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Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 1
FECHAMENTOAUTORIZADO.PodeserabertopelosCorreios.
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Lições e desafios
		 para a Igreja de Cristo
LAUSANNE 3
BRÁULIARIBEIRO	
O REI ESTÁ NU
CATITOEDAGMARGRZYBOWSKI
NINHO VAZIO: BOAS NOVAS OU DESESPERO?	
RUBEMAMORESE
ANELOS 2011
JA N E I R O – F E V E R E I R O 2 01 1 • A N O X L I V • N º 3 2 8
NASCE EM SÃO PAULO A ALIANÇA CRISTÃ EVANGÉLICA BRASILEIRA • A GRITARIA DOS
PREOCUPADOS: PRENÚNCIOS DE UMA REFORMA INTERNA • SOBRE A PARTICIPAÇÃO
EVANGÉLICA NA CAMPANHA ELEITORAL 2010 • POR UM AVIVAMENTO PENTECOSTAL
2 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011
Anúncio
Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 3
Deus fez o mundo e tudo o que nele há.
Deus é o Senhor dos céus e da terra.
Deus não habita em templos construídos por seres
humanos.
Deus não precisa de alguém que o ajude.
Deus dá a todos a vida, o fôlego e tudo o mais.
Deus criou a partir de um só homem todas as raças
humanas para viverem na terra.
Deus definiu as etapas da história e as fronteiras dos
países.
Deus fez tudo isso porque desejava ser procurado e
achado, ainda que às apalpadelas.
Deus não está longe de ninguém.
Deus não tem nada a ver com os ídolos de ouro, prata
ou pedra feitos pela arte e habilidade das pessoas. Ele
nem sequer é parecido com tais objetos.
Deus ordena que todos os homens em todos os
lugares se arrependam dos seus pecados.
Deus marcou em sua agenda uma data para julgar
o mundo com justiça por meio do homem que ele
designou e que já mostrou quem é ao ressuscitar Jesus.
Esse discurso de Paulo foi feito na colina do deus
Áries (nome grego) ou Marte (nome latino), situada
Um discurso
sobre Deus
no auditório mais
intelectualizado da
cidade mais culta
do mundo
Abertura
entre a Acrópole (a parte mais alta da cidade) e a
Ágora (o mercado), na cidade de Atenas, a capital
da Grécia e do helenismo, com 25 mil habitantes.
O conselho da cidade (algo parecido com a
Câmara Municipal) se reunia frequentemente
naquele mesmo auditório. O convite para Paulo
falar partiu de filósofos de duas escolas diferentes:
os estoicos (discípulos de Zenão) e os epicureus
(discípulos de Epicuro), que chamavam o apóstolo
de “tagarela” e “pregador de coisas esquisitas”
(At 17.20). Era uma elite complicada, pois os
epicureus acreditavam que o prazer era o principal
objetivo da vida e os estoicos entendiam que
“os seres humanos devem ser livres das paixões,
indiferentes à alegria ou ao sofrimento, aceitando
calmamente todas as coisas como resultado da
vontade divina”.
Atenas era famosa por ter sido, alguns anos
antes, o centro das artes, da arquitetura, da política
e da filosofia. Ali moraram Sólon (um dos sete
sábios da Grécia), Platão (fundador da Academia)
e Aristóteles (filósofo, educador e cientista).
O discurso de Paulo sobre Deus provocou
a conversão de Dionísio, “o areopagita”, de
Dâmaris, que provavelmente era uma mulher da
alta sociedade, e de outras pessoas cujos nomes o
historiador não cita (At 17.22-31).
4 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011
C
omo resultado da pesquisa respondida por
quase 3 mil leitores em outubro de 2010,
Ultimato agora conta com novas seções
e novos colaboradores. Ed René Kivitz, que assina
a seção “Cotidiano — o leitor pergunta” (p. 38),
tem 47 anos, é casado, tem dois filhos, é pastor
da Igreja Batista de Água Branca, na cidade de
São Paulo, e autor de vários livros (O Livro Mais
Mal-Humorado da Bíblia, Outra Espiritualidade,
Uma Igreja Como a Sua e outros). Jorge Henrique
Barro, responsável pela seção “Cidade em foco”
(p. 58), tem 48 anos, é casado, tem dois filhos,
é pastor presbiteriano e professor e diretor da
Faculdade Teológica Sul Americana, em Londrina,
PR. Ed René é mestre em ciências da religião
pela Universidade Metodista de São Paulo e Jorge
Henrique, doutor em estudos interculturais pelo
Fuller Theological Seminary, na Califórnia. Ed
René foi alfabetizado com a Bíblia Sagrada pela
avó paterna e se decidiu por Jesus aos 11 anos.
Jorge Barro foi encontrado pelo Senhor aos 13, no
Acampamento Palavra da Vida, em Atibaia, SP.
Carlos “Catito” Grzybowski e sua esposa, Dagmar
Fuchs Grzybowski, batistas, psicólogos e terapeutas
de casais e famílias, assinam a seção “Casamento
e família”. Catito é autor de Como se Livrar de
um Mau Casamento e Macho e Fêmea os Criou,
entre outros. A partir da edição de março/abril, a
seção “Meio ambiente e fé cristã” estará a cargo
da senadora Marina Silva, 52 anos, casada, quatro
filhos, membro da Assembleia de Deus do Plano
Piloto, em Brasília. Ela foi ministra do Meio
Ambiente e se converteu a Jesus aos 39 anos. A
seção “Estudos bíblicos”, muito solicitada pelos
leitores, será oferecida na internet.
Outra novidade para 2011 é a nova identidade
visual da Editora Ultimato (veja pág. 44).
Que o novo ano seja uma riqueza para você e
todos os seus!
Elben César
Carta ao leitor
ISSN 1415-3165
Revista Ultimato – Ano XLIV – Nº 328
Janeiro-Fevereiro 2011
www.ultimato.com.br
Publicação evangélica destinada à evangelização e
edificação, não denominacional, Ultimato relaciona
Escritura com Escritura e acontecimentos com Escrituras.
Visa contribuir para criar uma mentalidade bíblica e
estimular a arte de encarar os acontecimentos sob uma
perspectiva cristã. Pretende associar a teoria com a
prática, a fé com as obras, a evangelização com a ação
social, a oração com a ação, a conversão com santidade
de vida, o suor de hoje com a glória por vir.
Circula em meses ímpares
Diretor de redação e jornalista responsável:
Elben M. Lenz César – MTb 13.162 MG
Arte: Liz Valente
Impressão: Plural
Tiragem: 35.000 exemplares
Colunistas: Alderi Matos • Bráulia Ribeiro
Carlos “Catito” Grzybowski • Carlinhos Veiga
Dagmar Fuchs Grzybowski • Ed René Kivitz • Jorge Barro
Marcos Bontempo • Paul Freston • René Padilla Ricardo
Barbosa de Sousa • Ricardo Gondim Robinson Cavalcanti
Rubem Amorese • Valdir Steuernagel
Notícias: Lissânder Dias
Participam desta edição: David Allen Bledsoe
Délnia Bastos • Lyndon de Araújo Santos
Saulo Xavier de Souza
Publicidade: anuncio@ultimato.com.br
Assinaturas e edições anteriores:
atendimento@ultimato.com.br
Reprodução permitida: Favor mencionar a fonte.
Os artigos não assinados são de autoria da redação.
Publicado pela Editora Ultimato Ltda., membro
da Associação de Editores Cristãos (AsEC)
Editora Ultimato
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Caixa Postal 43
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Daniela Cabral • Ivny Monteiro • Lucas Rolim Menezes
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Bernadete Ribeiro • Djanira Momesso César
Fernanda Brandão Lobato • Gláucia Siqueira
Paula Mendes • Paulo Alexandre Lobato
Finanças/Circulação: Emmanuel Bastos
Aline Melo • Ana Paula Fernandes • Cristina Pereira
Daniel César • Edson Ramos • Luís Carlos Gonçalves
Rodrigo Duarte • Solange dos Santos
Vendas: Lúcia Viana • Lucinéa Campos • Romilda Oliveira
Sabrina Machado • Tatiana Alves • Vanilda Costa
Estagiárias: Cláudia Alvarenga • Jaklene Batista
Juliani Lenz
fundada em 1968
4 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011
oano,
asseções,
oscolaboradores,
aidentidadevisual
Arquivopessoal
Ed René Kivitz
Arquivopessoal
Carlos “Catito” e
Dagmar Grzybowski
FranciscoMessias
Marina Silva
Arquivopessoal
Jorge Barro
NOV
Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 5
6 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011
72.
L
ucas, historiador e médico, elogia muito
certo pregador egípcio chamado Apolo
(At 18.23-28). Diz que ele falava muito
bem, tinha um conhecimento profundo das
Escrituras Sagradas, era instruído no caminho do
Senhor, pregava com entusiasmo e notável coragem,
e possuía o precioso dom da pregação, com o
auxílio do qual conseguia convencer os judeus pelos
profetas do Antigo Testamento de que Jesus era de
fato o Messias que havia de vir. Apolo havia nascido
e crescido na cidade de Alexandria, o grande centro
cultural do Egito, situada à margem ocidental do
Delta do rio Nilo, junto ao Mediterrâneo. Além do
mais, quando saiu de Éfeso para Corinto, o mesmo
historiador afirma que Apolo sabia fortalecer os
crentes novos na fé.
Apesar de todos esses registros apreciativos, Lucas
aponta um senão: “O seu ensinamento a respeito de
Jesus era correto; porém [Apolo] conhecia somente
o batismo de João” (At 18.25, NTLH). O batismo
de Jesus é o batismo referido pelo Senhor no dia de
sua ascensão: “João batizou com água, mas daqui
a poucos dias vocês serão batizados com o Espírito
Santo” (At 1.5). Apolo não estava em Jerusalém no
dia de Pentecostes (talvez ainda não fosse cristão)
e, portanto, não havia participado da cerimônia da
descida espetacular e marcante do Espírito Santo.
Faltava-lhe o conhecimento da presença externa
e interna do Espírito, de modo contínuo, como
paracleto, santificador, revelador, consolador,
capacitador e doador de dons e poder. Em outras
palavras, Apolo ainda não era pentecostal no
sentido histórico.
E as informações de Lucas sobre o pregador
egípcio não terminam por aí. Ele faz questão
de salientar mais uma virtude de Apolo. Não
explicitamente, mas o suficiente para o leitor
enxergar de imediato a humildade do personagem:
sobre o batismo de Jesus, ele deixa-se esclarecer por
Priscila e Áquila, o simpático casal que o hospedava
em Corinto (At 18.26).
Embora em outros casos tenha havido
imposição de mãos relacionada ao recebimento do
Espírito Santo (At 8.17; 9.17; 19.6), o historiador
nada diz a esse respeito com referência a Apolo.
No entanto, deduz-se que o egípcio, até então
não-pentecostal, tenha se tornado conscientemente
pentecostal ali em Corinto, onde veio a ser
um obreiro de peso. Na Primeira Epístola aos
Coríntios, Paulo cita sete vezes o nome dele. Uma
delas lembra seu pastoreio: “Eu plantei, e Apolo
regou” (1Co 3.6). Ele era um homem de confiança
de Paulo, como se vê nesta passagem: “Quanto
ao irmão Apolo, tenho recomendado muitas
vezes que vá visitar vocês com os outros irmãos”
(1Co 16.12).
Pastorais
O não-pentecostal
OveTøpfer
Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 7
Cinco lições de Lausanne 3
Novas geografias, velhas
desigualdades
Uma declaração de amor
Um lugar para Lausanne 3 na
história
3 Abertura
4 Carta ao leitor
6 Pastorais
8 Cartas
12 Frases
14 Mais do que notícias
16 Números
18 Notícias
32 De hoje em diante...
38 Cotidiano — o leitor pergunta
39 Novos acordes
40 Altos papos
42 Meio ambiente e fé cristã
43 Caminhos da missão
58 Cidade em foco
CAPA
SEÇÕES
Leia mais
www.ultimato.com.br
Sumário
ABREVIAÇÕES:
AS21 - Almeida Século 21; BH - Bíblia Hebraica; BJ - A Bíblia de
Jerusalém; BP - A Bíblia do Peregrino; BV - A Bíblia Viva; CNBB -
Tradução da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil; CT - Novo
Testamento (Comunidade de Taizé); EP - Edição Pastoral; EPC - Edição
Pastoral - Catequética; HR – Tradução de Huberto Rohden; KJ - King
James (Nova Tradução Atualizada dos Quatro Evangelhos); NTLH - Nova
Tradução na Linguagem de Hoje; TEB - Tradução Ecumênica da Bíblia. As
referências bíblicas não seguidas de indicação foram retiradas da Edição
Revista e Atualizada, da Sociedade Bíblica do Brasil, ou da Nova Versão
Internacional, da Sociedade Bíblica Internacional.
Especial
20 ultimato.com.br: um novo ponto
de encontro
44 Ultimato: nova identidade visual
46 Como o grão de trigo, nasce e
morre em São Paulo a Aliança Cristã
Evangélica Brasileira
62 A gritaria dos preocupados:
prenúncios de uma reforma interna
64 A preocupação com o
neopentecostalismo: o caso da Igreja
Universal do Reino de Deus
David Allen Bledsoe
O caminho do coração
30 O espírito de Lausanne
Ricardo Barbosa de Sousa
Casamento e família
31 Ninho vazio: boas novas ou
desespero?, Carlos “Catito” Grzybowski
e Dagmar Fuchs Grzybowski
Da linha de frente
34 O rei está nu, Bráulia Ribeiro
Missão integral
36 A formação de discípulos (parte 2)
René Padilla
Ética
48 Sobre a participação evangélica na
campanha eleitoral 2010, Paul Freston
Reflexão
52 Lausanne: o olhar de um veterano
Robinson Cavalcanti
54 Por um avivamento pentecostal
Ricardo Gondim
Redescobrindo a Palavra de Deus
56 O testemunho de Cristo enriquece
a vida, Valdir Steuernagel
História
60 A missão da igreja: um conceito
incompreendido, Alderi Souza de Matos
Ponto final
66 Anelos 2011, Rubem Amorese
22
26
28
29
8 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011
Sofrimento
Sempre leio Ultimato página por
página. Dessa vez, foi diferente. A foto
de capa com o substantivo sofrimento
me levou direto à página 25. Vou
até arquivar o relato cronológico da
Segunda Guerra Mundial. Ele me faz
reconhecer os mesmos fatos. Eu era
cinco anos mais velho que o estimado
Elben e morava no interior do Rio
Grande do Sul, numa colônia alemã.
Minha mãe nasceu no Brasil e meu
pai imigrou para cá em 1881. Nasceu
na Lituânia e aqui se naturalizou russo.
Como família, não tivemos nenhuma
dificuldade. O delegado era um hóspede
constante em nossa casa. Ele não
nos considerava como pertencentes
ao “eixo”. Sem dúvida, a guerra foi a
causa de muitos sofrimentos. E qual é a
nossa situação hoje? Do ponto de vista
religioso, a confusão, o entrevero, os
desacertos são terríveis!
Helmuth Matschulat, Curitiba, PR
Fiquei tocada com o artigo sobre os
horrores da Segunda Guerra Mundial.
Embora não tão intensamente quanto o
autor, também convivi com os relatos e
noticiários da época, pelo rádio e pelos
comentários dos familiares. Por causa
do sobrenome alemão e porque meu
pai era assinante de revistas alemãs
e gerente da firma Carlos Hoepeke.
Lembro-me de policiais indo à nossa
casa, mandando queimar livros em
alemão, batendo nos móveis para ver
se havia algo suspeito. Vi lágrimas
de desconforto no olhar de meu pai,
cidadão honesto, cristão, com sangue
alemão nas veias. Justamente no ano
do término da guerra, Walter Hoeschl
faleceu em consequência de um
acidente, aos 58 anos. Eu tinha 12.
Carmen Hoeschl, São Paulo, SP
Nunca devemos nos esquecer da morte
ou assassinato de 6 milhões de judeus.
Também não podemos nos esquecer
que mais de 20 milhões de soviéticos
militares e civis morreram no mesmo
período. No último capítulo de um
documentário sobre a Segunda Guerra
Mundial (Remember!), vi que 20 milhões
de soviéticos, 5 milhões de alemães,
1,6 milhão de japoneses, 1,2 ou 1,3 de
iugoslávios (sérvios em sua maioria),
quase 400 mil ingleses e quase 300 mil
americanos perderam a vida.
George Kling, Viçosa, MG
Cartas
Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 9
questão, a imagem faria sentido. Porém,
como não é o caso, parece que legitima a
dominação masculina.
Clemir Fernandes, Rio de Janeiro, RJ
Coração, juventude e fé
Achei interessante e de
grande valor a matéria
de capa da edição
de setembro/
outubro de 2010.
Como jovem,
não pude
deixar de dar uma atenção
especial a essa matéria sobre a juventude
evangélica nos dias de hoje. Fiquei motivado
ao saber que muitos jovens tem assumido
liderança nas igrejas. A responsabilidade, o
compromisso, o comprometimento com as
coisas do reino de Deus é o melhor caminho
a se trilhar a fim de nos tornarmos cada vez
mais santos e separados.
Timóteo Santana, C. dos Goytacazes, RJ
Abraçando e reabrançando a
santidade do corpo e da mente
Quero fazer dois
comentários sobre
a edição de julho/
agosto de 2010.
O conteúdo da
carta de Patrícia
Neme, de Palmas
(“Cartas”), é absurdamente inaceitável.
Porém, é a posição dela e a revista tem
publicado, com respeito à liberdade de
opinião, o que os leitores pensam — isso
é bom. No entanto, nesse caso específico,
quando ele propõe um assassinato e
contraria frontalmente o ensino de Jesus
sobre o perdão, seria preciso fazer um
comentário abaixo, pois parece que ela está
legitimando algo antievangélico. Muito bonita
a arte de madeira que ilustra o artigo Sobre
a sexualidade cristã (p. 31). Mas ela sugere
abuso e controle do homem sobre a mulher.
Se o texto tratasse criticamente dessa
Viktor Frankl e anabatismo
Fiquei contente ao ver as enfáticas
informações sobre Viktor Frankl
publicadas na edição de novembro/
dezembro de 2010. Há anos venho
falando sobre esse homem e sua
posição com relação à psico-psiquiatria.
Sobre o artigo sobre anabatismo
(“Reflexão”), quero salientar que a
única coisa que dá sentido ao ato do
batismo é o seu significado. O modo
não importa: imersão, afusão, aspersão,
pouca água, muita água. O que importa
no batismo é o seu significado. E ele
varia nas igrejas. Quando a diferença
é secundária (sobre o modo, por
exemplo), não há necessidade de
se rebatizar. Quando o significado é
diferente, é preciso ministrar o batismo
bíblico. Há casos em que o batismo
está envolvido em superstições
semipagãs, para não dizer pagãs.
Odayr Olivetti, Águas do Prata, SP
10 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011
Como contribuição à matéria Igreja
e Juventude (Caderno Ultimato
Jovem, p. 22), é importante agregar
o Movimento de Clubes Bíblicos que
aconteceu no Rio de Janeiro nas
décadas de 70 e 80
e que celebrou 40
anos em novembro.
Deus operou de
maneira interessante
em diversos lugares
do Brasil, produzindo
um avivamento
na juventude que
impactou a igreja tanto
na evangelização
quanto na liturgia e que
produziu resultados
duradouros.
O movimento
brotou com o impacto que
os acampamentos do Palavra da
Vida produziram em jovens cariocas. O
nascimento efetivo, a identidade e os
contornos foram estabelecidos quando
um missionário afirmou publicamente não
acreditar em líderes com idade
inferior a 30 anos.
De alguma forma, Deus
usou essa declaração para
deflagrar um movimento
que geraria encontros
de jovens, nas noites
de sábado, em
diversos pontos
do Rio de
Janeiro (pelo
menos em sete
lugares), que
reuniam de trezentos
a quatrocentos jovens, e
que, uma vez por mês se agrupavam,
sempre no intuito de evangelizar. O incrível
foi a inexistência de uma liderança única
instituída e o florescimento de múltiplas
lideranças jovens emergentes, que hoje
operam nas mais variadas denominações,
sobretudo as históricas.
Milhares de conversões aconteceram,
centenas de vocações foram despertadas,
a liturgia e a música das igrejas foram
enriquecidas, projetos missionários
aconteceram, igrejas com novos perfis se
estabeleceram e o papel da juventude na
igreja foi reconhecido, apesar da resistência
presente em muitas lideranças eclesiásticas
denominacionais. Cerca de seiscentos
participantes deste movimento que vicejou
por uns 25 anos reuniram-se no dia 6 de
novembro para contar aos filhos o que Deus
fez por meio da juventude. Paul Pierson,
em uma de suas últimas visitas ao Rio de
Janeiro, ao analisar a história do movimento,
declarou: “Vocês experimentaram um
avivamento e não perceberam”.
Neander Kraul, Rio de Janeiro, RJ
Cartas
Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 11
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O sagrado e o secular
Parece-me que a igreja se tornou
demasiadamente secular. Na
cultura muçulmana, não se separa
secular e sagrado. Para eles tudo
é sagrado: o emprego, a roupa, a
família, a comida. Já para a cultura
ocidental, há coisas sagradas e
coisas seculares. Temos uma roupa
para ir à igreja e outra para ir a
festas ou sair com amigos. Temos
um comportamento ético na igreja e
outro não-ético no trabalho. Temos
uma docilidade e fraternidade
dentro das paredes do templo
e uma grosseria e má vontade
no santuário familiar. Será que
não percebemos o quanto temos
sido dominados pelos meios de
manipulação de massa?
Samantha Gramacho,
Rio de Janeiro, RJ
A teologia da confissão positiva
Lamentavelmente, a maioria dos
pregadores que está na mídia e nos
holofotes não tem pregado o evangelho
em sua pureza e inteireza. O tempo na
televisão é mais ocupado com mensagens
que giram em torno de curas, vitória
financeira e a teologia de confissão
positiva. Não se prega arrependimento,
conversão, segurança de salvação e a
volta do Senhor.
Eliamar Vidal, Nova Venência, ES
Errata
— No artigo Viktor Emil Frankl — o
salmista do século 20 (“Capa”, novembro/
dezembro de 2010, p. 27) diz-se que o
padre da Igreja Votiva de Viena e Freud
chamaram Viktor de ateu. Na verdade,
foi o padre quem chamou Freud e
Viktor de ateus.
12 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011
“Q ualquer criança que não é
repreendida pelos pais sobre seus
erros tende a crescer pouco civilizada. Se ela
tem uma tendência antissocial, não haverá
amarras para esse comportamento.
Martha Mendonça, editora-assistente de Época
“O orgulho científico entorpece a
mente dos pesquisadores, fazendo-os
desprezar aquilo que desconhecem.
Marcus Zulian Teixeira, pesquisador da
faculdade de medicina da USP
“Em casa, lugar de computador é na sala
ou no corredor. Jamais em quartos
isolados ou fechados.
Alexandre Hohagen, presidente do Google
para a América Latina
“A menina deveria compreender o
crescimento dos seios como uma
preparação para a maternidade, mas é
induzida a desejar seios grandes e “atraentes”.
Todas as mudanças projetadas por Deus
têm um sentido espiritual e eterno, mas, no
mundo, adquirem um sentido carnal e banal.
Tony Davidson Felício, biólogo
“Estive com Deus e com o Diabo e lutei.
Deus venceu, agarrei-me na melhor
mão e em nenhum momento duvidei de que
Deus iria me tirar daqui.
Mário Sepúlveda, um dos 33 mineiros
resgatados da Mina São José, no Chile
“A tempestade [entre pais e filhos
adolescentes] se alimenta
num mal-entendido fundamental: os
adolescentes menosprezam a experiência
dos adultos e os adultos menosprezam
a experiência dos adolescentes.
Contardo Calligaris, psicanalista
“S e a palavra de Deus estiver
somente na cabeça, não mudará
coisa alguma em sua vida, mas se ela
atingir o coração, sua vida nunca mais
será a mesma.
Henry Blackaby, autor de Holiness
“A religião cai no fundamentalismo
quando a relação entre a
verdade e liberdade não é vista
claramente; e isso é produzido quando
a ideologia política se converte em um
parasita da religião, utiliza a religião
para seu próprio projeto.
Cardeal Angelo Scola, patriarca de
Veneza em entrevista à rádio Vaticano
“Uma igreja que se empenha em
evangelizar sua comunidade sem
saturar seus esforços de oração é como
o piloto de corrida automobilística que
toma posição na linha de partida e
descobre que o tanque de combustível
não foi abastecido.
George Barna, presidente do Grupo de
Pesquisa Barna
”
”
”
”
”
”
”
”
FRASES
“T em autoridade quem a exerce ancorado em consistência moral,
intelectual, espiritual, técnica e humanista.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo, arcebispo de Belo Horizonte
“S into-me bem fazendo o
que faço. Essa questão de
aposentadoria não está na Bíblia.
Claro que nem sempre terei boa
disposição física, mas sempre serei
uma testemunha de Jesus. Enquanto
tiver fôlego, pregarei a todos a
salvação. Usarei minha boca para
pregar as boas novas.
Eddie Fox, diretor de evangelismo do
Conselho Metodista Mundial
”
”
”
ArquidiocesedeBeloHorizonte
www.outreach.com
“N ão conheço maior
crime do que matar
o que luta para nascer.
Henry Miller, escritor
americano, sobre o aborto
”
Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 13
Anúncio
14 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011
Arcebispo francês diz que
perversão e poder são as
entranhas da pedofilia
O
jornal Rumos, da
Associação dos
Padres Casados,
publicou uma entrevista com
Dom Albert Rouet, arcebis-
po de Poitiers, uma pequena
cidade na região centro-
oeste da França, e autor do
livro J’aimerais Vous Dire
(Eu gostaria de vos dizer),
publicado em 2009 (30 mil
exemplares vendidos). Vale a
pena transcrever algumas de
suas declarações:
•	Para que haja pedofi-
lia, são necessárias duas
condições: uma profunda
perversão e um poder. Isso
significa que qualquer sis-
tema fechado, idealizado,
sacralizado é um perigo.
•	Há algum tempo, a igreja
vem sendo atingida por
tempestades externas e
internas.
•	Temos um Papa que
é mais teórico do que
historiador. Ele pensa que,
quando um problema está
bem colocado, ele está
meio resolvido. Porém,
na vida não é bem assim:
a igreja tem dificuldade
em se situar no mundo
conturbado em que se
encontra hoje.
•	Duas coisas me
chocam na situação
atual da igreja. Hoje,
há certo congelamento
do discurso. O menor
questionamento da
exegese ou da mora-
lidade é considerado
blasfêmia. Questionar
deixou de ser uma
atitude natural, o que
é lamentável. Enquan-
to isso, reina na igreja
um clima doentio de
suspeita.
•	A igreja enfrenta um
centralismo romano,
que se apoia em uma
ampla rede de denún-
cias.
•	Reconheço que esta-
mos no fim de uma
época. Precisamos de
um cristianismo de
hábito e um cristianis-
mo de convicção.
•	Com as novas religiões
e a secularização, as
pessoas não estão dan-
do mais importância
ao sagrado. Na minha
diocese, por exemplo,
há setenta anos, havia
oitocentos sacerdotes;
hoje temos duzentos
(em 36 mil paróquias).
•	A pobreza da igreja é uma
provocação para abrir
novas portas. A igreja
deve se apoiar em seus
clérigos (bispos, padres e
diáconos) ou em seus ba-
tizados? Da minha parte,
acho que temos de confiar
nos leigos e parar de
trabalhar a partir de um
esquema medieval. É uma
mudança fundamental. É
um desafio.
•	O sacerdote deve ser o
animador de sua paróquia,
deve apoiar os batizados
para que eles se tornem
adultos na fé, formá-los,
evitar que eles se fechem
em si mesmos [...]. Se os
leigos continuarem a ser
crianças, menores, a igreja
não vai ter credibilidade.
•	Muitas vezes, é a nossa
maneira de falar que não
funciona. É preciso descer
da montanha e descer
para a planície, humilde-
mente.
•	É necessária uma imensa
misericórdia por este
mundo, em que milhões
de pessoas morrem de
fome. Cabe a nós melho-
rar o mundo e cabe a nós
nos tornamos amáveis!
+DO QUE NOTíCIAS
A
educadora religiosa
Isabel da Cunha Franco
se mostra preocupada
com a letra de alguns cânticos
que estão sendo entoados hoje,
tais como: “Bendito serei”,
“Transbordarei, prosperarei” e
“Somos mais que vencedores”:
“Quando tais músicas predo-
minam, mesmo sem perceber,
vamos trocando o culto que é
devido ao Senhor pelo louvor
ao ego”.
Isabel teme que esses cânti-
cos focados no “eu” tornem-se
instrumentos de autoajuda
e que os crentes absorvam
muitos valores da sociedade
atual em busca de sucesso e
vantagens.
Educadora
religiosa
chama
atenção
para o
perigo dos
cânticos de
autoajuda
Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 15
D
irigindo-se a
um grupo de
católicos reu-
nidos em Washington
em agosto de 2010, o
cardeal Tarcisio Berto-
ne, secretário de Estado
do Vaticano, declarou
que o Papa Bento 16
está convencido de que,
“diante dos ataques,
muitas vezes injustos
e infundados contra a
Igreja e seus líderes, a
resposta mais eficaz é
uma grande fidelidade
à Palavra de Deus, na
busca mais firme da
santidade e um maior
compromisso com a
caridade na verdade por
parte de todos os fiéis”.
Na mesma semana,
o arcebispo Velasio de
Paolis, presidente da
Prefeitura de Assuntos
Econômicos da Santa
Sé, num encontro rea-
lizado na Itália, tocou
outra vez na mesma
+DO QUE NOTíCIAS
Só a santidade
do clero pode
acabar com a
má fama da
igreja A
lém de não poder praticar
nem dar seu aval à con-
duta sexual adulterina e
à homossexual, o cristão precisa
aprender a arte da convivência
com aqueles que as praticam. Por
ter se comprometido espontane-
amente com Cristo ao se conver-
ter, o cristão é membro de uma
comunidade cristã e responsável
por seu comportamento e teste-
munho. Porém, ele não é retirado
do mundo, da sociedade no meio
da qual vive. Segundo Paulo, o
cristão não deve ficar separado
dos não-cristãos, que vivem a
seu bel-prazer. Para viverem
separados, os cristãos “teriam de
sair deste mundo” (1Co 5.10,
NTLH), atitude com a qual Jesus
não concorda. Na oração sacer-
dotal do Cenáculo, Jesus é claro:
“Não peço que os tires do mundo,
mas que os guardes do Maligno”
(Jo 17.15, NTLH). Retirado do
mundo, o cristão jamais seria “o
sal da terra” e “a luz do mundo”
(Mt 5.13-16).
Por uma questão de princípios,
se o cristão não se retira da socie-
dade, ele tem de aprender a con-
viver com seus contemporâneos e
vizinhos, sem se deixar influenciar
ou enredar por eles. Convivência
e conivência são coisas distintas:
convivência é viver com outra
pessoa; conivência é cumplicidade,
colaboração, conluio.
Não cabe ao cristão discrimi-
nar, desprezar, odiar, maltratar,
humilhar ou apedrejar o homos-
Homofobia: não
cabe ao cristão
discriminar
tecla: “A infidelidade do
clero e a perda da identi-
dade cristã representam
perigos maiores do que
as perseguições”.
Na mesma linha e
na mesma ocasião, o
arcebispo do Rio de
Janeiro, Dom Orani
João Tempesta, disse que
“a mais sublime missão
dos sacerdotes hoje é,
sem dúvida, ser um
Cristo agora, pois Jesus
é o mesmo ontem, hoje
e sempre”. Ele expli-
cou que o sacerdócio
ministerial é entrega, é
imolação, é doar-se inte-
gralmente, é cruz. Tomar
a cruz significa compro-
meter-se para derrotar
o pecado que impede o
caminho rumo a Deus,
acolher cotidianamente
a vontade do Senhor,
aumentar a fé, sobretudo
diante dos problemas,
das dificuldades, do
sofrimento”.
sexual ou a lésbica, em uma
sociedade em que há muitos
outros desvios, como a injusti-
ça, a avareza, o consumismo, a
hipocrisia, a idolatria, o ódio, a
vingança, a arrogância, a frivoli-
dade e assim por diante. Cabe ao
cristão conviver com todas essas
pessoas, com temor e tremor, sem
espírito de superioridade, repro-
vando todas essas coisas mais pela
conduta do que pelas palavras.
O ensino de Paulo tem um
valor imenso se o contexto for
considerado. Não há concessão
alguma ao desregramento sexual.
No mesmo capítulo, o apósto-
lo é enfaticamente contrário à
presença de certo indivíduo da
comunidade cristã de Corinto
que estava tendo relações com a
mulher de seu pai (já morto ou
não), provavelmente sua madras-
ta. Ele deveria ser temporaria-
mente afastado dos privilégios
da comunidade, até que sua
natureza carnal fosse suplantada
pela nova natureza (1Co 5.1-5).
No capítulo seguinte, Paulo
recorda que entre os membros
fundadores da comunidade cristã
havia ex-homossexuais ativos e
ex-homossexuais passivos, bem
como muitos outros ex-isto-e-
aquilo (1Co 6.9-11).
Na comunidade, o critério se-
ria um; na sociedade, seria outro.
Não se pode exigir que o não-
cristão se comporte como cristão,
mas é lícito exigir que o cristão se
comporte como cristão.
16 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011
NÚMEROS
160.000
visitas a sites pornográficos são
bloqueadas por hora para proteger as
crianças.
36,4
é a taxa de homicídios para cada 100
mil habitantes no estado de Alagoas. É a
maior taxa do país, que em 2007 era de
25.
23.000
cirurgias gástricas (para diminuir o peso
de pessoas excessivamente obesas)
são realizadas a cada ano no Brasil (nos
Estados Unidos foram realizadas quase
7,5 vezes mais).
150.000.000
de chineses pertencem à classe A (no
Brasil, a renda familiar média dessa
classe é de 14.550 reais). O número
poderá ser quatro vezes maior em 2025.
25.000
quilos de carne se perderam em apenas
dois dias só no frigorífico de Viamão,
RS, por causa da interrupção de energia
elétrica.
53
mulheres estão condenadas à morte nos
Estados Unidos.
19.500
professores da rede estadual de
São Paulo foram momentaneamente
afastados por problemas emocionais
entre janeiro e julho de 2010 (92 licenças
por dia). O número representa quase 10%
de todos os 220 mil professores.
+DO QUE NOTíCIAS
Pastores de almas têm de
animar seus rebanhos
D
ois mil anos antes de o arce-
bispo católico francês Albert
Rouet dizer que os pastores
deveriam ser os animadores de suas
igrejas, os líderes da igreja primitiva
já faziam isso.
De volta a Antioquia, depois da
bem-sucedida primeira viagem mis-
sionária, Paulo e Barnabé passaram
outra vez pelas cidades de Listra, Icô-
nico e Antioquia de Psídia, para ani-
mar os recém-convertidos. Eles “lhes
davam coragem para ficarem firmes
na fé” (At 14.22, NTLH). No início
da segunda viagem missionária, Pau-
lo e Silas atravessaram “a província da
Síria e a região da Cilícia, dando for-
ça às igrejas” (At 15.41, NTLH). Ao
saírem da cidade de Filipos, a mesma
dupla se dirigiu à casa de Lídia, onde
se encontraram com outros crentes
novos e só foram embora para Tes-
salônica depois de animarem a todos
(At 16.40, NTLH). O livro de
Atos dá muita ênfase à arte de
animar. Além das passagens ci-
tadas, diz-se que Paulo atraves-
sou as regiões da Macedônia e
da Acaia “animando muito com
as suas mensagens os cristãos”
(At 20.2, NTLH). Lembra também
que os cristãos de Éfeso animaram
Apolo, o pregador egípcio, e este,
por sua vez, “ajudou muito” os
recém-convertidos de Corinto (At
18.27-28, NTLH). A ressurreição do
jovem que cochilou e caiu da janela
enquanto Paulo pregava deixou os
cristãos de Trôade “muito animados”
(At 20.12, NTLH).
Vale a pena lembrar que os apóstolos
deram àquele levita nascido na ilha de
Chipre o nome de Barnabé, que quer
dizer “aquele que dá ânimo” (At 4.37,
NTLH). Esse homem tinha o precioso
dom de animar os outros. Foi ele que
deu total apoio ao jovem Saulo, o voraz
perseguidor da igreja convertido em
Damasco (At 9.27, 11.25). E que deu
a João Marcos a oportunidade de voltar
ao campo missionário (At 15.37-39).
Os apóstolos animavam os cristãos
por meio de contatos pessoais e de suas
muitas Epístolas, tanto as canônicas,
como as demais, como se pode ver nos
seguintes versículos:
“Estejam alertas, fiquem firmes
na fé, sejam corajosos, sejam fortes”
(1Co 16.13, NTLH).
“Peço a Deus que, da riqueza da sua
glória, ele, por meio do seu Espírito, dê
a vocês poder para que sejam espiritual-
mente fortes” (Ef 3.16, NTLH).
“Para terminar: tornem-se cada vez
mais fortes, vivendo unidos com o Se-
nhor e recebendo a força do seu grande
poder” (Ef 6.10, NTLH).
Pedimos a Deus que vocês se
tornem fortes com toda a força que
vem do glorioso poder dele, para que
possam suportar tudo com paciência”
(Cl 1.11, NTLH).
“Sejam também pacientes e forta-
leçam o seu coração, pois a vinda do
Senhor está próxima” (Tg 5.8, NVI).
Talvez fosse melhor ordenar como
pastores de almas apenas os Barnabés da
vida — aqueles que querem, que sabem,
que podem e que se dispõem a dar
contínuo ânimo às ovelhas!
Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 17
18 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011
NOTíCIAS
Cristãos
começam a se
mobilizar para a
Copa 2014
Muitos cristãos já estão planejando ações
para o período da Copa do Mundo
de Futebol em 2014, quando os olhos
do mundo todo estarão voltados para
o Brasil. A Rede Evangélica Nacional
de Ação Social,
Visão Mundial,
Makanudos,
Exército de
Salvação e outras
organizações
querem aproveitar
o campeonato
mundial e realizar
campanhas nas
cidades-sede
contra o turismo
sexual de crianças
e adolescentes.
“Queremos
mostrar ao
mundo não somente os cartões postais,
mas também a realidade de nossas
crianças”, dizem os organizadores. Entre
as atividades planejadas, estão passeatas
para mostrar a situação de exploração
sexual das crianças no país.
Vaticano cria
órgão para
evangelizar
batizados
A Igreja Católica criou um novo
departamento para evangelizar os já
batizados. O Conselho Pontifício para
a Promoção da Nova Evangelização,
criado em outubro de 2010, será
responsável por encontrar formas
adequadas de evangelização dos
Outra iniciativa está sendo
liderada pelo ministério Amme
Evangelizar. Com o foco na
evangelização, eles querem
“ajudar as igrejas a evangelizar
todo mundo”. Para o presidente
da Amme, José Bernardo, “os
grandes eventos esportivos
costumam ser boas oportunidades
para a evangelização. Mais do
que isso, a Copa em 2014 e a
Olimpíada em 2016 são uma
responsabilidade
da igreja
evangélica
brasileira”.
Os dois grupos
já realizaram
reuniões de
trabalho em
2010 para definir
melhor o foco das
campanhas. O
trabalho deve se
intensificar neste
ano. A expectativa
é que igrejas
locais e outros
ministérios também comecem a
planejar ações para 2014 e 2016.
A previsão do Ministério do
Turismo é que o país receba cerca
de 600 mil turistas estrangeiros
durante a Copa do Mundo.
“muitos batizados que não
compreendem mais o sentido de
pertença à comunidade cristã”,
disse à agência Zenit o presidente
do conselho, Dom Rino Fisichella.
Um dos objetivos do órgão será a
promoção do estudo e da difusão
do Catecismo da Igreja Católica,
publicado em 1992. Dom
Fisichella promete se apropriar
de ferramentas mais atuais de
comunicação, entendendo que
estas “têm o leme da cultura e da
mentalidade no contexto atual”.
Campanha
comemora o
Dia Mundial do
Banheiro
Uma campanha inusitada pretende
sensibilizar o primeiro-ministro do Reino
Unido, David Cameron, para o problema
da falta de saneamento básico nos países
pobres. A organização cristã Tearfund e
a instituição de assistência social Cord
lideram o Dia Mundial do Banheiro (19
de novembro). A campanha encoraja
a população a enviar mensagens por
e-mail ao primeiro-ministro pedindo
que ele doe ofertas para a construção de
banheiros em Burundi, um pequeno e
pobre país africano devastado pela guerra
civil. A frase principal da campanha é
provocativa: “David Cameron sabe tudo
sobre a importância de ter uma moradia
segura, mas e sobre ter um banheiro
decente?”. Segundo os organizadores,
com o apoio público de Cameron, a
campanha pode chegar aos ouvidos dos
mais poderosos.
A campanha de arrecadação de
fundos para a construção de banheiros
em Burundi foi lançada em 2008 e já
beneficiou 9 mil pessoas. O doador faz
a doação, que é destinada à construção
de banheiros seguros e higiênicos, além
de facilitar o acesso à água potável e o
desenvolvimento de ações de educação
e higiene. Em troca, ele recebe um
certificado e uma foto do novo banheiro
construído com sua ajuda.
Segundo dados da campanha, uma
em cada três pessoas ainda não tem
acesso a um banheiro decente. Doenças
associadas a falta de saneamento e água
poluída matam por dia 5 mil crianças
menores de 5 anos. “Como uma igreja
global, precisamos falar sobre essa
injustiça que mantém as pessoas na
pobreza”, diz o texto de divulgação
da campanha. Mais informações:
www.tearfund.org.
por Lissânder Dias
Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 19
Brasil perde
dois tradutores
da Bíblia
O mineiro Josué Xavier e o
paulista Werner Kaschel. Os
nomes desses estudiosos não são
conhecidos nas igrejas, mas o
trabalho que
realizaram
faz diferença
sempre que
abrimos a
Bíblia. Eles
ajudaram a
traduzir a
Bíblia Nova
Tradução na
Linguagem
de Hoje,
publicada pela
Sociedade Bíblica do Brasil (SBB),
e assim aproximar o conteúdo
das Escrituras Sagradas da língua
falada pela população brasileira.
Ambos morreram em 2010:
Josué, em 31 de março, aos
Congresso
Brasileiro de
Missões vai discutir
relevância para o
mundo atual
“A Missão Transformadora diante da
Realidade Mundial”. Esse foi o tema
escolhido para o próximo Congresso
Brasileiro de Missões (CBM), que acontece
entre 10 e 14 de outubro de 2011. Será a
sexta edição do maior congresso evangélico
de missões do país.
O aumento da globalização, da crise
financeira global e da perseguição religiosa
estão entre os desafios atuais considerados
mais importantes pela coordenação do
Mais de 1 milhão
de crianças
nasceram fora do
casamento nos
Estados Unidos
Em 2008, nasceram nos Estados Unidos,
fora do casamento, 1,72 milhão de crianças.
Os dados são do Departamento do
Censo dos Estados Unidos, que divulgou
a pesquisa “Casamento: a melhor arma
americana contra a pobreza infantil”, em
setembro de 2010. Segundo o censo, 75%
das mães de crianças nascidas fora do
casamento eram mulheres adultas jovens
entre 19 e 29 anos.
Outros números do censo revelaram
ainda que o índice de pobreza para os
progenitores solteiros com filhos em 2008
no país era de 36,5% (este número ficou em
6,4% entre casais casados que têm filhos).
O autor da pesquisa, Robert Rector, acha
que “o casamento continua sendo a arma
mais forte contra a pobreza na América do
Norte; ainda assim, continua diminuindo”.
evento. Outras questões prioritárias
são a desigualdade entre pobres
e ricos, a propagação da aids e o
aumento do número de crianças em
vulnerabilidade social. O congresso
pretende também discutir a
situação dos chamados “povos não-
alcançados”, ou seja, sem presença
cristã.
Segundo Silas Tostes, presidente
da Associação de Missões
75 anos; e Werner, em 8 de
novembro, aos 85. Ambos
eram também pastores: Josué,
presbiteriano, e Werner,
batista. Especialista em Antigo
Testamento, tradutor de hebraico e
revisor de língua portuguesa, Josué
trabalhou na SBB durante 27
anos — de 1980 a 2007. Werner
era doutor
em teologia
e especialista
em hebraico.
Ele traduziu
todos os
livros do
Antigo
Testamento.
Em sua
última
entrevista,
em julho
de 2010, à revista A Bíblia Hoje,
Werner defendeu a causa de toda a
sua vida: “A Palavra de Deus deve
ser compreendida por todos. E
isso inclui ricos, pobres, cultos e
incultos”.
ArquivoSBB
ArquivoSBB
O mineiro Xavier (dir.) e o paulista
Werner (esq.): tradutores da Bíblia
Transculturais Brasileiras (AMTB)
e coordenador do congresso, “o 6º
CBM pertence a um contexto maior
de despertamento missionário;
porém, o seu contexto histórico
próximo nos levou a considerar
como poderemos ser relevantes
à luz dos grandes desafios atuais.
Assim, após oração, reflexão e muito
diálogo, nos pareceu bem definir
que esse fosse o tema do congresso”.
20 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011
Especial
ultimato.com.br
um novo ponto de encontro
Q
uarta-feira é quase
dia santo para alguns
marmanjos que bem
ou mal conheço na
minha cidade. Todos,
obrigatoriamente, acima dos 40 anos.
Outro dia, antes de acender os refletores
do nosso templo — de grama acinzentada
pela seca insistente —, entre uma e outra
gargalhada, alguém confessa: “Hoje, tomei
dois comprimidos de Tandrilax, um pela
manhã e outro à tarde. E os dois estavam
vencidos. Mas estou ótimo”...
Claro, qualquer produto fora do
prazo de validade é um risco. Uma
curiosidade prosaica é saber exatamente o
que acontece “naquele dia” cuja validade
termina. A curiosidade faz sentido,
especialmente em relação às datas que
marcaram a história. O que aconteceu
antes e o que aconteceu depois fazem
parte da história tanto quanto “o” dia
apontado no calendário. E é assim que
celebramos e anunciamos o nosso novo
site, chamado carinhosamente de Portal
Ultimato.
Na web, mudar parece um verbo mais
do que perfeito. Em 1997, publicamos
as primeiras cartas à redação da revista
Ultimato recebidas por e-mail. Em 2001,
os leitores foram às compras na nossa
primeira loja virtual. Desde então, várias
mudanças, algumas visíveis, outras nem
tanto. Em abril de 2010, inauguramos a
nossa porção blogueira. Além dos vários
hotsites a cada lançamento da editora, do
Blog da Ultimato — blog editorial — e
do Paralelo 10 — blog do nosso projeto
para o fortalecimento de lideranças do
Norte e Nordeste do Brasil —, alargamos
a nossa tenda. Ultimato passou a abrigar
por Marcos Bontempo
blogs de colunistas, autores, ministérios
em diferentes áreas da missão integral,
além de outros escribas de plantão.
O portal é, na verdade, um ponto de
encontro. E, como aconteceu em 2008,
quando celebramos 40 anos no nosso
Encontro de Amigos, descobrimos que
Ultimato não é um, mas muitos. Talvez,
de modo mais prático e adequado aos
tempos modernos, o novo site apresenta
ao leitor aquilo que repetimos ao longo
dos anos: “Ao lado de muitos outros,
[Ultimato] participa da proclamação
da boa nova que nunca fica velha, da
esperança que nunca morre e de um
Salvador que nunca muda”.
Na primeira “página” do portal é
possível perceber a mudança. Uma nova
divisão e organização do conteúdo torna
mais fácil para o leitor saber onde e o quê
quer encontrar. Quatro grandes espaços
— ultimatoonline, revista, editora e
loja virtual —, em cores diferentes,
acompanham o leitor. Mais limpo, de
fácil navegação e com mais conteúdo,
o portal oferece também um sistema de
participação dos leitores e publicação
de textos sem complicações, com regras
claras, mais espaço para comentários e
ainda a possibilidade de réplicas a artigos
publicados. São contados aos milhares.
Numa época em que palavras,
imagens e holofotes viram bytes num
piscar de olhos, o velho e bom John
Stott dá-nos um critério nada comercial,
especialmente quando o assunto é
blog: “Se você quer mostrar, esconda;
se você quer esconder, mostre”. Nosso
desafio é juntar a sugestão do escritor
inglês à velha declaração de João Batista:
“Convém que ele cresça e eu diminua”
(Jo 3.30).
Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 21
22 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011
Uma igreja desunida é uma igreja
com pouca relevância, que não
sente profundamente a dor do
outro, não enxerga as chagas
do próximo. Seu ensino sobre
a vida parece frio e superficial,
porque seu olhar é fechado em si
mesmo. Essa verdade é relevante
tanto para as igrejas locais — que
precisam desenvolver ações em
parceria que proclamem com
mais consistência o evangelho da
reconciliação —, quanto para a
chamada “igreja global” — que
precisa, por exemplo, olhar com
mais compaixão para os cristãos
que vivem em contextos de
evidente perseguição religiosa.
Lausanne 3 dedicou o último
dia à temática “parcerias”.
Porém, foi nos momentos mais
espontâneos, como as discussões
1
nas mesas e as conversas nos corredores,
que o tema da unidade da igreja foi
visto, não como uma simples questão
de estratégia, de firmar parcerias,
mas como uma expressão da riqueza
teológica do trabalho em conjunto e
da união em Cristo. Nesses espaços, a
unidade foi vista como um verdadeiro
anseio dos presentes e como o elo que
pode ligar os grandes desafios da igreja.
Mas por que é tão difícil manter a
unidade? Lausanne 3 não respondeu a
essa pergunta; porém, nos deu algumas
pistas. Como diz Vaughan Roberts, “a
unidade de Cristo não pode ser criada,
é uma ação do Espírito. Por meio da
verdade do evangelho, do Espírito,
somos o Corpo de Cristo. Deus
pede que vivamos de maneira digna
da vocação a que fomos chamados.
As divisões não são por diferenças
teológicas, mas por orgulho”. Outra
pista foi dada pelo teólogo Ronald
Sider em uma conversa informal: “O
que eu gostaria de ver como resultado
deste congresso é um equilíbrio maior
de cooperação financeira entre todos
nós”.
Ao olharmos para a igreja brasileira,
a necessidade de unidade parece
ainda mais gritante. Alguns brasileiros
afirmaram que a comitiva nacional foi
uma amostra do que é a igreja: alegre
e numerosa, mas pouco organizada e
meio sem rumo (cerca de cem brasileiros
participaram do congresso). Ao refletir
sobre a crise de liderança cristã no país,
Robinson Cavalcanti norteou o caminho:
“Precisamos de um choque de humildade”.
Não podemos considerar a questão
da unidade cristã sem refletir sobre o
papel dos nossos líderes. Sendo assim, o
conselho do “choque de humildade” é um
passo igualmente relevante para termos
uma igreja mais unida. Não é à toa que
no penúltimo dia, dedicado ao tema
“integridade”, o britânico Chris Wright
exortou os presentes a um autoexame
sincero diante das idolatrias atuais: o poder
(orgulho), a popularidade (sucesso) e a
prosperidade (ganância). “Precisamos de
um retorno radical ao Senhor. Precisamos
ouvir a voz dos profetas, dos apóstolos e de
Jesus Cristo. Quem precisa se arrepender
primeiro não são os de fora, mas os de
dentro.”
Não dá para cumprir o
chamado missionário
sem o árduo esforço
da unidade
Cinco lições de Lau
O 3º Congresso Lausanne
de Evangelização Mundial –
CapeTown 2010, mais
conhecido como Lausanne 3,
foi inesquecível em muitos
aspectos. Quem esteve lá
não pode fazer uma análise
fria, sem emoção. Era uma
parte significativa da Igreja de
Cristo, celebrando a comunhão
e louvando ao Deus que dá
sentido à vida.
LAUSANNE 3
Lições e desafios
		 para a Igreja de Cristo
Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 23
Assim como um náufrago
precisa de terra firme,
é ingênuo achar que
nossa geração não precisa
de — e não clama
por — referências claras
e absolutas. No entanto,
em um mundo relativista,
pluralista e indiferente
a questões dogmáticas,
como defender a verdade
única do evangelho
sem perder a dimensão
pessoal, amorosa e
humilde daquele que é
a própria verdade, Jesus
Cristo?
Lausanne 3 foi
ousado ao nos provocar
com esse tema logo no
primeiro dia, diante
de um cenário tão
2
A verdade é
importante e não
anda sozinha
diversificado e do risco concreto
de ressuscitar fundamentalismos e
simplismos. As primeiras palavras
do escritor Os Guinness foram
fortes: “Oro para que não haja
dúvidas de que a verdade é uma
questão fundamental e decisiva
para este congresso e para nós,
como evangélicos. A verdade não
é essencialmente uma questão
filosófica, mas teológica. Deus é
verdade, o seu Espírito é o Espírito
da verdade; sua Palavra é verdade,
nossa fé é verdade, e, a menos que
sejamos seguros e firmes quanto
à verdade, este congresso pode
terminar agora”.
À medida que o congresso
acontecia, o clamor por clareza na
defesa da verdade (com referências
seguras e norteadoras) foi sendo
entendido também como a
necessidade de uma verdade
integradora, que reúna histórias
de vida e esforço acadêmico. Daí
a agradável surpresa de ouvir
tantos testemunhos de pessoas
simples de diversos lugares do
mundo. As histórias de vida
são tão importantes quanto as
dissertações acadêmicas. Não que
uma substitua a outra, mas elas
podem se fortalecer mutuamente.
Uma história de vida pode
resgatar o academicismo de
gabinete, sem amor e sem dor. A
teologia pode dar luz às histórias
de vida, trazendo-lhes um sentido
histórico. Tudo isso, no entanto,
não excluiu a justa crítica de
alguns intelectuais brasileiros de
que faltou profundidade e tempo
para as discussões acadêmicas.
Por último, é importante
assumir o desafio de refletir
sobre a unidade à luz da verdade
(e vice-versa). Mais do que
defender uma ou outra com
unhas e dentes, a igreja cristã
precisa dispor-se a fazer sérias
reflexões sobre como conjugá-las
harmoniosamente. Uma precisa
da outra. Assim o evangelho
será compreendido e digno de
confiança e também amado e
seguido.
usanne 3
Eram histórias verdadeiras de cristãos e cristãs que
estão na linha de frente em lugares extremamente difíceis,
enfrentando o sofrimento e a morte, lutando contra a
injustiça, levando esperança e o evangelho de Jesus Cristo.
Fomos agraciados por momentos especiais, como
quando a comissão brasileira pediu perdão aos líderes
africanos pela dor da escravidão infligida ao seu povo. Em
meio a lágrimas, tivemos a certeza de que Deus havia nos
dado um presente inesperado. Ou quando uma norte-
coreana de 18 anos contou sua história de fé e de como
seu pai foi morto por anunciar essa mesma fé. O foco
cristocêntrico, a valorização da história e a beleza litúrgica
do culto de encerramento superaram nossas expectativas.
Lausanne 3 é inesquecível porque se propõe a ser um
movimento global duradouro, o que não é fácil. Enquanto
as estatísticas mostram que a igreja cristã cresce, as
dificuldades não diminuem. As pressões do mundo
pós-moderno, as diversas faces da igreja em cada
continente, o acirramento da perseguição religiosa, a
complexidade da “tarefa inacabada”, as desigualdades
sociais e de gênero e principalmente os próprios
pecados da igreja cristã são desafios complexos e
arriscados.
A Igreja Cristã pode se beneficiar desse movimento,
que naturalmente não representa integralmente o Corpo
de Cristo. A multiforme sabedoria de Deus vai além. O
Espírito Santo sopra aonde quer. Ultimato reconhece
a importância do Movimento Lausanne e, nas páginas
seguintes, quer aproximar a igreja espalhada neste
mundo e chamar a igreja brasileira a participar.
por Lissânder Dias
Capa
24 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011
3
4
A igreja é global e as
antigas categorias para
delimitá-la precisam
ser atualizadas à luz
da globalização
O fenômeno da globalização
ficou evidente em vários
aspectos do congresso.
O evento foi mundial;
a tecnologia permitiu
que 100 mil pessoas o
acompanhassem pela
internet. Ouvimos
experiências de igrejas
europeias que já não são
tão homogêneas, mas
têm nos bancos gente de
diversas nacionalidades
e provenientes de países
pobres. Além desses aspectos,
Lausanne 3 nos ajudou a
pensar que a igreja cristã
Esses dois recursos nos
renovam quando as
circunstâncias exigem algo
mais do que argumentos
humanos. São fonte de poder,
de arrependimento, de amor
e de sabedoria; são canais da
obra do Espírito Santo no
espírito humano. Abandonar
essas duas práticas ou deixá-las
em segundo plano é perder-se
na caminhada. Dois momentos
no congresso foram simbólicos
quanto a isso:
•	 Perdão regado a oração —
no último dia a comissão
brasileira, liderada pelo
pastor Key Yuasa, tomou
não pode mais ser desenhada
simplesmente em termos
geográficos. Como lembra o
pastor e cientista social Orivaldo
Pimentel, “não se pode pensar a
igreja com as mesmas categorias
de antes. Não mais em termos
de Norte, Sul, Leste e Oeste,
mas sim da presença global num
mundo globalizado”. Isso exige
de nós novas formas de pensar
a presença da igreja. O que
significa ser uma comunidade
global, mas que constrói a
identidade localmente? Como
devemos comunicar o evangelho
nesse contexto? Como deve ser
o nosso testemunho? Quais as
oportunidades de serviço? Os
efeitos desse fenômeno devem ser
analisados a longo prazo, já que
eles não são tão óbvios quanto
seus sintomas.
Outra dimensão importante
da globalização, lembrada mais
claramente pelos teólogos
René Padilla e Samuel
Escobar no quarto dia do
congresso, é a econômica.
Padilla considerou a pobreza
gerada pela globalização
como um dos grandes
desafios da igreja e achou
que o assunto foi pouco
abordado por Lausanne 3.
Ele já havia aprofundado a
mesma ideia no artigo From
Lausanne 1 to Lausanne 3,
publicado no Journal of Latin
American Theology, a revista
da Fraternidade Teológica
Latino-Americana, distribuída
durante o evento. “Cristãos
conscientes não podem
ignorar a extrema pobreza de
milhões de pessoas, gerada
pelo atual sistema econômico
global controlado, em grande
medida, por uma classe
corrupta transnacional.”
O texto bíblico
e a oração
são riquezas
incalculáveis
a iniciativa de escrever uma carta
pedindo perdão à igreja africana
pela triste história de escravidão
no Brasil. Um dos momentos
mais emocionantes foi quando,
após a leitura da carta, durante
a reunião regional da África, os
líderes africanos pediram ao grupo
de sete brasileiros que representava
a comissão que ficassem de
joelhos. Em meio a lágrimas,
os irmãos da África oraram
longamente anunciando o perdão
aos brasileiros; enquanto oravam,
lembravam o sofrimento vivido
por mulheres e filhos, sem maridos
e pais, que foram trazidos cativos
para o Brasil. Espontaneamente,
um grupo de africanos foi até a
reunião da comissão brasileira e
orou novamente por nós. Nada
poderia traduzir melhor e reunir
os sentimentos de todos do que a
oração. O perdão foi regado pela
beleza da oração.
•	 Estudos bíblicos indutivos —
todas as manhãs, nos reuníamos
em grupos de sete pessoas e
estudávamos juntos a carta de
Paulo aos Efésios. Por diversas
vezes, nos vimos desarmados
pela riqueza da Palavra de Deus.
Apesar do pouco tempo, cada
momento de estudo indutivo
nos fazia assumir novamente
a responsabilidade para com
o evangelho e o mundo, e nos
permitia conhecer histórias
de irmãos de diversos países.
Experimentamos uma unidade
misteriosa, movida pela Palavra,
baseada nos relacionamentos,
que gera alegria, respeito e
amor pelo outro. Como disse
o teólogo Samuel Escobar,
“foi o momento mais rico do
congresso”.
O texto bíblico e a oração
são pilares para a compreensão
orgânica da igreja de Cristo.
Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 25
Capa
Quando era missionário na Índia,
o inglês William Carey planejou
realizar um congresso missionário
internacional na Cidade do Cabo,
na África do Sul, no ano de 1810.
Foi obrigado a desistir por razões
óbvias: os participantes da Europa e
da América do Norte gastariam meses
só nas viagens marítimas de ida e volta
ao lugar da conferência, no extremo
sul do continente africano. Ele mesmo
levaria várias semanas para descer
todo o Oceano Índico, de Calcutá
à Cidade do Cabo. Carey, a esposa,
grávida, e os três filhos embarcaram
no navio dinamarquês Körn Princess
da Inglaterra para a Índia no dia 13 de
junho de 1792. A família só chegou
ao destino cinco meses depois, no dia
11 de novembro.
Carey não sonhou em vão; a
conferência foi apenas “adiada”.
Os jovens são
a grande força
missionária
5
Coragem, idealismo,
paixão por Cristo e pelas
pessoas — esses são os
recursos necessários para
a mudança de geração, sem perder
a herança histórica. Valorizar e
reconhecer a juventude nos ajuda a
celebrar o Corpo de Cristo, de tantas
idades, e a discernir melhor as muitas
faces e a velocidade do nosso tempo.
Além disso, por sua grandiosidade
e relevância, Lausanne 3 não pode ser
assimilado a curto prazo. Os jovens
são personagens fundamentais para
Sonho de 1810
só se concretiza
em 2010
Ela se realizou em outubro de
2010, na Cidade do Cabo, 200
anos depois de planejada. Foi
o 3º Congresso Lausanne de
Evangelização Mundial.
William Carey, batista,
chamado de “pai das missões
modernas”, era um superdotado
com referência a idiomas: ele
conhecia os idiomas originais da
Bíblia (hebraico e grego), latim,
italiano, francês, holandês e pelo
menos três idiomas orientais
(bengali, sânscrito e marathi).
Graças a esse dom, traduziu a
Bíblia toda para dois idiomas
indianos. Ele dedicou à Índia
42 dos seus 73 anos de vida.
Nunca voltou à Inglaterra, nem
para tirar férias, nem para se
aposentar. Ficou viúvo duas vezes
e casou-se três.
que as mais significativas mudanças
aconteçam dentro e fora da igreja
de Cristo. Não é à toa que 40% dos
participantes eram pessoas com idade
entre 20 e 40 anos. O esforço dos
organizadores para que houvesse, de
fato, uma representatividade de jovens
líderes reforça a esperança de que o
evangelho continuará sendo anunciado
em todos os lugares, sem deixar
de enfrentar as principais questões
contemporâneas.
Ao mesmo tempo, essa evidência
aumenta a responsabilidade dos mais
velhos. É preciso apoiar e pastorear
nossos jovens nos mais desafiadores
contextos: nas periferias das grandes
cidades, nas igrejas, nas escolas,
nas universidades e outros lugares.
Juntos, jovens e velhos precisam
caminhar em alegria e em confiança.
Enquanto os jovens devem honrar a
sabedoria dos mais velhos, estes devem
permitir que aqueles liderem projetos
e comunidades até então sob suas
responsabilidades.
TheLausanneMovement
Jovens e velhos no plenário de Lausanne: juntos
eles precisam caminhar com alegria e em confiança
26 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011
Novas geografias,
D
oug Birdsall, presidente
executivo do Movimento
Lausanne, estava certo
quando afirmou que o 3º
Congresso de Evangelização Mundial
foi a “assembleia evangélica global
mais representativa da história”. Além
dos mais de 4 mil participantes de
198 nações presentes em Cape Town,
o congresso foi assistido por cerca de
100 mil expectadores a partir de quase
setecentos sites que retransmitiram o
evento em 96 países.
Lausanne 3 marcou de vez a nova
geografia da igreja global. Nas últimas
décadas, o centro de gravidade do
cristianismo deslocou-se do Norte e
do Ocidente para o Sul e o Oriente
(África, América Latina e Ásia) e isso
foi visto e anunciado no congresso.
A escolha da África do Sul como
anfitriã foi uma forma de fazer jus a
essa mudança.
A primeira saudação no
manual entregue aos participantes
é assinada pelo arcebispo da
Igreja de Uganda, Henry Luke
Orombi: “Bem-vindos à África,
nossa terra-mãe, e a Cape Town, a
cidade-mãe”. Em outra mensagem,
publicada no informativo diário,
ele declara: “Em 1900, somente 9%
da população da África era cristã. Em
2000, chegou a 46%, com 360 milhões
de cristãos. Ao mesmo tempo, houve
um trágico declínio no número de
cristãos ativos e praticantes no mundo
ocidental”. Citando Philip Jenkins,
autor de A Próxima Cristandade,
Orombi acrescenta: “Até 2025, 50% da
população cristã estará na África e na
América Latina e outros 17% estarão
na Ásia. [...] Não somos mais apenas o
alvo dos missionários ocidentais. Somos
também os que enviam missionários
para o Ocidente”.
Se Cape Town 2010 reivindica
a representação da igreja global
evangélica, convém perguntar como
esse objetivo foi alcançado. Segundo
Tim Stafford (articulista do site
Christianity Today), quando Doug
Birdsall convidou o bispo metodista da
Malásia Hwa Yung para trabalhar com
ele no planejamento do congresso, este
perguntou: “Que tipo de conferência
você quer? Um congresso normal
dominado por líderes do velho Oeste
ou um que represente o que a igreja é
hoje?”.
Os 4 mil participantes foram
escolhidos por meio do seguinte
processo de seleção: o Movimento
Lausanne elegeu um comitê, que
incluía um representante de cada uma
das doze regiões globais. Esse comitê
escolheu um diretor para cada país
convidado (duzentos ao todo), que
deveria ser imparcial e representar toda
a igreja de seu país, e não apenas seus
amigos e companheiros de igreja. Para
montar a delegação de cada país, esse
diretor contou com a ajuda de um
comitê nacional.
A quantidade de representantes
dependia do número de cristãos
evangélicos em cada país, com base
principalmente nas estatísticas do
Operation World, um guia mundial
de oração (www.operationworld.
org). Os comitês de seleção deveriam
seguir estas orientações: concordância
com o Pacto de Lausanne (declaração
do primeiro congresso, em 1974),
equilíbrio em termos de igrejas, etnias
e gêneros, garantia da presença de
jovens (30%), de mulheres (o critério
era de 35%, mas a composição final
foi de 27%), e de delegados que
viessem do “mundo do trabalho”
— leigos que não tinham cargo
oficial na igreja ou missão (10%). O
resultado final não foi um perfeito
espelho da igreja evangélica, mas sem
dúvida o corpo mais representativo
da igreja evangélica já montado.
Lindsay Brown, diretor
internacional de Cape Town 2010,
comentou que o equilíbrio global
se refletiu também nas finanças.
Os duzentos delegados da China
(impossibilitados de participar
porque o governo chinês se recusou a
liberá-los) pagaram por todas as suas
despesas, além de contribuírem com
milhares de dólares para as despesas
de outros. A maioria dos delegados da
Índia pagou suas próprias despesas. Os
da Malásia fizeram o mesmo. “China e
Índia deram mais que a Europa”, disse
Brown. “Essa é a primeira vez que eu
vi esse tipo de liberalidade quanto aos
recursos financeiros.”
A representatividade desse novo
cenário foi vista na composição das
delegações: 70% dos participantes
eram da África, América Latina
Lausanne 3 foi
o corpo mais
representativo da
igreja evangélica
já montado
Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 27
por Klênia Fassoni
velhas desigualdades
e Ásia. Isso contrasta fortemente
com Lausanne 1, em que 70% dos
participantes eram do Ocidente, e com
os números da conferência missionária
mundial em Edimburgo, há um século.
Nesta, dos 1.200 delegados, quinhentos
eram dos Estados Unidos, quinhentos
da Grã- Bretanha, quatro da Ásia e
nenhum da África.
A composição dos palestrantes e
dos músicos também evidenciou essa
representatividade: dos 42 palestrantes
e mestres de cerimônia apresentados
no caderno do participante, treze
eram da África, onze da Ásia, oito da
Europa e sete dos Estados Unidos e
Canadá. Havia também um palestrante
da Oceania. A participação de apenas
dois latino-americanos foi um grave
senão. Os 33 músicos e cantores
encarregados da direção da adoração
provinham de quinze países
diferentes, de praticamente todos os
continentes.
A sugestão dada aos congressistas
(“você pode tomar café-da-manhã
com alguém da Ásia, passar o
intervalo com alguém da América
Latina, almoçar com um europeu e
chamar um intérprete para ajudá-lo
no jantar com alguém da Eurásia
ou do Pacífico Sul”) pode sugerir
que as tensões entre o Norte e o
Sul estariam resolvidas. Porém, não
é bem assim. Na apresentação do
programa para o sexto dia, cujo tema
era “formando parcerias no Corpo de
Cristo rumo ao novo equilíbrio global”,
os diretores do congresso reconhecem:
O centro de gravidade da igreja cristã
mudou do Norte para o Sudeste e Sul
(África, América Latina, Ásia). Nesses
continentes e entre suas diásporas vemos
grande fervor espiritual e engajamento
holístico, e bons exemplos de liderança
como à de Cristo-servo. Porém, o centro
da liderança organizacional, do controle
financeiro e das tomadas de decisão
tende a permanecer no Norte e no Oeste.
[...] [Isto] nega a verdade de que, no
Corpo de Cristo, todos nós precisamos
uns dos outros. O problema pode
surgir por ignorância, estruturas falhas,
independência e acúmulo de poder
regional.
Um multiplex e algumas sessões
de diálogo abordaram esse tema. Um
dos palestrantes citou a estatística da
ONU de que os cristãos doam, em
média, 2% para missões e estimulou
os participantes a imaginarem o que
aconteceria se aumentassem para 3 ou
4%. Incentivou-os a pensar no Espírito
Santo como inspirador das doações.
Ele e outros insistiram que os temas
mordomia e parcerias devem ser tratados
juntos.
Richard Stearns, presidente da Visão
Mundial nos Estados Unidos e autor de
A Grande Lacuna (Editora Garimpo),
afirmou que o Ocidente abraçou
uma visão fraca e unidimensional do
evangelho. “É um evangelho que
protege o status quo injusto, que não
exige nada do rico, no qual falta poder
para mudar o mundo ou ganhá-lo para
Cristo”.
O teólogo latino-americano René
Padilla, uma semana após o congresso,
lamentou:
Tristemente, o maior obstáculo
para implementar uma verdadeira
parceria na missão é a riqueza do
Norte e do Ocidente; a riqueza que
Jonathan Bonk, em seu importante
livro Missions and Money (Missões
e dinheiro), descreve como “um
problema missionário ocidental”. Se é
assim, e se o Movimento Lausanne vai
contribuir significativamente com o
cumprimento da missão de Deus por
meio de seu povo, chegou o momento
de a força missionária conectada
com esse movimento, incluindo seus
estrategistas, renunciar ao poder do
dinheiro e modelar a vida missionária na
encarnação, no ministério terreno e na
cruz de Jesus Cristo.
A crítica de René deve ser aplicada
também às desigualdades internas em
cada país (seja o Brasil ou outro) e em
cada região (seja a América Latina ou
outra).
A confissão lida na cerimônia de
encerramento de Lausanne 3 pode ser
um bom começo rumo ao “equilíbrio
global”:
Diante do Senhor, arrependemo-nos da
extrema desigualdade material dentro
da igreja global de Cristo, [...] do
desequilíbrio dos recursos disponíveis
para a missão em diferentes partes da
sua igreja. Firmamos o compromisso
de buscar um novo equilíbrio global
enraizado no amor mútuo e profundo e
na parceria humilde dentro do Corpo de
Cristo em todos os continentes.
Capa
O centro de gravidade
da igreja cristã mudou
do Norte para o Sudeste
e Sul. Porém, o centro
da liderança tende a
permanecer no Norte e
no Oeste
28 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011
Uma declaração de amor
por Klênia Fassoni
Para os organizadores de Lausanne 3,
a forma como a igreja vai receber o
Compromisso da Cidade do Cabo será, em boa
parte, o impacto do congresso. O documento
está disponível na íntegra em
www.lausanne.org, em português e
outros sete idiomas. Ele pode e deve ser
copiado, reproduzido, estudado e adaptado
em sermões e estudos bíblicos. As igrejas,
os seminários e as organizações evangélicas
devem se apropriar desse material. Em breve
estará disponível também o guia de estudos.
O
Compromisso da Cidade
do Cabo, produzido por
Lausanne 3, tem como
subtítulo “uma declaração
de fé e um chamado para agir”.
Mesmo que o documento seja um
minicompêndio de teologia, o subtítulo
mais correto seria “uma declaração
de amor e um chamado para agir”. A
palavra amor aparece cem vezes, além
das 98 vezes em que o verbo amar é
usado. O amor é colocado como a
mola propulsora para a missão da igreja
e essa mesma ênfase permeou todo o
conteúdo e metodologia do congresso
(dramatizações, músicas, imagens,
testemunhos, mesas de estudo, oração).
Os relatores justificam: essa
“declaração foi firmada na linguagem
do amor, pois o amor é a linguagem da
aliança, e as alianças são uma expressão
do amor redentor de Deus [...]. Como
Deus é amor, o amor permeia todo o seu
ser e todas as suas ações”. E reconhecem:
“Quando afirmamos nossas convicções
e nosso compromisso em termos de
amor, estamos assumindo o mais básico
e o mais difícil de todos os desafios
bíblicos”.
Será muito bom trazermos à
memória a forma como o amor de
Cristo nos alcançou para, em seguida,
renovarmos o nosso amor por ele.
É por isso que Paulo, em Efésios
(a carta foi estudada em pequenos
grupos durante o congresso), ora para
que Cristo habite em nós a fim de
que possamos, juntamente com todos
os santos, compreender a largura, o
comprimento, a altura e a profundidade
e conhecer o amor de Cristo, que excede
todo entendimento, para que sejamos
cheios da plenitude de Deus.
O Compromisso da Cidade do
Cabo está dividido em duas partes:
“Para o Senhor que amamos; o nosso
compromisso de fé” e “Para o mundo
em que servimos; o nosso compromisso
de agir”. A primeira parte, entregue aos
participantes, é composta de dez itens,
todos iniciados com a expressão “nós
amamos”.
E assim transcorrem 21 páginas de
declarações em amor: “Renovamos o
nosso compromisso de não flertar com
o mundo caído nem com suas paixões
transitórias”, “amamos a Bíblia como
uma noiva ama as cartas de seu noivo, não
pelo papel propriamente dito, mas pela
pessoa que fala por meio dele”, “o mais
elevado de todos os motivos missionários
não é a obediência à Grande Comissão
nem o amor pelos pecadores que estão
perecendo, mas o zelo apaixonado pela
glória de Jesus Cristo”.
As declarações abrangem todas as
áreas da missão. A missão é a missão de
Deus, que nasce do seu amor por todas
as coisas criadas e que consiste em fazer
convergir a Cristo todas as coisas no céu
e na terra, reconciliando-as por meio de
sua cruz (“Deus em Cristo reconciliando
consigo todas as coisas” era o tema de
Lausanne 3). Essa missão deve ser o
nosso foco, o nosso chamado e a nossa
paixão. O amor a que o Espírito de Deus
nos inspira tem repercussões horizontais:
é dele que vem a motivação de amar
todos os povos, rejeitando qualquer
forma de racismo e etnocentrismo e
exigindo solidariedade e justiça, e de
desejar que todas as nações o conheçam.
Somos chamados também a ser uma
comunidade que demonstre o amor
de Deus. O Compromisso lembra
que tanto o mandamento de Jesus de
amarmo-nos uns aos outros como a sua
oração (“para que todos sejam um”) são
missionais: “Com isto todos saberão
que sois meus discípulos” e “para que o
mundo creia que tu [o Pai] me enviaste”.
Esse é o grande desafio para o povo de
Deus — “aqueles de todas as eras e nações
que Deus em Cristo amou, escolheu,
chamou e santificou como seu povo”.
Neste mundo corrompido, temos
sido apenas um reflexo fraco do amor,
da alegria e da paz, não a noiva radiante
de Cristo. Porém, o valor testemunhal
de uma comunidade de amor é vital
em lugares de sofrimento intenso
— onde falar de um Deus amoroso
parece brincadeira — ou em meio ao
secularismo e à globalização, onde as
relações são superficiais.
Que o amor, fruto do Espírito Santo,
cresça em nós! E que ele, o Espírito
missionário do Pai missionário e do
Filho missionário, sopre vida e poder na
igreja missionária de Deus.
O amor a que o Espírito
de Deus nos inspira
tem repercussões
horizontais: é dele que
vem a motivação de amar
todos os povos, rejeitando
qualquer forma de
racismo e etnocentrismo
e exigindo solidariedade
e justiça
Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 29
Um lugar para Lausanne 3 na história
Lyndon de Araújo Santos
Capa
C
ertamente, Lausanne 3 terá
um lugar na história sob
diferentes pontos de vista.
Como testemunha ocular
e num exercício de interpretação
ampla, apresento algumas perspectivas
históricas do congresso.
História contemporânea. Em 1974,
o congresso aconteceu no auge do
conflito da Guerra Fria. Em 1989,
ocorreu no início do período neoliberal
e no fim do socialismo real. Em 2010,
o congresso aconteceu num mundo
mais multilateral em suas relações de
força, urbano, plural e sob o alerta da
destruição ambiental.
História social. Lausanne 3 será
lembrado pelo seu sentido histórico e
relevância social. Deu-se o registro de
um volume extraordinário de fontes
históricas em discursos, documentos
escritos e imagens. Memórias,
sentimentos, percepções e olhares
foram transformados em relatos orais,
imagens e ações. Os efeitos desse
impacto nos diferentes contextos trarão
mudanças imprevisíveis em histórias de
vida, contextos e comunidades.
História conciliar do cristianismo.
O congresso se inseriu na tradição
conciliar da igreja (Hans Küng),
embora sem um propósito dogmático
normativo, tais como os concílios
ecumênicos nos primeiros oito séculos
de era cristã. Os católicos romanos
tiveram Latrão (Idade Média), Trento
(Idade Moderna) e Vaticanos 1 e 2
(1870 e 1962). Os protestantes tiveram
Edimburgo em 1910. Entretanto,
Lausanne se compreende como um
movimento, enquanto os concílios são
conclaves em torno de controvérsias
teológicas e que redefinem rumos da
igreja.
História das religiões. Lausanne 3
expressou a pluralidade atual do
cristianismo ante o desafio dos diálogos
ecumênico e inter-religioso. A presença
de observadores de outras igrejas cristãs
sinalizou a postura de ouvir, observar
e dialogar pelos seus diferentes ramos.
Por sua vez, a ação missionária nos
contextos islâmico, hindu, budista e
de outras religiosidades demonstrou
a exigência do debate sobre o
relacionamento com outras crenças,
a tolerância e o estatuto da verdade
religiosa.
História cultural. Lausanne realizou
um evento globalizado no seu aparato
tecnológico e numa perspectiva
predominantemente ocidental. Um
exemplo disso foram as imagens e
representações veiculadas da África
desde uma estética hollywoodiana.
Não há uma África, mas Áfricas.
Foi o primeiro Lausanne também
online. Embora a globalização em seus
congêneres negativos (pluralismo e
secularismo) tenha sido confrontada
como ameaça à igreja, esta mesma
igreja se mostrou afinada com os seus
avanços.
História das missões. O congresso
constatou o deslocamento da força
missionária para o eixo América Latina/
África/Ásia. Será que essas igrejas
criarão suas próprias perspectivas
teológicas e eclesiais marcando o
século 21 com um cristianismo latino-
americano, africano e asiático? A opção
será por uma ação missionária a partir
do contexto de sua encarnação ou o
discurso proposicional de imposição
da verdade sobre o outro, conquistado
não somente para a fé verdadeira,
mas para uma cultura que se julga
superior. Lausanne 3 demonstrou o
esgotamento de um evangelicalismo
etnocêntrico, nomeando inimigos a
serem conquistados.
Num movimento dialético, em
1974 os evangélicos discutiram
a relação entre a proclamação e a
responsabilidade social. Manila
reafirmou a missão como anúncio a
povos não-alcançados, em conflito com
a missão como encarnação. Cidade
do Cabo, por sua vez, recolocou a
integralidade da missão pela força dos
testemunhos e das experiências das
comunidades cristãs no mundo.
O lugar de Lausanne 3 na história
se dará tanto por sua força como por
suas fragilidades. Tal contradição pode
se tornar um impulso motivador para
a igreja no século 21. À beleza, luta e
dinâmica missionária testemunhadas,
se contrapôs a pouca reflexão teológica
e missiológica sobre questões como
gênero, diálogo inter-religioso, crise
ambiental e homossexualidade.
Quanto a uma história da igreja latino-
americana, ficou uma dívida pela sua
quase invisibilidade, não coerente
com a sua atual dinâmica, incluindo o
Brasil.
Lyndon de Araújo Santos é historiador, professor universitário e
pastor da Igreja Evangélica Congregacional em São Luís, MA.
TheLausanneMovement
30 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011
O espírito de Lausanne
O
1º Congresso Lausanne,
em 1974, trouxe uma
grande contribuição para
o cristianismo global.
O Pacto de Lausanne é
reconhecido como um dos documentos
mais completos sobre a missão da
igreja. Desde então, o “movimento de
Lausanne”, com seus altos e baixos,
permanece como um referencial para
a unidade missionária do mundo
evangelical.
O processo de compreensão e
amadurecimento de tudo o que foi
gerado a partir do Pacto de Lausanne
levou vários anos. Compreender a
missão integral da igreja e reconhecer
que o evangelho de Jesus envolve todo
o propósito de Deus para todo o ser
humano, em todas as suas necessidades,
não foi fácil e continua sendo um grande
desafio. A busca pela contextualização,
sem se deixar moldar por uma exegese
cultural, tem requerido um esforço
contínuo da igreja. Criar espaços de
diálogo entre Norte e Sul, Leste e Oeste,
ricos e pobres, homens e mulheres
das mais diferentes matrizes sociais
e/ou teológicas, e promover a unidade
da igreja também não tem sido um
caminho fácil. Porém, o que vimos no
3º Congresso Lausanne, na Cidade do
Cabo, foi uma celebração de tudo isso e
mais um pouco. A semente de Lausanne
deu frutos. O espírito de Lausanne é hoje
uma realidade no mundo evangélico.
Ouvir testemunhos de irmãos e
irmãs de todos os cantos do planeta,
falando de suas lutas pela promoção da
justiça, trabalhando pela reconciliação
entre pessoas e grupos marcados pela
hostilidade e pelo ódio, enfrentando
corajosamente a opressão e a
perseguição de governos totalitários,
O CAMINHO DO CORAçãO Ricardo Barbosa
promovendo a integração na igreja
de pessoas e grupos marginalizados,
foi a colheita da semente plantada em
1974. A preocupação com a devoção
e a prática de uma espiritualidade
bíblica e missionária, a afirmação da
unicidade e centralidade de Cristo e
sua autoridade final na proclamação do
evangelho e no discipulado, o chamado
à humildade, integridade e simplicidade,
demonstraram que o “espírito” de
Lausanne é hoje uma realidade no
cristianismo global.
Uma das marcas desse espírito está na
linguagem do “Compromisso da Cidade
do Cabo”. Em vez de usar a linguagem
acadêmica dos pactos e declarações
de congressos dessa natureza, usou-se
uma linguagem pessoal e afetiva. O
compromisso começa assim: “Para o
Senhor que amamos: nosso compromisso
de fé”. Toda a declaração é fundamentada
em nossa resposta ao amor de Deus.
No final da introdução, encontramos a
seguinte explicação para a linguagem do
amor:
O amor é a linguagem da aliança.
As alianças bíblicas, antigas e novas, são
expressões do amor redentor de Deus
e da graça que alcança a humanidade
perdida e a criação deteriorada. Essa
aliança nos convida a responder em amor.
Nosso amor expressa nossa confiança,
obediência e o compromisso apaixonado
com a aliança do Senhor. O Pacto
de Lausanne definiu a evangelização
como: “Toda a igreja, levando todo o
evangelho, para todo o mundo”. Essa
continua sendo nossa paixão.
Nesses quase 40 anos que nos
separam do primeiro congresso,
a linguagem teológica do terceiro
congresso alcança a maturidade de
uma linguagem de amor apaixonado.
A teologia da missão integral deixa de
ser defendida teologicamente para ser
celebrada como expressão do nosso
amor pelo próximo. Em 1974 e 1989
(Lausanne 2), a preocupação com
a salvação da alma provocava fortes
reações entre os que achavam que a
missão integral era uma nova versão
do “evangelho social”. Em Lausanne 3,
vimos com alegria a superação dessas
reações e a afirmação do “nosso amor
por todo o evangelho”, “nosso amor por
toda a igreja”, e “nosso amor por todo o
mundo”.
Cheguei à Cidade do Cabo sem saber
ao certo o que iria acontecer. Minhas
expectativas apostavam nas plenárias,
nos grandes e controversos temas do
século 21. As primeiras impressões foram
de frustração. Pouco tempo para as
plenárias e para as conversas das mesas;
tudo apontava para uma superficialidade
teológica. De certa forma, foi o que
aconteceu com alguns temas. Porém, de
repente, me dei conta de que o espírito
do congresso era outro — precisava
mudar o olhar e a disposição. Mudei e
voltei cheio de esperança.
Ricardo Barbosa de Sousa é pastor da Igreja Presbiteriana
do Planalto e coordenador do Centro Cristão de Estudos,
em Brasília. É autor de Janelas para a Vida e O Caminho do
Coração.
Compreender a
missão integral
da igreja continua
sendo um grande
desafio
Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 31
“Enfim sós!”— foi
o que falei para minha esposa ao
nos despedirmos de nosso filho no
aeroporto. Ele havia se casado no dia
anterior e estava indo com a esposa
para o exterior para continuar o
doutorado por mais 3 anos e meio.
Nossa filha mais velha se casara
oito anos antes e agora estávamos
somente minha esposa e eu em casa. O
chamado tempo do “ninho vazio”.
Para muitos casais, esse é um tempo
de desfrute da vida a dois. Todavia,
para outros, é um tempo de pesar e
luto. Por quê?
Quando iniciamos a jornada
conjugal, temos muitas expectativas:
sobre o outro, sobre o relacionamento
e a busca de um paraíso isento de
perturbações. Logo vão surgindo
algumas frustrações e a realidade se nos
apresenta menos “cor-de-rosa” — o
que pode ser superado por meio da
arte do diálogo, pouco cultivada em
muitos relacionamentos.
Quando nascem os filhos, o casal
assume compulsoriamente um segundo
papel, além do conjugal: o papel
parental (de pais). Filhos demandam
cuidados, atenção e carinho. E o
relacionamento que antes era entre
duas pessoas passa a ser entre três.
Assim, os cônjuges se veem obrigados
a dividir as atenções, o cuidado e o
carinho que eram dedicados somente
um ao outro com essa terceira pessoa, e
isso gera um desequilíbrio na relação.
Se as frustrações do ideal não-
atingido dos primeiros momentos do
casamento não forem superadas com
Ninho vazio
boas novas ou desespero?
Casamento e famíliaCarlos “Catito” Grzybowski e Dagmar Fuchs Grzybowski
um diálogo fecundo, a desestabilização
com a chegada do primeiro filho será
maior e surge um enorme risco: a
supervalorização do papel parental em
detrimento do papel conjugal.
Em outras palavras, com o
nascimento do primeiro filho, o casal
pode dedicar-se em demasia ao cuidado
com o bebê e deixar de investir no
relacionamento conjugal. O perigo é
que após 20 e poucos anos os filhos
se vão e o casal estará novamente
sozinho. Se não houve investimento
no relacionamento do casal, ele pode
não ter mais motivação de continuar
casado (muitos divórcios acontecem
justamente após a saída do último filho
de casa). Ou um dos pais pode apegar-
se excessivamente a um dos filhos, não
permitindo que ele tenha uma vida
independente, e isso causará problemas
não só para o seu próprio casamento,
como também para o casamento dos
filhos. Ou pior ainda: eles podem não
permitir que um dos filhos se torne
plenamente adulto e ele permanecerá
em casa para “cuidar dos pais” — há
filhos que são verdadeiros heróis e
sacrificam a vida pessoal com essa
finalidade.
O equilíbrio entre os papéis parental
e conjugal é delicado e muito dinâmico.
Também não é possível fixar-se somente
no papel conjugal e abandonar os
filhos. Em nossa cultura, entretanto,
é mais comum — e um sinal de
desequilíbrio dos papéis — que com o
nascimento do primeiro filho o casal
deixe de se tratar pelo apelido carinhoso
de até então (amorzinho, querida,
fofinho etc.) e passe a se tratar pela
função (pai, mãe). Esse é um sinal de
alerta de que a relação conjugal pode
estar sendo colocada em segundo
plano.
Assim, para o casal ter um tempo
agradável de vida a dois depois
que os filhos se emancipam, deve
desde cedo buscar esse equilíbrio
dinâmico, não deixando de investir no
relacionamento a dois.
O salmista compara os filhos
com flechas (Sl 127). Ora, as flechas
existem para serem atiradas para
longe, não para serem guardadas
em casa! O tempo de ninho vazio
deve ser um tempo de alegria e
aprofundamento da intimidade
conjugal — jamais de desesperança!
Carlos “Catito” e Dagmar são casados, ambos psicólogos e
terapeutas de casais e de família. Catito é autor de Como
se Livrar de um Mau Casamento e Macho e Fêmea os Criou,
entre outros.
O tempo de ninho vazio deve ser um
tempo de alegria e aprofundamento
da intimidade conjugal — jamais
de desesperança
AliFarid
32 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011
A
partir de hoje, com a
ajuda de Deus, não
vou ter crises de raiva,
mesmo que alguém
me irrite e que alguma
circunstância me aborreça. A raiva
pode ser o estopim de uma briga, de
uma separação e até de um crime de
sangue. Morto de raiva, Saul arrojou
uma lança contra Davi, que só não
morreu porque conseguiu desviar-se
dele por duas vezes (1Sm 18.10).
A raiva é uma coisa tão séria, que o
verbo enraivecer tem vários sinônimos:
enfurecer-se, enraivecer-se, irar-se,
raivar, raivecer, raivejar. Por meio
de uma explosão de raiva, mostra-
se o que está no íntimo; a fúria, a
indignação, a ira, o ódio, o rancor. A
raiva está sempre na companhia de
outras obras da natureza pecaminosa
do ser humano, como brigas, calúnias,
ciúmes, discórdia, dissensões, divisões,
egoísmo, facções, intrigas e invejas
(2Co 12.20; Gl 5.19-21).
Um dos Salmos mais bonitos da
Bíblia diz: “Não fique com raiva,
não fique furioso. [...] Pois isso será
pior para você” (Sl 37.8, NTLH). Os
Provérbios estão cheios de conselhos
contra a raiva: “O homem que fica
com raiva por qualquer coisa precisa
ser castigado várias e várias vezes”
(Pv 19.19, BV); “O tolo mostra toda
a sua raiva, mas quem é sensato se
cala e a domina” (Pv 29.11, NTLH);
Não quero me enraivecer
com qualquer pessoa ou qualquer acontecimento
DE HOJE EM DIANTE...
“Quando você vai ajuntando
raiva contra outra pessoa acabará
tendo uma briga violenta com ela”
(Pv 30.33, BV).
Estou ciente de que a tentação da
raiva existe. Por falta de carinho, de
sabedoria, de paciência e de tempo,
até os pais podem levar os filhos à
raiva (Ef 6.4). Quando os defeitos
alheios me afetam e me infernam a
vida, minha propensão raivosa pode
vir à tona e complicar ainda mais as
coisas. Deus me livre, mas posso ser
tentado a ter raiva dele quando me
acontece algo inesperado em uma
hora imprópria, quando adoeço,
quando entro definitivamente no vale
da sombra da morte. Talvez não haja
raiva mais pecaminosa do que a raiva
de Deus. Também não devo associar o
pecado da inveja ao pecado da raiva, o
que é muito comum. Talvez eu possa
parafrasear Asafe e escrever: “Quando
vi que tudo ia bem para os orgulhosos
e os maus, quase perdi a confiança em
Deus porque fiquei com inveja deles”
(Sl 73.2-3, NTLH).
Tudo é verdade. A raiva é forte, é
frequente e é fácil. Porém eu, de hoje
em diante, com a ajuda do Senhor,
vou levar a sério o conselho de Paulo:
“Abandonem toda amargura, todo
ódio e toda raiva” (Ef 4.31, NTLH).
Vou levantar as mãos para os céus,
para Deus, livre do pecado, da raiva
e do rancor (1Tm 2.8). Inculcarei
em minha mente para sempre o que
Tiago me ensina: “A raiva humana
não produz o que Deus aprova”
(Tg 1.20, NTLH)!
PaoloGadler
Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 33
34 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011
renascimento? No Google você encontra
nas referências sobre a tribo Zoé, que
vive entre o Pará e o Amazonas, esse
tom religioso. Pesquisadores e cineastas
franceses veem neles a esperança de
um renascimento para a humanidade.
Porém, como todas as outras, os Zoé
são apenas uma tribo brasileira pequena
tentando sobreviver. Foram contatados
pela Missão Novas Tribos do Brasil na
década de 80. Foram conduzidos com
cuidado do isolamento a um estágio
intermediário, em que recebiam ajuda
da Missão para as necessidades básicas.
O isolamento por si só não garante
a sobrevivência de nenhuma tribo, ao
contrário do que dizem os sertanistas.
Massacres de tribos isoladas inteiras,
causados por contaminações de doenças,
por seringueiros, madeireiros ou outros
predadores amazônicos, ou até por
guerras entre tribos ou clãs, acontecem
com frequência.
Voltando à história dos Zoé, a Missão
acabou sendo expulsa da área. Os Zoé
eram bonitos e puros demais para
ficarem em contato com uma missão.
Afinal, ela institucionaliza tudo o que
mais odiamos no Ocidente: sua religião.
A religião cristã continua pregando o
que mais queremos esquecer, continua
representando no mundo acadêmico
moderno a cristalização dos valores que
nos tornaram (entenda aqui a ironia)
capazes de criticar aquilo que somos.
Fora com eles.
A missão deu lugar aos “humanistas”
da Funai. Verbas internacionais vieram
e o projeto Zoé se tornou modelo. Um
hotel de selva foi construído em frente
à aldeia. Tudo o que dava acesso a outro
mundo foi retirado. Eles passaram
a viver numa ilha de selva virgem
O
Ocidente
está
adoecido
pelo
ódio a
si mesmo. Olhamos
para nossa história,
para o produto de
nosso progresso, para
nossa sociedade, e
não gostamos do que
vemos. O rei está nu. A
utopia política do início
do século passado se
tornou uma experiência
vergonhosa de domínio
de poucos sobre as
massas. As mentiras
sobre superioridade racial
em que acreditamos
se transformaram em
sangrentos genocídios.
O capitalismo que iria
permitir ao proletariado
qualidade de vida se
tornou um monstro de
produzir riquezas, que
nos engole sem piedade.
As propostas religiosas
se emaranharam
promiscuamente a
qualquer ideia que
pagasse mais. Enfim,
demos com os burros
n’água vez após vez.
Desiludimo-nos e nos
odiamos. Precisamos de
uma nova gênese.
Por causa disso,
olhamos para os índios
isolados com uma
esperança rousseauniana.
Serão eles nosso
vigiada apenas por observadores bem-
acomodados. Os vídeos na internet
que retratam a tribo são lindos, feitos
com equipamento de alta qualidade
só possível devido ao conforto e à
tecnologia oferecidos pelo hotel/
observatório. A tribo “virgem” agora
se torna entretenimento de turistas de
alta classe, uma espécie de zoológico
humano servindo ao voyerismo de
antropólogos e cineastas estrangeiros.
Suprema ironia. Os selvagens são
mantidos escravos por causa de sua
pureza. Vistos de longe, os Zoé são na’vi
azuis andando por Pandora com rabos
longos, etéreos, perfeitos. De perto, são
um povo escravo de um idealismo que
não inventaram. Presos a um paleolítico
circunstancial, são impedidos de mudar.
Não são humanos, não são cidadãos,
não são nem índios brasileiros. São uma
metáfora internacionalizada do ódio de
nossa cultura por si mesma.
O problema é que, não sabendo
disso, eles fugiram de seu paraíso
terrestre. Em outubro de 2010, os
Zoé fugiram para pedir ajuda aos
castanheiros locais e ao mundo. Num
vídeo tosco filmado por um dono de
castanhal, os índios se expressam em
português fluente: “A gente quer coisa.
A gente quer panela, faca, anzol. A
gente quer ter o que os Tirió tem. Funai
não dá nada pra nós não, mas a gente
quer”.
Tradução? Os Zoé estão dizendo:
“A gente quer parar de ser uma coisa,
a gente quer ser gente, vocês vão
permitir?”.
Bráulia Ribeiro trabalhou na Amazônia durante trinta anos.
Hoje mora em Kailua-Kona, no Havaí, com sua família e está
envolvida em projetos internacionais de desenvolvimento na
Ásia. É autora de Chamado Radical. braulia.ribeiro@uol.com.br
O rei está nuDe como os Zoé se tornaram vítimas do ódio que o Ocidente tem a si mesmo
DA LINHA DE FRENTE Bráulia Ribeiro
FernandoGiantaglia
Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 35
36 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011
materiais (ver Lucas 14.25-33).
A formação de discípulos à imagem
de Cristo acontece no contexto da
comunidade de fé, não fora dela. Jesus
diz: “Nisto conhecerão todos que sois
meus discípulos: se tiverdes amor uns
aos outros” (Jo 13.35). É claro que,
para Jesus, a marca do discípulo é o
amor. No entanto, ninguém pode
aprender a amar estando isolado dos
demais. Efetivamente, a experiência
do amor de Cristo, que segundo
Paulo “excede todo entendimento”,
só é possível “com todos os santos”
(Ef 3.18-19). Só é possível na
igreja, “a família de Deus”, onde os
discípulos aprendem a amar, e não
só a amar, mas também a servir, a
orar, a resistir ao mal, a cultivar o
bem. Na igreja, o Corpo de Cristo,
onde os discípulos descobrem
e exercem seus dons e crescem
para chegar “à unidade da fé e do
pleno conhecimento do Filho de
Deus, à perfeita varonilidade, à
medida da estatura da plenitude
de Cristo” (Ef 4.13). Para iniciar
o caminho do discipulado é
preciso arrependimento, ou seja,
uma decisão pessoal que envolve
a renúncia irrevogável a uma vida
dirigida por Deus e a disposição
de identificar-se com Jesus em seus
sofrimentos. Aqueles que começam a
seguir Jesus só podem avançar em sua
peregrinação conforme experimentam a
graça de Deus na igreja e por meio dela.
Traduzido por Wagner Guimarães
C. René Padilla é fundador e presidente da Rede Miqueias, e
membro-fundador da Fraternidade Teológica Latino-Americana
e da Fundação Kairós. É autor de O Que É Missão Integral? .
diária, tanto no privado como no
público, tanto no pessoal como no
social, tanto no espiritual como no
material. O chamado do evangelho
é um chamado a uma transformação
integral que reflita o propósito de Deus
de redimir a vida humana em todas as
suas dimensões. Uma transformação
baseada no evangelho integral, ou seja,
centrada em Jesus Cristo e orientada
para o cumprimento do desejo de Jesus
de que seus discípulos sejam “sal da
terra” e “luz do mundo”.
Assim entendido, o discipulado
tem um custo inevitável. E um aspecto
desse custo é a renúncia a tudo o que
interfere na lealdade absoluta a Jesus
Cristo como Senhor. Ele mesmo
definiu as condições do discipulado. E
as definiu de tal modo que não deixou
dúvida de que seu chamado é para um
discipulado radical, que envolve uma
obediência coerente com a vontade de
Deus em todas as áreas da vida, desde
as relações familiares até as posses
A formação de discípulos
(parte 2)
O
mandato de Jesus
Cristo é claro:
“Fazei discípulos
[...], ensinando-os
a guardar todas as
coisas que vos tenho ordenado”
(Mt 28.19, 20). Sabemos que o
conteúdo do ensino sobre a formação
de discípulos não é apenas teórico.
Sem negar a importância da doutrina
ou da teologia, a ênfase recai na prática
do ensinamento de Jesus Cristo — a
prática da verdade. Com o batismo
inicia-se um processo de transformação
que abarca a totalidade da vida;
um processo de aprendizagem
do que significa a obediência ao
ensinamento de Jesus Cristo,
isto é, à vontade de Deus. Sem
obediência à vontade de Deus,
não há discipulado genuíno. Sob
a perspectiva bíblica, a ortopraxia,
a obediência a tudo o que Jesus
ordenou a seus discípulos, é no
mínimo tão importante quanto a
ortodoxia — se não for mais, já que
sua meta é que os discípulos vivam
em função do amor e assim sejam
filhos do Pai que está nos céus,
perfeitos, assim como ele é perfeito
(Mt 5.45, 48).
Os discípulos de Jesus não se
distinguem por serem meros adeptos
de uma religião (um culto a Jesus),
mas sim por terem um estilo de
vida que reflete o amor e a justiça
do reino de Deus. Portanto, a igreja
não pode limitar-se a proclamar uma
mensagem de “salvação da alma”:
sua missão é fazer discípulos que
aprendam a obedecer ao Senhor
em todas as circunstâncias da vida
MISSãO INTEGRAL René Padilla
Os discípulos de Jesus
não se distinguem por
serem meros adeptos de
uma religião, mas sim por
terem um estilo de vida que
reflete o amor e a justiça
do reino de Deus
Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 37
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  • 1. Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 1 FECHAMENTOAUTORIZADO.PodeserabertopelosCorreios. FECHAMENTOAUTORIZADO.PodeserabertopelosCorreios. Lições e desafios para a Igreja de Cristo LAUSANNE 3 BRÁULIARIBEIRO O REI ESTÁ NU CATITOEDAGMARGRZYBOWSKI NINHO VAZIO: BOAS NOVAS OU DESESPERO? RUBEMAMORESE ANELOS 2011 JA N E I R O – F E V E R E I R O 2 01 1 • A N O X L I V • N º 3 2 8 NASCE EM SÃO PAULO A ALIANÇA CRISTÃ EVANGÉLICA BRASILEIRA • A GRITARIA DOS PREOCUPADOS: PRENÚNCIOS DE UMA REFORMA INTERNA • SOBRE A PARTICIPAÇÃO EVANGÉLICA NA CAMPANHA ELEITORAL 2010 • POR UM AVIVAMENTO PENTECOSTAL
  • 2. 2 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011 Anúncio
  • 3. Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 3 Deus fez o mundo e tudo o que nele há. Deus é o Senhor dos céus e da terra. Deus não habita em templos construídos por seres humanos. Deus não precisa de alguém que o ajude. Deus dá a todos a vida, o fôlego e tudo o mais. Deus criou a partir de um só homem todas as raças humanas para viverem na terra. Deus definiu as etapas da história e as fronteiras dos países. Deus fez tudo isso porque desejava ser procurado e achado, ainda que às apalpadelas. Deus não está longe de ninguém. Deus não tem nada a ver com os ídolos de ouro, prata ou pedra feitos pela arte e habilidade das pessoas. Ele nem sequer é parecido com tais objetos. Deus ordena que todos os homens em todos os lugares se arrependam dos seus pecados. Deus marcou em sua agenda uma data para julgar o mundo com justiça por meio do homem que ele designou e que já mostrou quem é ao ressuscitar Jesus. Esse discurso de Paulo foi feito na colina do deus Áries (nome grego) ou Marte (nome latino), situada Um discurso sobre Deus no auditório mais intelectualizado da cidade mais culta do mundo Abertura entre a Acrópole (a parte mais alta da cidade) e a Ágora (o mercado), na cidade de Atenas, a capital da Grécia e do helenismo, com 25 mil habitantes. O conselho da cidade (algo parecido com a Câmara Municipal) se reunia frequentemente naquele mesmo auditório. O convite para Paulo falar partiu de filósofos de duas escolas diferentes: os estoicos (discípulos de Zenão) e os epicureus (discípulos de Epicuro), que chamavam o apóstolo de “tagarela” e “pregador de coisas esquisitas” (At 17.20). Era uma elite complicada, pois os epicureus acreditavam que o prazer era o principal objetivo da vida e os estoicos entendiam que “os seres humanos devem ser livres das paixões, indiferentes à alegria ou ao sofrimento, aceitando calmamente todas as coisas como resultado da vontade divina”. Atenas era famosa por ter sido, alguns anos antes, o centro das artes, da arquitetura, da política e da filosofia. Ali moraram Sólon (um dos sete sábios da Grécia), Platão (fundador da Academia) e Aristóteles (filósofo, educador e cientista). O discurso de Paulo sobre Deus provocou a conversão de Dionísio, “o areopagita”, de Dâmaris, que provavelmente era uma mulher da alta sociedade, e de outras pessoas cujos nomes o historiador não cita (At 17.22-31).
  • 4. 4 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011 C omo resultado da pesquisa respondida por quase 3 mil leitores em outubro de 2010, Ultimato agora conta com novas seções e novos colaboradores. Ed René Kivitz, que assina a seção “Cotidiano — o leitor pergunta” (p. 38), tem 47 anos, é casado, tem dois filhos, é pastor da Igreja Batista de Água Branca, na cidade de São Paulo, e autor de vários livros (O Livro Mais Mal-Humorado da Bíblia, Outra Espiritualidade, Uma Igreja Como a Sua e outros). Jorge Henrique Barro, responsável pela seção “Cidade em foco” (p. 58), tem 48 anos, é casado, tem dois filhos, é pastor presbiteriano e professor e diretor da Faculdade Teológica Sul Americana, em Londrina, PR. Ed René é mestre em ciências da religião pela Universidade Metodista de São Paulo e Jorge Henrique, doutor em estudos interculturais pelo Fuller Theological Seminary, na Califórnia. Ed René foi alfabetizado com a Bíblia Sagrada pela avó paterna e se decidiu por Jesus aos 11 anos. Jorge Barro foi encontrado pelo Senhor aos 13, no Acampamento Palavra da Vida, em Atibaia, SP. Carlos “Catito” Grzybowski e sua esposa, Dagmar Fuchs Grzybowski, batistas, psicólogos e terapeutas de casais e famílias, assinam a seção “Casamento e família”. Catito é autor de Como se Livrar de um Mau Casamento e Macho e Fêmea os Criou, entre outros. A partir da edição de março/abril, a seção “Meio ambiente e fé cristã” estará a cargo da senadora Marina Silva, 52 anos, casada, quatro filhos, membro da Assembleia de Deus do Plano Piloto, em Brasília. Ela foi ministra do Meio Ambiente e se converteu a Jesus aos 39 anos. A seção “Estudos bíblicos”, muito solicitada pelos leitores, será oferecida na internet. Outra novidade para 2011 é a nova identidade visual da Editora Ultimato (veja pág. 44). Que o novo ano seja uma riqueza para você e todos os seus! Elben César Carta ao leitor ISSN 1415-3165 Revista Ultimato – Ano XLIV – Nº 328 Janeiro-Fevereiro 2011 www.ultimato.com.br Publicação evangélica destinada à evangelização e edificação, não denominacional, Ultimato relaciona Escritura com Escritura e acontecimentos com Escrituras. Visa contribuir para criar uma mentalidade bíblica e estimular a arte de encarar os acontecimentos sob uma perspectiva cristã. Pretende associar a teoria com a prática, a fé com as obras, a evangelização com a ação social, a oração com a ação, a conversão com santidade de vida, o suor de hoje com a glória por vir. Circula em meses ímpares Diretor de redação e jornalista responsável: Elben M. Lenz César – MTb 13.162 MG Arte: Liz Valente Impressão: Plural Tiragem: 35.000 exemplares Colunistas: Alderi Matos • Bráulia Ribeiro Carlos “Catito” Grzybowski • Carlinhos Veiga Dagmar Fuchs Grzybowski • Ed René Kivitz • Jorge Barro Marcos Bontempo • Paul Freston • René Padilla Ricardo Barbosa de Sousa • Ricardo Gondim Robinson Cavalcanti Rubem Amorese • Valdir Steuernagel Notícias: Lissânder Dias Participam desta edição: David Allen Bledsoe Délnia Bastos • Lyndon de Araújo Santos Saulo Xavier de Souza Publicidade: anuncio@ultimato.com.br Assinaturas e edições anteriores: atendimento@ultimato.com.br Reprodução permitida: Favor mencionar a fonte. Os artigos não assinados são de autoria da redação. Publicado pela Editora Ultimato Ltda., membro da Associação de Editores Cristãos (AsEC) Editora Ultimato Telefone: (31) 3611-8500 Caixa Postal 43 36570-000 — Viçosa, MG Administração: Klênia Fassoni • Ana Cláudia Nunes Daniela Cabral • Ivny Monteiro • Lucas Rolim Menezes Luci Maria da Silva Editorial e Produção: Marcos Bontempo Bernadete Ribeiro • Djanira Momesso César Fernanda Brandão Lobato • Gláucia Siqueira Paula Mendes • Paulo Alexandre Lobato Finanças/Circulação: Emmanuel Bastos Aline Melo • Ana Paula Fernandes • Cristina Pereira Daniel César • Edson Ramos • Luís Carlos Gonçalves Rodrigo Duarte • Solange dos Santos Vendas: Lúcia Viana • Lucinéa Campos • Romilda Oliveira Sabrina Machado • Tatiana Alves • Vanilda Costa Estagiárias: Cláudia Alvarenga • Jaklene Batista Juliani Lenz fundada em 1968 4 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011 oano, asseções, oscolaboradores, aidentidadevisual Arquivopessoal Ed René Kivitz Arquivopessoal Carlos “Catito” e Dagmar Grzybowski FranciscoMessias Marina Silva Arquivopessoal Jorge Barro NOV
  • 6. 6 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011 72. L ucas, historiador e médico, elogia muito certo pregador egípcio chamado Apolo (At 18.23-28). Diz que ele falava muito bem, tinha um conhecimento profundo das Escrituras Sagradas, era instruído no caminho do Senhor, pregava com entusiasmo e notável coragem, e possuía o precioso dom da pregação, com o auxílio do qual conseguia convencer os judeus pelos profetas do Antigo Testamento de que Jesus era de fato o Messias que havia de vir. Apolo havia nascido e crescido na cidade de Alexandria, o grande centro cultural do Egito, situada à margem ocidental do Delta do rio Nilo, junto ao Mediterrâneo. Além do mais, quando saiu de Éfeso para Corinto, o mesmo historiador afirma que Apolo sabia fortalecer os crentes novos na fé. Apesar de todos esses registros apreciativos, Lucas aponta um senão: “O seu ensinamento a respeito de Jesus era correto; porém [Apolo] conhecia somente o batismo de João” (At 18.25, NTLH). O batismo de Jesus é o batismo referido pelo Senhor no dia de sua ascensão: “João batizou com água, mas daqui a poucos dias vocês serão batizados com o Espírito Santo” (At 1.5). Apolo não estava em Jerusalém no dia de Pentecostes (talvez ainda não fosse cristão) e, portanto, não havia participado da cerimônia da descida espetacular e marcante do Espírito Santo. Faltava-lhe o conhecimento da presença externa e interna do Espírito, de modo contínuo, como paracleto, santificador, revelador, consolador, capacitador e doador de dons e poder. Em outras palavras, Apolo ainda não era pentecostal no sentido histórico. E as informações de Lucas sobre o pregador egípcio não terminam por aí. Ele faz questão de salientar mais uma virtude de Apolo. Não explicitamente, mas o suficiente para o leitor enxergar de imediato a humildade do personagem: sobre o batismo de Jesus, ele deixa-se esclarecer por Priscila e Áquila, o simpático casal que o hospedava em Corinto (At 18.26). Embora em outros casos tenha havido imposição de mãos relacionada ao recebimento do Espírito Santo (At 8.17; 9.17; 19.6), o historiador nada diz a esse respeito com referência a Apolo. No entanto, deduz-se que o egípcio, até então não-pentecostal, tenha se tornado conscientemente pentecostal ali em Corinto, onde veio a ser um obreiro de peso. Na Primeira Epístola aos Coríntios, Paulo cita sete vezes o nome dele. Uma delas lembra seu pastoreio: “Eu plantei, e Apolo regou” (1Co 3.6). Ele era um homem de confiança de Paulo, como se vê nesta passagem: “Quanto ao irmão Apolo, tenho recomendado muitas vezes que vá visitar vocês com os outros irmãos” (1Co 16.12). Pastorais O não-pentecostal OveTøpfer
  • 7. Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 7 Cinco lições de Lausanne 3 Novas geografias, velhas desigualdades Uma declaração de amor Um lugar para Lausanne 3 na história 3 Abertura 4 Carta ao leitor 6 Pastorais 8 Cartas 12 Frases 14 Mais do que notícias 16 Números 18 Notícias 32 De hoje em diante... 38 Cotidiano — o leitor pergunta 39 Novos acordes 40 Altos papos 42 Meio ambiente e fé cristã 43 Caminhos da missão 58 Cidade em foco CAPA SEÇÕES Leia mais www.ultimato.com.br Sumário ABREVIAÇÕES: AS21 - Almeida Século 21; BH - Bíblia Hebraica; BJ - A Bíblia de Jerusalém; BP - A Bíblia do Peregrino; BV - A Bíblia Viva; CNBB - Tradução da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil; CT - Novo Testamento (Comunidade de Taizé); EP - Edição Pastoral; EPC - Edição Pastoral - Catequética; HR – Tradução de Huberto Rohden; KJ - King James (Nova Tradução Atualizada dos Quatro Evangelhos); NTLH - Nova Tradução na Linguagem de Hoje; TEB - Tradução Ecumênica da Bíblia. As referências bíblicas não seguidas de indicação foram retiradas da Edição Revista e Atualizada, da Sociedade Bíblica do Brasil, ou da Nova Versão Internacional, da Sociedade Bíblica Internacional. Especial 20 ultimato.com.br: um novo ponto de encontro 44 Ultimato: nova identidade visual 46 Como o grão de trigo, nasce e morre em São Paulo a Aliança Cristã Evangélica Brasileira 62 A gritaria dos preocupados: prenúncios de uma reforma interna 64 A preocupação com o neopentecostalismo: o caso da Igreja Universal do Reino de Deus David Allen Bledsoe O caminho do coração 30 O espírito de Lausanne Ricardo Barbosa de Sousa Casamento e família 31 Ninho vazio: boas novas ou desespero?, Carlos “Catito” Grzybowski e Dagmar Fuchs Grzybowski Da linha de frente 34 O rei está nu, Bráulia Ribeiro Missão integral 36 A formação de discípulos (parte 2) René Padilla Ética 48 Sobre a participação evangélica na campanha eleitoral 2010, Paul Freston Reflexão 52 Lausanne: o olhar de um veterano Robinson Cavalcanti 54 Por um avivamento pentecostal Ricardo Gondim Redescobrindo a Palavra de Deus 56 O testemunho de Cristo enriquece a vida, Valdir Steuernagel História 60 A missão da igreja: um conceito incompreendido, Alderi Souza de Matos Ponto final 66 Anelos 2011, Rubem Amorese 22 26 28 29
  • 8. 8 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011 Sofrimento Sempre leio Ultimato página por página. Dessa vez, foi diferente. A foto de capa com o substantivo sofrimento me levou direto à página 25. Vou até arquivar o relato cronológico da Segunda Guerra Mundial. Ele me faz reconhecer os mesmos fatos. Eu era cinco anos mais velho que o estimado Elben e morava no interior do Rio Grande do Sul, numa colônia alemã. Minha mãe nasceu no Brasil e meu pai imigrou para cá em 1881. Nasceu na Lituânia e aqui se naturalizou russo. Como família, não tivemos nenhuma dificuldade. O delegado era um hóspede constante em nossa casa. Ele não nos considerava como pertencentes ao “eixo”. Sem dúvida, a guerra foi a causa de muitos sofrimentos. E qual é a nossa situação hoje? Do ponto de vista religioso, a confusão, o entrevero, os desacertos são terríveis! Helmuth Matschulat, Curitiba, PR Fiquei tocada com o artigo sobre os horrores da Segunda Guerra Mundial. Embora não tão intensamente quanto o autor, também convivi com os relatos e noticiários da época, pelo rádio e pelos comentários dos familiares. Por causa do sobrenome alemão e porque meu pai era assinante de revistas alemãs e gerente da firma Carlos Hoepeke. Lembro-me de policiais indo à nossa casa, mandando queimar livros em alemão, batendo nos móveis para ver se havia algo suspeito. Vi lágrimas de desconforto no olhar de meu pai, cidadão honesto, cristão, com sangue alemão nas veias. Justamente no ano do término da guerra, Walter Hoeschl faleceu em consequência de um acidente, aos 58 anos. Eu tinha 12. Carmen Hoeschl, São Paulo, SP Nunca devemos nos esquecer da morte ou assassinato de 6 milhões de judeus. Também não podemos nos esquecer que mais de 20 milhões de soviéticos militares e civis morreram no mesmo período. No último capítulo de um documentário sobre a Segunda Guerra Mundial (Remember!), vi que 20 milhões de soviéticos, 5 milhões de alemães, 1,6 milhão de japoneses, 1,2 ou 1,3 de iugoslávios (sérvios em sua maioria), quase 400 mil ingleses e quase 300 mil americanos perderam a vida. George Kling, Viçosa, MG Cartas
  • 9. Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 9 questão, a imagem faria sentido. Porém, como não é o caso, parece que legitima a dominação masculina. Clemir Fernandes, Rio de Janeiro, RJ Coração, juventude e fé Achei interessante e de grande valor a matéria de capa da edição de setembro/ outubro de 2010. Como jovem, não pude deixar de dar uma atenção especial a essa matéria sobre a juventude evangélica nos dias de hoje. Fiquei motivado ao saber que muitos jovens tem assumido liderança nas igrejas. A responsabilidade, o compromisso, o comprometimento com as coisas do reino de Deus é o melhor caminho a se trilhar a fim de nos tornarmos cada vez mais santos e separados. Timóteo Santana, C. dos Goytacazes, RJ Abraçando e reabrançando a santidade do corpo e da mente Quero fazer dois comentários sobre a edição de julho/ agosto de 2010. O conteúdo da carta de Patrícia Neme, de Palmas (“Cartas”), é absurdamente inaceitável. Porém, é a posição dela e a revista tem publicado, com respeito à liberdade de opinião, o que os leitores pensam — isso é bom. No entanto, nesse caso específico, quando ele propõe um assassinato e contraria frontalmente o ensino de Jesus sobre o perdão, seria preciso fazer um comentário abaixo, pois parece que ela está legitimando algo antievangélico. Muito bonita a arte de madeira que ilustra o artigo Sobre a sexualidade cristã (p. 31). Mas ela sugere abuso e controle do homem sobre a mulher. Se o texto tratasse criticamente dessa Viktor Frankl e anabatismo Fiquei contente ao ver as enfáticas informações sobre Viktor Frankl publicadas na edição de novembro/ dezembro de 2010. Há anos venho falando sobre esse homem e sua posição com relação à psico-psiquiatria. Sobre o artigo sobre anabatismo (“Reflexão”), quero salientar que a única coisa que dá sentido ao ato do batismo é o seu significado. O modo não importa: imersão, afusão, aspersão, pouca água, muita água. O que importa no batismo é o seu significado. E ele varia nas igrejas. Quando a diferença é secundária (sobre o modo, por exemplo), não há necessidade de se rebatizar. Quando o significado é diferente, é preciso ministrar o batismo bíblico. Há casos em que o batismo está envolvido em superstições semipagãs, para não dizer pagãs. Odayr Olivetti, Águas do Prata, SP
  • 10. 10 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011 Como contribuição à matéria Igreja e Juventude (Caderno Ultimato Jovem, p. 22), é importante agregar o Movimento de Clubes Bíblicos que aconteceu no Rio de Janeiro nas décadas de 70 e 80 e que celebrou 40 anos em novembro. Deus operou de maneira interessante em diversos lugares do Brasil, produzindo um avivamento na juventude que impactou a igreja tanto na evangelização quanto na liturgia e que produziu resultados duradouros. O movimento brotou com o impacto que os acampamentos do Palavra da Vida produziram em jovens cariocas. O nascimento efetivo, a identidade e os contornos foram estabelecidos quando um missionário afirmou publicamente não acreditar em líderes com idade inferior a 30 anos. De alguma forma, Deus usou essa declaração para deflagrar um movimento que geraria encontros de jovens, nas noites de sábado, em diversos pontos do Rio de Janeiro (pelo menos em sete lugares), que reuniam de trezentos a quatrocentos jovens, e que, uma vez por mês se agrupavam, sempre no intuito de evangelizar. O incrível foi a inexistência de uma liderança única instituída e o florescimento de múltiplas lideranças jovens emergentes, que hoje operam nas mais variadas denominações, sobretudo as históricas. Milhares de conversões aconteceram, centenas de vocações foram despertadas, a liturgia e a música das igrejas foram enriquecidas, projetos missionários aconteceram, igrejas com novos perfis se estabeleceram e o papel da juventude na igreja foi reconhecido, apesar da resistência presente em muitas lideranças eclesiásticas denominacionais. Cerca de seiscentos participantes deste movimento que vicejou por uns 25 anos reuniram-se no dia 6 de novembro para contar aos filhos o que Deus fez por meio da juventude. Paul Pierson, em uma de suas últimas visitas ao Rio de Janeiro, ao analisar a história do movimento, declarou: “Vocês experimentaram um avivamento e não perceberam”. Neander Kraul, Rio de Janeiro, RJ Cartas
  • 11. Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 11 Fale conosco Cartas à Redação • cartas@ultimato.com.br • Cartas à Redação, Ultimato, Caixa Postal 43, 36570-000, Viçosa, MG Inclua seu nome completo, endereço, e-mail e número de telefone. As cartas poderão ser editadas e usadas em mídia impressa e eletrônica. Economize Tempo. Faça pela Internet Para assinaturas e livros acesse www.ultimato.com.br Assinaturas • atendimento@ultimato.com.br • 31 3611-8500 • Ultimato, Caixa Postal 43, 36570-000, Viçosa, MG Edições Anteriores • atendimento@ultimato.com.br • www.ultimato.com.br O sagrado e o secular Parece-me que a igreja se tornou demasiadamente secular. Na cultura muçulmana, não se separa secular e sagrado. Para eles tudo é sagrado: o emprego, a roupa, a família, a comida. Já para a cultura ocidental, há coisas sagradas e coisas seculares. Temos uma roupa para ir à igreja e outra para ir a festas ou sair com amigos. Temos um comportamento ético na igreja e outro não-ético no trabalho. Temos uma docilidade e fraternidade dentro das paredes do templo e uma grosseria e má vontade no santuário familiar. Será que não percebemos o quanto temos sido dominados pelos meios de manipulação de massa? Samantha Gramacho, Rio de Janeiro, RJ A teologia da confissão positiva Lamentavelmente, a maioria dos pregadores que está na mídia e nos holofotes não tem pregado o evangelho em sua pureza e inteireza. O tempo na televisão é mais ocupado com mensagens que giram em torno de curas, vitória financeira e a teologia de confissão positiva. Não se prega arrependimento, conversão, segurança de salvação e a volta do Senhor. Eliamar Vidal, Nova Venência, ES Errata — No artigo Viktor Emil Frankl — o salmista do século 20 (“Capa”, novembro/ dezembro de 2010, p. 27) diz-se que o padre da Igreja Votiva de Viena e Freud chamaram Viktor de ateu. Na verdade, foi o padre quem chamou Freud e Viktor de ateus.
  • 12. 12 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011 “Q ualquer criança que não é repreendida pelos pais sobre seus erros tende a crescer pouco civilizada. Se ela tem uma tendência antissocial, não haverá amarras para esse comportamento. Martha Mendonça, editora-assistente de Época “O orgulho científico entorpece a mente dos pesquisadores, fazendo-os desprezar aquilo que desconhecem. Marcus Zulian Teixeira, pesquisador da faculdade de medicina da USP “Em casa, lugar de computador é na sala ou no corredor. Jamais em quartos isolados ou fechados. Alexandre Hohagen, presidente do Google para a América Latina “A menina deveria compreender o crescimento dos seios como uma preparação para a maternidade, mas é induzida a desejar seios grandes e “atraentes”. Todas as mudanças projetadas por Deus têm um sentido espiritual e eterno, mas, no mundo, adquirem um sentido carnal e banal. Tony Davidson Felício, biólogo “Estive com Deus e com o Diabo e lutei. Deus venceu, agarrei-me na melhor mão e em nenhum momento duvidei de que Deus iria me tirar daqui. Mário Sepúlveda, um dos 33 mineiros resgatados da Mina São José, no Chile “A tempestade [entre pais e filhos adolescentes] se alimenta num mal-entendido fundamental: os adolescentes menosprezam a experiência dos adultos e os adultos menosprezam a experiência dos adolescentes. Contardo Calligaris, psicanalista “S e a palavra de Deus estiver somente na cabeça, não mudará coisa alguma em sua vida, mas se ela atingir o coração, sua vida nunca mais será a mesma. Henry Blackaby, autor de Holiness “A religião cai no fundamentalismo quando a relação entre a verdade e liberdade não é vista claramente; e isso é produzido quando a ideologia política se converte em um parasita da religião, utiliza a religião para seu próprio projeto. Cardeal Angelo Scola, patriarca de Veneza em entrevista à rádio Vaticano “Uma igreja que se empenha em evangelizar sua comunidade sem saturar seus esforços de oração é como o piloto de corrida automobilística que toma posição na linha de partida e descobre que o tanque de combustível não foi abastecido. George Barna, presidente do Grupo de Pesquisa Barna ” ” ” ” ” ” ” ” FRASES “T em autoridade quem a exerce ancorado em consistência moral, intelectual, espiritual, técnica e humanista. Dom Walmor Oliveira de Azevedo, arcebispo de Belo Horizonte “S into-me bem fazendo o que faço. Essa questão de aposentadoria não está na Bíblia. Claro que nem sempre terei boa disposição física, mas sempre serei uma testemunha de Jesus. Enquanto tiver fôlego, pregarei a todos a salvação. Usarei minha boca para pregar as boas novas. Eddie Fox, diretor de evangelismo do Conselho Metodista Mundial ” ” ” ArquidiocesedeBeloHorizonte www.outreach.com “N ão conheço maior crime do que matar o que luta para nascer. Henry Miller, escritor americano, sobre o aborto ”
  • 13. Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 13 Anúncio
  • 14. 14 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011 Arcebispo francês diz que perversão e poder são as entranhas da pedofilia O jornal Rumos, da Associação dos Padres Casados, publicou uma entrevista com Dom Albert Rouet, arcebis- po de Poitiers, uma pequena cidade na região centro- oeste da França, e autor do livro J’aimerais Vous Dire (Eu gostaria de vos dizer), publicado em 2009 (30 mil exemplares vendidos). Vale a pena transcrever algumas de suas declarações: • Para que haja pedofi- lia, são necessárias duas condições: uma profunda perversão e um poder. Isso significa que qualquer sis- tema fechado, idealizado, sacralizado é um perigo. • Há algum tempo, a igreja vem sendo atingida por tempestades externas e internas. • Temos um Papa que é mais teórico do que historiador. Ele pensa que, quando um problema está bem colocado, ele está meio resolvido. Porém, na vida não é bem assim: a igreja tem dificuldade em se situar no mundo conturbado em que se encontra hoje. • Duas coisas me chocam na situação atual da igreja. Hoje, há certo congelamento do discurso. O menor questionamento da exegese ou da mora- lidade é considerado blasfêmia. Questionar deixou de ser uma atitude natural, o que é lamentável. Enquan- to isso, reina na igreja um clima doentio de suspeita. • A igreja enfrenta um centralismo romano, que se apoia em uma ampla rede de denún- cias. • Reconheço que esta- mos no fim de uma época. Precisamos de um cristianismo de hábito e um cristianis- mo de convicção. • Com as novas religiões e a secularização, as pessoas não estão dan- do mais importância ao sagrado. Na minha diocese, por exemplo, há setenta anos, havia oitocentos sacerdotes; hoje temos duzentos (em 36 mil paróquias). • A pobreza da igreja é uma provocação para abrir novas portas. A igreja deve se apoiar em seus clérigos (bispos, padres e diáconos) ou em seus ba- tizados? Da minha parte, acho que temos de confiar nos leigos e parar de trabalhar a partir de um esquema medieval. É uma mudança fundamental. É um desafio. • O sacerdote deve ser o animador de sua paróquia, deve apoiar os batizados para que eles se tornem adultos na fé, formá-los, evitar que eles se fechem em si mesmos [...]. Se os leigos continuarem a ser crianças, menores, a igreja não vai ter credibilidade. • Muitas vezes, é a nossa maneira de falar que não funciona. É preciso descer da montanha e descer para a planície, humilde- mente. • É necessária uma imensa misericórdia por este mundo, em que milhões de pessoas morrem de fome. Cabe a nós melho- rar o mundo e cabe a nós nos tornamos amáveis! +DO QUE NOTíCIAS A educadora religiosa Isabel da Cunha Franco se mostra preocupada com a letra de alguns cânticos que estão sendo entoados hoje, tais como: “Bendito serei”, “Transbordarei, prosperarei” e “Somos mais que vencedores”: “Quando tais músicas predo- minam, mesmo sem perceber, vamos trocando o culto que é devido ao Senhor pelo louvor ao ego”. Isabel teme que esses cânti- cos focados no “eu” tornem-se instrumentos de autoajuda e que os crentes absorvam muitos valores da sociedade atual em busca de sucesso e vantagens. Educadora religiosa chama atenção para o perigo dos cânticos de autoajuda
  • 15. Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 15 D irigindo-se a um grupo de católicos reu- nidos em Washington em agosto de 2010, o cardeal Tarcisio Berto- ne, secretário de Estado do Vaticano, declarou que o Papa Bento 16 está convencido de que, “diante dos ataques, muitas vezes injustos e infundados contra a Igreja e seus líderes, a resposta mais eficaz é uma grande fidelidade à Palavra de Deus, na busca mais firme da santidade e um maior compromisso com a caridade na verdade por parte de todos os fiéis”. Na mesma semana, o arcebispo Velasio de Paolis, presidente da Prefeitura de Assuntos Econômicos da Santa Sé, num encontro rea- lizado na Itália, tocou outra vez na mesma +DO QUE NOTíCIAS Só a santidade do clero pode acabar com a má fama da igreja A lém de não poder praticar nem dar seu aval à con- duta sexual adulterina e à homossexual, o cristão precisa aprender a arte da convivência com aqueles que as praticam. Por ter se comprometido espontane- amente com Cristo ao se conver- ter, o cristão é membro de uma comunidade cristã e responsável por seu comportamento e teste- munho. Porém, ele não é retirado do mundo, da sociedade no meio da qual vive. Segundo Paulo, o cristão não deve ficar separado dos não-cristãos, que vivem a seu bel-prazer. Para viverem separados, os cristãos “teriam de sair deste mundo” (1Co 5.10, NTLH), atitude com a qual Jesus não concorda. Na oração sacer- dotal do Cenáculo, Jesus é claro: “Não peço que os tires do mundo, mas que os guardes do Maligno” (Jo 17.15, NTLH). Retirado do mundo, o cristão jamais seria “o sal da terra” e “a luz do mundo” (Mt 5.13-16). Por uma questão de princípios, se o cristão não se retira da socie- dade, ele tem de aprender a con- viver com seus contemporâneos e vizinhos, sem se deixar influenciar ou enredar por eles. Convivência e conivência são coisas distintas: convivência é viver com outra pessoa; conivência é cumplicidade, colaboração, conluio. Não cabe ao cristão discrimi- nar, desprezar, odiar, maltratar, humilhar ou apedrejar o homos- Homofobia: não cabe ao cristão discriminar tecla: “A infidelidade do clero e a perda da identi- dade cristã representam perigos maiores do que as perseguições”. Na mesma linha e na mesma ocasião, o arcebispo do Rio de Janeiro, Dom Orani João Tempesta, disse que “a mais sublime missão dos sacerdotes hoje é, sem dúvida, ser um Cristo agora, pois Jesus é o mesmo ontem, hoje e sempre”. Ele expli- cou que o sacerdócio ministerial é entrega, é imolação, é doar-se inte- gralmente, é cruz. Tomar a cruz significa compro- meter-se para derrotar o pecado que impede o caminho rumo a Deus, acolher cotidianamente a vontade do Senhor, aumentar a fé, sobretudo diante dos problemas, das dificuldades, do sofrimento”. sexual ou a lésbica, em uma sociedade em que há muitos outros desvios, como a injusti- ça, a avareza, o consumismo, a hipocrisia, a idolatria, o ódio, a vingança, a arrogância, a frivoli- dade e assim por diante. Cabe ao cristão conviver com todas essas pessoas, com temor e tremor, sem espírito de superioridade, repro- vando todas essas coisas mais pela conduta do que pelas palavras. O ensino de Paulo tem um valor imenso se o contexto for considerado. Não há concessão alguma ao desregramento sexual. No mesmo capítulo, o apósto- lo é enfaticamente contrário à presença de certo indivíduo da comunidade cristã de Corinto que estava tendo relações com a mulher de seu pai (já morto ou não), provavelmente sua madras- ta. Ele deveria ser temporaria- mente afastado dos privilégios da comunidade, até que sua natureza carnal fosse suplantada pela nova natureza (1Co 5.1-5). No capítulo seguinte, Paulo recorda que entre os membros fundadores da comunidade cristã havia ex-homossexuais ativos e ex-homossexuais passivos, bem como muitos outros ex-isto-e- aquilo (1Co 6.9-11). Na comunidade, o critério se- ria um; na sociedade, seria outro. Não se pode exigir que o não- cristão se comporte como cristão, mas é lícito exigir que o cristão se comporte como cristão.
  • 16. 16 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011 NÚMEROS 160.000 visitas a sites pornográficos são bloqueadas por hora para proteger as crianças. 36,4 é a taxa de homicídios para cada 100 mil habitantes no estado de Alagoas. É a maior taxa do país, que em 2007 era de 25. 23.000 cirurgias gástricas (para diminuir o peso de pessoas excessivamente obesas) são realizadas a cada ano no Brasil (nos Estados Unidos foram realizadas quase 7,5 vezes mais). 150.000.000 de chineses pertencem à classe A (no Brasil, a renda familiar média dessa classe é de 14.550 reais). O número poderá ser quatro vezes maior em 2025. 25.000 quilos de carne se perderam em apenas dois dias só no frigorífico de Viamão, RS, por causa da interrupção de energia elétrica. 53 mulheres estão condenadas à morte nos Estados Unidos. 19.500 professores da rede estadual de São Paulo foram momentaneamente afastados por problemas emocionais entre janeiro e julho de 2010 (92 licenças por dia). O número representa quase 10% de todos os 220 mil professores. +DO QUE NOTíCIAS Pastores de almas têm de animar seus rebanhos D ois mil anos antes de o arce- bispo católico francês Albert Rouet dizer que os pastores deveriam ser os animadores de suas igrejas, os líderes da igreja primitiva já faziam isso. De volta a Antioquia, depois da bem-sucedida primeira viagem mis- sionária, Paulo e Barnabé passaram outra vez pelas cidades de Listra, Icô- nico e Antioquia de Psídia, para ani- mar os recém-convertidos. Eles “lhes davam coragem para ficarem firmes na fé” (At 14.22, NTLH). No início da segunda viagem missionária, Pau- lo e Silas atravessaram “a província da Síria e a região da Cilícia, dando for- ça às igrejas” (At 15.41, NTLH). Ao saírem da cidade de Filipos, a mesma dupla se dirigiu à casa de Lídia, onde se encontraram com outros crentes novos e só foram embora para Tes- salônica depois de animarem a todos (At 16.40, NTLH). O livro de Atos dá muita ênfase à arte de animar. Além das passagens ci- tadas, diz-se que Paulo atraves- sou as regiões da Macedônia e da Acaia “animando muito com as suas mensagens os cristãos” (At 20.2, NTLH). Lembra também que os cristãos de Éfeso animaram Apolo, o pregador egípcio, e este, por sua vez, “ajudou muito” os recém-convertidos de Corinto (At 18.27-28, NTLH). A ressurreição do jovem que cochilou e caiu da janela enquanto Paulo pregava deixou os cristãos de Trôade “muito animados” (At 20.12, NTLH). Vale a pena lembrar que os apóstolos deram àquele levita nascido na ilha de Chipre o nome de Barnabé, que quer dizer “aquele que dá ânimo” (At 4.37, NTLH). Esse homem tinha o precioso dom de animar os outros. Foi ele que deu total apoio ao jovem Saulo, o voraz perseguidor da igreja convertido em Damasco (At 9.27, 11.25). E que deu a João Marcos a oportunidade de voltar ao campo missionário (At 15.37-39). Os apóstolos animavam os cristãos por meio de contatos pessoais e de suas muitas Epístolas, tanto as canônicas, como as demais, como se pode ver nos seguintes versículos: “Estejam alertas, fiquem firmes na fé, sejam corajosos, sejam fortes” (1Co 16.13, NTLH). “Peço a Deus que, da riqueza da sua glória, ele, por meio do seu Espírito, dê a vocês poder para que sejam espiritual- mente fortes” (Ef 3.16, NTLH). “Para terminar: tornem-se cada vez mais fortes, vivendo unidos com o Se- nhor e recebendo a força do seu grande poder” (Ef 6.10, NTLH). Pedimos a Deus que vocês se tornem fortes com toda a força que vem do glorioso poder dele, para que possam suportar tudo com paciência” (Cl 1.11, NTLH). “Sejam também pacientes e forta- leçam o seu coração, pois a vinda do Senhor está próxima” (Tg 5.8, NVI). Talvez fosse melhor ordenar como pastores de almas apenas os Barnabés da vida — aqueles que querem, que sabem, que podem e que se dispõem a dar contínuo ânimo às ovelhas!
  • 18. 18 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011 NOTíCIAS Cristãos começam a se mobilizar para a Copa 2014 Muitos cristãos já estão planejando ações para o período da Copa do Mundo de Futebol em 2014, quando os olhos do mundo todo estarão voltados para o Brasil. A Rede Evangélica Nacional de Ação Social, Visão Mundial, Makanudos, Exército de Salvação e outras organizações querem aproveitar o campeonato mundial e realizar campanhas nas cidades-sede contra o turismo sexual de crianças e adolescentes. “Queremos mostrar ao mundo não somente os cartões postais, mas também a realidade de nossas crianças”, dizem os organizadores. Entre as atividades planejadas, estão passeatas para mostrar a situação de exploração sexual das crianças no país. Vaticano cria órgão para evangelizar batizados A Igreja Católica criou um novo departamento para evangelizar os já batizados. O Conselho Pontifício para a Promoção da Nova Evangelização, criado em outubro de 2010, será responsável por encontrar formas adequadas de evangelização dos Outra iniciativa está sendo liderada pelo ministério Amme Evangelizar. Com o foco na evangelização, eles querem “ajudar as igrejas a evangelizar todo mundo”. Para o presidente da Amme, José Bernardo, “os grandes eventos esportivos costumam ser boas oportunidades para a evangelização. Mais do que isso, a Copa em 2014 e a Olimpíada em 2016 são uma responsabilidade da igreja evangélica brasileira”. Os dois grupos já realizaram reuniões de trabalho em 2010 para definir melhor o foco das campanhas. O trabalho deve se intensificar neste ano. A expectativa é que igrejas locais e outros ministérios também comecem a planejar ações para 2014 e 2016. A previsão do Ministério do Turismo é que o país receba cerca de 600 mil turistas estrangeiros durante a Copa do Mundo. “muitos batizados que não compreendem mais o sentido de pertença à comunidade cristã”, disse à agência Zenit o presidente do conselho, Dom Rino Fisichella. Um dos objetivos do órgão será a promoção do estudo e da difusão do Catecismo da Igreja Católica, publicado em 1992. Dom Fisichella promete se apropriar de ferramentas mais atuais de comunicação, entendendo que estas “têm o leme da cultura e da mentalidade no contexto atual”. Campanha comemora o Dia Mundial do Banheiro Uma campanha inusitada pretende sensibilizar o primeiro-ministro do Reino Unido, David Cameron, para o problema da falta de saneamento básico nos países pobres. A organização cristã Tearfund e a instituição de assistência social Cord lideram o Dia Mundial do Banheiro (19 de novembro). A campanha encoraja a população a enviar mensagens por e-mail ao primeiro-ministro pedindo que ele doe ofertas para a construção de banheiros em Burundi, um pequeno e pobre país africano devastado pela guerra civil. A frase principal da campanha é provocativa: “David Cameron sabe tudo sobre a importância de ter uma moradia segura, mas e sobre ter um banheiro decente?”. Segundo os organizadores, com o apoio público de Cameron, a campanha pode chegar aos ouvidos dos mais poderosos. A campanha de arrecadação de fundos para a construção de banheiros em Burundi foi lançada em 2008 e já beneficiou 9 mil pessoas. O doador faz a doação, que é destinada à construção de banheiros seguros e higiênicos, além de facilitar o acesso à água potável e o desenvolvimento de ações de educação e higiene. Em troca, ele recebe um certificado e uma foto do novo banheiro construído com sua ajuda. Segundo dados da campanha, uma em cada três pessoas ainda não tem acesso a um banheiro decente. Doenças associadas a falta de saneamento e água poluída matam por dia 5 mil crianças menores de 5 anos. “Como uma igreja global, precisamos falar sobre essa injustiça que mantém as pessoas na pobreza”, diz o texto de divulgação da campanha. Mais informações: www.tearfund.org. por Lissânder Dias
  • 19. Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 19 Brasil perde dois tradutores da Bíblia O mineiro Josué Xavier e o paulista Werner Kaschel. Os nomes desses estudiosos não são conhecidos nas igrejas, mas o trabalho que realizaram faz diferença sempre que abrimos a Bíblia. Eles ajudaram a traduzir a Bíblia Nova Tradução na Linguagem de Hoje, publicada pela Sociedade Bíblica do Brasil (SBB), e assim aproximar o conteúdo das Escrituras Sagradas da língua falada pela população brasileira. Ambos morreram em 2010: Josué, em 31 de março, aos Congresso Brasileiro de Missões vai discutir relevância para o mundo atual “A Missão Transformadora diante da Realidade Mundial”. Esse foi o tema escolhido para o próximo Congresso Brasileiro de Missões (CBM), que acontece entre 10 e 14 de outubro de 2011. Será a sexta edição do maior congresso evangélico de missões do país. O aumento da globalização, da crise financeira global e da perseguição religiosa estão entre os desafios atuais considerados mais importantes pela coordenação do Mais de 1 milhão de crianças nasceram fora do casamento nos Estados Unidos Em 2008, nasceram nos Estados Unidos, fora do casamento, 1,72 milhão de crianças. Os dados são do Departamento do Censo dos Estados Unidos, que divulgou a pesquisa “Casamento: a melhor arma americana contra a pobreza infantil”, em setembro de 2010. Segundo o censo, 75% das mães de crianças nascidas fora do casamento eram mulheres adultas jovens entre 19 e 29 anos. Outros números do censo revelaram ainda que o índice de pobreza para os progenitores solteiros com filhos em 2008 no país era de 36,5% (este número ficou em 6,4% entre casais casados que têm filhos). O autor da pesquisa, Robert Rector, acha que “o casamento continua sendo a arma mais forte contra a pobreza na América do Norte; ainda assim, continua diminuindo”. evento. Outras questões prioritárias são a desigualdade entre pobres e ricos, a propagação da aids e o aumento do número de crianças em vulnerabilidade social. O congresso pretende também discutir a situação dos chamados “povos não- alcançados”, ou seja, sem presença cristã. Segundo Silas Tostes, presidente da Associação de Missões 75 anos; e Werner, em 8 de novembro, aos 85. Ambos eram também pastores: Josué, presbiteriano, e Werner, batista. Especialista em Antigo Testamento, tradutor de hebraico e revisor de língua portuguesa, Josué trabalhou na SBB durante 27 anos — de 1980 a 2007. Werner era doutor em teologia e especialista em hebraico. Ele traduziu todos os livros do Antigo Testamento. Em sua última entrevista, em julho de 2010, à revista A Bíblia Hoje, Werner defendeu a causa de toda a sua vida: “A Palavra de Deus deve ser compreendida por todos. E isso inclui ricos, pobres, cultos e incultos”. ArquivoSBB ArquivoSBB O mineiro Xavier (dir.) e o paulista Werner (esq.): tradutores da Bíblia Transculturais Brasileiras (AMTB) e coordenador do congresso, “o 6º CBM pertence a um contexto maior de despertamento missionário; porém, o seu contexto histórico próximo nos levou a considerar como poderemos ser relevantes à luz dos grandes desafios atuais. Assim, após oração, reflexão e muito diálogo, nos pareceu bem definir que esse fosse o tema do congresso”.
  • 20. 20 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011 Especial ultimato.com.br um novo ponto de encontro Q uarta-feira é quase dia santo para alguns marmanjos que bem ou mal conheço na minha cidade. Todos, obrigatoriamente, acima dos 40 anos. Outro dia, antes de acender os refletores do nosso templo — de grama acinzentada pela seca insistente —, entre uma e outra gargalhada, alguém confessa: “Hoje, tomei dois comprimidos de Tandrilax, um pela manhã e outro à tarde. E os dois estavam vencidos. Mas estou ótimo”... Claro, qualquer produto fora do prazo de validade é um risco. Uma curiosidade prosaica é saber exatamente o que acontece “naquele dia” cuja validade termina. A curiosidade faz sentido, especialmente em relação às datas que marcaram a história. O que aconteceu antes e o que aconteceu depois fazem parte da história tanto quanto “o” dia apontado no calendário. E é assim que celebramos e anunciamos o nosso novo site, chamado carinhosamente de Portal Ultimato. Na web, mudar parece um verbo mais do que perfeito. Em 1997, publicamos as primeiras cartas à redação da revista Ultimato recebidas por e-mail. Em 2001, os leitores foram às compras na nossa primeira loja virtual. Desde então, várias mudanças, algumas visíveis, outras nem tanto. Em abril de 2010, inauguramos a nossa porção blogueira. Além dos vários hotsites a cada lançamento da editora, do Blog da Ultimato — blog editorial — e do Paralelo 10 — blog do nosso projeto para o fortalecimento de lideranças do Norte e Nordeste do Brasil —, alargamos a nossa tenda. Ultimato passou a abrigar por Marcos Bontempo blogs de colunistas, autores, ministérios em diferentes áreas da missão integral, além de outros escribas de plantão. O portal é, na verdade, um ponto de encontro. E, como aconteceu em 2008, quando celebramos 40 anos no nosso Encontro de Amigos, descobrimos que Ultimato não é um, mas muitos. Talvez, de modo mais prático e adequado aos tempos modernos, o novo site apresenta ao leitor aquilo que repetimos ao longo dos anos: “Ao lado de muitos outros, [Ultimato] participa da proclamação da boa nova que nunca fica velha, da esperança que nunca morre e de um Salvador que nunca muda”. Na primeira “página” do portal é possível perceber a mudança. Uma nova divisão e organização do conteúdo torna mais fácil para o leitor saber onde e o quê quer encontrar. Quatro grandes espaços — ultimatoonline, revista, editora e loja virtual —, em cores diferentes, acompanham o leitor. Mais limpo, de fácil navegação e com mais conteúdo, o portal oferece também um sistema de participação dos leitores e publicação de textos sem complicações, com regras claras, mais espaço para comentários e ainda a possibilidade de réplicas a artigos publicados. São contados aos milhares. Numa época em que palavras, imagens e holofotes viram bytes num piscar de olhos, o velho e bom John Stott dá-nos um critério nada comercial, especialmente quando o assunto é blog: “Se você quer mostrar, esconda; se você quer esconder, mostre”. Nosso desafio é juntar a sugestão do escritor inglês à velha declaração de João Batista: “Convém que ele cresça e eu diminua” (Jo 3.30).
  • 22. 22 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011 Uma igreja desunida é uma igreja com pouca relevância, que não sente profundamente a dor do outro, não enxerga as chagas do próximo. Seu ensino sobre a vida parece frio e superficial, porque seu olhar é fechado em si mesmo. Essa verdade é relevante tanto para as igrejas locais — que precisam desenvolver ações em parceria que proclamem com mais consistência o evangelho da reconciliação —, quanto para a chamada “igreja global” — que precisa, por exemplo, olhar com mais compaixão para os cristãos que vivem em contextos de evidente perseguição religiosa. Lausanne 3 dedicou o último dia à temática “parcerias”. Porém, foi nos momentos mais espontâneos, como as discussões 1 nas mesas e as conversas nos corredores, que o tema da unidade da igreja foi visto, não como uma simples questão de estratégia, de firmar parcerias, mas como uma expressão da riqueza teológica do trabalho em conjunto e da união em Cristo. Nesses espaços, a unidade foi vista como um verdadeiro anseio dos presentes e como o elo que pode ligar os grandes desafios da igreja. Mas por que é tão difícil manter a unidade? Lausanne 3 não respondeu a essa pergunta; porém, nos deu algumas pistas. Como diz Vaughan Roberts, “a unidade de Cristo não pode ser criada, é uma ação do Espírito. Por meio da verdade do evangelho, do Espírito, somos o Corpo de Cristo. Deus pede que vivamos de maneira digna da vocação a que fomos chamados. As divisões não são por diferenças teológicas, mas por orgulho”. Outra pista foi dada pelo teólogo Ronald Sider em uma conversa informal: “O que eu gostaria de ver como resultado deste congresso é um equilíbrio maior de cooperação financeira entre todos nós”. Ao olharmos para a igreja brasileira, a necessidade de unidade parece ainda mais gritante. Alguns brasileiros afirmaram que a comitiva nacional foi uma amostra do que é a igreja: alegre e numerosa, mas pouco organizada e meio sem rumo (cerca de cem brasileiros participaram do congresso). Ao refletir sobre a crise de liderança cristã no país, Robinson Cavalcanti norteou o caminho: “Precisamos de um choque de humildade”. Não podemos considerar a questão da unidade cristã sem refletir sobre o papel dos nossos líderes. Sendo assim, o conselho do “choque de humildade” é um passo igualmente relevante para termos uma igreja mais unida. Não é à toa que no penúltimo dia, dedicado ao tema “integridade”, o britânico Chris Wright exortou os presentes a um autoexame sincero diante das idolatrias atuais: o poder (orgulho), a popularidade (sucesso) e a prosperidade (ganância). “Precisamos de um retorno radical ao Senhor. Precisamos ouvir a voz dos profetas, dos apóstolos e de Jesus Cristo. Quem precisa se arrepender primeiro não são os de fora, mas os de dentro.” Não dá para cumprir o chamado missionário sem o árduo esforço da unidade Cinco lições de Lau O 3º Congresso Lausanne de Evangelização Mundial – CapeTown 2010, mais conhecido como Lausanne 3, foi inesquecível em muitos aspectos. Quem esteve lá não pode fazer uma análise fria, sem emoção. Era uma parte significativa da Igreja de Cristo, celebrando a comunhão e louvando ao Deus que dá sentido à vida. LAUSANNE 3 Lições e desafios para a Igreja de Cristo
  • 23. Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 23 Assim como um náufrago precisa de terra firme, é ingênuo achar que nossa geração não precisa de — e não clama por — referências claras e absolutas. No entanto, em um mundo relativista, pluralista e indiferente a questões dogmáticas, como defender a verdade única do evangelho sem perder a dimensão pessoal, amorosa e humilde daquele que é a própria verdade, Jesus Cristo? Lausanne 3 foi ousado ao nos provocar com esse tema logo no primeiro dia, diante de um cenário tão 2 A verdade é importante e não anda sozinha diversificado e do risco concreto de ressuscitar fundamentalismos e simplismos. As primeiras palavras do escritor Os Guinness foram fortes: “Oro para que não haja dúvidas de que a verdade é uma questão fundamental e decisiva para este congresso e para nós, como evangélicos. A verdade não é essencialmente uma questão filosófica, mas teológica. Deus é verdade, o seu Espírito é o Espírito da verdade; sua Palavra é verdade, nossa fé é verdade, e, a menos que sejamos seguros e firmes quanto à verdade, este congresso pode terminar agora”. À medida que o congresso acontecia, o clamor por clareza na defesa da verdade (com referências seguras e norteadoras) foi sendo entendido também como a necessidade de uma verdade integradora, que reúna histórias de vida e esforço acadêmico. Daí a agradável surpresa de ouvir tantos testemunhos de pessoas simples de diversos lugares do mundo. As histórias de vida são tão importantes quanto as dissertações acadêmicas. Não que uma substitua a outra, mas elas podem se fortalecer mutuamente. Uma história de vida pode resgatar o academicismo de gabinete, sem amor e sem dor. A teologia pode dar luz às histórias de vida, trazendo-lhes um sentido histórico. Tudo isso, no entanto, não excluiu a justa crítica de alguns intelectuais brasileiros de que faltou profundidade e tempo para as discussões acadêmicas. Por último, é importante assumir o desafio de refletir sobre a unidade à luz da verdade (e vice-versa). Mais do que defender uma ou outra com unhas e dentes, a igreja cristã precisa dispor-se a fazer sérias reflexões sobre como conjugá-las harmoniosamente. Uma precisa da outra. Assim o evangelho será compreendido e digno de confiança e também amado e seguido. usanne 3 Eram histórias verdadeiras de cristãos e cristãs que estão na linha de frente em lugares extremamente difíceis, enfrentando o sofrimento e a morte, lutando contra a injustiça, levando esperança e o evangelho de Jesus Cristo. Fomos agraciados por momentos especiais, como quando a comissão brasileira pediu perdão aos líderes africanos pela dor da escravidão infligida ao seu povo. Em meio a lágrimas, tivemos a certeza de que Deus havia nos dado um presente inesperado. Ou quando uma norte- coreana de 18 anos contou sua história de fé e de como seu pai foi morto por anunciar essa mesma fé. O foco cristocêntrico, a valorização da história e a beleza litúrgica do culto de encerramento superaram nossas expectativas. Lausanne 3 é inesquecível porque se propõe a ser um movimento global duradouro, o que não é fácil. Enquanto as estatísticas mostram que a igreja cristã cresce, as dificuldades não diminuem. As pressões do mundo pós-moderno, as diversas faces da igreja em cada continente, o acirramento da perseguição religiosa, a complexidade da “tarefa inacabada”, as desigualdades sociais e de gênero e principalmente os próprios pecados da igreja cristã são desafios complexos e arriscados. A Igreja Cristã pode se beneficiar desse movimento, que naturalmente não representa integralmente o Corpo de Cristo. A multiforme sabedoria de Deus vai além. O Espírito Santo sopra aonde quer. Ultimato reconhece a importância do Movimento Lausanne e, nas páginas seguintes, quer aproximar a igreja espalhada neste mundo e chamar a igreja brasileira a participar. por Lissânder Dias Capa
  • 24. 24 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011 3 4 A igreja é global e as antigas categorias para delimitá-la precisam ser atualizadas à luz da globalização O fenômeno da globalização ficou evidente em vários aspectos do congresso. O evento foi mundial; a tecnologia permitiu que 100 mil pessoas o acompanhassem pela internet. Ouvimos experiências de igrejas europeias que já não são tão homogêneas, mas têm nos bancos gente de diversas nacionalidades e provenientes de países pobres. Além desses aspectos, Lausanne 3 nos ajudou a pensar que a igreja cristã Esses dois recursos nos renovam quando as circunstâncias exigem algo mais do que argumentos humanos. São fonte de poder, de arrependimento, de amor e de sabedoria; são canais da obra do Espírito Santo no espírito humano. Abandonar essas duas práticas ou deixá-las em segundo plano é perder-se na caminhada. Dois momentos no congresso foram simbólicos quanto a isso: • Perdão regado a oração — no último dia a comissão brasileira, liderada pelo pastor Key Yuasa, tomou não pode mais ser desenhada simplesmente em termos geográficos. Como lembra o pastor e cientista social Orivaldo Pimentel, “não se pode pensar a igreja com as mesmas categorias de antes. Não mais em termos de Norte, Sul, Leste e Oeste, mas sim da presença global num mundo globalizado”. Isso exige de nós novas formas de pensar a presença da igreja. O que significa ser uma comunidade global, mas que constrói a identidade localmente? Como devemos comunicar o evangelho nesse contexto? Como deve ser o nosso testemunho? Quais as oportunidades de serviço? Os efeitos desse fenômeno devem ser analisados a longo prazo, já que eles não são tão óbvios quanto seus sintomas. Outra dimensão importante da globalização, lembrada mais claramente pelos teólogos René Padilla e Samuel Escobar no quarto dia do congresso, é a econômica. Padilla considerou a pobreza gerada pela globalização como um dos grandes desafios da igreja e achou que o assunto foi pouco abordado por Lausanne 3. Ele já havia aprofundado a mesma ideia no artigo From Lausanne 1 to Lausanne 3, publicado no Journal of Latin American Theology, a revista da Fraternidade Teológica Latino-Americana, distribuída durante o evento. “Cristãos conscientes não podem ignorar a extrema pobreza de milhões de pessoas, gerada pelo atual sistema econômico global controlado, em grande medida, por uma classe corrupta transnacional.” O texto bíblico e a oração são riquezas incalculáveis a iniciativa de escrever uma carta pedindo perdão à igreja africana pela triste história de escravidão no Brasil. Um dos momentos mais emocionantes foi quando, após a leitura da carta, durante a reunião regional da África, os líderes africanos pediram ao grupo de sete brasileiros que representava a comissão que ficassem de joelhos. Em meio a lágrimas, os irmãos da África oraram longamente anunciando o perdão aos brasileiros; enquanto oravam, lembravam o sofrimento vivido por mulheres e filhos, sem maridos e pais, que foram trazidos cativos para o Brasil. Espontaneamente, um grupo de africanos foi até a reunião da comissão brasileira e orou novamente por nós. Nada poderia traduzir melhor e reunir os sentimentos de todos do que a oração. O perdão foi regado pela beleza da oração. • Estudos bíblicos indutivos — todas as manhãs, nos reuníamos em grupos de sete pessoas e estudávamos juntos a carta de Paulo aos Efésios. Por diversas vezes, nos vimos desarmados pela riqueza da Palavra de Deus. Apesar do pouco tempo, cada momento de estudo indutivo nos fazia assumir novamente a responsabilidade para com o evangelho e o mundo, e nos permitia conhecer histórias de irmãos de diversos países. Experimentamos uma unidade misteriosa, movida pela Palavra, baseada nos relacionamentos, que gera alegria, respeito e amor pelo outro. Como disse o teólogo Samuel Escobar, “foi o momento mais rico do congresso”. O texto bíblico e a oração são pilares para a compreensão orgânica da igreja de Cristo.
  • 25. Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 25 Capa Quando era missionário na Índia, o inglês William Carey planejou realizar um congresso missionário internacional na Cidade do Cabo, na África do Sul, no ano de 1810. Foi obrigado a desistir por razões óbvias: os participantes da Europa e da América do Norte gastariam meses só nas viagens marítimas de ida e volta ao lugar da conferência, no extremo sul do continente africano. Ele mesmo levaria várias semanas para descer todo o Oceano Índico, de Calcutá à Cidade do Cabo. Carey, a esposa, grávida, e os três filhos embarcaram no navio dinamarquês Körn Princess da Inglaterra para a Índia no dia 13 de junho de 1792. A família só chegou ao destino cinco meses depois, no dia 11 de novembro. Carey não sonhou em vão; a conferência foi apenas “adiada”. Os jovens são a grande força missionária 5 Coragem, idealismo, paixão por Cristo e pelas pessoas — esses são os recursos necessários para a mudança de geração, sem perder a herança histórica. Valorizar e reconhecer a juventude nos ajuda a celebrar o Corpo de Cristo, de tantas idades, e a discernir melhor as muitas faces e a velocidade do nosso tempo. Além disso, por sua grandiosidade e relevância, Lausanne 3 não pode ser assimilado a curto prazo. Os jovens são personagens fundamentais para Sonho de 1810 só se concretiza em 2010 Ela se realizou em outubro de 2010, na Cidade do Cabo, 200 anos depois de planejada. Foi o 3º Congresso Lausanne de Evangelização Mundial. William Carey, batista, chamado de “pai das missões modernas”, era um superdotado com referência a idiomas: ele conhecia os idiomas originais da Bíblia (hebraico e grego), latim, italiano, francês, holandês e pelo menos três idiomas orientais (bengali, sânscrito e marathi). Graças a esse dom, traduziu a Bíblia toda para dois idiomas indianos. Ele dedicou à Índia 42 dos seus 73 anos de vida. Nunca voltou à Inglaterra, nem para tirar férias, nem para se aposentar. Ficou viúvo duas vezes e casou-se três. que as mais significativas mudanças aconteçam dentro e fora da igreja de Cristo. Não é à toa que 40% dos participantes eram pessoas com idade entre 20 e 40 anos. O esforço dos organizadores para que houvesse, de fato, uma representatividade de jovens líderes reforça a esperança de que o evangelho continuará sendo anunciado em todos os lugares, sem deixar de enfrentar as principais questões contemporâneas. Ao mesmo tempo, essa evidência aumenta a responsabilidade dos mais velhos. É preciso apoiar e pastorear nossos jovens nos mais desafiadores contextos: nas periferias das grandes cidades, nas igrejas, nas escolas, nas universidades e outros lugares. Juntos, jovens e velhos precisam caminhar em alegria e em confiança. Enquanto os jovens devem honrar a sabedoria dos mais velhos, estes devem permitir que aqueles liderem projetos e comunidades até então sob suas responsabilidades. TheLausanneMovement Jovens e velhos no plenário de Lausanne: juntos eles precisam caminhar com alegria e em confiança
  • 26. 26 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011 Novas geografias, D oug Birdsall, presidente executivo do Movimento Lausanne, estava certo quando afirmou que o 3º Congresso de Evangelização Mundial foi a “assembleia evangélica global mais representativa da história”. Além dos mais de 4 mil participantes de 198 nações presentes em Cape Town, o congresso foi assistido por cerca de 100 mil expectadores a partir de quase setecentos sites que retransmitiram o evento em 96 países. Lausanne 3 marcou de vez a nova geografia da igreja global. Nas últimas décadas, o centro de gravidade do cristianismo deslocou-se do Norte e do Ocidente para o Sul e o Oriente (África, América Latina e Ásia) e isso foi visto e anunciado no congresso. A escolha da África do Sul como anfitriã foi uma forma de fazer jus a essa mudança. A primeira saudação no manual entregue aos participantes é assinada pelo arcebispo da Igreja de Uganda, Henry Luke Orombi: “Bem-vindos à África, nossa terra-mãe, e a Cape Town, a cidade-mãe”. Em outra mensagem, publicada no informativo diário, ele declara: “Em 1900, somente 9% da população da África era cristã. Em 2000, chegou a 46%, com 360 milhões de cristãos. Ao mesmo tempo, houve um trágico declínio no número de cristãos ativos e praticantes no mundo ocidental”. Citando Philip Jenkins, autor de A Próxima Cristandade, Orombi acrescenta: “Até 2025, 50% da população cristã estará na África e na América Latina e outros 17% estarão na Ásia. [...] Não somos mais apenas o alvo dos missionários ocidentais. Somos também os que enviam missionários para o Ocidente”. Se Cape Town 2010 reivindica a representação da igreja global evangélica, convém perguntar como esse objetivo foi alcançado. Segundo Tim Stafford (articulista do site Christianity Today), quando Doug Birdsall convidou o bispo metodista da Malásia Hwa Yung para trabalhar com ele no planejamento do congresso, este perguntou: “Que tipo de conferência você quer? Um congresso normal dominado por líderes do velho Oeste ou um que represente o que a igreja é hoje?”. Os 4 mil participantes foram escolhidos por meio do seguinte processo de seleção: o Movimento Lausanne elegeu um comitê, que incluía um representante de cada uma das doze regiões globais. Esse comitê escolheu um diretor para cada país convidado (duzentos ao todo), que deveria ser imparcial e representar toda a igreja de seu país, e não apenas seus amigos e companheiros de igreja. Para montar a delegação de cada país, esse diretor contou com a ajuda de um comitê nacional. A quantidade de representantes dependia do número de cristãos evangélicos em cada país, com base principalmente nas estatísticas do Operation World, um guia mundial de oração (www.operationworld. org). Os comitês de seleção deveriam seguir estas orientações: concordância com o Pacto de Lausanne (declaração do primeiro congresso, em 1974), equilíbrio em termos de igrejas, etnias e gêneros, garantia da presença de jovens (30%), de mulheres (o critério era de 35%, mas a composição final foi de 27%), e de delegados que viessem do “mundo do trabalho” — leigos que não tinham cargo oficial na igreja ou missão (10%). O resultado final não foi um perfeito espelho da igreja evangélica, mas sem dúvida o corpo mais representativo da igreja evangélica já montado. Lindsay Brown, diretor internacional de Cape Town 2010, comentou que o equilíbrio global se refletiu também nas finanças. Os duzentos delegados da China (impossibilitados de participar porque o governo chinês se recusou a liberá-los) pagaram por todas as suas despesas, além de contribuírem com milhares de dólares para as despesas de outros. A maioria dos delegados da Índia pagou suas próprias despesas. Os da Malásia fizeram o mesmo. “China e Índia deram mais que a Europa”, disse Brown. “Essa é a primeira vez que eu vi esse tipo de liberalidade quanto aos recursos financeiros.” A representatividade desse novo cenário foi vista na composição das delegações: 70% dos participantes eram da África, América Latina Lausanne 3 foi o corpo mais representativo da igreja evangélica já montado
  • 27. Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 27 por Klênia Fassoni velhas desigualdades e Ásia. Isso contrasta fortemente com Lausanne 1, em que 70% dos participantes eram do Ocidente, e com os números da conferência missionária mundial em Edimburgo, há um século. Nesta, dos 1.200 delegados, quinhentos eram dos Estados Unidos, quinhentos da Grã- Bretanha, quatro da Ásia e nenhum da África. A composição dos palestrantes e dos músicos também evidenciou essa representatividade: dos 42 palestrantes e mestres de cerimônia apresentados no caderno do participante, treze eram da África, onze da Ásia, oito da Europa e sete dos Estados Unidos e Canadá. Havia também um palestrante da Oceania. A participação de apenas dois latino-americanos foi um grave senão. Os 33 músicos e cantores encarregados da direção da adoração provinham de quinze países diferentes, de praticamente todos os continentes. A sugestão dada aos congressistas (“você pode tomar café-da-manhã com alguém da Ásia, passar o intervalo com alguém da América Latina, almoçar com um europeu e chamar um intérprete para ajudá-lo no jantar com alguém da Eurásia ou do Pacífico Sul”) pode sugerir que as tensões entre o Norte e o Sul estariam resolvidas. Porém, não é bem assim. Na apresentação do programa para o sexto dia, cujo tema era “formando parcerias no Corpo de Cristo rumo ao novo equilíbrio global”, os diretores do congresso reconhecem: O centro de gravidade da igreja cristã mudou do Norte para o Sudeste e Sul (África, América Latina, Ásia). Nesses continentes e entre suas diásporas vemos grande fervor espiritual e engajamento holístico, e bons exemplos de liderança como à de Cristo-servo. Porém, o centro da liderança organizacional, do controle financeiro e das tomadas de decisão tende a permanecer no Norte e no Oeste. [...] [Isto] nega a verdade de que, no Corpo de Cristo, todos nós precisamos uns dos outros. O problema pode surgir por ignorância, estruturas falhas, independência e acúmulo de poder regional. Um multiplex e algumas sessões de diálogo abordaram esse tema. Um dos palestrantes citou a estatística da ONU de que os cristãos doam, em média, 2% para missões e estimulou os participantes a imaginarem o que aconteceria se aumentassem para 3 ou 4%. Incentivou-os a pensar no Espírito Santo como inspirador das doações. Ele e outros insistiram que os temas mordomia e parcerias devem ser tratados juntos. Richard Stearns, presidente da Visão Mundial nos Estados Unidos e autor de A Grande Lacuna (Editora Garimpo), afirmou que o Ocidente abraçou uma visão fraca e unidimensional do evangelho. “É um evangelho que protege o status quo injusto, que não exige nada do rico, no qual falta poder para mudar o mundo ou ganhá-lo para Cristo”. O teólogo latino-americano René Padilla, uma semana após o congresso, lamentou: Tristemente, o maior obstáculo para implementar uma verdadeira parceria na missão é a riqueza do Norte e do Ocidente; a riqueza que Jonathan Bonk, em seu importante livro Missions and Money (Missões e dinheiro), descreve como “um problema missionário ocidental”. Se é assim, e se o Movimento Lausanne vai contribuir significativamente com o cumprimento da missão de Deus por meio de seu povo, chegou o momento de a força missionária conectada com esse movimento, incluindo seus estrategistas, renunciar ao poder do dinheiro e modelar a vida missionária na encarnação, no ministério terreno e na cruz de Jesus Cristo. A crítica de René deve ser aplicada também às desigualdades internas em cada país (seja o Brasil ou outro) e em cada região (seja a América Latina ou outra). A confissão lida na cerimônia de encerramento de Lausanne 3 pode ser um bom começo rumo ao “equilíbrio global”: Diante do Senhor, arrependemo-nos da extrema desigualdade material dentro da igreja global de Cristo, [...] do desequilíbrio dos recursos disponíveis para a missão em diferentes partes da sua igreja. Firmamos o compromisso de buscar um novo equilíbrio global enraizado no amor mútuo e profundo e na parceria humilde dentro do Corpo de Cristo em todos os continentes. Capa O centro de gravidade da igreja cristã mudou do Norte para o Sudeste e Sul. Porém, o centro da liderança tende a permanecer no Norte e no Oeste
  • 28. 28 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011 Uma declaração de amor por Klênia Fassoni Para os organizadores de Lausanne 3, a forma como a igreja vai receber o Compromisso da Cidade do Cabo será, em boa parte, o impacto do congresso. O documento está disponível na íntegra em www.lausanne.org, em português e outros sete idiomas. Ele pode e deve ser copiado, reproduzido, estudado e adaptado em sermões e estudos bíblicos. As igrejas, os seminários e as organizações evangélicas devem se apropriar desse material. Em breve estará disponível também o guia de estudos. O Compromisso da Cidade do Cabo, produzido por Lausanne 3, tem como subtítulo “uma declaração de fé e um chamado para agir”. Mesmo que o documento seja um minicompêndio de teologia, o subtítulo mais correto seria “uma declaração de amor e um chamado para agir”. A palavra amor aparece cem vezes, além das 98 vezes em que o verbo amar é usado. O amor é colocado como a mola propulsora para a missão da igreja e essa mesma ênfase permeou todo o conteúdo e metodologia do congresso (dramatizações, músicas, imagens, testemunhos, mesas de estudo, oração). Os relatores justificam: essa “declaração foi firmada na linguagem do amor, pois o amor é a linguagem da aliança, e as alianças são uma expressão do amor redentor de Deus [...]. Como Deus é amor, o amor permeia todo o seu ser e todas as suas ações”. E reconhecem: “Quando afirmamos nossas convicções e nosso compromisso em termos de amor, estamos assumindo o mais básico e o mais difícil de todos os desafios bíblicos”. Será muito bom trazermos à memória a forma como o amor de Cristo nos alcançou para, em seguida, renovarmos o nosso amor por ele. É por isso que Paulo, em Efésios (a carta foi estudada em pequenos grupos durante o congresso), ora para que Cristo habite em nós a fim de que possamos, juntamente com todos os santos, compreender a largura, o comprimento, a altura e a profundidade e conhecer o amor de Cristo, que excede todo entendimento, para que sejamos cheios da plenitude de Deus. O Compromisso da Cidade do Cabo está dividido em duas partes: “Para o Senhor que amamos; o nosso compromisso de fé” e “Para o mundo em que servimos; o nosso compromisso de agir”. A primeira parte, entregue aos participantes, é composta de dez itens, todos iniciados com a expressão “nós amamos”. E assim transcorrem 21 páginas de declarações em amor: “Renovamos o nosso compromisso de não flertar com o mundo caído nem com suas paixões transitórias”, “amamos a Bíblia como uma noiva ama as cartas de seu noivo, não pelo papel propriamente dito, mas pela pessoa que fala por meio dele”, “o mais elevado de todos os motivos missionários não é a obediência à Grande Comissão nem o amor pelos pecadores que estão perecendo, mas o zelo apaixonado pela glória de Jesus Cristo”. As declarações abrangem todas as áreas da missão. A missão é a missão de Deus, que nasce do seu amor por todas as coisas criadas e que consiste em fazer convergir a Cristo todas as coisas no céu e na terra, reconciliando-as por meio de sua cruz (“Deus em Cristo reconciliando consigo todas as coisas” era o tema de Lausanne 3). Essa missão deve ser o nosso foco, o nosso chamado e a nossa paixão. O amor a que o Espírito de Deus nos inspira tem repercussões horizontais: é dele que vem a motivação de amar todos os povos, rejeitando qualquer forma de racismo e etnocentrismo e exigindo solidariedade e justiça, e de desejar que todas as nações o conheçam. Somos chamados também a ser uma comunidade que demonstre o amor de Deus. O Compromisso lembra que tanto o mandamento de Jesus de amarmo-nos uns aos outros como a sua oração (“para que todos sejam um”) são missionais: “Com isto todos saberão que sois meus discípulos” e “para que o mundo creia que tu [o Pai] me enviaste”. Esse é o grande desafio para o povo de Deus — “aqueles de todas as eras e nações que Deus em Cristo amou, escolheu, chamou e santificou como seu povo”. Neste mundo corrompido, temos sido apenas um reflexo fraco do amor, da alegria e da paz, não a noiva radiante de Cristo. Porém, o valor testemunhal de uma comunidade de amor é vital em lugares de sofrimento intenso — onde falar de um Deus amoroso parece brincadeira — ou em meio ao secularismo e à globalização, onde as relações são superficiais. Que o amor, fruto do Espírito Santo, cresça em nós! E que ele, o Espírito missionário do Pai missionário e do Filho missionário, sopre vida e poder na igreja missionária de Deus. O amor a que o Espírito de Deus nos inspira tem repercussões horizontais: é dele que vem a motivação de amar todos os povos, rejeitando qualquer forma de racismo e etnocentrismo e exigindo solidariedade e justiça
  • 29. Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 29 Um lugar para Lausanne 3 na história Lyndon de Araújo Santos Capa C ertamente, Lausanne 3 terá um lugar na história sob diferentes pontos de vista. Como testemunha ocular e num exercício de interpretação ampla, apresento algumas perspectivas históricas do congresso. História contemporânea. Em 1974, o congresso aconteceu no auge do conflito da Guerra Fria. Em 1989, ocorreu no início do período neoliberal e no fim do socialismo real. Em 2010, o congresso aconteceu num mundo mais multilateral em suas relações de força, urbano, plural e sob o alerta da destruição ambiental. História social. Lausanne 3 será lembrado pelo seu sentido histórico e relevância social. Deu-se o registro de um volume extraordinário de fontes históricas em discursos, documentos escritos e imagens. Memórias, sentimentos, percepções e olhares foram transformados em relatos orais, imagens e ações. Os efeitos desse impacto nos diferentes contextos trarão mudanças imprevisíveis em histórias de vida, contextos e comunidades. História conciliar do cristianismo. O congresso se inseriu na tradição conciliar da igreja (Hans Küng), embora sem um propósito dogmático normativo, tais como os concílios ecumênicos nos primeiros oito séculos de era cristã. Os católicos romanos tiveram Latrão (Idade Média), Trento (Idade Moderna) e Vaticanos 1 e 2 (1870 e 1962). Os protestantes tiveram Edimburgo em 1910. Entretanto, Lausanne se compreende como um movimento, enquanto os concílios são conclaves em torno de controvérsias teológicas e que redefinem rumos da igreja. História das religiões. Lausanne 3 expressou a pluralidade atual do cristianismo ante o desafio dos diálogos ecumênico e inter-religioso. A presença de observadores de outras igrejas cristãs sinalizou a postura de ouvir, observar e dialogar pelos seus diferentes ramos. Por sua vez, a ação missionária nos contextos islâmico, hindu, budista e de outras religiosidades demonstrou a exigência do debate sobre o relacionamento com outras crenças, a tolerância e o estatuto da verdade religiosa. História cultural. Lausanne realizou um evento globalizado no seu aparato tecnológico e numa perspectiva predominantemente ocidental. Um exemplo disso foram as imagens e representações veiculadas da África desde uma estética hollywoodiana. Não há uma África, mas Áfricas. Foi o primeiro Lausanne também online. Embora a globalização em seus congêneres negativos (pluralismo e secularismo) tenha sido confrontada como ameaça à igreja, esta mesma igreja se mostrou afinada com os seus avanços. História das missões. O congresso constatou o deslocamento da força missionária para o eixo América Latina/ África/Ásia. Será que essas igrejas criarão suas próprias perspectivas teológicas e eclesiais marcando o século 21 com um cristianismo latino- americano, africano e asiático? A opção será por uma ação missionária a partir do contexto de sua encarnação ou o discurso proposicional de imposição da verdade sobre o outro, conquistado não somente para a fé verdadeira, mas para uma cultura que se julga superior. Lausanne 3 demonstrou o esgotamento de um evangelicalismo etnocêntrico, nomeando inimigos a serem conquistados. Num movimento dialético, em 1974 os evangélicos discutiram a relação entre a proclamação e a responsabilidade social. Manila reafirmou a missão como anúncio a povos não-alcançados, em conflito com a missão como encarnação. Cidade do Cabo, por sua vez, recolocou a integralidade da missão pela força dos testemunhos e das experiências das comunidades cristãs no mundo. O lugar de Lausanne 3 na história se dará tanto por sua força como por suas fragilidades. Tal contradição pode se tornar um impulso motivador para a igreja no século 21. À beleza, luta e dinâmica missionária testemunhadas, se contrapôs a pouca reflexão teológica e missiológica sobre questões como gênero, diálogo inter-religioso, crise ambiental e homossexualidade. Quanto a uma história da igreja latino- americana, ficou uma dívida pela sua quase invisibilidade, não coerente com a sua atual dinâmica, incluindo o Brasil. Lyndon de Araújo Santos é historiador, professor universitário e pastor da Igreja Evangélica Congregacional em São Luís, MA. TheLausanneMovement
  • 30. 30 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011 O espírito de Lausanne O 1º Congresso Lausanne, em 1974, trouxe uma grande contribuição para o cristianismo global. O Pacto de Lausanne é reconhecido como um dos documentos mais completos sobre a missão da igreja. Desde então, o “movimento de Lausanne”, com seus altos e baixos, permanece como um referencial para a unidade missionária do mundo evangelical. O processo de compreensão e amadurecimento de tudo o que foi gerado a partir do Pacto de Lausanne levou vários anos. Compreender a missão integral da igreja e reconhecer que o evangelho de Jesus envolve todo o propósito de Deus para todo o ser humano, em todas as suas necessidades, não foi fácil e continua sendo um grande desafio. A busca pela contextualização, sem se deixar moldar por uma exegese cultural, tem requerido um esforço contínuo da igreja. Criar espaços de diálogo entre Norte e Sul, Leste e Oeste, ricos e pobres, homens e mulheres das mais diferentes matrizes sociais e/ou teológicas, e promover a unidade da igreja também não tem sido um caminho fácil. Porém, o que vimos no 3º Congresso Lausanne, na Cidade do Cabo, foi uma celebração de tudo isso e mais um pouco. A semente de Lausanne deu frutos. O espírito de Lausanne é hoje uma realidade no mundo evangélico. Ouvir testemunhos de irmãos e irmãs de todos os cantos do planeta, falando de suas lutas pela promoção da justiça, trabalhando pela reconciliação entre pessoas e grupos marcados pela hostilidade e pelo ódio, enfrentando corajosamente a opressão e a perseguição de governos totalitários, O CAMINHO DO CORAçãO Ricardo Barbosa promovendo a integração na igreja de pessoas e grupos marginalizados, foi a colheita da semente plantada em 1974. A preocupação com a devoção e a prática de uma espiritualidade bíblica e missionária, a afirmação da unicidade e centralidade de Cristo e sua autoridade final na proclamação do evangelho e no discipulado, o chamado à humildade, integridade e simplicidade, demonstraram que o “espírito” de Lausanne é hoje uma realidade no cristianismo global. Uma das marcas desse espírito está na linguagem do “Compromisso da Cidade do Cabo”. Em vez de usar a linguagem acadêmica dos pactos e declarações de congressos dessa natureza, usou-se uma linguagem pessoal e afetiva. O compromisso começa assim: “Para o Senhor que amamos: nosso compromisso de fé”. Toda a declaração é fundamentada em nossa resposta ao amor de Deus. No final da introdução, encontramos a seguinte explicação para a linguagem do amor: O amor é a linguagem da aliança. As alianças bíblicas, antigas e novas, são expressões do amor redentor de Deus e da graça que alcança a humanidade perdida e a criação deteriorada. Essa aliança nos convida a responder em amor. Nosso amor expressa nossa confiança, obediência e o compromisso apaixonado com a aliança do Senhor. O Pacto de Lausanne definiu a evangelização como: “Toda a igreja, levando todo o evangelho, para todo o mundo”. Essa continua sendo nossa paixão. Nesses quase 40 anos que nos separam do primeiro congresso, a linguagem teológica do terceiro congresso alcança a maturidade de uma linguagem de amor apaixonado. A teologia da missão integral deixa de ser defendida teologicamente para ser celebrada como expressão do nosso amor pelo próximo. Em 1974 e 1989 (Lausanne 2), a preocupação com a salvação da alma provocava fortes reações entre os que achavam que a missão integral era uma nova versão do “evangelho social”. Em Lausanne 3, vimos com alegria a superação dessas reações e a afirmação do “nosso amor por todo o evangelho”, “nosso amor por toda a igreja”, e “nosso amor por todo o mundo”. Cheguei à Cidade do Cabo sem saber ao certo o que iria acontecer. Minhas expectativas apostavam nas plenárias, nos grandes e controversos temas do século 21. As primeiras impressões foram de frustração. Pouco tempo para as plenárias e para as conversas das mesas; tudo apontava para uma superficialidade teológica. De certa forma, foi o que aconteceu com alguns temas. Porém, de repente, me dei conta de que o espírito do congresso era outro — precisava mudar o olhar e a disposição. Mudei e voltei cheio de esperança. Ricardo Barbosa de Sousa é pastor da Igreja Presbiteriana do Planalto e coordenador do Centro Cristão de Estudos, em Brasília. É autor de Janelas para a Vida e O Caminho do Coração. Compreender a missão integral da igreja continua sendo um grande desafio
  • 31. Janeiro-Fevereiro, 2011 I ULTIMATO 31 “Enfim sós!”— foi o que falei para minha esposa ao nos despedirmos de nosso filho no aeroporto. Ele havia se casado no dia anterior e estava indo com a esposa para o exterior para continuar o doutorado por mais 3 anos e meio. Nossa filha mais velha se casara oito anos antes e agora estávamos somente minha esposa e eu em casa. O chamado tempo do “ninho vazio”. Para muitos casais, esse é um tempo de desfrute da vida a dois. Todavia, para outros, é um tempo de pesar e luto. Por quê? Quando iniciamos a jornada conjugal, temos muitas expectativas: sobre o outro, sobre o relacionamento e a busca de um paraíso isento de perturbações. Logo vão surgindo algumas frustrações e a realidade se nos apresenta menos “cor-de-rosa” — o que pode ser superado por meio da arte do diálogo, pouco cultivada em muitos relacionamentos. Quando nascem os filhos, o casal assume compulsoriamente um segundo papel, além do conjugal: o papel parental (de pais). Filhos demandam cuidados, atenção e carinho. E o relacionamento que antes era entre duas pessoas passa a ser entre três. Assim, os cônjuges se veem obrigados a dividir as atenções, o cuidado e o carinho que eram dedicados somente um ao outro com essa terceira pessoa, e isso gera um desequilíbrio na relação. Se as frustrações do ideal não- atingido dos primeiros momentos do casamento não forem superadas com Ninho vazio boas novas ou desespero? Casamento e famíliaCarlos “Catito” Grzybowski e Dagmar Fuchs Grzybowski um diálogo fecundo, a desestabilização com a chegada do primeiro filho será maior e surge um enorme risco: a supervalorização do papel parental em detrimento do papel conjugal. Em outras palavras, com o nascimento do primeiro filho, o casal pode dedicar-se em demasia ao cuidado com o bebê e deixar de investir no relacionamento conjugal. O perigo é que após 20 e poucos anos os filhos se vão e o casal estará novamente sozinho. Se não houve investimento no relacionamento do casal, ele pode não ter mais motivação de continuar casado (muitos divórcios acontecem justamente após a saída do último filho de casa). Ou um dos pais pode apegar- se excessivamente a um dos filhos, não permitindo que ele tenha uma vida independente, e isso causará problemas não só para o seu próprio casamento, como também para o casamento dos filhos. Ou pior ainda: eles podem não permitir que um dos filhos se torne plenamente adulto e ele permanecerá em casa para “cuidar dos pais” — há filhos que são verdadeiros heróis e sacrificam a vida pessoal com essa finalidade. O equilíbrio entre os papéis parental e conjugal é delicado e muito dinâmico. Também não é possível fixar-se somente no papel conjugal e abandonar os filhos. Em nossa cultura, entretanto, é mais comum — e um sinal de desequilíbrio dos papéis — que com o nascimento do primeiro filho o casal deixe de se tratar pelo apelido carinhoso de até então (amorzinho, querida, fofinho etc.) e passe a se tratar pela função (pai, mãe). Esse é um sinal de alerta de que a relação conjugal pode estar sendo colocada em segundo plano. Assim, para o casal ter um tempo agradável de vida a dois depois que os filhos se emancipam, deve desde cedo buscar esse equilíbrio dinâmico, não deixando de investir no relacionamento a dois. O salmista compara os filhos com flechas (Sl 127). Ora, as flechas existem para serem atiradas para longe, não para serem guardadas em casa! O tempo de ninho vazio deve ser um tempo de alegria e aprofundamento da intimidade conjugal — jamais de desesperança! Carlos “Catito” e Dagmar são casados, ambos psicólogos e terapeutas de casais e de família. Catito é autor de Como se Livrar de um Mau Casamento e Macho e Fêmea os Criou, entre outros. O tempo de ninho vazio deve ser um tempo de alegria e aprofundamento da intimidade conjugal — jamais de desesperança AliFarid
  • 32. 32 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011 A partir de hoje, com a ajuda de Deus, não vou ter crises de raiva, mesmo que alguém me irrite e que alguma circunstância me aborreça. A raiva pode ser o estopim de uma briga, de uma separação e até de um crime de sangue. Morto de raiva, Saul arrojou uma lança contra Davi, que só não morreu porque conseguiu desviar-se dele por duas vezes (1Sm 18.10). A raiva é uma coisa tão séria, que o verbo enraivecer tem vários sinônimos: enfurecer-se, enraivecer-se, irar-se, raivar, raivecer, raivejar. Por meio de uma explosão de raiva, mostra- se o que está no íntimo; a fúria, a indignação, a ira, o ódio, o rancor. A raiva está sempre na companhia de outras obras da natureza pecaminosa do ser humano, como brigas, calúnias, ciúmes, discórdia, dissensões, divisões, egoísmo, facções, intrigas e invejas (2Co 12.20; Gl 5.19-21). Um dos Salmos mais bonitos da Bíblia diz: “Não fique com raiva, não fique furioso. [...] Pois isso será pior para você” (Sl 37.8, NTLH). Os Provérbios estão cheios de conselhos contra a raiva: “O homem que fica com raiva por qualquer coisa precisa ser castigado várias e várias vezes” (Pv 19.19, BV); “O tolo mostra toda a sua raiva, mas quem é sensato se cala e a domina” (Pv 29.11, NTLH); Não quero me enraivecer com qualquer pessoa ou qualquer acontecimento DE HOJE EM DIANTE... “Quando você vai ajuntando raiva contra outra pessoa acabará tendo uma briga violenta com ela” (Pv 30.33, BV). Estou ciente de que a tentação da raiva existe. Por falta de carinho, de sabedoria, de paciência e de tempo, até os pais podem levar os filhos à raiva (Ef 6.4). Quando os defeitos alheios me afetam e me infernam a vida, minha propensão raivosa pode vir à tona e complicar ainda mais as coisas. Deus me livre, mas posso ser tentado a ter raiva dele quando me acontece algo inesperado em uma hora imprópria, quando adoeço, quando entro definitivamente no vale da sombra da morte. Talvez não haja raiva mais pecaminosa do que a raiva de Deus. Também não devo associar o pecado da inveja ao pecado da raiva, o que é muito comum. Talvez eu possa parafrasear Asafe e escrever: “Quando vi que tudo ia bem para os orgulhosos e os maus, quase perdi a confiança em Deus porque fiquei com inveja deles” (Sl 73.2-3, NTLH). Tudo é verdade. A raiva é forte, é frequente e é fácil. Porém eu, de hoje em diante, com a ajuda do Senhor, vou levar a sério o conselho de Paulo: “Abandonem toda amargura, todo ódio e toda raiva” (Ef 4.31, NTLH). Vou levantar as mãos para os céus, para Deus, livre do pecado, da raiva e do rancor (1Tm 2.8). Inculcarei em minha mente para sempre o que Tiago me ensina: “A raiva humana não produz o que Deus aprova” (Tg 1.20, NTLH)! PaoloGadler
  • 34. 34 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011 renascimento? No Google você encontra nas referências sobre a tribo Zoé, que vive entre o Pará e o Amazonas, esse tom religioso. Pesquisadores e cineastas franceses veem neles a esperança de um renascimento para a humanidade. Porém, como todas as outras, os Zoé são apenas uma tribo brasileira pequena tentando sobreviver. Foram contatados pela Missão Novas Tribos do Brasil na década de 80. Foram conduzidos com cuidado do isolamento a um estágio intermediário, em que recebiam ajuda da Missão para as necessidades básicas. O isolamento por si só não garante a sobrevivência de nenhuma tribo, ao contrário do que dizem os sertanistas. Massacres de tribos isoladas inteiras, causados por contaminações de doenças, por seringueiros, madeireiros ou outros predadores amazônicos, ou até por guerras entre tribos ou clãs, acontecem com frequência. Voltando à história dos Zoé, a Missão acabou sendo expulsa da área. Os Zoé eram bonitos e puros demais para ficarem em contato com uma missão. Afinal, ela institucionaliza tudo o que mais odiamos no Ocidente: sua religião. A religião cristã continua pregando o que mais queremos esquecer, continua representando no mundo acadêmico moderno a cristalização dos valores que nos tornaram (entenda aqui a ironia) capazes de criticar aquilo que somos. Fora com eles. A missão deu lugar aos “humanistas” da Funai. Verbas internacionais vieram e o projeto Zoé se tornou modelo. Um hotel de selva foi construído em frente à aldeia. Tudo o que dava acesso a outro mundo foi retirado. Eles passaram a viver numa ilha de selva virgem O Ocidente está adoecido pelo ódio a si mesmo. Olhamos para nossa história, para o produto de nosso progresso, para nossa sociedade, e não gostamos do que vemos. O rei está nu. A utopia política do início do século passado se tornou uma experiência vergonhosa de domínio de poucos sobre as massas. As mentiras sobre superioridade racial em que acreditamos se transformaram em sangrentos genocídios. O capitalismo que iria permitir ao proletariado qualidade de vida se tornou um monstro de produzir riquezas, que nos engole sem piedade. As propostas religiosas se emaranharam promiscuamente a qualquer ideia que pagasse mais. Enfim, demos com os burros n’água vez após vez. Desiludimo-nos e nos odiamos. Precisamos de uma nova gênese. Por causa disso, olhamos para os índios isolados com uma esperança rousseauniana. Serão eles nosso vigiada apenas por observadores bem- acomodados. Os vídeos na internet que retratam a tribo são lindos, feitos com equipamento de alta qualidade só possível devido ao conforto e à tecnologia oferecidos pelo hotel/ observatório. A tribo “virgem” agora se torna entretenimento de turistas de alta classe, uma espécie de zoológico humano servindo ao voyerismo de antropólogos e cineastas estrangeiros. Suprema ironia. Os selvagens são mantidos escravos por causa de sua pureza. Vistos de longe, os Zoé são na’vi azuis andando por Pandora com rabos longos, etéreos, perfeitos. De perto, são um povo escravo de um idealismo que não inventaram. Presos a um paleolítico circunstancial, são impedidos de mudar. Não são humanos, não são cidadãos, não são nem índios brasileiros. São uma metáfora internacionalizada do ódio de nossa cultura por si mesma. O problema é que, não sabendo disso, eles fugiram de seu paraíso terrestre. Em outubro de 2010, os Zoé fugiram para pedir ajuda aos castanheiros locais e ao mundo. Num vídeo tosco filmado por um dono de castanhal, os índios se expressam em português fluente: “A gente quer coisa. A gente quer panela, faca, anzol. A gente quer ter o que os Tirió tem. Funai não dá nada pra nós não, mas a gente quer”. Tradução? Os Zoé estão dizendo: “A gente quer parar de ser uma coisa, a gente quer ser gente, vocês vão permitir?”. Bráulia Ribeiro trabalhou na Amazônia durante trinta anos. Hoje mora em Kailua-Kona, no Havaí, com sua família e está envolvida em projetos internacionais de desenvolvimento na Ásia. É autora de Chamado Radical. braulia.ribeiro@uol.com.br O rei está nuDe como os Zoé se tornaram vítimas do ódio que o Ocidente tem a si mesmo DA LINHA DE FRENTE Bráulia Ribeiro FernandoGiantaglia
  • 36. 36 ULTIMATO I Janeiro-Fevereiro, 2011 materiais (ver Lucas 14.25-33). A formação de discípulos à imagem de Cristo acontece no contexto da comunidade de fé, não fora dela. Jesus diz: “Nisto conhecerão todos que sois meus discípulos: se tiverdes amor uns aos outros” (Jo 13.35). É claro que, para Jesus, a marca do discípulo é o amor. No entanto, ninguém pode aprender a amar estando isolado dos demais. Efetivamente, a experiência do amor de Cristo, que segundo Paulo “excede todo entendimento”, só é possível “com todos os santos” (Ef 3.18-19). Só é possível na igreja, “a família de Deus”, onde os discípulos aprendem a amar, e não só a amar, mas também a servir, a orar, a resistir ao mal, a cultivar o bem. Na igreja, o Corpo de Cristo, onde os discípulos descobrem e exercem seus dons e crescem para chegar “à unidade da fé e do pleno conhecimento do Filho de Deus, à perfeita varonilidade, à medida da estatura da plenitude de Cristo” (Ef 4.13). Para iniciar o caminho do discipulado é preciso arrependimento, ou seja, uma decisão pessoal que envolve a renúncia irrevogável a uma vida dirigida por Deus e a disposição de identificar-se com Jesus em seus sofrimentos. Aqueles que começam a seguir Jesus só podem avançar em sua peregrinação conforme experimentam a graça de Deus na igreja e por meio dela. Traduzido por Wagner Guimarães C. René Padilla é fundador e presidente da Rede Miqueias, e membro-fundador da Fraternidade Teológica Latino-Americana e da Fundação Kairós. É autor de O Que É Missão Integral? . diária, tanto no privado como no público, tanto no pessoal como no social, tanto no espiritual como no material. O chamado do evangelho é um chamado a uma transformação integral que reflita o propósito de Deus de redimir a vida humana em todas as suas dimensões. Uma transformação baseada no evangelho integral, ou seja, centrada em Jesus Cristo e orientada para o cumprimento do desejo de Jesus de que seus discípulos sejam “sal da terra” e “luz do mundo”. Assim entendido, o discipulado tem um custo inevitável. E um aspecto desse custo é a renúncia a tudo o que interfere na lealdade absoluta a Jesus Cristo como Senhor. Ele mesmo definiu as condições do discipulado. E as definiu de tal modo que não deixou dúvida de que seu chamado é para um discipulado radical, que envolve uma obediência coerente com a vontade de Deus em todas as áreas da vida, desde as relações familiares até as posses A formação de discípulos (parte 2) O mandato de Jesus Cristo é claro: “Fazei discípulos [...], ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho ordenado” (Mt 28.19, 20). Sabemos que o conteúdo do ensino sobre a formação de discípulos não é apenas teórico. Sem negar a importância da doutrina ou da teologia, a ênfase recai na prática do ensinamento de Jesus Cristo — a prática da verdade. Com o batismo inicia-se um processo de transformação que abarca a totalidade da vida; um processo de aprendizagem do que significa a obediência ao ensinamento de Jesus Cristo, isto é, à vontade de Deus. Sem obediência à vontade de Deus, não há discipulado genuíno. Sob a perspectiva bíblica, a ortopraxia, a obediência a tudo o que Jesus ordenou a seus discípulos, é no mínimo tão importante quanto a ortodoxia — se não for mais, já que sua meta é que os discípulos vivam em função do amor e assim sejam filhos do Pai que está nos céus, perfeitos, assim como ele é perfeito (Mt 5.45, 48). Os discípulos de Jesus não se distinguem por serem meros adeptos de uma religião (um culto a Jesus), mas sim por terem um estilo de vida que reflete o amor e a justiça do reino de Deus. Portanto, a igreja não pode limitar-se a proclamar uma mensagem de “salvação da alma”: sua missão é fazer discípulos que aprendam a obedecer ao Senhor em todas as circunstâncias da vida MISSãO INTEGRAL René Padilla Os discípulos de Jesus não se distinguem por serem meros adeptos de uma religião, mas sim por terem um estilo de vida que reflete o amor e a justiça do reino de Deus