O documento resume o enredo do romance Memorial do Convento de José Saramago através de 4 frases iniciadas por "Era uma vez". Resume que o livro conta a história da construção do Convento de Mafra pelo rei D. João V, o amor proibido entre Baltasar e Blimunda, e os sonhos do padre Bartolomeu de Gusmão de criar uma máquina voadora.
3. "Era uma vez um Rei que fez a
promessa de levantar um
convento em Mafra. Era uma
vez a gente que construiu
esse convento. Era uma vez
um soldado maneta e uma
mulher que tinha poderes. Era
uma vez um padre que queria
voar e morreu doido. Era uma
vez.“
in Memorial do Convento,
Editorial Caminho
4. Contracapa: texto-síntese
Era uma vez: ficção (maravilhoso,
contos populares, fábulas,…)
A fórmula inicial «Era uma vez» conduz-nos para um
mundo fictício, o das histórias de crianças. A repetição
desta fórmula é intencional e convida-nos a entrar num
mundo onde tudo é imaginário, exceto aquilo que se
conhece ser verdadeiro: o convento que sabemos existir
em Mafra e, o rei que viveu nessa época.
5. Esta sinopse aponta para as duas dimensões que estruturam o
romance:
•Uma dimensão literária, onde pontua o maravilhoso: ‘Era
uma vez’; neste universo mágico, evoluem personagens
fictícias que representam um povo explorado, oprimido sob o
jugo da tirania do poder.
•Uma dimensão histórica, baseada em factos e personagens
verídicos: o rei D. João V, o Convento de Mafra, o aeróstato do
padre Bartolomeu de Gusmão, o músico Domenico Scarlatti.
6. A partir desta informação da contracapa, podemos esquematizar
as linhas de força da arquitetura do romance Memorial do
Convento, considerando a estruturação das suas ações principais:
Pelo povo, a Pelo padre
mando do rei Bartolomeu,
D. João V ajudado por
Baltasar,
Blimunda e
Scarlatti
7. «Era uma vez um rei (…)»
O rei é D. João V (1689-1750), filho de D. Pedro II e da rainha
Maria Sofia. Foi proclamado rei em 1 de janeiro de 1707 e casou
no ano seguinte com D. Maria Ana de Áustria, de quem teve seis
filhos. Teve um longo reinado, bastante controverso, pois há
quem considere que tenha sido um bom governador e há quem
considere que foi péssimo administrador das imensas riquezas
que a descoberta e exploração das minas de ouro e de pedras
preciosas do Brasil, trouxeram a Portugal.
O rei fez promessa de construir um Convento em Mafra porque
estava preocupado com a falta de descendentes. Apesar da
existência de bastardos pretendia que a rainha lhe desse um
filho varão para suceder ao trono. O convento irá construir-se
após o nascimento da princesa Maria Bárbara.
8. «Era uma vez a gente que construiu esse convento».
A gente que construiu esse convento é o povo, o povo anónimo
que trabalha e sofre às ordens do rei, para cumprir a sua
promessa e satisfazer a sua vaidade. Personagem coletiva muito
importante, o povo é elogiado e enaltecido pelo narrador/autor
que tenta tirá-lo do anonimato e o individualiza em várias
personagens e também, simbolicamente, atribui-lhe um nome
para cada letra do alfabeto (ex.: Cap. XIX).
É dentre o povo que surgem personagens como Francisco
Marques, Manuel Milho, José Pequeno e o par amoroso Baltasar e
Blimunda. A parte da Epopeia da Pedra é importante para
reconhecer o trabalho e o sofrimento do povo na construção do
Convento (Cap. XIX).
9. Era uma vez a gente que construiu esse convento.
10.
11. «Era uma vez um soldado maneta e uma mulher que tinha poderes»
Baltasar Mateus, mutilado da guerra da Sucessão espanhola, donde foi expulso
por ter perdido uma mão. É de Mafra e de regresso a Lisboa encontra Blimunda,
numa procissão de um auto-de-fé, em pleno Rossio. A partir desse momento
passam a viver juntos uma história de amor e de paixão. É um dos operários que
constrói o Convento de Mafra e participa também na construção da Passarola.
Blimunda é filha de Sebastiana de Jesus que ia condenada ao degredo em
Angola, na procissão do Auto de fé (uma das medidas de repressão utilizadas
pelo Tribunal do Santo Ofício – Inquisição – consistia numa cerimónia em sessão
pública onde eram lidas e executadas as sentenças a todos os que para a Igreja
Católica praticavam heresias)em que eles se encontraram. Blimunda é vidente,
tem a capacidade de, em jejum, olhar para dentro das pessoas e das coisas.
Ajuda igualmente na construção da Passarola, recolhendo «vontades».
12.
13. «Era uma vez um padre que queria voar e
morreu doido»
O Padre Bartolomeu de Gusmão tinha o sonho de
voar e, por isso, construiu a Passarola. Tem a
proteção e a amizade de D. João V mas nem isso
o livra da perseguição do Santo Ofício. O seu
sonho é realizado com a ajuda de Baltasar e de
Blimunda e do músico Scarlatti. Acaba por morrer
louco, em Toledo, para onde havia fugido.
14. Saramago escreve de forma a fazer refletir sobre uma organização
social, religiosa e política.
O romance desenvolve-se articulando três núcleos narrativos:
o projeto e construção do convento de Mafra, no espaço do
rei;
a história de amor entre um soldado “maneta”, mutilado da
guerra, e uma jovem com poderes “paranormais”, uma
vidente – ele Baltasar Sete-sóis, ela Blimunda Sete-luas;
a construção da passarola arquitetada por padre Bartolomeu,
descendente de portugueses morador do Brasil, e que, nesse
cenário, foi a Portugal com o objetivo de construir a “máquina
voadora”. Ele representa a face prospetiva naquela
sociedade, o mundo da ciência que busca projeção e é
tolhido.
Destacam-se 3 fios diegéticos / narrativos, que se entrelaçam por via da ação das personagens que intervêm nas três ações: A construção do convento O amor entre Baltasar e Blimunda A construção da passarola voadora (Bartolomeu)
Daqueles homens que conhecemos no outro dia, vão na viagem José Pequeno e Baltasar, conduzindo cada qual sua junta, e, entre o pessoal peão, só para as forças chamado, vai o de Cheleiros, aquele que lá tem a mulher e os filhos, Francisco Marques é o nome dele, e também vai o Manuel Milho, o das ideias que lhe vêm e não sabe donde. Vão outros Josés, e Franciscos, e Manuéis, serão menos os Baltasares, e haverá Joões, Álvaros, Antónios e Joaquins, talvez Bartolomeus, mas nenhum o tal, e Pedros, e Vicentes, e Bentos, Bernardos e Caetanos, tudo quanto é nome de homem vai aqui, tudo quanto é vida também, sobretudo se atribulada, principalmente se miserável, já que não podemos falar-lhes das vidas, por tantas serem, ao menos deixemos os nomes escritos, é essa a nossa obrigação, só para isso escrevemos, torná-los imortais, pois aí ficam, se de nós depende, Alcino; Brás, Cristóvão, Daniel, Egas, Firmino, Geraldo, Horácio, Isidro, Juvino, Luís, Marcolino, Nicanor, Onofre, Paulo, Quitério, Rufino, Sebastião, Tadeu, Ubaldo, Valério, Xavier, Zacarias, uma letra de cada um para ficarem todos representados, porventura nem todos estes nomes serão os próprios do tempo e do lugar, menos ainda da gente, mas, enquanto não se acabar quem trabalhe, não se acabarão os trabalhos, e alguns destes estarão no futuro de alguns daqueles, à espera de quem vier a ter o nome e a profissão. (cap. XIX)