A experiência estética: da sensibilidade à justificação do juízo
1. III Dimensões da acção humana e dos valores
2. A dimensão estética
Análise e compreensão da experiência estética
Malangatana, Mural, (edifício do Centro de Estudos Africanos)
2. 2.1 A experiência
e o juízo estético
Sumário
Análise da Situação-Problema
Caracterização da experiência estética
Sensibilidade estética
A justificação do juízo estético: subjectivismo e
objectivismo estéticos
3. Problema
O que é a experiência estética?
Nesta unidade vamos estudar a dimensão estética
do ser humano e a natureza da Arte
>>>
4. Situação-Problema
1.Contemplação de uma imagem: Pietá, de Miguel Ângelo
2. Audição de Stabat Mater, de Pergolesi
3. Observação de outras representações (esculturas e
pinturas) sobre o tema
8. Pietá
Já lívido repousa em seu regaço.
Já não escuta, não vê, não ri, não fala.
Aquele que foi Seu filho, Ela o embala
Morto, alheia a tempo e espaço.
O mistério parou no limiar dos assombros.
Dos irados profetas, das rígidas escrituras
Sobra um Deus morto; e os únicos escombros
São a atónita aflição das criaturas.
Eles choram, vários, como vários são
Sua revolta e sua dor. Absorto,
O olhar da Mãe escorre, inútil, no chão.
Ela, o que chora? O Deus parado - ou o filho morto?
Reinaldo Ferreira
9. Guião de exploração
da Situação-Problema >>>
Observação da escultura
• Qual é o tema?
• Que tipo de sentimentos
exprimem as figuras?
• Que elementos da
composição justificam
esses sentimentos?
(dar atenção ao material, à
proporcionalidade e
expressividade das figuras, à
postura, aos pormenores …)
10.
11. Guião de exploração da Situação-Problema
Pietá
Já lívido repousa em seu regaço. Análise do poema
Já não escuta, não vê, não ri, não fala.
Aquele que foi Seu filho, Ela o embala
Morto, alheia a tempo e espaço.
O mistério parou no limiar dos assombros.
Dos irados profetas, das rígidas escrituras • Qual é o tema?
Sobra um Deus morto; e os únicos
escombros
São a atónita aflição das criaturas.
• Que tipo de
Eles choram, vários, como vários são sentimentos exprime?
Sua revolta e sua dor. Absorto,
O olhar da Mãe escorre, inútil, no chão.
Ela, o que chora? O Deus parado - ou o
• Que questões coloca?
filho morto?
Reinaldo Ferreira
12. Caracterização da experiência estética >>>
Miguel Ângelo representou a Mãe de Jesus com o corpo do filho
morto
A escultura foi encomendada pelo cardeal Jean de Bilheres para a
Capela dos Reis de França (Basílica de São Pedro, Vaticano)
Observámos diferentes formas
de representação de um drama
da existência (escultura, música,
poesia)
Os seus autores usaram meios
diferentes para retratar a emoção
sentida por Maria, Mãe de Jesus
Van Gogh, Pietá
13. Caracterização da experiência estética
Apesar de se tratar de uma obra de arte sacra, e de
representar a morte de Cristo (um momento importante do
Cristianismo), a Pietá pode ser interpretada como uma
representação simbólica do sofrimento de todas as mães
perante a morte de um filho
A beleza formal da escultura estimula a nossa sensibilidade,
provocando um estado afectivo paradoxal: somos ao mesmo
tempo tocados pela dor e atraídos pela beleza da obra
A este tipo de experiência chamamos experiência estética
aos objectos capazes de a suscitar, objectos estéticos
14. Experiência estética
É um estado afectivo de agrado e de prazer
suscitado pela apropriação subjectiva de um
objecto, seja a contemplação da natureza, seja
a criação ou a contemplação de uma obra de arte
16. Objecto estético
O termo usa-se em dois sentidos:
• em sentido objectivo designa
as obras de arte ou elementos da
natureza capazes de provocarem
uma experiência estética
• em sentido subjectivo (no
contexto da linguagem estética),
designa as representações
mentais dessas obras de arte
Míron (escultor grego, século V a.C.) -
Discóbolo (cópia) ou desses objectos naturais
17. Tipos de Atitudes
Quando nos colocamos perante os objectos podemos assumir:
• Uma atitude técnica, quando os “olhamos” como algo útil
• Uma atitude teórica, quando procuramos compreender
• Uma atitude religiosa quando os “olhamos” como sinais
ou símbolos de uma outra realidade
• Uma atitude estética, quando os “olhamos” para sentir
simplesmente o prazer do acto de observar sem
qualquer outra finalidade
18. Atitude estética
Atitude estética
é a atitude
desinteressada,
fixada apenas
no sentimento
de prazer
proporcionado
pela percepção
do objecto
Alexander Calder, Lithograph Skybird - 1974
19. Experiência estética: texto de Kant
Apreender pela sua faculdade de conhecimento (…) um
edifício regular e conforme a fins, é algo totalmente diverso
do que ser consciente desta representação com a sensação
de comprazimento. Aqui a representação é referida
inteiramente ao sujeito e na verdade ao seu sentimento de
prazer ou desprazer. (…) A cor verde dos prados pertence à
sensação objectiva, como percepção de um objecto dos
sentidos; o seu agrado, porém, pertence à sensação
subjectiva, ao sentimento (…) do comprazimento.
Kant, Crítica da Faculdade de Julgar
20. Uma experiência estética pode ser suscitada
• Pela contemplação • Pela contemplação de objectos
da natureza, da sua beleza, estéticos, especialmente pela
do seu poder, grandiosidade contemplação da arte
e magnificência
A Pietá é um objecto estético
porque a sua contemplação
provoca uma emoção estética:
um sentimento de prazer que
pode fazer-nos esquecer
o dramatismo da situação
retratada na obra
21. Sensibilidade estética Chopin, por P. Klinge
Se nos colocarmos numa atitude
estética, perceberemos os objectos
como algo de que se gosta ou
não se gosta
Sensibilidade estética é a capacidade
de perceber e apreciar as formas,
em termos de um sentimento de agrado
ou desagrado
Embora seja uma capacidade natural,
a sensibilidade estética precisa de ser
educada e desenvolvida.
Ouvir música desenvolve
a sensibilidade estética?
22. Em síntese
1) Se adoptarmos uma atitude estética, olharmos os objectos
desinteressadamente, fixando-nos no sentimento de
agrado que o objecto nos dá, acedemos a uma experiência
afectiva a que chamamos experiência estética
2) Segundo Kant, a experiência estética não se centra no
objecto, nas suas características ou utilidade, nem tem
qualquer preocupação prática. Refere-se ao sentimento de
prazer ou de desprazer vivido pelo sujeito
3) Se educarmos a nossa sensibilidade estética, poderemos
aceder a experiências estéticas de grau mais elevado
24. Juízos
estéticos
Ao fazermos apreciações
dos objectos em termos de
beleza estamos a exprimir
um juízo estético
Juízo estético é
a expressão da
apreciação dos
objectos em termos
de beleza
Dali, Mulher nua ao espelho
25. Qual o fundamento do juízo estético?
Em que nos baseamos para
dizer «A Vénus de Milo é uma
escultura magnífica!», na
emoção que sentimos ou nas
suas características?
A cada uma destas alternativas
corresponde uma concepção
acerca da natureza dos juízos
estéticos: subjectivismo ou
objectivismo estético?
Milo, Vénus
26. Subjectivismo / Objectivismo
Subjectivismo estético Objectivismo estético
Os juízos estéticos são Os juízos estéticos são
subjectivos objectivos
▼ ▼
A beleza depende dos A beleza depende das
sentimentos de prazer propriedades dos objectos
provocados pela independentemente
contemplação do que sente o
desinteressada do objecto observador
estético
27. Subjectivismo estético - Kant
Se alguém me pergunta se acho belo um palácio que vejo
ante mim, então posso na verdade dizer: não gosto desta
espécie de coisas que são feitas simplesmente para
embasbacar, ou, como aquele chefe iroquês, a quem em
Paris nada lhe agrada mais do que as tabernas; posso além
disso, (…) recriminar a vaidade dos grandes, que se servem
do suor do povo para coisas supérfluas. (…) Pode-se
conceder-me e aprovar tudo isto; só que agora não se trata
disso. Quer-se saber somente se esta simples
representação do objecto [palácio] em mim é acompanhada
de comprazimento, por indiferente que sempre eu possa ser
com respeito à existência do objecto desta representação.
Kant, Crítica da Faculdade de Julgar
28. Subjectivismo estético
Gosto é a capacidade de
julgar o sentimento de prazer
ou desprazer que acompanha
a representação de um
objecto (Kant)
Óscar Niemeyer, Congresso Nacional ,Brasília
Ora, se o gosto é que julga
Para Kant o juízo estético
com base no sentimento de
• não expressa prazer ou desprazer, então,
características do objecto o juízo estético é determinado
• refere-se ao sentimento por um sentimento subjectivo
de prazer resultante da desinteressado de belo ou de
representação do objecto sublime
29. Segundo Kant,
O valor estético dos objectos depende do sentimento de
prazer que a sua contemplação provoca
(chamamos a isso subjectivismo estético)
Afirmar «A música de Mozart é bela» significa que:
• Ouvi-la produz comprazimento
(sentimento de prazer)
• Esse sentimento não depende
de nenhum interesse prático
no objecto
• A beleza designa o sentimento
de prazer provocado no sujeito
30. O belo é universal
O belo é o que é representado sem conceitos como objecto
de um comprazimento universal. (...) Aquilo a respeito de cujo
comprazimento alguém é consciente de que é nele próprio
independente de todo o interesse, isso ele não pode ajuizar
de outro modo senão que tem de conter um fundamento de
comprazimento para qualquer um (…). Consequentemente,
tem que se atribuir ao juízo de gosto, com a consciência da
separação nele de todo o interesse, uma reivindicação de
validade para qualquer um, sem universalidade fundada sobre
objectos, isto é, uma reivindicação de universalidade
subjectiva tem de estar ligada a esse juízo.
Kant, Crítica da Faculdade de Julgar
31. Conclusão
Para Kant, o juízo estético é
• Singular, pois refere-se apenas ao sujeito que
ajuíza
• Universalmente subjectivo, pois deve ser válido
para todos os sujeitos que julgam
desinteressadamente
Tese de Kant: o juízo estético é subjectivamente
universal
32. Imaginemos dois cenários diferentes
Rochedos audazes e
Um prado florido, proeminentes, por assim
serpenteado por um regato dizer ameaçadores,
de água cristalina, bordeado nuvens de trovões
de árvores frondosas, a acumulando-se no céu,
música dos pássaros... avançando com
relâmpagos e
estampidos…
33. Belo e sublime: diferenças
Estes cenários despertam o mesmo tipo de comprazimento?
Qual dizemos que é belo? Que tipo de comprazimento
proporcionará o cenário B?
No juízo estético sobre o belo, o comprazimento é tranquilo;
a afirmação “o prado é belo”, traduz um sentimento de agrado
positivo que mantém o espírito em serena contemplação
Ora, a contemplação de uma tempestade, como do cenário
B não proporciona o mesmo tipo de comprazimento
34. Texto de Kant
O ilimitado oceano revolto, uma alta queda d’água de um rio
poderoso, etc., tornam a nossa capacidade de resistência
de uma pequenez insignificante em comparação com o seu
poder. Mas o seu espectáculo só se torna tanto mais
atraente, quanto mais terrível ele é, contanto nos
encontremos em segurança; e de bom grado
denominaremos esses objectos sublimes porque eles
elevam as forças da alma acima da sua mediania, e
permitem descobrir em nós uma faculdade de resistência
de espécie totalmente diversa, a qual nos encoraja a
medir--nos com a omnipotência da natureza.
Kant, Crítica da Faculdade de Juízo
35. Sublime
Sublime significa elevado, superior,
grandioso, e a experiência do sublime
refere-se a um “sentir-se superado”
por algo que nos ultrapassa
ilimitadamente (Kant)
Sublime é aquilo em comparação com
o qual tudo o mais é pequeno
O sublime pode ser aquilo que é grande para além de toda
a comparação, ou seja, o infinitamente grande (sublime
matemático) ou aquilo que excede infinitamente as nossas
próprias forças (sublime dinâmico)
36. Experiência do sublime
Tamanha grandeza ou tamanha manifestação
de poder, atemoriza e atrai, proporcionando um
sentimento misto de:
Desprazer Prazer
▼ ▼
permite-nos descobrir
obriga-nos a nossa natureza racional
a reconhecer ou supra-sensível
a nossa (a capacidade de pensar tamanha
grandeza revela a existência
fraqueza em nós de uma natureza que
supera os padrões e medidas
finitas e limitadas)
37. Texto de Kant
Encontramos a nossa própria limitação na
incomensurabilidade da natureza e na insuficiência da
nossa faculdade para tomar um padrão de medida
proporcionado à avaliação estética do seu domínio, e
contudo também ao mesmo tempo encontramos na nossa
faculdade da razão um outro padrão de medida não
sensível que contém em si, como unidade, aquela própria
infinitude, e em confronto com a qual tudo na natureza é
pequeno;
>>>
38. >>>
por conseguinte, encontramos no nosso espírito uma
superioridade sobre a própria natureza na sua
incomensurabilidade: assim também a irresistibilidade
do seu poder nos dá a conhecer, considerados como entes
da natureza, a nossa impotência física, mas descobre
ao mesmo tempo uma faculdade de ajuizar-nos como
independentes dela e uma superioridade sobre a natureza,
sobre a qual se funda uma auto conservação de espécie
totalmente diversa daquela que pode ser atacada e posta
em perigo pela natureza fora de nós (…).
Kant, Crítica da Faculdade de Juízo
40. O belo é o sentimento de O sublime é, simultaneamente:
41. Conclusão
O sublime é, simultaneamente,
O belo é o • o sentimento de temor e de respeito
sentimento de suscitado pelo incapacidade da imaginação
para compreender aquilo que a excede em
comprazimento
poder e grandeza
suscitado pela
contemplação da • o sentimento de atracção e de sedução
pelo objecto (da natureza), cuja
forma do objecto representação determina o espírito a
pensar a própria natureza como totalidade
(ideia de Mundo) e a pensar-se a si mesmo
como natureza supra-sensível concretizada
através da moralidade
43. Objectivismo estético
O objectivismo
faz depender a
apreciação
estética de um
conjunto de
características
existentes no
objecto estético
Matisse, Dance
44. Segundo o objectivismo, quais são as características do objecto que
permitem considerá-lo como objecto estético?
Como identificá-las quando materializadas nas diferentes formas de arte?
Na arte contemporânea encontramos uma enorme
variedade de correntes estéticas e de estilos.
Os artistas nem sempre estão integrados em movimentos
estéticos nem subordinam as suas criações às regras formais
(cânones) definidas
O que é valorizado é a criatividade a capacidade de
imaginar novas formas para expressar uma emoção,
comunicar uma ideia, fazer pensar e até intervir
Cada criação tem as suas próprias regras
45. Objectivismo estético
Salvador Dali, The Weaning of Furniture
Nutrition
A beleza deste quadro depende das suas
características ou do sentimento de prazer
do espectador?
46. Como identificar o que é arte?
Como distinguir a boa da má?
O filósofo americano Monroe Beardsley (1915-1985)
identificou as qualidades estéticas gerais exigidas para se
poder falar de arte (seja qual for a forma de arte e das
diferenças de estilo)
Afirmando que a função da arte é produzir experiências
estéticas disse:
o valor de uma obra de arte depende da sua capacidade
de produzir experiências estéticas
47. Quais as características formais para que uma obra produza
uma experiência estética? Uma obra (de arte) deve ter:
Qualidades estéticas gerais:
unidade / intensidade / complexidade
Qualidades regionais específicas de cada forma de arte
APLICAÇÃO
Se usarmos a teoria objectivista de Beardsley como critério de
avaliação da Pietá, teremos de verificar se ela tem:
• as qualidades estéticas gerais (unidade, complexidade e
intensidade)
• as qualidades específicas da escultura (leveza formal, por
exemplo), necessárias para provocar uma experiência estética
49. Nesta pintura,
e do ponto de vista
do objectivismo
estético, que
características
justificam o juízo
“Esta pintura é uma
obra de arte?”
Chagall (1887-1985), Eu e a Aldeia
50. Organograma conceptual >>>
Objectos Atitude estética Obras de
naturais Contemplação pura e desinteressada arte
Experiência estética
Objectos Estado afectivo de agrado e de prazer Objectos
estéticos provocado pela contemplação da Natureza, estéticos
↓ pela criação (artista) e pela contemplação ↓
artística observador)
Juízos estéticos
Juízos de apreciação dos objectos estéticos
Objectivismo estético Subjectivismo estético
A beleza depende das A beleza depende dos sentimentos de
propriedades do objecto, não prazer provocados pela contemplação
do que sente o observador desinteressada do objecto estético
51. >>> Organograma conceptual
Subjectivismo estético
O belo depende dos sentimentos prazer provocados pela contemplação
desinteressada do objecto estético
Kant
Os juízos estéticos são juízos de gosto pois referem-se
ao comprazimento do sujeito e não ao objecto estético
Belo Sublime
O sentimento de comprazimento O sentimento
suscitado pela contemplação de temor/respeito/atracção
do objecto suscitado pela grandiosidade
ou pela força da Natureza
52.
53. Ninguém está
dispensado de
responder Exercício
As respostas podem
ser dadas:
1. On-line (através do
“Moodle”)
2. Em papel (fornecido
pelo professor)
O exercício será feito
em sala de aula.