Meus avos maternos

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Meus avós maternos

Contos de momentos especiais que não voltam mais.
Geraldo Magela Batista
Visite o Site: www.geraldofadipa.comunidades.net
Meus avós maternos.
Na morada dos saudosos José Jacob e Isaura Alvarenga.
A casa dos meus avôs situava-se à
direita da fazenda, de meu bisavô materno, é
era necessário seguir por um caminho
estreito que tinha o seu final lá pelas
propriedades dos “Nicetos”. Antes
passávamos próximas as moradas dos tios
de minha mãe, chamados Altivo e Geraldo
(Não cheguei a conhecê-lo, pois já era
falecido). Recordo perfeitamente do medo
que sentia quando deparávamos com o gado
do tio Altivo a pastar junto do caminho.
A residência possuía uma cozinha enorme com um fogão a lenha e
uma mesa de centro, dois quartos, copa e sala. A parte mais usada era a
cozinha. Na verdade era pela sua porta que se recebiam as visitas e se
realizavam todas as comemorações familiares. Nela era comum presenciar
minha avó Isaura preparando uma sopa de couve e fritando carne de porco
retirada, ao meio de imensa gordura, de um latão de cerca de dez litros.
Sem contar os vapores aromáticos que emanava de um grande bule com
café de rapadura estacionado nas trempes, e mantido no ponto, pelas
chamas de pontas amarelas que dançavam sobre as brasas do fogão.
Próximo da porta, em uma bancada de madeira, ficava o moedor de
café. Era comum o cheiro de linguiça que defumava dependurada por cima
do fogão, juntamente com o milho de pipoca.
Lembro-me que não gostava de rondar pelos lados do quarto de
visitas, que situava junto à sala, devido ao papo que ali tinha morrido uma
pessoa enforcada. Na verdade tinha medo de adentrar pela sala, pois o
quarto aos meus olhos era a prisão da alma de uma pessoa suicida. Local
sinistro onde o brilho de uma vida foi apagado. Podia sentir o balançar da
cabeça na ponta de uma fina corda lançada sobre a madeira que sustentava
o telhado e as vozes noturnas de homens e mulheres, não sei o porquê que
em minha mente a morte tenha ocorrido à noite, levadas pela brisa
anunciando o factício suicídio. Para meus olhos de crianças o quarto
representava gritos e sangue, sintaxe de um corpo imaginário, que se
lançou no dilúvio de chamas e erupções do inferno.
Do lado de fora tinha uma bica que ficava a jorrar água dia e noite e
seu transporte era feito por troncos de coqueiros cortados de comprido e
escavados emendados uns aos outros e sustentados por madeira de
primeira para maior durabilidade, desde a origem da nascente, em uma
pequena elevação há oitocentos metros, até o cercado próximo da casa.
Meu avô, em tom brincalhão, dizia que a água estava tão acostumada com
o percurso que quando os troncos de coqueiro apodrecessem e caísse, ela
continuaria a correr suspensa no ar.
Próximo da bica tinha imensos abacateiros de folhas lustrosas,
flores pequenas, frutos grandes de casca verde e polpa cremosa. Apesar
do incômodo da queda dos frutos não colhidos cujo odor acentuado atraia
um bom número de abelhas, eles nunca pensaram em cortar os pés da
“manteiga que vem da madeira".
Diversas espécies de pássaros frequentavam seus galhos, para
alimentar de seus frutos repondo as energias gastas no vôo, e contemplava
nossos ouvidos com melodias em diversos tons. Eram nesses abacateiros
que o saudoso “vô Jacó” entrelaçava duas alas de corda em seus galhos
e uma tábua na parte de baixo. Era a gangorra, motivo de alegria para o seu
casal de netos, e de preocupação para minha avó Isaura. Não me esqueço
de suas palavras: “que falta de juízo Zé, já pensou se os meninos
machucarem. Ho flagelo”.
Meu avô implicava com algumas frutas e dava sua explicação
“cientifica” para cada uma delas. O jatobá, para ele, não era um fruto
saboroso e o comparava com o pó de serra que secava a boca a ponto de
sair correndo pelo pasto em busca de um riacho. A jaca era pesada demais
a ponto de povoar sua noite com pesadelo se comer antes de deitar. Sem
contar do perigo de se engasgar com o caroço. Foi com ele que provei a
fruta de jatobá gosto de pó de serra. Outra de suas explicações era para o
sabor das frutas. Segundo ele se os passarinhos e as vespas rodeiam
determinada fruta e porque ela é saborosa. Pois é, passarinho sabe
escolher as frutas.
Minha avó vivia preocupada com uma cabra que conduzia uma
pequena carroça, isto porque meu avô colocava (eu e minha irmã Lúcia)
dentro da carroça para passearmos pelo terreiro. Um belo dia a cabra
resolveu pôr à prova a sua capacidade de corrida e disparou como uma
flecha pelo terreiro. Por sorte, ele conseguiu conter a corrida e paramos em
frente da cerca. Ufa!
Lembro-me, também, de uma coruja que ficava nos galhos dos
abacateiros, tocando a sua “música fúnebre” (batida de seus bicos nos
galhos), e minha avó Isaura afirmava que a música indicava que haveria
morte na família, já que a mesma simbolizava o toque do martelo em pregos
fechando o caixão. Para espantar a coruja, meu avô saía com um lampião,
e com essa precária iluminação a localizava e lançando pedras, fazia-a voar
e deixar o abacateiro. No seu vôo, ela piava como se estivesse rasgando
pano, o pano que envolve os mortos: a mortalha.
No terreiro sempre havia galinhas a desfilar o seu ciscar e a correr
do ataque dos cães, que sem motivos aparente se punha a perseguir as
pobres aves. O galo, rei do terreiro, sempre se exibia com cabeça alta,
olhos agudos e passos militar. Seu canto afinado definia o horário da
alvorada e o toque de recolher. Era o Manda-Chuva por natureza e ofício.
A vida das galinhas era uma rotina. Sua existência resumia em
comer, receber a visita do galo, um ninho para pôr os ovos e poleiro para
dormir. “Vô Jacob” dizia que o ideal era sete galinhas para cada galo. Mas
dois ou mais galos juntos complicava, pois não conseguiam viver
pacificamente.
Achava engraçadas as galinhas chocas. Normalmente corriam de
tudo por qualquer motivo, mas quando chocas enfrentavam qualquer
perigo. O instinto materno as deixava valentes e viravam uma fera para
defenderem seus ovos no ninho e depois os pintinhos. Até os cães não
ousava desafia-las.
Havia também os lagartos que nas manhãs se punha em cima dos
pedaços de madeiras e das elevações de terras endurecidos para sentir os
raios do sol.
Logo depois da bica, em direção a um córrego que deslizava
mansamente para o Ribeirão Sacramento havia uma grande pedra. Sobre
ela vespas e abelhas listradas zumbiam dividindo o matagal com
borboletas coloridas e aranhas que tricotavam suas redes entre a
vegetação. Libélulas coloridos, com seus corpos de flecha, sobrevoavam
as borbulhentas águas a caça de seus alvos prediletos. Sobre esta pedra
sentia uma alegria ingênua e harmônica adentrar pelos poros de meu corpo
quente sentindo-me bem mais leve, como se fosse flutuar, mesmo que o
meu físico insensível teimasse em permanecer em terra.
Entre o riacho e a casa principal sempre havia plantação de milho
que cresciam com seus lindos pendões e espigas imensas. O milho quando
verde era colhido e servido cozido, assado na espiga ou na forma de
mingau. Minha avó dizia que o milho verde não devia ser cozido em
excesso, pois ao contrário do que se pensam, os grãos ficarão mais duros.
O milho plantado ficava dormindo no chão aconchegado em seis
grãos na cova. Vida inerte que a terra iria multiplicar e realizar o milagre do
nascer e de um canudo enrolado, amarelo pálido, se levantava e crescia
garboso com os pendões balançando ao vento. A boneca virava espiga e a
espiga cheia saltava da haste.
Depois seu tronco seco e ressecado servia de suporte, por onde
feijão verde trançava, enramava e enflorava. Os pés de feijão explodiam as
vagens para o sustento, num abrir e fechar de olhos. Toda a plantação
parecia compartilhar de um destino comum, uma festa comum, feito gente.
O mundo era verde. Que mais podíamos desejar?
Gostava de ir a uma parte do terreno em que tinha uma pedra com
pés de goiabeiras para realizar uma brincadeira solitária - subir nos pés
destas árvores. Estas goiabeiras eram minhas amigas intimas. Eu subia
sempre para pegar goiaba ou simplesmente quanto estava triste. Ali ficava
matutando sobre os questionamentos de crianças e quando estava com
raiva ficava conversando com ela.
Lembro-me das névoas matinais que cobria as árvores e dos raios
de luz infiltrando-se pelo denso ar, parecendo teias, para brilhar nos
matagais molhado de orvalho. A neblina que cobria o céu, lá pelos lados
do capoeirão, em questão de tempo se dissiparia com o calor emitido pelo
sol após o seu completo despertar.
Nestas manhãs utilizava sempre o olhar para buscar as distâncias
físicas entre as montanhas, divisar os limites do horizonte que se abria ao
meu redor. Ao praticar esse exercício descobria um amplo espaço cercado
de puro céu por todos os lados. Nestes amplos espaços, feliz, corria livre
sentindo o contato da natureza, o sabor das frutas colhidas diretamente do
pé e contemplava a correria dos pequenos peixes do riacho que existia
próximo a um grupo de rocha, lá dos lados da bica d’água.
Na quietude destas manhãs, era comum ouvir as batidas da lâmina
de um machado mordendo a madeira, para a obtenção da lenha que iria
fornecer o calor necessário ao preparo das iguarias magistralmente
preparadas pelas mãos de minha avó.
No natal havia Presépio. Minha avó Isaura com a ajuda do avô Jacob,
da minha mãe e até mesmo de meu pai armavam com carinho e junto à
manjedoura colocava a imagem do Menino Jesus de Praga, a quem tinha
verdadeira adoração.
Havia verdadeiro céu negro de estrelas feito em colagem de papel e
papelão com a estrela-guia e alguns anjos. Semicírculo de bambu e
gravetos limitava a gruta feita em papel amassado que lembravam rochas.
Os caminhos eram de serragem e areia, as planícies verdes eram feitas de
tintas e possuíam arrozais e outros tipos de plantas que variavam de ano
para ano, monjolo, capelas e até casas modernas, tudo era possível
encontrar no Presépio.
Burros, vacas, carneiros, patos e qualquer outro tipo de bicho que
aparecesse ela logo arrumava lugar. Até um gato ele colocou em um ano,
apesar do protesto de alguns que não queriam a presença do felino.
Irredutível ele dizia: - O gato também é criação de Deus e o presépio é meu
e ele fica. Confesso que até hoje não entendi está história do gato. Lembro
apenas que quem inicialmente disse foi a Eva, filha da queridíssima “Fifa”
do Adão Macarrão. Aliás, a “Fifa” – que fazia deliciosos pirulitos - foi uma
das boníssimas pessoas que tive o prazer de conviver em criança. Que
Deus a tenha.
O palco central desta representação era mesmo a manjedoura que
me parecia desproporcional em tamanho (pequenas demais) em relação ao
Menino Jesus de Praga. Cogitou-se até em comprar um novo, não houve
acordo e o Menino Jesus de Praga, tendo avó Isaura como advogada, saiu
vencedor.
Até aos dezesseis anos gostava de visitar os Presépios das Igrejas
e apreciava o capricho das imagens humanas, dos três Reis magos
(Gaspar, Belchior e Baltazar) e a imagem do Menino Deus sob os olhares
carinhosos de seus pais.
Hoje nem a Igreja costumo ir mais e em minha casa não há essas
“praticas tão antiquadas”. Mas quanto recupero estas lembranças meus
olhos começam a lagrimejar e sinto uma tristeza imensa por saber que esta
fase se foi, assim como meus queridos avôs, que muito ofereceram para
seu neto e nunca exigiram nada em troca.
Eles são até hoje, espelho de minha
vida e meus anjos de guarda. Eram pessoas
doces, meigas, serenas e amorosas. Dona
Isaura tinha uma brancura singela, típica de
uma descendente de italianos, e uma rara
combinação de beleza, inteligência e
simpatia. Seus olhos transmitiam alegria de
viver e o brilho de seus cabelos, a luz das
lamparinas de querosene ou do lampião,
possuía o mesmo brilho dourada das
chamas. Embora com uma aparência frágil,
era uma mulher forte, de muita força e
determinação.
Possuía um silencioso orgulho de
pertencer àquelas terras e sonhava deixá-las
apenas a caminho da morada eterna.
Infelizmente este sonho lhe foi negado e veio a falecer em Caratinga, longe
do torrão amado.
Junto com ela adorava ver pela janela, que dava pelos lados dos
“Nicetos”, a lua cheia que pairava sobre as árvores e parecia uma grande
e lustrava pérola contra a escuridão aveludada da noite, salpicada de
estrelas que brilhavam como diamantes.
Já meu avô Zé Jacob normalmente usava um chapéu com a aba a
sombrear o seu rosto queimado pelo sol. Possui cabelos pretos que com
os raios do astro rei a atingi-los, aos meus olhos, pareciam tingidos de um
tom prateados. Seu porte era tranquilo e seu lábio ostentava-se sempre um
sorriso de felicidade ao contemplar os seus dois netos. Nos dias
ensolarados no roçado tirava o chapéu de palha, enxugando a testa com
seu antebraço, enfiando em seguida o mesmo nos cabelos negros.
Sempre que penso nele sinto uma chicotada de emoção, que ainda
não foi diluída pelo tempo, mesmo ciente de não ser mais possível
desfrutar de sua presença nesta mesma dimensão da terra. Ele gostava de
sentir o solo vermelho entre as mãos e fechava os dedos em torno da terra
seca, sentindo a aspereza e repassando para o seu neto que aquele solo
era uma fonte de alimento para a vida vegetal. Era a fertilidade que se
encontrava em suas mãos e compunha a primeira cadeia do ciclo da
natureza.
Se Deus permitisse gostaria que meu espirito velejasse pelo céu azul
e por aquelas planícies, ao acorde de um doce poema de saudades,
desfrutando uma visão privilegiada destas doces pessoas que foram
importantes na minha vida.
Descanse em paz meu avô. Descanse em paz minha avó. Que seus
espíritos me acompanhem em toda minha existência e seja o farol a guiar
meus passos por este imenso labirinto chamado vida.

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Meus avos maternos

  • 1. Contos de momentos especiais que não voltam mais. Geraldo Magela Batista Visite o Site: www.geraldofadipa.comunidades.net Meus avós maternos. Na morada dos saudosos José Jacob e Isaura Alvarenga. A casa dos meus avôs situava-se à direita da fazenda, de meu bisavô materno, é era necessário seguir por um caminho estreito que tinha o seu final lá pelas propriedades dos “Nicetos”. Antes passávamos próximas as moradas dos tios de minha mãe, chamados Altivo e Geraldo (Não cheguei a conhecê-lo, pois já era falecido). Recordo perfeitamente do medo que sentia quando deparávamos com o gado do tio Altivo a pastar junto do caminho. A residência possuía uma cozinha enorme com um fogão a lenha e uma mesa de centro, dois quartos, copa e sala. A parte mais usada era a cozinha. Na verdade era pela sua porta que se recebiam as visitas e se realizavam todas as comemorações familiares. Nela era comum presenciar minha avó Isaura preparando uma sopa de couve e fritando carne de porco retirada, ao meio de imensa gordura, de um latão de cerca de dez litros. Sem contar os vapores aromáticos que emanava de um grande bule com café de rapadura estacionado nas trempes, e mantido no ponto, pelas chamas de pontas amarelas que dançavam sobre as brasas do fogão. Próximo da porta, em uma bancada de madeira, ficava o moedor de café. Era comum o cheiro de linguiça que defumava dependurada por cima do fogão, juntamente com o milho de pipoca. Lembro-me que não gostava de rondar pelos lados do quarto de visitas, que situava junto à sala, devido ao papo que ali tinha morrido uma pessoa enforcada. Na verdade tinha medo de adentrar pela sala, pois o quarto aos meus olhos era a prisão da alma de uma pessoa suicida. Local sinistro onde o brilho de uma vida foi apagado. Podia sentir o balançar da cabeça na ponta de uma fina corda lançada sobre a madeira que sustentava o telhado e as vozes noturnas de homens e mulheres, não sei o porquê que em minha mente a morte tenha ocorrido à noite, levadas pela brisa anunciando o factício suicídio. Para meus olhos de crianças o quarto representava gritos e sangue, sintaxe de um corpo imaginário, que se lançou no dilúvio de chamas e erupções do inferno.
  • 2. Do lado de fora tinha uma bica que ficava a jorrar água dia e noite e seu transporte era feito por troncos de coqueiros cortados de comprido e escavados emendados uns aos outros e sustentados por madeira de primeira para maior durabilidade, desde a origem da nascente, em uma pequena elevação há oitocentos metros, até o cercado próximo da casa. Meu avô, em tom brincalhão, dizia que a água estava tão acostumada com o percurso que quando os troncos de coqueiro apodrecessem e caísse, ela continuaria a correr suspensa no ar. Próximo da bica tinha imensos abacateiros de folhas lustrosas, flores pequenas, frutos grandes de casca verde e polpa cremosa. Apesar do incômodo da queda dos frutos não colhidos cujo odor acentuado atraia um bom número de abelhas, eles nunca pensaram em cortar os pés da “manteiga que vem da madeira". Diversas espécies de pássaros frequentavam seus galhos, para alimentar de seus frutos repondo as energias gastas no vôo, e contemplava nossos ouvidos com melodias em diversos tons. Eram nesses abacateiros que o saudoso “vô Jacó” entrelaçava duas alas de corda em seus galhos e uma tábua na parte de baixo. Era a gangorra, motivo de alegria para o seu casal de netos, e de preocupação para minha avó Isaura. Não me esqueço de suas palavras: “que falta de juízo Zé, já pensou se os meninos machucarem. Ho flagelo”. Meu avô implicava com algumas frutas e dava sua explicação “cientifica” para cada uma delas. O jatobá, para ele, não era um fruto saboroso e o comparava com o pó de serra que secava a boca a ponto de sair correndo pelo pasto em busca de um riacho. A jaca era pesada demais a ponto de povoar sua noite com pesadelo se comer antes de deitar. Sem contar do perigo de se engasgar com o caroço. Foi com ele que provei a fruta de jatobá gosto de pó de serra. Outra de suas explicações era para o sabor das frutas. Segundo ele se os passarinhos e as vespas rodeiam determinada fruta e porque ela é saborosa. Pois é, passarinho sabe escolher as frutas. Minha avó vivia preocupada com uma cabra que conduzia uma pequena carroça, isto porque meu avô colocava (eu e minha irmã Lúcia) dentro da carroça para passearmos pelo terreiro. Um belo dia a cabra resolveu pôr à prova a sua capacidade de corrida e disparou como uma flecha pelo terreiro. Por sorte, ele conseguiu conter a corrida e paramos em frente da cerca. Ufa! Lembro-me, também, de uma coruja que ficava nos galhos dos abacateiros, tocando a sua “música fúnebre” (batida de seus bicos nos galhos), e minha avó Isaura afirmava que a música indicava que haveria morte na família, já que a mesma simbolizava o toque do martelo em pregos fechando o caixão. Para espantar a coruja, meu avô saía com um lampião, e com essa precária iluminação a localizava e lançando pedras, fazia-a voar e deixar o abacateiro. No seu vôo, ela piava como se estivesse rasgando pano, o pano que envolve os mortos: a mortalha.
  • 3. No terreiro sempre havia galinhas a desfilar o seu ciscar e a correr do ataque dos cães, que sem motivos aparente se punha a perseguir as pobres aves. O galo, rei do terreiro, sempre se exibia com cabeça alta, olhos agudos e passos militar. Seu canto afinado definia o horário da alvorada e o toque de recolher. Era o Manda-Chuva por natureza e ofício. A vida das galinhas era uma rotina. Sua existência resumia em comer, receber a visita do galo, um ninho para pôr os ovos e poleiro para dormir. “Vô Jacob” dizia que o ideal era sete galinhas para cada galo. Mas dois ou mais galos juntos complicava, pois não conseguiam viver pacificamente. Achava engraçadas as galinhas chocas. Normalmente corriam de tudo por qualquer motivo, mas quando chocas enfrentavam qualquer perigo. O instinto materno as deixava valentes e viravam uma fera para defenderem seus ovos no ninho e depois os pintinhos. Até os cães não ousava desafia-las. Havia também os lagartos que nas manhãs se punha em cima dos pedaços de madeiras e das elevações de terras endurecidos para sentir os raios do sol. Logo depois da bica, em direção a um córrego que deslizava mansamente para o Ribeirão Sacramento havia uma grande pedra. Sobre ela vespas e abelhas listradas zumbiam dividindo o matagal com borboletas coloridas e aranhas que tricotavam suas redes entre a vegetação. Libélulas coloridos, com seus corpos de flecha, sobrevoavam as borbulhentas águas a caça de seus alvos prediletos. Sobre esta pedra sentia uma alegria ingênua e harmônica adentrar pelos poros de meu corpo quente sentindo-me bem mais leve, como se fosse flutuar, mesmo que o meu físico insensível teimasse em permanecer em terra. Entre o riacho e a casa principal sempre havia plantação de milho que cresciam com seus lindos pendões e espigas imensas. O milho quando verde era colhido e servido cozido, assado na espiga ou na forma de mingau. Minha avó dizia que o milho verde não devia ser cozido em excesso, pois ao contrário do que se pensam, os grãos ficarão mais duros. O milho plantado ficava dormindo no chão aconchegado em seis grãos na cova. Vida inerte que a terra iria multiplicar e realizar o milagre do nascer e de um canudo enrolado, amarelo pálido, se levantava e crescia garboso com os pendões balançando ao vento. A boneca virava espiga e a espiga cheia saltava da haste. Depois seu tronco seco e ressecado servia de suporte, por onde feijão verde trançava, enramava e enflorava. Os pés de feijão explodiam as vagens para o sustento, num abrir e fechar de olhos. Toda a plantação parecia compartilhar de um destino comum, uma festa comum, feito gente. O mundo era verde. Que mais podíamos desejar?
  • 4. Gostava de ir a uma parte do terreno em que tinha uma pedra com pés de goiabeiras para realizar uma brincadeira solitária - subir nos pés destas árvores. Estas goiabeiras eram minhas amigas intimas. Eu subia sempre para pegar goiaba ou simplesmente quanto estava triste. Ali ficava matutando sobre os questionamentos de crianças e quando estava com raiva ficava conversando com ela. Lembro-me das névoas matinais que cobria as árvores e dos raios de luz infiltrando-se pelo denso ar, parecendo teias, para brilhar nos matagais molhado de orvalho. A neblina que cobria o céu, lá pelos lados do capoeirão, em questão de tempo se dissiparia com o calor emitido pelo sol após o seu completo despertar. Nestas manhãs utilizava sempre o olhar para buscar as distâncias físicas entre as montanhas, divisar os limites do horizonte que se abria ao meu redor. Ao praticar esse exercício descobria um amplo espaço cercado de puro céu por todos os lados. Nestes amplos espaços, feliz, corria livre sentindo o contato da natureza, o sabor das frutas colhidas diretamente do pé e contemplava a correria dos pequenos peixes do riacho que existia próximo a um grupo de rocha, lá dos lados da bica d’água. Na quietude destas manhãs, era comum ouvir as batidas da lâmina de um machado mordendo a madeira, para a obtenção da lenha que iria fornecer o calor necessário ao preparo das iguarias magistralmente preparadas pelas mãos de minha avó. No natal havia Presépio. Minha avó Isaura com a ajuda do avô Jacob, da minha mãe e até mesmo de meu pai armavam com carinho e junto à manjedoura colocava a imagem do Menino Jesus de Praga, a quem tinha verdadeira adoração. Havia verdadeiro céu negro de estrelas feito em colagem de papel e papelão com a estrela-guia e alguns anjos. Semicírculo de bambu e gravetos limitava a gruta feita em papel amassado que lembravam rochas. Os caminhos eram de serragem e areia, as planícies verdes eram feitas de tintas e possuíam arrozais e outros tipos de plantas que variavam de ano para ano, monjolo, capelas e até casas modernas, tudo era possível encontrar no Presépio. Burros, vacas, carneiros, patos e qualquer outro tipo de bicho que aparecesse ela logo arrumava lugar. Até um gato ele colocou em um ano, apesar do protesto de alguns que não queriam a presença do felino. Irredutível ele dizia: - O gato também é criação de Deus e o presépio é meu e ele fica. Confesso que até hoje não entendi está história do gato. Lembro apenas que quem inicialmente disse foi a Eva, filha da queridíssima “Fifa” do Adão Macarrão. Aliás, a “Fifa” – que fazia deliciosos pirulitos - foi uma das boníssimas pessoas que tive o prazer de conviver em criança. Que Deus a tenha.
  • 5. O palco central desta representação era mesmo a manjedoura que me parecia desproporcional em tamanho (pequenas demais) em relação ao Menino Jesus de Praga. Cogitou-se até em comprar um novo, não houve acordo e o Menino Jesus de Praga, tendo avó Isaura como advogada, saiu vencedor. Até aos dezesseis anos gostava de visitar os Presépios das Igrejas e apreciava o capricho das imagens humanas, dos três Reis magos (Gaspar, Belchior e Baltazar) e a imagem do Menino Deus sob os olhares carinhosos de seus pais. Hoje nem a Igreja costumo ir mais e em minha casa não há essas “praticas tão antiquadas”. Mas quanto recupero estas lembranças meus olhos começam a lagrimejar e sinto uma tristeza imensa por saber que esta fase se foi, assim como meus queridos avôs, que muito ofereceram para seu neto e nunca exigiram nada em troca. Eles são até hoje, espelho de minha vida e meus anjos de guarda. Eram pessoas doces, meigas, serenas e amorosas. Dona Isaura tinha uma brancura singela, típica de uma descendente de italianos, e uma rara combinação de beleza, inteligência e simpatia. Seus olhos transmitiam alegria de viver e o brilho de seus cabelos, a luz das lamparinas de querosene ou do lampião, possuía o mesmo brilho dourada das chamas. Embora com uma aparência frágil, era uma mulher forte, de muita força e determinação. Possuía um silencioso orgulho de pertencer àquelas terras e sonhava deixá-las apenas a caminho da morada eterna. Infelizmente este sonho lhe foi negado e veio a falecer em Caratinga, longe do torrão amado. Junto com ela adorava ver pela janela, que dava pelos lados dos “Nicetos”, a lua cheia que pairava sobre as árvores e parecia uma grande e lustrava pérola contra a escuridão aveludada da noite, salpicada de estrelas que brilhavam como diamantes. Já meu avô Zé Jacob normalmente usava um chapéu com a aba a sombrear o seu rosto queimado pelo sol. Possui cabelos pretos que com os raios do astro rei a atingi-los, aos meus olhos, pareciam tingidos de um tom prateados. Seu porte era tranquilo e seu lábio ostentava-se sempre um sorriso de felicidade ao contemplar os seus dois netos. Nos dias ensolarados no roçado tirava o chapéu de palha, enxugando a testa com seu antebraço, enfiando em seguida o mesmo nos cabelos negros.
  • 6. Sempre que penso nele sinto uma chicotada de emoção, que ainda não foi diluída pelo tempo, mesmo ciente de não ser mais possível desfrutar de sua presença nesta mesma dimensão da terra. Ele gostava de sentir o solo vermelho entre as mãos e fechava os dedos em torno da terra seca, sentindo a aspereza e repassando para o seu neto que aquele solo era uma fonte de alimento para a vida vegetal. Era a fertilidade que se encontrava em suas mãos e compunha a primeira cadeia do ciclo da natureza. Se Deus permitisse gostaria que meu espirito velejasse pelo céu azul e por aquelas planícies, ao acorde de um doce poema de saudades, desfrutando uma visão privilegiada destas doces pessoas que foram importantes na minha vida. Descanse em paz meu avô. Descanse em paz minha avó. Que seus espíritos me acompanhem em toda minha existência e seja o farol a guiar meus passos por este imenso labirinto chamado vida.