Este documento analisa o poema "O Mostrengo" de Fernando Pessoa. Resume a estrutura narrativa do poema, as personagens principais e a simbologia presente, incluindo o significado do Mostrengo e do homem do leme.
2. Contextualização
Mensagem
O conjunto de poemas de “Mensagem” está dividido em três
partes:
• Brasão
• Mar Português
• O Encoberto
12 poemas incluindo “O
Mostrengo”
3. Mensagem
Estruturação do poema
Título:
• A palavra «mostrengo» é derivada por sufixação («monstro +
engo»). O sufixo «-engo», de origem germânica, tem um valor
pejorativo
• Por outro lado, «mostrengo» está relacionado com o verbo
«mostrar».
4. Mensagem
Estruturação do poema
1ºParte:
O mostrengo que está no fim do mar
Na noite de breu ergueu-se a voar;
À roda da nau voou três vezes,
Voou três vezes a chiar,
E disse: «Quem é que ousou entrar
Nas minhas cavernas que não
desvendo,
Meus tetos negros do fim do mundo?»
E o homem do leme disse, tremendo:
«El-Rei D. João Segundo!»
«De quem são as velas onde me roço?
De quem as quilhas que vejo e ouço?»
Disse o mostrengo, e rodou três
vezes,
Três vezes rodou imundo e grosso,
«Quem vem poder o que só eu posso,
Que moro onde nunca ninguém me
visse
E escorro os medos do mar sem
fundo?»
E o homem do leme tremeu, e disse:
«El-Rei D. João Segundo!»
5. Mensagem
Estruturação do poema
2ºParte:
Três vezes do leme as mãos ergueu,
Três vezes ao leme as reprendeu,
E disse no fim de tremer três vezes:
«Aqui ao leme sou mais do que eu:
Sou um Povo que quer o mar que é teu;
E mais que o mostrengo, que me a alma teme
E roda nas trevas do fim do mundo;
Manda a vontade, que me ata ao leme,
De El-Rei D. João Segundo!»
6. Mensagem
Explicação dos versos mais significativos
«[…]sou mais do que eu:
Sou um Povo[…]
E mais que o mostrengo[…]
Manda a vontade, que me ata ao leme,
De El-Rei D. João Segundo!»
Metáfora - traduz o vínculo
à missão a cumprir, do qual
nem o medo o pode libertar
Gradação - o “eu” representa a
vontade de um povo; - o povo age
de acordo com a vontade maior
que o representa: a de D. João II.
7. Mensagem
Análise do poema
• Esquema rimático:AABAACDCD
• Ritmo crescente, crescendo à medida que o homem do leme
“cresce” em coragem; e livre, adaptado à emoção patente no
poema.
• Refrão: predominam os sons nasais e fechados, conferindo ao
poema um tom pesado e sombrio, de mistério. Por outro lado, nele
ressoa a força, a vontade férrea inerentes à figura do rei D. João II,
e acentua a lealdade inabalável do marinheiro à vontade do rei.
8. Mensagem
Análise do poema
• Alternância entre a subordinação e a coordenação (sindética ou
assindética), sendo de salientar a frequência da conjunção
coordenativa /e/ (polissíndeto).(vv.1-5; 24-25)
• Harmonia imitativa (onomatopeia) produzida pelas aliterações,
repetição dos sons /v/, /s/, /ch/, /r/, /z/ que sugerem o ruído do voo do
«mostrengo».
• Aliteração em /m/ no verso 15.
• Ocorrência de outros sons nasais (em) e fechados (ê, ô), que
emprestam ao poema o referido tom sombrio, de gravidade, de mau
presságio.
• A linguagem é emotiva, fática e apelativa. Além disso, é
visualista para sugerir o ambiente de terror e mistério, fazendo-se
apelo às sensações visuais e auditivas.
9. Mensagem
Análise do poema
• Anáfora: «de quem (…) / De quem…» (vv. 10-11); «Três vezes (…) /
Três vezes (…) / Três vezes (…)» (vv. 13, 19 e 20).
• Metáforas pretendem dar uma imagem do espaço:
- «nas minhas cavernas que não desvendo»;
- «meus tetos negros do fim do mundo
- «E escorro os medos;
- «a vontade que me ata ao leme»
• Exclamações e interrogações: traduzem a emotividade, quer do
«mostrengo» quer do marinheiro.
• Abundâncias de formas verbais que sugerem movimentos
incontroláveis, violentos, de terror e que emprestam ao poema grande
dinamismo
10. Mensagem
Análise do poema
• A abundância de nomes traduz a sucessão incontrolável e dramática dos
acontecimentos. (fim do mar, nau, cavernas, mundo, medos...)
• Os adjetivos são quase inexistentes: «negros», «imundo» e «grosso»
(traduzem a noção de mistério e terror).
• Tipos de frase:
- Declarativa: narração e parte do discurso do «homem do leme»;
- Interrogativa: discurso do «mostrengo»;
- Exclamativa: discurso do marinheiro.
• Inversão, assumindo por vezes a violência do hipérbato
11. Mensagem
A estrutura narrativa do poema
A ação :
• Recurso a versos dinâmicos típicos das estruturas narrativas:
erguer, voar, repreender, tremer,…
• Preferência pelo pretérito perfeito, nos momentos de avanço da
ação: “ergueu-se”, “voou”, “disse”,…
• Utilização do verbo introdutor de relato de discurso direto - nas
vozes das personagens – seguido de aspas: “disse”
Modos discursivos privilegiados:
Narração - “O mostrengo que está no fim do mar/Na noite
de breu ergueu-se a voar;/À roda da nau voou três
vezes,/Voou três vezes a chiar,/E disse”
12. Mensagem
A estrutura narrativa do poema
Modos discursivos privilegiados:
O diálogo - «Aqui ao leme sou mais do que eu:/Sou um
Povo que quer o mar que é teu;/E mais que o mostrengo, que
me a alma teme/E roda nas trevas do fim do mundo;/Manda
a vontade, que me ata ao leme,/De El-Rei D. João Segundo!»
13. Mensagem
A presença das personagens
O Protagonista/ herói: o homem do leme
Um herói coletivo individualizado – um povo
“sou mais do que eu:/Sou um Povo que quer o mar que é
teu;/E mais que o mostrengo, que me a alma teme/E roda
nas trevas do fim do mundo;/Manda a vontade, que me ata
ao leme,/De El-Rei D. João Segundo!”
14. Mensagem
Simbologia inerente:
•A extensão do poema parece querer simbolizar o longo e difícil
processo de conquista do mar.
• O seu caracter narrativo;
• A dimensão simbólica do homem do leme: anónimo que dá
voz ao sentir e à ousadia de um povo;
• A insistência no número 3 e a sua simbologia;
• O diálogo a três vozes: sujeito poético, Mostrengo e homem
do leme;
• Visão do poema como eco da tradição lendária: o desafio do
homem face aos limites da sua condição humana;
• O domínio do Mostrengo pelo homem do leme simboliza a
vitória dos portugueses sobre os medos e os perigos do mar.
15. Mensagem
Simbologia inerente:
O Mostrengo: Simboliza o desconhecido, as lendas do
Mar, os obstáculos e os medos dos navegadores portugueses.
• “Quem é que ousou entrar/Nas minhas cavernas que não
desvendo,/Meus tetos negros do fim do mundo?”
O homem do leme: Alegoria do povo português
O leme: Símbolo de responsabilidade
16. Mensagem
Simbologia inerente:
Os Símbolos pessoanos:
• O número 3: representa o fim do medo; a totalidade e a
conclusão; e a conquista do mar;
• O número 7: representa a conclusão cíclica e a renovação; a
passagem do desconhecimento para o conhecido; e a conquista
do mar ( “Possessio maris”)
17. Mensagem
A noite:
• Tradicionalmente: o domínio do inconsciente e do mundo das
trevas povoado de medos e de monstros;
• A noite em Mensagem: morte iniciática da vontade do herói
que treme/ teme, para renascer como alma de Portugal. “(…) a
vontade, que me ata ao leme, De El-Rei D. João Segundo.”
18. Mensagem
O Herói como predestinado:
• Importância de Deus
• Aquele que vence os seus próprios medos. (3 vezes treme
perante o medo corporizado no Mostrengo, que 3 vezes roda à
sua volta)
• Aquele que tem um sentido de missão superior a si e ao
povo que representa – “ cumprir o mar”. ( 3 vezes invoca a
vontade de D. João II)
19. Mensagem
Intertextualidade:
O Mostrengo O Adamastor
Descrição do gigante Pouco definido: “imundo e grosso”, voa,
chia, vê, ouve e fala
É descrito com pormenor e, ao longo do
episódio, vai adquirindo feições humanas
Atitude do Homem face ao desconhecido Ousadia Ousadia
Atitude do “monstro” face os
portugueses
Interroga-os Ameaça-os
Reação do homem do leme e de Vasco da
Gama
Enfrenta-o depois de tremer três vezes Primeiro sente medo e depois enfrenta-o,
interrogando- o
Desfecho Ao responder, na 3 estrofe, que não é
apenas ele que ali está mas sim “um
povo”, o homem do leme aniquila o
mostrengo pela força da sua missão
Quando Vasco da Gama, através da
pergunta “Quem és tu?”, leva o
Adamastor a nomear-se, obriga-o a
autodestruir-se pois deixa de ser “oculto