Este projeto foi pensado e elaborado como possibilidade de apresentar aos alunos dos 8ºs e 9º ano do Ensino Fundamental a riqueza do conteúdo memorialístico de Carolina Maria de Jesus em sua obra prima, “Quarto de Despejo. Carolina Maria de Jesus tem fome de pão, mas também tem fome de escrever para dar conta da vida sofrida que levava.
Semelhante a PROJETO DE ESTÁGIO II LEITURA, PRODUÇÃO E ANÁLISE LINGUÍSTICA: as marcas de oralidade e de erudição em “Quarto de Despejo” de Carolina Maria de Jesus
Semelhante a PROJETO DE ESTÁGIO II LEITURA, PRODUÇÃO E ANÁLISE LINGUÍSTICA: as marcas de oralidade e de erudição em “Quarto de Despejo” de Carolina Maria de Jesus (20)
ALMANANHE DE BRINCADEIRAS - 500 atividades escolares
PROJETO DE ESTÁGIO II LEITURA, PRODUÇÃO E ANÁLISE LINGUÍSTICA: as marcas de oralidade e de erudição em “Quarto de Despejo” de Carolina Maria de Jesus
1. FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDÔNIA
UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL
NÚCLEO DE CIÊNCIAS HUMANAS
DIRETORIA DE EDUCAÇÃO À DISTÂNCIA
DEPARTAMENTO DE LÍNGUAS VERNÁCULAS
Curso de Licenciatura em Letras/UAB – Habilitação em Língua Portuguesa e suas
Literaturas
Coordenação de Estágios e Atividades Acadêmico-científico-culturais/AACC
PROJETO DE ESTÁGIO II
LEITURA, PRODUÇÃO E ANÁLISE LINGUÍSTICA: as marcas de oralidade e de
erudição em “Quarto de Despejo” de Carolina Maria de Jesus
Cidade/RO
2016
2. Locimar Massalai
LEITURA, PRODUÇÃO E ANÁLISE LINGUÍSTICA: as marcas de oralidade e de
erudição em “Quarto de Despejo” de Carolina Maria de Jesus
Projeto de Ensino apresentado ao Curso de
Licenciatura em Letras/UAB, Habilitação
em Língua Portuguesa e suas Literaturas
apresentado como requisito avaliativo
parcial da Disciplina de Estágio
Supervisionado em Ensino de Língua
Portuguesa e Literatura II, ministrada pela
professora Mestra Larissa Gotti Pissinatti
Cidade/RO
2016
4. 1. INTRODUÇÃO
Este projeto foi pensado e elaborado como possibilidade de apresentar aos alunos
dos 8ºs e 9º ano do Ensino Fundamental a riqueza do conteúdo memorialístico de Carolina
Maria de Jesus em sua obra prima, “Quarto de Despejo. Carolina Maria de Jesus tem fome
de pão, mas também tem fome de escrever para dar conta da vida sofrida que levava. A
fome de pão é transcendida pelo uso da palavra escrita que se torna uma necessidade
existencial para ela quando confessa no seu diário de 21 de julho de 1955, por exemplo:
Quando fico nervosa não gosto de discutir. Prefiro escrever. Todos os dias eu
escrevo. Sento no quintal e escrevo. (...) Fui catar papel, mas estava indisposta.
Vim embora porque o frio era demais. Quando cheguei em casa era 22,30. Liguei
o radio. Tomei banho. Esquentei comida. Li um pouco. Não sei dormir sem ler.
Gosto de manusear um livro. O livro é a melhor invenção do homem. (JESUS,
2013, p.24)
Vamos apresentar aos alunos a Carolina Maria de Jesus, uma mulher que opta por
não se casar porque nota em seu entorno mulheres casadas que trabalham fora o dia inteiro
e quando chegam em casa apanham de seus maridos, enquanto ela, sossegada em seu
barraco ouve valsas vienenses; e ao fazê-lo estamos também mostrando a eles uma
Carolina leitora de poetas como Casemiro de Abreu, Castro Alves e Olavo Bilac de onde
retira parte de seu linguajar rebuscado. Esta “Cinderela Negra”, no dizer de Meihy (1994)
muito discutida na academia e nas universidades em artigos, dissertações e teses,
dificilmente entra 1nos currículos escolares. Conceição Evaristo (2015) considera que este
“esquecimento” se deve principalmente por dois fatores: pelo fato de Carolina Maria de
Jesus ser negra, por mais que isso pareça redundante, e que trabalhar com o texto de
Carolina pressupõe também uma discussão em torno dos próprios preconceitos lingüísticos
porque uma das coisas é afirmado é o fato de que Carolina não tenha escrito dentro da
norma culta da língua, o que seria na verdade a norma oculta da língua, fazendo um
trocadilho, já que esta norma não é percebida, não é oferecida e não é apropriada por todos.
1 Constamos que na biblioteca da Escola Estadual de Ensino Fundamental Nova Brasília, que se
chama Biblioteca Escolar Professora Vanessa Fuzari, existe um exemplar novo, sem uso ainda de
“Quarto de Desejo”. Tal exemplar pertence ao Programa Nacional Biblioteca da Escola – PNBE
2013 – 6º ao 9º do Ensino Fundamental.
5. Ai tem em “Quarto de Desejo” um momento rico de discutirmos a questão da
diversidade linguística. Trabalhar o texto de Carolina é uma oportunidade de pensar que
português é este que nós estamos falando, pensar numa variante lingüística não sob o
aspecto de pensarmos sobre o que estaria certo ou errado gramaticalmente, pois quem
define quem escreve certo ou não são sempre as classes privilegiadas e de como os saberes
definem quem nós somos através dos processos de subjetivação.
Defendemos que essa mulher que chegou a criticar abertamente em seu livro “Casa
de Alvenaria” o espanto que a mídia e a elite paulistana teve com seu relativo sucesso em
“Quarto de Despejo”, não considerando o fato de escrever como algo excepcional de uma
determinada classe, precisa urgentemente ser redescoberta na e pelas escolas públicas
brasileiras, principalmente.
Há tempos estamos sendo instigados pela presença da obra de Carolina Maria de
Jesus, especificamente em “Quarto de Despejo” e ao apresentá-la aos alunos pretendemos
que eles percebam em tempos da crise colossal que envolve o Brasil, não apenas a
atualidade de sua obra e suas denúncias como a riqueza dos bordados presentes na colcha
de retalhos de seu cotidiano contado na materialidade de seus discursos, que ao escrever
nos contam Carolina Maria de Jesus precisa ser apresentada ou redescoberta pelas escolas
brasileiras.
As memórias literárias de Carolina Maria de Jesus comparecem no livro ora num
discurso coloquial, ora com características de um linguajar culto, mostrando as fontes onde
ela bebeu, em quais poços buscou, dialogou para utilizá-lo em suas memórias. Pelo texto de
Carolina Maria de Jesus apresentar-se desta forma é que o consideramos instigante para
oferecer aos alunos, pois estes também escrevem desta maneira, mesclando o dialeto
coloquial e o padrão, sendo a primeira desmerecida e desvalorizada em sala de aula.
Dentro deste contexto Carrijo (2011), considera que comparece na materialidade
discursiva apreendida no corpus literário incanônico de “Quarto de Despejo”, inscrições
dicotômicas reveladoras de marcas da oralidade e marcas de um discurso mais próximo dos
textos românticos ou intitulados letrados.
Carolina Maria de Jesus lança mão da narrativa em diários ou relatos
memorialísticos que era na época, 1950/60, um gênero textual materializado por escritores
6. homens para tecer sua materialidade discursiva de mulher negra, semi-escolarizada, mãe
solteira por opção, moradora de favela e catadora de lixo.
Consideramos que este projeto, ao fazer uma incursão histórica, literária, lingüística
e gramatical no “Quarto de despejo” é rica possibilidade para que os adolescentes entrem
em contato com uma parte da história do Brasil por meio da literatura e de como ela
escreve e descreve o mundo nos contando em quais fontes ela bebeu e como o fez.
Em tempos de facebook e whatzap a escritura testemunhal e memorialística de
Carolina Maria de Jesus ajuda resgatar a importância dos registros cotidianos que nem
sempre são considerados como textos de qualidade ou reveladores da identidade de um
povo e seu tempo, mormente quando se trata de escritos de crianças, adolescentes e jovens.
O texto literário de “Quarto de Despejo” nos provoca os seguintes questionamentos:
será a língua uma entidade social estável e absoluta ou a evidência das mutações e
interferências entre espaços e agentes sociais? Haverá interesse por parte dos alunos
adolescentes na leitura da escrita dos diários de Carolina Maria de Jesus? Quais trocas
simbólicas, identitárias, escriturárias e afetivas se dariam e seriam possíveis entre narradora
e leitores?
Para coroar o trabalho às voltas com os textos do diário de Carolina Maria de Jesus,
através de uma interface com a disciplina de Arte iremos instigar os alunos a apresentar
monólogos de excertos do “Quarto de Despejo” para toda a comunidade escolar
compreendendo que ler, recitar ou declamar em voz alta é trazer para o corpo físico o corpo
do texto que estará sendo evocado teatral e imageticamente no momento da apresentação.
2. OBJETIVOS
2.1. Geral
Perceber e analisar as marcas lingüísticas, literárias e textuais presentes na obra
“Quarto de Despejo” de Carolina Maria de Jesus tomando como referencial o linguajar dos
alunos às voltas com a leitura e a escrita no seu cotidiano e na escola e partindo do texto
como unidade pedagógica de aprendizagem.
2.2. Específicos:
7. Conhecer a história e a evolução das bibliotecas como espaços de cultura ao longo
dos séculos;
Identificar os vários suportes do livro como objeto de saber e de poder;
Diferenciar o que é língua padrão e linguagem coloquial e ajudar o aluno a perceber
como são usadas no seu cotidiano e na obra de Caroliniana;
Compreender o que é um texto memorialístico e testemunhal;
Conhecer a importância e as peculiaridades de um diário como texto literário;
Levar o aluno a compreender que as memórias podem ser registradas oralmente e por
escrito;
Conhecer e perceber as peculiaridades da narrativa memorialística e memórias
literárias como gêneros discursivos;
Definir o que é análise de discurso;
Fazer com os alunos pequenas análises de discurso de excertos dos textos de “Quarto
de Despejo”;
Desafiar os alunos para que percebam através de pequenos trechos do texto
Caroliniano, as marcas da oralidade e as marcas da erudição;
Compreender a língua de maneira a dar conta de perceber a variação intrínseca ao
processo lingüístico no que diz respeito aos fatores geográficos, históricos e sociológicos;
Perceber as diferenças entre os padrões de linguagem oral e os padrões da linguagem
escrita;
Perceber que escrever é muito mais do que obedecer a regras gramaticais e a
esquemas fixos de estruturação e estilo textual.
Identificar o que é um monólogo teatral e proceder a exercícios práticos a partir de
excertos de textos carolinianos.
BASE TEÓRICAE CONCEITUAL
Inicialmente consideramos que a importância de um referencial teórico, além de sua
atualidade, pertinência e capacidade de diálogo com autores que discutem determinadas
8. questões, residem no fato de que nossas falas e argumentos não se sustentam por si só.
Carecemos de um apoio de outros pesquisadores que já falaram antes de nós para sustentar,
apoiar e dar credibilidade aos nossos posicionamentos. Ressalva feita.
Pensamos ser importante pontuar que este nosso referencial, bordado de acordo com
a intencionalidade do projeto, do olhar cuidadoso sobre a realidade escolar e em contínua
troca com a professora regente das turmas que vamos exercer a experiência da docência,
vêm estruturado a partir das três dimensões que norteiam o Estágio II, a saber: leitura,
produção e análise linguística. Dentro destas três dimensões, escolhemos autores, dentre
tantos outros possíveis, para sustentar e amparar nossos posicionamentos.
Observamos que, das três dimensões acima, a leitura seguida da produção ou de
produções textuais sejam as mais esquecidas ou pobremente trabalhadas nas aulas de
Língua Portuguesa, onde a hegemonia é dada para o trato com a gramática
descontextualizada do texto como um todo, ou seja, como uma unidade, pois,
Se o objetivo é que o aluno aprenda a produzir e a interpretar textos, não é
possível tomar como unidade básica de ensino nem a letra, nem a sílaba, nem a
palavra, nem a frase que, descontextualizadas, pouco têm a ver com a
competência discursiva, que é questão central. Dentro desse marco, a unidade
básica de ensino só pode ser o texto, mas isso não significa que não se enfoquem
palavras ou frases nas situações didáticas específicas que o exijam. (...) Não se
formam bons leitores oferecendo materiais de leitura empobrecidos. (...) As
pessoas aprendem a gostar de ler quando, de alguma forma, a qualidade de suas
vidas melhora com a leitura. (PCN, 2001, p. 35-36)
Pensando em trabalhar leitura, produção e análise lingüística a partir da perspectiva
apontada acima, escolhemos o texto de Carolina Maria de Jesus especialmente, “Quarto de
Despejo” por apresentar situações em que a autora comete pequenos “deslizes” ortográficos
combinados com um vocabulário ricamente elaborado, porque ela mesma intuíra também
que ler é poder e que a literatura, ter acesso ao mundo letrado era uma forma de inclusão, e
dar conta do mundo da palavra e das palavras do mundo possibilitaria que ela e os seus
saíssem de uma condição de sofrimento para uma vida melhor.
Como para Carolina Maria de Jesus, defendemos que também para os alunos com
os quais estamos desenvolvendo a prática do Estágio, ler e escrever, ter acesso a textos de
qualidade seja uma possibilidade ontológica inclusão não apenas ao mundo letrado, mas a
outras visões sobre os mundos muitas vezes i-mundos.
9. Possibilitar o contato com o texto Caroliniano nos remete à premissa maior de que
ler e escrever experiências vividas constroem o conhecimento transformador de indivíduos
e culturas.
Por isso é preciso parar de tratar a literatura ou a leitura apenas como adereço na sua
relação com a gramática. Prado (2010) defende que é preciso inserir a literatura no feijão
com arroz da atividade da pedagógica da escola onde as demais questões concernentes ao
ler, escrever e falar bem acontecerá sem muito esforço.
Como vamos estagiar com adolescentes de 8º e 9º ano, inseridos em uma realidade
de periferia, empobrecida, marginalizada, alijada do acesso à políticas sociais de qualidade
e com suas lutas por vida melhor, defendemos que ler é uma inclusão desmedida, pois é
bem verdade que a literatura (...) “permite ser outro sem deixar de ser o mesmo. Oferece ao
leitor um instrumento poderoso de construção pessoal e uma completa dimensão educativa
sobre os sentimentos e ações humanas”. (COLOMER, 2010, p.61).
Neste caso, apresentar aos alunos a literatura de uma mulher negra, pobre, viciada
em ler e escrever, que registrava diariamente no papel as agruras, as alegrias, os
pensamentos e sentimentos que passavam por ela diariamente, em casa e nas ruas, onde
trabalhava catando papel e lata no lixo é possibilitar aos alunos e professores da escola a se
questionar quantas outras Carolina haverá por aí, de quem não tomamos conhecimento,
testemunhas surdas, sujas de um desejo de fazer-se notar. Eles mesmos, os alunos que, em
suas rebeldias e indisciplinas poderão pela escrita e pela leitura utilizar de outros meios que
não a agressão e a violência para fazerem-se notar.
Porque mais que o tema ou o discurso das páginas do diário de Carolina Maria de
Jesus interessa-nos sua fala como sujeito de um gênero literário e social, sua apropriação do
ato de autorrepresentação pela palavra escrita, No seu processo de letramento literário.
Processo também desejado quando solicitamos a escrita dos alunos sobre a escola, sobre a
sala de aula, a leitura e as aulas de língua portuguesa. Neste sentido, Leahy-Dios (2013,
p.29) em seu texto “vida e poesia no quarto de despejo: diário de uma favelada” considera
que,
Leitores identificados com a autora e suas palavras podem ser levados a novas
reflexões dialógicas entre Literatura, Educação, Sociedade. Que diálogo pode
surgir entre tal autora, tal texto, e qual leitor, até que o invisível ocupe umespaço
de visibilidade, e o excluído exija inclusão? Afinal, Carolina escreve ‘errado’, o
10. que é motivo de acusação; mas usa vocabulário sofisticado. Carolina fala de
fome, de catar papel no lixo para sobreviver, o que serve mais à fruição que
advém de um estado de incômodo, desestruturação e mudança, do que à
propaganda oficial de que ler é prazer, ler é viajar, ler é viver belas fantasias. Que
certamente não passavam pela Favela do Canindé, onde Carolina morava e
sobrevivia, com o dinheiro obtido pela venda de papéis e outros objetos
encontrados no lixo.
Qual seria o teor da obra de Carolina como cultura popular urbana? Em primeiro
lugar, como manifestação formal, seus erros gramaticais, em contraste com a difícil
explicação de seu vocabulário, representam facetas que se fundem na necessidade
expressiva, a afetação de quem vê a literatura como poder. Isso, aliás, nunca esteve ausente
da percepção de Carolina, que, mesmo sendo mulher fisicamente indefesa na favela, sabia
que, por ler e escrever dominava o código dos poderosos. (p.31)
O Ensino da Língua Portuguesa, ainda é hegemonicamente pautado no ensino da
gramática, fato que dificulta a percepção da linguagem como ciência, pois não se pode
ignorar o que a língua é construída socialmente e que traz arraigados fatos individuais e
coletivos de culturas e crenças distribuídas no tempo e no espaço.
Quanto aos desafios propostos ao ensino da língua portuguesa, concordamos com
Possenti (2009) quando defende que, no caso específico do ensino do português, tais
desafios não serão enfrentados se não se mudar a concepção de linguagem e de ensino da
língua e que o objetivo da mesma é o de criar condições para que o português padrão seja
aprendido na escola.
No Brasil, apesar de todas as variações lingüísticas seguimos convencionalmente
uma mesma gramática. No entanto, não podemos acreditar que língua e gramática são a
mesma coisa, pois a língua é muito mais que a sua gramática. A gramática é o conjunto de
regras que nos ajudam a entender como funciona uma língua. Por isso,
(...) Toda língua tem sua gramática, tem seu conjunto de regras,
independentemente do prestígio social ou do nível de desenvolvimento
econômico e cultural da comunidade em que é falada. Quer dizer, não existe
língua sem gramática. (...) Quando alguém é capaz de falar uma língua é então
capaz de usar apropriadamente as regras dessa língua na produção de textos
interpretáveis e relevantes. Aprender uma língua é, portanto, adquirir, entre outras
coisas, o conhecimento das regras de formação dos enunciados dessa língua.
(ANTUNES, 2009, p. 85)
11. Assim posto é fato que não existe falante sem conhecimento de gramática. Isto é,
saber usar as regras de combinações de palavras em textos para que suas mensagens
resultem inteligíveis e interpretáveis. Neste contexto, concordamos com Possenti (2009,
p.17) quando apregoa que o “objetivo da escola é ensinar o português padrão, ou seja, o de
criar condições para que ele seja aprendido”.
É bem verdade que a escola perde muito tempo às voltas com questões de
nomenclaturas e de classificações e esquece-se do estudo das regras e dos usos da língua
nos textos como unidades de ensino. A questão que se põe não é a de ensinar ou não
ensinar regras gramaticais, mas que regras ensinar e em quais perspectivas.
E aqui estamos falando de perspectivas pedagógicas e assim sendo, o professor de
língua portuguesa deverá trazer para sala de aula, segundo Antunes (2009), uma gramática
que seja relevante, que possam ampliar a competência comunicativa dos alunos, que seja
funcional no sentido de suas aplicações em textos de diferentes gêneros, que tenha como
referência o efetivo uso da língua o qual se materializa nos textos, que seja contextualizada
na qual promova a produção e análise de textos a partir da realidade, que faça sentido e
promova sentido na vida dos alunos, que considere mais de uma norma e, finalmente, “uma
gramática que é da língua e das pessoas”, cujo grande objetivo é ampliar as competências
comunicativas e interacionais dos alunos.
Quando consideramos o trabalho com a gramática a partir de textos concretos e
reais, estamos sendo referendados pelo PCN de Língua Portuguesa (2001) ao apontar que,
Entre os principais recursos que precisam estar disponíveis na escola para
viabilizar a proposta didática da área, estão os textos autênticos. A utilização de
textos autênticos pressupõe cuidado com a manutenção de suas características
gráficas: formatação, paginação, diferentes elementos utilizados para atribuição
de sentido — como fotografias, desenhos gráficos, ilustrações, etc. Da mesma
forma, é importante que esses textos, sempre que possível, sejam trazidos para a
sala de aula nos seus portadores de origem (ainda que em algumas situações
possam ser agrupados segundo gênero ou tema, por exemplo, para atender a
necessidades específicas dos projetos de estudo).
Diante de todas essas implicações e especificidades do ensino da gramática é
importante incentivar na escola, projetos de intervenção que priorizem a reflexão e a análise
linguística dentro de diferentes situações sociais e acadêmicas e nas relações que elas
12. desempenham de censura e discriminação. Eis a razão, de nossa escolha por “Quarto de
Despejo”, de Carolina Maria de Jesus, como mote provocador de nosso projeto.
Carrijo (2011, p. 150), ao falar da materialidade discursiva de “Quarto de Despejo”
infere que nele,
(...) Se faz possível identificar, assinalar diversos recursos utilizados para compor
o dizer. Trechos carregados de metáforas, textos (des)veladores dos motes
utilizados nos textos de Casimiro de Abreu, emCastro Alves, o uso de metáforas,
o recurso da hipercorreção – quando a instância-sujeito Carolina, sabendo-se não
possuidora do código letrado, tenta se infiltrar nesse código e se corrigir – de tal
modo que chega ao exagero ou, ainda, abeira-se ao que se conhece como
hipercorreção: uso exagerado dos pronomes, escolha de vocábulos burilados,
garimpados nos dicionários. Nesse sentido, o dizer de Carolina traz tatuada a
marca do interdiscurso.
Os “tropeços gramaticais” de Carolina não depõem contra a riqueza de seus textos.
Pelo contrário, tais “tropeços” se tornam grandiosa possibilidade de perceber a riqueza
social de uma língua no exercício real de seus sentidos. A presença de “erros gramaticais” e
a utilização de recursos lexicais elaborados e a sofisticação vocabular característica de seus
escritos são reveladores de seus mundos.
Acreditamos que os alunos dos anos finais do ensino fundamental merecem e terão
o prazer de conhecer: “Carolina Maria de Jesus, uma menina perguntadeira, atenta,
questionadora e inquieta se deu conta de que as palavras não poderiam mudar o mundo,
mas poderiam sim ajudar a contá-lo, inventá-lo e representá-lo.
E porque concordamos com Calvino (1990) o parafraseamos argumentando que
nossa confiança no futuro da humanidade consiste em saber que há coisas que só a
literatura com seus meios específicos nos podem dar.
METODOLOGIA
A metodologia utilizada será dialógica, sempre respeitando os falares e dizeres dos
alunos envolvidos na prática da regência. Em todos os momentos os alunos serão ouvidos,
consultados e suas falas aproveitadas e/ou aprofundadas.
13. Em todos os momentos as atividades serão previamente planejadas a partir das
observações, inferências e participação dos alunos e dos docentes de Língua Portuguesa
para que em seguida a regência aconteça e se efetive numa perspectiva de troca de saberes.
Para que a regência nas turmas de 8º ano e 9º ano se concretize, lançaremos mão dos
seguintes instrumentais: entrevista com professora e alunos, aplicação de questionários,
aulas expositivas, trabalhos em grupos, leituras compartilhadas de excertos de textos,
exercícios individuais e coletivos de análise lingüística e análise do discurso, construção de
textos, monólogos teatrais com posterior apresentação.
QUADRO 1- DISTRIBUIÇÃO DA CARGA HORÁRIA E ATIVIDADES
ESTAGIÁRIO: Locimar Massalai
CURSO: Letras PERÍODO: 7º ANO: 2016
TEMA: LEITURA, PRODUÇÃO E ANÁLISE LINGUÍSTICA: as marcas de oralidade
e de erudição em “Quarto de Despejo” de Carolina Maria de Jesus
Escola Estadual de Ensino Fundamental Nova Brasília - SÉRIES: 8º “A” e “B” e 9º
“A” – TURNO: Vespertino
CARGA HORÁRIA: 40 horas
DATA CH ATIVIDADES ESTRATÉGIAS
05/09/2016 02 Planejamento de atividades junto
ao professor regente das turmas
Contato com os professores de Língua
Portuguesa. Apresentação do projeto.
06/09/2016 04 O curso de Letras, a prática do
Estágio, a Disciplina de Língua
Portuguesa: o aluno merece saber
como quais são suas dinâmicas e
suas interfaces
Aula realizada no Laboratório de
Informática Educativa – atividades
realizadas em grupos menores após
orientações por parte do acadêmico.
14/09/2016 06 A leitura, a escrita, a biblioteca, o
livro e a escola: uma relação
antiga.
Aula iniciada no LIE, com visita “in loco” à
biblioteca da escola e manipulação de seu
acervo destinado aos alunos de 6º ao 9º ano
e finalizada com produção de textos em sala
de aula.
20/09/2016 06 A leitura e a escrita de Carolina
Maria de Jesus em “Quarto de
despejo”
Leitura compartilhada e teatralizada de
textos, análise lingüística de textos,
produção de textos e monólogos teatrais.
26/09/2016 06 Trabalhando com excertos de
textos de “Quarto de Despejo” –
monólogos
Apresentação de monólogos teatrais de
excertos do Diário da Favela, de Carolina
Maria de Jesus
268 horas Regência Aulas, atividades em grupo, leituras
2 Salientamos que trabalhamos com três turmas, conforme consta no cabeçalho do “Quadro 01”. Sendo assim,
cada hora aula é multiplicada por três que corresponde ao número de turmas trabalhadas.
14. compartilhadas, construção de textos e
teatro.
Fonte: Locimar Massalai
5. CRONOGRAMA
QUADRO 2- DATAS/HORÁRIOS E TURMAS
ESTAGIÁRIO LOCIMAR MASSALAI
TELEFONES: 3424-9223 E-MAIL: locimassalai@gmail.com
ESCOLA: Nova Brasília
ENDEREÇO Rua Cedro, nº 2311
TELEFONE 3424-5670
DATA SÉRIE C.H HORÁRIO
05/09/2016 Todas 02 13 às 15 horas
06/09/2016 8º “A” 05 13h15min às 17h15min
08/09/2016 8º “B” 05 13h15min às 17h15min
09/09/2016 9º “A” 05 13h15min às 17 h15min
12/09/2016 8º “A” 05 13h15min às 17 h15min
13/09/2016 8º “A” 02 13h15min às 15h15min
14/09/2016 8º “B” 05 13h15min às 1 h15min
15/09/2016 8º “B” 02 13h15min às 15h15min
16/09/2016 9º “A” 05 13h15min às 17 h15min
19/09/2016 9º “A” 02 13h15min às 15h15min
20/09/2016 8º “A” 05 13h15min às 17 h15min
21/09/2016 8º “A” 02 13h15min às 15h15min
22/09/2016 8º “B” 05 13h15min às 17 h15min
23/09/2016 8º “B” 02 13h15min às 15h15min
26/09/2016 9º “A” 05 13h15min às 17 h15min
27/09/2016 9º ”A” 02 13h15min às 15h15min
28/09/2016 8º “A” 05 13h15min às 17 h15min
29/09/2016 8º “A” 02 13h15min às 15h15min
03/10/2016 8º “B” 05 13h15min às 17 h15min
04/10/2016 8º “B” 02 13h15min às 15 h15min
05/10/2016 9º “A” 05 13h15min às 17 h15min
06/10/2016 9º”A” 02 13h15min às 15 h15min
Fonte: Locimar Massalai
15. REFERÊNCIAS
ANTUNES, Irandé. Aula de Português: encontro e interação. 8ª ed. Parábola Editorial:
São Paulo, 2009.
BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa. 3ª ed. Brasília:
Secretaria de Educação Fundamental, 2001.
CALVINO, Ítalo. Seis propostas para o próximo milênio. São Paulo: Cia das Letras,
1990.
CARRIJO, Fabiana Rodrigues. Nas fissuras dos cadernos encardidos: o bordado
testemunhal de Carolina Maria de Jesus. Revista OPSIS, Catalão, v. 11, nº 1, p.142-156,
jan/jun, de 2011.
COLOMER, Tereza. Andar entre livros. São Paulo: Global, 2007.
Entrevista com a professora Conceição Evaristo sobre Carolina de Jesus (2015).
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=EDYxWzhlFfw. Acesso em
19/09/2016.
JESUS. Carolina Maria. Quarto de Despejo. Abril Cultural: São Paulo, 2013.
LEAHY-DIOS, Cyana M. Vida e Poesia no Quarto de Despejo: Diário de uma favelada.
Revista Semioses: Rio de Janeiro, v.7, nº 2, p. 26-34, jul./dez.2013.
POSSENTI, Sírio. Por que (não) ensinar gramática na escola. Mercado das Letras:
Campinas, 2009.
PRADO, Adélia. Entrevista com Adélia Prado. Revista na Ponta do Lápis: São Paulo, ano
VI, nº 15, Dez/2010, p. 32
MEIHY, José Carlos sebe Bom. Cinderela Negra: a saga de Carolina Maria de Jesus. Rio
de Janeiro: editora UFRJ, 1994.
Professor Regente Professor Orientador