1. Julho-Agosto, 2010 I ULTIMATO 1
ENTREVISTA: GUILHERME FARIA – O casamento é uma instituição de direito entre um homem e uma mulher
ARIOVALDO
RAMOS
QUESTÃO DE
ORDEM
CARLOS “CATITO” GRZYBOWSKI
COMO RESGUARDAR A CRIANÇA DO
SEXO PRECOCE, DA PORNOGRAFIA E
DA HOMOSSEXUALIDADE
ALDERI MATOS
PERSEGUIÇÃO
NO MUNDO
CONTEMPORÂNEO
Abraçando e
reabraçando
a santidade do corpo e da mente
3. Julho-Agosto, 2010 I ULTIMATO 3
G
adara é uma cidade da Transjordânia, a dez
quilômetros ao sudeste do mar da Galileia,
na Palestina. Nos tempos de Jesus, havia
ali um homem fora de si. Ele era muito
estranho: não parava em casa, passava
dias e noites nas cavernas e nos cemitérios, feria-se de
propósito, gritava pelas estradas, tinha uma força capaz
de arrebentar correntes de ferro, andava nu e assustava
todo mundo. Poderia ser um louco varrido, mas, no caso
desse gadareno, o diagnóstico era outro. O rapaz estava
de fato endemoninhado.
Os demônios são espíritos maus a serviço de
Satanás, capazes de entrar numa pessoa e dominá-la por
completo, causando tormentos e transtornos mentais.
Eles são inimigos de Deus, mas não são ignorantes.
Referem-se a Deus como o “Deus Altíssimo” (Mc 5.7;
At 16.17) e a Jesus como o “santo de Deus” (Mc 1.24)
ou o “Filho do Deus Altíssimo” (Mc 5.7). Quando Jesus
pisou em terra, o endemoninhado de Gadara foi ao
seu encontro e o Senhor o curou. Pouco depois o rapaz
“estava assentado aos pés de Jesus, vestido e em perfeito
juízo” (Lc 8.35). O milagre provocou grande reboliço
em toda a região e reações diferentes. Os envolvidos
com aquele acontecimento fizeram pedidos diferentes e
curiosos a Jesus. Os demônios pediram com insistência
a Jesus que os transferisse do corpo daquele homem para
os porcos que pastavam nas imediações. Os gadarenos
pediram com insistência que Jesus saísse da terra deles. E
o ex-endemoninhado pediu com insistência que Jesus o
deixasse permanecer na companhia dele.
O pedido dos demônios foi atendido de pronto.
A manada de porcos, “que era de cerca de dois mil,
precipitou-se despenhadeiro abaixo, para dentro do mar,
onde se afogaram” (Mc 5.13). O pedido dos gadarenos
também foi atendido: “Jesus subiu no barco e foi
embora” (Lc 8.37). Todavia, o pedido coletivo e unânime
do povo daquela cidade é um dos mais estranhos de que
se tem notícia! Por trás dele estava o dinheiro. Com a
morte dos porcos, o prejuízo dos porqueiros foi enorme
(quase meio milhão de reais, caso os porcos estivessem
no ponto de abate).
Mas o pedido do ex-endemoninhado não foi
atendido. Jesus tinha outros planos para ele: “Volte
para casa e conte aos seus parentes o que o Senhor lhe
fez e como ele foi bom para você” (Mc 5.19). Naquele
dia, Jesus e o homem curado se separaram e seguiram
direções opostas: o Senhor atravessou o lago e foi para
o oeste e o ex-endemoninhado seguiu não só para
sua própria casa, mas também para a vasta região de
Decápolis, no lado leste (Mc 5.20).
Entre as dez cidades que formavam a antiga
Decápolis, cuja população em sua maioria era grega,
estavam Gadara, Gerasa, Damasco e Filadélfia. Essa
Filadélfia é hoje Amã, capital da Jordânia. Quem sabe
o ex-endemoninhado de Gadara teria sido o primeiro
missionário da atual Jordânia!
EvaSerna
Amã, atual capital da Jordânia
O gadareno teria sido o primeiro
missionário na Jordânia?
Abertura
4. 4 ULTIMATO I Julho-Agosto, 2010
S
em diagnóstico, não há tratamento. Sem tratamento, não
há cura. Sem cura, o prolongamento da vida é incerto.
O mesmo acontece com as doenças da alma.
Pouco antes de sua morte, Jesus explicou que o
ministério do Espírito Santo seria convencer o mundo
do pecado, da justiça e do juízo (Jo 16.8). A doença da alma é o pecado.
Esse é o diagnóstico correto, difícil de ser admitido. A convicção
de pecado é a porta de entrada para o arrependimento e o perdão.
O processo da salvação começa sempre aí. Porém, além de convencer o
pecador do pecado, o Espírito Santo convence-o da justiça de Deus, isto
é, da justiça propiciada pela morte sacrifical de Cristo. Apropriando-se
pela fé da justiça de Deus, o pecador arrependido é então feito justo e
não está mais em débito diante de Deus (Rm 1.17; 5.1; 8.1).
Pouco antes de sua ascensão, Jesus ordenou que seus discípulos
percorressem o mundo inteiro anunciando sempre duas mensagens
“coladas” uma na outra: a mensagem do arrependimento e a mensagem
do perdão (Lc 24.17). O que leva ao arrependimento é a convicção do
pecado; o que leva ao perdão é a aceitação pela fé de Jesus como Salvador
e Senhor. Sem falar em pecado não há necessidade de falar em perdão.
A propósito, é oportuno citar uma observação feita há 65 anos, no Rio
de Janeiro, pelo formidável missionário batista William Carey Taylor:
“Suponho haver, neste instante, ao menos um milhão de pecadores no
Brasil que estão intelectualmente convencidos da verdade do evangelho,
faltando-lhes, no entanto, a convicção de pecado para poderem crer e ser
salvos” (Evangelho de João, 1975, v. 3, p. 104). É o caso de se perguntar:
quantos milhões haveria hoje depois do espantoso crescimento de igrejas
evangélicas no país?
Pouco antes de sua última ida a Jerusalém, Jesus ensinou aos seus
discípulos: “Se o seu irmão pecar, repreenda-o e, se ele se arrepender,
perdoe-lhe” (Lc 17.3). Aqui estão, outra vez juntas, as duas obrigações
gêmeas: repreender o culpado e perdoar o arrependido.
Um dos deslizes da igreja de Corinto foi a ausência de ambas as
providências: eles deixaram de repreender o imoral que chegou a deitar-
se com a mulher do próprio pai (1Co 5.1-5) e também deixaram de
perdoá-lo depois que ele se arrependeu (2Co 2.5-11).
Com temor e tremor, Ultimato apresenta uma porção de textos
bíblicos para provocar, em nosso meio e na sociedade na qual estamos
inseridos, duas descobertas ou redescobertas: a descoberta do pecado e a
descoberta do perdão.
Elben César
Carta ao leitor
ISSN 1415-3165
Revista Ultimato – Ano XLIII – Nº 325
Julho-Agosto 2010
www.ultimato.com.br
Publicação evangélica destinada à evangelização e
edificação, não denominacional, Ultimato relaciona
Escritura com Escritura e acontecimentos com
Escrituras. Visa contribuir para criar uma mentalidade
bíblica e estimular a arte de encarar os acontecimentos
sob uma perspectiva cristã. Pretende associar a teoria
com a prática, a fé com as obras, a evangelização com
a ação social, a oração com a ação, a conversão com
santidade de vida, o suor de hoje com a glória por vir.
Circula em meses ímpares
Diretor de redação e jornalista responsável:
Elben M. Lenz César – MTb 13.162 MG
Arte: Liz Valente
Impressão: Plural
Tiragem: 35.000 exemplares
Colunistas: Alderi Matos • Bráulia Ribeiro
Carlinhos Veiga • Marcos Bontempo
Paul Freston • René Padilla
Ricardo Barbosa de Sousa • Ricardo Gondim
Robinson Cavalcanti • Rubem Amorese
Valdir Steuernagel
Participam desta edição: Alcir Souza • Ariovaldo
Ramos • Carlos Caldas • Carlos “Catito” Grzybowski
Lissânder Dias • Tais Machado
Publicidade: anuncio@ultimato.com.br
Assinaturas e edições anteriores:
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fonte. Os artigos não assinados são de autoria
da redação.
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da Associação de Editores Cristãos (AsEC)
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Vendas: Lúcia Viana • Lívia Moraes
Lucinéa Campos • Romilda Oliveira
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Estagiários: Ariane Santos • Euniciléa Ferreira • Jamille
Filgueiras • Juliani Lenz • Thales Moura Lima
fundada em 1968
4 ULTIMATO I Julho-Agosto, 2010
A descoberta do pecado
e a descoberta do perdão
PaulBarker
6. 6 ULTIMATO I Julho-Agosto, 2010
AsifAkbar
69.
O impossível
torna-se possível
E
xistem o fácil e o difícil, o mais fácil e
o mais difícil, o possível e o impossível.
Todavia o difícil pode se tornar fácil, o
impossível pode se tornar possível. Quando
Jesus disse: “É mais difícil um rico entrar no
Reino de Deus do que um camelo passar pelo fundo
de uma agulha” (Lc 18.25, NTLH), o Senhor não
estava dizendo que a salvação daquele jovem rico era
literalmente impossível, pois “o que é impossível para
os homens é possível para Deus” (Lc 18.27). Jesus
mesmo ensinou que a fé no poder e na misericórdia de
Deus, mesmo que pequena como o grão de mostarda,
pode remover montanhas tão altas como o monte
Hermon (Mt 17.20). A palavra impossível pertence ao
vocabulário humano e nunca é pronunciada no céu.
Para Deus não é impossível que o imoral deixe de
ser imoral, que o idólatra deixe de ser idólatra, que
o adúltero deixe de ser adúltero, que o homossexual
deixe de ser homossexual, que o ladrão deixe de ser
ladrão, que o avarento deixe de ser avarento, que o
alcoolista deixe de ser alcoolista, que o caluniador
deixe e ser caluniador, que o trapaceiro deixe de ser
trapaceiro (1Co 6.9-11). Pedro deixou de ser medroso
ao extremo para ser corajoso ao extremo. João deixou
de ser “filho do trovão” para ser o profeta do amor.
Aquele homem nascido em Tarso da Cilícia deixou de
ser Saulo para ser Paulo, deixando de ser o perseguidor-
mor para ser o perseguido-mor. Tomé deixou de ser
incrédulo para ser crente. Depois do encontro com
Jesus Cristo, o publicano Zaqueu distribuiu a metade
de seus bens com os pobres e se dispôs a devolver
quatro vezes mais o que porventura havia roubado
dos outros. Uma vez perdoadas, as três mulheres
envolvidas com pecados sexuais (a mulher samaritana,
a mulher adúltera e a mulher pecadora) viveram vidas
diferentes.
Desde o primeiro compêndio da história do
cristianismo até hoje, milhares de indivíduos
conhecidos por seus vícios e mazelas tornaram-se
conhecidos por sua vida cristã. Ao 17 anos, o profano
Agostinho já tinha uma amante; quinze anos depois
passou pela experiência da conversão, satisfez sua sede
e fome de Deus, e tornou-se o santo Agostinho.
É preciso diferenciar a santificação da conversão.
Esta é a porta de entrada da vida cristã. Marca o
início do comprometimento pessoal com Jesus Cristo,
quando ocorre uma profunda transformação de fé e
de caráter, operada pela graça de Deus e pelo poder
do Espírito Santo. Já a santificação é o processo
contínuo e progressivo da vitória do convertido sobre
suas tendências pecaminosas, sobre suas dificuldades
pessoais, sobre a ditadura do eu, que precisa ser
crucificado o tempo todo. Diz respeito também ao
nível cada vez maior de conhecimento e comunhão
com Deus e ao crescimento da fé, da submissão, do
sentimento de dependência e da humildade. Não é
um processo legalista e terrorista. Qualquer derrota
pode ser admitida, confessada e perdoada, desde
que tenha causado tristeza e arrependimento. A
santificação bem-sucedida requer vigilância, devoção e
obediência.
O Deus dos impossíveis que se manifestou na
conversão é o mesmo que se manifesta na santificação.
É também o mesmo que vai se manifestar na
glorificação de todos os crentes por ocasião da parusia
de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo. Naquele
dia seremos semelhantes a ele (1Jo 3.2; Rm 8.29;
2Co 3.18)!
Pastorais
7. Julho-Agosto, 2010 I ULTIMATO 7
24 Abraçando e reabraçando a
santidade do corpo e da mente
25 Uma paráfrase da Bíblia sobre a
criação da mulher
26 Como resguardar a criança do
sexo precoce, da pornografia e da
homossexualidade
Carlos “Catito” Grzybowski
28 A porno-Corinto
30 Como pode terminar uma noite de
orgia sexual
31 Sobre a sexualidade cristã
Wolfhart Pannenberg
32 A absurda decisão de não amar o
cônjuge, Lissânder Dias do Amaral
3 Abertura
4 Carta ao leitor
6 Pastorais
8 Cartas
12 Frases
14 Mais do que notícias
18 Notícias
22 Números
38 De hoje em diante...
39 Reportagem
42 Meio ambiente e fé cristã
43 Caminhos da missão
44 Altos papos
45 Novos acordes
59 Deixem que elas mesmas falem
CAPA
SEÇÕES
Leia mais
www.ultimato.com.br
Sumário
ABREVIAÇÕES:
AS21 - Almeida Século 21; BH - Bíblia Hebraica; BJ - A Bíblia de
Jerusalém; BP - A Bíblia do Peregrino; BV - A Bíblia Viva; CNBB -
Tradução da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil; CT - Novo
Testamento (Comunidade de Taizé); EP - Edição Pastoral; EPC - Edição
Pastoral - Catequética; HR – Tradução de Huberto Rohden; KJ - King
James (Nova Tradução Atualizada dos Quatro Evangelhos); NTLH - Nova
Tradução na Linguagem de Hoje; TEB - Tradução Ecumênica da Bíblia. As
referências bíblicas não seguidas de indicação foram retiradas da Edição
Revista e Atualizada, da Sociedade Bíblica do Brasil, ou da Nova Versão
Internacional, da Sociedade Bíblica Internacional.
Especial
34 Pai nosso, que estás nos céus! Seja feita
a tua vontade quanto à nossa
sexualidade
35 Heterossexualidade sem homofobia e
homossexualidade sem heterofobia
36 A solução do problema gay na
perspectiva cristã
Da linha de frente
46 Metáforas de uma vida passiva
Bráulia Ribeiro
Missão integral
47 O mandamento de fazer discípulos
René Padilla
Ética
48 Questão de ordem, Ariovaldo Ramos
O caminho do coração
49 Assentados em lugares celestiais
Ricardo Barbosa de Sousa
Reflexão
52 50 anos de crente: 1960-2010
(parte final), Robinson Cavalcanti
54 Teologia e esperança, Ricardo Gondim
Redescobrindo a Palavra de Deus
57 Chamados para expulsar demônios:
libertação e graça, Valdir Steuernagel
História
60 Sofrendo pelo nome de Cristo:
perseguição no mundo contemporâneo
Alderi Souza de Matos
Entrevista
62 Guilherme Nacif de Faria: O casamento é
uma instituição de direito entre um homem
e uma mulher
Ponto final
66 Atendimento, entendimento e presença
Rubem Amorese
8. 8 ULTIMATO I Julho-Agosto, 2010
A turma de Jesus
A começar pelo título, Ultimato não foi feliz
na escolha do termo turma. Não se trata
de vocábulo essencialmente depreciativo,
mas pela relação de sinonímia com bando,
acaba infetado pela proximidade. O mais
grave, porém, vem em seguida. Sei que é
uma constante da literatura protestante, ao
falar da virgem Maria, insistir em banalizar
seu papel no plano divino da salvação, em
proporção inversa à hiperexaltação católica.
O que não sabia é que a livre interpretação
das Sagradas Escrituras já havia incorporado
o conceito moderno de “barriga de aluguel”.
Dizer que Maria “cedeu o ventre para gerar”
é comparar com o que acontece com quem
aluga seu ventre para nele ser introduzido
um bebê de proveta, isto é, o embrião ali se
instala exclusivamente para se desenvolver.
Nessa concepção, Maria não teria tido nenhuma
participação ativa de mãe que concebe,
impondo-nos assim a releitura de Isaías 7.14,
Lucas 1.31 e Hebreus 4.15. De tanto banalizar,
acaba-se banalizando o próprio mistério da
encarnação, “envolvido em silêncio desde
os séculos eternos” (Rm 16.25), latente nos
“escritos proféticos”, abertamente revelado, pela
primeira vez, a uma humilde jovem de Israel e
nela própria consumado.
Edilson Cunha, Brasília, DF
Sempre leio Ultimato, que tem sido uma bênção
em minha vida. A turma de Jesus (“Capa”, maio/
junho de 2010) foi uma dos melhores matérias.
Nilza Nira
Se Maria recebeu uma visita especial do anjo
Gabriel, se ela recebeu a grandiosa mensagem
de que seria mãe do Filho de Deus, se teve de
fugir com o filho para o Egito por ordem do anjo,
se estava o tempo todo ciente de que o menino
que ela amamentava era o Filho de Deus, como
é possível pensar que ela teve a pretensão de
se deitar com José para ter mais filhos? Será
que esse filho, que é o Filho de Deus, gerado
por uma concepção especial que não somos
capazes de entender, não bastava para ela? Será
que interpretar que Maria teve mais filhos não é
banalizar o significado da vinda do Filho de Deus
entre os homens? Quando Jesus se referia aos
“irmãos” (em hebraico), dizer que eles seriam de
fato irmãos carnais de Jesus não é forçar demais
a interpretação? Perguntem às mulheres se elas
teriam mais filhos se fossem a mãe do Filho de
Deus.
Wigbert Weber, Criciúma, SC
Parabéns pela matéria de capa A turma de Jesus
(maio/junho de 2010), pois serviu para somar
mais conhecimentos e contrabalançar tantos
artigos adulterados e sem fundamentos bíblicos.
Adecio da Silva, Nova Iguaçu, RJ
Os evangélicos e a teologia liberal
O artigo de Alderi Souza de Matos (“História”,
maio/junho de 2010) foi certeiro em todos os
pontos e relevante para nossos dias, em que
muitos estão tomando os velhos rumos em
direção ao liberalismo teológico. É tão gostoso ler
algo objetivo, historicamente correto e profético.
Que o Senhor nos ajude, e que Ultimato seja
como uma daquelas instituições que Alderi
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Cartas
9. Julho-Agosto, 2010 I ULTIMATO 9
mencionou, que ficaram firmes no século
passado, como pequenas barreiras contra o
maré da secularização do evangelho.
Barbara Burns, João Pessoa, PB
No meio do jardim
O artigo No meio do jardim e da cidade, o meio
ambiente (“Meio ambiente e fé cristã”, maio/
junho de 2010) mexeu comigo ao falar em
jardim, pois meu esposo, Amálio Jonkoski, foi
para lá e eu fiquei na cidade! Agradeço pela
existência de Ultimato.
Neusa Sasso, Curitiba, PR
Brasília tem mais do que dez
justos
Surpreendeu-me a frase de Rene G. Santana: “A
única saída para Brasília seria chover muito fogo
e muito enxofre por lá” (“Frases”, maio/junho
de 2010). Brasília não tem somente políticos
corruptos. É uma cidade linda, que acolhe
carinhosamente pessoas de qualquer estado
brasileiro. Lembro a resposta do Senhor a
Abraão: “Não destruirei [Sodoma] por amor dos
dez [justos]”. Ora, Brasília tem bem mais do que
dez justos e tementes a Deus!
Ana Barreto, Brasília, DF
Seminário de Mariana
Sou padre católico em Barbacena. Gosto de ler
Ultimato porque percebo a intenção de anunciar
Jesus e promover um diálogo construtivo entre
os que hoje são seus discípulos (evangélicos ou
católicos). Entretanto, algumas frases infelizes
me causam estranheza, como a que li na Carta
aberta (março/abril de 2010). Há uma referência
ao Seminário de Mariana como “o mais
tridentino dos seminários católicos do Brasil”.
Na década de 60, o Seminário de Mariana era
tridentino, e estava em comunhão com a Igreja
Católica, que também o era, já que, até então,
Trento era o último concílio realizado e suas
normas vigoravam para toda a igreja (houve o
Concílio do Vaticano I, mas que não modificou
substancialmente a visão eclesial e doutrinal
de Trento). Por outro lado, o Concílio de Trento
produziu uma grande reforma espiritual e moral
dentro da Igreja Católica. Sem dúvida, através
de Trento, o Espírito Santo renovou a igreja, em
especial o ardor missionário e a exigência de
se constituírem seminários para uma formação
mais profunda do clero. Enxergar o Concílio de
Trento apenas como uma estratégia organizada
para perseguir os protestantes é ter uma visão
reducionista da história. Quando foi promulgado
o Concílio Vaticano II, o Seminário de Mariana o
abraçou de imediato e suas orientações têm sido
uma das referências para a formação sacerdotal
em Mariana. Fiz o seminário entre as décadas
de 80 e 90 e posso avaliar o quanto a afirmação
é preconceituosa e inverídica. O ecumenismo
e o diálogo inter-religioso sempre estiveram
presentes em minha formação. Nos estudos
teológicos e exegéticos, nunca deixamos de
conhecer e nos aprofundar nas obras mais
importantes de autores protestantes sérios.
Convido os editores de Ultimato a manter uma
relação isenta e aberta com o Seminário de
Mariana.
Daniel Lima, Barbacena, MG
O bom maná
Conheci Ultimato há duas décadas. Foi paixão
à primeira leitura, por causa da seriedade, da
postura ética, da lisura etc. A revista propõe
uma leitura reflexiva sobre o reino e sobre o
que acontece ao nosso redor, respeitando as
diferenças e sendo um diferencial em relação
a tudo o que está no “mercado”. Ultimato nos
serve uma refeição diferente daquela que temos
visto no meio evangélico. Sua linha editorial está
centrada em Cristo e nas Escrituras. Enquanto
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10. 10 ULTIMATO I Julho-Agosto, 2010
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Ultimato apresentar o bom maná e contribuir
para o meu crescimento espiritual, reflexivo e
crítico, para diferenciar o joio do trigo, o ético
do imoral, continuarei assinante e divulgadora
de seu conteúdo e de sua postura ética
irrepreensível.
Anamélia Fernandes, Brasília, DF
Li a edição de maio/junho de capa a capa.
Foi como um bálsamo em dias de correrias,
ansiedades e provações. Foi edificante e
abençoador ler os artigos Eu era fariseu
(“Pastorais”) e Graça (“Reflexão”). Que Deus
continue a usar a Ultimato para levar a graça
restauradora do evangelho para os carentes.
Rev. Djaik Neves, Jataí, GO
Comecei a receber Ultimato por meio do
Paralelo 10. Não concordo com algumas
coisas, como a propaganda de outras religiões
que não estão inseridas no padrão bíblico-
protestante-evangélico. Não sou obrigado a
concordar, mas posso dizer que a revista tem
me ajudado a compreender e aplicar o conceito
de missão integral. Glorifico a Deus pela vida
de Alderi Souza de Matos, pois seus artigos têm
me abençoado.
Jean Oliveira, Nova Cruz, RN
Ao receber a edição de maio/junho agradeci
a Deus pela notícia de que há muito mais
online (p. 5) e também por encontrar os
dois selos — da FSC e da AGR-WEB — na
página do sumário (p. 7). A revista é coerente
e atual. Ultimato precisa de oração e fui
levada a orar por vocês.
Rosane Pessanha, Curitiba, PR
Sou missionário em Guiné Bissau, enviado
e sustentado por igrejas brasileiras por meio
da Missão Amide. Por cortesia do conselho
de missões da Igreja Presbiteriana Nacional
em Brasília, há vários anos tenho sido
abençoado com a chegada de Ultimato em
plena aldeia africana, onde moramos há sete
anos.
Timothy Bachmann, Guiné Bissau
Ultimato presta um enorme serviço à
comunidade cristã do país. Seus artigos
têm levado aos mais recônditos lugares
do Brasil (e quiçá do mundo) uma palavra
de esperança e paz. Um dos fatores
que corroboram para isso é a ausência
de proselitismo, que é nocivo à vivência
harmônica das crenças e religiões.
Olegário Venceslau, Chã Preta, AL
O evangelho intolerante tem de ser
banido de nosso meio. Esse não é o perfil
de Ultimato. No dia em que a revista
mudar seu perfil, perderá o valor. Só a
eternidade poderá revelar o bem que ela me
proporcionou e proporcionou a muitos.
Luiz Souza, Riachão do Jacuípe, BA
Minha tia me emprestou Ultimato. Fiquei
impressionado com o que li. Foi amor à
primeira vista.
Cícero Quirino, João Pessoa, PB
Glorifico a Deus pela Ultimato. Estou no
Japão, onde vim conhecer Jesus Cristo.
Hoje estou a serviço dele. Trabalho na
elaboração de um projeto de mobilização
de recursos para missões na Ásia. Peço
permissão para reproduzir textos de
Ultimato numa publicação que estamos
preparando.
Fabio Higa Nobuo, Japão
Pedofilia e perdão
O artigo Pedofilia e perdão (“Especial”,
maio/junho de 2010) não fugiu muito do que
diz a maioria dos meios de comunicação.
Cartas
11. Julho-Agosto, 2010 I ULTIMATO 11
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Ficou na generalização, ignorando as
estatísticas e deturpando a realidade. Faltou
objetividade, fidelidade à verdade e apuração
real e verdadeira dos fatos. Conforme a
afirmação do espanhol Jon Juaristi, escritor
judeu, “não é necessário ser católico para
perceber a campanha da mídia contra o papa
Bento XVI e a Igreja. [A mídia] só procura vender
e tirar os católicos da esfera pública”. Como
exemplo, cito o sociólogo italiano Massimo
Introvigne: “Num período de várias décadas,
apenas cem sacerdotes foram denunciados e
condenados na Itália, enquanto 6 mil professores
de educação física sofriam pelo mesmo delito.
Na Alemanha, 210 mil denúncias, e apenas
trezentas ligadas ao clero”. Por que os jornais se
ocuparam apenas das trezentas denúncias?
Luiz Magalhães, Campinas, SP
Segundo alguns psiquiatras que se
apresentaram recentemente na televisão, o
pedófilo será eternamente pedófilo. Maltratará,
estuprará e assassinará crianças. Sempre.
Perdoar essa covardia seria o mesmo que tentar
doutrinar uma cascavel prestes a dar o bote. A
Deus pertence a vida. Mas bicho peçonhento
não se doutrina nem se perdoa: mata-se. E tal
ato chama-se autodefesa, defesa da inocência,
defesa da vida!
Patrícia Neme, Palmas, TO
Homossexualismo
Gostaria que vocês abordassem a questão
homossexual. Assisti a um programa de televisão
que mostrava um casal de pastores homossexuais.
Seria esclarecedor, principalmente para os que
querem permanecer fiéis. A igreja tem sofrido
infiltrações dessa natureza. Não deixem de abordar
também a questão da lei da homofobia.
José Gadelha, Brejo Santo, CE
Uma moral que se apoia somente nos aspectos da
individualidade enfraquece a dinâmica do grupo
social, descaracterizando o viver em sociedade,
podendo apontar para a extinção do próprio ser
humano, pela ausência de valores de grupo, de
coletividade e, portanto, de sustentabilidade.
Marco Antonio de Oliveira, Rio de Janeiro, RJ
— Este é um trecho do artigo Casamento
homossexual, do pastor Marco Antonio, da Catedral
Metodista do Rio de Janeiro, terapeuta familiar.
Confira-o na íntegra em www.ultimato.com.br.
Aproveite e confira também O equívoco da revista
Veja, de Francisco Helder Sousa Cardoso.
12. 12 ULTIMATO I Julho-Agosto, 2010
“Devemos orar para que Deus freie nossos impulsos pecaminosos. Muito mais
importante do que orar pela saúde física é rogar para que Deus cure a
enfermidade espiritual.
Ewerton Barcelos Tokashiki, professor do Seminário Presbiteriano Brasil Central
Na sala do conselho Sem princípios, os crentes perdem a vitalidade; “o que salva é ter muitos conselheiros” (Pv 11.14).
”
FRASES
Fernando Eduardo Prison — Uma das
piores consequências do pecado é o fato
de que podemos vê-lo claramente nos
outros; contudo, achamos muito difícil
enxergar essas mesmas coisas em nós.
N. T. Wright — Quando a igreja vive
de acordo com o padrão do reino de
Deus, a Palavra de Deus se espalha
poderosamente e o Senhor realiza a sua
obra.
J. I. Packer — Estar convencido do
pecado não significa meramente
sentir-se um completo fracasso, mas
dar-se conta de que ofendeu a Deus,
a sua autoridade, de que o provocou,
o desafiou e colocou-se de forma
totalmente errada contra ele.
Santo Ambrósio — Pecar é comum a
todos os homens, mas arrepender-se é
próprio dos santos.
Antonio Borges Teixeira — A santidade
é o supremo escopo da atividade
moral e religiosa do cristão.
Raul Pilla — O poder pessoal é um
tremendo tóxico psicotrópico que
embriaga, vicia e pode chegar à
demência.
José Reis Pereira — O orgulhoso
é aquele que se julga o centro do
mundo. Tem susceptibilidade à flor
da pele. Por qualquer coisa sente sua
dignidade ferida. Mas não há nada
tão eficiente para derrotar dignidades
orgulhosas como a Palavra de Deus.
”
“Quando alguém se apaixona por Cristo, torna-se
absolutamente impossível desapaixonar-se.
José Francisco Barbalho, em carta à Folha de São Paulo
“Sem saúde emocional, não existe santidade. Talvez
não seja por acaso que a única diferença na grafia
das palavras sanidade e santidade seja a letra “t”, que
representa a cruz do Messias.
Esly R. Carvalho, psicóloga clínica
“Sem evangelizadores santos, não se convertem almas e não se fundam
igrejas; o porvir das igrejas e das missões depende da formação dos
apóstolos e dos pastores.
Paolo Manna, padre católico”
”
”
”
”
“Aopressão do “fazer a igreja crescer”
levou os pastores, líderes e crentes, de
uma maneira geral, a abrir mão dos conceitos
e princípios expostos nas Sagradas Escrituras,
e principalmente a abrir mão do evangelho
verdadeiro.
Leonardo Henrique, professor da Escola Bíblica
Terra dos Milagres, da Igreja Nova Vida
“Por mais que as ferramentas nos ajudem
a analisar sistemas e causas, jamais
teremos a compreensão de todas as variáveis
envolvidas quando se trata de ser humano.
Nessa hora, importa haver humildade para
reconhecer nossas limitações e submeter nossos
planos à validação de Deus, que tudo conhece.
Oséas Elias Heckert, engenheiro da esperança
Arquivopessoal
Domíniopúblico
14. 14 ULTIMATO I Julho-Agosto, 2010
H
á quase 350 anos, o
dramaturgo francês
Jean Racine (1639-
1699), que escreveu várias
tragédias baseadas em relatos
do Antigo Testamento, disse
que “não existem segredos que
o tempo não revele”. Se vives-
se hoje, ele teria que atualizar
sua observação: “Não existem
segredos que a parafernália de
apetrechos de microcâmeras,
microfones imperceptíveis e
aparelhos de captação de som
não revelem”.
De fato, esses aparelhos
sofisticadíssimos estão em
toda parte, vigiando nossas
andanças, nossos movimentos,
nossas vidas. Eles nos veem,
mas nós não os vemos, porque
eles podem estar disfarçados
de botões, canetas, parafusos
etc. Eles estão instalados nas
ruas, nos meios de transporte,
nos condomínios, nos eleva-
dores, nos estádios de futebol,
nos shoppings, nos escritórios,
num gabinete oficial de Bra-
sília e até em cemitérios (para
evitar o furto de restos mortais
e de objetos dos túmulos).
Nas plataformas do metrô
paulistano já há 930 câmeras
registrando tudo. Em cada
novo vagão da linha verde
foram instaladas quatro. Só na
cidade de São Paulo já há qua-
se 600 mil câmeras, uma para
cada dezesseis habitantes.
Na Inglaterra, onde a
população é a mais vigiada do
planeta, há uma câmera para
cada quatorze pessoas.
O promotor de justiça
do Distrito Federal, Fausto
Rodrigues de Lima, acredita
que vai chegar “o dia em
que cada centímetro da terra
será devassado por todos
os meios tecnológicos que,
interligados por satélites,
gravarão imagens 24 horas
por dia”.
Boa parte dessa espio-
nagem é criminosa, como
aconteceu numa casa na
grande Florianópolis. Um
jovem casal, com filhos de
6, 7 e 9 anos, descobriu, por
acaso, uma microcâmera
instalada no banheiro. Fo-
tografias indiscretas podem
ser colocadas na internet
para alimentar os pedófilos.
Carlos Heitor Cony lembra
que “hoje é cada vez mais
possível essa vigilância full
time em cima de todos nós”.
Agora é bem mais fácil
entender aquilo que as crian-
ças aprendem e cantam na
escola dominical das igrejas
evangélicas:
O que você faz
O que você diz
Deus tudo escuta e tudo vê.
A onisciência de Deus,
termo teológico que se refere
a um dos atributos divinos,
aquele que menciona a per-
feita e completa capacidade
de Deus de conhecer todas
as coisas em qualquer lugar e
em qualquer tempo, é uma
das mais proveitosas doutri-
nas cristãs. É ela que gera o
temor do Senhor, pelo qual
o ser humano evita o mal
(Pv 16.6). Sabendo de an-
temão que o pecado oculto
é impossível, a pessoa pensa
duas vezes antes de cometer
qualquer deslize. Os crentes
sabem que “os olhos do
Senhor estão em toda parte,
observando atentamente os
maus e os bons” (Pv 15.3).
A mais formidável
passagem da Bíblia sobre a
onisciência de Deus é o Sal-
mo 139. O autor não hesita
em declarar:
Senhor, tu examinaste
a fundo a minha alma e
conheces todas as coisas
a meu respeito. Tu sabes
o que acontece comigo
quando estou descansando
ou quando estou cami-
nhando. Tu conheces de
longe cada um dos meus
pensamentos. Tu examinas
+DO QUE NOTíCIAS
cuidadosamente todos os
meus passos e observas com
atenção o meu sono; sim, tu
conheces muito bem tudo o
que eu faço. Tu sabes tudo
o que eu vou dizer antes de
a palavra ser formada em
minha boca.
Salmo 139.1-4, BV
O mesmo salmo mostra
que esse conhecimento ple-
no de Deus começa quando
a criatura ainda está no
ventre materno: “Meus os-
sos não estavam escondidos
de ti quando em secreto fui
formado e entretecido como
nas profundezas da terra.
Os teus olhos viram o meu
embrião” (Sl 139.15-16).
O devassamento da alma,
da mente, dos sentimentos,
das intenções do ser huma-
no, em seu passado, em seu
presente e em seu futuro,
do certo e do errado — é
incontavelmente maior aos
olhos de Deus do que aos
olhos das microcâmeras!
Completamente
nu
AliHaider
15. Julho-Agosto, 2010 I ULTIMATO 15
Recall de
pecadores
Historiador diz que o século 20
é um “museu de horrores”
Embora a população do mundo
tenha subido três vezes em cem
anos (de 2 bilhões em 1900 para
mais de 6 bilhões em 2000) e a
expectativa de vida tenha passa-
do de 40 para 68 anos no mes-
mo período, o século 20 é muito
contraditório. Quem afirma isso
é o historiador inglês Tony Judt,
autor de Reflexões sobre um Sécu-
lo Esquecido — 1900–2000. O
escritor de 62 anos gravemente
enfermo lembra que duas formas
de despotismo ensanguentaram
a era: “Em nome de ambos,
apenas três psicopatas (Hitler,
Stalin e Mao) conseguiram levar
à morte no mínimo 120 milhões
de pessoas”.
Arcebispo católico diz que a
crise mundial é geral e radical
Para o arcebispo emérito de
Estrasburgo, onde se escreveu
A Marselhesa, o hino nacional
francês, não é exagero dizer que
a crise pela qual o mundo está
passando é maior que as anterio-
res. Dom Joseph Doré explica
que a atual crise é geral e radical.
É geral “porque atinge todos os
aspectos de nossa vida e todos os
setores da sociedade: a escola en-
contra-se em crise, a família está
em crise, o sistema de assistência
à saúde encontra-se em crise, a
política está em crise, a econo-
mia está em crise etc”. É radical
porque “nada mais funciona por
si só”, “nada é dado por certo
automaticamente” (Omnis Terra,
março de 2010, p. 122).
Pastor batista diz que a crise
da igreja é crise da Palavra
Humberto Xavier Rodrigues,
um dos pastores da Primeira
Igreja Batista em Londrina, no
Paraná, tem certeza de que “toda
esterilidade, pobreza e corrupção
que encontramos nas igrejas se
devem ao elemento humano,
mais precisamente às lideran-
ças”. Para ele, “os líderes são
inadequados porque são pessoas
que não foram quebradas pela
cruz”, que “se levantam e falam
de acordo com sua própria
mente”. A solução, completa o
pastor, “está no retorno à Palavra
de Deus” (Palavra da Cruz, maio
de 2010, p. 2).
Cientista diz que o cidadão do
século 21 sofre de estresse,
ansiedade e depressão
“De uma maneira ou de outra”,
declara Marcelo Leite, autor
de Ciência – Use com cuidado
(Editora Unicamp), “é raro o
cidadão do século 21 que não
experimenta na vida diária
uma das três condições que o
definem — estresse, ansiedade
e depressão”. Corrobora com
ele a informação de que, entre
2003 e 2007, 102 milhões de
antidepressivos foram vendi-
dos no Brasil. Em cinco anos
o aumento foi de 42% (de 17
milhões para 24,1 milhões). O
que Salomão escreveu há anos é
mais do que atual: “É melhor ter
pouco numa das mãos, com paz
de espírito, do que estar sempre
com as duas mãos cheias de tra-
balho, tentando pegar o vento”
(Ec 4.6, NTLH).
+DO QUE NOTíCIAS
O mundo vai mal
A
inda não arranjamos uma palavra em por-
tuguês para transmitir o completo sentido
do vocábulo inglês recall (chamar de volta).
Enquanto isso, o anglicismo continua: “Toyota ini-
cia hoje o recall dos modelos de Corolla no Brasil”;
“Estados Unidos fazem recall de remédios de uso
infantil”; “recall de políticos”.
A montadora de carros está recolhendo mais
de 100 mil Corollas para reparar um defeito que
pode provocar graves acidentes. A Johnson &
Johnson está recolhendo medicamentos infantis,
como Tylenol, Benadryl, Motrin e Zyrtec, em
doze países, por não atenderem aos padrões de
qualidade exigidos pelo governo americano e por
poderem conter impurezas e princípios ativos em
concentração mais alta que a especificada pelo
laboratório.
O jornalista Ruy Castro foi muito feliz ao usar a
palavra em sentido figurado: “Esse conceito poderia
se alargar e também se aplicar aos políticos”. Daí o
título de seu artigo Recall de políticos, publicado na
Folha de São Paulo (3 de maio de 2010).
Por que não usar a mesma metáfora no sentido
religioso? Se o ser humano danificou seriamente a
imagem e semelhança de Deus à qual foi criado,
por que não fazer um recall de toda a humanidade
para consertar o que está errado? Se a sociedade está
de cabeça para baixo, por que não chamar de volta
todos os pecadores para serem colocados outra vez
de cabeça para cima?
Sem exagero, a evangelização do mundo
é um perfeito recall: Deus chama de volta a
criatura machucada, confusa, perdida, alienada,
decepcionada e enferma para ser consertada,
curada, e para começar tudo de novo. É Jesus quem
possibilita e providencia esse recall — o mais amplo
e o mais nobre de todos: “O Filho do Homem veio
buscar e salvar o que estava perdido” (Lc 19.10).
16. 16 ULTIMATO I Julho-Agosto, 2010
+DO QUE NOTíCIAS
A
conteceu no dia 18 de
junho no templo da Igreja
Metodista Central de Belo
Horizonte. Dois pastores (Valdir
Steuernagel e Welinton Pereira)
estavam prestando algumas infor-
mações sobre a pré-organização da
Aliança Cristã Evangélica do Brasil
(veja pág. 18) a um pequeno grupo
de líderes da capital mineira.
Steuernagel leu a famosa oração
de Jesus sobre a unidade cristã:
“Rogo também por aqueles que
crerão em mim, por meio da men-
sagem deles, para que todos sejam
um, Pai, como tu estás em mim e
eu em ti. Que eles também estejam
em nós, para que o mundo creia
que tu me enviaste” (Jo 17.20-21).
Em seguida, lembrou que Deus
não desiste daquilo que ele quer e
pretende fazer. Uma dessas coisas é
aproximar os verdadeiros cren-
tes entre si. Para tanto, é preciso
mudar a cultura predominante
de cada um por si. Ele foi muito
convincente ao lembrar que a igreja
brasileira já experimentou uma
mudança de mentalidade no que
diz respeito a missões. Até pouco
tempo atrás, quando se falava em
missionários, só se pensava na
figura do missionário estrangeiro
que vinha para o Brasil. A geração
atual entende de outra maneira: o
missionário é o brasileiro que sai
do país para fazer missões em outro
lugar. A igreja deixou de ser recebe-
dora para ser enviadora de missio-
nários. É uma porta aberta ou um
incentivo para outras mudanças.
No final, Welinton Pereira convi-
dou um dos pastores presentes para
orar. Ele agradeceu pelo esforço em
favor da unidade da igreja evangélica
em torno de Cristo e confessou mais
ou menos assim:
O apego demasiado de cada deno-
minação à sua história, teologia,
tradições, liturgia, princípios, alvos,
tem dificultado a aproximação maior
de seus membros. Porém, os maiores
obstáculos são menos importantes e
mais carnais. Estamos separados por
causa do pecado. A inveja, o ciúme,
a vaidade, a concorrência, a compe-
tição, a briga pelo poder denomina-
cional nos separam. A falta de amor,
a ausência de perdão, as picuinhas, o
não esquecimento de problemas an-
teriores nos separam. O crescimento
numérico nos separa. Ficamos no mí-
nimo intranquilos quando outra igreja
da mesma denominação é diferente da
nossa e “ameaça” crescer mais e mais
rápido. Perdoa-nos! Faze-nos chorar!
Vence-nos! Amém.
O que impede a unidade da
Igreja é o pecado, e não a
ortodoxia
LissânderDias
Nancy Dusilek ora ao final da
reunião de escuta sobre a Aliança,
realizada na Catedral Presbiteriana
do Rio, em 3 de junho. Entre outras
coisas, pede: “Ó Deus, controla o
nosso temperamento!”
18. 18 ULTIMATO I Julho-Agosto, 2010
NOTíCIAS
Futebol ajuda
a amenizar
lembrança da
guerra em crianças
angolanas
O futebol é mais do que um esporte para
as crianças de Angola. Ele pode se tornar
um fio de cura para as feridas do passado.
Esta é a esperança do casal Nilson e Débora
Piedade e da professora Cecília Gouvea.
Eles lideram o Projeto Angola e lutam para
incluir socialmente centenas de crianças que
vivem em Lubango.
Uma vez por ano, uma equipe sai
do Brasil em direção à cidade angolana.
Cada visita dura um mês. Lá, eles são
hospedados por igrejas locais. As crianças
visitadas recebem atendimento psicológico
e aprendem técnicas de futebol, além
de informática, princípios bíblicos e
de cidadania. Um dos sonhos é fazer
intercâmbios com clubes de futebol do
Brasil. Com a ajuda de voluntários da
Mocidade para Cristo, a equipe tenta
mostrar para as crianças que o amor de
Deus é maior do que as lembranças da
guerra.
O Projeto Angola começou em 2001
com a iniciativa do cantor e compositor
Jorge Camargo. Apesar de contar com
poucos recursos financeiros, a equipe
brasileira conseguiu fazer cinco visitas ao
país e ajudou mais de 1.600 crianças.
Angola é marcada por uma guerra
que durou cerca de 30 anos. Segundo o
Relatório de Segurança Humana (2005),
de 1975 a 2002, 1,5 milhão de pessoas
morreram por causa da guerra.
Definida data
de fundação de
nova aliança
evangélica
30 de novembro. Esta é a data marcada
para o início de uma nova aliança
evangélica brasileira. A aliança quer
reunir igrejas e ministérios evangélicos
para que expressem suas vozes e façam
frente às necessidades da sociedade
brasileira. A proposta inicial é que a
aliança tenha uma estrutura de rede, que
é menos hierárquica e mais agregadora.
Desde 2009, um grupo de trabalho
tem realizado reuniões de “escuta” com
líderes evangélicos. Até agora já foram
cinco reuniões. Uma delas aconteceu
no dia 5 de junho, no Rio de Janeiro, e
atraiu cerca de 150 pessoas. Na ocasião,
o grupo de trabalho ouviu sugestões
e críticas sobre como e quando deve
funcionar a aliança. Um dos presentes
foi o pastor Davi Malta Nascimento,
91 anos, reitor emérito do Seminário
Teológico Batista do Sul do Brasil, no
Rio de Janeiro. “Não se deve esperar
muito para iniciar a aliança, porque sua
importância é urgente”, disse ele. Outros
líderes presentes levantaram a necessidade
de a aliança levar a sério o desafio da
unidade e agir com maturidade quando
as possíveis divergências surgirem.
Valdir Steuernagel, um dos líderes da
estruturação da nova aliança, pontua o
desafio da unidade, com base nas palavras
de Jesus registradas por João: “A oração
de Jesus (Jo 17) é um belo modelo de
vida em comunidade, de vida em amor e
de como Deus envia seu povo”.
NilsonPiedade
LizValente
Por Lissânder Dias
20. 20 ULTIMATO I Julho-Agosto, 2010
NOTíCIAS
Paralelo 10
completa 2 anos
Fortalecer as lideranças das regiões
Norte e Nordeste para a prática
da missão integral e, por meio de
um intercâmbio entre as regiões
brasileiras, tornar as igrejas nortistas
e nordestinas mais conhecidas e
reconhecidas. Este é o objetivo do
Paralelo 10, um projeto da Editora
Ultimato em parceria com o Centro
Evangélico de Missões (CEM) e
apoio da Tearfund, que completou 2
anos de existência.
A celebração ocorreu no dia
19 de abril, na sede da Editora
Ultimato, em
Viçosa, MG.
Leonízia Gama,
indígena
Tukano, aluna
de mestrado do
CEM e bolsista
do Paralelo 10,
compartilhou
sua história
com os
presentes.
O envio
gratuito
das revistas
Ultimato,
Mãos Dadas
e Passo a Passo a 2 mil líderes e a
concessão de bolsas de estudos e
livros são algumas das atividades
do projeto. “O Paralelo 10 trouxe
um renovo em minha vida pra
que eu continue trabalhando na
minha comunidade e igreja em
busca de fortalecer outras vidas
no compromisso social com a
sociedade”, diz Suelly Marilene da
Silva, de Recife, PE.
O nome Paralelo 10 é uma
referência ao paralelo que corta
alguns estados do Norte e Nordeste.
Para mais informações, acesse
www.ultimato.com.br/blogs/
paralelo10.
Comunidade
evangélica
transforma
garrafas pet em
vassouras
Na Comunidade Evangélica Vida
Plena, em Natal, RN, missão cristã
combina com meio ambiente. Em
2009, a igreja fundou uma pequena
fábrica no bairro de Filipe Camarão,
que transforma garrafas pet em
vassouras. São produzidas mil vassouras
por mês.
O pastor da comunidade, José
Silvestre Moura, não tem dúvida sobre
a importância do trabalho. “Eu tenho
convicção de que posso ser pentecostal,
falar em línguas, profetizar e que eu
posso ser ambientalista. Isso é missão
integral. A gente divide: isso aqui prá
cá, isso aqui prá lá. Isso aqui pode, isso
aqui não pode. Fica difícil. Confunde
as coisas. Faz tudo pela metade.”
A ideia de criação da fábrica surgiu
a partir de oficinas com a ONG cristã
A Rocha Brasil no início de 2009. A
fábrica é autossustentável e se tornou o
braço socioambiental da igreja.
Todos os componentes da garrafa
pet são reutilizados. O bico e o fundo
vão para uma usina de reciclagem de
plástico em Recife, PE. As tampas
são aproveitadas para artesanato e os
rótulos, para depilação. Cada vassoura
tem a durabilidade de 8 a 9 meses, três
vezes mais que a vassoura piaçaba.
Leonízia Gama compartilha
seu testemunho de vida
PaulaMendes
22. 22 ULTIMATO I Julho-Agosto, 2010
NÚMEROS NOTíCIAS
Presbiterianos do Rio querem
mulheres e crianças no
diaconato
O Presbitério do Rio de Janeiro — o mais antigo do país — quer duas
mudanças na prática do serviço diaconal da Igreja Presbiteriana do
Brasil: que a denominação aceite diaconisas e diáconos-mirins.
Segundo o documento que embasa a primeira proposta, há
argumentos teológicos, históricos e constitucionais para que a igreja
aceite mulheres no diaconato. O texto afirma que “desde os tempos
apostólicos a Igreja teve diaconisas”. A proposta sugere que mulheres
acima de 18 anos tenham plenos direitos de serem votadas, assim como
os homens o têm. A outra proposta é que crianças de 7 a 12 anos sejam
escolhidas para o serviço diaconal, sem que haja eleição ou ordenação,
com prazo de mandato fixado pelo conselho da igreja. O objetivo seria
“treiná-las e descobrir vocações”.
As duas propostas serão apresentadas para votação na 37ª Reunião
Ordinária do Supremo Concílio, que acontecerá de 12 a 17 de julho,
em Curitiba, PR.
Lançado Novo
Testamento chinês-
português
Foi lançado no dia 23 de maio em São Paulo
o Novo Testamento chinês-português. Trata-se
de uma obra inédita que inclui também Salmos
e Provérbios. Editada pelas Sociedades Bíblicas do
Brasil e de Hong Kong, a publicação utiliza as duas
traduções mais apreciadas pelas populações da China e do
Brasil: a Revised Chinese Union Version — em mandarim
com escrita simplificada — e a Almeida Revista e Atualizada,
respectivamente. Cada uma das traduções, apresentadas lado a lado, foi
feita a partir dos textos originais.
Para o secretário de Tradução e Publicações da Sociedade Bíblica do
Brasil, Paulo Teixeira, esta edição da Bíblia, desenvolvida a pedido das
igrejas cristãs chinesas do Brasil, representa, sobretudo, um importante
avanço na consolidação da fé de uma comunidade em constante
crescimento.
O Novo Testamento chinês-português visa alcançar os chineses que
moram no Brasil e os brasileiros que moram na China ou que estudam
mandarim. Segundo informações da missionária Shalom Fan, em
fevereiro deste ano havia 38 igrejas chinesas no Brasil.
40
casais oficializaram a união em
cerimônia coletiva realizada no
templo da Assembleia de Deus de
Belém, no Pará. Cada um recebeu
de presente uma Bíblia com capa
branca.
800.000
robôs industriais estão trabalhando
ao redor do mundo, quase a metade
no Japão.
7.022
pessoas por quilômetro quadrado
é a densidade demográfica de
Cingapura.
2.300.000.000
de habitantes do planeta se
apresentam como cristãos (1/3 da
população mundial).
2.479
idiomas têm alguma tradução das
Escrituras Sagradas.
160
vezes os cristãos são chamados de
“irmãos” no Novo Testamento.
31.300.000
reais foi quanto custou o
supercomputador Cray, que vai
possibilitar ao Instituto Nacional de
Pesquisas Espaciais fazer previsões
meteorológicas em áreas mais
precisas (de 5 km por 5 km).
24. 24 ULTIMATO I Julho-Agosto, 2010
MennoGroenmen
A
propaganda da pornografia,
do amor livre, do sexo
precoce, do adultério, do
homossexualismo e do
divórcio é tão bem feita,
tão ampla, tão esmagadora
e tão bem-sucedida, que as muitas vozes
ainda em harmonia com a sexualidade
cristã são tentadas a se calarem. No que diz
respeito à homossexualidade, por exemplo,
os defensores da condição oposta são quase
constrangidos a pedir licença para falar
sobre a homossexualidade ou a se desculpar
por tocarem no assunto. Faz parte da
propaganda do sexo ilícito a mensagem de
que seus praticantes são a maioria e nós, a
minoria. Faz parte da propaganda anticristã
a mensagem de que a disciplina sexual é
impossível, além de intervir na liberdade
Abraçando e
reabraçando
a santidade
do corpo e
da mente
24 ULTIMATO I Julho-Agosto, 2010
Capa
25. Julho-Agosto, 2010 I ULTIMATO 25
H
avia intervalos entre um ato
criador e outro. Antes de
continuar, de se ocupar do
ato seguinte, Deus dava uma olhada
no ato anterior para ver se tudo
estava saindo a contento. E ele ficava
satisfeito com tudo o que fazia. Ao
final, quando estava tudo pronto,
bonito e funcionando, “Deus viu
que tudo o que havia feito era muito
bom” (Gn 1.31, NTLH). Então, ele
descansou.
Acontece que, quando viu o
homem andando para lá e para cá
no Jardim do Éden, Deus constatou:
“Não é bom que o homem viva
sozinho. Vou fazer para ele alguém
que o ajude como se fosse a sua outra
metade” (Gn 2.18, NTLH). Então,
Deus saiu à procura desse alguém.
Caminhou pelo campo, subiu as
montanhas, entrou na floresta,
aproximou-se da praia, olhou para
o céu, olhou para o chão, e nada.
Nenhum dos animais que ele havia
criado antes do homem, nem os
domésticos nem os selvagens, muito
menos os que se arrastavam pelo chão,
poderia ser elevado à honrosa posição
de completar o homem.
Então Deus teve uma ideia genial:
“Fez com que o homem caísse num
sono profundo e, enquanto ele dormia,
tirou uma das suas costelas e fechou
a carne naquele lugar” (Gn 2.21). E
começou a trabalhar com essa única
peça para fazer dela o que pretendia.
Deus não queria fazer outro homem
para viver na companhia do primeiro.
individual. Faz parte da propaganda
da licenciosidade desacreditar o
casamento (veja Cartunista coloca
veneno na imaginação dos teenagers
e se manda, Ultimato, maio/junho,
p. 14). Por isso, são poucos os que
hoje se casam pensando numa união
que deve ser preservada e mantida
para sempre. Os celebrantes estão
sendo pressionados a retirar os
compromissos de fidelidade mútua
e de durabilidade só interrompidos
pela morte.
É nesse mar tempestuoso que
os cristãos são chamados a navegar
(sem naufrágios fatais). A palavra do
bispo N. T. Wright é mais do que
oportuna: “Uma coisa é ser atraído
pelo pecado; outra bem diferente é
inverter os conceitos de moralidade
e transformar o mal em bem e o
bem em mal”.
Para trazer à lembrança a
sexualidade não profanada pelo
pecado e para oferecer resistência
à propaganda em contrário, leia os
textos das páginas que se seguem e
os da seção “Especial”.
A entrevista com Guilherme
Nacif de Faria, doutor em direito
privado e professor na Universidade
Federal de Viçosa, mostra que
os líderes religiosos têm plena
liberdade de falar e escrever sobre
suas convicções religiosas na área
da sexualidade, “da mesma forma
que a filosofia, a ética, a psicanálise
e outras áreas do conhecimento
humano podem se manifestar
livremente sobre a questão”. Porém,
ele alerta que essa manifestação
seja argumentativa, e não
discriminatória.
Todo esse esforço não se destina
apenas aos “outros”, mas
especialmente a nós, aos nossos
filhos e às nossas igrejas. Precisamos
abraçar e reabraçar a santidade
do corpo e da mente e evitar
mau testemunho, escândalos,
incoerências, hipocrisia, frouxidão
moral, comportamento de risco,
separações e casamentos infelizes!
Uma paráfrase da Bíblia
sobre a criação da mulher
Ele achou melhor fazer alguém
parecido com o homem, mas não igual
a ele. Talvez alguém mais gracioso,
com algumas curvas a mais, com
dois seios, sem bigode e sem barba,
com movimentos menos bruscos e
mais delicados, de tal maneira que
esse alguém tivesse interesse e desejo
pelo homem e que despertasse nele os
mesmos sentimentos. Seria formidável,
pois manteria os dois juntos, um na
dependência do outro.
E Deus foi além. Já que o homem
tinha próstata, Deus pôs nesse
alguém que ele estava formando um
ovário. Já que o primeiro produzia
espermatozoides, por que o segundo
não poderia produzir óvulos? Para
tornar possível o encontro do
espermatozoide com o óvulo, Deus
fez uma genitália para o homem e
outra para aquela pessoa em formação.
Assim, além do prazer proporcionado
pela união sexual, eles poderiam se
reproduzir por conta própria e ficar
menos sozinhos. Poderiam até encher
a terra, se fosse o caso. Espaço, beleza,
água e comida era o que não faltava.
Quando a outra metade do homem
estava pronta e bela, Deus a levou ao
homem. Ele achou por bem chamá-la
mulher (por ter saído dele) e exclamou:
“Esta é a carne da minha carne e osso
dos meus ossos” (Gn 2.23). (Homem
em hebraico é ish, mulher é ishah
— duas letras a mais.) Então houve
uma grande festa, pois o momento
celebrava o primeiro casamento da
história.
FredFokkelman
26. 26 ULTIMATO I Julho-Agosto, 2010
Capa
E
ntender por que uma
pessoa se comporta como
se comporta sempre foi um
dos mistérios da humanidade. Para
responder a esse mistério, vários
campos do saber, como a filosofia, a
psicologia, a biologia, a antropologia,
a sociologia e a teologia, têm criado
teorias que abarcam desde aspectos
exclusivamente biológicos até aspectos
de cunho unicamente transcendental.
A verdade é que, até o presente
momento, temos muitas teorias e
poucas certezas sobre o que realmente
define a conduta humana.
As vertentes mais comuns que
encontramos hoje na ciência e na
cultura quando se trata de explicar o
comportamento humano podem ser
agrupadas em cinco grandes blocos:
teorias biologicistas ou organicistas,
teorias da aprendizagem, teorias do
inconsciente, teorias de base espiritual
e teoria dos sistemas.
As teorias biologicistas ou organicistas
postulam que o comportamento é
resultado de transmissões neuronais,
e estas, determinadas no código
genético — falando de modo bem
geral. O grande impasse nessa
perspectiva é a impossibilidade de
saber se é a biologia que determina a
conduta ou se é a conduta que altera a
biologia. A velha questão do ovo ou a
galinha. Pode-se até averiguar a perda
de transmissão neuronal em alguns
comportamentos (como a depressão),
mas não se pode definir exatamente
se ela é causa ou consequência da
disposição mental. Muitos cientistas
hoje afirmam categoricamente que
a biologia determina a conduta,
mesmo porque isso impulsiona a
indústria farmacêutica. Entretanto,
os estudos feitos até hoje sobre o
genoma humano não sustentam
esse determinismo. Da mesma
forma que a ansiedade pode causar
um “curto-circuito” em nosso
sistema neurovegetativo e jogar suco
gástrico em um estômago vazio,
causando gastrite e até úlcera, não
se pode afirmar que não ocorram
tais “curtos-circuitos” na produção
de neurotransmissores sob certas
condições extracorpóreas. As pessoas
querem soluções rápidas para aliviar
todo tipo de sofrimento (inclusive o
mental); as indústrias farmacêuticas
investem fortunas no desenvolvimento
de pesquisas que apontem soluções
químicas para a conduta e a mídia
se encarrega de tornar dogmáticas
as teorias biologicistas. Gregory
Bateson¹ é categórico em contrapor-
se a essa teoria afirmando que “não
há nenhum comportamento [...] e
nenhuma aprendizagem nos próprios
cromossomas”. Infelizmente a paz não
vem em cápsulas!
As teorias da aprendizagem, por
sua vez, apontam para outra direção.
Grosso modo, trazem em seu bojo
a ideia de que nascemos como
uma tábula rasa, na qual vão sendo
desenhados os traços de nossa conduta
— seja por condicionamento, por
imitação ou por aprendizagem social.
Para os postulantes dessa teoria,
somos fruto do meio em que vivemos.
Entretanto, os estudos recentes sobre
resiliência (a capacidade de uma
pessoa suportar adversidades e sair-se
bem) colocam em xeque as teorias
que exaltam a função do meio como
modelador da conduta.
As clássicas teorias do inconsciente,
que dominaram o campo da
psicologia no final do século 19 e
durante boa parte do século 20,
especialmente a partir dos estudos
de Freud, nos informavam que “as
pessoas tinham impulsos inconscientes
que as levavam a fazer o que
faziam. Como estes impulsos eram
inconscientes, a mente consciente
podia apenas ficar perplexa a respeito
do que a pessoa fazia e pensava”.²
Assim, muito da conduta humana é
explicado por meio do inconsciente.
A encantadora erudição de Freud
e alguns de seus seguidores e a
popularização da sua teoria levam, até
os dias de hoje, as pessoas a aceitarem
este “determinismo psíquico”. Para
Freud, muito do comportamento
humano era estabelecido a partir das
experiências infantis nos primeiros
anos de vida, em especial na relação
da criança com a mãe, e, a partir de
então, registrado no inconsciente, que
atua como maestro da conduta para o
restante da vida.
Quanto às teorias de base espiritual,
em praticamente todas as culturas
acredita-se que há elementos
extranaturais que interferem na
Como resguardar a crian
do sexo precoce, da pornografia e da homossexualidade
Carlos “Catito” Grzybowski
27. Julho-Agosto, 2010 I ULTIMATO 27
conduta humana. Deuses, anjos
e demônios são narrados desde as
mitologias mais remotas como tendo
o poder de interferir em nossa forma
de agir. A Bíblia e toda a teologia
hebraico-cristã nos informam que há
uma dimensão espiritual invisível,
cujos seres pertencem a outra ordem
de realidade e por isso têm o poder
de se apossar de nosso corpo e
mente (embora haja cristãos que
não acreditam na existência dessa
dimensão, tentando pulverizar as
narrativas bíblicas sobre o tema
em interpretações que remetem às
outras teorias mencionadas). Por
mais que alguns afirmem que tal
ideia é retrógrada e anticientífica, no
que tange às explicações da conduta
humana, nenhuma teoria até aqui
postulada pode ser afirmada como
mais verossímil — são apenas teorias.
A teoria dos sistemas entende
que a conduta é resultado de vários
sistemas que interagem em um
determinado tempo e espaço e que,
simultaneamente, essa conduta, ao se
manifestar, gera mudanças nos vários
sistemas, tornando a realidade cada
vez mais complexa em um processo
contínuo circular.
Voltemos ao questionamento
inicial sobre como resguardar a
criança dos desvios sexuais. Segundo
algumas teorias, qualquer prevenção
é impossível. Para outras, isso é
perfeitamente viável em qualquer tipo
de conduta — inclusive a sexual.
A partir da experiência clínica, o
que constatamos é que uma criança
que cresce em uma família na qual
os pais se amam e expressam isso
abertamente aos filhos, o diálogo
é aberto — não somente sobre
trivialidades, mas sobre valores
— e os valores de integridade,
lealdade, companheirismo e
amizade prevalecem entre os
membros da família, tem menos
riscos de desenvolver uma conduta
disfuncional, seja de ordem sexual ou
de outras ordens. Nos estudos sobre
resiliência, o que se tem constatado é
que, mesmo uma criança crescendo
sob as mais adversas circunstâncias
(em meio à promiscuidade dos pais
ou à criminalidade, por exemplo),
quando ela encontra alguém (um
professor, um amigo, um religioso)
que lhe dê referências de valores —
em especial valores espirituais —, ela
ganha certa “imunidade” a desvios de
conduta.
Assim, a ciência hoje passa a
estudar a saúde (e não somente
a doença) e descobre que a
espiritualidade é um elemento
fundamental na prevenção de
condutas disfuncionais, seja de que
instâncias forem.
Notas
1. Gregory Bateson, Metadiálogos. Lisboa: Gradiva
Publicações, 1986. p. 71.
2. Jay Haley, Aprendendo e ensinando terapia.
Porto Alegre: ARTMED, 1998. p. 85.
Carlos “Catito” Grzybowski, 50 anos, casado, é psicólogo
(CRP 08/1117) e terapeuta familiar. Mora em Curitiba, PR.
BillDavenport
nça
28. 28 ULTIMATO I Julho-Agosto, 2010
S
ituada no istmo de mesmo
nome, no sul da Grécia,
Corinto era, no início do
primeiro século, a cidade mais
antiga, mais importante, mais rica,
mais comercialmente próspera, mais
populosa (250 mil habitantes) e
mais obcecada por sexo da Europa
Oriental. Ali se realizavam os Jogos
Ístmicos, quase tão importantes
quanto os Jogos Olímpicos, que
eram mais antigos e surgiram em
Olímpia, mais a oeste. Por ser uma
cidade portuária (um porto no mar
Egeu e outro no mar Mediterrâneo)
e o elo entre Roma e o Oriente,
Corinto abrigava uma grande mistura
de raças, línguas e culturas (gregos,
latinos, sírios, asiáticos, egípcios e
judeus), de classes sociais (escravos
e libertos, burgueses e pobres) e de
Capa
A porno-Corinto
profissões (investidores, mercadores,
ambulantes, marinheiros, filósofos,
ex-soldados, atletas e “promotores de
todas as formas de vícios”).
Considerada a capital da
licenciosidade, Corinto era notável
por sua independência moral. À
semelhança dos hebreus na época
dos juízes, cada um fazia o que bem
desejava (Jz 21.25). Não havia a
quem prestar contas nem leis para
obedecer, senão a lei dos desejos. Os
impulsos sexuais eram um fenômeno
biológico como a fome e, portanto,
deveriam ser satisfeitos.
Em Corinto havia muitos templos.
No templo dedicado a Afrodite,
a deusa do amor (a mesma Vênus
dos romanos), havia mil prostitutos
e prostitutas, que ofereciam seus
serviços ao pôr-do-sol. No templo
dedicado a Apolo, o deus que
representava o ideal de beleza
masculina, havia “estátuas de Apolo
nu, em diversas posturas, que exibiam
sua virilidade, inflamavam seus
adoradores masculinos a prestarem
devoção por meio de demonstrações
físicas com os belos rapazes a
serviço da divindade” (David Prior,
A Mensagem de 1 Coríntios). O
problema das tais “imoralidades
sexuais” (1Co 7.2) entre os coríntios
era tal que um dos verbos gregos que
significava “fornicar” era “corintizar”,
ou seja, viver uma vida coríntia.
Esse descaso com a moral sexual
vinha de longe. Demóstenes, o
famoso orador grego (384-322 a.C.),
escreveu: “Temos amantes para
nos regozijarmos com elas, depois
escravas compradas para cuidar de
29. Julho-Agosto, 2010 I ULTIMATO 29
A
Grécia foi o primeiro país europeu
a ser evangelizado. Apesar de ser
nominalmente cristão (apenas 2%
da população participa de alguma cerimônia
aos domingos), é o país mais cristão da
Europa. A porcentagem de cristãos gregos
é enorme (95,15%), maior que a dos países
historicamente católicos, como Portugal
(94,39%), Polônia (90,29%), Áustria
(89,77%), Itália (77,35%), Espanha
(67,77%) e França (67,72%), e dos países
historicamente protestantes, como Noruega
(93,71%), Suíça (86,56%), Finlândia
(87,09%), Dinamarca (85,85%), Alemanha
(69,43%) e Reino Unido (67,63%).
Percentualmente falando, a Grécia
é mais cristã que todos os países da
América do Norte e da América do
Sul, exceto Paraguai (97,95%) e
Colômbia (95,45%). Quase
todos os cristãos
da Grécia
nossos corpos e, finalmente, esposas,
que devem conceder-nos filhos
legítimos e estão encarregadas de
supervisionar todos os nossos misteres
domiciliares”. Trezentos anos antes,
na mesma época dos profetas Daniel
e Habacuque (600 a.C.), Safo, a não
menos famosa poetisa grega, teria
levado várias jovens sob sua influência
à prática do lesbianismo. Por essa
razão, e por viver em Metilene, capital
da ilha grega de Lesbos, próxima
ao litoral da Turquia, chama-se
lésbica (lésbia ou lesbiana) a mulher
homossexual. “Tanto no mundo
grego como no mundo romano,
a parceria homossexual entre um
homem mais velho e um jovem era
considerada parte da educação do
rapaz”, lembra Amy Orr-Ewing no
livro Por Que Confiar na Bíblia?.
Foi em sua segunda grande viagem
missionária que Paulo começou
a evangelizar a cidade de Corinto
(51 d.C.). Muitos convertidos
renunciaram sua vida pregressa e
tornaram-se novas criaturas em
Cristo (2Co 5.17). Entre eles havia
imorais, adúlteros e homossexuais
passivos e ativos, como vemos na
Primeira Epístola de Paulo aos
Coríntios (6.9-11), escrita no ano
55. Para se referir aos homossexuais
ativos, o apóstolo usa a palavra
grega arsenokoitai, aquele que toma
a iniciativa, traduzida também
por sodomita (por causa do que
aconteceu em Sodoma, Gn 19).
Para se referir aos homossexuais
passivos, usa a palavra grega malakoi,
aquele que se permite usar, traduzida
também por efeminado. Para Calvino
(1509-1564), os malakoi são “aqueles
que, enquanto não podem tornar-se
prostitutos publicamente, revelam
quão impudicos são no emprego da
linguagem ignóbil, no maneirismo e
vestuário femininos, bem como em
outros meios de atrair a atenção”.
Esse trecho da Carta de Paulo aos
Coríntios é a melhor passagem das
Escrituras para mostrar a possibilidade
de mudança de comportamento
mediante uma experiência autêntica
de conversão, não importando o estilo
de vida anterior.
Corinto foi três vezes destruída: em
146 antes de Cristo pelos exércitos
romanos, em 501 por um terremoto,
e em 1858 por outro terremoto,
bem mais devastador que o primeiro.
Hoje, Corinto não passa de uma
aldeia.
Grécia — o país mais cristão da Europa
pertencem à Igreja Ortodoxa — fruto
da cisão ocorrida em 1054.
Há muito mais pais gregos do que
pais latinos nos primeiros 450 anos
da história da igreja (chamam-se pais
da igreja os pensadores e escritores
cristãos dos primeiros séculos que
contribuíram para a formulação
teológica dos pontos centrais da fé
cristã). Entre os primeiros cristãos
gregos havia ex-imorais, ex-idólatras,
ex-adúlteros, ex-homossexuais ativos
e passivos, ex-ladrões, ex-avarentos,
ex-alcoólatras, ex-caluniadores e
ex-trapaceiros. Eles “foram lavados
do pecado, separados para pertencer
a Deus e aceitos por ele por meio do
Senhor Jesus Cristo e pelo Espírito do
nosso Deus” (1Co 6.9-11, NTLH).
Fonte: Intercessão Mundial, Edição
Século 21.
30. 30 ULTIMATO I Julho-Agosto, 2010
A
conteceu em Gibeá, no território
da tribo de Benjamim, perto de
Jerusalém, no final do período
dos juízes, há mais ou menos 3.100
anos (no ano 1.050 a.C.), pouco antes
da instalação da monarquia de Israel,
numa época em que prevalecia a moral
particular e “cada um fazia o que achava
mais reto” (Jz 21.25). Foi uma reprise do
que havia acontecido em Sodoma cerca
de mil anos antes (Gn 19.1-11).
A história é muito triste, porque
envolve estupro, assassinato e guerra
civil. O que aconteceu numa única
noite acabou por dizimar uma tribo
inteira (homens, mulheres e crianças) e
provocou a morte de 65 mil soldados.
Certo casal, que morava na região
montanhosa da tribo de Efraim, se
desentendeu e ela resolveu voltar para
a casa paterna, em Belém de Judá.
Quatro meses depois, o marido foi
procurá-la na casa dos sogros para salvar
o casamento. Deu tudo certo e ambos
voltaram para reiniciar a vida conjugal
em Efraim — ela num jumento e ele em
outro. O empregado seguia a pé. Como
começou a escurecer no trevo que levava
a Gibeá, o casal resolveu passar a noite
ao ar livre, na praça. Porém, passava
por ali um homem idoso que vinha da
roça para casa. Ele sabia que não era
seguro o casal permanecer na praça e,
gentilmente, os levou para casa. As duas
famílias — a dos hospedeiros e a dos
novamente casados — deram-se muito
Capa
Como pode terminar uma noite de
orgia sexualbem. Comeram, beberam e se alegraram
até tarde da noite.
Quando estavam para pegar no
sono, os homens de Gibeá cercaram
a casa do velho, bateram à porta e
exigiram que ele lhes entregasse não a
mulher em trânsito, mas o marido dela
para que eles abusassem sexualmente
do pobre homem. O hospedeiro
conseguiu proteger o hóspede, mas não
a mulher dele. Os bissexuais levaram-
na e abusaram dela até de manhã. Ao
nascer do sol, lá estava a mulher morta
estendida à porta da casa.
Indignado, o ex-separado e agora
viúvo ajeitou o corpo da mulher num
dos jumentos e seguiu viagem. Em casa,
nas montanhas de Efraim, pegou um
facão, cortou o corpo em doze pedaços
e mandou um para cada tribo de Israel,
inclusive para as que ficavam mais
distantes, como as tribos do norte e do
outro lado do rio Jordão. Isso provocou
uma convulsão nacional: de Dã a
Berseba, do Gerizim ao Nebo, tribos
exclamavam: “Nunca se viu nem se fez
uma coisa dessas desde o dia em que os
israelitas saíram do Egito!” (Jz 19.30).
O que o homem queria, funcionou.
Poucos dias depois, todos os líderes de
todas as tribos fizeram uma assembleia
perante o Senhor em Mispá, a dez
quilômetros de Gibeá, o local do crime.
Depois de ouvirem toda a história da
vítima, tomaram a decisão unânime
de exigir que a tribo de Benjamim
entregasse os culpados, “os canalhas
de Gibeá” (Jz 20.13, NVI).¹ Como a
intimação não foi atendida e a justiça
precisava ser feita, as tribos partiram
para medidas mais drásticas: declararam
guerra à tribo de Benjamim. No final
da história, foram travadas três furiosas
batalhas, com muitas perdas em ambos
os lados. A tribo culpada foi eliminada
do mapa de Israel (homens, mulheres
e crianças) e suas cidades, incendiadas.
Apenas seiscentos benjamitas, todos do
sexo masculino, conseguiram escapar e
fugiram para o deserto. Quando a poeira
finalmente assentou e toda a nação teve
tempo para avaliar os estragos decorrentes
de uma noite de orgia, a nação inteira
chorou amargamente. Em voz alta, o
povo se perguntava: “Ó Senhor, Deus de
Israel, por que aconteceu isso? Por que
está faltando uma das nossas tribos?”
(Jz 21.3, NTLH).
Nota
1. “Canalha” é uma palavra muito forte. Ela está na
Bíblia, na Nova Versão Internacional, para se
referir a um grupo de homens que estuprou uma
mulher a noite inteira, causando-lhe a morte.
Não é fácil traduzir o original hebraico que
caracteriza esse tipo de gente. Versões católicas
e protestantes variam muito. As traduções mais
brandas usam as expressões “homens sem valor”
(TEB), “homens imorais” (NTLH), “bandidos” (BJ
e EP) e “homens malvados” (Bíblia Hebraica).
Já outras versões falam de “pervertidos” (BP),
“perversos” (BV), “depravados” (CNBB e AS21)
e “celerados” (EPC). A Bíblia mais usada pelos
protestantes (a tradução de Almeida Revista e
Atualizada) prefere não traduzir a expressão
original “filhos de Belial”.
BlasLamagni
31. Julho-Agosto, 2010 I ULTIMATO 31
na área sexual, assim como em outras
áreas, desvios de norma não são
excepcionais, mas, antes, comuns e
difundidos. A igreja deve agir com
tolerância e compreensão para com
todos os envolvidos, mas também
deve levá-los ao arrependimento.
Ela não pode abandonar a distinção
entre a norma e o comportamento
que se desvia da norma. Aqui estão
os limites de uma igreja cristã
que está sujeita à autoridade das
Escrituras. Aqueles que argumentam
que a igreja deve mudar essa norma
devem estar cientes de que estão
promovendo divisões: se uma igreja
se deixar levar a ponto de não
considerar a atividade homossexual
como um desvio da norma bíblica e
reconhecer as uniões homossexuais
como uma parceria possível de amor
equivalente ao casamento, tal igreja
não estaria sobre bases bíblicas, mas
contra o testemunho inequívoco das
Escrituras. Uma igreja que desse esse
passo, deixaria de ser a igreja una,
santa, católica e apostólica.
Traduzido por Vitor Grando da Silva Pereira
Wolfhart Pannenberg, teólogo protestante alemão nascido na
Polônia, é professor de teologia sistemática da Universidade de
Munique e diretor do Instituto de Teologia Ecumênica. É autor
de Teologia Sistemática (Paulus).
Sobre o amor — Pode o amor ser
pecaminoso? Toda tradição doutrinária
cristã ensina que há uma coisa
chamada amor invertido, pervertido.
Os seres humanos são criados para o
amor como criaturas de Deus, que
é amor. Ainda assim, essa ordenação
divina é corrompida sempre que as
pessoas se afastam de Deus ou amam
outras coisas mais do que a Deus.
Sobre o casamento — A união
indissolúvel do casamento é o alvo
da nossa criação como seres sexuais
(Mc 10.2-9). Visto que, quanto
a esse princípio, a Bíblia não é
temporal, as palavras de Jesus são o
critério e o fundamento para todo
pronunciamento cristão sobre a
sexualidade, não somente para o
casamento, mas também para nossa
identidade como seres sexuais. De
acordo com o ensinamento de Jesus,
a sexualidade humana como macho
e fêmea tem como alvo a união
indissolúvel do casamento.
Sobre a homossexualidade — As
determinações bíblicas quanto à
prática homossexual são claras e
não dão margem à ambiguidade
quanto à rejeição de tal prática.
Todas as afirmações sobre esse
assunto concordam mutuamente,
Wolfhart Pannenberg
sem exceções [...]. Sobre esse assunto,
o judaísmo sempre se viu como
distinto de outras nações. Essa mesma
distinção continuou a determinar
as afirmações do Novo Testamento
sobre a homossexualidade, em
contraste à cultura helenista, que não
via problema algum com as relações
homossexuais. Em Romanos, Paulo
inclui o comportamento homossexual
entre as consequências de se afastar de
Deus (Rm 1.27). Em 1 Coríntios, a
prática homossexual está, junto com
a fornicação, o adultério, a idolatria,
a avareza, a bebedeira, o furto e o
roubo, entre os comportamentos que
impedem a entrada no reino de Deus
(1Co 6.9-10). O Novo Testamento
não contém nenhuma passagem que
possa contrabalançar essas afirmações
paulinas. Assim, o testemunho bíblico
inclui a prática do homossexualismo,
sem exceção, entre os tipos de
comportamento que expressam
notavelmente a humanidade afastada
de Deus. Esse resultado exegético
coloca amarras estreitas na visão sobre
a homossexualidade que uma igreja
sob a autoridade do Espírito Santo
pode ter.
Sobre o papel da igreja — A igreja
tem de conviver com o fato de que,
Sobre a
sexualidade
cristã
StefanVasilev
32. 32 ULTIMATO I Julho-Agosto, 2010
A
decisão de amar é acompanhada
pelo risco de não amar. Nem
o compromisso público do
casamento extingue tal risco. Amamos
quando nos dispomos a dedicar tempo,
serviço e coração ao outro. Decidimos
não amar quando nosso cônjuge deixa
de ser o real objeto do nosso amor e
se torna, em nossa fantasia, qualquer
outra pessoa — exceto ele mesmo.
Desvios sexuais, como a
pornografia e o adultério, são, na
prática, nossa absurda decisão de
não amar o cônjuge. Na pornografia,
idealizamos um corpo perfeito e
não conseguimos dedicar tempo,
serviço e coração para amar o corpo
imperfeito do nosso cônjuge. Cada ato
pornográfico é, no fundo, a decisão
de não amar quem um dia decidimos
amar. E quanto mais constante e
Capa
A absurda decisão de
não amar o cônjugeLissânder Dias do Amaral
repetitiva essa prática se torna, mais
nos afastamos do nosso (verdadeiro)
cônjuge. Se não houver cura, chegará
o dia em que decidiremos amar
definitivamente a fantasia da perfeição
sem amor a despeito da realidade da
imperfeição com amor.
Já no adultério, falsificamos a nós
mesmos e duplicamos nosso cônjuge.
Decidimos amar duas ou mais pessoas,
não amando, na verdade, nenhuma. Já
não há mais foco e dedicação ao amor.
Não há uma pessoa inteira ao nosso
lado, com sua história, sentimentos,
defeitos e qualidades únicas. Há apenas
opções de prazer. E já não somos nós
mesmos, apenas consumidores de bem-
estar. Cometer adultério também faz
parte da absurda decisão de não amar
o cônjuge. Quanto mais o praticamos,
mais reduzimos a quase nada quem um
dia decidimos amar.
Amar é uma ordem. Quando
Jesus deu essa ordem aos discípulos
(Jo 15.12), ele estava estabelecendo
um alto padrão de relacionamento
para toda a humanidade. Esse
padrão é ainda mais relevante no
relacionamento conjugal, que tem um
grau de intimidade e compromisso
muito mais elevado. No entanto, antes
de ordenar que os discípulos amassem
uns aos outros, Jesus disse que eles
deveriam “permanecer no amor
dele” (Jo 15.9). Permanecer é decidir
diariamente continuar amando, e isso
torna a vida maravilhosamente mais
bela. À luz desse padrão, decidir não
amar é verdadeiramente um absurdo.
Lissânder Dias do Amaral é coordenador executivo da Rede
Mãos Dadas.
ElioRocha
32 ULTIMATO I Julho-Agosto, 2010
34. 34 ULTIMATO I Julho-Agosto, 2010
ESPECIAL
N
as palestras sobre religião
e homossexualidade
realizadas na
Universidade Federal de
Viçosa por ocasião da 1ª
Semana da Diversidade Sexual, em maio
de 2010, alguém sugeriu que, antes de
qualquer coisa, se fizesse a oração do
Pai-Nosso. Outro participante achou
a ideia estranha, pois a universidade é
laica. Se fosse levada a sério, a oração
do Senhor poderia ter ajudado,
principalmente por causa da terceira
súplica que nela aparece: “Seja feita a
tua vontade, assim na terra como no
céu” (Mt 6.10).
Qual é a vontade, ou melhor, a
prescrição de Deus quanto à sexualidade
humana? A resposta encontra-se no
livro-texto do cristianismo, as Escrituras
Sagradas, o maior best-seller de todos
os tempos (nos últimos anos, só as
147 sociedades bíblicas do mundo
colocaram em circulação 145 milhões
de Bíblias e 297 milhões de Novos
Testamentos). O nigeriano Yusufu
Turaki, mestre em teologia e doutor
em ética social, explica que “nossa visão
sobre a homossexualidade não deve
proceder de fontes humanas, mas da
Palavra de Deus”. Ele conclui: “A Bíblia
define claramente a homossexualidade
como pecado” (Comentário Bíblico
Africano, 2010, p. 1389). Há vários
anos, o psiquiatra Armand Nicholi,
da Universidade de Harvard, autor
de Deus em Questão, escreveu: “Os
que baseiam sua fé sobre o Antigo e o
Novo Testamentos não podem duvidar
que as severas proibições quanto ao
comportamento homossexual fazem de
sua atividade uma transgressão diante da
Lei de Deus” (Dicionário de Ética, 2007,
p. 337).
Desde o início da vida humana, a
companheira do homem é uma mulher
e o companheiro da mulher, um
homem, como se pode ver no artigo
Uma paráfrase da Bíblia sobre a criação
da mulher (pág. 25). Só a redescoberta
desse ato criador de Deus já seria
suficiente para se conhecer os caminhos
da heterossexualidade. Todavia,
como reforço, é bom consultar outras
passagens bíblicas.
É comum ridicularizar a história da
destruição de Sodoma e Gomorra e
pôr panos quentes no pecado principal
daquelas cidades próximas ao mar
Morto, na Palestina. A descrição
nua e crua que a Bíblia faz da orgia
homossexual coletiva e generalizada,
ousada e incontrolável (Gn 19), tem
suporte em outras passagens bíblicas
(Ez 16.46-52; 2Pe 2.6-8 e Jd 7).
Pedro conta que Ló, que vivia em
Sodoma, “todos os dias [...] ficava
muito agoniado em ver e ouvir as coisas
más que aquela gente fazia” (2Pe 2.8,
NTLH).
Embora o livro de Levítico contenha
leis cerimoniais, profiláticas e higiênicas,
ele contém também leis de valor
durável. No capítulo 18, diversas uniões
sexuais são consideradas fora da lei
e a maior parte delas ainda é levada
a sério pelo senso comum. Relações
sexuais com a mãe ou outra mulher
do pai, com a irmã, a neta, a nora,
a cunhada e a mulher alheia eram
terminantemente proibidas para o povo
judeu. É nessa porção da Bíblia que
se encontra a passagem mais explícita
contra a homossexualidade: “Com
homem não te deitarás, como se fosse
mulher” (v. 22). No versículo seguinte,
há outra séria e óbvia proibição: “Não
tenha relações sexuais com um animal”
e “mulher nenhuma se porá diante de
um animal para ajuntar-se com ele; é
depravação”.
A carta de Paulo aos Romanos é
o único texto bíblico que menciona
explicitamente a homossexualidade
feminina: “Até suas mulheres trocaram
suas relações naturais por outras,
contrárias à natureza” (Rm 1.26).
No verso seguinte, Paulo fala sobre
o homossexualismo masculino: “Da
Pai nosso, que
estás nos céus!
Seja feita a tua
vontade quanto à
nossa sexualidade
MaryLatch
35. Julho-Agosto, 2010 I ULTIMATO 35
mesma forma, os homens
abandonaram as relações
naturais com as mulheres
e se inflamaram de paixão
uns pelos outros”. Paulo
volta a falar sobre o
assunto pelo menos mais
duas vezes (1Co 6.9-11 e
1Tm 1.9-10).
Certo empresário
queria saber se um
homossexual poderia
deixar de ser homossexual.
Para responder a
pergunta, seu interlocutor
abriu a Bíblia e leu para
ele a passagem que mostra
que na igreja de Corinto
havia ex-homossexuais
passivos e ativos (veja A
porno-Corinto, pág. 28).
Mesmo no meio
científico, alguns admitem
que homossexuais
podem mudar sua
orientação sexual. O
próprio Robert Spitzer,
professor de psiquiatria
da Universidade de
Colúmbia, famoso por
ter ajudado a excluir
a homossexualidade
da lista de doenças
mentais da Associação
Psiquiátrica Americana
(1973), “descobriu
que 78% dos homens
e 95% das mulheres
que voluntariamente se
submeteram a uma terapia
‘restauradora’ relataram
uma mudança em sua
sexualidade” (Por que
confiar na Bíblia?, 2005,
p. 124).
Embora a
hermenêutica dessas
passagens bíblicas seja
tranquila, naturalmente
algumas pessoas, até
mesmo cristãs (católicas e
protestantes), fazem uma
leitura diferente, a “leitura
gay”, como se diz.
Heterossexualidade
sem homofobia e
homossexualidade
sem heterofobia
S
e todos somos igualmente marcados pelo
pecado, tanto potencialmente como na prática,
a discriminação por razões morais e religiosas
contra, por exemplo, os gays, torna-se ridícula
e hipócrita, além de acrescentar mais um
pecado ao nosso vergonhoso currículo moral. Além do
mais, a oposição que alguns fazem à homossexualidade não
é educada, inteligente, coerente e caridosa. Há casos de
agressão verbal e física. Em algumas vertentes muçulmanas
acentuadamente fundamentalistas, os homossexuais podem
ser condenados à morte. Nem todos os prisioneiros dos
muitos campos de concentração eram judeus ou inimigos do
regime nazista — alguns eram apenas homossexuais.
Em contrapartida, os homossexuais não podem dar lugar
à heterofobia. Eles podem sair do armário sem pretender
colocar os héteros nos armários vazios. A sociedade precisa
enxergar esse processo em andamento. Se os homossexuais
podem defender a bandeira da homossexualidade, por
que os heterossexuais não podem defender a bandeira da
heterossexualidade?
Se a consciência de um homossexual não o deixar em paz,
apesar do apoio ostensivo da mídia, de alguns profissionais
da saúde e até de alguns líderes religiosos, por que não
se pode dar a ele auxílio psicológico ou pastoral, caso a
pessoa espontaneamente o deseje? Se uma igreja se recusa a
celebrar um casamento gay ou ordenar um padre ou pastor
homossexual, por que zombar, perseguir, multar ou prender
o responsável por esse comportamento, exigido por seu
credo? Os homos querem liberdade de pensamento e de
ação. O mesmo acontece com os héteros.
A prática homossexual é condenada pelas três religiões
monoteístas do planeta: o cristianismo, o judaísmo e o
islamismo. No caso dos protestantes, enquanto eles se
conservarem fiéis às Escrituras Sagradas, sua única regra de
fé e prática, a conduta homossexual será considerada um
desvio sexual. Entretanto, os cristãos horrorizados com a
homossexualidade se obrigam pela mesma Bíblia a ficar
horrorizados também com o adultério, com a hipocrisia,
com o roubo, com o egocentrismo, com a soberba, com a
incredulidade, com a inveja, com a violência, com a berrante
injustiça social e daí por diante. E com a mesma intensidade!
DiegoMedrano
36. 36 ULTIMATO I Julho-Agosto, 2010
ESPECIAL
C
om a presença de tantos
homossexuais na cidade
grega de Corinto e a
completa ausência de
normas contrárias e de
reações homofóbicas na sociedade grega,
bastaria a Paulo instituir o casamento gay
e combater apenas a orgia homossexual.
Mas não foi isso o que ele fez nem
o que aconselhou. Em sua primeira
Carta aos Coríntios, o apóstolo é
bem explícito: “Já que existe [aqui em
Corinto] tanta imoralidade sexual, cada
homem deve ter a sua própria esposa,
e cada mulher, o seu próprio marido”
(1Co 7.2, NTLH).
Para não se colocar contra a maré,
contra a cultura, contra a opinião
pública, contra os deuses (Apolo em
especial) e contra a “corintização”,
Paulo deveria ter prescrito no máximo a
monogamia homossexual: “Já que existe
em Corinto tantos prostitutos, tantas
orgias homossexuais, cada homem deve
ter o seu próprio homem, e cada mulher,
a sua própria mulher”.
Se somos realmente cristãos,
se devemos obediência às normas
preestabelecidas desde a criação, se
entendemos que a Bíblia é a Palavra de
Deus, se reconhecemos a autoridade do
apóstolo Paulo, autor de treze dos 27
livros do Novo Testamento, o casamento
gay deve ficar totalmente fora de
cogitação.
A rigor, e para os cristãos, a questão
gay tem de ser enfrentada de outra
maneira. Permanecer no armário ou
voltar para ele não resolve. Casar-se
com o parceiro do mesmo sexo não
resolve. Adotar e criar filhos ora sem
mãe ora sem pai não resolve. Fazer
uma leitura gay da Bíblia não resolve.
Filiar-se a uma igreja gay e ter pastores
e bispos homossexuais não resolve.
Livrar-se de qualquer preconceito por
parte da sociedade não resolve.
Isso não quer dizer que não haja
solução para a pessoa que nasceu com
dificuldade heterossexual ou com
tendência homossexual, para a pessoa
que recebeu no lar estímulos contrários
à heterossexualidade, para a pessoa
que foi levada ao homossexualismo
por causa de abusos sexuais cometidos
por familiares ou estranhos, para a
pessoa que chegou a essa situação
por curiosidade e para a pessoa que
tornou-se homossexual em função
da propaganda da homossexualidade
(novelas, filmes, internet, paradas gays
etc.). A solução é a graça de Deus, que
ela deve buscar persistentemente. A
graça de Deus a levará à conversão,
como aconteceu com certo número
de pessoas em Corinto (1Co 6.11).
Trata-se, honestamente falando, de um
milagre, algo inexplicável operado pelo
Espírito Santo. Embora dependente
da soberania de Deus, a gênese dessa
experiência religiosa tem muito a ver
com o ministério da igreja, que precisa
orar, amar, acolher, compreender
o drama da homossexualidade e
comunicar as boas novas da salvação.
A participação de profissionais da
saúde não deve ser descartada nem pela
igreja nem pela medicina. Na verdade,
a Resolução 01/99 do Conselho Federal
de Psicologia não “impede os psicólogos
de atenderem pessoas que queiram
reduzir seu sofrimento psíquico causado
por sua orientação sexual, seja ela
homo ou heterossexual”. A proibição,
continua o documento, “é claramente
colocada na adoção de ações coercitivas
tendentes à cura e na expressão
de concepções que considerem a
homossexualidade doença, distúrbio
ou perversão”. Naturalmente, os
pregadores do evangelho não estão
proibidos, à luz da Bíblia, de condenar
como pecado a prática homossexual,
desde que chamem todos os outros
pecados de pecado e desde que
anunciem também a graça de Deus.
A conversão não significa
obrigatoriamente que o ex-homossexual
ou a ex-lésbica precisa contrair
matrimônio com pessoa de sexo
diferente. A aceitação do evangelho e
o compromisso com Cristo indicam
uma mudança radical no estilo de
vida, seja qual for o estado civil.
E o mesmo se requer do heterossexual
A solução do
problema gay
na perspectiva cristã
KateNorthern
37. Julho-Agosto, 2010 I ULTIMATO 37
solteiro ou casado. No final das contas,
a moral sexual cristã não visa apenas
os homossexuais, as mulheres e os
casados. Ela é também para os héteros,
os homos e os solteiros, e em qualquer
faixa etária (adolescentes, jovens,
adultos e idosos).
A conversão não impede que
haja um desagradável descuido que
provoque uma acidental queda, que
deve ser confessada e abandonada para
ser perdoada (1Jo 1.9). Entre os muitos
problemas de comportamento que
havia na igreja de Corinto, um deles
era na área sexual.
O apóstolo temia encontrar, em
sua próxima passagem por Corinto,
alguns daqueles irmãos que haviam
abandonado as imoralidades sexuais
de volta a elas, fato que o humilharia
muito e o faria chorar por eles
(2Co 12.21). Era sabido que um deles
havia sucumbido à tentação de deitar-
se com a mulher de seu pai (1Co 5.1),
embora, depois da disciplina, tivesse
se entristecido amargamente e se
arrependido (2Co 2.5-8).
Em vez de afrouxar as normas
de conduta, o apóstolo as confirma:
“Fujam da imoralidade sexual, [pois]
todos os outros pecados que alguém
comete, fora do corpo os comete; mas
quem peca sexualmente, peca contra o
seu próprio corpo, [que] é santuário do
Espírito...” (1Co 6.18-20).
Há esperança para
o homossexual
temente a Deus
William Lane Craig
S
Se você é homossexual ou tem inclinação,
mantenha-se puro. Se você não é casado, deve
praticar abstinência de toda atividade sexual.
Eu sei que isso é difícil, mas o que Deus está
pedindo que você faça é simplesmente o
mesmo que ele requer de todas as pessoas solteiras. Isso
significa manter puro não só o seu corpo, mas em especial
a sua mente. Assim como o heterossexual deve evitar a
pornografia e a imaginação, você também precisa manter
sua vida e pensamentos limpos.
Resista à tentação de racionalizar o pecado, dizendo
“Deus me fez assim”. Deus deixa claro que ele não quer que
você ceda ao pecado, mas, sim, que você o honre mantendo
puros o corpo e a mente.
Procure aconselhamento profissional cristão. Com tempo
e esforço, você pode vir a usufruir de relações normais e
heterossexuais com a sua esposa. Há esperança!
Traduzido por Vitor Grando da Silva Pereira
William Lane Craig, doutor em teologia pela Universidade de Munique, na Alemanha, e em
filosofia pela Universidade de Birmingham, na Inglaterra, é professor de filosofia na Faculdade
de Teologia da Universidade Biola, em La Miranda, na Califórnia.
38. 38 ULTIMATO I Julho-Agosto, 2010
A
partir de hoje, com a
ajuda de Deus, vou
deixar de me lembrar
de muitas coisas.
Não me lembrarei
de alguns traumas da infância.
Daquele professor que zombou de
mim em público quando escrevi
uma palavra errada no quadro-
negro. Daquela correada de meu pai
que atingiu o tumor que eu tinha
na barriga. Da falta de aplicação aos
estudos que me obrigou a repetir a
série duas vezes. Das discussões sem
fim entre meu pai e minha mãe. Do
suicídio do garoto da minha idade
perto da minha casa. Daquele teco-
teco que caiu e matou o piloto.
Não me lembrarei dos pecados
anteriormente cometidos, dos
pecados ocultos nem dos pecados
públicos. Não há proveito algum
nessa lembrança mórbida e
desnecessária, pois já chorei por
eles e eles já foram confessados,
perdoados e removidos.
Não me lembrarei daquela
provocação, daquela injustiça,
daquela dolorosa afronta que alguém
me dedicou. Vou me esquecer do
lugar, da data e das circunstâncias
em que o desagravo aconteceu.
Considerarei definitivamente
perdoada a pessoa que o cometeu.
Porei no fogo documentos históricos
que lembrem esse incidente e
qualquer outro do mesmo porte.
Ficarei completamente livre de
recordações incômodas.
Não me lembrarei
demasiadamente das placas,
dos troféus, dos diplomas, das
honrarias, dos prêmios, das
coroas recebidos no percurso da
minha caminhada. Para evitar o
espírito de superioridade, o nariz
empinado, a empáfia, a situação de
risco, a queda. Para não provocar
a inferioridade nem a antipatia
alheias. Com a ajuda de Deus,
lançarei minha coleção de coroas
diante “daquele que está sentado
no trono e que vive para todo o
sempre” (Ap 4.9).
Não me lembrarei unicamente
de mim, de minhas dores, de meu
sofrimento, de minhas carências, de
minha posição, de meus bens. Esse
mandamento recebi de meu Pai. Ele
tem me dito e repetido: “A pessoa
que procura seus próprios interesses
nunca terá a vida verdadeira; mas
quem esquece a si mesmo terá
a vida verdadeira” (Lc 17.33,
NTLH). Não me será fácil agir
dessa maneira cristã, pois, como
descendente de Adão, eu me lembro
de tudo, menos dos outros. Porém
de hoje em diante será diferente!
Que o Senhor me socorra!
Não quero me lembrar de tudo
DE HOJE EM DIANTE...
MateuszStachowski
39. Julho-Agosto, 2010 I ULTIMATO 39
REPORTAGEM
O
pastor Lindon Carlos entra pela porta de uma
escola municipal da cidadezinha de Imaculada,
no sertão da Paraíba. Carrega uma Bíblia e
alguns exemplares da revista Mãos Dadas. Os
professores o recebem com sorrisos, enquanto
ele entrega a revista e prega o evangelho. Ele faz isso porque
sabe da triste realidade das crianças do seu lugar (alimentação
inadequada, sistema educacional precário e merenda escolar
insuficiente, insegurança em casa e ausência dos pais, que
deixam a família à procura de emprego) e acredita que os
cristãos devem lutar em favor das crianças em situação de
risco.
Ailton Fonseca visita igrejas e seminários da cidade de
São Paulo. Enquanto fala da necessidade de os cristãos se
envolverem com o problema da delinquência juvenil, também
distribui exemplares de Mãos Dadas, como ferramenta útil
para mostrar às igrejas a necessidade de olharmos as crianças
com compaixão e de nos unirmos em rede.
As atitudes de Lindon Carlos e Ailton são bons exemplos
do que pode acontecer quando organizações e comunidades
cristãs decidem trabalhar juntas. Lindon é membro da Ação
Evangélica (ACEV), uma igreja que atua há 72 anos no
Nordeste. Ailton é administrador do Ministério JEAME,
que ajuda jovens em conflito com a lei, egressos de unidades
O desafio de trabalhar junto
Rede evangélica completa 10 anos e mostra que
é possível caminhar em parceria
por Lissânder Dias
Uma Criança os Guiará
O ponto alto da comemoração dos 10 anos
de Mãos Dadas foi o lançamento de Uma
Criança os Guiará – por uma teologia da criança
(Ed. Ultimato, 280 pág.), que reúne textos de
mais de vinte autores nacionais e estrangeiros,
entre teólogos, historiadores, psicólogos,
jornalistas e pastores. A criança é mencionada
no olhar da teologia, do Antigo Testamento, do
Novo Testamento, da sociedade e da própria
criança. Nas últimas páginas, John Collier
lembra que “Jesus colocou uma criança no
meio dos discípulos no momento em que eles
estavam engajados num debate teológico
sobre grandeza no reino de Deus” (pág. 258).
O fato é que — conclui o mesmo autor —, “com
a teologia da criança, embarcamos em uma
nova jornada com Cristo em direção ao mistério
revelado de Deus no mundo” (pág. 259).
O título do livro lembra aquela
criança que, nos novos céus e
nova terra, vai caminhar sem
perigo algum com lobos e
ovelhas, e brincar perto de
cobras e não será picada
(Is 11.6-8)!
JamesGIlbert
Parceiros oram durante a celebração
dos dez anos de Mãos Dadas
40. 40 ULTIMATO I Julho-Agosto, 2010
socioeducativas. Ambas as
instituições são parceiras da Rede
Mãos Dadas, por meio da qual
quarenta organizações evangélicas
transitam e dialogam em um
espaço comum. A bandeira da rede
é a criança. Sua identidade é o
cristianismo.
Com a Rede Mãos Dadas, as
organizações recebem informação,
recursos didáticos (como a revista
Mãos Dadas) e encorajamento umas
das outras. Na troca, elas descobrem
que não caminham sozinhas,
apesar dos obstáculos próprios do
sertão nordestino ou das grandes
cidades. Compartilhando suas lutas
e conquistas, igrejas e instituições
descobrem que o reino de Deus
é maior do que elas mesmas e,
com isso, sentem-se motivadas a
seguir a caminhada de obediência
ao chamado para cuidar dos mais
vulneráveis. Trabalhando em
rede, elas podem também mudar
a cultura de isolamento ainda
existente no meio evangélico e
abrir caminho para uma cultura de
parceria e doação.
Dez anos
Em novembro de 2000, quatro
organizações sociais evangélicas —
Compassion, Tearfund, Visão
Mundial e Viva Network —, a
agência missionária Equip Inc e a
Editora Ultimato publicaram no
Brasil uma revista de 16 páginas,
de linguagem simples, escrita
para pessoas que trabalham com
crianças e adolescentes em situação
de vulnerabilidade extrema. Era
uma iniciativa inovadora, já que
não havia nenhuma publicação tão
contextualizada para um público
carente de informação. Com uma
tiragem de 35 mil exemplares,
ninguém tinha certeza se a ideia
teria vida longa (daí enumerá-la
como edição zero). No entanto, por
trás da publicação, havia a intenção
de unir organizações cristãs. A
disposição para tal fez com que a
revista se tornasse não somente uma
ferramenta de informação, mas
também um meio agregador.
Com 26 edições publicadas e
950 mil exemplares impressos,
a caminhada já dura 10 anos. O
número de parceiros saltou para
quarenta e outros projetos foram
sendo abraçados pela rede, como o
Mutirão de Oração por Crianças e
Adolescentes em Situação de Risco,
o Programa CLAVES (ferramenta de
prevenção contra o abuso infantil), a
ferramenta Um Lugar Seguro para as
Crianças (que ajuda as organizações
a construírem políticas internas de
proteção à criança), o processo de
reflexão Teologia da Criança e a
Campanha Latino-Americana pelos
Bons Tratos da Criança. Porém
mais do que desenvolver projetos
específicos, a caminhada em parceria
ajudou a rede a compreender melhor
que, de fato, a criança é um cidadão
do reino de Deus (e que, por isso,
deve ser respeitada) e um pleno
sujeito de direitos (e que, portanto,
deve ser defendida nas esferas
públicas). Com isso, as ações deixam
de ser desconectadas das convicções
cristãs e da dimensão social e
política.