Diabetes mellitus faculdade de medicina de botucatu unesp
1. EMV 1/23
Diabetes Mellitus
Profa
. Adja
. Walkyria de Paula Pimenta
Disciplina de Endocrinologia e Metabologia do Departamento de Clínica Médica
Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP
Definição
“Diabetes Mellitus” (DM) compreende um
grupo heterogêneo de distúrbios crônicos do
metabolismo, devido à deficiência absoluta ou
relativa de insulina.
É caracterizado por hiperglicemia nos
períodos pós-prandial e/ou de jejum que, em sua
forma mais grave, se acompanha de cetose e
proteólise.
Quando presente por períodos prolongados, o
diabetes é complicado pelo desenvolvimento de
doença dos pequenos vasos (microangiopatia),
envolvendo particularmente retina e glomérulo
renal, além de neuropatia e aterosclerose
acelerada.
Prevalência
A importância do conhecimento do DM está no
fato de ser provavelmente a doença endócrino-
metabólica mais importante no Brasil, com grande
impacto na saúde pública do país.
A prevalência de diabetes na população
brasileira, urbana, adulta (30 a 69 anos) é de
7,6%, comparável à de vários outros países,
incluindo aqueles mais desenvolvidos.
A grande maioria dos pacientes diabéticos
pertence a uma das duas classes
etiopatogênicas: diabetes mellitus tipo 1 (DMT1) e
diabetes mellitus tipo 2 (DMT2).
No Brasil, como na maioria dos outros países,
o DMT2 é o estado hiperglicêmico mais comum
dessas duas classes, constituindo cerca de 90%
dos diabéticos.
Classificação
I. Diabetes mellitus tipo 1 (destruição células β → deficiência absoluta insulina)
a) doença auto-imune (maioria)
b) idiopático
II. Diabetes mellitus tipo 2 (associação de vários graus de resistência à insulina e de deficiência insulínica)
III. Outros tipos específicos
a) Defeitos genéticos da função células β:
• Tipos de MODY; DNA mitocondrial; outros.
b) Defeitos genéticos da ação insulina:
• Resistência insulínica tipo A; diabetes lipoatrófico; outros.
c) Doenças do pâncreas exócrino:
• Pancreatites (alcoolismo); hemocromatose; fibrose cística; pancreatopatia fibrocalculosa; outras.
d) Endocrinopatias:
• Síndrome Cushing; Acromegalia; Feocromocitoma; Hipertireoidismo; Outras.
e) Induzido por drogas ou agentes químicos:
• Glicocorticóides; Agonistas β-adrenérgicos; tiazídicos; α-interferon; ácido nicotínico; difenilhidantoína; outros.
f) Associado, às vezes, a síndromes genéticas:
• Síndrome Down; Síndrome Klinefelter; Síndrome Turner; Síndrome Laurence-Moon-Biedl; Síndrome Prader-
Willi; outras.
g) Outros
IV. Diabetes mellitus gestacional (DMG) (intolerância à glicose cujo início ou reconhecimento é feito durante a gestação)
* Obs.: Alguns grupos da classe III e o DMG exigem reclassificação do indivíduo cessada a situação específica em que se encontrava; mesmo passando para o
estado de tolerância à glicose normal são indivíduos com risco aumentado para o desenvolvimento do DM e portanto necessitam de acompanhamento e de
orientações.
Etiopatogênese
I. Diabetes mellitus tipo 1 (doença auto-imune):
Está fortemente associado ao complexo HLA,
desenvolvendo-se quase exclusivamente em
indivíduos expressando as moléculas DR3 ou
DR4 ou ambas. Susceptibilidade está
intimamente ligada ao gene DQB. Os alelos
DQB1*0302 e DQB1*0201 predispõem ao DMT1
enquanto o alelo DQB1*0602 é eminentemente
protetor.
A predisposição genética múltipla é
necessária, mas não suficiente para causar a
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doença. Fatores ambientais (ainda pouco
definidos) devem dar início ao processo auto-
imune nas células β.
Vírus e substâncias tóxicas às células β
podem iniciar uma insulite auto-imune progressiva
que causa a destruição das células β. A
intensidade da resposta imunológica seria
determinada pelos genes HLA que conferem
susceptibilidade ou proteção e pelo nível de
resposta em citocinas, que também pode ser
geneticamente determinada.
O processo auto-imune é lentamente
progressivo tornando-se o DMT1 clinicamente
manifesto somente depois que mais de 90% das
células β foram destruídas (geralmente após 3
anos). Anticorpos a várias proteínas podem ser
demonstrados no citoplasma e na superfície das
células β (geralmente são marcadores do
processo destrutivo) antes da manifestação
clínica do DMT1.
A insulite que leva à destruição das células β
envolve a imunidade celular. Linfócitos T
(“helper”, citotóxico/supressor, células “natural
killer – NK”) interagem com as células
apresentadoras de antígeno (nas células β), o
que culmina com a secreção de citolisinas e
apoptose das células β. Adicionalmente,
macrófagos produzem citocinas: interleucina-1
(IL-1) e fator de necrose tumoral α (TNFα), que
têm efeitos destrutivos sobre as células β.
Os efeitos lesivos da IL-1 sobre as células β
podem ser mediados pelos radicais livres
derivados do oxigênio. As células β são
extremamente sensíveis (têm pouca defesa
contra) a radicais livres, incluindo os ânions
superóxidos, o peróxido de hidrogênio e os
radicais hidroxilas. As ações da IL-1 sobre as
células β são muito potenciadas pelo TNFα e
interferon γ (INF-γ) e pela estimulação da
atividade secretória das células β.
Indivíduos geneticamente susceptíveis iniciam
suas vidas sem qualquer alteração detectável.
Um evento precipitante (ex. infecção viral), que
diretamente causa destruição mínima das células
β, desencadeia o processo auto-imune. Tal
processo é expresso pela detecção de anticorpos:
contra as células β (ICA), contra a descarboxilase
do ácido glutâmico (GAD) presente nas células β,
contra a insulina (IAA).
Embora a massa de células β diminua, a
reserva funcional de células β
é suficiente para a manutenção de níveis normais
de glicemia.
Continuado o processo auto-imune e lesivo às
células β, a perda destas é agora de tal grandeza
que causa diminuição de secreção de insulina ao
estímulo com glicose e finalmente altera o teste
oral de tolerância à glicose (TOTG). Como a
destruição das células β continua, a glicemia de
jejum se eleva e o diabetes se manifesta
clinicamente.
Os pacientes com DMT1 são vulneráveis a
outras doenças auto-imunes tais como: Tireoidite
de Hashimoto, Doença de Graves, Doença de
Addison, vitiligo e anemia perniciosa.
Figura 1: Estágios do desenvolvimento do diabetes mellitus tipo 1 autoimune (Adaptado de Williams Textbook of Endocrinology)
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II. Diabetes mellitus tipo 2:
É uma doença ou síndrome freqüentemente
associada a uma grande predisposição genética
(maior que a que ocorre no DMT1), onde 38%
dos irmãos e um terço dos filhos de diabéticos
tipo 2 têm diabetes ou tolerância à glicose
diminuída (TGD) e a concordância de DMT2 entre
gêmeos univitelínicos é geralmente de 70 a 80%.
Entretanto, a genética desta forma de diabetes é
complexa, provavelmente poligênica e não está
bem definida. O DMT2 envolve dois defeitos:
resistência à insulina e deficiência de secreção de
insulina para compensar a menor ação insulínica.
Se um ou ambos os defeitos são primários, e,
portanto, geneticamente herdados, permanece
controverso.
A manifestação do componente genético está
sujeita a importante influência de fatores
ambientais. Assim, o risco de desenvolver o
DMT2 aumenta com a idade, obesidade
(principalmente a do tipo abdominal) e
sedentarismo. Ocorre mais freqüentemente em
mulheres com passado de DMG e em associação
à hipertensão arterial e dislipidemia e sua
prevalência varia entre os diferentes grupos
raciais/étnicos.
Patologia do Pâncreas Endócrino
(Ilhotas de Langerhans)
O pâncreas é glândula mista, cuja porção
exócrina constitui 98% de seu volume e envolve a
porção endócrina. Além da proximidade
anatômica das duas porções, há uma interação
morfológica e funcional entre ambas. Assim, os
elevados níveis e insulina que perfundem o tecido
acinar por meio dos vasos pancreáticos
exerceriam efeito trófico sobre os ácinos. Por
outro lado, as enzimas digestivas pancreáticas
fazem parte da incretina, que estimula a secreção
de insulina após ingestão de alimentos.
A porção endócrina ou ilhotas de Langerhans,
que é a nossa glândula alvo, é, por sua vez,
constituída por grupos celulares distintos: células
β (61%), células α (16%), células δ (9%) e células
produtoras do polipeptídeo pancreático (14%). As
células β produzem insulina, as α, glucagon e as
δ, somatostatina. Existe uma interação parácrina
entre estas células: insulina inibe a secreção de
glucagon e este estimula a de insulina; a
somatostatina inibe ambas as secreções – de
insulina e de glucagon.
I. Diabetes Mellitus Tipo 1:
Nos primeiros seis meses do início clínico do
DMT1, estudos de autópsia observaram
infiltração das ilhotas pancreáticas por linfócitos e
macrófagos denominada insulite.
Posteriormente, geralmente após cinco anos
do início clínico do DMT1, há diminuição do
número e tamanho das ilhotas, constituindo em
média um terço do volume do pâncreas endócrino
de indivíduos controle, não-diabéticos. As células
β tornam-se praticamente ausentes. Há atrofia do
pâncreas exócrino, com diminuição do volume do
pâncreas total, que pode ser visualizada à ultra-
sonografia.
II. Diabetes Mellitus Tipo 2:
Após anos de doença há moderada redução
da massa de células β em associação a depósito
de fibrilas de amilina (processo degenerativo
secundário). Com freqüência há infiltração
gordurosa do pâncreas.
Fisiopatologia
Os níveis de glicose plasmática são
normalmente mantidos numa faixa relativamente
estreita, aproximadamente entre 70 e 150 mg/dL,
apesar das grandes variações de entrada e saída
de glicose como as que ocorrem após refeições e
durante exercício físico. A manutenção dos níveis
glicêmicos é crítica para a sobrevivência porque a
glicose plasmática é o substrato energético
principal utilizado pelo sistema nervoso central; a
hiperglicemia crônica exerce efeitos
degenerativos sobre os vasos que culminam com
a morte dos tecidos e órgãos envolvidos.
Para a manutenção da glicemia na faixa de
normalidade é de fundamental importância o
sistema hormonal, assim constituído: de um lado
a insulina (hormônio hipoglicemiante) e do outro,
o glucagon, as catecolaminas, o cortisol e o
hormônio do crescimento - GH (hormônios
hiperglicemiantes ou contra-reguladores).
A insulina é liberada nos períodos pós-
prandiais (após alimentação) e o glucagon nos
períodos de jejum.
As células β são estimuladas pela glicose,
principalmente, mas também por aminoácidos,
ácidos graxos livres e medicamentos como as
sulfoniluréias e as glinidas (potenciam a ação da
glicose). A glicose é transportada de forma eficaz
para o interior das células β pelo GLUT2 e
imediatamente fosforilada em glicose-6P pela
glicokinase, que é considerada o sensor de
glicose para as células β. A glicose-6P é oxidada
aumentando a relação ATP/ADP com fechamento
dos canais de K+
sensíveis ao ATP das células β.
Há então desporalização da membrana destas
células com abertura dos canais de Ca++
,
aumento da concentração do Ca++
citoplasmático,
ativação provável de cinases, com extrusão dos
grânulos secretores e liberação de insulina (pró-
insulina → insulina + peptídeo C).
Podemos observar os principais passos da
secreção de insulina estimulada pela glicose, na
figura abaixo:
4. Diabetes Mellitus
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Figura 2 - Vias da secreção de insulina pela célula b estimulada pela glicose (Adaptado de Williams Textbook of Endocrinology)
A secreção de insulina é bifásica. A 1a
fase
ocorre nos primeiros 10 minutos após o estímulo,
sendo aguda e de curta duração. É constituída
pela insulina pré-formada. É de fundamental
importância para o controle dos níveis glicêmicos
pós-prandiais e é a primeira a ser alterada no DM
(liberação lentificada e diminuída). Persistindo o
estímulo glicêmico, ocorre a 2a
fase, que é menos
intensa e mais prolongada (figura 3).
Figura 3 - Secreção bifásica da insulina pelas células ß pancreáticas.
5. Diabetes Mellitus
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A insulina liberada na circulação atinge seus
receptores em seus órgãos-alvo sem necessitar
de transportador.
O receptor da insulina é um hétero-tetrâmero
constituído de duas subunidades α,
extracelulares e duas subunidades β,
transmembrana celulares e intracelulares: β-α-α-
β. A ação da insulina começa com sua ligação às
subunidades α, que muda de conformação e ativa
a subunidade β, que é uma tirosina quinase.
Assim, inicia-se a fosforilação em cascata de
substratos e enzimas, que culmina com as ações
da insulina: anabolismo, estímulo do transporte
da glicose pelo GLUT4 (músculo, tecido adiposo),
crescimento celular (fig. 4).
Figura 4 - Resposta dos tecidos periféricos à insulina após interação com seu receptor
As principais ações metabólicas da insulina
são: estimular a captação de glicose e sua
utilização produzindo energia (oxidação da
glicose/glicólise) e/ou armazenando-a
(glicogênio/glicogênese e síntese de
triglicerídeos/lipogênese); estimular o depósito de
ácidos graxos livres (AGL) no tecido adiposo;
estimular a captação de aminoácidos e a síntese
protéica (tabela 1).
Tabela 1 - Ações metabólicas da insulina em seus principais órgãos-alvos
Metabólitos
Energéticos
Fígado Célula Adiposa Músculo
Carboidrato ↑ Glicólise
↑ Glicogênese
↓ Neoglicogênese
↓ Glicogenólise
↑ Transporte Glicose
↑ Glicólise
↑ Síntese Glicerol
↑ Transporte Glicose
↑ Glicólise
↑ Glicogênese
Gordura ↑ Lipogênese ↑ Entrada Agl
↑ Depósito Tg
↓ Lipólise
Proteína ↑ Síntese Protéica
↓ Proteólise
↑ Captação AA
↑ Síntese Protéica
As células α são estimuladas quando os níveis
glicêmicos estão abaixo do limite inferior de
normalidade (jejum), por aminoácidos (pós-
prandial) e por vários hormônios: catecolaminas,
cortisol, GH, β-endorfina, vasopressina (estresse).
Lembramos que nas ilhotas de Langerhans, as
células α (e células δ) localizadas na região
cortical, recebem fluxo sangüíneo direto da região
medular, rica em células β, com concentração de
insulina a mais elevada do organismo. A insulina,
pelo contrário, exerce efeito inibitório sobre a
secreção de glucagon.
O glucagon é então liberado na circulação e,
sem necessitar de transportador, atinge seus
receptores nos órgãos-alvo. A ligação glucagon-
receptor causa acúmulo citoplasmático de AMP
cíclico (AMPc) e cálcio. Os efeitos do glucagon
ocorrem principalmente no metabolismo
intermediário hepático por meio dos segundos
mensageiros antes citados, que ativam as
proteínas quinases A (dependente do AMPc) e C
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(dependente de Ca++
). Estas quinases, por sua
vez, afetam um amplo espectro de processos
enzimáticos, incluindo ativação da glicogenólise e
da neoglicogênese com aumento da produção
hepática de glicose, da oxidação de AGL com a
produção de corpos cetônicos (cetogênese) pelo
fígado e da síntese de uréia.
Assim, no estado pós-prandial (alimentado) é
importante que os alimentos sejam aproveitados
seja para a produção de energia ou para seu
armazenamento, seja para fins plásticos, o que
ocorre sob as ações da insulina. Por outro lado,
no estado pós-absortivo (jejum) é importante que
o organismo produza glicose e que os tecidos
periféricos utilizem AGL como principal fonte
energética, poupando a glicose, como substrato
energético, para o sistema nervoso central, o que
é realizado pelas ações do glucagon.
Temos então, os hormônios insulina e
glucagon inteferindo nas vias metabólicas de
formas opostas: a) por meio de controle rápido
dos complexos enzimáticos por fosforilação-
desfosforilação; b) por meio de controle de longa
duração por regular a síntese das várias enzimas.
Os hormônios liberados em situações de
estresse: catecolaminas, cortisol e GH atuam
metabolicamente aumentando a lipólise e a
produção hepática de glicose (ativação da
glicogenólise e/ou neoglicogênese) e diminuindo
a captação e a utilização periférica da glicose.
Portanto, intensificam as ações metabólicas do
glucagon.
No Diabetes mellitus o mecanismo
fisiopatológico fundamental é a diminuição da
razão: insulina/glucagon, que é mais intensa no
DMT1 que no DMT2. Tal ocorre por diminuição de
secreção de insulina, que é grave no DMT1 e
menos intensa e associada a resistência à
insulina no DMT2, e por secreção aumentada de
glucagon. Conseqüentemente, ocorrerão, em
grau variável de intensidade, os distúrbios
metabólicos apresentados na Tabela 2, que
caracterizam um estado catabólico.
Tabela 2. Alterações metabólicas do diabetes descompensado pelo distúrbio bi-hormonal*.
Alterações Deficiência Insulina Excesso Glucagon
↓ utilização glicose ++++ O
↑ produção glicose: + ++++
↑ glicogenólise + ++++
↑ neoglicogênese + ++++
↑ liberação aminoácidos ++++ O
↑ lipólise ++++ + (?)
↑ cetogênese hepática + (?) ++++
Obs.: As alterações metabólicas são intensificadas pela secreção dos hormônios de estresse
*Magnitude do efeito em escala semiquantitativa: do menor (+) para o maior (++++); O: sem efeito; ?: efeito incerto.
Quadro Clínico
I. Diabetes Mellitus Tipo 1:
O diagnóstico geralmente é feito por ocasião
da puberdade, após curto período dos sintomas:
poliúria (glicosúria e diurese osmótica), polidipsia
(desidratação pela diurese osmótica), polifagia e
emagrecimento (estado catabólico), que
freqüentemente evoluem para a cetoacidose
(descompensação metabólica máxima). É
necessário o tratamento imediato com insulina
para a sobrevida destes pacientes.
II. Diabetes Mellitus Tipo 2:
A maioria dos pacientes com este tipo de
diabetes tem mais de 40 anos de idade e são
obesos ou têm aumento da gordura intra-
abdominal.
Freqüentemente o diagnóstico é feito após
vários anos de doença porque a hiperglicemia
desenvolve gradualmente e nos estágios iniciais
geralmente não é intensa o suficiente para o
paciente perceber qualquer dos sintomas
clássicos do diabetes. No entanto, tais pacientes
têm risco aumentado para desenvolverem as
complicações macro e microvasculares, que
podem ser o quadro de apresentação da doença.
O diagnóstico é muitas vezes feito por
dosagem da glicemia em exames de rotina. Mais
tarde, com a evolução da doença, os sintomas
mais freqüentes são: poliúria, polidipsia,
emagrecimento e micoses de pele ou do trato
genital. Raramente, o início dos sintomas é agudo
como no DMT1 (cetoacidose) ou com o estado
hiperosmolar não-cetótico, ocorrendo na maioria
das vezes como resultado do estresse por
doença aguda intercorrente.
Os antecedentes pessoais são importantes,
como passado obstétrico sugestivo de DMG,
diagnóstico prévio de DMG e de hiperglicemia
diária gestacional, de hipertensão arterial e de
dislipidemia. Com freqüência há presença de
familiares com DMT2. Neste tipo de diabetes é de
grande importância o diagnóstico precoce da
doença.
7. Diabetes Mellitus
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Diagnóstico (ADA, 2003)
A presença dos sintomas clássicos do
diabetes facilmente conduzem ao seu
diagnóstico, que porém, pode ser tardio no DMT2.
São 3 os critérios para o diagnóstico de
diabetes mellitus:
1. Sintomas de diabetes-poliúria, polidipsia,
emagrecimento e glicemia de qualquer
momento dia ≥ 200 mg/dL; ou
2. Glicemia de jejum (GJ) ≥ 126 mg/dL. Jejum é
considerado como não ingestão calórica por
pelo menos 8 hs; ou
3. Glicemia 2 h após carga oral de 75 g de
glicose (anidra) ≥ 200 mg/dL. O TOTG só
deve ser realizado quando há indicações bem
precisas: GJ alterada (110-125 mg/dL), ou GJ
normal (< 110 mg/dL) com indícios clínicos de
diabetes. O TOTG quando realizado deve
seguir as condições em que o teste foi
padronizado: indivíduos saudáveis e
ambulatoriais; com ingestão mínima de 250 g
de carboidratos/dia, por pelo menos 3 dias
que antecedem o teste; não fazendo uso de
medicamentos que sabidamente interferem
no metabolismo da glicose.
*Obs.: Na ausência de sintomas e hiperglicemia
inequívoca, os critérios 2 e 3 devem ser
confirmados por repetição do teste em dia
subseqüente e próximo.
O padrão-ouro para o diagnóstico de diabetes
é a elevação dos níveis glicêmicos após o jejum
noturno.
A Associação Americana de Diabetes (ADA)
tem recomendado o uso da GJ para o diagnóstico
de diabetes preferencialmente ao TOTG, mas
com tal medida há subdiagnóstico de DM.
Os resíduos valina da região N-terminal da
hemoglobina eritrocitária tornam-se
irreversivelmente glicosilados na proporção das
concentrações da glicose circulante e o produto
resultante é denominado hemoglobina A1C
(HbA1C). Devido à meia-vida do eritrócito, a
porcentagem de sua hemoglobina (HbA)
representada pela HbA1C (normalmente, 4-6%)
fornece um índice da concentração plasmática
média da glicose durante os 2-3 meses
precedentes. É ferramenta valiosa para o
monitoramento das glicemias do paciente
diabético, mas não é atualmente recomendada
para o diagnóstico de diabetes.
A presença de glicosúria geralmente é
indicativa de glicemias acima da taxa máxima de
reabsorção de glicose pelos túbulos renais (180-
200 mg/dL). É assim, método diagnóstico pouco
sensível. Na impossibilidade de se dispor de
glicemias de ponta de dedo realizadas pelos
pacientes no seu dia-a-dia, a glicosúria de 24 hs,
fracionada, na avaliação do controle glicêmico do
paciente é uma alternativa satisfatória.
Atualmente, são considerados 2 estágios
intermediários entre a tolerância à glicose normal
e o diabetes:
1. Glicemia de jejum alterada – GJA (GJ: ≥ 110 e
< 126 mg/dL);
2. Tolerância à glicose diminuída – TGD (G 2hs
após 75 g glicose V.O.: ≥ 140 e < 200
mg/dL).
Ambos estágios são precursores do DMT2 e
de doenças cardiovasculares (principalmente o de
TGD) e resultam de graus variados de deficiência
de secreção insulínica e resistência à insulina, de
acordo com a população considerada.
A Federação Internacional de Diabetes (IDF)
recomenda que se a TGD não puder ser revertida
por mudanças no estilo de vida, se considere a
intervenção farmacológica.
Os indivíduos em cada uma destas 2 classes
de risco devem ser acompanhados e incentivados
a diminuir os fatores de resistência à insulina
(excesso de peso, sedentarismo, tabagismo,
outros).
Concluindo, com valores da glicemia de jejum
e de 2 h após carga oral de 75 g de glicose
(TOTG) fazemos o diagnóstico das classes de
tolerância à glicose (quadro 1).
Quadro 1. Valores de glicose plasmática para diagnóstico de diabetes mellitus e seus estágios pré-clínicos
Classes de Tolerância à Glicose Glicemia de Jejum (mg/dL)
Glicemia 2 h após 75 g Glicose VO
(mg/dL)
Tolerância à Glicose Normal < 110 <140
Glicemia Jejum Alterada ≥110 e <126 <140
Tolerância à Glicose Diminuída <126 ≥140 e <200
Diabetes Mellitus ≥126 ≥200
Obs.: Para cada diagnóstico é necessário confirmação do resultado.
Vimos que o DMT1 geralmente é uma doença
auto-imune, caracterizada pela presença de uma
variedade de auto-anticorpos contra proteínas de
superfície ou do interior das células β do
pâncreas. A presença de tais marcadores antes
da manifestação clínica do DMT1 pode identificar
pacientes de risco.
Todavia, na ausência de terapias eficazes e
inócuas para prevenir ou postergar o DMT1, não
há indicação de rastreamento de indivíduos,
mesmo os com alto risco (ex. irmãos de
diabéticos tipo 1), por meio da dosagem dos
anticorpos anti-proteínas das células β. Tal
medida é de valor, entretanto, para classificar um
paciente diabético como tipo 1 ou tipo 2, nos
8. Diabetes Mellitus
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casos que suscitam dúvidas, e para confirmar a
etiologia auto-imune de um paciente com DMT1
(principalmente quando se dispuser de tratamento
adequado que preserve a massa de células β).
DMT2 não-diagnosticado é freqüente, como
observado nos EUA e no Brasil, onde tal situação
correspondeu a 50 e 46% dos diabéticos,
respectivamente. O DMT2 não-diagnosticado é
uma condição séria, pois a hiperglicemia vigente
é causadora das micro e macroangiopatias.
Assim, a detecção precoce e conseqüentemente
o seu pronto tratamento devem diminuir os
transtornos decorrentes do DMT2 e de suas
complicações.
Está indicado testar indivíduos saudáveis, mas
com risco aumentado para o DMT2 com medida
da GJ e se necessário, com a realização do
TOTG, conforme apresentado no Quadro 2. As
recomendações contidas neste Quadro se
baseiam em:
1) pico de incidência do DMT2 depois dos 45
anos,
2) probabilidade negligenciável de
desenvolvimento de qualquer das complicações
do diabetes num intervalo de 3 anos a partir de
um teste negativo,
3) conhecimento dos fatores de risco, já bem
documentados, para o DMT2.
Quadro 2. Critérios para o rastreamento de diabetes mellitus tipo 2
1. O rastreamento do DMT2 deve ser considerado em todos indivíduos com 45 ou mais anos de
idade e, se negativo, deve ser repetido a intervalos de 3 anos.
2. O rastreamento do DMT2 deve ser considerado em indivíduos com menos de 45 anos de idade e
se necessário, repetido mais freqüentemente, quando:
• têm sobrepeso (Índice de Massa Corporal: ≥ 25 kg/m2
);
• têm parente em 1o
grau com diabetes;
• são membros de grupos étnicos com alto risco para o DMT2, como: origem africana, hispânica,
indígena ou asiática; habitantes das ilhas do Pacífico; índios Pima (Arizona); outros;
• têm passado de DMG ou de terem dado à luz recém-nascido com mais de 4 kg;
• têm hipertensão arterial (PA ≥ 140/90 mmHg);
• têm níveis séricos de HDL baixos (≤ 35 mg/dL) e/ou de triglicérides elevados (≥250 mg/dL);
• têm TGD ou GJA.
Tratamento
• Diabetes Mellitus Tipo 1:
Os principais objetivos do tratamento são:
• promover o controle metabólico, incluindo
níveis euglicêmicos nos períodos pós-
absortivos e pós-prandiais;
• permitir crescimento e desenvolvimento
adequados;
• promover o bem-estar físico e psíquico;
• evitar as complicações crônicas.
O tratamento tem melhores resultados quando
proporcionado por uma equipe multidisciplinar, da
qual o paciente precisa ser membro ativo e
principal. Desta equipe devem também fazer
parte: o endocrinologista, a nutricionista, o
psicoterapeuta, o educador físico, a enfermeira.
1. Terapia Médica Nutricional (TMN):
O valor calórico total (VCT) da TMN deve ser
apropriado para permitir estado nutricional,
crescimento e desenvolvimento adequados. A
ingestão alimentar diária deve ser feita em 3
refeições principais: café da manhã com 20%
VCT, almoço com 20% VCT e jantar com 30%
VCT, e preferencialmente 3 refeições
complementares: meio da manhã e da tarde e
antes de se deitar, com 10% VCT cada uma ou
com 5, 10 e 15% VCT, respectivamente.
Cada uma das refeições principais devem
conter os 3 macronutrientes: carboidratos,
gordura e proteínas nas proporções
recomendadas para a população em geral, além
dos micronutrientes (minerais), vitaminas e fibras
(cerca de 20 a 30 g/d). Assim, carboidratos e
gordura monoinsaturada devem fornecer 60-70%
do VCT (50 a 60% e 10 a 20%, respectivamente),
gordura poliinsaturada e saturada devem fornecer
10 e <10% do VCT, respectivamente, proteína
deve fornecer 15-20% do VCT (0,8 a 1,0 g
proteína/kg peso/dia; as menores quantidades
podem estar indicadas nos pacientes com
insuficiência renal).
Com relação aos efeitos glicêmicos dos
carboidratos, a quantidade total dos mesmos nas
refeições e lanches é mais importante que sua
fonte ou tipo (açúcares, oligossacarídeos,
polissacarídeos). Recomenda-se que as
principais fontes de carboidratos sejam: os
cereais, as frutas, os vegetais e o leite desnatado.
Os pacientes sob a terapia insulínica intensiva
devem ajustar as doses de insulina pré-refeição
de acordo com a quantidade de carboidratos da
refeição (contagem de carboidratos) e do nível
glicêmico presente.
2. Atividade Física:
Atividade física é desejada por seus vários
efeitos benéficos, principalmente em relação ao
sistema cardiovascular, mas deve ser regular,
9. Diabetes Mellitus
EMV 9/23
pois há consumo de glicose pelo músculo em
exercício independentemente da insulina,
devendo fazer parte do plano terapêutico. O alvo
mínimo é de 150 minutos/semana (30 min – 5 d
ou 50 min – 3 d, semanalmente).
3. Insulinoterapia:
A insulina humana, isto é, insulina sintética
com estrutura idêntica àquela do hormônio
humano, tem em grande parte substituído as
insulinas de origem animal (bovina + suína ou
mista, geralmente). A insulina humana é
produzida por síntese química ou por técnicas do
DNA recombinante.
Em busca de uma insulina com características
de ação mais próximas da fisiológica, por meio da
engenharia molecular, surgiram nos últimos anos
os análogos da insulina humana: de curta e
longa-ação.
O perfil de ação das insulinas depende de:
a) composição do tampão, b) estrutura protéica
(análogos), c) via de administração.
a) Insulinas (análogos) de ação ultra-rápida:
Podem ser aplicados nas vias: endovenosa,
muscular e subcutânea. Aplicados no
subcutâneo, em relação à insulina regular, têm
absorção mais rápida, pico mais elevado e tempo
de ação mais curto (3 a 4 horas). Assim, permite
serem administrados logo antes das refeições,
com melhor controle dos picos glicêmicos pós-
prandiais, e com menor risco de hipoglicemia no
período pós-prandial tardio. Todavia, exigem um
maior suprimento de insulina basal (insulinas de
longa ação) e são mais caras que a insulina
regular.
Atualmente, dispomos de 2 destes análogos:
1) a insulina lispro criada pela inversão na cadeia
B da insulina dos aminoácidos prolina e lisina das
posições B28 e B29 para as B29 e B28,
respectivamente;
2) a insulina aspart que resulta da substituição do
aminoácido prolina na posição 28 da cadeia B da
molécula de insulina humana (B28) pelo ácido
aspártico.
b) Insulinas de ação rápida:
Geralmente de origem humana, estão contidas
em solução cristalina e são denominadas de
insulina regular (R). Podem ser aplicadas pelas
vias: endovenosa, muscular e subcutânea. As
duas primeiras vias são utilizadas em situações
de urgência (ex.: cetoacidose diabética), sendo
necessário o uso de bomba de infusão para a
administração endovenosa da insulina.
Pela via endovenosa têm ação imediata e
término de ação em 3 a 5 minutos. Pela via
intramuscular têm início de ação em 20 minutos,
pico de ação em 60 minutos e término de ação
em 120 minutos. A insulina regular é administrada
no subcutâneo 30 minutos antes das refeições
para o controle glicêmico pós-prandial, nas
situações de instabilidade clínica e no período de
48 horas após a administração endovenosa da
insulina e antes de se iniciar a administração de
insulina de ação intermediária (ex.: NPH ou
lenta). Pela via subcutânea a insulina R tem início
de ação em 30 minutos, pico de ação em 120
minutos e término de ação em 4 a 6 horas.
c) Insulinas de ação intermediária ou lenta:
A adição de protamina e zinco ou de apenas
zinco em maior quantidade ao tampão da insulina
em solução resultou na insulina protamina neutra
de Hagedorn (NPH;N) e na insulina lenta (L),
respectivamente. Há a formação de cristais de
insulina quando aplicada no subcutâneo, o que
torna sua liberação mais lenta. Só admite a
aplicação no subcutâneo que geralmente é feita 2
vezes ao dia, sendo a 1a
dose 20 minutos antes
do café da manhã (2/3 da dose diária) e a 2a
dose
20 minutos antes do jantar ou antes de o paciente
se deitar (1/3 da dose diária).
Embora, tenham sido usadas comumente
como substitutas da secreção basal endógena
normal, apresentam pico de ação. Têm início de
ação em 2-4 horas, pico de ação entre 6-12 horas
e duração de ação de 16-20 horas (as de origem
animal têm início de ação mais lento e duração de
ação mais longa).
d) Insulinas e análogos de ação prolongada ou
ultralenta:
• Insulinas:
Com adição ao tampão da solução de insulina
de maiores quantidades de protamina e zinco que
as das insulinas anteriores, obtêm-se cristais de
insulina maiores, que do subcutâneo liberam a
insulina mais lentamente, sendo denominadas
insulinas protamina-zinco (PZI) e ultralenta (U),
respectivamente. Obviamente, só admitem
aplicação no subcutâneo.
São pouco utilizadas, tendo indicação maior
para os pacientes que metabolizam a insulina
mais rapidamente. Têm início de ação em 6-10
horas, pico de ação em 10-16 horas e duração de
ação de 20-24 horas (para as de origem animal,
são válidas as observações feitas anteriormente).
• Análogos:
A insulina glargina (recentemente disponível
no Brasil) é produzida pela substituição da
asparagina na posição A21 da molécula da
insulina humana pela glicina e pela adição de 2
moléculas de arginina na posição B30. Estas
modificações reduzem a solubilidade da insulina
glargina ao pH do tecido subcutâneo, onde
precipita lentificando sua absorção e resultando
num suprimento basal constante. Assim, permite
10. Diabetes Mellitus
EMV 10/23
uma aplicação única em associação a insulina de
ação rápida ou ultra-rápida pré-refeições.
Difere das insulinas NPH ou L por não ter
ação em pico, daí ser mais fisiológica no
suprimento basal de insulina; provocar menos
hipoglicemias noturnas; proporcionar melhor
controle glicêmico e causar menor ganho de peso
(vantagens). Como desvantagens, não permite a
mistura na mesma seringa com outra insulina
(alteração cinética) e é mais cara.
e) Insulina do futuro próximo: Insulina inalatória
Estudos têm mostrado que a insulina humana
R, por meio de vários dispositivos, pode ser
inalada e atingir o alvéolo, onde é absorvida. Em
relação à via subcutânea, apresentou pico mais
rápido e duração de ação pouco mais prolongada.
Inalada antes de cada refeição tem a função de
controlar os níveis glicêmicos pós-prandiais.
Sua grande vantagem é evitar as picadas,
todavia, pelos sistemas inalatórios disponíveis há
perda de insulina no trajeto respiratório, exigindo
maiores gastos da mesma. Ainda são
necessários outros estudos que definitivamente
garantam sua eficácia e segurança.
Com a disponibilidade das insulinas humanas
de ação rápida e lenta o paciente com DMT1
pode ser submetido ao tratamento convencional,
ou melhor, ao tratamento intensivo.
Insulinoterapia Convencional:
Duas doses de insulina NPH ou L: maior dose
antes do café da manhã e menor dose antes do
jantar, ou antes de deitar, aplicadas no
subcutâneo. Se há hiperglicemia isolada, após
uma das 3 refeições principais, deve-se associar
insulina R ou lispro/aspart antes da refeição.
Controle glicêmico: glicemias de jejum e pré e
pós-prandiais, as duas últimas,
preferencialmente, por automonitoramento pelo
paciente por meio do glicosímetro (HGT); HbA1C;
glicosúria de 24 hs, fracionada (menos sensível).
Insulinoterapia Intensiva:
É o indicado para se obter o controle glicêmico
necessário para se evitar as microangiopatias:
glicemias de jejum e pré-prandial: 70-120 mg/dL,
glicemias pós-prandiais: <180 mg/dL, HbA1C <
7,0%. Pode ser feita de algumas formas:
a) Bomba de infusão contínua de insulina R ou
lispro/aspart no subcutâneo com controle
constante da velocidade de infusão pelo
paciente de acordo com a glicemia (HGT) e a
atividade a ser desenvolvida.
b) Insulina glargina no subcutâneo antes de se
deitar ou do jantar e insulina lispro/aspart no
subcutâneo antes das 3 refeições básicas.
c) Insulina NPH ou L no subcutâneo antes de se
deitar e em pequenas doses junto à insulina
lispro/aspart no subcutâneo antes das 3
refeições básicas.
d) Insulina NPH ou L no subcutâneo antes de se
deitar e insulina R no subcutâneo antes das 3
refeições principais.
Nos esquemas b, c, d as doses de insulina
rápida ou ultra-rápida são determinadas pelo nível
glicêmico (HGT) e a quantidade de carboidratos
(contagem de carboidratos) da dieta a ser
consumida.
A insulinoterapia intensiva é a ideal, mas exige
que o paciente tenha dedicação e interesse em
controlar seu diabetes, tenha condições psico e
sócio-culturais adequadas.
O principal efeito colateral da insulinoterapia,
principalmente a intensiva, para o diabético tipo 1
é a hipoglicemia. Tal decorre dos níveis
circulantes de insulina (dose exógena recebida)
não poderem ser diminuídos com o exercício ou o
jejum, o que causa: a) não diminuição da
utilização de glicose pelos tecidos dependentes
de insulina; b) não liberação de AGL do tecido
adiposo; c) supressão da secreção de glucagon.
Ainda, no paciente com DMT1 de duração de
2 anos ou mais a resposta do glucagon à
hipoglicemia induzida pela insulina está reduzida,
assim como a das catecolaminas, quando o
diabetes tem cerca de 15 anos ou mais de
duração. Ambos déficits tornam o combate e a
recuperação de um episódio de hipoglicemia
prejudicados.
As hipoglicemias tornam-se mais perigosas
quando acompanhadas da não percepção das
mesmas, pela ausência dos sintomas de alarme,
que possibilitam o paciente de se socorrer antes
que ocorra disfunção do sistema nervoso central.
Normalmente, os sintomas de hipoglicemia
aparecem quando os níveis glicêmicos atingem
aproximadamente o valor de 55 mg/dL, que é
superior aos que causam disfunção do sistema
nervoso central. Episódios repetidos de
hipoglicemia, mais freqüentes na insulinoterapia
intensiva, parecem estabelecer novo limiar de
percepção de hipoglicemia, agora mais baixo, tal
que a liberação dos hormônios contra-
reguladores não ocorrem no nível glicêmico
esperado. Conseqüentemente, na ausência dos
sintomas de alarme o paciente corre sério risco
de sofrer convulsões, coma e morte. Deve-se,
assim, evitar episódios de hipoglicemia.
4. Transplante
Tratamento mais eficaz para o diabetes seria o
transplante do pâncreas ou das células β.
O primeiro tem sido realizado junto ao
transplante renal há mais tempo e mais
freqüentemente, tendo havido consideráveis
progressos na técnica e nos resultados. Todavia,
devido à necessidade de imunossupressão
prolongada, o transplante de pâncreas só está
11. Diabetes Mellitus
EMV 11/23
indicado numa fase tardia da microangiopatia,
como a insuficiência renal crônica.
O segundo envolve técnica cirúrgica bem mais
simples e evitaria a terapia imunossupressora,
mas, embora tenha havido progressos, ainda
vários obstáculos técnicos, principalmente em
relação ao número e preservação da vitalidade
das células β, precisam ser vencidos.
• Diabetes Mellitus Tipo 2:
Os objetivos básicos do tratamento dos
pacientes com DMT2 não diferem daqueles do
DMT1: controle metabólico com a esperança de
se promover a saúde e aumentar a expectativa de
vida.
Em contraste com o DMT1, a insulina não é
componente obrigatório da terapia do DMT2,
embora após vários anos de doença ela se torne
necessária.
Entre os diabéticos tipo 2 há um largo
espectro clínico de: disfunção das células β,
índice de massa corporal e resistência à insulina
que requer uma escolha cuidadosa das várias
opções terapêuticas. Os pacientes com DMT2
sendo mais velhos têm com maior freqüência
associação com outros problemas clínicos, tais
como: hipertensão arterial, dislipidemia e
osteoporose, que precisam ser tratados
concomitantemente.
Como para os diabéticos tipo 1, o tratamento
para os de tipo 2 é mais eficaz quando conduzido
por uma equipe multidisciplinar, da qual o
paciente precisa ser um participante ativo.
Também, como para os pacientes com DMT1,
para os com DMT2 a TMN e a atividade física são
os fundamentos da terapêutica. Infelizmente, em
geral a aderência a estas duas condutas, com
redução de peso, é pequena. Assim, com
freqüência é necessária a prescrição de
antidiabéticos orais. Com a evolução da doença,
freqüentemente há necessidade de associação
dos medicamentos orais e por fim da
administração de insulina, para o controle
glicêmico.
1. Terapêutica médica nutricional:
Tudo o que foi escrito para o DMT1 é valido
para o DMT2, exceto quanto à necessidade em
geral da TMN ser hipocalórica para o controle
glicêmico (principalmente nos períodos pós-
prandiais) e redução do peso (geralmente trata-se
de pacientes obesos). Com a diminuição de peso
há diminuição da resistência à insulina com
melhora metabólica.
2. Atividade Física:
O que foi referido para o DMT1 também se
aplica para o DMT2 com o benefício adicional de
poder proporcionar perda de peso.
3. Antidiabéticos Orais: (ver Quadro 3)
a) Medicamentos que diminuem a resistência à
insulina:
a1) Metformina:
É uma biguanida que tem menor risco de
causar acidose lática se observadas suas contra-
indicações. Age principalmente diminuindo a
neoglicogênese hepática. Pode determinar perda
de peso e reduz os níveis de triglicérides de 10 a
15% e do inibidor-1 do ativador do plasminogênio
(PAI-1).
Os efeitos colaterais mais freqüentes são
distúrbios digestivos: mal estar gástrico,
flatulência e diarréia. Está contra-indicada em:
situações de hipóxia sistêmica (insuficiência
cardíaca, insuficiência respiratória, aterosclerose
avançada, etc), nas insuficiências renal e
hepática.
a2) Tiazolidinedionas ou Glitazonas:
Incluem, atualmente, a rosiglitazona e a
pioglitazona. Agem principalmente ativando o
receptor de insulina nos tecidos adiposos,
muscular e hepático com aumento da utilização
de glicose pelos mesmos. As glitazonas ligam-se
a um receptor nuclear proliferador ativado dos
peroxisomas γ (PPAR-γ), levando a um aumento
da expressão dos transportadores de membrana
da glicose (GLUT 4). Corroborando com esta
ação, agem também bloqueando as ações
antiinsulinas do TNF-α e de outras citocinas.
Como efeito colateral indesejado tem-se o
ganho de peso (2-3 kg). Recomenda-se
acompanhamento da função hepática. São bem
mais caras que a metformina.
b) Medicamentos que estimulam a secreção de
insulina:
b1) Sulfoniluréias:
Junto com as biguanidas são os
medicamentos mais antigos utilizados no
tratamento do DMT2 e os mais prescritos. São
hipoglicemiantes orais. Têm como principal
mecanismo de ação estimular a secreção de
insulina ligando-se ao seu receptor na superfície
das células β, com fechamento dos canais de K+
dependentes de ATP, resultando em
despolarização das células.
As sulfoniluréias de 2a
geração são mais
eficazes e têm menos efeitos colaterais que as de
1a
geração (clorpropamida). Quanto aos últimos,
destaca-se o ganho ponderal e a possibilidade de
hipoglicemia. Estão contra-indicadas nas
insuficiências renal e hepática.
b2) Glinidas:
Incluem, atualmente, a repaglinida (derivado
do ácido benzóico) e a nateglinida (derivado da
D-fenilalanina). Agem também nas células β
12. Diabetes Mellitus
EMV 12/23
estimulando a secreção de insulina à glicose.
Diferente, porém, das sulfonilúreias, têm início de
ação mais rápido e duração de ação menor,
estando indicadas para o controle glicêmico pós-
prandial.
c) Medicamentos que diminui a absorção
intestinal de glicose:
Acarbose:
É um inibidor das α-glicosidases intestinais
bloqueando a entrada da glicose na circulação e
controlando a glicemia pós-prandial, todavia, os
dissacarídeos não absorvidos sofrem
fermentação no interior das alças intestinais pela
flora bacteriana causando os sintomas de:
meteorismo, flatulência e diarréia. Estes efeitos
adversos nem sempre são tolerados pelos
pacientes. Iniciando o tratamento com doses
baixas de 25 mg nas refeições, ajuda a tornar tais
efeitos menos intensos. A acarbose também
diminui de modo consistente a trigliceridemia pós-
prandial em cerca de 20%.
d) Associações:
Geralmente inicia-se o tratamento com
antidiabético oral que diminua a resistência à
insulina (ex.: metformina). Se não se conseguir o
controle glicêmico desejado deve-se associar
uma 2a
classe de medicamento: glinida ou
acarbose, para o controle das glicemias pós-
prandiais ou sulfoniluréia, para o controle
glicêmico nas 24 h.
Se necessário, pode-se associar uma 3a
classe de medicamento.
Quadro 3. Principais características dos antidiabéticos orais.
Medicamentos
Estrutura Química*
Posologia
(mg)
Min-Máx.
Nº Doses/
dia
Meia-
Vida
(h)
Metabolismo/
Excreção
Metformina 1000 – 2550 2 2-4 −/Renal
Roziglitazona
2 – 8 1 3-4 Hepático/Renal
Tiazolidinedionas
Pioglitazona
15-45 1 3-7 Hepático/Renal
Glibenclamida 2,5 – 20 2 6-12 Hepático/Renal e Biliar
Gliclazida
80 – 320 2 12 Hepático/Renal e Biliar
Sulfoniluréias
Glimepirida
1 – 8 1 Hepático/Renal e Biliar
Repaglinida
1 – 4 3 2 Hepático/ Biliar
Glinidas
Nateglinida
3 2
Hepático/ Biliar e 10%
Renal
Acarbose 150 – 300 3 2 Intestino
4. Insulinoterapia
A explanação feita para os DM tipo 1 aqui
também é valida. Deve-se, entretanto, ressaltar
que a maior aderência à introdução da
insulinoterapia em diabéticos tipo 2 ocorre
quando o fazemos prescrevendo uma dose
pequena de insulina de ação intermediária antes
do paciente se deitar (“bed-time insulin”), com
manutenção da posologia antidiabética oral
durante o dia. Posteriormente, se necessário,
acrescentamos a 2a
dose, pela manhã e
retiramos a sulfoniluréia (se for o caso), enquanto
podemos manter a droga oral que diminui a
resistência a insulina (ex.: metformina) e até
mesmo as medicações que diminuem a glicemia
pós-prandial.
CH3
CH3
N⎯C⎯NH⎯C⎯NH2
NH
N
N
O
S
NH
O
O
N
O
S
NH
O
O
CONH (CH2)2
OCH3
SO2NHCONH
Cl
N
H3
S
N
H
OO O
N
H
N
H3C
S
N
H
OO O
N
H
O
CH3
CH3
CH⎯CH2⎯CH⎯NH⎯C⎯CH2 CO2H
N
CH2
CH3
O
CH3
CH3
C⎯NH⎯CH⎯CH2
O
CO2H
CH
13. Diabetes Mellitus
EMV 13/23
Figura 5 - Diretrizes para o Tratamento da Hiperglicemia no Diabetes Tipo 2
5. Tratamentos Associados (fundamentalmente
para os diabéticos tipo 2).
Princípios Gerais: Mudanças do estilo de vida:
Alimentação saudável; redução de peso;
atividade física regular; abandono de vícios
(fumo, álcool, etc.)
Obesidade
Pequenas reduções de peso (5 a 10%) se
associam à melhora significativa nos níveis
pressóricos e nos índices de controle metabólico
e reduzem a mortalidade relacionada ao DM.
O tratamento da obesidade deve iniciar com a
prescrição de um plano alimentar hipocalórico e
aumento da atividade física. Se o resultado for
insatisfatório, pode-se empregar medicamentos
como: noradrenérgicos, serotoninérgicos,
associação de ambos, ou inibidores da absorção
intestinal de gorduras, ou até a cirurgia bariátrica
(IMC ≥40 kg/m2
).
Hipertensão Arterial Sistêmica
Meta: <130x85 mmHg.
Além das medidas gerais, freqüentemente, é
necessário prescrever um ou uma associação de
medicamentos anti-hipertensivos:
1) Inibidores da enzima conversora de
angiotensina (1a
escolha): bem tolerados, não
afetam o metabolismo, associam-se à redução da
hipertrofia de ventrículo esquerdo e à proteção
renal ou antagonistas do receptor da
angiotensina;
2) diuréticos: indapamida, clorotiazídico;
3) β-bloqueadores (cardioseletivos);
4) bloqueadores de canais de cálcio (não
diidropiridínicos);
5) vasodilatadores diretos (associados a
diuréticos e/ou β-bloqueadores).
Dislipidemia
Metas: Colesterol total: <160 mg/dL, LDL:
<100 mg/dL, Colesterol não-HDL: <130 mg/dL;
HDL: >45 mg/dL TG: <150 mg/dL.
O tratamento da dislipidemia é extremamente
importante em pacientes diabéticos, devido à
elevada prevalência de doença coronariana.
Assim, as metas são aquelas preconizadas como
prevenção secundária em indivíduos não-
diabéticos.
O tratamento nutricional (↓ gordura saturada)
é fundamental e deve-se estimular a atividade
física (propicia ↓ triglicérides e ↑ HDL-C).
Devemos lembrar a interferência de alguns
medicamentos:
a) insulina: ↓ TG e ↑ HDL-C;
b) sulfoniluréias e metformina: melhoram o perfil
lipídico em função do controle glicêmico;
c) acarbose: ↓ TG;
d) glitazonas: ↓ TG mas ↑ LDL-C;
e) β-bloqueadores e diuréticos tiazídicos: ↑
colesterol e mais acentuadamente, ↑ TG.
Recomenda-se aguardar por cerca de 2 a 3
meses o efeito das medidas gerais (reduzir e
atingir o peso desejável pela adequação da
alimentação combinada ao aumento da atividade
física; normalização do nível glicêmico). Se o
resultado é insatisfatório, introduz-se o tratamento
medicamentoso.
Mudanças no estilo de vida
Glicemia de Jejum
≤110 mg/dL 110-140 mg/dL 141-270 mg/dL >271 mg/dL
Acarbose ou
metformina
Metformina ou
sulfoniluréiaHbA1C
Normal
HbA1C
Aumentada
Manter
conduta
Acarbose
Resposta inadequada
Acrescentar 2
o
Agente
Resposta inadequada
Acrescentar
3o
Agente
Insulina
ao deitar
Insulinoterapia
plena
Insulinoterapia
14. Diabetes Mellitus
EMV 14/23
São de primeira escolha, as estatinas e os
fibratos. As estatinas reduzem a síntese do
colesterol por inibição competitiva da enzima
HMG CoA-redutase. Os derivados do ácido fíbrico
diminuem a produção hepática de VLDL e ativam
a enzima lípase-lipoprotéica localizada no leito
capilar dos tecidos adiposo e muscular,
diminuindo os níveis de triglicérides.
Lembramos que estes medicamentos devem
ser iniciados juntamente com as medidas
alimentares quando ocorre: a) hipertrigliceridemia
>700 mg/dL, com risco de pancreatite aguda, b)
aumento isolado de LDL-C >200 mg/dL; c)
doença cardiovascular.
Aspirina
A aspirina está indicada:
1) em dose baixa (75 a 325 mg/dia), nos
diabéticos com complicações vasculares;
2) como estratégica de prevenção primária,
quando há pelo menos um dos fatores:
tabagismo, HAS, obesidade, micro e
macroproteinúria e história familiar de
coronariopatia; ou
3) como profilaxia auxiliar das doenças
cardiovasculares, em todo diabético acima dos 30
anos de idade.
Complicações Agudas
As principais e por ordem de freqüência de
ocorrência são: hipoglicemia, cetoacidose
diabética e estado hiperosmolar não cetótico.
1. Hipoglicemia
A hipoglicemia (<50 mg/dL) resulta de erro no
tratamento, envolvendo na maioria das vezes a
insulinoterapia e menos freqüentemente as
sulfoniluréias.
As manifestações clínicas da hipoglicemia são
causadas pela liberação de adrenalina
(manifestações neurogênicas) e por
manifestações do sistema nervoso central
(manifestações neuroglicopênicas).
Os sintomas adrenérgicos: sudorese,
taquicardia, tremor, palidez e sensação de mal-
estar, ocorrem primeiramente, antes da
hipoglicemia tornar-se profunda. É o momento em
que o paciente pode se socorrer ingerindo uma
fonte de açúcar, seguida pela realização de uma
refeição (uma das 3 principais ou complementar).
As manifestações do sistema nervoso central:
mudanças de personalidade ou de
comportamento, confusão, obnubilação,
convulsões e coma, desenvolvem-se depois da
glicemia arterial ter atingido valores muito baixos,
incapaz de fornecer a energia necessária para as
atividades cerebrais. Nesta fase o paciente
necessita do auxílio de outra pessoa e
freqüentemente de assistência médica em
Pronto-Socorro, correndo risco de lesão cerebral
definitiva ou até de morte.
Idealmente, antes de ser levado ao Pronto-
Socorro para receber glicose hipertônica
endovenosa (SG 50% - 20 a 40 mL EV), deveria
ser aplicado 1 mg de glucagon IM.
A hipoglicemia noturna pode ser manifestada
por pesadelos, sudorese noturna e cefaléia ao
levantar-se. Merece avaliação glicêmica e se
confirmada, é necessária redução da 2a
dose ou
dose noturna da insulina de ação intermediária.
Assim, todo paciente tratado com insulina e as
pessoas que convivem com ele devem estar
alertas para os sintomas e sinais de hipoglicemia
e saber como proceder; o paciente deve ter
consigo uma fonte de açúcar e cartão de
identificação como diabético.
No diabético tratado com insulina,
principalmente o de tipo 1, os níveis de insulina
(recebida exogenamente) não podem diminuir
com o exercício ou jejum (não previstos). Assim,
a utilização periférica de glicose não diminui ou
até aumenta (músculo em exercício) e a liberação
de AGL continua inibida. Mais, a produção
hepática de glicose estimulada pelo glucagon é
bloqueada pela ação insulínica.
Além do diabético tipo 1 ser muitas vezes
incapaz de impedir a ocorrência de hipoglicemia,
sua defesa com a liberação dos hormônios
contra-reguladores está prejudicada,
principalmente após 15 anos de doença; Esta
resposta deficitária torna o diabético tipo 1
vulnerável a hipoglicemias prolongadas, o que
pode causar dano cerebral definitivo e morte.
A terapia intensiva com insulina para o
diabético tipo 1 é desejada pois é capaz de
diminuir ou postergar o desenvolvimento das
complicações vasculares, todavia, se associa,
inevitavelmente, a maior número de episódios de
hipoglicemia. Tal fato acarreta menor percepção
da hipoglicemia pelo paciente (“hypoglycemia
unawareness”) por liberação mais tardia (ou a
níveis glicêmicos mais baixos) dos hormônios
contra-reguladores, o que não é desejado e
evitável por diminuição da ocorrência de
hipoglicemias. Decorre de um rebaixamento do
limiar de hipoglicemia, cujos mecanismos não
estão bem esclarecidos.
2. Cetoacidose Diabética (CAD):
Descompensação aguda do diabetes,
geralmente de tipo 1, que pode ocorrer como
forma de apresentação do DMT1, ou ser
precipitada por estresse, transgressão alimentar
ou omissão da insulina, ou resultar de período
mais longo de mal controle metabólico. É estado
catabólico caracterizado por deficiência grave de
insulina associada à elevação do glucagon e
demais hormônios contra-reguladores. Tal
ambiente hormonal causa:
- ↓ da utilização periférica de glicose e ↑ da sua
produção endógena (fígado)
- ↑ da lipólise
- ↑ da proteólise
15. Diabetes Mellitus
EMV 15/23
A história geralmente revela poliúria,
polidipsia, polifagia e perda de peso por período
de 3 a 7 dias. Tais sintomas são seguidos por
náuseas e vômitos (cetogênese), respiração
profunda ou de Kussmaul (compensação da
acidose metabólica), hálito cetônico (acetona),
fraqueza e diferentes graus de obnubilação. O
quadro clínico completa-se com diversos graus de
desidratação e de acidose metabólica.
O quadro é tanto mais grave quanto mais
evoluído estiver e, portanto, próximo do choque
hipovolêmico. Assim, a hipotensão arterial é um
sinal de gravidade deste quadro.
Figura 6 - Conseqüências metabólicas da falta de insulina agravada por excesso de glucagon
Os achados laboratoriais iniciais são:
hiperglicemia (menor que no estado
hiperosmolar), glicosúria, cetonemia, cetonúria e
↑ triglicérides plasmáticos. Apesar das perdas, os
níveis plasmáticos de Na+
e K+
são geralmente
normais, o Na+
na faixa limite inferior – normal e o
K+
, normal – limite superior. Na gasometria
arterial: pH baixo e bicarbonato diminuído;
osmolaridade sangüínea aumentada (menor que
no estado hiperosmolar). O hemograma é de
estresse ou infeccioso (se processo infeccioso for
a causa desencadeante).
Tabela 3. Dados laboratoriais iniciais nas descompensações mais graves do diabetes mellitus.
Plasma Cetoacidose Diabética
Estado Hiperosmolar não
cetótico
Glicose (mmol.L-1
/mg.dL-1
) 26/475 65/1166
Sódio (mmol/L) 132 144
Potássio (mmol/L) 4,8 5
Bicarbonato (mmol/L) <10,0 17
Uréia (mmol.L-1
/mg.dL-1
) 9/25 31/87
Acetoacetato (mmol/L) 4,8 ND
β-Hidroxibutirato (mmol/L) 13,7 ND
Ácidos graxos livres (mmol/L) 2,1 0,73
Lactato (mmol/L) 4,6 ND
Osmolaridade (mmol/kg) 310 384
ND: não dosado
Uremia
Perda N
Fraqueza Muscular
↓ Utilização glicose pelos tecidos
periféricos
Hemoconcentração
Hipotensão, Taquicardia
↑ Produção hepática
glicose
↑ Lipólise ↑ Proteólise
Hiperglicemia
Cetose
Glicosúria Desidratação
intracelular
Diurese
Osmótica ↓ Consciência
Perda água Perda de: Na, Cl, PO4, K, Ca,
Mg, N
Desidratação
Choque
Acidose Vômitos Cetonúria
Hiperventilação
(Kussmaul)
Perda de Água,
Na, Cl, K, H
Desidratação
↓ Insulina
↑ Glucagon
16. Diabetes Mellitus
EMV 16/23
Aos quadros clínico e laboratorial associar-se-
ão os dados da doença infecciosa ou não,
quando esta for a causa desencadeante.
O diagnóstico de CAD é de pouca
complexidade. A diminuição da consciência e a
presença de cetoacidose geralmente são de fácil
diferenciação da hipoglicemia num paciente
diabético em termos clínicos e laboratoriais
(glicemia capilar e detecção de corpos cetônicos
na urina).
A CAD é uma acidose com “anion gap”, isto é,
a fração aniônica não mensurável é maior que 16
mM/L (calculada pela fórmula: [Na+
pl + K+
pl] – [Cl-
pl
+ HCO3
–
pl]). As principais causas deste tipo de
acidose além da CAD, da qual se diferenciam em
aspectos clínicos e laboratoriais são: cetoacidose
alcoólica, acidose lática, insuficiência renal e
alguns envenenamentos (por ex.: glicol etileno,
álcool metílico).
Apresentamos os princípios básicos do
tratamento, sendo que a conduta em detalhe
encontra-se disponível nos setores de
atendimento de emergência de nosso hospital.
a) Reposição de líquidos e eletrólitos
A hipovolemia e o colapso vascular são causa
de morte na cetoacidose não complicada, sendo
a correção do déficit volêmico prioridade
terapêutica. A reposição volêmica isoladamente
(sem administração de insulina) pode diminuir os
níveis glicêmicos e dos hormônios contra-
reguladores, mas não reverte a acidose. A
administração de insulina concomitantemente à
hidratação é sempre necessária.
A deficiência média de líquidos em adultos é
de 3 a 5 L, que deve ser reposta em cerca de 12
horas em velocidade decrescente. Geralmente
inicia-se com infusão de solução salina ou
fisiológica (0,9%) na velocidade de 1 a 2 L em 2
h. Quando a glicemia atinge o valor ≤250 mg/dL a
solução salina deve ser substituída por solução
glicosada ou glicofisiológica a 5%.
Os níveis plasmáticos de K+
diminuem com o
início da ação insulínica, que estimula o retorno
do K+
para o espaço intracelular. Assim, após a
primeira hora de tratamento, tendo-se assegurada
função renal adequada, infusão de K+
diluído em
SF, em Y, deve ser iniciada. A velocidade de
infusão (nunca rápida) é determinada pela
concentração plasmática de K, que deve ser
verificada a cada 2 horas.
b) Terapia insulínica:
Todos pacientes em cetoacidose diabética
requerem insulina humana regular (ou análogo
correspondente), administrada por via
endovenosa preferencialmente, ou se não
possível, por via intramuscular. Geralmente,
administra-se uma dose inicial em bolo de 20 U
seguida por 6 a 10 U/h EV por meio de bomba de
infusão (ou 5 U/h IM). Este sistema de
administração de insulina deve ser mantido até
não haver mais cetonúria. A partir daí passa-se
ao esquema de insulina regular no SC a cada 4-6
h, quando o paciente já deve estar se
alimentando por V.O. Após 48 h neste esquema,
pode-se passar para o sistema de insulina
humana de ação intermediária, associada ou não
a de ação rápida, no SC.
c) Administração de bicarbonato:
Só está indicada em casos de acidose severa,
ou seja, pH ≤7,0 ou ≤7,1, que prejudica a
contratilidade miocárdica e esta, associada à
depleção de volume, pode causar o choque. A
infusão de bicarnonato de sódio deve ser feita
concomitantemente ao início do tratamento, na
metade da dose calculada, em cerca de meia
hora. Após meia hora do término da infusão,
deve-se repetir a gasometria, que geralmente
está melhorada, não havendo necessidade de
repetição da infusão.
3. Estado hiperosmolar não cetótico (EHNC):
É a descompensação metabólica aguda do
DM, principalmente do tipo 2. Este estado
catabólico é caracterizado por hiperglicemia e
desidratação extremas.
Em comparação com a CAD temos maior grau
de hiperglicemia e desidratação e ausência de
cetoacidose. Estas diferenças têm como fator
básico a maior produção de insulina pelas células
β nos diabéticos tipo 2 em relação aos de tipo 1.
A quantidade de insulina produzida seria
suficiente para impedir a lipólise mas não para
bloquear a produção endógena (hepática) de
glicose e estimular a utilização periférica de
glicose.
O EHNC freqüentemente ocorre em pacientes
mais idosos, quando uma doença intercorrente
causando estresse eleva os níveis dos hormônios
contra-reguladores, com aumento da produção
endógena de glicose, e prejudica a capacidade de
ingestão de fluidos. Com a diminuição da volemia
extracelular, a capacidade de excreção urinária
de glicose diminui, enquanto continua sendo
lançada glicose pelo fígado num espaço
circulatório diminuído. Temos então elevados
níveis de glicemia e de osmolaridade plasmática,
como mostrado na Tabela 2. Com o evoluir do
quadro ocorre disfunção do sistema nervoso
central (provavelmente por desidratação
intracelular) com agravamento da disposição para
ingerir água e conseqüentemente intensificação
da hiperglicemia, hiperosmolaridade e
desidratação. Acidose metabólica pode ocorrer
que é decorrente do acúmulo de ácido láctico. A
acidose lática então, ocorre no EHNC mais
freqüentemente que na CAD e resulta da
hipovolemia e hipoperfusão tecidual, que favorece
a glicólise anaeróbica nos tecidos e dificulta a
metabolização do ácido lático formado.
17. Diabetes Mellitus
EMV 17/23
O evento precipitante – por ex.: AVC, IAM,
pneumonia – pode dominar o quadro metabólico
ou vice-versa. O quadro clínico compõe-se
principalmente de desidratação intensa e
distúrbios neurológicos, que envolvem: diferentes
graus de diminuição da consciência, convulsões
focais ou generalizadas, hemiplegia rapidamente
reversível. Não há a respiração de Kussmaul
compensatória.
Os principais dados laboratoriais são os
elevados níveis glicêmicos e de osmolaridade
plasmática Tabela 2. Os níveis de uréia e de
creatinina se elevam devido à insuficiência pré-
renal. Se a osmolaridade plasmática não pode ser
medida diretamente podemos calculá-la com a
fórmula:
Osm. plasm = 2 [Na+
pl + K+
pl] + Glicosepl + Uréiapl
O diagnóstico é feito de forma relativamente
fácil diante de hiperglicemia extrema não
acompanhada de cetonemia. Maior desafio
diagnóstico é elucidar a causa precipitante e
verificar se há lesão cerebral.
Às vezes, o EHNC ocorre apenas por dose
insuficiente de insulina ou de sulfonilúreias,
principalmente se o paciente repõe a perda de
fluidos com refrigerantes. Lembramos ainda, que
o EHNC pode ser causado iatrogenicamente,
quando num paciente diabético administramos
algumas drogas (glicocorticóides, diuréticos),
alimentação enteral ou parenteral hipercalóricas,
infusão de solução glicosada hipertônica e diálise
peritoneal com solução contendo glicose.
O tratamento é semelhante ao da CAD,
devendo-se destacar dois aspectos: há
necessidade de maior reposição volêmica e
menor de insulina.
A reposição volêmica é o aspecto mais
importante do tratamento. O déficit pode atingir 10
L ou mais, dos quais os primeiros 2 a 3 L devem
ser infundidos rapidamente, com monitoramento
da pressão venosa central, nos pacientes mais
idosos. A metade da reposição de líquidos
necessária deve ser feita nas primeiras 6 h.
Geralmente é necessário iniciar com solução
salina a 0,45%, depois passa-se para a 0,9% e
finalmente, quando a glicemia atingiu 250 mg/dL
ou menos, deve-se substituí-la por SG ou SGF a
5%.
Com a reposição volêmica, há diminuição dos
níveis circulantes dos hormônios contra-
reguladores e é re-estabelecida a excreção renal
de glicose, com diminuição dos níveis glicêmicos.
Todavia, para normalização glicêmica é
necessária a administração de insulina via
endovenosa (preferencialmente) ou intramuscular
nas doses: 10 U em bolus e 5 a 10 U/h.
A reposição de potássio, após a primeira ou
segunda hora de tratamento, é necessária. Se
houver acidose lática deve-se corrigi-la com
bicarbonato de sódio.
No paciente mais idoso no EHNC e também
na CAD está indicada a prevenção da trombose
vascular.
O tratamento bem conduzido da CAD e do
EHNC evita suas principais complicações:
choque, edema cerebral, trombose venosa
profunda, infecções, síndrome do desconforto
respiratório.
Complicações Crônicas
Desde a disponibilidade da insulina e dos
antibióticos, o número de mortes pelas
complicações metabólicas agudas diminuiu, e a
morbidade e a mortalidade no DM tipo 1 e tipo 2
resultam geralmente das complicações
degenerativas da doença.
Tradicionalmente, as complicações
microvasculares compreendem a retinopatia,
nefropatia e neuropatia, enquanto as
complicações macrovasculares referem-se à
aterosclerose e suas seqüelas (AVC, IAM,
gangrena).
A relação entre as complicações diabéticas e
os distúrbios metabólicos do diabetes
(principalmente a hiperglicemia) ficou
estabelecida inequivocamente pelo Diabetes
Control and Complications Trial (DCCT). O
“DCCT” é um estudo prospectivo, multicêntrico,
norte-americano, designado para testar o efeito
de um melhor controle glicêmico no
desenvolvimento das complicações crônicas em
diabéticos tipo 1. Um grupo destes pacientes
passou a seguir o tratamento intensivo com
insulina, e outro o tratamento convencional
(geralmente 2 doses diárias de insulina de ação
intermediária). Após um período médio de
seguimento de 6,5 anos observou-se uma
diminuição de 40 a 60% na ocorrência ou
evolução das microangiopatias no grupo com o
tratamento intensivo em relação ao com o
tratamento convencional.
Pouco depois, outro estudo multicêntrico e
prospectivo no Reino Unido, envolvendo 5102
diabéticos tipo 2 por 10 anos (“UKPDS”),
observou que a redução de 1% no valor da HbA1C
e portanto a melhoria do controle glicêmico pelo
tratamento com anti-diabéticos orais e/ou insulina
causava redução de 35% das complicações
microvasculares e de 18% do infarto agudo do
miocárdio e que a diminuição da pressão arterial
para valor médio de 144/82 mmHg proporcionou
diminuição significativa da mortalidade e
morbidades vasculares.
Nas várias complicações diabéticas 3
mecanismos podem estar envolvidos:
• ↑ glicação de proteínas
• ↑ atividade da via do poliol
• alterações hemodinâmicas
18. Diabetes Mellitus
EMV 18/23
Glicação de Proteínas:
Na presença de hiperglicemia a glicose pode
ser incorporada à proteína, sendo os resíduos
lisina e valina os sítios primários, numa reação
não enzimática. As proteínas assim glicadas têm
sua estrutura alterada bem como distúrbios de
suas funções.
Todas as proteínas do organismo podem ser
glicadas. Um exemplo é a hemoglobina (HbA),
cuja glicação ocorre na valina terminal da cadeia
β, com alteração de sua carga elétrica de
superfície, que proporciona sua identificação
como HbA1C, por métodos de eletroforese ou de
cromatografia. Também sua função fica
prejudicada, diminuindo sua capacidade de liberar
O2 aos tecidos. A HbA1C, por suas características
estruturais específicas, pode ser quantificada e
fornece um índice do valor glicêmico integrado,
correspondente ao período de vida da hemácia,
que é normalmente de cerca de 100 a 120 dias.
Outro exemplo é o da albumina glicada ou
frutosamina, que também pode ser medida. Por
ser metabolizada mais rapidamente que a HbA1C,
reflete o controle glicêmico de período mais curto,
isto é, de cerca de 10 a 15 dias.
As proteínas glicadas não enzimaticamente
lentamente formam complexos protéicos
fluorescentes denominados “advanced glycation
end products” ou “AGES”. Os “AGES” ligam-se a
seus receptores nos tecidos causando danos. No
endotélio a presença dos “AGES” causa ativação
de macrófagos, liberação do TNF-α, citocinas e
fatores de crescimento com espessamento de
parede, diminuição de óxido nítrico (NO) com
menor resposta vasodilatadora, aumento da
permeabilidade. Temos assim, a importante
conseqüência, da disfunção do endotélio em
geral.
Alguns outros exemplos de disfunções de
proteínas glicadas: o colágeno glicado é mais
insolúvel e mais resistente à digestão pela
colagenase, podendo contribuir para o
espessamento da membrana basal capilar; a
glicação da parede da hemácia favorece a
hemólise e diminui sua capacidade de se
deformar e, portanto, seu transporte de oxigênio
aos tecidos; a glicação da mielina contribui para a
diminuição da condução nervosa; a glicação da
parede dos leucócitos pode causar diminuição
das funções dos granulócitos: quimiotaxia –
diapedese – fagocitose – ativiade bactericida e
dos linfócitos T e B; e a glicação do fator de von
Willebrand contribui para a aumentada agregação
plaquetária observada no diabético mal
controlado.
Ainda, as proteínas glicadas podem se tornar
antigênicas desencadeando a formação de
anticorpos e reação inflamatória.
A aminoguanidina é agente antioxidante que
bloqueia a glicação das proteínas (estudos
experimentais).
Via do Poliol:
Com a elevação dos níveis glicêmicos há
aumento de atividade desta via. A aldose
redutase está presente na retina, papilas renais,
cristalino, células de Schwann e aorta. O acúmulo
de sorbitol nos tecidos, principalmente naqueles
cuja entrada de glicose é independente da
insulina, provoca entrada de água nas células,
uma vez que é molécula osmoticamente ativa. Há
inibição da Na+
/K+
ATPase e diminuição de mio-
inositol. Observa-se então, diminuição da
velocidade de condução nervosa seguida por
degeneração da mielina da fibra nervosa. Ainda,
a frutose também se liga não enzimaticamente às
proteínas, com os mesmos danos causados pela
glicose.
Têm sido sintetizados inibidores da aldose
redutase, que, se administrados no início da
neuropatia, induzem melhora sintomática e da
função da fibra nervosa.
Distúrbios Hemodinâmicos:
Por seu efeito osmótico, a hiperglicemia atrai
água, aumentando a pressão hidrostática no leito
dos capilares (principalmente dos glomérulos
renais), o que por sua vez aumenta a filtração de
proteínas e macromoléculas através da
membrana basal capilar (e mesângio), com
espessamento da mesma.
Mais recentemente, foi proposta uma via
comum para os mecanismos antes descritos,
causadores das complicações crônicas do
diabetes: a produção de superóxido (O2
-
) pela
célula endotelial. A hiperglicemia por meio do
GLUT 1 (independente da insulina) na célula
endotelial, eleva a concentração de glicose desta,
com estimulação da glicólise e da cadeia de
transporte de elétrons na mitocôndria, e produção
aumentada de O2
-
. Este, per se ou por indução de
outras alterações como: formação do ânion
peróxi-nitrito (ONOO-
) e depleção do NO (fator de
vasodilatação produzido no endotélio), causa
ativação da via do poliol, da formação dos
“AGES”, do fluxo da hexosamina e da reação
inflamatória com liberação de citocinas e
disfunção endotelial. Todos estes mecanismos,
finalmente, causam as complicações crônicas do
DM.
Felizmente, medicamentos de que dispomos e
que são utilizados no tratamento dos diabéticos
atuam beneficamente também como
antioxidantes: as tiazolinedionas (↓ resistência à
insulina), diminuindo a formação do ONOO-
; as
estatinas (↓ síntese de colesterol), aumentando
os níveis de NO e diminuindo os de O2
-
; os
inibidores da enzima conversora da angiotensina
(IECA) e os bloqueadores dos receptores da
Aldose Sorbitol
Glicose Sorbitol Frutose
Redutase Desidrogenase
19. Diabetes Mellitus
EMV 19/23
angiotensina-1 (anti-hipertensivos). A vitamina E
é também um anti-oxidante, atuando como
inibidor da peroxidação dos lípides. Lembramos
que todos estes medicamentos atuam numa
determinada reação entre as múltiplas
formadoras dos radicais livres oxidantes. Daí,
contribuem para diminuir a evolução das
complicações crônicas, mas não para impedir sua
ocorrência.
1. Aterosclerose
O DM é um fator de risco para a aterosclerose,
particularmente na mulher. As complicações
macrovasculares: infarto do miocárdio (IAM),
acidente vascular cerebral (AVC) e gangrena em
membros inferiores, são responsáveis por 80%
das mortes dos diabéticos tipo 2, 60% sendo
atribuíveis a doença isquêmica do coração. As
síndromes ateroscleróticas nos diabéticos não se
distinguem clinicamente daquelas em não-
diabéticos, todavia, ocorrem de forma mais
precoce e intensa nos primeiros, além de ser
mais elevada a incidência de IAM silencioso nos
diabéticos.
Mecanismos patogenéticos da aterosclerose:
• Fatores genéticos predisponentes;
• Dislipidemia: 1) ↑ triglicérides séricos por:
fatores genéticos, excesso de carboidratos na
alimentação, deficiência de insulina; 2) ↑
colesterol total e da fração LDL séricos por:
fatores genéticos, excesso de gordura
saturada na alimentação, glicação e
peroxidação da LDL que se acumula e se
torna aterogênica; 3) ↓ HDL colesterol sérico,
por glicação que acelera seu catabolismo.
• Distúrbios da coagulação sangüínea: há
ativação da mesma por aumento da
agregação plaquetária, do fator de von
Willebrand (ambos por efeito de sua glicação)
e do inibidor do ativador do plasminogênio 1
(PAI-1) (liberado do tecido adiposo – DM tipo
2 obesos).
• Disfunção endotelial (radicais livres oxidantes).
Está indicado o uso do ácido acetil-salicílico
(AAS) na dose de 100 mg/dia nos diabéticos a
partir dos 30 anos de idade; a dose diária é
aumentada para 200 mg quando há
macroangiopatia manifesta.
* Recomenda-se leitura complementar em livros
de Patologia e Medicina Interna.
2. Nefropatia
A nefropatia diabética é responsável por
porcentagem significativa de pacientes em regime
de diálise renal crônica, sendo nos Estados
Unidos de cerca de 50%. É a principal causa de
morte dos diabéticos tipo 1.
O quadro histopatológico é de
glomeruloesclerose difusa ou nodular (Doença de
Kimmelstiel-Wilson): espessamento de membrana
basal dos capilares glomerulares, depósito de
macromoléculas no mesângio, proliferação do
mesângio, hialinose das arteríolas glomerulares
aferente e eferente.
A história natural da nefropatia diabética é
resumida na Tabela 4.
Tabela 4. Curso clínico da nefropatia diabética.
Anos após início
do diabetes
Curso Clínico
0
Aumento de volume e função dos rins, microalbuminúria reversíveis pelo tratamento
insulínico meticuloso
2
Espessamento da membrana basal glomerular e aumento da matriz mesangial
10-15
Período silencioso: sem proteinúria; microalbuminúria pode estar presente,
especialmente após exercício físico (>30 µg/min)
10-20
Proteinúria intermitente inicialmente e depois, persistente (>0,5 g/24 h), indicativo
de início do declínio contínuo da função glomerular
>15
20
Azotemia que tem início em média após 17 anos de diabetes
Período urêmico: podem estar presentes retinopatia, hipertensão e síndrome
nefrótica
Assim, clinicamente, a nefropatia diabética
manifesta-se como: ↑ microalbuminúria →
Síndrome Nefrótica → IRC, sendo os controles
glicêmico e pressórico de fundamental
importância para retardar o seu início e evolução.
Os principais mecanismos patogenéticos são:
hiperperfusão renal (inicial), glicação de proteínas
no endotélio e mesângio glomerulares e fatores
genéticos.
A administração de um dos inibidores da ECA
ou do receptor da angiotensina em diabéticos
normotensos e com aumento da microalbuminúria
tem sido benéfica em lentificar a diminuição da
função renal e em diminuir a excreção urinária de
albumina. Estes medicamentos também são os
de primeira escolha para o tratamento da
hipertensão arterial; a pressão arterial não deve
ultrapassar 130x85 mmHg.
Quando o clearance de creatinina cai abaixo
de 20 ml/min, deve-se iniciar o tratamento
dialítico: via peritoneal, contínuo,
ambulatorialmente, se não há perspectiva de
transplante renal; ou hemodiálise pré-transplante
20. Diabetes Mellitus
EMV 20/23
renal. Alguns pacientes toleram bem o tratamento
dialítico crônico, mas, para muitos a qualidade de
vida fica prejudicada pelas complicações
cardíacas, vasculares periféricas ou
oftalmológicas. Em alguns Centros a taxa de
sobrevida de 5 anos após o transplante renal é
tão alta quanto 65% e a de 10 anos aproxima-se
de 45%.
* Recomenda-se leitura complementar em livros
de Patologia e Medicina Interna.
3. Retinopatia
Embora, o diabetes seja a principal causa de
cegueira no adulto, nos Estados Unidos, o risco
de cegueira num paciente diabético é pequeno,
provavelmente menor que 10%. Quase todos
diabéticos tipo 1 têm alguma manifestação de
retinopatia após 15 anos de doença e 67%
apresentam retinopatia proliferativa após 35 anos
de diabetes.
A retinopatia diabética é classificada em dois
estágios evolutivos: a retinopatia não-proliferativa
(também denominada de simples ou
“background”) e a proliferativa, cujas lesões são
apresentadas na Tabela 5.
Tabela 5. Lesões de retinopatia diabética.
Não Proliferativa Proliferativa
↑ Permeabilidade capilar Neovasos
Dilatação e obstrução
capilares
Cicatrizes (retinite
proliferante)
Microaneurismas Hemorragia vítrea
“Shunts” arteriovenosos Descolamento retina
Veias dilatadas
Hemorragias
Exsudatos algodonosos
Exsudatos duros
As lesões da retinopatia têm início e evoluem
impulsionadas pelas tentativas do organismo
suprir O2 necessário ao tecido retiniano. A
retinopatia proliferativa é quadro grave, evoluindo
para a cegueira dentro de 5 anos de sua
instalação em 40% dos diabéticos tipo 1 e em
60% dos diabéticos tipo 2.
Os principais mecanismos patogênicos
envolvidos são: fatores genéticos, glicação de
proteínas, ativação da via do poliol, liberação de
fatores de crescimento e disfunção endotelial.
O diagnóstico da retinopatia inicial (vasos
dilatados e tortuosos, microaneurismas) é
facilitado pela realização do exame fundoscópico
acompanhado da angiografia com fluoresceína.
Deve-se ter como objetivo um bom controle
glicêmico para se retardar o início e a evolução
da retinopatia. Uma vez diagnosticada, deve-se
continuar buscando o melhor controle glicêmico
possível, e o paciente deve ser também
acompanhado pelo oftalmologista. O tratamento
de fotocoagulação da retina com laser é
atualmente preconizado já na fase de retinopatia
pré-proliferativa. Com este tratamento há
destruição da área hipóxica, deixando de haver
os estímulos para oxigenação da mesma e
diminuindo as necessidades de O2 do tecido
retiniano como um todo. Em caso de hemorragia
vítrea está indicada a vitrectomia desde que não
haja retinopatia proliferativa avançada.
* Recomendamos leitura complementar em livros
de Patologia e Medicina Interna.
4. Neuropatia
Aproximadamente 7 ou 8% dos diabéticos tipo
2 apresentam neuropatia no momento do
diagnóstico, o que aumenta para 50% após 25
anos de doença. A neuropatia autonômica, nas
suas várias formas de expressão, é
subdiagnosticada, sendo a impotência sexual a
das mais freqüentes e de manifestação mais
precoce nos diabéticos de tipo 1 e tipo 2. Deve-se
ressaltar que nos diabéticos tipo 2 a impotência
sexual resulta freqüentemente da neuropatia e
aterosclerose (macroangiopatia).
Consideram-se três formas estabelecidas de
neuropatia diabética:
a) Mononeuropatia
b) Polineuropatia Periférica e Simétrica
c) Neuropatia Autonômica
a) A mononeuropatia diabética pode envolver
nervos periféricos e cranianos, causando paralisia
motora (exs.: mão e pé caídos, ptose palpebral)
unilateral. O componente vascular do nervo
parece ser o mais comprometido, causando
hipóxia do tecido nervoso. Comumente as
síndromes mononeuropáticas se resolvem
espontaneamente após alguns dias a algumas
semanas. Outras formas de manifestação:
- A radiculopatia é uma forma rara de dor da
parede torácica ou abdominal que pode
mimetizar herpes zoster ou abdômen agudo,
respectivamente.
- A amiotrofia diabética é caracterizada por
atrofia, dor e fasciculações dos músculos das
cinturas escapular e pélvica. Mais freqüente
mas, subdiagnosticada é a atrofia dos
músculos interósseos e das eminências tenar
e hipotenar das mãos e regiões
correspondentes dos pés. Pacientes com
esta forma de neuropatia geralmente têm DM
tipo 1 ou tipo 2 há pelo menos 20 anos.
b) A polineuropatia periférica e simétrica é a
manifestação mais comum de neuropatia
diabética periférica, havendo perda sensorial
ascendente nas extremidades: 1o
) membros
inferiores (em bota) e 2o
) membros superiores
(em luva).
No início, o paciente é geralmente
assintomático, apresentando diminuição da
velocidade de condução nervosa e às vezes,
também alterações ao exame neurológico
(hiporreflexia profunda, diminuição de um ou mais
tipos de sensibilidade).
Os sintomas mais comuns são parestesias –
dormência, formigamento e queimação – em
21. Diabetes Mellitus
EMV 21/23
membros inferiores, que pioram à noite. Dor pode
estar associada ou desenvolver posteriormente,
também se intensifica à noite (então ocorre em
repouso, se diferenciando da claudicação
intermitente), pode ser espontânea ou ser
desencadeada por estímulos mínimos, como o
toque do lençol. A dor pode ser muito intensa.
Com a evolução da neuropatia há
degeneração do nervo, com desaparecimento da
dor. Nesta fase o paciente está sujeito a sofrer
traumatismos em pele e articulações,
principalmente em pés, sem perceber, causando
calos, úlceras (MAL PERFURANTE PLANTAR) e
artropatia neuropática (ARTICULAÇÕES DE
CHARCOT). O principal mecanismo patogenético
envolvido é o da ativação da via do poliol
(hipótese metabólica).
Síndrome do pé diabético:
É conseqüência da insuficiência vascular
(macro e microangiopatias) e neuropatia
periférica e por sua freqüência e gravidade
merece ser ressaltada.
Devido à diminuição sensorial o pé sofre
continuamente traumas – desde pressões em
locais não habituais ao caminhar, sapatos não
bem adaptados, até o pisar sobre objetos
perfurantes. A pele mal irrigada facilmente se
rompe aos traumas.
Temos então a formação de úlcera, pouco
dolorosa, mas que pela insuficiência vascular é
de difícil cicatrização, evoluindo com freqüência
para infecção, que pode chegar à osteomielite
(recomenda-se avaliação por RX do pé diabético,
principalmente se há dificuldade maior de
cicatrização) e a gangrena, que necessita de
amputação de extensão variável .
O aspecto mais importante na conduta em
relação ao pé diabético é a sua profilaxia. Os pés
dos pacientes diabéticos devem ser observados
com freqüência em busca de pontos que estejam
sendo traumatizados, higienizados e hidratados.
Os calos devem ser removidos com lixas suaves
e as unhas cortadas em linha reta. Os sapatos
devem ser adequados (com palmilhas ou
ortopédicos). Deve-se proibir o andar descalço.
Idealmente, o paciente deveria ser acompanhado
por um podólogo. O pé diabético é talvez, das
complicações diabéticas, a mais prevenível,
usando medidas relativamente simples.
c) As manifestações de neuropatia autonômica
são várias, podendo resultar da desnervação
simpática ou parassimpática de qualquer órgão.
Diminuem muito a qualidade de vida do paciente.
O seu diagnóstico é subestimado devido à falta
de avaliação específica regularmente. Citaremos
as mais freqüentes:
Sistema genitourinário:
• Disfunção sexual masculina: (ejaculação
retrógrada/impotência sexual)
No diabético tipo 2 resulta geralmente da
neuropatia e vasculopatia. A neuropatia resulta da
destruição nervosa e falência de geração de NO,
fundamentalmente. Como tratamento, tem se
dado preferência aos vasodilatadores locais (ex.:
citrato de sildenafil) à prótese peniana.
• Bexiga neurogênica
Pode progredir sem sintomas outros além de
intervalos crescentes entre duas micções e
permanecer não-diagnosticada até ocorrer
infecção urinária ou retenção urinária de
repetição. O exame físico revela macicez
suprapúbica à percussão e menos comumente,
uma massa à palpação. O diagnóstico é firmado
por exame de R-X ou de cistometria; o quadro é
de uma bexiga de parede fina, distendida e
atônica. O tratamento é insatisfatório.
Inicialmente, pode-se estimular o esvaziamento
vesical, com a manobra de “Crede”, a cada 3
horas. Nos casos mais graves pode ser
necessária sondagem permanente. O risco de
infecção urinária é grande, sendo necessária
quimioterapia crônica.
Ambos distúrbios do trato genitourinário
ocorrem em até 75 a 80% dos pacientes
diabéticos com maior duração da doença.
Sistema gastrointestinal:
Sintomas gastrointestinais podem ocorrer em
3/4 dos diabéticos e pode acometer qualquer
porção do sistema.
• Gastroparesia diabética:
A desnervação vagal retarda o esvaziamento
gástrico e prejudica a secreção gástrica de HCl
causando empachamento pós-prandial, náuseas
e vômitos. Há também perda das contrações, que
propiciam a varredura de detritos e bactérias do
estômago e intestino delgado superior, permitindo
o crescimento bacteriano nestas regiões.
Os níveis aumentados de somatostatina na
deficiência de insulina podem ter implicação nesta
alteração motora. A metoclopramida é o
tratamento de escolha, aumentando o
esvaziamento gástrico e tendo um efeito central
antiemético. A cisaprida é uma terapia alternativa.
• Distúrbios do hábito intestinal:
Constipação ocorre em cerca de 2/3 dos
diabéticos. É geralmente intermitente e pode
alternar-se com diarréia. A diarréia é
predominantemente noturna, pode-se
acompanhar de incontinência fecal, por disfunção
do esfíncter anal e a esteatorréia é componente
menor. A diarréia pode ser desencadeada pelo
ato de alimentar-se, devido à exacerbação do
reflexo gastrocólico. Pode haver
supercrescimento bacteriano no intestino delgado
quando o tratamento com tetraciclina resulta
eficaz.
Lembramos que no paciente diabético ocorre
com maior freqüência a diarréia pela enteropatia
22. Diabetes Mellitus
EMV 22/23
glúten-induzida e por insuficiência pancreática
exócrina, sendo nesta última, componente de
destaque, a esteatorréia.
Para a constipação intestinal indica-se,
inicialmente maior ingestão de fibras e água e
atividade física e, posteriormente com a maior
gravidade do quadro, laxantes e lavagem
intestinal periódica. Comumente obtém-se boa
resposta à diarréia com loperamida.
Sistema cardiovascular:
• Taquicardia crônica:
A freqüência cardíaca se mantém elevada,
mesmo ao repouso; resulta de disfunção
parassimpática, que geralmente precede a
simpática.
• Hipotensão postural:
Resulta da insuficiência dos barorreceptores
(arco aórtico e seio carotídeo), da redução da
secreção de catecolaminas e da incapacidade de
aumentar a freqüência de pulso. É disfunção
simpática, predominantemente. O tratamento
envolve elevação da cabeceira da cama, uso de
meias elásticas, aumento da ingestão de sal e,
nos casos mais graves, prescrição de
fluorohidrocortisona (mineralocorticóide).
A disfunção cardíaca parassimpática pode ser
demonstrada pela medida das variações do
intervalo R-R ao ECG durante manobra de
Valsalva, ou respiração profunda, ou à mudança
brusca de posição: de decúbito dorsal para
ortostática. A disfunção cardiovascular simpática
pode ser avaliada pela medida da PA à mudança
de decúbito: posição supina para ortostática (tem-
se maior queda pressórica) ou a exercício
isométrico (tem-se menor elevação pressórica).
Diante da neuropatia diabética é fundamental
a prevenção das complicações inerentes, como
traumas em membros inferiores e infecções
urinárias. O melhor controle glicêmico melhora a
velocidade de condução nervosa. A neuropatia
dolorosa deve ser tratada com antidepressivos
tricíclicos (ex.: amitriptilina) ou carbamazepina, ou
mesmo fenitoína. Os inibidores da aldose
redutase parecem ser eficazes se introduzidos
bem no início do quadro de neuropatia,
prevenindo sua evolução.
5. Outras complicações:
− Catarata: é do tipo senil, que ocorre mais
precocemente e com maior freqüência nos
diabéticos de tipo 2. Sua freqüência nos
diabéticos tipo 1 tem sido relatada de 4 a 10%.
− Glaucoma: é de ocorrência mais elevada nos
diabéticos, principalmente de tipo 2.
− Dermopatias: manchas hipercrômicas em
pernas; “necrobiose lipoídica diabeticorum”;
piodermites; micoses.
− Miocardiopatia: há aumento do coração com
hipofunção (ICC), resultante de lesão dos
capilares miocárdicos. É difícil de ser diferenciada
de e muitas vezes se associa a outras causas
comuns de miocardiopatia nos diabéticos como:
aterosclerose e hipertensão arterial.
− Infecção Urinária: Nos diabéticos
acompanhados por nós e caracterizados por
serem predominantemente do tipo 2, do sexo
feminino e terem a doença de longa duração,
observamos 24,7% de bacteriúria significativa,
sendo 67,9% assintomáticas.
− Tireopatias: Em nosso meio verificamos a
elevada prevalência de 51,6% entre os diabéticos
ambulatoriais (vs 38,7% em pacientes não-
diabéticos). Houve predomínio dos bócios
nodulares atóxicos, seguido por hipotireoidismo
primário e menos vezes, hipertireoidismo.
Prevenção
Diabetes Mellitus Tipo 1:
Sabemos que é doença auto-imune, cujo
processo de destruição das células β completa-se
anos após seu início, assim, fornecendo um
período (janela) para se intervir. A identificação
de pessoas de risco pode ser feita pela
verificação de marcadores de susceptibilidade
HLA e de auto-anticorpos.
É essencial que a intervenção em crianças
“pré-diabéticas”, de resto saudáveis, seja isenta
de riscos e toxicidade consideráveis e simples o
suficiente para evitar interferência significativa na
qualidade de vida. Algumas estratégias adotadas,
que aguardam conclusões finais são:
antioxidantes: ex.: nicotinamida; insulinoterapia
em pequenas doses (repouso das células β).
Obs.: a imunossupressão com ciclosporina A foi
abandonada (efeitos adversos significativos).
Diabetes Mellitus Tipo 2:
Embora, este tipo de diabetes tenha sua
etiopatogenia menos conhecida que a do tipo 1,
sua prevenção envolve medidas saudáveis e ao
alcance de todos. Estudos prospectivos de
diferentes populações demonstraram que a
mudança para hábitos de vida recomendáveis:
alimentação saudável com manutenção de peso
normal, atividade física regular, ausência de
vícios como: tabagismo, alcoolismo, etc, é a mais
eficaz em reduzir a resistência à insulina e então
o desenvolvimento do diabetes. Medicamentos
que reduzem a resistência à insulina direta (ex.:
metformina e glitazonas) ou indiretamente
(acarbose) são auxiliares.
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