O documento discute o atendimento à vítima de abuso sexual, abordando epidemiologia da violência sexual, sinais de abuso, protocolos de atendimento médico e acompanhamento, incluindo exames, profilaxias para DSTs e gravidez, e opções legais no caso de gravidez decorrente do abuso.
1. ASSISTÊNCIA À VÍTIMA DE ABUSO SEXUAL
Luiz Philippe Jorge de Nazareth
Orientadora:
Profª Juraci Ghiaroni
RIO DE JANEIRO
2014
2. Violência sexual
Estupro: “Ato de constranger alguém, mediante
violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal
ou a praticar ou permitir que com ele se pratique
outro ato libidinoso” (Decreto-Lei nº12.015/2009);
Estupro de Vulnerável (art. 217-A);
Crimes contra a dignidade sexual.
(CÓDIGO PENAL BRASILEIRO)
3. Epidemiologia
12 milhões de pessoas a cada ano;
A mulher é a principal vítima de violência
doméstica e sexual, da infância à terceira idade;
9 em cada 10 vítimas são mulheres;
Grupos de vulnerabilidade;
Subnotificação.
(BRASIL, 2012; SCHRAIBER, 2007)
7. Sinais de violência sexual
Edema, hematoma ou lacerações genitais;
Sangramento vaginal;
Rompimento himenal;
Lesões de palato ou de dentes anteriores;
Sangramento, fissuras ou cicatrizes anais;
Dilatação ou flacidez de esfíncter anal.
(BRASIL, 2010; BRASIL, 20
8. Sinais indiretos
Crianças e adolescentes:
Mudanças de comportamento;
Atitudes sexuais impróprias para a idade;
Demonstração de conhecimento sobre atividades
sexuais superiores à de sua fase de
desenvolvimento;
Masturbação frequente e compulsiva;
Tentativas frequentes de desvio para brincadeiras
que possibilitem intimidades e a manipulação
genital; (BRASIL, 2010
9. Síndrome do trauma do estupro
Fase aguda 2-3 semanas:
Desorganização do estilo de vida;
Sintomas físicos:
- náuseas, vômito, anorexia, desconforto
geniturinário, tensão muscular.
Sintomas psíquicos:
- negação, raiva, medo, culpa, pânico,
ansiedade, variações no humor, humilhação,
vergonha, desesperança, vingança, medo de
repetição, desconfiança de homens, alterações
sexuais.
(ABRAHAMS et al, 2013; MCGRATH, 20
10. Normas de atendimento
Atendimento integral e humanizado com equipe
multiprofissional;
Esclarecimento sobre o risco de gravidez e de
DST;
Conscientização sobre o seguimento ambulatorial;
Importância do acompanhamento psicológico;
Notificação compulsória (Lei nº10.778/2003);
Segredo profissional (art. 154);
Omissão e objeção de consciência (art. 13).(BRASIL, 2012; CÓDIGO PEN
12. Contracepção de emergência
Risco de gravidez: 0,5-5%;
Indicações: mulheres em idade de reprodutiva +
penetração vaginal;
AE hormonal é o método de eleição (3/5 dias):
- altera o desenvolvimento dos folículos ou
modifica o muco cervical. Não existe efeito
abortivo!
(BRASIL, 2012
13. Contracepção de emergência
Método de Yuzpe x ritonavir;
Contraindicações:
- Cat. 4: gravidez confirmada;
- Cat. 2: AVC, tromboembolismo, enxaqueca
severa ou DM com complicações vasculares
(Yuzpe).
Efeitos colaterais: náuseas (~50%) e vômitos
(~20%);
Índice de Pearl: 2%. Eficácia diminui com o tempo;
60% terão a próxima menstruação normal; (BRASIL, 2012
14. DST não virais
Consequências físicas e emocionais;
16-58% adquirem pelo menos uma DST:
- Gonorreia: 0,8-9,6%;
- Clamídia: 1,5-26%;
- Tricomoníase: 3,1-22%;
- Sífilis: até 1,6%;
- Vaginose bacteriana: 12-50%*.
Tipo de exposição, nº de agressores, tempo de
exposição, traumatismos genitais, idade e
presença de DST.
(BRASIL, 2012
15. DST não virais
(BRASIL, 2012
* Metronidazol x ARV
Exposição crônica ao agressor ou uso de
preservativos: profilaxia não recomendada;
Avaliar postergação (uso concomitante de
vários medicamentos).
16. DST não virais
Esquema alternativo:
- Em caso de hipersensibilidade às drogas de
primeira escolha.
(BRASIL, 2012
18. Hepatite B
(BRASIL, 2012
Imunoprofilaxia contra hepatite B (2/14 dias):
- Indicação: exposição a fluidos corporais do
agressor e esquema vacinal incompleto ou
desconhecido;
- Não recomendada: exposição crônica ou uso de
preservativos ou agressor sabidamente vacinado.
19. Hepatite C
(BRASIL, 2012
Não existe profilaxia;
Investigação laboratorial para hepatite C:
- ALT/TGP: 0, 45, 90 e 180 dias após;
- Anti-HCV: 0, 90 e 180 dias após;
- HCV-RNA (PCR qualitativo): 90 dias.
Indicação: agressor infectado ou sorologia
desconhecida.
20. Hepatites virais
(BRASIL, 2012
Transmissão vertical em gestantes vítimas de VS:
- Risco de hepatite C é baixo (coinfecção com
HIV);
- Risco de hepatite B é elevado (90%).
Efeitos colaterais:
- Febre e dor local.
Conduta frente à infecção:
- Positividade para hepatite B ou C: avaliação
especializada.
21. Infecção pelo HIV
(BRASIL, 2012
Risco de transmissão: 0,8-2,7%.
- Tipo de exposição;
- nº de agressores;
- Susceptibilidade da mulher;
- Rotura himenal;
- Exposição a secreções sexuais ou sangue;
- Presença de DST ou úlcera genital;
- Carga viral do agressor;
- Início precoce da profilaxia ARV.
22. Infecção pelo HIV
(BRASIL, 2012
Quimioprofilaxia ARV – Indicações:
- Considerar sempre o desejo da paciente de realizar a
profilaxia.
24. Infecção pelo HIV
(BRASIL, 2012
Esquemas de administração:
- A profilaxia deve ser considerada uma
emergência. Iniciada nas primeiras 24h e
mantida por 4 semanas.
- Agressor HIV+ em TARV e com carga viral
indetectável: esquema ARV para a vítima pode
ser o mesmo do agressor.
27. Infecção pelo HIV
(BRASIL, 2012
Aconselhamento à paciente:
Não adesão falha da profilaxia e surgimento
de cepas multiresistentes.
- Processo de responsabilidade
compartilhada;
- Efeitos colaterais x atividades cotidianas;
- Impactos de um resultado positivo;
- Janela Imunológica (seguimento de 6
meses);
- Suspender amamentação;
28. Infecção pelo HIV
(BRASIL, 2012
Interações medicamentosas:
- Metronidazol x ritonavir: efeito antabuse;
- YUZPE x ritonavir: níveis séricos de
estrogênios;
- Psicotrópicos, antiarrítmicos e estatinas.
Reações adversas:
- Efeitos gastrointestinais (LPV/r), cefaleia e
fadiga;
- Alterações laboratoriais discretas e
29. Acompanhamento laboratorial
(BRASIL, 2012
Exames de rotina:
Hemograma completo*;
Transaminases*;
VDRL ou RPR;
HBSAg;
Anti-HBc IgM;
Anti-HCV;
Anti-HIV (consentimento verbal);
Coleta de espécimes da vagina e do endocérvice
para exame bacterioscópico e de cultura.
* Para pacientes em uso de ARV.
32. Seguimento ambulatorial
(BRASIL, 2012
Retorno em14 dias e 1, 3 e 6 meses;
Verificar e esclarecer à paciente os resultados
das primeiras sorologias coletadas;
Sorologia positiva ou não conclusiva: avaliação
especializada;
Sinais importantes de intolerância ou intoxicação
química por ARV: infectologista;
Gravidez: obstetrícia (pré-natal ou interrupção da
gestação).
33. Gravidez decorrente de abuso
(CÓDIGO PENAL
Alternativas legais:
Manutenção da gravidez (criança inserida na
família ou encaminhada para adoção);
Interrupção da gravidez (Decreto-Lei
nº2.848/1940).
“O abortamento é permitido quando a gravidez resulta
de estupro ou, por analogia, de outra forma de
violência sexual”
- Presunção de veracidade (art. 20).
34. Interrupção da gestação
(CÓDIGO PENAL; BRASIL, 20
O código penal exige apenas o consentimento;
Procedimentos de justificação a autorização da
interrupção da gravidez (Portaria MS/GM nº1508):
- Termo de consentimento livre e esclarecido;
- Termo de responsabilidade;
- Termo de relato circunstanciado;
- Parecer técnico;
- Termo de aprovação do procedimento de
interrupção da gravidez.
35. Interrupção da gestação
(CFM; CÓDIGO PENAL; EC
Adolescentes:
Atendimento: pode ser realizado na ausência dos
pais ou responsáveis;
Solicitação de aborto: autorização dos pais (<18
anos) e comunicação ao Conselho Tutelar (<14
anos).
Objeção de consciência (art. 9 do Código de Ética
Médica):
“É direito do médico recusar a realização de atos
médicos que, embora permitidos por lei, sejam
contrários aos ditames da sua consciência”
36. Interrupção da gestação
(PROTOCOLOS ASSISTENCIAIS ME UFRJ,
Métodos de interrupção:
Até 12 semanas:
- Aspiração à vácuo intrauterina (método de
eleição);
- Misoprostol 800 mcg vv 12/12 horas.
Após 12 semanas:
- Misoprostol 200 mcg vv 6/6 horas (13-16
semanas);
- Misoprostol 100 mcg vv 6/6 horas (17-20
semanas).
37. Informações úteis
Central de atendimento à mulher: 180;
Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher
(DEAM)
Rua Visconde do Rio Branco, nº 12 – Centro;
O atendimento médico de emergência é realizado
em todas as maternidades;
Referência para abortamento legal:
- Instituto Municipal da Mulher Fernando
Magalhães
Rua General José Cristino, 87 – São Cristóvão.
38. REFERÊNCIAS
ABRAHAMS, N. et al. Depressive symptoms after a sexual assault among women:
understanding victim-perpetrator relationships and the role of social perceptions. Afr.
J. Psychiatry. v. 14, n. 4, p. 288-93, 2013.
BRASIL. Código penal brasileiro. 10. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.
BRASIL. Estatuto da criança e do adolescente (1990). 7.ed. Brasília : Câmara dos
Deputados, 2010.
BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº 1.508/GM de 1º de setembro de 2005.
Procedimento de justificação e autorização da interrupção da gravidez nos
casos previstos em lei, no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS.
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de
Ações Programáticas Estratégicas. Prevenção e tratamento dos agravos
resultantes da violência sexual contra mulheres e adolescentes : norma
técnica. 3. ed. atual. e ampl., Brasília : Ministério da Saúde, 2012.
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de
Ações Programáticas e Estratégicas. Linha de Cuidado para a Atenção Integral à
Saúde de Crianças, Adolescentes e suas Famílias em Situação de Violência.
Orientações para gestores e profissionais de saúde. Brasília : Ministério da
Saúde, 2010.
39. REFERÊNCIAS
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de
Vigilância Epidemiológica. Hepatites virais : o Brasil está atento. 3. ed. Brasília :
Ministério da Saúde, 2008.
CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA (CFM). Código de Ética Médica. Disponível em
http://www.portalmedico.org.br/novocodigo/integra.asp. Acessado em 15/03/14 às 14:57:00.
DREZETT, J. Estudo de fatores relacionados com a violência sexual contra crianças,
adolescentes e mulheres adultas. São Paulo, 2000. Tese (Doutorado) – Centro de
Referência da Saúde da Mulher e de Nutrição, Alimentação e Desenvolvimento Infantil.
OSHIKATA, C.T. et al. Atendimento de emergência a mulheres que sofreram violência
sexual: características das mulheres e resultados até seis meses pós-agressão. Cad.
Saúde Pública. v. 21, n. 1, p. 192-199, 2005.
PROTOCOLOS ASSISTENCIAIS: MATERNIDADE ESCOLA DA UNIVERSIDADE
FEDERAL DO RIO DE JANEIRO. 1. ed. Rio de Janeiro: PoD, 2013.
SAVINO, J.O; TURVEY, B.E. Rape Investigation Handbook. 2. ed. Elsevier, 2001.
SCHRAIBER, L.B. et al. Prevalência da violência contra a mulher por parceiro íntimo em
regiões do Brasil. Rev. Saúde Pública, São Paulo, v. 41, n. 5, 2007.