O documento discute a evolução do conceito de cidadania ao longo da história, desde a Grécia Antiga e Roma, passando pela Idade Média e época moderna. Aponta que cidadania deixou de ser apenas o direito de voto e passou a incluir também direitos sociais, econômicos e a participação política. Argumenta que cidadania e direitos humanos estão intimamente ligados, uma vez que a garantia dos direitos humanos é essencial para o pleno exercício da cidadania.
2. O conceito de cidadania se renova constantemente diante das transformações
sociais, do contexto histórico vivenciado e principalmente diante da mudança de
paradigmas ideológicos. Por tal razão é possível afirmar que cidadania não é uma
idéia estática, mas dinâmica. Neste sentido, destaca-se:
3. O conceito contemporâneo de cidadania se estendeu em direção a uma
perspectiva na qual cidadão não é apenas aquele que vota, mas aquela pessoa
que tem meios para exercer o voto de forma consciente e participativa.
Portanto, cidadania é a condição de acesso aos direitos sociais (educação,
saúde, segurança, previdência) e econômicos (salário justo, emprego) que
permite que o cidadão possa desenvolver todas as suas potencialidades,
incluindo a de participar de forma ativa, organizada e consciente, da
construção da vida coletiva no Estado democrático
4. A cidadania conhecida na antiguidade clássica não é a mesma cidadania por que
lutamos hodiernamente e a que almejamos concretizada nas gerações futuras.
De há muito cidadania deixou de ser simplesmente o direito de votar e ser
votado. Cidadania é muito mais que isto. É ter educação de qualidade, saúde,
informação, poder de participação na condução das políticas públicas e
igualdade de oportunidades.
5. As transformações históricas da Cidadania
A palavra “cidadania” provém do latim civitatem que significa cidade. Isto nos
remete a expressão grega polis, cidades-estados antigas; tipo de organização a
que é atribuído, pela maioria dos historiadores, o conceito tradicional de
cidadania. Nesta fase cidadania se restringia à participação política de
determinadas classes sociais. Cidadão era o que morava na cidade e participava
de seus negócios
6. Não é incorreto afirmar que na Grécia antiga, cidadania era confundida com o
próprio conceito de naturalidade, visto que cidadãos eram somente os nascidos
em solo Grego e só esses podiam exercer e usufruir dos direitos políticos. E
assim era devido ao regime aristocrático dominante.
O mesmo ocorria em Roma, onde se via claramente a exclusão dos romanos não
nobres e de estrangeiros, que não detinham nenhuma espécie de direitos.
7. Na Idade Média, com o advento das mudanças trazidas pelo feudalismo logo no
primeiro período, isto é, o que sucedeu à queda do Império Romano, a
preocupação política cedeu espaço à questão religiosa e a idéia de cidadania
foi relegada a segundo plano. A sociedade de estamentos apresentava uma
organização que incluía a nobreza, o clero e os camponeses, tendo referidas
classes direitos e privilégios distintos.
8. Tal situação só se modificou com o surgimento dos estados nacionais. Neste
período denominado historicamente como Baixa Idade Média, reaparece a
noção de estado centralizado e com ele a clássica visão da cidadania, ligada
aos direitos políticos.
9. Contudo, as mudanças sociais advindas das novas necessidades materiais aliada
ao fenômeno da cristianização passou a exigir uma reformulação do conceito de
cidadania que já não atendida às demandas, surgindo daí a semente do ideal de
igualdade.
Com o iluminismo vivenciamos um período de transição e de transformações
políticas, econômicas, artísticas, contribuindo também para o despertar do
ideal de liberdade.
10. Movidos por esta chama filósofos como Locke e Rousseau defenderam a
democracia liberal, distante do direito divino e que tinha por base a razão.
Merece destaque as idéias de Rousseau que preconizava ainda um caráter
universal para os direitos. Muito influenciaram essas ideias nas lutas políticas
da época, sendo alicerce para os movimentos de independência de colônias
americanas e de revoluções tais como a Francesa e a Inglesa. Entretanto, neste
período, diante do fato de que a sociedade ideal apontava desigualdades
sociais, a cidadania também foi tolhida, de certa forma, de seu sentido mais
amplo.
11. Os séculos XIX e XX foram responsáveis por progressos significativos que
repercutiram no conceito de cidadania.
A Revolução Francesa e a Revolução Americana inseriram no contexto mundial
um novo tipo de Estado, carregando consigo os ideais de liberdade e igualdade
e embora tivessem uma origem burguesa auxiliaram na busca pela inclusão
social. Aliado a tudo isto despontavam as lutas sociais. A cidadania passa, por
fim, a manter íntima vinculação com o relacionamento entre a sociedade
política e seus membros.
12. As duas guerras mundiais foram decisivas para a mudança de ideologia sobre a
cidadania e o medo advindo das atrocidades praticadas e alicerçadas pela
legalidade fez com que órgãos internacionais e a própria sociedade civil
passassem a entender cidadania como algo indissociável dos direitos humanos.
13. O conceito de cidadania passou a ser vinculado não apenas à participação
política, representando um direito do indivíduo, mas também o dever do Estado
em ofertar condições mínimas para o exercício desse direito, incluindo,
portanto, a proteção ao direito à vida, à educação, à informação, à
participação nas decisões públicas.
14. Mesmo diante de todos estes avanços ainda hoje se percebe as inúmeras
violações aos direitos humanos e a ausência de cidadania plena a considerável
parcela da população que se diz excluída, em especial, nos países
subdesenvolvidos e emergentes.
15. Podemos assim, abeberando-nos da lição de Norberto Bobbio, assegurar que a
cidadania é uma luta diária, e que hoje não basta apenas elencar e
fundamentar direitos é preciso efetivá-los. Este é o desafio de nosso tempo.
Para tanto, a informação é instrumento indispensável nesta empreitada,
porque somente conhecendo seus direitos é que o cidadão terá condições para
reivindicá-los. Daí o papel fundamental da educação, a mais fecunda de todas
as todas as medidas financeiras, nas palavras de Rui Barbosa.
16. A Inter-relação entre Cidadania e Direitos
Humanos
Vimos ao longo da história que cidadania e direitos humanos se interligaram de
tal maneira que hoje é incabível dissociá-los.
A noção de cidadania sempre esteve voltada para um agir, para uma conduta
positiva de participação. Já os direitos humanos, considerados como direitos
básicos, direitos fundamentais internacionalizados, foram vistos em
determinadas épocas apenas como direitos negativos (função de defesa), outras
como direitos positivos (função de prestação) e atualmente como direitos que
exigem do Estado condutas positivas e negativas (direito de participação).
17. A partir do momento que a cidadania deixou de ser vista restritivamente
passando a garantir ao cidadão o direito de exigir do Estado condutas negativas
e positivas, isto é, a implementação dos direitos fundamentais individuais e
sociais, tornou-se intimamente ligada aos direitos humanos.
É cediço que ambos são direitos a serem conquistados, são frutos de um
processo histórico, de conquistas, avanços e mudança de comportamento, não
podendo ser entendidos como direitos subjetivos inerentes aos indivíduos.
18. Os direitos humanos nada mais são que os direitos fundamentais da pessoa
humana. São necessários como forma de garantir a participação plena na vida
social. Aí se encontra o elo que liga os conceitos de cidadania aos direitos
humanos. Se considerarmos que cidadania é o direito de participação na
sociedade e que para seu efetivo exercício deve o cidadão ser resguardado de
direitos básicos, tais como a vida, a moradia, a educação, a informação, dentre
outros e considerando que estes direitos são direitos básicos de qualquer ser
humano, logo podemos concluir que a violação de direitos humanos redunda em
prejuízo ao pleno exercício da cidadania.
19. Assim como a cidadania, os direitos humanos também foram se consolidando no
decorrer da história, envolto nas concepções ideológicas do Estado Liberal, do
Estado Social ou da providência e mais recentemente no Estado Democrático de
Direito.
Após a 2ª Guerra Mundial, e diante dos horrores provocados pelo holocausto,
grande marco de desrespeito ao valor dignidade da pessoa humana, os direitos
humanos ganharam força. Isto culminou na criação da Organização das Nações
Unidas e em sequentes tratados de Direitos Humanos a destacar a Declaração
Universal dos Direitos do Homem.
20. Embora não seja um documento que apresente força obrigatória serviu de base
a outros tratados que também foram responsáveis por avanços significativos: o
Tratado Internacional dos Direitos Civis e Políticos e o Tratado Internacional dos
Direitos Econômicos, Sociais e Culturais.
Seu preâmbulo nos demonstra de forma clara o sentimento que predominava no
contexto histórico da época, reconhecendo dignidade a todas as pessoas. Assim,
verifica-se o resgate do valor dignidade humana, sendo este o sentido maior da
referida Declaração.