1. LIRA DOS VINTE ANOS
No prefácio da primeira parte, o autor avisa: “É uma lira, mas sem cordas;
uma primavera, mas sem flores; uma coroa de folhas, mas sem viço. //
Cantos espontâneos do coração, vibrações doridas da lira interna que
agitava um sonho, notas que o vento levou – como isso dou a lume essas
harmonias”.A poesia aparece aqui como expressão de um estado de
espírito marcado pela tristeza e pela melancolia.Ela funciona como um
registro de vida, daí sua espontaneidade – sugestão de que não teria
passado pelo crivo da razão, originando-se diretamente do coração e da
alma do poeta. O anseio de algo que acabou por não se realizar, graças à
morte prematura do autor, está prenunciado na referência ao “sonho”.
2. “Lembrança de morrer” é, significativamente, o
texto que encerra essa primeira parte. Poema
emblemático de toda a poesia ultrarromântica,
trata-se de uma verdadeira súmula temática da
estética: referências à morte (“Quando em meu
peito rebentar-se a fibra, / Que o espírito enlaça à
dor vivente”), o desprezo pela vida (“Eu deixo a
vida como deixa o tédio / Do deserto o poento
caminheiro”), a saudade materna (“De ti, ó minha
mãe! pobre coitada / Que por minha tristeza te
definhas!”) e a figura feminina, virginal, veículo de
um amor platônico (“É pela virgem que sonhei...
que nunca / Aos lábios me encostou a face linda!”).
3. Já o prefácio da segunda parte avisa o leitor sobre
o que esperar dela: “[O poeta] Tem nervos, tem
fibra e tem artérias – isto é, antes e depois de ser
um ente idealista, é um ente que tem corpo. E,
digam o que quiserem, sem esses elementos, que
sou o primeiro a reconhecer, muito prosaicos, não
há poesia”. De fato, os poemas se distanciam do
idealismo para tratar de aspectos corriqueiros da
existência humana. O tratamento temático é ainda
romântico, mas a nota cômica que salta aos olhos
aqui e ali permite perceber alguma diferença.
4. Destaca-se “Namoro a cavalo”, que relata um
desastrado encontro amoroso que foge em tudo da
média romântica. O próprio enamorado registra o
momento final do episódio: “Circunstância
agravante. A calça inglesa / Rasgou-se no cair de
meio a meio, / O sangue pelas ventas me corria /
Em paga do amoroso devaneio!”. Como se vê,
nada que faça lembrar os abraços e beijos –
mesmo que sonhados – das aventuras amorosas
do romantismo.
5. SOBRE O AUTOR
Álvares de Azevedo foi um poeta
romântico típico. Jovem e tuberculoso,
fez da poesia uma válvula de escape
para seus anseios e frustrações.
Mesmo que haja algo de fictício em
sua biografia, o fato é que sua poesia
reúne o que há de mais propriamente
romântico: o sentimentalismo, a
morbidez e o pessimismo que
caracterizaram a geração que teve no
poeta inglês Byron seu maior modelo.