A febre tifóide é uma doença infecciosa causada pela bactéria Salmonella typhi, caracterizada por febre prolongada e alterações intestinais. É transmitida principalmente pela ingestão de água ou alimentos contaminados e afeta com mais frequência países em desenvolvimento com saneamento inadequado. Os sintomas incluem febre, dor de cabeça, vômitos e diarreia ou constipação. Sem tratamento, pode levar à confusão mental e óbito.
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Febre Tifóide: Transmissão, Riscos e Manifestações
1. Febre tifóide
Terezinha Marta P.P. Castiñeiras, Luciana G. F. Pedro & Fernando S. V. Martins
A febre tifóide é uma doença infecciosa potencialmente grave, causada por uma
bactéria, a Salmonella typhi. Caracteriza-se por febre prolongada, alterações do trânsito
intestinal, aumento de vísceras como o fígado e o baço e, se não tratada, confusão
mental progressiva, podendo levar ao óbito. A transmissão ocorre principalmente
através da ingestão de água e de alimentos contaminados. A doença tem distribuição
mundial, sendo mais freqüente nos países em desenvolvimento, onde as condições de
saneamento básico são inexistentes ou inadequadas.
Transmissão
A S. typhi causa infecção exclusivamente nos seres humanos. A principal forma de
transmissão é a ingestão de água ou de alimentos contaminados com fezes humanas ou,
menos freqüentemente, com urina contendo a S. typhi. Mais raramente, pode ser
transmitida pelo contato direto (mão-boca) com fezes, urina, secreção respiratória,
vômito ou pus proveniente de um indivíduo infectado.
A acidez gástrica é o primeiro mecanismo de defesa do organismo contra a S. typhi.
Quando consegue resistir à acidez do estômago, a S. typhi chega ao intestino delgado,
onde compete com as bactérias da microbiota normal do intestino. Se sobreviver, a S.
typhi invade a parede intestinal e alcança a circulação sangüínea. A presença da bactéria
no sangue determina o início dos sintomas. A S. typhi pode invadir qualquer órgão e
multiplicar-se no interior de células de defesa (células fagocíticas mononucleares),
sendo mais freqüente o acometimento do fígado, baço, medula óssea, vesícula e
intestino (íleo terminal). O tempo entre a exposição e o início dos sintomas (período de
incubação) pode variar de 3 a 60 dias, ficando entre 7 e 14 dias na maioria das vezes. A
infecção pode não resultar em adoecimento.
Uma pessoa infectada elimina a S. typhi nas fezes e na urina, independente de apresentar
ou não as manifestações clínicas. O tratamento adequado diminui o tempo de
eliminação da bactéria nas excreções humanas, que pode ser de até três meses em
indivíduos não tratados. Cerca de 2 a 5% das pessoas, mesmo quando tratadas, tornam-
se portadoras crônicas, o que é particularmente mais comum em menores de 5 anos,
idosos e mulheres com patologias biliares. Os portadores crônicos podem eliminar a S.
typhi nas fezes até por mais de um ano, tendo importância na manutenção da
transmissão da doença.
Em geral, a água contaminada tem uma baixa concentração de bactérias, resultando
numa taxa de infecção menor entre os expostos e, naqueles em que a infecção se
desenvolve, o tempo de incubação é habitualmente mais prolongado. A S. typhi pode
sobreviver em águas poluídas por até 4 semanas e é resistente ao congelamento. Não
resiste, entretanto, a temperaturas maiores que 57 oC, nem ao tratamento adequado da
água com cloro ou iodo.
Os alimentos podem ser contaminados diretamente pela água utilizada para lavá-los ou
prepará-los, através de mãos não adequadamente limpas de portadores crônicos e, mais
raramente, pela exposição aos insetos (como moscas). Embora a concentração inicial de
bactérias nos alimentos recém-contaminados possa ser insuficiente para causar doença
2. humana, sob condições ambientais favoráveis ocorre significativa multiplicação
bacteriana, resultando em grandes inóculos por ocasião da ingestão.
Riscos
A distribuição da doença é universal, porém é mais prevalente em países e regiões onde
o saneamento básico é inadequado. Estima-se a ocorrência de 12 a 33 milhões de casos
por ano no mundo, com aproximadamente 600 mil óbitos. Cerca de 60% dos casos
notificados ocorre na Ásia e 35% na África. Nos países desenvolvidos ocorrem apenas
surtos ocasionais de febre tifóide. Nos países em desenvolvimento, principalmente no
subcontinente Indiano, sudeste Asiático, África, América Central e do Sul, a doença é
endêmica. No Brasil, são registrados casos em todas as Regiões do país, principalmente
no Norte e Nordeste. Nos últimos dez anos, a Bahia (1.765) e o Amazonas (1.447) são
os Estados com o maior número de casos.
Febre tifóide no Brasil.
Casos confirmados, por local de transmissão: 1996 - 2005
Região 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 Total
Norte 306 475 245 264 413 323 500 410 323 157 3.416
Nordeste 982 460 219 449 416 346 297 419 216 200 4.004
Sudeste 22 34 29 21 32 17 23 21 23 35 257
Sul 21 20 20 19 12 19 25 20 10 5 171
Centro-Oeste 27 7 10 4 8 0 6 3 3 0 68
Ignorado 0 0 0 0 5 0 0 0 0 0 5
Total 1.358 996 523 757 886 705 851 873 575 397 7.921
* dados sujeitos à revisão.
Fonte: Ministério da Saúde - Secretaria de Vigilância em Saúde, 2006.
O risco durante viagens depende do roteiro, das condições de estada e da história clínica
do viajante. Indivíduos com diminuição da acidez gástrica, gastrectomizados, portadores
de doenças crônicas intestinais ou imunodeficientes têm um risco maior de adquirir a
febre tifóide. O uso de antibiótico também aumenta a susceptibilidade à doença, pois
altera a microbiota intestinal que normalmente compete com as bactérias patogênicas. O
consumo de alimentos como leite, manteiga, queijo e peixes são considerados de alto
risco, pois possuem o pH ideal (4,4 a 7,8) para o crescimento da S. typhi.
Nos países desenvolvidos, com saneamento adequado, o risco de aquisição da febre
tifóide é significativamente menor. Na maioria dos casos diagnosticados, a infecção
ocorreu durante estada em outros locais (casos importados) com estrutura sanitária
precária. É possível, entretanto, a ocorrência de casos associados à fonte alimentar, visto
que uma parcela não desprezível dos alimentos consumidos nos países desenvolvidos
origina-se de outras regiões e podem ser contaminados na origem ou durante o preparo,
se não houver higiene adequada. Nos países em desenvolvimento, além de risco
relacionado aos alimentos ser mais elevado (origem e preparo), a inexistência ou o
tratamento inadequado de esgotos favorece a contaminação dos reservatórios de água
para consumo. A identificação de S. typhi resistente a vários antibióticos,
principalmente no Subcontinente indiano, está ocorrendo com freqüência crescente. A
emergência de bactérias resistentes dificulta o tratamento, aumentando a letalidade e a
disseminação da doença.
Medidas de proteção individual
3. Os viajantes que se dirigem para uma área onde exista risco de febre tifóide devem
adotar as medidas de proteção para evitar doenças transmitidas através da ingestão de
água e alimentos. O consumo de água tratada e o preparo adequado dos alimentos são
medidas altamente eficazes. A seleção de alimentos seguros é crucial. Em geral, a
aparência, o cheiro e o sabor dos alimentos não ficam alterados pela contaminação com
agentes infecciosos. O viajante deve alimentar-se em locais que tenham condições
adequadas ao preparo higiênico de alimentos. A alimentação na rua com vendedores
ambulantes constitui um risco elevado. Os alimentos mais seguros são os preparados na
hora, por fervura, e servidos ainda quentes.
O Cives não recomenda a vacinação sistemática contra a febre tifóide. Em 2008 foi
liberada e pode ser encontrada no Brasil a vacina injetável contra febre tifóide (não
disponível nos Centros Municipais de Saúde). As vacinas disponíveis apresentam baixa
eficácia e foram melhor testadas em indivíduos que vivem em áreas endêmicas, o que
não permite avaliar de forma inequívoca sua eficácia em viajantes. A vacina injetável
tem eficácia entre 50 e 70%. A vacina oral contra a febre tifóide, tem eficácia entre 40 e
90% e não pode ser utilizada em indivíduos imunodeficientes e gestantes, uma vez que
é produzida com bactérias atenuadas. Quando o risco de infecção é muito elevado, a
utilização de uma das vacinas como medida complementar deve ser avaliada
individualmente após consulta médica.
Recomendações para áreas com risco de transmissão
Em locais onde existe saneamento básico adequado, a ocorrência de casos é apenas
episódica. A forma mais efetiva de impedir a instalação e a disseminação da febre
tifóide em uma localidade é a existência de infra-estrutura de saneamento básico
adequada. Devem ser implementadas melhorias do sistema de armazenamento e
distribuição de água tratada e a construção de redes de esgoto. A população deve
continuamente receber informações sobre a forma de transmissão da doença e como
evitá-la e ser estimulada a mudar hábitos, assegurando práticas higiênicas cotidianas,
que incluam limpeza das mãos, uso regular de sanitários, correto acondicionamento e
despejo de lixo. Cabe ainda ressaltar que o diagnóstico precoce e o tratamento adequado
ajudam a diminuir o aparecimento de novos casos.
A vacinação e o uso profilático de antibióticos são ineficazes para evitar a disseminação
dafebre tifóide. O uso indiscriminado de antibióticos aumenta o risco do surgimento de
resistência na S. typhi (e em outras bactérias intestinais), o que pode dificultar o
tratamento das formas graves. Durante as inundações não parece haver risco
significativo de epidemias, visto que o esperado é maior diluição da bactéria no meio
líquido, e a vacina contra a febre tifóide não está indicada para evitar a ocorrência de
epidemias. A profilaxia mais efetiva é feita através do tratamento correto da água e da
preparação adequada de alimentos.
Manifestações
A maioria das pessoas infectadas pela S. typhi, permanece assintomática durante o
período de incubação, usualmente 10 a 14 dias após ingestão de água ou alimentos
contaminados, embora seja possível (em 10 a 20% dos casos) a ocorrência de diarréia
transitória. Ao término deste período, coincidindo com a fase de bacteremia contínua,
4. surge a febre que inicialmente é baixa, mas torna-se progressivamente mais alta. Nesta
fase inicial, é comum a ocorrência simultânea de dor de cabeça (cefaléia intensa frontal
ou difusa), dores pelo corpo, dor no abdome, fadiga, perda de apetite, náuseas e
alteração do trânsito intestinal, manifesta por diarréia ou constipação ("prisão de
ventre") intestinal. É também freqüente a queixa de dor de garganta transitória e, por
vezes, o surgimento de tosse seca.
Ao final da primeira semana é possível, numa parcela significativa de doentes, detectar
o aumento do baço e do fígado e a febre, já elevada, tende a torna-se contínua e assim
se manter ao longo da segunda semana, que é marcada por intensificação da fadiga e da
prostração. O surgimento de manchas róseas no tórax (roséola tífica) pode ser
observado mais facilmente nos indivíduos de pele clara. Em 10 a 25% dos casos, as
manifestações neuropsiquiátricas tornam-se progressivamente exuberantes, incluindo
desorientação, delírio, rigidez de nuca, crises convulsivas e mais raramente estupor e
coma.
Se não tratada, a doença pode evoluir por semanas ou até meses, resultando em óbito
em 15% dos acometidos. Na maioria, no entanto, ocorre defervecência a partir da
terceira semana, com retorno da temperatura a normalidade na quarta semana, quando
parte dos infectados recuperam-se. Ressalta-se que, na ausência de tratamento
específico, as recaídas são comuns.
Complicações (perfuração intestinal, hemorragia) decorrentes das lesões causadas pela
S. typhi na mucosa intestinal podem ocorrer em qualquer fase da doença, sendo mais
comum após a terceira semana e em pessoas não tratadas. O sangramento intestinal é a
complicação mais comum e resulta da erosão da parede intestinal pela S. typhi. Na
maioria das vezes, o sangramento é pequeno e cessa espontaneamente. A perfuração
intestinal, que ocorre em até 3% das pessoas internadas, é uma complicação mais grave.
Geralmente, se manifesta com piora da dor abdominal, aumento da freqüência cardíaca
e queda da pressão arterial. O tratamento é cirúrgico e deve ser realizado
imediatamente.
A febre tifóide tende a ser mais grave em pessoas que permaneceram doentes por tempo
mais prolongado, em desnutridos, em imunodeficientes, em portadores de doenças da
vesícula biliar e em indivíduos com certas características genéticas. Adicionalmente,
peculiaridades da cepa infectante e a quantidade (inóculo) de bactérias ingeridas podem
influenciar a apresentação e evolução clínica.
As manifestações da febre tifóide, especialmente na primeira semana de doença, podem
ser semelhantes a de outras doenças febris como a malária. Mesmo que tenham história
de risco para febre tifóide, pessoas que estiveram em uma área de transmissão de
malária, e que apresentem febre, durante ou após a viagem, devem ter essa doença
investigada. À medida que a febre tifóide progride, é mais facilmente confundível com
infecções que podem ter evolução lenta como a endocardite bacteriana, a tuberculose
ou, ainda, com as doenças de natureza auto-imune, como o lupus eritematoso sistêmico.
A confirmação do diagnóstico de febre tifóide é feita através de isolamento da bactéria
em cultivo, feito geralmente a partir de sangue, fezes, urina ou biopsia das lesões de
pele. O cultivo do aspirado de medula óssea é menos utilizado, a despeito do elevado
rendimento, pois a obtenção do material traz desconforto para o doente, mas pode ter
seu uso justificado nos casos mais graves e com diagnóstico mais difícil. O isolamento
de amostras da bactéria é fundamental, pois torna possível determinar a sua
susceptibilidade aos antimicrobianos.
Tratamento
5. O tratamento da febre tifóide consiste basicamente em antibióticos e reidratação. Nos
casos leves e moderados, o médico pode recomendar que o tratamento seja feito em
casa, com antibióticos orais. Os casos mais graves devem ser internados para hidratação
e administração venosa de antibióticos. Sem tratamento antibiótico adequado, a febre
tifóide pode ser fatal em até 15% dos casos.