O documento discute o Simbolismo na literatura brasileira, apresentando suas principais características e autores. O Simbolismo surgiu no Brasil no final do século XIX como reação contra a visão positivista e racionalista da época, privilegiando a sugestão sobre a descrição e o uso de símbolos. Cruz e Sousa foi o maior expoente do movimento no país, explorando temas como o sofrimento, a espiritualidade e o erotismo em sua poesia marcada pela musicalidade e obsessão pela cor branca
2. • As últimas décadas do século XIX foram
marcadas por uma visão materialista,
racional e cientificista da realidade.
Artistas insatisfeitos com a mentalidade,
perceberam que o discurso racional não
dava conta de explicar cabalmente
todas as questões atinentes à existência
humana
• Lançado no Brasil oficialmente em 1893,
com a publicação dos livros Missal e
Broquéis, de Cruz e Sousa, o Simbolismo
foi uma escola literária contemporânea
do Realismo-Naturalismo e significou uma
dupla reação:
3. • Reação biológica contra o
materialismo positivista e cientificista
do século XIX, colocando-se,
consequentemente, a favor da
filosofia, da metafísica e da
espiritualidade;
•Reação estética contra a objetividade e
impessoalidade da poesia parnasiana e
a conseqüente proposta de um retorno às
raízes da poesia.
5. Antífona de Cruz e Sousa
I
1. Ó Formas alvas, brancas, Formas claras
2. De luares, de neves, de neblinas!...
3. Ó Formas vagas, fluidas, cristalinas...
4. Incensos dos turíbulos das aras...
II
5. Formas do Amor, constelarmente puras,
6. De Virgens e de Santas vaporosas...
7. Brilhos errantes, mádidas frescuras
8. E dolências de lírios e de rosas...
III
9. Indefiníveis músicas supremas,
10. Harmonias da Cor e do Perfume...
11. Horas do Ocaso, trêmulas, extremas,
12. Réquiem do Sol que a Dor da Luz resume...
IV
13. Visões, salmos e cânticos serenos,
14. Surdinas de órgãos flébeis, soluçantes...
15. Dormências de volúpicos venenos
16. Sutis e suaves, mórbidos, radiantes...
6. VI
21. Do Sonho as mais azuis dia diafaneidades
22. Que fuljam, que na Estrofe se levantem
23. E as emoções, todas as castidades
24. Da alma do Verso, pelos versos cantem.
VII
25. Que o pólen de ouro dos mais finos astros
26. Fecunde e inflame a rima clara e
ardente...
27. Que brilhe a correção dos alabastros
28. Sonoramente, luminosamente.
VIII
29. Forças originais, essência, graça
30. De carnes de mulher, delicadezas...
31. Todo esse eflúvio que por ondas passa
32. Do Éter nas róseas e áureas correntezas...
...
7. 1. A sugestão predomina sobre a descrição:
as imagens que tão fartamente aparecem
nos poemas simbolistas são vagas,
diluídas, suaves. Ocorre um registro
impressionista do mundo real: não importa
como a realidade é, mas os efeitos que ela
causa na sensibilidade do artista.
Ex.:
I
1. Ó Formas alvas, brancas, Formas claras
2. De luares, de neves, de neblinas!...
3. Ó Formas vagas, fluidas, cristalinas...
4. Incensos dos turíbulos das aras...
8. 2. Misticismo: o simbolista mantém
uma atitude mística perante a
vida; tenta atingir o inatingível, o
oculto e o misterioso para tentar
contemplar algum tipo de sentido
para sua existência na terra e na
transcendência a outro plano.
Ex.
4. Incensos dos turíbulos das
aras. 6. De Virgens e de
Santas vaporosas.....
9. 3. Inovação emprego das maiúsculas: o
autor simbolista usa maiúsculas em
substantivos comuns para ampliar o
sentido desses vocábulos, alem dar maior
força emocional a eles.
Ex. versos:
1.Ó Formas alvas, brancas, Formas claras
3.Ó Formas vagas, fluidas, cristalinas...
10. 4. Musicalidade: para os simbolistas, há
uma relação fundamental entre
música e poesia. Os efeitos sonoros
são amplamente explorados, entre os
quais podemos destacar o uso das
aliterações (repetição de sons
consonantais).
A aliteração pode ser vista na estrofe
I(repetição do fonema /s/). O poema
todo
apresenta uma certa musicalidade,
facilmente percebida quando feita uma
leitura em voz alta
9. Indefiníveis músicas supremas,
10. Harmonias da Cor e do Perfume...
11. 5. Hermetismo: a poesia simbolista
é complexa, fechada, de difícil
compreensão integral, exigindo
maior sensibilidade, intuição e
abstração por parte do leitor.
. Ex.:
O poema como um todo
demonstra isso, tanto pelo
vocabulário empregado como
pelas construções
12. 6. Emprego de símbolos cósmicos
e religiosos: altares, incensos,
estrelas, constelações, sinos,
turíbulos, nuvens, ... são
símbolos frequentemente utiliza
dos pelos simbolistas para
sugerir os estados da alma
humana.
Em praticamente todos os
versos temos a presente
símbolos cósmico-religiosos.
2. De luares, de neves, de neblinas!...
4. Incensos dos turíbulos das aras...
13. 7. Emprego de sinestesias: a sinestesia
consiste numa figura de linguagem que
procura promover a fusão de
sensações (audição, tato, gustação,
olfato, visão), para tentar dizer o
indizível, para tentar sugerir, esboçar
aquilo que não pode ser descrito
objetivamente.
Sinestisias: Harmonias (sensação
auditiva), Cor (sensação visual),
Perfume (sensação olfativa).
10. Harmonias da Cor e do Perfume...
14. 8. Desejo de transcendência e ]
integração cósmica: em
oposição aos limites do mundo
físico e material, os simbolistas
apreciam situações de viagem
interior ou cósmica, o
extravasamento e a
transcendência do mundo real.
Em virtude desta postura um
tanto escapista, foram chamados
pejorativamente de nefelibatas
(viviam nas nuvens).
Ex.:
17. Infinitos espíritos dispersos,
18. Inefáveis, edênicos, aéreos,
19. Fecundai o Mistério destes
versos
20. Com a chama ideal de todos
os mistérios.
15. 9. Interesse pelas zonas profundas
da mente e pela loucura:
interesse em explorar zonas até
então desconhecidas da
mente humana (sonhos,
alucinações), que começava a
ser desvendada pelos estudos
sobre a psicanálise,
desenvolvidos por Sigmund
Freud.
21. Do Sonho as mais azuis dia
diafaneidades
22. Que fuljam, que na Estrofe se
levantem
23. E as emoções, todas as
castidades
24. Da alma do Verso, pelos versos
cantem.
16.
17. 10. Atração pela morte e por
elementos decadentes da
condição humana: exploração
de temas macabros e
satânicos, ambientes noturnos
e misteriosos.
41. Tudo! vivo e nervoso e quente e
forte,
42. Nos turbilhões quiméricos do
Sonho,
43. Passe, cantando, ante o perfil
medonho
44. E o tropel cabalístico da Morte...
19. Cruz e Sousa
O maior poeta simbolista brasileiro, nasceu
em Desterro(atual Florianópolis). Seus pais eram
escravos negros.
Todo o período catarinense de Cruz e Sousa foi
marcado pelo combate ao preconceito racial de
fora vítima em tantas ocasiões.
As tragédias pessoais vão marcando a vida do
poeta: o mísero reconhecimento artístico, a
morte do pai, a morte de dois filhos, a loucura
de esposa e a tuberculose.
Foi morar na pequena estação de Sítio (MG), onde
morreu.
Seu corpo foi levado para o Rio, sem caixão, num
vagão de carga que transportava animais.
21. • Sua obra expressa o sentido trágico da
existência.
Entretanto, nota-se em seus versos uma
evolução importante, que vai do
subjetivismo e angústia individuais a valores
mais universais; do sofrimento homem para o
sofrimento e angústia do ser humano. E a
chamada metafísica do sofrimento. Observe:
Meu Filho
Nesse ambiente de amor onde dormes teu sono,
Não sentes nem sequer o mais ligeiro espectro..
Mas, ah! eu vejo bem, sinistra sobre o trono,
A Dor, a eterna Dor, agitando o seu cetro!
22. • Poesia de sublimação:
anulação da matéria para a liberação de
uma profunda espiritualidade. Comprove
isso no próximo poema:
Siderações
Para as Estrelas de cristais gelados
As ânsias e os desejos vão subindo,
Galgando azuis e siderais noivados
De nuvens brancas a amplidão vestindo...
23. • Erotismo sensual/espiritual, que
demonstra angústia sexual. Observe:
Selos (IV)
Oásis brancos e miraculosos
Das frementes volúpias pecadoras
Nas paragens fatais, aterradoras
Do Tédio, nos desertos tenebrosos...
(...)
Ó selos virginais, tálamos vivos,
Onde do amor nos êxtases lascivos
Velhos faunos febris dormem sonhando...
24. • Misticismo indefinido em vários versos,
observamos um Cruz de Sousa cravejando
sua poesia de símbolos religiosos do culto
católico e a figura de anjos.
Já em outros, há referências às trevas,
menção a demônios e ao inferno.
A Flor do Diabo
Branca e floral como um jasmim do Cabo
Maravilhosa ressurgiu um dia
A fatal Criação do fulvo Diabo,
Eleita do pecado e da Harmonia.
25. • Obsessão pela cor branca e
tudo que sugere brancura:
Ó Formas alvas, brancas , Formas claras
De luares, de neves,de neblinas!...
Ó Formas vagas, fluidas, cristalinas...
Incensos dos turíbulos das aras...
26. • Cromatismo: Geralmente,
cada cor em seus poemas
possui um valor semântico;
o destaque vai — além do
branco — para o azul, que
nos poemas de Cruz e Sousa
representa o indecifrável, o
infinito.
27. • Grande rigor formal e o
vocabulário erudito:
Em seus versos, há métrica, rimas
e outros recursos de versificação.
Há intenso artesanato do verso e
a escolha vocabular apurada. E
a influência da poesia
parnasiana sobre o estilo do
autor.
28. • Metalirismo: Principalmente em
Broquéis, há alguns poemas que se
referem mais ou menos incisivamente,
em maior ou menor amplitude — à
própria produção artística,
evidenciando as concepções poéticas
de Cruz e Sousa.
O poema “Antífona”, apresentado no
início desta aula, exemplifica o
metalirismo presente em Cruz e Sousa.
29. Alphonsus do Guimaraens
* Alphonsus de Guimaraens nasceu em
Ouro Preto (MG).
* Iniciou a poesia aos 17 anos .
* Compunha versos para sua
noiva Constança, a qual acabou
morrendo de tuberculose.
* Alphonsus estudou Direito em São
Paulo.
* Terminou o curso em Ouro Preto.
* Casou-se, teve 14 filhos e levou uma
vida bastante reclusa, a ponto de ser
apelidado de o “Solitário de Mariana”,
cidade onde morreu.
31. Alphonsus de Guimaraens demonstra
características simbolistas:
a sugestão, a musicalidade e o desejo de
transcendência.
Quanto à temática, o amor, a religiosidade e o
escapismo são bastante freqüentes em sua obra.
O traço marcante de Alphonsus vem ser a
descrição idealizada da mulher, normalmente
uma virgem inacessível tragada pela morte —
talvez a herança do desgosto pela perda da
noiva Constança.
*Quanto à religiosidade, percebemos em seus
versos um eu-lírico completamente rendido à fé e
aos motivos católicos.
32. Ismália
Quando Ismália enlouqueceu,
Pôs-se na torre a sonhar...
Viu uma lua no céu,
Viu outra lua no mar.
No sonho em que se perdeu,
Banhou-se toda em luar..
Queria subir ao céu,
Queria descer ao mar...
E, no desvario seu,
Na torre pôs-se a cantar..
Estava perto do céu,
Estava longe do mar..
33. Hão de Chorar por ela os Cinamomos...
Hão de chorar por ela os cinamomos,
Murchando as flores ao tombar do dia.
Dos laranjais hão de cair os pomos,
Lembrando-se daquela que os colhia.
As estrelas dirão: — “Ai! nada somos,
Pois ela se morreu, silente e fria...”
E pondo os olhos nela como pomos,
Hão de chorar a irmã que lhes sorria.
A lua, que lhe foi mãe carinhosa,
juntos?”
34. Augusto do anjos: um caso à
parte
Pertencente a uma família poderosa de proprietários de engenho, Augusto
nasceu no interior da Paraíba. Formou-se em Direito em Recife (PE) em
1907, mas a profissão que exerceu foi a de professor de literatura. Em
1910, recém-casado, foi tentar a vida no Rio de Janeiro, também dando
aulas de Literatura. Situação financeira difícil, algumas tragédias na família
(seu primeiro filho nasce morto) e nada de reconhecimento
à sua obra. Lança seu único livro de poesias, intitulado
Eu, em 1912, recebido com enorme repulsa por parte
da crítica mais conservadora. Em 1914, foi nomeado
diretor de um grupo escolar em Leopoldina (MG),
onde passou os seus últimos dias, falecendo em
virtude de uma forte gripe. Morreu em condição
financeira desfavorável e sem ter recebido o devido
reconhecimento pela sua obra poética.
36. • seus poemas apresentam o rigor formal e o apuro técnico
típicos do Parnasianismo;
• sua poesia constantemente tematiza os aspectos decadentes
da condição humana, o viver doloroso, numa linguagem
bastante simbólica, melódica e sugestiva, características que se
configuram como próprias ao Simbolismo;
• a visão pessimista a respeito da sociedade e da condição
humana demonstra alguns pontos de contato com o Realismo
propriamente dito;
• a utilização de um vocabulário cientificista,
repleto de termos considerados não-poéticos —
tais como: amoníaco, escarro, vermes, mamífero,
malacopterígios,flamívomos, Zooplasma, ... — faz-nos lembrar
o Naturalismo. A propósito: esse vocabulário tão inusitado
torna inconfundíveis os poemas de Augusto dos Anjos.
• a deformação radical da realidade, o traço grotesco, violento e
hiperbólico assemelham-se essencialmente ao Expressionismo,
vanguarda artística de que, curiosamente, Augusto não tinha
conhecimento;
37. Psicologia de um Vencido
Eu, filho do carbono e do amoníaco,
Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigênese da infância,
A influência má dos signos do zodíaco
Profundissimamente hipocondríaco,
Este ambiente me causa repugnância...
Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia
Que se escapa da boca de um cardíaco.
Já o verme — este operário das ruínas —
Que o sangue podre das carnificinas
Come, e à vida em geral declara guerra,
Anda a espreitar meus olhos para roê-los,
E há-de deixar-me apenas os cabelos,
Na frialdade inorgânica da terra!