O documento discute a teologia da missão cristã. Primeiramente, distingue entre os conceitos de "missão" e "missões", sendo que "missão" se refere à missão de Deus no mundo e "missões" se refere às ações missionárias das igrejas. Também explora os termos "protestantismo" e "evangélico" e suas diferentes acepções. Por fim, reflete sobre como a teologia cristã deve ser reinterpretada à luz da "missio Dei" e dos desafios do contexto atual.
3. Missão e evangelização merecem desde já um breve
esclarecimento. Conforme David J. Bosch, missão é um conceito
primário, diz respeito à missão de Deus e abrange tanto sua ação
na igreja quanto no mundo. Missões é termo secundário e
remete à ação missionária das igrejas, aos seus programas e
instituições, formas particulares de participação na missão de
Deus.
TEOLOGIA DA MISSÃO
4. Por isto, é recomendável utilizar o conceito missões com mais
cuidado para não obscurecer justamente a acepção principal, a
missio Dei. Já sobre o conceito de evangelização há um longo
debate na teologia da missão que não cabe aqui reproduzir.
Bosch distingue entre evangelismo, o ministério dirigido a
pessoas que se afastaram da fé cristã, e missão que teria o
sentido de dirigir-se a pessoas que desconhecem esta fé. Nos
meios evangélicos, os setores vinculados ao movimento de
Lausanne preferiram evitar o termo missão e usar apenas
evangelismo.
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6. Contexto histórico e cultural da missão protestante na América
Latina
Protestantismo ou protestantismos? Missão ou missões?
Estudiosos da história da igreja na América Latina são unânimes
neste sentido. Entendem que não existe um protestantismo, mas
vários e diferenciados protestantismos que se desenvolveram
segundo condições específicas, tanto em relação aos lugares de
origem quanto às formas que adotaram na nova realidade, na
qual vieram a se organizar como comunidades de fé e vida.
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7. A mesma questão se apresenta quando aqui vou usar o conceito
evangélico ou teologia evangélica.6 Outra questão é o pouco
interesse que a história das igrejas protestantes tem despertado
na historiografia latino-americana. Normalmente, se conhece
bem melhor a história da igreja católico-romana, ficando o
protestantismo como um capítulo menor ou até como apêndice
daquela.
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8. O termo protestante tem sua origem relacionada a um protesto
formal em defesa da fé evangélica dirigido ao arquiduque
Ferdinando, representante do irmão imperador Carlos V,
apresentado por príncipes alemães adeptos da Reforma de
Lutero na segunda Dieta de Espira (1529).
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9. Quanto ao termo evangélico, fundamental para a formulação de
uma teologia da missão, vou utilizá-lo em três acepções:
a) Como característica da doutrina que está de acordo com o
evangelho de Jesus Cristo;
b) Como vinculado ao movimento da Reforma da igreja católica
romana a partir da redescoberta da palavra de Deus no
século 16, liderado pelo monge agostiniano Martim Lutero
(1517).
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10. c) evangélicas são as comunidades e igrejas que se vinculam à
história da Reforma e das confissões de fé dela oriundas
(Confissão de Augsburgo de 1530 e outras). Como
desdobramento da vivência de fé e da reflexão teológica destas
comunidades temos a teologia evangélica, como uma realidade
igualmente plural e em constante desenvolvimento.
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11. Teologia e missão: Pressupostos para um novo paradigma
Há pelo menos cem anos a ciência moderna vem passando por
transformações nunca imaginadas na história da humanidade. E
o questionamento de seus pressupostos modernos é cada vez
mais evidente.
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12. Os inícios da modernidade podem ser estabelecidos na
passagem do século 15 para o século 16, mas seu modus
operandi mais específico se situa entre os séculos 17 e 19. Trata-
se de um longo período histórico em que a razão ocidental foi
tornando-se hegemônica no mundo, provocando mudanças
radicais em todos os âmbitos da vida e das sociedades, tanto
positivas quanto negativas.
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13. A teologia cristã – como hermenêutica da fé e da ação prática
que lhe corresponde – não podia ficar alheia a esta crise, cujas
proporções a custo vimos nos dando conta nas últimas décadas.
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14. Teologia diz respeito ao logos de um Deus que se revela a nós,
gratuita e incondicionalmente. Falar desse Deus e explicar em
palavras inteligíveis sua realidade inefável e sagrada; apresentar
a história de sua presença em meio aos povos e,
particularmente, na história do povo de Israel;
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15. Dar conta da esperança que Jesus de Nazaré anunciou e pela
qual viveu, entregando sua vida para depois ressurgir pela força
do Deus vivo; remontar à formação da comunidade que nasceu
da ressurreição de Jesus e passou a testemunhar o evangelho do
reino de Deus manifestado no Filho, sob o impacto da força do
Espírito Santo; ...
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16. ... tratar dos desdobramentos históricos das primeiras
testemunhas e comunidades, e mais tarde, das contradições e
comprometimentos com os poderes imperiais, sobretudo no
Ocidente pós Constantino (século 4); enfim, reinterpretar a
mensagem evangélica depois de dois mil anos de história cristã
sob a ótica da missio, isto é, do envio divino que compromete a
igreja e sua teologia;
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17. A teologia cristã é uma tentativa histórica e sempre aberta de
interpretar o evangelho de Deus e a caminhada da igreja
seguidora daquele Jesus de Nazaré. Nem sempre ela foi fiel às
suas fontes e a sua experiência fundante. Noutras
oportunidades, ela foi essencial para renovar a fé das origens e
persuadir o povo de Deus das mudanças necessárias e urgentes
que a própria mensagem estava a exigir.
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18. A teologia cristã é uma tentativa histórica e sempre aberta de
interpretar o evangelho de Deus e a caminhada da igreja
seguidora daquele Jesus de Nazaré. Nem sempre ela foi fiel às
suas fontes e a sua experiência fundante. Noutras
oportunidades, ela foi essencial para renovar a fé das origens e
persuadir o povo de Deus das mudanças necessárias e urgentes
que a própria mensagem estava a exigir.
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19. Num tempo como o nosso, vivemos talvez um kairós que
descortina diante de nossas perplexidades caminhos de
renovação, de construção de uma esperança solidária para
revolucionar o mundo, numa dimensão utópica que não se
consegue perceber a olho nu.
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20. A teologia cristã trabalha a partir da perspectiva da fé, é verdade
(Hebreus 11.1). Mas para ser ouvida e encontrar credibilidade,
ela precisará apresentar razões, argumentos e visões, que
tenham plausibilidade.
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21. Teologia prática e missão
Em que área da teologia situar a reflexão da teologia da missão?
A pergunta é pertinente porque não existe consenso nas
faculdades e escolas de teologia sobre este lugar epistemológico.
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22. O desenvolvimento da missiologia nas igrejas e contextos do
Terceiro Mundo ganhou expressão apenas em meados do século
20, na medida em que as igrejas se tornaram autônomas e o
colonialismo decaiu. É o que explica porque atualmente existem
tantos departamentos e cadeiras de missiologia, principalmente
na Ásia e África, e também na América Latina.
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23. O que se nota é que nas últimas quatro ou cinco décadas cresceu
o número de teólogos e teólogas que compreende sua tarefa
docente a partir dos desafios históricos que a realidade social na
América Latina lhes apresenta.
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24. Este momento histórico vivido pela teologia na América Latina
foi extremamente rico e mereceria um maior aprofundamento
sob a ótica da teologia da missão, com base em documentos e
literatura que a este altura já deve ser abundante.
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25. “A missão é o privilégio e a responsabilidade de todo o povo de
Deus, a missão é a responsabilidade “ecumênica” de todo o povo
de Deus, a missão é o anúncio e o tornar presente o Reino de
Deus, o Reino do shalom, da tsedaqah, da hesed – por parte de
todo o povo de Deus”.
Cf. MÍGUEZ BONINO, José. “Un silbo apacible y suave...” (1 Reyes 19:12): notas
autobiográficas de um recorrido pastoral y teológico. In: HANSEN, Guillermo, 2004, p.
431 (em negrito no original).
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27. A missão do amor eficaz precisa estar firmemente ancorada na
experiência e no testemunho bíblico fundamental, ou seja, que o
Deus em quem cremos é o Deus crucificado. A cruz e sua
memória perigosa nos auxiliam a dar-nos conta de que o poder
político e religioso não tem a última palavra na história nem na
vida cotidiana das pessoas mais humildes.
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28. A cruz como ponto de apoio crítico para uma teologia da missão
é o que posso encontrar aqui, mas atentando para sua
efetividade histórica na fé que impulsiona à ação, na fé que
motiva a fazer opções, a participar ativamente nos dramas
humanos das pessoas nos contextos em que vivemos.
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