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Inatismo, empirismo e interacionismo/construtivismo: três concepções sobre o
desenvolvimento e a aprendizagem

                                                                            Juliana Zantut Nutti

Concepção inatista: o saber congênito
A busca por respostas começa na Antiguidade grega, com o nascimento do pensamento racional,
que busca explicações baseadas em conceitos (e não mais em mitos) como uma forma de entender o
mundo. Para os primeiros filósofos, a dúvida consistia em saber se as pessoas possuem saberes
inatos ou é se possível ensinar alguma coisa a alguém.
Chamada de Inatismo, essa perspectiva sustenta que as pessoas naturalmente carregam certas
aptidões, habilidades, conceitos, conhecimentos e qualidades em sua bagagem hereditária. Tal
concepção motivou um tipo de ensino que acredita que o educador deve interferir o mínimo
possível, apenas trazendo o saber à consciência e organizando-o. "Em resumo, o estudante aprende
por si mesmo", escreve Fernando Becker, professor da Faculdade de Educação da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) no livro Educação e Construção do Conhecimento.
A concepção inatista parte do pressuposto de que os eventos que ocorrem após o nascimento não
são essenciais e/ou importantes para o desenvolvimento. As qualidades e capacidades básicas de
cada ser humano  personalidade, valores, hábitos, crenças, forma de pensar, reações emocionais,
conduta social  já se encontrariam basicamente prontas e em sua forma final por ocasião do
nascimento, sofrendo pouca diferenciação e quase nenhuma transformação ao longo da existência.
O papel do ambiente é tentar interferir o mínimo possível no processo do desenvolvimento
espontâneo da pessoa.
As origens da concepção inatista podem ser encontradas, por um lado, na Teologia (o destino
individual de cada ser humano já estaria determinado pela graça divina) e, por outro, em um
entendimento errôneo de algumas contribuições da proposta evolucionista de Darwin, da
Embriologia e da Genética (as mudanças no desenvolvimento das espécies decorrem de variações
hereditárias em que o papel do ambiente é limitado).
Platão (427-347 a.C.) firmou posição a favor das ideias congênitas. Defendendo a tese de que a
alma precede o corpo e que, antes de encarnar, tem acesso ao conhecimento, o discípulo de Sócrates
(469-399 a.C.) afirmou que conhecer é relembrar, pois a pessoa já domina determinados conceitos
desde que nasce.
Platão (427-347 a.C.)
"Mas o deus que vos modelou, àqueles dentre vós que eram aptos para governar, misturou-lhes
ouro na sua composição, motivo por que são mais preciosos; aos auxiliares, prata; ferro e bronze
aos lavradores e demais artífices." Platão, no livro A República


Nesta perspectiva, a aprendizagem é considerada como um processo interno do sujeito (aquele que
aprende). O objeto do conhecimento (aquilo que é aprendido) é algo que o sujeito descobre. Por isso
se diz que esta vertente se caracteriza pelo primado do sujeito.
A concepção inatista gerou uma idéia de homem que produziu uma abordagem rígida, autoritária e,
sobretudo, pessimista para a educação de crianças e adolescentes: se o homem “já nasce pronto”,
pode-se apenas aprimorar aquilo que ele é ou virá a ser.
O ditado “pau que nasce torto morre torto” expressa bem a concepção inatista, que ainda hoje
aparece na escola, camuflada sob o disfarce das aptidões, da prontidão e do coeficiente de
inteligência (QI).

Concepção ambientalista/empirista: a absorção do conhecimento externo
A concepção ambientalista/empirista atribui um imenso poder ao ambiente no desenvolvimento e
aprendizagem humanos. O homem é concebido como um ser extremamente plástico, que
desenvolve as suas características em função das condições existentes no meio em que se encontra.
Para essa concepção, o conhecimento é algo que existe fora do sujeito. A realidade está fora do
indivíduo, localiza-se no ambiente, no meio, por isso se diz que esta vertente se caracteriza pelo
primado do objeto (ambiente).


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Esta concepção deriva do empirismo, corrente filosófica que enfatiza a experiência sensorial como
fonte do conhecimento e que determinados fatores encontram-se associados a outros, sendo possível
identificar, controlar e manipular essas associações.
Aristóteles (384-322 a.C.) apresentou uma perspectiva contrária à de Platão (como se vê no quadro
resumo, abaixo). Segundo ele, embora as pessoas nasçam com capacidade de aprender, elas
precisam de experiências ao longo da vida para que se desenvolvam. A fonte do conhecimento são
as informações captadas do meio exterior pelos sentidos. Ideias como essa impulsionaram o
empirismo, corrente favorável a um ensino pela imitação - na escola, as atividades propostas são as
que facilitam a memorização, como a repetição e a cópia.




      Aristóteles (384-322 a.C.)
"As virtudes, portanto, não são geradas em nós nem através da natureza nem contra a natureza. A
natureza nos confere a capacidade de recebê-las, e essa capacidade é aprimorada e amadurecida
pelo hábito." Aristóteles, no livro Ética a Nicômaco


"Os empiristas acreditavam que as informações se transformam em conhecimento quando passam a
fazer parte do hábito de uma pessoa", explica Clenio Lago, professor de Filosofia da Educação na
Universidade do Oeste de Santa Catarina (Unoesc), em São Miguel do Oeste. Absorvidos tal como
uma esponja retém líquido, os dados aprendidos são acumulados e fixados - e podem ser
rearranjados quando outros conteúdos mais complexos aparecem. A mente humana é definida como
uma tábula rasa, um espaço vazio a ser preenchido. "A criança é comparada à água, que pode ser
canalizada na direção desejada", diz Lago.
Nos séculos 16 e 17, em plena Idade Moderna, essa perspectiva ganha força com filósofos como
Francis Bacon (1561-1626), Thomas Hobbes (1588-1679) e John Locke (1632-1704). Do ponto de
vista dos empiristas, caberia à escola formar um sujeito capaz de conhecer, julgar e agir segundo os
critérios da razão, substituindo as respostas "erradas" absorvidas no contato com diversos meios (a

                                                                                                   3
religião, por exemplo) pelas "certas", já validadas pelos acadêmicos por seguirem os critérios
científicos da época.
Na Psicologia, o maior defensor da posição ambientalista é o norte - americano B. F. Skinner, que
elaborou uma teoria baseada na análise dos comportamentos observáveis do sujeito, desprezando a
análise de outros aspectos da conduta humana como o raciocínio, os desejos, as fantasias e os
sentimentos (Behaviorismo). Na concepção de Skinner e seus colaboradores, o papel do ambiente é
muito mais importante do que a maturação biológica, pois os estímulos presentes numa dada
situação levariam ao surgimento de determinados comportamentos.
Manipulando-se os elementos existentes no ambiente é possível controlar o comportamento dos
indivíduos: pode-se aumentar ou diminuir a freqüência com que os comportamentos aparecem,
através de esquemas de reforçamento que envolvem elogios (aumentar a freqüência de
comportamentos positivos) e punições (diminuir a freqüência de comportamentos negativos).
Nesta perspectiva, o ensino é visto como o planejamento e o arranjo das contingências de
reforçamento (elogios, notas, diplomas), as quais vão permitir a aprendizagem, que consiste em
obter mudanças no comportamento dos alunos, tendo em vista objetivos predeterminados.
Apesar dos séculos de distância, o fato é que algumas práticas empiristas seguem presentes no dia a
dia das escolas. "Até hoje, o conhecimento é visto por muitos como um produto que pertence ao
professor", explica Becker. Os especialistas formulam outra crítica à corrente: nem sempre ideias
simples dão elementos para compreender as mais complexas. Dito de outra forma, não basta
acumular informações para aprender.
Os efeitos nocivos da concepção ambientalista sobre a prática pedagógica estão relacionados a uma
ênfase exagerada na tecnologia educacional, em detrimento da reflexão filosófica sobre o papel da
educação.

Concepção interacionista: a tentativa de caminho do meio
Com inatismo e empirismo apontando para lados opostos ("O saber está no indivíduo" versus "O
saber está na realidade exterior"), o século 20 nasceu com uma tentativa de caminho do meio para
explicar o aprendizado: a perspectiva construtivista. De acordo com essa linha, o sujeito tem
potencialidades e características próprias, mas, se o meio não favorece esse desenvolvimento
(fornecendo objetos, abrindo espaços e organizando ações), elas não se concretizam.
A presença ativa do sujeito diante do conteúdo é essencial - portanto, não basta somente ter contato
com o conhecimento para adquiri-lo. É preciso "agir sobre o objeto e transformá-lo", como diz Jean
Piaget (1896-1980) (leia o quadro abaixo). Foi o cientista suíço quem cunhou o termo
construtivismo, comparando a construção de conhecimento à de uma casa, que deve ter materiais
próprios e a ação de pessoas para que seja erguida.

                                                                                                   4
Embora seus estudos não tenham sido feitos para aplicação em sala de aula - por isso, é um
equívoco falar em "método construtivista de ensino" -, suas teorias inspiraram as obras sobre
Educação popular de Paulo Freire (1921-1997), sobre Matemática de Constance Kamii, sobre ética
de Yves de la Taille e sobre a psicogênese da língua escrita de Emilia Ferreiro e Ana Teberosky.
Nas últimas três décadas, elas também têm influenciado investigações nas chamadas didáticas
específicas de cada disciplina.
Pela concepção construtivista, o professor deve criar contextos, conceber ações e desafiar os alunos
para que a aprendizagem ocorra.
"O conhecimento não é incorporado diretamente pelo sujeito: pressupõe uma atividade, por parte de
quem aprende, que organize e integre os novos conhecimentos aos já existentes", escreve Teresa
Mauri em O Construtivismo na Sala de Aula.
É claro que nem tudo cabe debaixo do chapéu do construtivismo. Entre os mal-entendidos, um dos
mais comuns é considerar que o professor construtivista não apresenta conteúdos nem orienta seus
alunos. "Professor que não ensina não é construtivista", afirma Becker. Para que haja o avanço dos
alunos, o docente precisa tomar muitas decisões: considerar as demandas da turma, propor questões
e desafios e pensar formas de promover ações que gerem aprendizado. "O educador deve dominar
sua área e conhecer os processos pelos quais o aluno aprende os mais diferentes conteúdos", diz.
Ao pesquisar a maneira como a criança pensa, Piaget chamou a atenção para o papel da interação
para explicar como o conhecimento se origina e se desenvolve. Por essa via, aproximou-se de
pesquisadores como Lev Vygotsky (1896-1934) e Henri Wallon (1879-1962). Embora os registros
históricos indiquem que Wallon e Vygostky não conviveram diretamente com Piaget, são muitos os
pontos de contato entre o construtivismo piagetiano e a perspectiva defendida pela dupla, o
sociointeracionismo. Segundo ela, o processo de aprendizagem se dá pela relação do aprendiz com
o meio (ambiente familiar e social, professores, colegas e o próprio conteúdo). Você conhece mais
detalhes sobre as duas perspectivas nas próximas reportagens da série.




            Jean Piaget (1896-1980)

                                                                                                   5
"Pensar não se reduz, acreditamos, em falar, classificar em categorias, nem mesmo abstrair.
Pensar é agir sobre o objeto e transformá-lo." Jean Piaget, no livro Problemas de Psicologia
Genética

Para esta concepção, não há o primado do sujeito nem do objeto, pois o conhecimento decorre do
processo de interação constante entre sujeito e objeto.
O sujeito tem um papel ativo no sentido de incorporar às suas estruturas os dados do ambiente,
modificando-os e criando estruturas cada vez mais complexas que vão lhe permitir o domínio desse
ambiente e, se necessário, sua transformação.
O ensino consiste no provimento de atividades desafiadoras que levem o educando a buscar novos
conhecimentos. São atividades preparadas para que os indivíduos acionem seus processos mentais,
num mecanismo ativo de assimilação dos dados do ambiente às suas estruturas, modificando-as
para incorporar esses novos dados, num movimento contínuo de desequilíbrio e equilíbrio.
A aprendizagem é um processo ativo que ocorre no sujeito, através de uma interação constante com
o ambiente, na qual estruturas cada vez mais complexas vão sendo construídas. As informações, os
conteúdos a que os educandos estão expostos vão sendo processados internamente num movimento
de construção, que torna essa perspectiva também conhecida como construtivista.
Várias correntes aparecem nesta tendência interacionista com implicações importantes para o
ensino e a aprendizagem. Uma delas é a que vem sendo denominada de sociointeracionista
construtivista (ou construtivismo sociointeracionista) e que envolve uma inter - relação entre as
concepções de Piaget e Vygotsky.
O conhecimento é um processo socialmente construído: através da interação do sujeito com o
“outro”, torna-se possível a incorporação dos conhecimentos sistematizados e o reconhecimento de
sua determinação histórica, ao mesmo tempo em que esse mesmo sujeito se reconhece como
participante do processo histórico de produção do conhecimento.
A construção do real pelo sujeito é um processo sociocultural, pois envolve um sujeito de uma
determinada cultura, com hábitos, valores próprios, em interação com outro sujeito, também datado
e situado historicamente.
As premissas básicas apresentadas determinam ao professor um papel muito mais maior do que o de
um mero “facilitador” do processo de aprendizagem, pois exerce uma função vital na relação que
estabelece com os educandos, dependendo também dele a conquista do conhecimento pelos alunos.
Na sala de aula o conhecimento não é apenas transmitido pelo professor e apropriado pelos alunos.
Os estudantes são exigidos como parceiros na construção do conhecimento, que é disputado, aceito,
rejeitado, elaborado no processo concreto de interlocução. Assim, a interação em sala de aula é
potencialmente conflitiva, pois nela se visa a substituição dos saberes do aluno por outros saberes.



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Referências
COLL, Cesar; PALACIOS, Jesus & MARCHESI, Alvaro (Orgs.) Desenvolvimento Psicológico e
Educação. (vol.1) Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.
Inatismo, empirismo e construtivismo: três concepções sobre a aprendizagem. Disponível em:
http://revistaescola.abril.com.br/formacao/formacao-continuada/inatismo-empirismo-
construtivismo-tres-ideias-aprendizagem-608085.shtml?page=0       Acessado     em  08/02/2013.
Publicado em NOVA ESCOLA Edição 237, Novembro 2010. Título original: Três ideias sobre a
aprendizagem




                                                                                             7
Referências
COLL, Cesar; PALACIOS, Jesus & MARCHESI, Alvaro (Orgs.) Desenvolvimento Psicológico e
Educação. (vol.1) Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.
Inatismo, empirismo e construtivismo: três concepções sobre a aprendizagem. Disponível em:
http://revistaescola.abril.com.br/formacao/formacao-continuada/inatismo-empirismo-
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Publicado em NOVA ESCOLA Edição 237, Novembro 2010. Título original: Três ideias sobre a
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                                                                                             7

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Concepções aprendizagem

  • 1. Inatismo, empirismo e interacionismo/construtivismo: três concepções sobre o desenvolvimento e a aprendizagem Juliana Zantut Nutti Concepção inatista: o saber congênito A busca por respostas começa na Antiguidade grega, com o nascimento do pensamento racional, que busca explicações baseadas em conceitos (e não mais em mitos) como uma forma de entender o mundo. Para os primeiros filósofos, a dúvida consistia em saber se as pessoas possuem saberes inatos ou é se possível ensinar alguma coisa a alguém. Chamada de Inatismo, essa perspectiva sustenta que as pessoas naturalmente carregam certas aptidões, habilidades, conceitos, conhecimentos e qualidades em sua bagagem hereditária. Tal concepção motivou um tipo de ensino que acredita que o educador deve interferir o mínimo possível, apenas trazendo o saber à consciência e organizando-o. "Em resumo, o estudante aprende por si mesmo", escreve Fernando Becker, professor da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) no livro Educação e Construção do Conhecimento. A concepção inatista parte do pressuposto de que os eventos que ocorrem após o nascimento não são essenciais e/ou importantes para o desenvolvimento. As qualidades e capacidades básicas de cada ser humano  personalidade, valores, hábitos, crenças, forma de pensar, reações emocionais, conduta social  já se encontrariam basicamente prontas e em sua forma final por ocasião do nascimento, sofrendo pouca diferenciação e quase nenhuma transformação ao longo da existência. O papel do ambiente é tentar interferir o mínimo possível no processo do desenvolvimento espontâneo da pessoa. As origens da concepção inatista podem ser encontradas, por um lado, na Teologia (o destino individual de cada ser humano já estaria determinado pela graça divina) e, por outro, em um entendimento errôneo de algumas contribuições da proposta evolucionista de Darwin, da Embriologia e da Genética (as mudanças no desenvolvimento das espécies decorrem de variações hereditárias em que o papel do ambiente é limitado). Platão (427-347 a.C.) firmou posição a favor das ideias congênitas. Defendendo a tese de que a alma precede o corpo e que, antes de encarnar, tem acesso ao conhecimento, o discípulo de Sócrates (469-399 a.C.) afirmou que conhecer é relembrar, pois a pessoa já domina determinados conceitos desde que nasce.
  • 2. Platão (427-347 a.C.) "Mas o deus que vos modelou, àqueles dentre vós que eram aptos para governar, misturou-lhes ouro na sua composição, motivo por que são mais preciosos; aos auxiliares, prata; ferro e bronze aos lavradores e demais artífices." Platão, no livro A República Nesta perspectiva, a aprendizagem é considerada como um processo interno do sujeito (aquele que aprende). O objeto do conhecimento (aquilo que é aprendido) é algo que o sujeito descobre. Por isso se diz que esta vertente se caracteriza pelo primado do sujeito. A concepção inatista gerou uma idéia de homem que produziu uma abordagem rígida, autoritária e, sobretudo, pessimista para a educação de crianças e adolescentes: se o homem “já nasce pronto”, pode-se apenas aprimorar aquilo que ele é ou virá a ser. O ditado “pau que nasce torto morre torto” expressa bem a concepção inatista, que ainda hoje aparece na escola, camuflada sob o disfarce das aptidões, da prontidão e do coeficiente de inteligência (QI). Concepção ambientalista/empirista: a absorção do conhecimento externo A concepção ambientalista/empirista atribui um imenso poder ao ambiente no desenvolvimento e aprendizagem humanos. O homem é concebido como um ser extremamente plástico, que desenvolve as suas características em função das condições existentes no meio em que se encontra. Para essa concepção, o conhecimento é algo que existe fora do sujeito. A realidade está fora do indivíduo, localiza-se no ambiente, no meio, por isso se diz que esta vertente se caracteriza pelo primado do objeto (ambiente). 2
  • 3. Esta concepção deriva do empirismo, corrente filosófica que enfatiza a experiência sensorial como fonte do conhecimento e que determinados fatores encontram-se associados a outros, sendo possível identificar, controlar e manipular essas associações. Aristóteles (384-322 a.C.) apresentou uma perspectiva contrária à de Platão (como se vê no quadro resumo, abaixo). Segundo ele, embora as pessoas nasçam com capacidade de aprender, elas precisam de experiências ao longo da vida para que se desenvolvam. A fonte do conhecimento são as informações captadas do meio exterior pelos sentidos. Ideias como essa impulsionaram o empirismo, corrente favorável a um ensino pela imitação - na escola, as atividades propostas são as que facilitam a memorização, como a repetição e a cópia. Aristóteles (384-322 a.C.) "As virtudes, portanto, não são geradas em nós nem através da natureza nem contra a natureza. A natureza nos confere a capacidade de recebê-las, e essa capacidade é aprimorada e amadurecida pelo hábito." Aristóteles, no livro Ética a Nicômaco "Os empiristas acreditavam que as informações se transformam em conhecimento quando passam a fazer parte do hábito de uma pessoa", explica Clenio Lago, professor de Filosofia da Educação na Universidade do Oeste de Santa Catarina (Unoesc), em São Miguel do Oeste. Absorvidos tal como uma esponja retém líquido, os dados aprendidos são acumulados e fixados - e podem ser rearranjados quando outros conteúdos mais complexos aparecem. A mente humana é definida como uma tábula rasa, um espaço vazio a ser preenchido. "A criança é comparada à água, que pode ser canalizada na direção desejada", diz Lago. Nos séculos 16 e 17, em plena Idade Moderna, essa perspectiva ganha força com filósofos como Francis Bacon (1561-1626), Thomas Hobbes (1588-1679) e John Locke (1632-1704). Do ponto de vista dos empiristas, caberia à escola formar um sujeito capaz de conhecer, julgar e agir segundo os critérios da razão, substituindo as respostas "erradas" absorvidas no contato com diversos meios (a 3
  • 4. religião, por exemplo) pelas "certas", já validadas pelos acadêmicos por seguirem os critérios científicos da época. Na Psicologia, o maior defensor da posição ambientalista é o norte - americano B. F. Skinner, que elaborou uma teoria baseada na análise dos comportamentos observáveis do sujeito, desprezando a análise de outros aspectos da conduta humana como o raciocínio, os desejos, as fantasias e os sentimentos (Behaviorismo). Na concepção de Skinner e seus colaboradores, o papel do ambiente é muito mais importante do que a maturação biológica, pois os estímulos presentes numa dada situação levariam ao surgimento de determinados comportamentos. Manipulando-se os elementos existentes no ambiente é possível controlar o comportamento dos indivíduos: pode-se aumentar ou diminuir a freqüência com que os comportamentos aparecem, através de esquemas de reforçamento que envolvem elogios (aumentar a freqüência de comportamentos positivos) e punições (diminuir a freqüência de comportamentos negativos). Nesta perspectiva, o ensino é visto como o planejamento e o arranjo das contingências de reforçamento (elogios, notas, diplomas), as quais vão permitir a aprendizagem, que consiste em obter mudanças no comportamento dos alunos, tendo em vista objetivos predeterminados. Apesar dos séculos de distância, o fato é que algumas práticas empiristas seguem presentes no dia a dia das escolas. "Até hoje, o conhecimento é visto por muitos como um produto que pertence ao professor", explica Becker. Os especialistas formulam outra crítica à corrente: nem sempre ideias simples dão elementos para compreender as mais complexas. Dito de outra forma, não basta acumular informações para aprender. Os efeitos nocivos da concepção ambientalista sobre a prática pedagógica estão relacionados a uma ênfase exagerada na tecnologia educacional, em detrimento da reflexão filosófica sobre o papel da educação. Concepção interacionista: a tentativa de caminho do meio Com inatismo e empirismo apontando para lados opostos ("O saber está no indivíduo" versus "O saber está na realidade exterior"), o século 20 nasceu com uma tentativa de caminho do meio para explicar o aprendizado: a perspectiva construtivista. De acordo com essa linha, o sujeito tem potencialidades e características próprias, mas, se o meio não favorece esse desenvolvimento (fornecendo objetos, abrindo espaços e organizando ações), elas não se concretizam. A presença ativa do sujeito diante do conteúdo é essencial - portanto, não basta somente ter contato com o conhecimento para adquiri-lo. É preciso "agir sobre o objeto e transformá-lo", como diz Jean Piaget (1896-1980) (leia o quadro abaixo). Foi o cientista suíço quem cunhou o termo construtivismo, comparando a construção de conhecimento à de uma casa, que deve ter materiais próprios e a ação de pessoas para que seja erguida. 4
  • 5. Embora seus estudos não tenham sido feitos para aplicação em sala de aula - por isso, é um equívoco falar em "método construtivista de ensino" -, suas teorias inspiraram as obras sobre Educação popular de Paulo Freire (1921-1997), sobre Matemática de Constance Kamii, sobre ética de Yves de la Taille e sobre a psicogênese da língua escrita de Emilia Ferreiro e Ana Teberosky. Nas últimas três décadas, elas também têm influenciado investigações nas chamadas didáticas específicas de cada disciplina. Pela concepção construtivista, o professor deve criar contextos, conceber ações e desafiar os alunos para que a aprendizagem ocorra. "O conhecimento não é incorporado diretamente pelo sujeito: pressupõe uma atividade, por parte de quem aprende, que organize e integre os novos conhecimentos aos já existentes", escreve Teresa Mauri em O Construtivismo na Sala de Aula. É claro que nem tudo cabe debaixo do chapéu do construtivismo. Entre os mal-entendidos, um dos mais comuns é considerar que o professor construtivista não apresenta conteúdos nem orienta seus alunos. "Professor que não ensina não é construtivista", afirma Becker. Para que haja o avanço dos alunos, o docente precisa tomar muitas decisões: considerar as demandas da turma, propor questões e desafios e pensar formas de promover ações que gerem aprendizado. "O educador deve dominar sua área e conhecer os processos pelos quais o aluno aprende os mais diferentes conteúdos", diz. Ao pesquisar a maneira como a criança pensa, Piaget chamou a atenção para o papel da interação para explicar como o conhecimento se origina e se desenvolve. Por essa via, aproximou-se de pesquisadores como Lev Vygotsky (1896-1934) e Henri Wallon (1879-1962). Embora os registros históricos indiquem que Wallon e Vygostky não conviveram diretamente com Piaget, são muitos os pontos de contato entre o construtivismo piagetiano e a perspectiva defendida pela dupla, o sociointeracionismo. Segundo ela, o processo de aprendizagem se dá pela relação do aprendiz com o meio (ambiente familiar e social, professores, colegas e o próprio conteúdo). Você conhece mais detalhes sobre as duas perspectivas nas próximas reportagens da série. Jean Piaget (1896-1980) 5
  • 6. "Pensar não se reduz, acreditamos, em falar, classificar em categorias, nem mesmo abstrair. Pensar é agir sobre o objeto e transformá-lo." Jean Piaget, no livro Problemas de Psicologia Genética Para esta concepção, não há o primado do sujeito nem do objeto, pois o conhecimento decorre do processo de interação constante entre sujeito e objeto. O sujeito tem um papel ativo no sentido de incorporar às suas estruturas os dados do ambiente, modificando-os e criando estruturas cada vez mais complexas que vão lhe permitir o domínio desse ambiente e, se necessário, sua transformação. O ensino consiste no provimento de atividades desafiadoras que levem o educando a buscar novos conhecimentos. São atividades preparadas para que os indivíduos acionem seus processos mentais, num mecanismo ativo de assimilação dos dados do ambiente às suas estruturas, modificando-as para incorporar esses novos dados, num movimento contínuo de desequilíbrio e equilíbrio. A aprendizagem é um processo ativo que ocorre no sujeito, através de uma interação constante com o ambiente, na qual estruturas cada vez mais complexas vão sendo construídas. As informações, os conteúdos a que os educandos estão expostos vão sendo processados internamente num movimento de construção, que torna essa perspectiva também conhecida como construtivista. Várias correntes aparecem nesta tendência interacionista com implicações importantes para o ensino e a aprendizagem. Uma delas é a que vem sendo denominada de sociointeracionista construtivista (ou construtivismo sociointeracionista) e que envolve uma inter - relação entre as concepções de Piaget e Vygotsky. O conhecimento é um processo socialmente construído: através da interação do sujeito com o “outro”, torna-se possível a incorporação dos conhecimentos sistematizados e o reconhecimento de sua determinação histórica, ao mesmo tempo em que esse mesmo sujeito se reconhece como participante do processo histórico de produção do conhecimento. A construção do real pelo sujeito é um processo sociocultural, pois envolve um sujeito de uma determinada cultura, com hábitos, valores próprios, em interação com outro sujeito, também datado e situado historicamente. As premissas básicas apresentadas determinam ao professor um papel muito mais maior do que o de um mero “facilitador” do processo de aprendizagem, pois exerce uma função vital na relação que estabelece com os educandos, dependendo também dele a conquista do conhecimento pelos alunos. Na sala de aula o conhecimento não é apenas transmitido pelo professor e apropriado pelos alunos. Os estudantes são exigidos como parceiros na construção do conhecimento, que é disputado, aceito, rejeitado, elaborado no processo concreto de interlocução. Assim, a interação em sala de aula é potencialmente conflitiva, pois nela se visa a substituição dos saberes do aluno por outros saberes. 6
  • 7. Referências COLL, Cesar; PALACIOS, Jesus & MARCHESI, Alvaro (Orgs.) Desenvolvimento Psicológico e Educação. (vol.1) Porto Alegre: Artes Médicas, 1995. Inatismo, empirismo e construtivismo: três concepções sobre a aprendizagem. Disponível em: http://revistaescola.abril.com.br/formacao/formacao-continuada/inatismo-empirismo- construtivismo-tres-ideias-aprendizagem-608085.shtml?page=0 Acessado em 08/02/2013. Publicado em NOVA ESCOLA Edição 237, Novembro 2010. Título original: Três ideias sobre a aprendizagem 7
  • 8. Referências COLL, Cesar; PALACIOS, Jesus & MARCHESI, Alvaro (Orgs.) Desenvolvimento Psicológico e Educação. (vol.1) Porto Alegre: Artes Médicas, 1995. Inatismo, empirismo e construtivismo: três concepções sobre a aprendizagem. Disponível em: http://revistaescola.abril.com.br/formacao/formacao-continuada/inatismo-empirismo- construtivismo-tres-ideias-aprendizagem-608085.shtml?page=0 Acessado em 08/02/2013. Publicado em NOVA ESCOLA Edição 237, Novembro 2010. Título original: Três ideias sobre a aprendizagem 7