4. Em síntese:
Características gerais:
* Racionalidade
* Rigor Científico
* Dignidade do Ser Humano
* Ideal Humanista
* Reutilização das artes greco-romana
a) Racionalismo – a razão é o único caminho para se chegar ao conhecimento.
b) Experimentalismo – todo o conhecimento deverá ser demonstrado
racionalmente.
c) Antropocentrismo – colocava o homem como a suprema criação de Deus e como
o centro do universo.
d) Humanismo – glorificação do homem e da natureza humana, em contraposição
ao divino e ao sobrenatural.
e) Classicismo - movimento cultural que valoriza e recupera os elementos artísticos
da cultura clássica (greco-romana). Ocorreu nas artes plásticas, teatro e literatura,
nos séculos XIV ao XVI.
5. As características da epopeia:
• A epopeia é um género narrativo em verso;
• visa celebrar feitos grandiosos de heróis fora do comum reais ou lendários.;
• tem pois sempre um fundo histórico;
• é um género narrativo e que exige a presença de uma acção, desempenhada por
personagens num determinado tempo e espaço.
• O estilo é elevado e grandioso e possui uma estrutura própria, cujos principais aspectos
são:
PROPOSIÇÃO - em que o autor apresenta a matéria do poema;
INVOCAÇÃO – pedido de inspiração às musas ou outras divindades e entidades míticas
protectoras das artes;
DEDICATÓRIA - em que o autor dedica o poema a alguém, sendo esta facultativa;
NARRAÇÃO - a acção é narrada por ordem cronológica dos acontecimentos, mas inicia-se já
no decurso dos acontecimentos (“in medias res”), sendo a parte inicial narrada
posteriormente num processo de retrospectiva, “flash-back” ou “analepse”;
PRESENÇA DE MITOLOGIA GRECO-LATINA - contracenando heróis mitológicos e heróis humanos.
6. A narrativa organiza-se em quatro planos:
Plano da viagem - A viagem de Vasco da Gama de Lisboa até à Índia.
Saída de Belém, paragem em Melinde e chegada a Calecut
Plano Mitológico, em alternância, ocupam uma posição importante.
Plano da História de Portugal – Quando Vasco da Gama ou outro
narrador conta, por exemplo ao rei de Melinde, a História de Portugal.
Está encaixada na viagem.
Plano do Poeta – ou as considerações pessoais aparecem normalmente
nos finais de canto e constituem, de um modo geral, a visão crítica do
poeta sobre o seu tempo.
A narrativa organiza-se de forma anacrónica:
Passado – reconto da História de Portugal desde as origens até D. Manuel I. (analepse)
Presente – tempo da acção central do poema, ou seja, da viagem de Vasco da Gama,
iniciada “ in media res”.
Futuro – Profecias . (prolepse)
9. Proposição I
As armas, e os barões assinalados Todos os homens ilustres
Sinédoque – Que, saíram de Portugal
apresentar a Que, da Ocidental praia Lusitana,
parte pelo E foram por mares desconhecidos -
todo
Por mares nunca dantes navegados, navegadores
Passaram além da já conhecida ilha de
Passaram ainda além da Taprobana, Ceilão
Em perigos e guerras esforçados Enfrentaram perigos enormes,
Mesmo superiores ao seu estatuto de
Hipérbole –
exagero da Mais do que prometia a força humana, ser humano – afasta-os do comum
realidade mortal
E entre gente remota edificaram Construíram um novo império em
terras distantes. Um reino que tanto
Novo Reino, que tanto sublimaram; desejaram
O sujeito poético começa por apresentar os destinatários da epopeia, valorizando já os
seus feitos e aproximando-os já de um estatuto acima do humano.
Fazem-se referências a factos históricos e locais concretos.
10. Gerúndio –
processo de
enumeração continuidade
II
E também as memórias gloriosas E aqueles reis que estiveram
envolvidos na reconquista cristã
Daqueles Reis que foram dilatando /nas cruzadas contra os
Conjunção
coordenativa mouros/infiéis em África e na
copulativa – A Fé, o Império, e as terras viciosas
Ásia
enumeração de
figuras a ser De África e de Ásia andaram devastando;
exaltadas
E aqueles que fazem obras com
E aqueles que por obras valerosas valor e que, por isso, não cairão
no esquecimento – se vão
Se vão da lei da Morte libertando. imortalizando
Cantando espalharei por toda aaparte,
Cantando espalharei por toda parte, O sujeito poético compromete-
se a exaltar a louvar, a cantar os
Se a tanto me ajudar ooengenho eearte.
Se a tanto me ajudar engenho arte.
feitos daqueles que enumerou
anteriormente. Usando a
1ª pessoa do primeira pessoa – plano do
singular – poeta.
envolvimento do
poeta
11. Herói de Herói de
Odisseia - Eneida -
III Ulisses Eneias
Cessem do sábio Grego e do Troiano Num tom imperativo, de ordem
As navegações grandes que fizeram; manda suspender/cessar a fama
Imperativo dos gregos e romanos
de Alexandro e de Trajano
Manda suspender a fama das
A fama das vitórias que tiveram; vitórias de reis e imperadores
clássicos
Que eu canto o peito ilustre Lusitano,
Porque o poeta louva o povo
A quem Neptuno e Marte obedeceram. lusitano ao qual pertence.
Conjunção Povo esse que dominou o mar
subordinativa Cesse tudo o que a Musa antiga canta, (Neptuno)e a guerra (Marte).
causal (= porque)
. Apresenta a Que outro valor mais alto se alevanta.
causa da Continua em tom imperativo,
desvalorização ordenando que os clássicos
dos clássicos
Neptuno – deus do mar suspendam a sua fama, porque
Marte – deus da guerra agora há um novo povo que
1ª pessoa do
Patriotismo, apresenta feitos ainda mais
singular –
valores
envolvimento
nacionais valerosos.
do poeta
Para demonstrar a superioridade e a legitimidade da realização desta epopeia, o
poeta compara os feitos dos Portugueses aos de Ulisses, herói da Odisseia de Homero e
aos de Eneias, o troiano que, na Eneida de Virgílio, chegou ao Lácio e fundou Roma, ou
seja compara o seu herói com os heróis das epopeias de referência.
12. Proposição
Canto I, est. 1-3,
• Camões proclama ir cantar as grandes vitórias e os homens ilustres –
“as armas e os barões assinalados”;
•as conquistas e navegações no Oriente (reinados de D. Manuel e de D. João III);
•as vitórias em África e na Ásia desde D. João a D. Manuel, que dilataram “a fé e o
império”;
• e, por último, todos aqueles que pelas suas obras valorosas “se vão da lei da morte
libertando”, todos aqueles que mereceram e merecem a “imortalidade” na memória
dos homens.
13. A proposição aponta também para os “ingredientes” que constituíram os quatro planos
do poema:
Plano da Viagem - celebração de uma viagem:
"...da Ocidental praia lusitana / Por mares nunca dantes navegados
/ Passaram além da Tapobrana...";
Plano da História - vai contar-se a história de um povo:
"...o peito ilustre lusitano..."."...as memórias gloriosas /
Daqueles Reis que foram dilatando / A Fé, o império e as
terras viciosas / De África e de Ásia...";
Plano dos Deuses (ou do Maravilhoso) aos quais os Portugueses se equiparam:
"... esforçados / Mais do que prometia a força humana..."."A quem Neptuno e Marte
obedeceram...";
Plano do Poeta - em que a voz do poeta se ergue, na primeira pessoa:
"...Cantando espalharei por toda a parte. / Se a tanto me ajudar o engenho e
arte..."."...Que eu canto o peito ilustre lusitano...".
14. Funcionamento da língua
Identificação de orações subordinadas relativas
I
As armas, e os barões assinalados
Que, da Ocidental praia Lusitana,
Por mares nunca dantes navegados,
Passaram ainda além da Taprobana,
Em perigos e guerras esforçados
Mais do que prometia a força humana,
E entre gente remota edificaram
Novo Reino, que tanto sublimaram;
15. Funcionamento da língua
Identificação de orações subordinadas causais / relativas
III
Cessem do sábio Grego e do Troiano
As navegações grandes que fizeram;
de Alexandro e de Trajano
A fama das vitórias que tiveram;
porque Que eu canto o peito ilustre Lusitano,
A quem Neptuno e Marte obedeceram.
Cesse tudo o que a Musa antiga canta,
porque Que outro valor mais alto se alevanta.
16. Funcionamento da língua
Identificação de Conjugação perifrástica
II
E também as memórias gloriosas
Daqueles Reis que foram dilatando
A Fé, o Império, e as terras viciosas
De África e de Ásia andaram devastando;
E aqueles que por obras valerosas
Se vão da lei da Morte libertando.
c
17. Funcionamento da língua
Nome próprio
Identificação de classes e subclasses de palavras
Nome comum
I
As armas, e os barões assinalados
Conjunção
Que, da Ocidental praia Lusitana,
Por mares nunca dantes navegados,
Passaram ainda além da Taprobana, Preposição
Em perigos e guerras esforçados
Mais do que prometia a força humana, Pronome relativo
E entre gente remota edificaram
Novo Reino, que tanto sublimaram; Determinante artigo definido
Determinante demonstrativo
II
Pronome demonstrativo
E também as memórias gloriosas
Daqueles reis que foram dilatando Advérbio
A Fé, o Império, e as terras viciosas
De África e de Ásia andaram devastando; Adjectivo
E aqueles que por obras valerosas
Se vão da lei da Morte libertando.
18. Funcionamento da língua
Graus dos adjectivos
Elabora frases onde uses os adjectivos nos graus indicados
adjectivo Grau
valorosas Grau normal
remotas Grau comparativo de superioridade
glorioso Grau comparativo de inferioridade
famoso Grau comparativo de igualdade
importante Grau superlativo relativo de superioridade
conhecido Grau superlativo relativo de nferioridade
falador Grau superlativo absoluto analítico
famoso Grau superlativo absoluto sintético
19. Correcção
adjectivo Grau
valorosas Grau normal
… mais remotas do que… Grau comparativo de superioridade
… menos glorioso do que… Grau comparativo de inferioridade
…tão famoso como… Grau comparativo de igualdade
… o mais importante… Grau superlativo relativo de superioridade
… o menos conhecido… Grau superlativo relativo de nferioridade
… muito falador…. Grau superlativo absoluto analítico
…famosíssimo… Grau superlativo absoluto sintético
Seguir para a Invocação
20. Invocação
Canto I, est. 4-5, o poeta pede ajuda a entidades mitológicas, chamadas musas. Isso
acontece várias vezes ao longo do poema, sempre que o autor precisa de inspiração:
Tágides ou ninfas do Tejo (Canto I, est. 4-5);
Calíope - musa da eloquência e da poesia épica (Canto II, est. 1-2);
Ninfas do Tejo e do Mondego (Canto VII, est. 78-87);
Calíope (Canto X, est. 8-9);
Calíope (Canto X, est. 145).
21. Anáfora - é uma figura de estilo
que consiste em repetir a mesma Metáfora –
palavra no princípio de várias frases. Aposto Perífrase dar coragem
Invocação estrofes 4-5 Apóstrofe
E vós, Tágides minhas, pois criado
Invocar significa apelar, pedir, suplicar.
Tendes em mi um novo engenho ardente Daí a presença do Imperativo.
Se sempre, em verso humilde, celebrado
Foi de mi vosso rio alegremente, Nestas estrofes, Camões dirige-se às
Tágides, as ninfas do Tejo, pedindo-lhes
Dai-me agora um som alto e sublimado que o ajudem a cantar os feitos dos
Um estilo grandíloco e corrente, portugueses de uma forma sublime.
Por que de vossas águas Febo ordene Até aí apenas usou a inspiração na
humilde lírica, mas agora precisa de
Que não tenham enveja às de Hipocrene.
uma inspiração superior.
Dai-me hua fúria grande e sonorosa, O estilo da epopeia aparece aqui descrito:
E não de agreste avena ou frauta ruda, “alto e sublimado”
”Um estilo grandíloco e corrente.“
Mas de tuba canora e belicosa,
“fúria grande e sonorosa”
Que o peito acende e a cor ao gesto muda. “tuba canora e belicosa”
Dai-me igual canto aos feitos da famosa “Que se espalhe e se cante no Universo”
Gente vossa, que a Marte tanto ajuda;
-“Que se espalhe e se cante no Universo, Se
Que se espalhe e se cante no Universo tão Sublime preço cabe em verso” Ou seja
Se tão sublime preço cabe em verso. ,Camões quer que a mensagem se espalhe e
que cante ao universo os feitos dos
Conjunção Imperativo portugueses
subordinativa
condicional
22. Dedicatória ***(sem leitura obrigatória)
Canto I, est. 6-18, é o oferecimento do poema a D.
Sebastião, que encara toda a esperança do poeta,
que quer ver nele um monarca poderoso, capaz de
retomar “a dilatação da fé e do império” e de
ultrapassar a crise do momento.
Termina com uma exortação ao rei para que
também se torne digno de ser cantado,
prosseguindo as lutas contra os Mouros.
Exórdio (est. 6-8) - início do discurso;
Exposição (est. 9-11) - corpo do discurso;
Confirmação (est. 12-14) - onde são apresentados os exemplos;
Peroração (est. 15-17) - espécie de recapitulação ou remate;
Epílogo (est. 18) - conclusão.
23. Dedicatória estrofes 6-8
E vós, ó bem nascida segurança
Metáfora e Apóstrofe : Vós, tenro e novo ramo
Da Lusitana antiga liberdade, florecente”,
E não menos certíssima esperança
De aumento da pequena Cristandade, -“E vós” 6estrofe-1linha: A D.Sebastião
Vós, ó novo temor da Maura lança, -“Maravilha Fatal da Nossa Idade”: Elogio a
Maravilha fatal da nossa idade, D.Sebastião
Dada ao mundo por Deus, que todo o mande,
Pera do mundo a Deus dar parte grande.
Vós, tenro e novo ramo florecente,
De hua árvore, de Cristo mais amada
Que nenhua nascida no Ocidente,
Cesária ou Cristianíssima chamada,
Vede-o no vosso escudo, que presente
Vos amostra a vitória já passada,
Na qual vos deu por armas e deixou
As que Ele pera Si na Cruz tomou;
Vós, poderoso Rei, cujo alto Império
O Sol, logo em nascendo, vê primeiro;
Vê-o também no meio do Hemisfério,
E, quando dece, o deixa derradeiro;
Vós, que esperamos jugo e vitupério
Do tope Ismaelita cavaleiro,
Do Turco Oriental e do Gentio
Que inda bebe o licor do santo Rio: (...)
24. Narração
Começa no Canto I, est. 19
• constitui a acção principal que, à maneira clássica, se inicia “in medias res”, isto é,
quando a viagem já vai a meio, “Já no largo oceano navegavam”, encontrando-se já
os portugueses em pleno Oceano Índico.
• Este começo da acção central, a viagem da descoberta do caminho marítimo para a
Índia, quando os portugueses se encontram já a meio do percurso do canal de
Moçambique vai permitir:
A narração do percurso até Melinde (narrador heterodiegético);
A narração da História de Portugal até à viagem (por Vasco da Gama);
A inclusão da narração da primeira parte da viagem;
A apresentação do último troço da viagem (narrador heterodiegético).
27. Consílio dos Deuses - plano mitológico Canto I – 19-41c
Os Deuses reúnem-se para decidir se ajudam ou não os portugueses a chegar à Índia.
Esta reunião foi presidida por Júpiter, tendo estado presentes todos os Deuses convocados.
Os Deuses sentem a necessidade de reunir face aos feitos gloriosos conseguido até ao
momento.
Júpiter decide ajudá-los, pois considera que os portugueses, pelos seus feitos passados,
são dignos de tal ajuda.
Baco, pelo contrário, não queria que os portugueses fossem para a Índia, com medo
de perder a sua fama no Oriente.
Vénus apoia Júpiter, pois vê reflectida nos portugueses a força e a coragem do seu filho
Eneias e dos seus descendentes, os romanos. Vénus defende os portugueses não só por se
tratar de uma gente muito semelhante à do seu amado povo latino e com uma língua
derivada do Latim, como também por terem demonstrado grande valentia no norte de
África.
Marte - deus defensor desta gente lusitana, porque o amor antigo que o ligava a Vénus o
leva a tomar essa posição e porque reconhece a bravura deste povo. Marte consegue
convencer Júpiter a não abdicar da sua decisão e assim, os portugueses serão recebidos
num porto amigo. Pede a Mercúrio - o Deus mensageiro - que colha informações sobre a
Índia, pois começa a desconfiar da posição tomada por Baco.
Este consílio termina com a decisão favorável aos portugueses e cada um dos deuses regressa
ao seu domínio celeste.
28. Consílio dos Deuses - plano mitológico Canto I – 19-41
Já no largo Oceano navegavam, A narração começa “in média”. Já no oceano
Pacífico.
As inquietas ondas apartando;
Faz-se referência ao domínio da técnica da
Os ventos brandamente respiravam, navegação, dominada pelos portugueses.
Das naus as velas côncavas inchando;
Da branca escuma os mares se mostravam
Cobertos, onde as proas vão cortando
As marítimas águas consagradas,
Que do gado de Próteu são cortadas,
Perífrase
Quando os Deuses no Olimpo luminoso, Apresenta-se então:
Conjunção - o local da reunião - Olimpo;
Onde o governo está da humana gente,
subordinativa
- o objectivo da reunião – decisão sobre as
temporal Se ajuntam em consílio glorioso, coisas do Oriente.
Sobre as cousas futuras do Oriente.
Pisando o cristalino Céu fermoso,
Indicação da forma como os deuses foram
Vêm pela Via Láctea juntamente, convocados: foi Mercúrio que avisou todos os
Convocados, da parte de Tonante, deuses cumprindo a vontade de Júpiter.
Pelo neto gentil do velho Atlante.
Perífrase
29. 21
Deixam dos sete Céus o regimento, Reunião dos deuses vindos de
todos os quadrantes: N, S, E, O.
Que do poder mais alto lhe foi dado,
Alto poder, que só co pensamento
Governa o Céu, a Terra e o Mar irado.
Perífrase -
Júpiter Ali se acharam juntos num momento
Os que habitam o Arcturo congelado
Perífrases:
E os que o Austro têm e as partes onde
Norte, Sul,
Oriente e
A Aurora nasce e o claro Sol se esconde.
Ocidente
22
Estava o Padre ali, sublime e dino, É apresentada a descrição de
Júpiter – um deus poderoso,
Que vibra os feros raios de Vulcano, soberano, severo.
Num assento de estrelas cristalino,
Com gesto alto, severo e soberano;
Do rosto respirava um ar divino,
Que divino tornara um corpo humano;
Com ũa coroa e ceptro rutilante,
De outra pedra mais clara que diamante.
30. 23
Descrição Em luzentes assentos, marchetados
de um local Caracterização do espaço
rico, De ouro e de perlas, mais abaixo estavam do Olimpo e Organização
luxuoso, do espaço.
sublime. Os outros Deuses, todos assentados
Os deuses sentam-se
Como a Razão e a Ordem concertavam segundo a sua hierarquia.
(Precedem os antigos, mais honrados,
Mais abaixo os menores se assentavam);
Quando Júpiter alto, assi dizendo, Introdução ao discurso de
Júpiter – Discurso directo.
Cum tom de voz começa grave e horrendo:
24 Apóstrofe, indicação dos
– «Eternos moradores do luzente, destinatários do seu discurso –
Apóstrofe
e perífrase
os restantes deuses
Estelífero Pólo e claro Assento: Início do discurso de Júpiter
Se do grande valor da forte gente
De Luso não perdeis o pensamento,
Júpiter começa por recordar
Deveis de ter sabido claramente que é do conhecimento geral
Como é dos Fados grandes certo intento que os Fados têm a intenção de
tornar este povo luso superior
Que por ela se esqueçam os humanos aos antigos heróis.
Enumeração
De Assírios, Persas, Gregos e Romanos.
31. 25
Já lhe foi (bem o vistes) concedido,
Cum poder tão singelo e tão pequeno,
Tomar ao Mouro forte e guarnecido Júpiter recorda as vitórias e
a protecção concedidas e
Toda a terra que rega o Tejo ameno. realizadas pelos lusos.
Pois contra o Castelhanovtão temido Lutou contra os Mouros e
sinédoque
contra os castelhanos e
Sempre alcançou favor do Céu sereno: sempre foi protegido pelas
Assi que sempre, enfim, com fama e glória, divindades.
Os
inimigos
que teve Teve os troféus pendentes da vitória.
de
enfrentar 26
são
apresenta Deixo, Deuses, atrás a fama antiga,
dos como Júpiter continua a relembra as
“fortes” e Que co a gente de Rómulo alcançaram,
raízes do povo português:
“temidos”,
reforçando Quando com Viriato, na inimiga . Guerra com os Romanos,
o seu valor . A importância e valor de Viriato,
Guerra Romana, tanto se afamaram;
. Lendas romanas.
Também deixo a memória que os obriga
vocativo
A grande nome, quando alevantaram
Um por seu capitão, que, peregrino,
Fingiu na cerva espírito divino.
32. O
27
advérbio
“agora” –
Agora vedes bem que, cometendo Júpiter reconhece a força a
antes
O duvidoso mar num lenho leve, coragem para descobrir e explorar
esteve a territórios em locais tão diferentes.
falar do
passado,
Por vias nunca usadas, não temendo
“agora”
falará do
de Áfrico e Noto a força, a mais s'atreve:
presente
–
Que, havendo tanto já que as partes vendo
Onde o dia é comprido e onde breve,
E diz que agora querem explorar o
Inclinam seu propósito e perfia oriente.
perífrase A ver os berços onde nasce o dia.
28
Prometido lhe está do Fado eterno,
Júpiter reafirma que os Fados já
Cuja alta lei não pode ser quebrada, determinaram a glória dos
portugueses.
Que tenham longos tempos o governo
Do mar que vê do Sol a roxa entrada.
Nas águas têm passado o duro Inverno;
Júpiter considera os portugueses
A gente vem perdida e trabalhada; merecedores de algum recobro e
Já parece bem feito que lhe seja reconforto, pois as tripulações
estão cansadas. Apresenta pois a
Mostrada a nova terra que deseja. sua posição pessoal
33. E porque, como vistes, têm passados A viagem tem levado a enfrentar
Na viagem tão ásperos perigos, perigos, climas, intempéries…
Tantos climas e céus exprimentados,
Tanto furor de ventos inimigos,
Júpiter apresenta a sua
Que sejam, determino, agasalhados determinação em apoiar os
portugueses, mostrando-lhes terra
Nesta costa Africana como amigos;
e assegurando-lhes que serão bem
E, tendo guarnecido a lassa frota, “agasalhados” para que depois
possam seguir viagem.
Tornarão a seguir sua longa rota.»
Final do discurso de Júpiter
Posição de Baco
Estas palavras Júpiter dizia,
Júpiter terminara o seu
Quando os Deuses, por ordem respondendo, discurso e os deuses
apresentam as suas
Na sentença um do outro diferia, posições
Razões diversas dando e recebendo.
O padre Baco ali não consentia
No que Júpiter disse, conhecendo Baco, deus do vinho, teme
perder a sua fama no Oriente.
Que esquecerão seus feitos no Oriente
Se lá passar a Lusitana gente.
34. 31
Ouvido tinha aos Fados que viria
Ũa gente fortíssima de Espanha Baco já tinha ouvido a fama deste povo
e sabe que este povo levará ao
Pelo mar alto, a qual sujeitaria esquecimento dos antigos heróis,
Perífrase- Da Índia tudo quanto Dóris banha, entre eles, o próprio Baco.
Pacífico/
oriente E com novas vitórias venceria E mais uma vez se reforça a ideia de
que perderia a fama que ainda tem no
A fama antiga, ou sua ou fosse estranha. Oriente (Nisa).
Altamente lhe dói perder a glória
De que Nisa celebra inda a memória.
32
Vê que já teve o Indo sojugado Baco nunca fora posto em causa por
nenhum herói ou poeta.
E nunca lhe tirou Fortuna ou caso
Por vencedor da Índia ser cantado
Perífrase - De quantos bebem a água de Parnaso.
poetas
Teme agora que seja sepultado Baco teme agora que o seu nome seja
votado ao esquecimento e à “morte” – este
Metáfora - Seu tão célebre nome em negro vaso medo reforça o valor dos lusos, pois são um
esquecimen
D' água do esquecimento, se lá chegam poder fora de comum.
to
Os fortes Portugueses que navegam.
35. Posição de Vénus
Sustentava contra ele Vénus bela,
Afeiçoada à gente Lusitana Vénus defendia os
portugueses:
Por quantas qualidades via nela -Descendentes dos
romanos;
Da antiga, tão amada, sua Romana; - coragem e força
Nos fortes corações, na grande estrela demonstrada;
-Uso da língua com
Que mostraram na terra Tingitana, origem latina.
E na língua, na qual quando imagina,
Com pouca corrupção crê que é a Latina.
34
Vénus defendia os
Estas causas moviam Citereia, portugueses, pois sabe
que se eles tiverem
E mais, porque das Parcas claro entende
sucesso ela também
Que há-de ser celebrada a clara Deia será louvada.
Onde a gente belígera se estende.
Assi que, um, pela infâmia que arreceia, Enquanto Baco se
opõe, porque não
E o outro, pelas honras que pretende,
quer perder a fama,
Debatem, e na perfia permanecem; Vénus defendia, pois
deseja ser louvada.
A qualquer seus amigos favorecem.
36. Balanço da discussão
Qual Austro fero ou Bóreas na espessura
De silvestre arvoredo abastecida,
Rompendo os ramos vão da mata escura
A agitação dos ventos era
Com ímpeto e braveza desmedida, grande, evidenciando a
Brama toda montanha, o som murmura, agitação da discussão
gerada no Olimpo.
Rompem-se as folhas, ferve a serra erguida: A natureza reflecte o
Tal andava o tumulto, levantado humor dos deuses.
Entre os Deuses, no Olimpo consagrado.
37. Posição de Marte
Mas Marte, que da Deusa sustentava
Marte, porque
Entre todos as partes em porfia, amava Vénus,
ou porque a gente lusa o merecia,
Ou porque o amor antigo o obrigava,
tomou a palavra e uma posição.
Ou porque a gente forte o merecia,
Anáfora De antre os Deuses em pé se levantava:
Merencório no gesto parecia;
O forte escudo, ao colo pendurado,
Deitando pera trás, medonho e irado; Descrição de Marte
37
A viseira do elmo de diamante
Alevantando um pouco, mui seguro,
Por dar seu parecer se pôs diante
De Júpiter, armado, forte e duro;
Descrição de Marte –
E dando ũa pancada penetrante deus forte, decidido, duro.
Co conto do bastão no sólio puro, Faz-se ouvir e respeitar.
O Céu tremeu, e Apolo, de torvado,
Um pouco a luz perdeu, como enfiado;
38. Discurso de Marte
E disse assi: – «Ó Padre, a cujo império
Discurso de Marte –
Tudo aquilo obedece que criaste: Começa por reforçar o
Apóstrofe
Se esta gente que busca outro Hemisfério, poder de Júpiter.
Cuja valia e obras tanto amaste,
Não queres que padeçam vitupério, Começa por reforçar o poder de
Júpiter. Considera que Júpiter é
Como há já tanto tempo que ordenaste, soberano e que não deve ouvir as
Não ouças mais, pois és juiz direito, opiniões dos restantes deuses.
Razões de quem parece que é suspeito. Deuses esses que são “suspeitos”.
39
Que, se aqui a razão se não mostrasse
Vencida do temor demasiado, Marte tenta provar que a opinião de
Baco é fundada na inveja.
Bem fora que aqui Baco os sustentasse,
Pois que de Luso vêm, seu tão privado; Considera ainda que a inveja nunca
poderá roubar as glórias merecidas e
Mas esta tenção sua agora passe,
oferecidas pelo céu, como é o caso
Porque enfim vem de estâmago danado; dos portugueses.
Que nunca tirará alheia enveja
O bem que outrem merece e o Céu deseja.
39. Aposto E tu, Padre de grande fortaleza, Reforça novamente o poder de
Da determinação que tens tomada Júpiter. Considera que Júpiter é
Apóstrofe soberano que se voltar atrás com a
Não tornes por detrás, pois é fraqueza sua posição é uma mostra de
fraqueza.
Desistir-se da cousa começada.
Mercúrio, pois excede em ligeireza
Finaliza o seu discurso, dizendo que
Ao vento leve e à seta bem talhada, Mercúrio deverá, rapidamente,
indicar um porto seguro, onde os
Lhe vá mostrar a terra onde se informe portugueses sejam reabastecidos e
orientados.
Da Índia, e onde a gente se reforme.»
Fim do discurso de Marte
Como isto disse, o Padre poderoso, Júpiter concorda e termina este
consílio.
A cabeça inclinando, consentiu
No que disse Mavorte valeroso
E néctar sobre todos esparziu.
Pelo caminho Lácteo glorioso
Logo cada um dos Deuses se partiu,
Todos os deuses regressaram aos
Fazendo seus reais acatamentos,
respectivos aposentos, aceitando a
Pera os determinados apousentos. decisão tomada.
40. Episódio de Inês de Castro - plano história de Portugal – episódio lírico Canto III – 119- 135
41. Episódio de Inês de Castro - plano história de Portugal – episódio lírico Canto III – 119- 135
Episódio inclui-se no plano da História de Portugal, pois:
• é narrado por Vasco da Gama, cujo narratário/destinatário é o Rei de Melinde.
• surge na continuidade da apresentação do reinado de D. Afonso IV.
Episódio é considerado um momento lírico, pois:
•Exploram-se os sentimentos pessoais do narrador;
• Dá-se expressão à emotividade e à exploração de sentimentos como o Amor, a
crueldade, o sofrimento…
• pode-se mesmo considerar que as principais características da tragédia clássica
estão patentes:
• Há o desenvolvimento de uma acção, que termina com a morte da
protagonista;
• Observa-se a lei das três unidades (acção, tempo e espaço);
• Há uma motivação para sentimentos de terror e piedade;
• A catástrofe é simbolizada pela morte da protagonista.
42. Estrutura deste episódio
A primeira parte, referente as causas da morte de Inês, vítima do amor.
A segunda, constitui o desenvolvimento em que se descreve o modo de vida feliz e
despreocupado que Inês tinha em Coimbra - é apresentada a razão de estado para que Inês
deixe a vida, pois o perigo que representa a ligação de D. Inês com D. Pedro, receia o domínio
espanhol.
O poeta põe em questão a grandeza moral do Rei por solucionar o problema de seu reino
mandando matar a sua própria filha:
“Tirar Inês ao mundo, determina”;
“Que furor consentiu que a espada fina,
Que pôde sustentar o grande peso
Do furor Mauro, fosse alevantada
Contra üa fraca dama delicada?”.
Também nesta segunda parte é redigido o discurso suplicante de Inês ao rei de Portugal, seu
pai. Ela utiliza súplicas e argumento para comover o Rei na sua determinação - apresenta a
sua situação de mãe e a orfandade de seus filhos, declara-se inocente perante toda a situação
de futuro conflito, comove o rei dizendo-lhe que sendo um cavaleiro que sabe dar morte,
também sabe ”dar vida, com clemência” e como alternativa à morte, dá preferência ao exílio.
A terceira e última parte, constitui a reprovação do narrador, sublinhada pelo pranto
comovente das “filhas do Mondego” e pela animização da Natureza, que chora a morte de
Inês, sua antiga confidente.
43. Episódio de Inês de Castro - plano história de Portugal – episódio lírico Canto III – 119- 135
Passada esta tão próspera vitória,
Início remete para o plano da história
Tornando Afonso à Lusitana terra, de Portugal – o episódio narrado
anteriormente foi o da Batalha do
A se lograr da paz com tanta glória
Salado
Quanta soube ganhar na dura guerra,
O caso triste, e dino da memória, O narrador introduz o caso de Inês de
Que do sepulcro os homens desenterra, Castro, como um episódio do reinado
A de D. AfonsoIV, remetendo já para os
imparcialidade Aconteceu da mísera e mesquinha contornos do mesmo.
do narrador
Introdução
Que depois de ser morta foi Rainha.
Perífrase - D. Inês
119 de Castro
Tu só, tu, puro Amor, com força crua, O narrador dirige-se ao Amor,
atribuindo-lhe várias características:
Apóstrofe e
Que os corações humanos tanto obriga,
- puro, mas cruel
personificação
do Amor
Deste causa à molesta morte sua, -dominador e tirano;
- causador da desgraça que conta;
Como se fora pérfida inimiga. - cruel, que não se satisfaz com
Se dizem, fero Amor, que a sede tua lágrimas, pois deseja sangue.
Nem com lágrimas tristes se mitiga,
comparação
É porque queres, áspero e tirano,
Tuas aras banhar em sangue humano.
44. Estavas, linda Inês, posta em sossego,
Apresentação de Inês,
De teus anos colhendo doce fruto, remetendo para o momento
anterior à sua morte:
Naquele engano da alma, ledo e cego,
Metáfora - beleza, juventude, em Coimbra
Que a fortuna não deixa durar muito, - tranquilidade,
- paz ilusória,
Nos saudosos campos do Mondego,
- já a presença do sofrimento
De teus fermosos olhos nunca enxuto, amoroso
Desenvolvimento
Aos montes ensinando e às ervinhas
Perífrase – O nome que no peito escrito tinhas.
Pedro
121
Hipérbato: Do teu Príncipe ali te respondiam Este amor vive de memórias
As lembranças do felizes e ilusórias.
teu príncipe que na As lembranças que na alma lhe moravam, Também D. Pedro vive este
alma lhe moravam,
respondiam-te ali. Que sempre ante seus olhos te traziam, amor, da mesma forma.
Quando dos teus fermosos se apartavam:
Antítese
De noite em doces sonhos, que mentiam,
Oração relativa
explicativa De dia em pensamentos, que voavam. É um amor marcado pela
E q