Revista Ciência Equatorial (ISSN 2179-9563), foi uma publicação semestral do Colegiado de Farmácia, da Universidade Federal do Amapá - UNIFAP. Foi publicada de 2011 à 2013 e teve por objetivo divulgar a produção científica resultante das atividades de estudos, pesquisas, trabalhos técnicos e outros, dos professores, pesquisadores, estudantes de pós-graduação e graduação desta e de outras instituições de ensino e de pesquisa, tanto no Brasil como no exterior. Publicava artigos originais, notas prévias e trabalhos de revisão que cobriam todos os aspectos da ciência em suas diversas áreas.
O GÊNERO Bifidobacterium E SEUS BENEFÍCIOS À SAÚDE
1. CIÊNCIA EQUATORIAL ISSN 2179-9563
Artigo Original Volume 1 - Número 2 - 2º Semestre 2011
O GÊNERO Bifidobacterium: DOMINÂNCIA À FAVOR DA VIDA
Flávio Henrique Ferreira Barbosa1
; Andréia Marçal da Silva2
;Larissa Paula Jardim de Lima3
; Jacques Robert Nicoli4
RESUMO
Antes de 1960, as espécies de Bifidobacterium foram referidos coletivamente como "Lactobacillus bifidus".
Bifidobacterium é um gênero de bactéria anaeróbica, Gram-positivo, imóveis. São microrganismos dominantes
presentes na microbiota intestinal humana (estas residem no cólon) e outros sítios como: vagina e cavidade bucal de
mamíferos e de outros animais. Estes microrganismos estão associados a uma menor incidência de alergias e também
com a prevenção do crescimento de algumas formas de tumor. Algumas possuem utilização como um probiótico
promovendo benefícios à saúde humana.
Palavras-chave: Bifidobacterium, Probiótico, Microbiota intestinal.
THE Bifidobacterium GENUS: DOMINANCE TO FAVOR OF LIFE
ABSTRACT
Before 1960, the Bifidobacterium species were collectively referred to as "Lactobacillus bifidus". Bifidobacterium is a
genus of anaerobic bacteria, Gram-positive properties, non-motile. Are dominant microorganisms present in the human
intestinal microbiota (in the colon) and other sites such as vaginal and buccal cavity of mammals and other animals.
These microorganisms are associated with a lower incidence of allergies and also with the prevention of growth of
certain types of tumor. Some have use as a probiotic promoting human health benefits.
Keywords: Bifidobacterium, Probiotic, Intestinal microbiota.
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INTRODUÇÃO
1. O gênero Bifidobacterium
Características taxonômicas,
metabólicas e ecológicas
Bifidobacterium constituem o mais
recente grupo de bactérias reconhecidas como
adjuntos dietéticos. Segundo o Manual Bergey
(HOLT, 1994) estas bactérias são anaeróbias
estritas, imóveis, Gram-positivo, não
esporuladas, em forma de bastonete curvo,
caracterizados frequentemente por uma
bifurcação em forma de Y. De acordo com
Samona & Robinson (1991), a aparência das
colônias de B. bifidum varia em tamanho e
forma através do meio. As colônias na
superfície são principalmente convexas,
arredondadas e opacas, as colônias abaixo da
superfície são lenticulares e as colônias do
fundo da placa de Petri são grandes e
arredondadas, ou irregulares na forma. Sob o
microscópio, as bifidobactérias aparecem
pleomórficas. Bastonetes curvos ou retos, com
ou sem “bulbos” no final são numerosos, mas
muitos microrganismos mostram variação no
grau de bifurcação. Muitas formas de Y e V
bifurcados são observadas, e ocasionalmente a
bifurcação é vista nas duas extremidades. Em
alguns casos a bifurcação é tão profunda que
qualquer semelhança com bastonetes é
perdida. Além disso, as bifidobactérias
fermentam açúcares com produção
principalmente de ácido acético e ácido
láctico. O gás carbônico não é produzido.
Crescem a uma temperatura ótima de 37 -
41ºC e geralmente não crescem a 45ºC . O pH
inicial ótimo é de 6 a 7 e, abaixo de 4,5 ou
acima de 8,5 não há crescimento (SNEATH,
1986; LAROIA & MARTIN, 1990).
Bifidobactérias não são bactérias ácido
lácticas “verdadeiras” como Lactococcus ou
Pediococcus. As bifidobactérias produzem
tanto o ácido acético quanto o ácido láctico por
uma via incomum, não usual do sistema
metabólico da glicose, que resulta em uma
proporção teórica de 3:2 (acetato/lactato)
como metabólitos primários. Em adição,
pequenas quantidades de ácido fórmico e
etanol são frequentemente produzidos
(HUGHES & HOOVER, 1991). Glicólise é a
via usada pelas bactérias homofermentativas
para a conversão de glicose a ácido láctico,
enquanto que a via hexosemonofosfato leva a
produção de ácido acético e etanol pelas
bactérias heterofermentativas. Diferente disso,
as bifidobactérias possuem a enzima frutose-6-
fosfatofosfoquetolase (F6PPK) que quebra
frutose-6-fosfato em acetil-1-fosfato e eritrose-
4-fosfato.
Desde a sua descoberta, as
bifidobactérias foram classificadas como
pertencentes aos gêneros Bacillus,
Bacteroides, Bacterium, Tissieria, Nocardia,
Lactobacillus, Actinomyces e
Corynebacterium (TAMIME et al,1995).
Existem 30 diferentes espécies de
Bifidobacterium. Entretanto, para produção de
leites fermentados com fins terapêuticos e/ou
comerciais, somente cinco espécies têm sido
utilizadas (B. adolescentis, B. bifidum, B.
breve, B. infantis e B. longum).
Bactérias do gênero Bifidobacterium
têm sido classificadas como organismos
difíceis de serem pesquisados devido a
necessidade da presença de fatores de
crescimento encontrados no leite humano e
condições anaeróbias de crescimento.
Pesquisadores têm relatado que sob condições
laboratoriais, as bifidobactérias mostram
grande variabilidade na morfologia em
resposta à nutrientes, condições de
crescimento e quantidade de metabólitos
(VENTLING & MISTRY, 1993; MISRA &
KUILA, 1991; BALLONGUE, 1993). Embora
sejam consideradas anaeróbias, as
bifidobactérias variam consideravelmente na
tolerância ao oxigênio. Algumas são
anaeróbias obrigatórias enquanto outras
toleram oxigênio na presença de CO2. Os
requerimentos anaeróbios das bifidobactérias
são relacionados à cepa; cepas menos sensíveis
parecem possuir alguma atividade de catalase
que remove traços de H2O2. Peróxido de
hidrogênio inativa F6PPK, uma enzima chave
no metabolismo dos carboidratos. Devido a
essas características, as bifidobactérias não
foram reconhecidas como adjuntos dietéticos
efetivos sobre a microbiota fecal porque os
métodos de cultura usados não eram capazes
de detectar anaeróbios estritos (LAROIA &
MARTIN, 1990). Atualmente, resultados
positivos têm sido obtidos com o
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desenvolvimento de pesquisas em câmaras de
anaerobiose capazes de reduzirem a proporção
de O2 atmosférico para aproximadamente
0,001%.
Várias espécies de bifidobactérias são
habitantes naturais do intestino de animais de
sangue quente sendo descritas no homem, em
bovinos, aves, suínos e abelhas (RASIC &
KURMANN, 1983; MODLER et al., 1990).
Em crianças, a colonização do intestino por
Bifidobacterium spp. inicia-se dois a três dias
após o nascimento, passando a predominar a
microbiota intestinal (ISHIBASHI &
SHIMAMURA, 1993; HOOVER, 1993).
Propriedades benéficas
Segundo Driessen & Boer (1989),
alguns dos benefícios advindos do consumo de
produtos de leite fermentado por
Bifidobacterium incluem a melhora do
“flavor” e do valor nutricional de alguns
alimentos como aqueles destinados a bebês.
Também o controle de infecções intestinais em
crianças e idosos, atividade anticarcinogênica
e ativação do sistema imune têm sido
relacionados com o uso ou consumo desses
produtos. Normalmente a microbiota indígena
age sinergicamente com o sistema
imunológico do hospedeiro (por ex. produção
IgA) na proteção contra infecções por
patógenos intestinais (RASIC & KURMANN,
1983). Além destes efeitos, alguns autores têm
destacado a melhoria das condições gerais de
saúde após o consumo de produtos contendo
Bifidobacterium, melhoria na utilização da
lactose, especialmente para indivíduos
intolerantes, efeito hipocolesterolêmico,
desconjugação de ácidos biliares, inativação de
compostos tóxicos e ainda, alívio de sintomas
gastrointestinais em mulheres com síndrome
pré-menstrual (MINELLI et al., 1996;
GIBSON & ROBERFROID, 1995). Foi
demonstrado ainda que a administração de
Leite Bifidus a uma criança após tratamento
com penicilina, aumentou a população de
bifidobactéria nas fezes e suprimiu o
crescimento de Candida albicans (RASIC &
KURMANN, 1983).
Outro efeito benéfico de
Bifidobacterium inclui a atividade
antibacteriana que poderia ser explicada pela
produção de ácido lático e acético a partir de
açúcares, com diminuição do pH do meio e
consequentemente por uma ação antibacteriana
(MISRA & KUILA, 1991; GIBSON &
ROBERFROID, 1995); pela produção de
substâncias antimicrobianas (bacteriocinas)
contra bactérias Gram-positivo e Gram-
negativo (DRIESSEN & BOER, 1989;
GIBSON & ROBERFROID, 1995; DUNCAN
& EDBERG, 1995); pela competição por
nutrientes essenciais e pela ligação a sítios no
epitélio, minimizando ou inibindo a
colonização do trato intestinal por patógenos
(BERGOGNE-BEREZIN, 1989; LAROIA &
MARTIN, 1990; DUNCAN & EDBERG,
1995); pelo aumento do peristaltismo
estimulado pelos ácidos acético e lático
produzidos pelo Bifidobacterium, resultando
na remoção de patógenos do intestino
(LAROIA & MARTIN, 1990; DUNCAN &
EDBERG, 1995) como E. coli, Clostridium
spp, Proteus spp, S. dysenteriae, S. aureus, B.
cereus, Campylobacter jejuni e S. typhi
(WIJSMAN et al., 1989; MISRA & KUILA,
1992; O’SULLIVAN et al., 1992;
VIJAYENDRA & GUPTA, 1992;
ISHIBASHI & SHIMAMURA, 1993; LIM et
al. 1993); pela diminuição do potencial de
oxi-redução no ambiente intestinal, levando a
uma inibição do crescimento de patógenos
(DRIESSEN & BOER, 1989; DUNCAN &
EDBERG, 1995) e pela modulação da
produção de toxinas como no caso de
Clostridium difficile (CORTHIER, 1989).
Uso terapêutico
O uso terapêutico de uma cepa de B.
longum antibiótico-resistente pode ser
benéfico no tratamento de doenças por
radiação, por ajudar na “normalização” da
microbiota intestinal, inibindo a colonização e
crescimento de patógenos oportunistas. Além
disso, esta cepa tem sido usada com sucesso
no tratamento de enterocolite úlcero-necrótica
em crianças, disenteria aguda e doenças
intestinais agudas de etiologia indefinida
(KORSCHUNOV et al., 1996).
A administração de substâncias
antimicrobianas (antibióticos) pode causar
supressão de certos grupos de bactérias
benéficas, incluindo as bifidobactérias, que
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promovem resistência natural do hospedeiro
contra infecções. Um balanço intestinal
alterado pode resultar em desordens
intestinais, entretanto poucos estudos sobre
estas relações têm sido realizados,
principalmente devido às características não
patogênicas destes microrganismos benéficos.
A susceptibilidade das bifidobactérias aos
antibióticos deve ser conhecida não somente
na pesquisa de agentes seletivos para
enumeração de células viáveis em produtos
contendo bifidobactérias, mas também na
compreensão da alteração da microbiota
intestinal normal quando os antibióticos são
ministrados. As bifidobactérias são prevalentes
no intestino e podem prevenir a colonização
por bactérias patogênicas (LIM et al., 1993).
Pesquisas têm demonstrado que a
alimentação de crianças prematuras ou recém-
nascidas com um leite fermentado contendo
Bifidobacterium, promove um aumento na
população de Bifidobacterium no intestino e
uma marcante diminuição de produtos tóxicos
nas fezes (MISRA & KUILA, 1991). No
Japão, o uso de produtos de leite contendo
grande número de Bifidobacterium tem obtido
sucesso no tratamento de diarréia em crianças
(HOOVER, 1993).
Segundo a literatura consultada, o
consumo de “Leite bifidus” contendo grande
número deste microorganismo (107
UFC/g),
fornece ácido láctico L (+) , um fator
antibiótico e os próprios Bifidobacterium
vivos em adição a outros componentes
nutricionais. A ação combinada destes fatores
cria condições favoráveis para a proliferação
de Bifidobacterium no intestino, inibindo o
crescimento de microorganismos indesejáveis.
Viabilidade
A) No produto
A tecnologia de cultivo de
Bifidobacterium no processamento industrial
de leite e a utilização desta cultura na
produção de leite fermentado foi descrita
primeiro por SCHULER-MALYOTH et al. em
1968. Esforços sucessivos na otimização da
qualidade dos leites fermentados contendo
Bifidobacterium também foram relatados, mas
os produtos obtidos variaram entre uma cepa e
outra das culturas “starter”(COLLINS &
HALL, 1984; MISRA & KUILA, 1992).
Com relação à viabilidade, a maioria
dos produtos examinados mostraram um
constante declínio no número de células
viáveis de Bifidobacterium durante a
estocagem (NAGAWA et al., 1988; MODLER
et al., 1990; KLAVER et al., 1993; SHAH et
al., 1995; CHARTERIS et al., 1997),
chegando a uma redução de até 92,6%
(MEDINA & JORDANO, 1994). O
crescimento de B. bifidum é significativamente
retardado quando os valores de pH estão
abaixo de 5,0, portanto a escolha de uma cepa
de Bifidobacterium resistente à acidez é
importante na fabricação de leites fermentados
(BERRADA et al., 1991). Além disso, as
bifidobactérias são anaeróbias, exigentes,
requerendo fatores de crescimento específicos
e preferindo um baixo potencial de oxi-
redução para seu crescimento, portanto a
chave para uma efetiva fermentação por
bifidobactérias em produtos lácteos comerciais
é a adequada manutenção do ambiente
anaeróbio e manutenção do pH maior ou igual
a 5,0. Também é importante a manutenção de
bifidobactérias viáveis nos produtos (mínimo
de 109-10
UFC/100g) até o momento do
consumo, assegurando assim suficientes
quantidades (106-7
UFC/g) no lúmem intestinal
para que ocorram as atividades probióticas
benéficas (CHARTERIS et al., 1997). As
espécies mais comumente usadas em produtos
comerciais são B. longum e B. bifidum, embora
o cultivo de Bifidobacterium em leite seja
difícil, devido a deficiência de fatores de
crescimento essenciais para um adequado
desenvolvimento das diferentes cepas de
Bifidobacterium (KLAVER et al., 1993).
No passado, a necessidade de
monitorar a sobrevivência dos microrganismos
contidos em culturas “starter” foi
frequentemente negligenciada, o que resultou
em uma linha de produtos que chegava ao
mercado com baixo número de bactérias
viáveis. O inevitável fracasso de tais produtos
que não possuíam qualquer propriedade
terapêutica, levou muitos consumidores a se
colocarem como totalmente céticos quanto aos
efeitos benéficos, e somente uma proibição da
venda desses produtos duvidosos poderá
reconquistar a confiança dos compradores em
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potencial. No Japão, um padrão foi
desenvolvido pela “Fermented Milks and
Lactic Acid Bacteria Beverages Association”
que estabeleceu um nível mínimo de 107
células viáveis de bifidobactéria por ml nos
produtos recém-fabricados de leite (SHAH et
al., 1995).
B) No trato gastrointestinal
Espécies de Bifidobacterium
sobrevivem à passagem intestinal como
evidenciado por altos níveis fecais, mas
desaparecem dentro de poucos dias após a
última dose. Se consumidos diariamente, os
efeitos benéficos desses agentes
bioterapêuticos transientes podem ser
mantidos (RASIC & KURMANN, 1983;
BOUHNIK et al., 1992; HOIER, 1992;
MARTEAU et al., 1992a e 1992b; POCHART
et al., 1992; BOUHNIK, 1993; GIBSON &
ROBERFROID, 1995; ELMER et al., 1996).
Em trabalho desenvolvido por Berrada et al.
(1991), foi demonstrado que entre os leites
fermentados pesquisados apenas 1 continha
uma cepa resistente à acidez gástrica durante
os 90 minutos de trânsito gástrico ou à acidez
do produto durante seu prazo de validade (24
dias, pH final de 4,4 e mantido em temperatura
de 6°C). É importante a ingestão da bactéria
probiótica junto com alimentos e o
desenvolvimento de espécies ácido resistentes.
A capacidade de sobreviver a processos
digestivos no ambiente gastrointestinal reflete
a eficácia e a habilidade de proliferação, sendo
a persistência no intestino aparentemente não
tão importante para os agentes bioterapêuticos
quando estes são fornecidos diariamente
(ELMER et al., 1996).
Mercado
Atualmente, Bifidobacterium tem sido
utilizado em grande escala no Japão e na
Europa, adicionado em alimentos e bebidas em
proporções cada vez maiores. O Japão é líder
mundial no fornecimento de produtos
contendo bifidobactérias, produzindo cerca de
70 tipos de preparações. Mais de 50 delas são
produtos de laticínio incluindo cultura de leite,
bebidas, queijos, leite em pó, biscoitos e
sorvetes (SHAH et al., 1995). De acordo com
Hughes & Hoover (1991), a YOPLAIT e a
DANONE (Paris, França) têm introduzido
produtos que contém L. acidophilus e B.
bifidum em cerca de 11-12% de todo iogurte
vendido na França (CORRE et al., 1992).
Canadá, Itália, Polônia, Tchecoslováquia,
Inglaterra e Brasil também fabricam produtos
contendo Bifidobacterium (HUGHES &
HOOVER, 1991). Em 1978, a YAKULT Co.
lançou um iogurte fluido de Bifidus
denominado MilMilTM
que continha B. breve,
B. bifidum e L. acidophilus.
Dois fatores têm interferido na rápida
comercialização de produtos contendo
bifidobactérias na América do Norte: suspeita
da não existência dos efeitos benéficos
apregoados e dificuldade de produção e
utilização destas culturas em escala industrial.
Embora esteja aumentando a fabricação de
iogurtes e também de queijos contendo
bifidobactérias, o preço da cultura ainda é
muito alto, cerca de 5 vezes o preço de
culturas convencionais de lactobacilos.
Existem várias razões para isso: a bactéria é
mais difícil de ser manipulada (requerendo
condições de anaerobiose), é sensível à acidez
e requer tempo de geração muito mais longo
que as bactérias ácido lácticas “clássicas”
(CORRE et al., 1992). A maioria das culturas
comerciais utilizadas tendem a ser
moderadamente tolerantes ao oxigênio, porém
essa tolerância varia de cepa para cepa.
Recomenda-se o uso de outras culturas (por
ex. S. salivarius subsp. thermophilus),
entretanto a produção de ácido nestes produtos
pode interferir na manutenção da concentração
das bifidobactérias (ROBINSON, 1989).
Atualidades
Atualmente, temos descritas e
catalogadas 30 espécies de Bifidobacterium.
São elas: B. adolescentis, B. angulatum, B.
animalis, B. asteroides, B. bifidum, B. boum,
B. breve, B. catenulatum, B. choerinum, B.
coryneforme, B. cuniculi, B. denticolens, B.
dentium, B. gallicum, B. gallinarum, B.
indicum, B. inopinatum, (para o B. lactis ver
B. animalis), B.infantis, B. longum, B.
magnum, B. merycicum, B. minimum, B.
pseudocatenulatum, B. pseudolongum, B.
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pullorum, B. ruminantium, B. saeculare, B.
subtile, B. thermacidophilum e B.
thermophilum.
Atualmente, um dos principais focos da
indústria de laticínios em todo o mundo é o
desenvolvimento de novos produtos,
especialmente probióticos (ANTUNES, 2007).
Diversos trabalhos vêm reforçando a utilização
benéfica de Bifidobacterium como probiótico,
reduzindo assim problemas como infecções
intestinais, diarreias causadas por
antimicrobianos, dentres outros. Entretanto
muitos desses trabalhos precisam ser
cautelosos com algumas informações e
dosagens testadas antes que se possa atestar
com veemência que o microrganismo não
apresentou efeito.
Exemplos disso podem ser observados
a seguir onde, no caso da diarreia associada ao
uso de antimicrobiano (DAA), Souza & Jorge
(2012) observaram que em pacientes
hospitalizados em um hospital universitário
com diarréia, que se desenvolveu durante o
uso ou até sete dias após a suspensão de
antimicrobianos e receberam dieta padronizada
associada, três vezes ao dia, ao uso de
probiótico (Lactobacillus casei e
Bifidobacterium breve), a dosagem e
frequência administradas, não demonstraram
qualquer efeito no tratamento da diarreia
associada a antimicrobiano. Estudos similares
merecem ser realizados com doses maiores
destes ou de outros probióticos.
Outra preocupação diz respeito à
conservação das culturas probióticas já que o
Bifidobacterium é um microrganismo
anaeróbio o que aumenta a atenção em relação
à manutenção da viabilidade. Em um estudo,
culturas probióticas de Lactobacillus spp. e
Bifidobacterium spp. foram cultivadas em leite
em pó desnatado reconstituído 12%
adicionado de 3% (p/v) de mel pasteurizado.
Foram preparados controles sem mel. Todos
os cultivos mantiveram-se viáveis por 46 dias
a 7 °C atendendo o número mínimo exigido
pela legislação. O maior número de células
viáveis de L. casei-01 e L. casei Shirota (>9,0
log10 UFC.mL–1
) foi observado nos cultivos
contendo mel. A acidez titulável produzida por
estas culturas foi de 1,44%. O número de
células viáveis de L. acidophilus Sacco®
aos
46 dias em cultivos com mel foi
significativamente maior (p < 0,05) que nos
controles. Considerando todo o período de
estocagem, o mel exerceu efeito positivo
significativo (p < 0,05) apenas para as culturas
de Bifidobacterium. O menor crescimento e a
menor acidificação no 46º dia foram
observados nos cultivos de Bf. lactis Bb-12,
sendo de 7,63 log10 UFC.mL–1
e 0,61% de
acidez em presença de mel e 6,11 log10
UFC.mL–1
e 0,30% de acidez nos controles.
Diferentemente, os cultivos de Bf. lactis
Sacco®
atingiram contagens de 9,11 log10
UFC.mL–1
e produziram 1,11% de acidez
(MACEDO, 2008).
Três leites fermentados, o primeiro por
Str. thermophilus, o segundo por Bif. longum e
o terceiro por Lb. acidophilus e o leite
fermentado elaborado pela mistura de volumes
iguais dos leites fermentados, separadamente,
por Str. thermophilus, Bif. longum e Lb.
acidophilus tiveram seu pH, acidez titulável,
atributos sensoriais de sabor e acidez, e
contagens de células viáveis determinadas, ao
longo de 21 dias de estocagem a 4o
C. Não
houve diferença significativa (p<0,05) para os
atributos sensoriais entre o leite fermentado
elaborado por mistura e aquele contendo
apenas Str. thermophilus. O leite fermentado
por Str. thermophilus apresentou a maior
acidez e menor pH, enquanto o leite
fermentado por Bif. longum apresentou a
menor acidez e maior pH. As populações de
Str. thermophilus e Bif. longum mantiveram-se
constantes até 21 dias de estocagem, tanto nos
leites fermentados isoladamente como no leite
elaborado pela mistura, enquanto as
populações de Lb. acidophilus apresentaram
redução de um ciclo logarítmico
(ZACARCHENCO & MASSAGUER-ROIG,
2004).
Grosso e Favaro-Trindade (2004),
avaliaram a estabilidade de Bifidobacterium
lactis (Bb-12) e de Lactobacillus acidophilus
(La-05) nas formas livre e imobilizada em
alginato de cálcio, em leite e leite acidificado
(pHs 5.0, 4.4 e 3.8), e a estabilidade de B.
lactis imobilizado em iogurte (fermentado até
pH 4.2), durante 28 dias de estocagem
refrigerada. Também foi estudada a eficiência
de dois meios de cultura (ágar MRS
modificado e Reinforced Clostridial Agar,
acrescido de Prussian Blue) para enumerar B.
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lactis em iogurte. Ágar Lee foi usado para
enumeração de Streptococcus thermophilus e
Lactobacillus delbrueckii ssp. bulgaricus
quando B. lactis era enumerado no meio MRS.
Ambos os microrganismos, nas formas livre e
imobilizada, apresentaram uma taxa de
sobrevivência adequada nos leites
acidificados, uma vez que houve redução de
apenas um ciclo log, após 21 dias de
estocagem refrigerada. O número de células
viáveis de B. lactis imobilizado mostrou um
declínio gradual durante o período de
armazenamento do iogurte, passando de 108
ufc/ml até não ter mais contagem na diluição
10-1
. Quando as culturas não estavam em
equilíbrio, o meio MRS modificado foi mais
eficiente para a contagem de B. lactis em
iogurte. Em vista destes resultados pode-se
concluir que ambos os microrganismos podem
ser incorporados em leite e leite acidificados,
haja vista que a redução na população foi
pequena durante o período de armazenagem
estudado. A presença da cultura tradicional de
iogurte parece ter afetado negativamente a
sobrevivência de B. lactis e a imobilização não
proveu proteção às células, em nenhum dos
tratamentos estudados.
Tem-se dado muita atenção à utilização
de Bifidobacterium sp. em iogurtes devido às
suas excelentes propriedades terapêuticas e
nutricionais. Entretanto, é recomendado que,
baseado em testes in vitro e em humanos, cada
produto comercial indique qual a quantidade
mínima diária recomendada de ingestão para
que se obtenha os benefícios desejados à
saúde. Além da inerente dificuldade do
crescimento de Bifidobacterium sp em leite, há
uma necessidade de padronização de um
método de contagem confiável de
Bifidobacterium sp na presença das bactérias
do iogurte. Este trabalho avaliou o uso dos
meios M-MRS, MRS-NNLP e RCPB pH5,
visando a contagem do número de células de
Bifidobacterium animalis Bb12 na presença de
Streptococcus thermophilus e Lactobacillus
delbrueckii subsp bulgaricus após a
fermentação do iogurte. O meio M-MRS não
foi seletivo, apresentando crescimento de L.
delbrueckii subsp. bulgaricus. O meio MRS-
NNLP apresentou boa seletividade para B.
animalis Bb12, apesar de uma leve redução no
número de células ter sido verificada quando
comparado ao meio padrão MRS em cultura
pura. O meio MRS-NNLP foi considerado
uma boa opção para a contagem de B. animalis
Bb12 porque a diferença encontrada entre as
contagens em cultura pura foi bastante
pequena. O meio RCPB pH5 apresentou
crescimento diferencial de Bifidobacterium
animalis Bb12 em relação às bactérias do
iogurte e uma recuperação de células igual ao
meio padrão MRS, sendo considerado o
melhor meio de cultura deste estudo para a
contagem de Bifidobacterium sp na presença
das culturas do iogurte (MORIYA et al, 2006).
Seguindo por este mesmo caminho,
Fachin (2008) testou o meio de cultura RCPB
pH5. O meio tem sido considerado uma boa
opção para a contagem de Bifidobacterium em
iogurte. Entretanto, durante a estocagem
refrigerada do iogurte é extremante difícil a
contagem deste microrganismo devido ao
pequeno diâmetro desenvolvido pelas colônias
de Bifidobacterium neste meio, sendo que a
sua contagem somente se torna possível com o
auxílio de um estereoscópio. Outro meio,
MRS-LP, também tem sido recomendado para
a contagem de Bifidobaterium em iogurte. Este
estudo avaliou a suplementação do meio
RCPB pH5 com extrato de fígado desidratado
e com os sais KH2PO4, K2HPO4, FeSO47H2O,
MnSO4H2O e MgSO47H2O, visando melhorar
a diferenciação de Bifidobacterium em iogurte
durante a estocagem refrigerada e também
avaliou a contagem seletiva de
Bifidobacterium em iogurte usando o meio
MRS-LP. O meio MRS-LP apresentou a
mesma recuperação de células que o meio
RCPB pH5, usado como padrão, após 30 dias
de estocagem refrigerada do iogurte, sendo
considerado uma boa opção para a contagem
de Bifidobacterium em iogurtes durante a
estocagem refrigerada. O meio RCPB pH5
fortificado também apresentou a mesma
recuperação de células de Bifidobacterium que
o meio padrão RCPB pH5; entretanto, a adição
de extrato de fígado desidratado aumentou
consideravelmente o diâmetro das colônias de
Bifidobacterium, tornando a diferenciação
destas bastante fácil e confiável quando
comparadas à sua diferenciação no meio
RCPB pH5 sem a fortificação. A adição dos
sais (KH2PO4, K2HPO4, FeSO47H2O,
MnSO4H2O e MgSO47H2O) não exerceu
8. Ciência Equatorial, Volume 1 - Número 2 - 2º Semestre 2011 Página 22
influência no desempenho do meio RCPB pH5
(FACHIN et al, 2008).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os resultados obtidos em experimentos
com probióticos podem ser afetados por vários
fatores tais como: tipo de microrganismo
probiótico; método de produção; método de
administração; viabilidade da preparação;
condição do hospedeiro e condição da
microbiota intestinal (FULLER, 1995). De
acordo com O’Sullivan et al. (1992), existem
poucos dados consistentes cientificamente para
evidenciar os efeitos benéficos dos probióticos
incorporados em produtos comerciais. Isso
está relacionado a desenhos experimentais
insatisfatórios, análise estatística inadequada
dos resultados, fraca escolha da cepa
probiótica e controle de qualidade
insatisfatório da cultura e do produto. O
ceticismo existente em relação ao uso de
probióticos pode ser explicado em parte à
pretensões exageradas e “insubstanciadas”
usadas na propaganda e venda destes produtos.
A maioria dos artigos sobre seus efeitos
positivos têm sido publicados em folhetos
comerciais ao invés de jornais científicos.
Além disso, muitos microrganismos incluídos
nestes produtos não são viáveis nem têm sido
selecionados pelas propriedades benéficas
específicas (por ex. inibição de
enteropatógenos) ou pela capacidade de
sobreviver no trato gastrointestinal (por ex.
resistência ao baixo pH). Tannock (1984) apud
Fuller (1995) relata que “para cada artigo na
literatura científica que objetiva resultados
benéficos à partir da ingestão de leite
fermentado, um outro artigo fornece evidência
contrária”.
A única certeza dos pesquisadores é
que com o probiótico certo, administrado da
maneira correta e no tempo indicado, pode-se
obter o(s) efeito(s) benéfico(s) desejado(s).
Mais conhecimento de como agem os
probióticos e os melhores métodos de
administração, poderia nos capacitar a
selecionar cepas mais ativas e administrá-las
de forma que os resultados se tornassem mais
consistentes (FULLER, 1995).
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1 – Prof. Flávio Henrique Ferreira Barbosa, PhD
Biólogo / Professor Adjunto I
Colegiado Ciências Farmacêuticas
Universidade Federal do Amapá – UNIFAP
flavio.barbosa@unifap.br
2 – Profa. Andréia Marçal da Silva, PhD
Veterinária / Professor Adjunto II
Universidade Federal de São João Del Rey– UFSJ
3 – Larissa Paula Jardim de Lima Barbosa, BSc,
Bióloga / Especialista
Real Biológica Ltda.
4 – Prof. Jacques Robert Nicoli, PhD
Biólogo / Professor Titular
Departamento de Microbiologia
Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG