DeClara n.º 75 Abril 2024 - O Jornal digital do Agrupamento de Escolas Clara ...
09 - O teatro
1. A palavra e o gesto para dramatizar: o teatro
O teatro, como conhecemos hoje no mundo ocidental, tem suas raízes na Grécia
antiga de antes, muito antes da era cristã. Em homenagem aos deuses, os gregos faziam
procissões que, ao final, tornavam-se festas, com, inicialmente, apresentação de histórias ou
homenagens em coro. Assim, grupos de vozes se organizavam e diziam as histórias, os
poemas. Um dia um homem apresentou sozinho o poema e foi seguido pelo coro. E de
apresentação em apresentação, o teatro foi de tornando o que é hoje em dia.
As peças eram, de maneira geral, uma dramatização de acontecimentos de que
tinham notícia. Dessa forma, o tempo dos mitos foi se transformando, pela expressão
teatral, na era da expressão do humano, com suas fraquezas, contradições e seus atos
heroicos.
Os gêneros predominantes da Antiguidade são:
Tragédia - gênero em que os personagens eram sempre de classes sociais superiores:
ou deuses ou nobres; a intenção era provocar o terror e a compaixão.
Comédia - gênero em que os personagens eram pessoas do povo; a intenção era
apontar os erros, as falhas humanas pelo riso.
O texto teatral é aquele que serve à representação teatral. É, portanto, um texto
dramático. Para Vítor Manuel Aguiar e Silva, o drama procura representar a totalidade da
vida, através de ações humanas que se opõem. A vida é assim representada nos seus
momentos de exaltação e de crise, as relações humanas são apreendidas nos seus momentos
de tensão antagônica.
Embora o texto dramático se assemelhe a outros textos narrativos, pelo fato de
também contar uma história, é diferente deles, pois é escrito para ser representado. Para
isso, o texto teatral elimina figuras supérfluas, abole episódios laterais, defrontando as
personagens necessárias e desenvolvendo com elas uma ação que conduz sem desvios ao
conflito.
O texto teatral exige a presença física do vulto humano e, ainda que a intriga se situe
no passado ou no futuro, a ação dramática apresenta-se sempre como atualidade para o
espectador.
No teatro, personagem e espectador estão frente a frente, coexistem, e é perante os
olhos do espectador, fisicamente presente, que a ação se desenvolve. Na narração de um
romance ou conto, as figuras são desenhadas como opiniões do narrador, ao passo que, no
texto teatral, elas se desenham como gestos.
No romance e no conto, o narrador pode penetrar na intimidade da personagem. No
texto teatral só a voz, o gesto, o silêncio e a encenação podem revelar algo sobre as
personagens e seus conflitos.
Colégio Pedro II - Unidade Tijuca II
Departamento de Língua Portuguesa
Coordenadora: Rosângela Abraão
Professoras: Vanessa, Patrícia e Andreia
2. SOBRE A TRAGÉDIA GREGA
A tragédia, segundo Aristóteles, é a imitação de uma ação importante e completa.
Esta ação não é apresentada com a ajuda de uma narrativa, mas sim por atores. Ela é feita
para provocar a compaixão e o terror e, dessa forma, permitir a purgação das emoções de
quem assiste a ela.
A ação encenada não tem por finalidade imitar costumes, objetiva, sim, representar
estes mesmos costumes.
Na Grécia, a tragédia servia não só para distrair o povo como também tinha a
pretensão de ensinar os valores considerados importantes pela aristocracia, daí que o Estado
tinha muito interesse nas exibições dos textos trágicos. Se observarmos com atenção
alguns outros trechos escritos na época, vamos ver que, geralmente, os personagens eram
semideuses, heróis grandiosos, figuras míticas, seres que tinham um poder diferente do
homem comum.
Características do texto teatral
O diálogo constitui o elemento dominante e essencial de um texto dramático. No
diálogo, manifestam-se uma oposição e uma luta de vontades que caracterizam o conflito,
elemento essencial que possibilita ao leitor ou à plateia criar expectativa em relação aos
fatos que lê ou vê. O conflito é, portanto, qualquer elemento da história que se opõe a
outro, criando uma tensão que organiza os fatos narrados e, consequentemente, prende a
atenção do leitor ou da plateia.
O conjunto de elementos que compõem no palco o espaço em que ocorrem as ações
é chamado cenário. Quando o texto teatral é encenado, exige, além do cenário, outros
elementos, como música, luz, figurino, maquiagem, gestos, movimentos etc.
No texto teatral escrito, o autor indica esses elementos nas rubricas. As rubricas
aparecem em letra de tipo diferente (normalmente em itálico) e indicam como as
personagens devem falar (rubrica de interpretação) e como devem se movimentar (rubrica
de movimento). Quando lemos um texto dramático, as rubricas cênicas procuram nos dar
informações sobre aquilo que se vê no palco.
A linguagem empregada no texto teatral varia de acordo com a época em que ele foi
escrito, com a época que o autor quer retratar e com a procedência e o nível social e cultural
das personagens.
Quando a peça teatral é longa, ela costuma ser dividida em partes, que são
chamados atos.
CARACTERÍSTICAS DO TEXTO TEATRAL ESCRITO:
• normalmente dispensa narrador;
• contém os elementos básicos da narrativa: fatos, personagens, tempo e lugar;
• apresenta discurso direto como estrutura básica de construção de texto e desenvolvimento
das ações;
• identifica o nome da personagem antes de sua fala;
• apresenta rubricas de interpretação e de movimento;
• o nível da linguagem é adequado à personagem e ao contexto;
• às vezes, apresenta divisão em atos.
3. ATOR, TEXTO E PÚBLICO
Não há fenômeno teatral sem a conjunção da tríade ator, texto e público: um ator
interpreta um texto para o público. E entre ator e público é estabelecida uma cumplicidade:
ambos sabem que se trata de um jogo, de uma representação. Por meio da razão e da
emoção, estabelece-se um diálogo vivo entre ator e público. Proporcionando prazer, o
teatro age diretamente sobre os homens. Ele ensina, provoca, faz refletir.
Cereja, William Roberto & Magalhães, Thereza Cochar. Português: linguagens: volume único. São Pauio:
Atual. 2003.
Édipo Rei
Édipo Rei é uma das tragédias mais significativas desse início. Sófocles,
considerados um dos maiores autores da Antiguidade, trouxe à cena a peça sobre a história
de Édipo. Essa obra mostra o homem em face do destino, do qual não pode se desvencilhar,
mesmo que fuja dele.
Você vai ler uma tradução/ adaptação do texto para os dias de hoje. Na verdade, as
peças da Antiguidade eram longas, sua apresentação durava vários dias, e eram feitas em
versos. Repare que no texto dramático (teatral) uma história é contada, mas não há a
presença do narrador conduzindo o enredo; são os personagens que, por meio de sua fala,
gestos e ações, conduzem a história.
O narrador/autor/diretor dá apenas indicações de entrada, saídas e expressões faciais
ou corporais, em alguns casos. Para se entender a história, temos que Édipo era filho natural
de Jocasta e Laio, reis de Tebas. Esses reis, ao terem o seu filho, decidiram por entregá-lo a
um servo/pastor para que o matasse, já que o Oráculo de Delfos vaticinou que o filho deles
iria matar o pai e desposar a mãe – era em Delfos, cidade próxima a Tebas, que ficava um
dos Oráculos mais importantes da época. Naqueles tempos, em que deuses decidiam o
destino dos homens, era comum os cidadãos irem aos templos saber do seu destino, ou o
que lhes era destinado pelos deuses. Mas o empregado não o matou, preferindo entregá-lo a
um mensageiro, que levou o bebê para os reis de outra cidade, Corinto, onde ele cresceu.
Édipo, já era um jovem rapaz quando descobre em uma festa, por meio de um bêbado, que
era filho adotivo de Pólibo e Mérope. Nesse momento vai ao Oráculo de Delfos e procura
saber a verdade. Lá não fica sabendo se era filho adotivo ou não, mas escuta a mesma
notícia que ouviu Laio anteriormente. Então decide sair de Corinto sem rumo, e acaba
chegando a Tebas;
Sobre os personagens, é bom saber:
• Jocasta – rainha de Tebas, bela mulher, que, viúva de Laio, casa-se com Édipo.
• Laio – rei de Tebas, marido de Jocasta.
• Creonte – irmão de Jocasta, cunhado de Édipo.
• Tirésias – velho adivinho cego, capaz de ver o passado e o futuro.
• O Coro – formado pelo povo de Tebas.
4. • Corinto – chefe do coro.
Exercícios:
1) Levantamento de vocabulário. Relacione as palavras aos significados (contextualizados):
VERBOS
(a) prosternar [p. 4]
(b) condoer [p. 4]
(c) redimir [p. 4]
(d) macular [p.6]
(e) descurar [p.6]
(f) secundar [p. 7]
(g) predizer [p.11]
(h) urgir [p.6 e13]
(i) sucumbir [p.14]
(j) vaguear [p.15]
(k) atinar [p.15]
( ) v. trans. dir ajudar, apoiar (em funções); coadjuvar, auxiliar
( ) v. intrans. ser urgente, premente, inadiável ou indispensável; instar
( ) v. trans dir.reparar (falta, falha, crime etc.); expiar
( ) v. trans. dir dizer antecipadamente; prever, profetizar
( ) v. trans. indir não cuidar, não tratar (de)
( ) v. pron. curvar-se ao chão em sinal de profundo respeito.
( ) v. trans dir pôr mancha em; sujar; comprometer (alguém, algo ou a si mesmo) por
meio de algo vil, desonroso.
( ) v. trans dir. ou pron inspirar ou sentir dó, pena, tristeza, comiseração; comover(-se),
compadecer(-se).
( ) v. intrans. andar passeando por (lugares) sem rumo certo, ao acaso; perambular, vagar
( ) v. trans. ind. e intrans. não resistir, ser vencido; ceder, entregar-se
( ) v. trans. dir descobrir por dedução, perceber por algum sinal, probabilidade etc.;
enxergar, perceber, acertar
SUBSTANTIVOS
(a) incenso [p. 4]
(b) archote [p. 4]
(c) tributo [p. 4]
(d) concurso [p.4]
(e) oráculo [p.5]
(f) presteza [p. 7]
(g) nódoa [p.9]
(h) desígnio [p.13]
(i) vitupério [p.13]
(j) desdita [p.14]
5. ( ) ação ou ocorrência considerada desonrosa e que prejudica a reputação de uma pessoa;
mácula, estigma.
( ) imposto exigido de uma província ou Estado dependente por aquele que o subjuga
contribuição monetária imposta pelo Estado ao povo, sobre mercadorias etc.
( ) ideia de realizar algo; intenção, propósito, vontade
( ) cooperação, participação em ação comum
( ) falta de dita ('sorte favorável'); má sorte, infortúnio, desgraça
( ) qualidade do que é prestes característica do que é ligeiro para fazer algo; rapidez,
celeridade
( ) substância resinosa aromática que, ao ser queimada (ger. como parte de cerimônias
litúrgicas ou, outrora, nos sacrifícios religiosos), desprende odor penetrante.
( ) grande vela de cera; tocha
( ) acusação infamante, injúria qualquer ato infame, vergonhoso ou criminoso
( ) na Antiguidade, resposta de uma divindade a quem a consultava
ADJETIVOS
(a) venerando [p. 4]
(b) pungente [p.8]
(c) soturno [p.8]
(d) inóspito [p.8]
(e) rubicundo [p.8]
(f) flamejante [p. 8]
(g) lustral [p.9]
(h) frívolo [p.10]
(i) divinatório [p.10]
(j) celerado [.11]
(k) ímpio [p.12]
(l) ultrajante [p.12]
( ) cujas faces estão muito avermelhadas; corado
( ) que lança flamas; chamejante; que tem esplendor, vivacidade; garrido, resplandecente,
vistoso.
( ) o que afronta, insulta, ultraja
( ) que é ou tem pouca importância; inconsistente, inútil, superficial
( ) que ou aquele que não tem fé ou que tem desprezo pela religião
( ) referente à adivinhação ou aos instrumentos desta prática; que supostamente tem
capacidade de adivinhar
( ) que é digno de veneração; respeitável, venerável
( ) que não possui alegria e vivacidade; melancólico, tristonho, taciturno
( ) que ou aquele que cometeu ou é capaz de cometer crimes de morte ou violência;
facínora, criminoso
( ) relativo a ou água us. em cerimônias de purificação (esp. aquela com que se benzia um
recém-nascido na Roma antiga)
( ) em que não se pode viver; rude, áspero
6. ( ) que afeta e/ou impressiona profundamente o ânimo, os sentimentos, as paixões; muito
comovente
2) Responda:
1. O que o Sacerdote vem pedir a Édipo (p. 4)?
2. Qual a razão de ele achar que o rei poderá ajudá-los?
3. Como se pode descrever a relação de Édipo com Creonte, pelo que se nota na cena da
p.5, assim que o cunhado entra em cena?
4. Qual o motivo de Creonte se mostrar animado com as notícias que traz de Apolo?
5. Qual o motivo de Édipo se irritar com o que Tirésias diz?
6. Que informações nós, os leitores, temos a partir da fala do coro?
7. Que mudanças houve no relacionamento de Édipo com o cunhado?
8. Assinale a alternativa correta em relação ao coro:
( ) o coro representa a população de Tebas;
( ) Édipo sempre se desentendia com o coro da cidade;
( ) faz o pano de fundo cantando e rezando quando a situação piora;
( ) se mostra sempre solícito e amigo do rei Édipo;
( ) Julga o rei Édipo incapaz de ajudar a cidade pois sabe que ele matou o rei Laio.
Como você percebeu, a linguagem da tragédia de Sófocles se apresenta em uma
linguagem formal, não usual, em que encontramos:
palavras pouco usadas no dia a dia;
colocação de pronomes própria da linguagem ultraformal, como a ênclise e a
mesóclise;
tratamento em 2ª pessoa do plural.
Além disso, pelo fato de ser uma tragédia clássica, a linguagem é grandiloquente,
isto é, cheia de ênfases, pomposa, solene, o que se percebe pelo grande número de
interjeições e pontos de exclamação. Nota-se que é mesmo um texto para ser declamado e
para emocionar quem ouve.
Seu trabalho será, junto com seu grupo, reescrever a parte que lhes foi
indicada em linguagem mais usada atualmente, a coloquial, e no tipo de texto
narrativo. O grupo deverá lançar mão das características de uma narrativa:
narrador, personagens, e especialmente nesta narrativa deverá predominar o discurso
indireto. Lembre-se de que, mesmo em linguagem coloquial, Édipo continua a ter uma
função social de poder: ele é o rei de Tebas, a quem todos devem respeito. Mas podem
ser usadas expressões coloquiais, expressões de linguagem figurada mais modernas.