Materialismo reducionista: As teorias da identidade
1. UNIFESSP
A
Tópicos Especiais em Psicologia IV:
Introdução à Filosofia da Mente
Aula 4:
Materialismo reducionista:
As teorias da identidade
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A
Uma definição das
teorias da identidade
●
“por serem empíricos, sintéticos, contingentes, os estados mentais
eram idênticos aos estados do cérebro e do sistema nervoso
central” (Searle, p. 55)
●
A experiência da dor, as imagens mentais, ou as memórias são
processos cerebrais, não estão meramente correlacionados com
eles
● Estritamente falando, não é necessário postular que a mente é
idêntica ao cérebro – simplesmente que identificar cérebro e mente
é uma questão de identificar processos e estados da mente e do
cérebro
SEARLE, J. A redescoberta da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1997
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A
Antecedentes
●
Leucipo, Hobbes, La Mettrie, d’Holbach
●
Pierre Cabanis: “O cérebro secreta pensamentos da mesma forma como o fígado secreta
bile” (séc. XVIII)
● E. Boring (1933): The Physical Dimensions of Consciousness; “Para este autor, uma
correlação perfeita é uma identidade. Dois eventos que sempre ocorrem juntos ao mesmo
tempo e no mesmo lugar, sem quaisquer diferenciações temporais ou espaciais, não são dois
eventos mas um só. As correlações mente-corpo formuladas até o presente não admitem
consideração sobre a correlação espacial, então se reduzem a questões de correlação
simples no tempo. A necessidade de identificação não é menos urgente nesse caso”
● Reichenbach (1938): eventos mentais podem ser identificados podem ser identificados pelos
estímulos e respostas assim como o estado interno de uma célula fotoelétrica pode ser
identificada pelos estímulos e respostas que a controlam
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A
Antecedentes: Argumento da
linguagem privada
● Qualquer linguagem que deve servir como meio para comunicação inter-pessoal deve
pressupor a existência de um mundo material espacialmente extenso ao qual os
conceitos básicos se ancoram
● Reconhecimento de que a linguagem ordinária que utilizamos para descrever nossas
experiências privadas e sensações é uma extensão metafórica de uma linguagem cuja
função básica é descrever objetos materiais e suas propriedades
● Colapso do fenomenalismo e do idealismo berkeleyano como posições filosóficas
defensáveis
● Assunção de um realismo ingênuo, no qual aquilo que percebemos diretamente
corresponde objetos materiais espacialmente extensos em um mundo tridimensional
FREGE, G. Lógica e filosofia da linguagem. São Paulo:Cultrix 1978
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A
Antecedentes: Behaviorismo
filosófico ryleano
●
Se o que fazemos quando usamos conceitos mentais é falar de
forma logicamente complexa sobre o comportamento observável
em humanos, segue-se
A)que não há uma classe de estados e eventos mentais separada
dos eventos e disposições comportamentais; e
B)que a relação entre mente e cérebro é simplesmente a relação
relativamente não-problemática entre atividade cerebral e
comportamento observável
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A
Marcos históricos e
conceituais
● U. T. Place (1956): Is
consciousness a brain
process?’
● Feigl (1958): The ‘mental’
and the ‘physical’
● J. J. C. Smart (1959):
Sensations and brain
processes
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A
Exemplos
(1)“Sensação de dor = certos efeitos corticais resultantes de
estimulações pré-corticais (no tálamo e na formação
reticular), as quais são geralmente produzidas pela
estimulação de células nociceptoras periféricas.
(2)Ansiedade = certos efeitos corticais resultantes da
reverberação de descargas em circuitos neuronais no
sistema límbico
(3)Impressão visual consciente = certos efeitos no nexo
prefrontal, resultantes da estimulação da área V1 do córtex
occipital...” (Costa, 2005)
COSTA, C. Filosofia da mente. Rio de Janeiro:Jorge Zahar Editora, 2005
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A
Redução inter-teórica
●
Grosso modo, uma forma de sucessão teórica no qual a teoria sucessora (“redutora”) é substancialmente
similar a, ou contínua com, sua predecessora (teoria “reduzida”) no nível das leis, estrutura, ou ontologia
– Reduções ocorrem comumente quando a teoria reduzida é parcial ou aproximadamente correta, ou quando é
verdadeira somente em um domínio relativamente limitado
– O estudo aprofundado da redução inter-teórica iniciou-se com The structure of science, de Ernest Nagel (1951)
●
“Concluímos, então, que apreendemos exatamente a mesma realidade que era incompletamente descrita
no antigo arcabouço conceitual, mas por meio de um novo e mais penetrante arcabouço. E afirmamos o
que os filósofos da ciência chamam de ‘identidades interteóricas’: a luz é idêntica a ondas magnéticas, a
temperatura é energia cinética molecular média, e assim por diante” (Churchland, p 54)
● “a redução interteórica ocorre não apenas entre os arcabouços conceituais situados na estratosfera
teórica: os observáveis do senso comum também podem ser reduzidos” (Churchland, p. 55)
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A
Exemplo 1: De Kepler a
Newton
● Baseando-se em suas observações e nas de Tycho Brahe, Kepler criou três leis
que governam os movimentos planetários:
1) Todos os planetas movem-se em elipses com o sol em um foco;
2) Um dado planeta sempre cobre áreas iguais em tempos iguais;
3) O quadrado do período do planeta é proporcional ao cubo de seu raio orbital médio
● Newton criou um conjunto de leis governando todos os objetos em movimentos
1)O movimento inercial é constante e retilíneo
2) Aceleração = força/massa
3) Para toda mudança no momento algo sofre uma mudança igual e oposta em momento
4) Lei da gravitação: F = -Gm1
m2
/r²
● Podemos derivar as leis de Kepler das leis de Newton
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A
Exemplo 2: Da temperatura ao
movimento molecular médio
● A Lei dos Gases de Boyle-Charles faz referência à temperatura:
– PV = µR·T
● Mas o que é temperatura?
– A teoria cinética dos gases substituiu o lado direito da equação por PV
= (2n/3mv²)/2, no qual a temperatura é entendida como a velocidade
média das partículas
● O movimento médio das partículas de um gás não é algo que
observamos; é uma entidade teórica nova
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A
Versões iniciais da teoria
da identidade
● Place e Smart inicialmente aceitam as explicações do behaviorismo filosófico
para conceitos cognitivos e conativos, mas consideram-no insuficiente para
explicar alguns coneitos (p. ex., sensações)
● Place afirmou que sensações e outras funções psicológicas similares são
processos do cérebro – independente do fato de que afirmações sobre funções
psicológicas não podem ser analizadas logicamente através de afirmações
sobre processos cerebrais
– “Materialismo de estado central”: Noção versão limitada da teoria da identidade que
identifica as sensações a estados do SNC
● Fazendo analogia com reduções interteóricas, Place citou a potência
explanatória potencial dessas analogias como uma boa razão para hipotetizar
identidade das relações mente-cérebro
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A
Sensations and the brain
processes (Smart, 1959)
● “não há um experimento concebível que possa decidir
entre o materialismo e o epifenomenalismo”
● A afirmação “sensações são processos cerebrais” não é
uma hipótese científica, mas deve ser assumida como
verdadeira com base na navalha de Occam:
– Mesmo se a teoria da identidade e o dualismo forem igualmente
consistentes com os fatos empíricos, a primeira tem vantagem
por sua simplicidade e utilidade explanatória
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A
O problema da introspecção
● Não é possível explicar o resultado da introspecção em termos de processos
cerebrais, porque esses processos fazem referência a entidades não-neurais
– p. ex., uma pós-imagem verde não pode ser explicada em termos cerebrais porque
não há nada “verde” no cérebro
● Place chamou atenção à “falácia fenomenológica” - afirmação errada de que
as observações introspectivas reportam “o estado real das coisas em algum
ambiente interno misterioso”
●
A teoria da identidade só precisa demonstrar que o processo cerebral
causando a descrição da experiência em uma forma particular é o tipo de
processo que normalmente acontece quando há algo no ambiente
correspondendo à sua descrição
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A
A noção de “identidade”
● Place: A relação de identidade é uma relação assimétrica de composição
– Eventos mentais de nível superior são compostos de eventos físicos de nível
inferior, e serão eventualmente reduzidos analiticamente a esses
● Para Feigl e Smart, a identidade é interpretada como entre referentes de
duas descrições que referem-se à mesma coisa
– P. ex., “estrela d’alva” e “Vésper” referem-se ao planeta Vênus
– A resposta à objeção é fregeana; “sensações” e “processos cerebrais” significam
coisas diferentes, mas referem-se ao mesmo fenômeno físico
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A
Identidade versus igualdade
● Dois conceitos contrastantes de identidade
● Leibniz: uma afirmação de identidade é uma afirmação na forma
tautológica x = x, ou uma afirmação que se reduz a essa forma por uma
substituição matemática
● Frege: a identidade é uma relação entre dois nomes ou descrições
diferentes que referem-se ao mesmo referente
– Se tenho quatro moedas no meu bolso direito, e quatro moedas no meu bolso
esquerdo, a relação x = x é satisfeita, mas não se trata de uma identidade
● Feigl e Smart subscrevem ao conceito fregeano
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A
Identidade versus composição
● Para Place, a consciência não é a mesma coisa que o processo cerebral
ao qual se correlaciona, mas é composta inteiramente do processo
cerebral
– As experiências subjetivas são entendidas em termos de uma “micro-redução”
substancial às partes constituintes dos processos cerebrais
● Place (1967): formular identidade como composição ou pelo conceito
fregeano são duas formas de afirmar a mesma coisa
– Ambas são igualmente efetivas para eliminar eventos e processos mentais como
uma classe separada de eventos e processos
– Ambas implicam que a relação é contingente
PLACE,U. Comments on Putnam’s “Psychological predicates”, in W. H. Capitan e D. D. Merrill
(eds.), Art, Mind, and Religion. Pittsburgh: Pittsburgh University Press, 1967
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A
Identidade versus composição
● O contra-argumento é que a relação de composição é assimétrica, enquanto a
relação de identidade é simétrica
– Identidade: Se A é a mesma coisa que B, segue-se necessariamente que B é a mesma
coisa que A
– Composição: Se A é composto inteiramente por B’s, não podemos afirmar que B é
composto inteiramente por A’s
● Redução inter-teórica ≠ redução substancial
– Na redução substancial, a entidade é decomposta em seus componentes; na redução
inter-teórica, o conceito do qual a entidade faz parte é decomposto em seus elementos
conceituais componentes
– A redução substancial explica características da mente que não estão presentes na
descrição psicológica
– A descrição psicol ica não pode explicar a micro-descrição (ou seja, mente não explicaǵ
neurônio, mas neurônio explica mente)
20. UNIFESSP
A
Pontos comuns entre Place,
Smart e Feigl
1) As experiências privadas ou sensações do indivíduo são
redutíveis sem resíduo a eventos ou processos do cérebro (=
tese da identidade)
2) A tese da identidade é uma proposição contingente (i.e., não é
uma verdade logicamente necessária)
-As descrições da experiência privada não tem o mesmo sentido ou significado que
as descrições dos processos cerebrais hipotéticos a que de fato se identificam
3) A verdade da tese da identidade é pelo menos em parte uma
questão de determinação empírica
4) A tese da identidade aplica-se somente a certos aspectos da
vida mental: consciência (Place), as sensações cruas da
experiência (Feigl), sensações (Smart)
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A
Identidade de ocorrência (token)
versus identidade de tipo (type)
● Nagel: distinção entre identidades “gerais” e “particulares”
● Charles Taylor (1967): “a falha em encontrar correlações [gerais]… ainda
nos permitiria procurar identidades particulares, não entre, digamos, uma
pós-imagem amarela e um certo tipo de processo cerebral no geral, mas
entre uma ocorrência particular dessa pós-imagem amarela e uma
ocorrência particular de um processo cerebral”
● Ao perguntar se coisas mentais são a mesma coisa que coisas físicas, ou
se são diferentes, devemos clarificar se a questão aplica-se a particulares
concretos (casos individuais e particulares) ou ao tipo de estado ou evento
a que se referem esses casos particulares
– O segundo caso afirma que os próprios tipos mentais são tipos físicos
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A
Identidade de ocorrência
● Todo particular concreto pertencente a um tipo mental pode ser identificado com um
evento físico (talvez neurofisiológico)
– Para cada exemplo ocorrência de um estado mental há algum evento neurofisiológico
ocorrência a qual é idêntico
● Ocorrências de dor são instâncias não só de um estado mental, mas de algum
estado neurofisiológico (p. ex., excitação de nociceptores)
● Fodor (1974): a teoria da identidade de ocorrência pode ser derivada da teoria da
identidade de tipo, mas o contrário não é verdadeiro
– Se tipos mentais são tipos físicos, então qualquer ocorrência de um tipo mental também será
uma instância individual de um tipo físico
– Mesmo se um particular concreto equivale tanto a um tipo mental quanto a um tipo físico,
esse fato é contingente e não garante a identidade dos tipos cuja instanciação constitui os
particulares concretos
Notas do Editor
Representation of stationary polar coordinate stimuli (rays and rings, respectively) in human V1. This experiment was designed to produce a “bulls-eye” or “spider web” pattern in area V1 and examine the response by using fMRI, analogous to the pattern produced in macaque V1 previously by using different functional imaging techniques (34, 35). Here, the ray and ring stimuli were presented separately, during different scan acquisitions. During the first scan, the subjects viewed alternating 16-sec epochs of ray stimuli (“S1” and “S2”) composed of flickering black and white checks. This viewing produced the activity patterns shown in A and B. Preferential activation by the first stimulus is coded in red, and preferential activation by the second stimulus is coded green. A is a flattened section of the cortical surface from the right hemisphere, and B is from the left hemisphere. Both sections are taken from the same hemisphere shown in Fig. 1. Area V1 is the large middle region enclosed in dotted lines (i.e., the representation of the vertical meridian, based on the field sign map). V1 is flanked on both sides by V2, then V3/VP. The foveal representation is represented by a white asterisk. As one would expect from previous retinotopic maps in macaques and humans, rays of equal polar angle produce bands of approximately equal width in flattened cortex. During the second scan, the stimuli were composed of interleaved rings, again composed of flickering black and white checks (“S3” and “S4”). The rings were of equal polar width, thus quite unequal in width in the visual display. This stimulus produced activity bands of approximately equal width in cortex (C and D, same red–green pseudocolor conventions), oriented roughly at right angles to the bands of equal-polar-angle in A and B. During the third scan, stimuli were circular in shape (S5 and S6). The diameters of the stimulus circles were equal in polar coordinates. Thus the circles were much larger in angular subtense at greater eccentricities (large blue arrows), compared with the circles at more central eccentricities (smaller blue arrows). Nevertheless, the roughly circular activity representation of the two sets of circles in V1 was approximately equal in cortical extent (E and F). The stimulus circles are rerepresented, but progressively more faintly, in V2 and V3/VP. [The scale bar represents 1 cm (on average) across the cortical surface.]