Esta decisão judicial trata de um caso de ação contra profissionais de saúde. O documento (1) permite a aplicação dos princípios do novo Código de Processo Civil de 2015 (NCPC) ao caso, garantindo o contraditório e evitando decisões surpresa, (2) pede às partes que esclareçam se o atendimento ocorreu no sistema público ou privado, pois isso afeta a legitimidade dos réus e competência do juízo.
Material de Apoio Curso "Reformas do Processo Penal - Lei 12.403/11 2a Parte"
Aplicação CPC /15 Vedação decisão surpresa
1. Estado do Paraná
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PODER JUDICIÁRIO
ESTADO DO PARANÁ
COMARCA DE FOZ DO IGUAÇU
Autos n.º XXXXXXXXXXX.2014.8.16.0030
D E C I S Ã O
1. Ainda que eu seu vacatio legis, a Lei 13. 105/2015 (NCPC), pelo
menos em relação à sua natureza principiológica já admite a sua aplicação ao processo
civil, até mesmo pelo fato de que na maioria das vezes somente positivou princípio já
tratados na doutrina e jurisprudência há vários anos. Ressalte-se que não se trata de
aplicação de lei, antes de sua vigência, o que, por certo violaria os mais fundamentais
princípios de direito, mas sim, a aplicação dos novos princípios previstos no NCPC,
como referência de aplicação da legislação ainda vigente. Como leciona Dierle Nunes1
:
O que aqui se defende é que no âmbito
interpretativo os próprios aplicadores, com destaque para os
tribunais (e doutrina), comecem a adaptar seu modo de
interpretar o sistema processual em conformidade com as
novas premissas. (...)
Obviamente, que as disposições normativas
do CPC 2015 indicadas não estão em vigor, mas suas
potencialidades interpretativas são inteiramente aplicáveis,
na atualidade, e seria altamente recomendável que já
começassem a ser utilizadas de modo a reduzir o desgaste
que toda transição gera.
2. A aplicação de princípios positivados no NCPC às decisões
proferidas ainda sob a égide do CPC/73 garante prospectivamente a garantia de
coerência no sistema, evitando-se para o futuro contradições desnecessárias no
sistema. Como leciona Humberto Ávila2
, sobre o postulado da coerência do sistema
jurídico:
1
NUNES, Dierle. Interpretação processual já deveria considerar conceitos do novo CPC. Disponível em
http://goo.gl/X6cQa9, acesso em 27/04/2015
2
ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicados dos princípios jurídicos. Malheiros, 14ª ed.
p.97148
2. Estado do Paraná
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COMARCA DE FOZ DO IGUAÇU
A conexão de sentido ou a relação de
dependência entre as normas é um reconhecido postulado
hermenêutico: trata-se de uma condição de possibilidade do
conhecimento a ser necessariamente preenchida na
interpretação dos textos normativos. A coerência é tanto um
critério de relação entre dois elementos como uma
propriedade resulta dessa mesma relação.
3. Partindo dessa premissa, tem-se que aos presentes autos são
aplicáveis os artigos 9º e 10º do CPC/153
, que garantem a necessidade de preservação
do contraditório pleno por meio da vedação da decisão surpresa4
. Como lecionam
Nelson Nery e Rosa Maria Nery5
:
“Este dispositivo juntamente com o CPC 10,
veda a chamada decisão surpresa, a qual se baseia em fatos
ou circunstâncias que não eram de conhecimento da parte
prejudicada pela mesma decisão.”
4. Aliás, no direito português, sob a vigência do atual Código de
Processo Civil de 20136
, o entendimento é o mesmo acerca da vedação ao julgador de
decidir contra a parte sem lhe oportunizar a manifestação.
5. Destaque-se que, ainda que o Enunciado 057
, aprovado no
Seminário - O Poder Judiciário e o Novo Código de Processo Civil da Escola
Nacional de Formação de Magistrados, em correto entendimento, refira que não se
3
Art. 9o Não se proferirá decisão contra uma das partes sem que ela seja previamente ouvida.
Parágrafo único. O disposto no caput não se aplica:
I - à tutela provisória de urgência;
II - às hipóteses de tutela da evidência previstas no art. 311, incisos II e III;
III - à decisão prevista no art. 701.
Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha
dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício.
4
“Verbot der Überraschungsentscheidungen”, na terminologia germânica.
5
Comentários ao Código de Processo Civil, Ed. RT, ano 2015, p. 211
6
Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho : Artigo 3.º Necessidade do pedido e da contradição
1 - O tribunal não pode resolver o conflito de interesses que a ação pressupõe sem que a resolução lhe seja pedida por
uma das partes e a outra seja devidamente chamada para deduzir oposição.
2 - Só nos casos excecionais previstos na lei se podem tomar providências contra determinada pessoa sem que esta
seja previamente ouvida.
3 - O juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe
sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de
conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem.
4 - Às exceções deduzidas no último articulado admissível pode a parte contrária responder na audiência prévia ou,
não havendo lugar a ela, no início da audiência final.
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Não viola o art. 10 do CPC/2015 a decisão com base em elementos de fato documentados nos autos sob o
contraditório.
3. Estado do Paraná
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aplica o art. 10º do CPC/15 quando a matéria de fato esteja devidamente documentada
nos autos e dela tenham tido acesso às partes, no caso dos autos entendo necessário
que as partes sejam cientificadas para manifestar-se, posto que, aparentemente a
questão de fato não se encontra devidamente esclarecida.
5. No caso dos autos se vislumbra que a parte autora moveu a ação
contra os profissionais de saúde que lhe atenderam, contudo, do que se observa dos
prontuários de atendimento (mov. 1.9 e 1.10) este atendimento se deu em Posto de
Saúde do Município de Foz do Iguaçu o que, em tese, permitiria a incidência do art. 37,
§6º da CF/88, com reflexos diretos na legitimidade dos réus e da própria competência
do juízo.
6. Assim, esclareçam as partes, em 48(quarenta e oito) horas, se
efetivamente o atendimento prestado pelos réus se deu dentro do sistema único de
saúde pelo Município de Foz do Iguaçu, ou a título privado, após, voltem para decisão.
7. Intimações e diligências na forma do CNCJ.
Foz do Iguaçu, 27 de abril de 2015.
ROGERIO DE VIDAL CUNHA
Juiz de Direito Substituto