O documento discute a violência contra a mulher e o papel da equipe multidisciplinar nas Varas da Violência Doméstica. Apresenta dados sobre violência doméstica no Brasil e no Espírito Santo. Também descreve a atuação das Centrais de Apoio Multidisciplinar e dos profissionais de serviço social e psicologia nesses casos.
2. “A contribuição da equipe
multidisciplinar nas varas
da Violência Doméstica”
Thamires dos Santos Ratis
Assistente Social - TJES
3. Violência
A violência é o uso intencional de força física ou do poder, real ou em ameaça, contra si
próprio, contra outra pessoa, ou contra um grupo ou uma comunidade que resulte ou
tenha possibilidade de resultar em lesão, morte, dano psicológico, deficiência de
desenvolvimento ou privação (OMS, 2002).
Tipos: Autoinfligida, Interpessoal ou Coletiva.
Quanto à natureza: Física, psicológica/moral, sexual, negligência, Econômica/
Financeira/ Patrimonial e institucional.
4. Violência Doméstica como questão de
Gênero
A violência doméstica e familiar é a espécie de violência contra a mulher que ocorre,
predominantemente, no âmbito doméstico e/ou familiar.
Decorre da desigualdade nas relações de poder entre homens e mulheres, bem como da
discriminação de gênero ainda presente tanto na sociedade como na família
(CAVALCANTI, 2009).
Sua origem no Brasil está relacionada à formação patriarcal, sexista, homofóbica,
intolerante e escravista-capitalista herdada da coroa portuguesa.
5. Feminilidade e Masculinidade
Feminilidade - é o conjunto de ideias que se costuma atribuir às mulheres por pertencerem
ao sexo feminino, e nisso podemos incluir a passividade, a sensibilidade, a compreensão, a
delicadeza etc.
Masculinidade - reúne características em torno dos homens, que se justificariam pelo fato
de pertencerem ao sexo masculino, como a agressividade, dominação, insensibilidade etc.
Ser homem é ser violento?
Masculinidade e Machismo são sinônimos?
6. Porque falar sobre violência contra a mulher?
Segundo a pesquisa “Violência contra a mulher: o jovem está ligado?” (Data
Popular/Instituto Avon, 2014):
• um terço das mulheres já foi xingada ou impedida de usar determinada roupa;
• 40% declaram que o parceiro tentou controlá-las por meio de ligações telefônicas para
saber onde e com quem estavam;
• 53% das jovens já tiveram mensagens ou ligações no celular vasculhadas;
• Uma em cada três jovens também já foi proibida de conversar virtualmente com
amigos, sofreu invasão da conta de alguma das redes sociais utilizadas e até mesmo
amizades virtuais foram excluídas pelo parceiro;
7. • 51% também declaram compartilhar a senha do celular, 46% fazem o mesmo com a
chave de acesso às contas de Facebook e 34% já repassaram os caracteres de
identificação de seus e-mails pessoais em um relacionamento;
• 37% das jovens que responderam à pesquisa também afirmam ter tido relação sexual
sem preservativo por insistência do parceiro, o que ajuda a explicar o crescimento da
contaminação pelo HIV e outras doenças sexualmente transmissíveis entre jovens;
• 51% já sofreram ameaças, foram seguidas pelo ex, ou este ficou enviando mensagens
ou ainda espalhando boatos sobre a mulher;
• Quase metade das entrevistas declararam que tiveram que tomar alguma atitude para
cortar contato com o ex, incluindo deixar de frequentar lugares onde iam regularmente,
mudar o número do celular, parar de usar redes sociais e até mesmo mudar de telefone
residencial ou endereço ou local de trabalho. Apenas 2% declaram ter registrado
boletim de ocorrência.
8. Segundo o Mapa da Violência 2015 – Homicídio de Mulheres (produzido pela Flacso -
Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais):
• A taxa de homicídios contra mulheres no Brasil aumentou 8,8% entre 2003 e 2013.
Entre 1980 e 2013 foram assassinadas 106.093 mulheres, 4.762 só em 2013.
• 50,3% das mortes violentas de mulheres no Brasil são cometidas por familiares. Desse
total, 33,2% são parceiros ou ex-parceiros.
• No período estudado, em média, 11 mulheres foram assassinadas no Brasil todos os
dias. Mais da metade delas, 55%, eram negras.
O Brasil é o quinto país mais violento para mulheres em um ranking de 83 nações que
usa dados da OMS (Organização Mundial de Saúde)
9. Meios utilizados (%) nos homicídios, por sexo. Brasil. 2013
Local da agressão (%), por sexo. Brasil. 2013
Meio/instrumento Fem. Masc.
Estrangulamento/sufocação 6,1 1,1
Arma de Fogo 48,8 73,2
Cortante/penetrante 25,3 14,9
Objeto contundente 8,0 5,1
Outros 11,8 5,7
Total 100,0 100,0
Local Fem. Masc.
Estabelecimento saúde 25,2 26,1
Domicílio 27,1 10,1
Via pública 31,2 48,2
Outros 15,7 15,0
Ignorado 0,8 0,7
Total 100,0 100,0
10. Espírito Santo
Entre 2003 e 2013, o número de vítimas do sexo feminino passou de 3.937 para 4.762,
incremento de 21,0% na década. Essas 4.762 mortes em 2013 representam 13
homicídios femininos diários.
No ordenamento dos 100 municípios com mais de 10.000 habitantes do sexo feminino,
com as maiores taxas médias de homicídio de mulheres (por 100 mil). Brasil. 2009-
2013, Pinheiros aparece em 11º lugar, a Serra em 14º lugar e Linhares em 42º.
Espírito Santo está entre as unidades da federação com maiores taxas de homicídios de
negras.
Comparação das taxas de homicídio de mulheres (por 100 mil) nas UFs e em suas
respectivas capitais. Brasil. 2013
UF TAXA POSIÇÃO CAPITAL TAXA POSIÇÃO
ES 9,3 2º VITÓRIA 11,8 1º
11.
12. Lei Maria da Penha
A Lei 11.340/06, ou Lei Maria da Penha, cria mecanismos para coibir a Violência
Doméstica e Familiar contra a Mulher. Trata-se de uma normativa que traz no seu bojo a
questão da relação de gênero. A referida lei foi criada na busca de respostas para o
enfrentamento da violência que atinge não só as mulheres, mas também crianças,
adolescentes. Foi fruto de lutas da sociedade e movimentos sociais, especialmente o
movimento feminista.
13. O conceito de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, está expresso em seu
artigo 5°, que a define como qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause
morte, lesão, sofrimento físico, sexual, ou psicológico e dano moral ou patrimonial.
Ressalta-se que para configurar Violência Doméstica a situação baseada na relação de
gênero deve ocorrer nas hipóteses contidas nos incisos I, II e III do referido artigo,
descritas a seguir:
I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de
convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as
esporadicamente agregadas;
II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por
indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais,
por afinidade ou por vontade expressa;
III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha
convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.
No parágrafo único do mesmo artigo coloca-se que essas relações pessoais independem
de orientação sexual, o que demonstra grande avanço na legislação a garantir a
aplicabilidade da Lei em casos envolvendo homossexuais, lésbicas e transexuais.
14. A violência aconteceu e agora?
Para denunciar a violência deve-se procurar as delegacias ou o Ministério Público de sua
cidade.
Os artigos 10, 11 e 12 da Lei n. 11.340/06 estabelecem as providências que devem ser
adotadas pela autoridade policial.
Medidas protetivas e de urgência:
Medidas protetivas de urgência relativas ao agressor (art.22):
Exemplos: Afastamento do lar, proibição de contato ou aproximação com a ofendida,
prestação de alimentos aos filhos.
Medidas Protetivas de urgência aplicadas à ofendida (art. 23):
Exemplos: Encaminhamento da ofendida a programas de proteção ou atendimento;
pedido de separação de corpos.
Medidas de proteção ao patrimônio da ofendida (art. 24):
Exemplos: Restituição de bens indevidamente subtraídos; suspensão de procurações
conferidas pela ofendida ao agressor.
15. TÍTULO V
DA EQUIPE DE ATENDIMENTO MULTIDISCIPLINAR
Art. 29. Os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher que vierem a ser
criados poderão contar com uma equipe de atendimento multidisciplinar, a ser integrada
por profissionais especializados nas áreas psicossocial, jurídica e de saúde.
Art. 30. Compete à equipe de atendimento multidisciplinar, entre outras atribuições que
lhe forem reservadas pela legislação local, fornecer subsídios por escrito ao juiz, ao
Ministério Público e à Defensoria Pública, mediante laudos ou verbalmente em audiência, e
desenvolver trabalhos de orientação, encaminhamento, prevenção e outras medidas,
voltados para a ofendida, o agressor e os familiares, com especial atenção às crianças e aos
adolescentes.
16. As Centrais de Apoio Multidisciplinar
Centrais de Apoio Multidisciplinar das Zonas Judiciárias são formadas por profissionais
de Serviço Social e Psicologia para atenderem demandas oriundas das Varas de Família
e das Varas Especializadas em Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e no
interior do Estado, também, as demandas das Varas da Infância e da Juventude.
As centrais de apoio multidisciplinar - CAM surgem no sentido de dar celeridade ao
atendimento das questões referentes à família e a violência doméstica, imprimindo
maior qualidade aos serviços prestados pelos (as) profissionais de Serviço social e
psicologia, na perspectiva de ampliação do acesso à justiça.
17. DAATRIBUIÇÃO DA EQUIPE TÉCNICA
Assistente social
Atender determinações judiciais relativas à prática do Serviço Social, em conformidade
com a legislação que regulamenta a profissão e o Código de Ética Profissional.
Realizar estudo social ou perícia social, com a finalidade de subsidiar ou assessorar a
autoridade judiciária no conhecimento dos aspectos socioeconômicos, culturais,
interpessoais, familiares, institucionais e comunitários, sendo assegurada a livre
manifestação do ponto de vista técnico.
Emitir laudos técnicos, pareceres e resposta a quesitos, por escrito ou verbalmente em
audiências;
Atender crianças, adolescentes e adultos envolvidos nos processos, bem como os
encaminhar, quando necessário, para atendimento especializado, na rede pública
ou privada existente;
Prestar informações aos usuários sobre o atendimento específico realizado pelo Juizado
Especial de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher,
orientando e procedendo os devidos encaminhamentos
Realizar atendimento social às mulheres vítimas de violência doméstica e familiar, bem
como aos agressores, no decorrer dos trâmites processuais;
18. DA ATRIBUIÇÃO DA EQUIPE TÉCNICA
Psicologia
Proceder a avaliação de crianças, adolescentes e adultos, elaborando o estudo
psicológico, com a finalidade de subsidiar ou assessorar a autoridade judiciária no
conhecimento dos aspectos psicológicos de sua vida familiar, institucional e
comunitária, para que o magistrado possa decidir e ordenar as medidas cabíveis;
Exercer atividades no campo da psicologia jurídica, realizando entrevistas psicológicas,
individuais, em grupo, de casal e família, além de devolutivas; aplicar técnicas
psicométricas e projetivas, observação lúdica de crianças, crianças/pais, para
compreender e analisar a problemática apresentada, elaborando um prognóstico; propor
procedimentos a serem aplicados;
Aplicar técnicas de orientação, aconselhamento individual, casal e de família;
Fornecer subsídios por escrito (em processo judicial) ou verbalmente (em audiência),
emitir laudos, pareceres e responder a quesitos;
Desenvolver um trabalho de prevenção e controle da violência intra e extra familiar,
institucional contra crianças e adolescentes e mulheres vítimas de violência;
19. Matérias atendidas pela CAM
colocação em família substituta; suspensão e extinção do poder familiar; habilitação para
adoção;
destituição de tutela;
pedido de guarda e responsabilidade; pedidos de modificação de guarda; regulamentação e
revisional de visitas; busca e apreensão;
divórcio; reconhecimento e dissolução da união estável; revisão de alimentos;
alienação parental
pedidos de interdição cumulado com pedido de nomeação de curador; remoção de
dispensa de curador;
Internação compulsória;
medida protetiva- Lei Maria da Penha;
ação penal- Lei Maria da Penha
20. A Rede de Proteção à mulher em situação
de violência
Para atuar no enfrentamento a violência doméstica, as palavras de ordem são
articulação e trabalho em rede, no sentido de trabalhar com uma política pública que
englobe prevenção, assistência e atendimento às vítimas de violência. As consequências
das situações de violência vividas por mulheres, crianças e adolescentes geram grandes
impactos na saúde pública e demais políticas sociais.
21. Rede de proteção
Delegacias Especializadas no Atendimento à Mulher (DEAMs);
Juizados/Varas especializadas;
Casas-Abrigo;
Centros de Referência de Atendimento à Mulher;
Órgãos da Defensoria Pública
Serviços de saúde;
Equipamentos de Assistência social;
Escolas;
22. Ônibus Rosa - Juizado Itinerante da Lei
Maria da Penha
Iniciativa da Coordenadoria de Enfrentamento à Violência Doméstica contra a Mulher
do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo (TJES), em parceria com órgãos e
entidades públicas;
Início dos trabalhos em 2013;
Visa principalmente alcançar os municípios onde não existem Varas Especializadas em
Violência Doméstica;
23. Botão do Pânico
O projeto é uma iniciativa do Tribunal de Justiça do Espírito Santo, por meio da
Coordenadoria de Violência Doméstica e Familiar, em parceria com a Prefeitura
Municipal de Vitória e o Instituto Nacional de Tecnologia Preventiva (INTP).
O dispositivo, que funciona por GPS, permite que a mulher emita um alerta quando o
agressor se aproxima. O áudio de toda a ameaça começa a ser gravado e a central de
monitoramento da prefeitura recebe o chamado com o endereço e os dados do agressor.
Imediatamente a Patrulha Maria da Penha – que ganhou o nome em homenagem à
mulher que batizou a lei – é enviada ao local.
O dispositivo de segurança que ajuda a proteger mulheres vítimas de violência
doméstica foi implantado originalmente em Vitória, em 2013 e já está sendo adotado
em outras cidades do Brasil.
24. Ligue 180
O Ligue 180 foi criado pela Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da
República (SPM-PR), em 2005, para servir de canal direto de orientação sobre direitos
e serviços públicos para a população feminina em todo o país (a ligação é gratuita).
Ele é a porta principal de acesso aos serviços que integram a rede nacional de
enfrentamento à violência contra a mulher, sob amparo da Lei Maria da Penha, e base
de dados privilegiada para a formulação das políticas do governo federal nessa área.
Em março de 2014, o Ligue 180 transformou-se em disque-denúncia, com capacidade
de envio de denúncias para a Segurança Pública com cópia para o Ministério Público de
cada estado.