1. O documento discute a evolução da doutrina da responsabilidade civil do Estado, desde a teoria da irresponsabilidade até a teoria do risco administrativo que fundamenta a responsabilidade objetiva do Estado.
2. A responsabilidade civil do Estado no direito brasileiro é objetiva para atos comissivos e subjetiva para atos omissivos, dependendo da prova de culpa do serviço público.
3. O documento exemplifica situações em que o Estado pode ser responsabilizado e quando pode haver excludentes ou atenuantes dessa responsabilidade.
Estado de bem estar origem modelos e terminologias
Resp Civ Estado bens públicos
1. Roteiro DAd - Resp Civil Estado - Bens PúblicosRoteiro DAd - Resp Civil Estado - Bens Públicos
Prof. Wallace C. Seifert
EDITAL: 10. Responsabilidade civil da
Administração: evolução doutrinária;
responsabilidade civil da Administração no
Direito brasileiro; ação de indenização; ação
regressiva.
RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO
# Principal fonte jurídica atual
CF, art. 37, § 6º - “As pessoas jurídicas de direito
público e as de direito privado prestadoras de
serviços públicos responderão pelos danos que
seus agentes, nessa qualidade, causarem a
terceiros, assegurado o direito de regresso contra o
responsável nos casos de dolo ou culpa.”. Este
dispositivo trata principalmente da responsabilidade
objetiva do Estado, fato que nem sempre foi assim,
conforme será explicitado a seguir.
Outra informação importante é que, apesar de não
expresso no Edital, é importante que o candidato
saiba que trata-se de um tipo de responsabilidade
extracontratual do Estado, uma vez que a
contratual, se rege por princípios próprios,
normalmente estudados juntamente com o capítulo
de contratos administrativos.
Ressalta-se ainda que, diferentemente do que
ocorre no direito privado, em que a
responsabilidade exige sempre um ato ilícito
(contrário à lei), no direito administrativo ela pode
decorrer de atos ou comportamentos que, embora
lícitos, causem a pessoas determinadas ônus maior
do que o imposto aos demais membros da
coletividade. Note que o fundamento básico então
para haver a responsabilização do Estado
atualmente é o fato da justiça social que prega um
tratamento igualitário que o Estado deve dispensar
em prol da sociedade. Nesta linha, poderíamos
genericamente definir responsabilidade
extracontratual do Estado, genericamente, sem
preocupação com a identificação de nenhuma das
teorias que serão vistas adiante, como: obrigação
de reparar danos causados a terceiros em
decorrência de comportamentos comissivos ou
omissivos, materiais ou jurídicos, lícitos ou
ilícitos, imputáveis aos agentes públicos
1. Evolução doutrinária
Maria Sylvia leciona que “a regra adotada, por muito
tempo, foi a da irresponsabilidade; caminhou-se,
depois, para a responsabilidade subjetiva,
vinculada à culpa, ainda hoje aceita em várias
hipóteses; evoluiu-se, posteriormente, para a teoria
da responsabilidade objetiva, aplicável, no
entanto, diante de requisitos variáveis de um
sistema para outro, de acordo com normas
impostas pelo direito positivo.” Nesta linha,
baseando-se principalmente no sistema europeu-
continental (destacando-se os trabalhos
jurisprudenciais do Conselho de Estado francês), as
teorias sobre o tema compreendem:
a) teoria da irresponsabilidade
Foi adotada na época dos Estados absolutos e
repousava fundamentalmente na idéia de soberania
(Estado com autoridade incontestável perante o
súdito) onde o próprio Estado exercia a tutela do
direito, de modo não poder agir contra si. Daí os
princípios de que o rei não pode errar ou fazer mal
(respectivamente, the king can do no wrong; le roi
ne peut mal faire) e o que “aquilo que agrada ao
príncipe tem força de lei” (quod principi placuit
habet legis vigorem). Conseqüentemente, por esta
teoria, qualquer tentativa de responsabilizar o
Estado significaria colocá-lo no mesmo nível que o
súdito, desrespeitando sua soberania.
b) teorias civilistas
b.1) teoria dos atos de império e de gestão
Foi apenas no século XIX que a tese da
irresponsabilidade ficou superada. Numa primeira
fase, distinguia-se, para fins de responsabilização
do Estado, os atos de império e os atos de
gestão.
Os primeiros seriam os praticados pela
Administração com todas as prerrogativas e
privilégios de autoridade (fruto das normas e
princípios que conformam o Regime Jurídico
Administrativo) e impostos coercitivamente ao
particular, independentemente de autorização
judicial, sendo regidos por um direito especial,
exorbitante do direito comum (de forma que os
particulares não poderiam praticar atos
semelhantes). Os últimos, seriam praticados pela
Administração em situação de igualdade com os
particulares, para a conservação e desenvolvimento
do patrimônio público e para a gestão de seus
serviços, aplicando-se nestes casos, em caso de
divergência, o direito comum.
Esta teoria perdeu força, primeiramente, pela
impossibilidade de dividir-se a personalidade do
Estado (sendo a pessoa do Rei, que praticaria os
atos de império, da pessoa do Estado, que
praticaria os atos de gestão, através de seus
prepostos) e pela impossibilidade de enquadrar-se
como de gestão todos atos praticados pelo Estado
na administração do patrimônio público e na
prestação de seus serviços.
b.2) teoria da culpa civil ou da responsabilidade
subjetiva
Abandonada, pelos motivos expostos, a distinção
entre atos de império e gestão, muitos países
continuam apegados à doutrina civilista, aceitando a
responsabilidade do Estado, desde que
demonstrada a culpa. Nestes casos, procura-se
equiparar a responsabilidade do Estado à do
patrão, ou comitente, pelos atos dos empregados
ou prepostos. Lembrando-se que no Direito Civil,
para haver a responsabilização de uma pessoa
(responsabilização subjetiva), devem estar
presentes quatro elementos:
1º) ação ou omissão;
2º) culpa ou dolo;
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3º) relação de causalidade entre a ação ou omissão
e o dano verificado;
4º) ocorrência de um dano material ou moral.
Por estas, a responsabilização do Estado existe
porque o serviço funcionou mal, podendo ocorrer
nos seguintes casos: o serviço público não
funcionou (omissão), funcionou atrasado ou
funcionou imperfeitamente. Em qualquer destas três
hipóteses ocorre a culpa (faute) do serviço ou
acidente administrativo, que não tem nada haver
com a possível culpa do funcionário.
Questão que tem gerado confusão aos candidatos a
concurso público é o fato da classificação desta
responsabilização na hora de definir se este tipo de
responsabilização é objetiva ou subjetiva. Lembre-
se que falamos em “culpa” do serviço que deve ser
demonstrada no processo, ou seja, se depende de
demonstração de culpa, a responsabilidade é
subjetiva.
Desta teoria vem as questões de prova que falam
sobre a responsabilização do Estado por omissão.
Não tenham dúvida, é subjetiva e – aproveitando
jurisprudência recente do STF a respeito do tema –
foi reconhecida, pelo próprio Pretório Excelso
(STF), esta subjetividade, esclarecendo-se ainda
que se deve demonstrar a culpa da Administração
por meio da teoria do dano direto e imediato que,
por sua vez, não admite a existência de
“concausas” (outros fatores existentes que
colaboram para ocorrência do dano) na geração do
referente dano.
Na prática, lembre-se de dois casos:
1º caso: condenado foge da prisão (omissão do
Estado em relação ao serviço de segurança pública
o que configura pela nossa teoria presente a culpa
administrativa); forma uma quadrilha (1ª concausa);
seis meses depois (desconfigurado, portanto, dano
direto e imediato), num assalto da quadrilha,
proprietário de veículo reage (2ª concausa, talvez
se não reagisse não seria assassinado) e é morto
pelo mesmo bandido que fugiu anteriormente por
falha no sistema penitenciário estadual. Pelo já
exposto, não haverá neste caso a
responsabilização do Estado por esta omissão, pois
a culpa do Estado pela omissão do serviço não
gerou dano direto e imediato, inclusive sendo
identificado concausas na situação apresentada
(neste sentido foi a decisão recente do STF em
caso concreto ocorrido no julgamento de recurso
extraordinário encaminhado por Estado-membro da
Região Sul do País onde o Tribunal de Justiça
respectivo tinha responsabilizado o referido Estado,
condenando-o ao pagamento de indenização a
esposa da vítima. A excelsa Corte deu provimento
ao recurso e reformou a decisão do Tribunal local
para não reconhecer na espécie a
responsabilização do respectivo Estado.)
2º caso: condenado, durante rebelião que gerou
sua fuga de penitenciária (omissão do Estado em
relação ao serviço de segurança pública o que
configura pela nossa teoria presente a culpa
administrativa), mata outro detento que não tinha
nada haver com a rebelião, mas tinha sido pego
como refém do grupo que fugiu. Nesta situação,
está cristalino que o dano foi causado de modo
direto e imediato pelo má funcionamento da
segurança do presídio, não tendo como se
identificar concausas, ou seja, o Estado será
responsabilizado a indenizar a família da vitima.
c.2) teoria do risco administrativo (fundamento
para a responsabilidade objetiva do Estado)
Baseia-se no princípio da justiça social adotado em
grande parte dos Estados modernos, onde o ônus e
encargos sociais devem ser igualmente repartidos
pelos membros da sociedade. Ou seja, se uma
pessoa ou grupo sofrem um ônus do que o
suportado pelas demais, rompe-se o equilíbrio que
necessariamente deve haver por questão isonômica
e para restabelecer este equilíbrio, o estado deve
indenizar o(s) prejudicado(s), utilizando recursos do
erário público. Reparem que aqui pouco importa se
o serviço tenha funcionado bem ou mal, como
importava na teoria anterior.
Baseia-se, portanto, no fato de que a execução da
função administrativa do Estado envolve risco de
dano, sendo objetiva, pois independe da
apreciação de elementos subjetivos (dolo ou
culpa). Causado o dano, o Estado responde como
se fosse uma empresa de seguro em que os
segurados seriam os contribuintes que, pagando os
tributos, contribuem para a formação de um
patrimônio coletivo.
Parte da doutrina diferencia esta teoria em tela da
do risco integral, pelo fato de poder admitir (a do
risco integral não) as causas excludentes ou
atenuantes de responsabilização do Estado que
serão vistas adiante.
No ordenamento brasileiro, a responsabilidade
objetiva do Estado esta disposta na primeira parte
do art. 37, § 6º, já reproduzido, sendo que do
mesmo podemos extrair algumas exigências:
i) trate-se de pessoa jurídica de direito público ou
privado prestadora de serviço público (incuindo
nestas ùltimas: fundações governamentais de
direito privado; sociedade de economia mista,
empresas públicas, e permissionárias ou
concessionárias de serviço público);
ii) prestem serviço público;
iii) haja um dano à terceiro – nexo de causa e efeito;
iv) que o dano seja causado por agente; e
v) que o agente cause dano no exercício de suas
funções.
# Excludente ou atenuantes da responsabilidade
objetiva
Caso fortuito ou força maior, uma vez que
constituem fatos imprevisíveis. São excludentes da
responsabilidade objetiva, pois mesmo que
comprovados casos de mal funcionamento de
certos serviços (fault du service) que atuaram
concorrentemente com os mesmos, como já foi
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visto não irá configurar uma responsabilização
objetiva do Estado, como já vimos, visto que terá
que ser provada a culpa anônima do serviço.
Culpa de terceiros (atos de multidões). São
também excludentes da responsabilidade
objetiva, entretanto a explicação final do caso
anterior, quanto a possível existência concorrente
de falha na prestação do serviço, aplica-se ao
presente caso; e
Culpa da vítima. Se concorrente com agente
público, será caso de atenuação ou mitigação da
responsabilidade objetiva do Estado; já se
exclusiva (da vítima), será caso de excludente da
responsabilidade objetiva.
2. Responsabilidade Civil do Estado no Direito
Brasileiro
Complementando o que já foi exposto sobre o tema,
colocamos algumas outras situações concretas que
já foram exploradas ou podem ser exploradas em
provas:
a) Aplica-se indistintamente a quaisquer das
funções públicas, não só aos danos provenientes
de atos administrativos (ex., no caso de um
motorista, dirigindo carro oficial do Poder
Legislativo, abalroar carro particular, sem culpa do
particular, o Estado indenizará a vitima,
independentemente de culpa de seu agente. A
indenização, nesse caso, não decorre,
evidentemente, de nenhum ato administrativo, mas
de um simples fato da Administração);
b) O Estado responde mesmo se o agente atuou
com excesso ou desvio de poder, desde que tenha
atuado na qualidade de agente público;
c) Nossa jurisprudência só admite a
responsabilidade por atos legislativos no caso de:
(a) lei inconstitucional; e (b) leis de efeitos
concretos;
d) Nossa jurisprudência não admite
responsabilidade por atos jurisdicionais, salvo no
caso de erro judiciário na área criminal, e somente
nela;
e) Só está consagrada a responsabilidade objetiva,
constitucionalmente, para atos comissivos do
Estado;
f) Para os atos omissivos, a regra é a
responsabilidade subjetiva, por culpa do serviço (o
Estado, devendo legalmente agir para evitar um
dano, e podendo fazê-lo, não o fez ou não o fez
tempestiva ou eficientemente), que deve ser
provada pela pessoa que sofreu o dano, devendo
este, como vimos, ser ocasionado pela teoria do
dano direto e imediato;
g) O agente somente responde em ação regressiva,
e só se houver atuado com dolo ou culpa
(responsabilidade subjetiva do agente); a ação só
pode ser intentada, pela Administração, após ela
haver indenizado a vítima;
h) As concessionárias ou permissionárias de
serviço público respondem objetivamente apenas
em relação aos usuários de seus serviços. No caso
de terceiros, não usuários de serviços públicos, a
responsabilidade, como também já visto, é
subjetiva. O Estado aqui, bem como nos casos dos
prestadores de serviços e obras por força de
contratos administrativos, responderá
subsidiariamente.
i) no caso da responsabilização por danos
causados por obras públicas executadas
diretamente pelo Estado (caso seja executada por
terceiros já foi vista na letra anterior, parte final), a
doutrina é dividida, mas majoritariamente definindo-
a como caso de objetiva (Neste sentido, Hely
Lopes Meirelles e José dos Santos Carvalho Filho)
j) entendemos que a responsabilidade civil do
Estado por danos nucleares é objetiva mesmo no
caso de dano ocasionado por omissão do Estado
(CF, art. 21, XXIII, “c”).
3. Ação de Indenização
a) Em regra, o particular que sofreu o dano
praticado pelo agente deverá intentar a ação de
indenização em face da Administração Pública, e
não contra o agente causador do dano;
b) O Supremo Tribunal Federal firmou entendimento
no sentido de que é facultado ao particular a
propositura da ação contra o Estado e o agente
público conjuntamente, formando-se litisconsórcio
passivo facultativo (RE 90.071-3).
c) Bastará ao particular demonstrar a relação de
causa e conseqüência entre o fato lesivo e o dano,
bem assim o valor patrimonial desse dano.
d) A Administração somente se eximirá da
obrigação de indenizar se provar culpa exclusiva da
vítima (a culpa concorrente acarreta atenuação
proporcional).
4. Ação Regressiva
a) A entidade pública, para voltar-se contra o
agente, deverá comprovar já ter indenizado a
vítima, pois seu direito de regresso nasce a partir do
pagamento.
b) Somente há responsabilidade do agente no caso
de dolo ou culpa deste.
c) Trata-se de ação civil, portanto, seus efeitos
transmitem-se aos sucessores do culpado; da
mesma forma, o agente pode ser condenado
mesmo após cessado seu vínculo funcional com a
pessoa jurídica autora da ação regressiva.
d) É inaplicável a denunciação da lide pela
Administração a seus agentes, no caso da ação de
reparação do dano.
EDITAL: 9. Domínio público: conceito e
classificação dos bens públicos; administração,
utilização e alienação dos bens públicos;
imprescritibilidade, impenhorabilidade e não
oneração dos bens públicos; aquisição de bens
pela Administração; terras públicas; águas
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públicas; jazidas; florestas; fauna; espaço
aéreo; patrimônio histórico; proteção ambiental.
DOMÍNIO PÚBLICO
1. Conceito
Como veremos adiante, o conceito de domínio
envolve o de propriedade e, portanto, antes de
entrar no tema propriamente dito, convém lembrar
que vivemos atualmente num Estado Democrático
de Direito, onde a propriedade deve atender aos
anseios da coletividade (função social), desta feita,
se, em outrora, a propriedade direito absoluto já se
limitava, tanto mais agora quando se vislumbra um
conteúdo social no seu uso. Assim sendo, a
concepção moderna, longe de ser um exemplo de
potestade absoluta, é um direito limitado no
interesse da coletividade, ou seja, é relativa.
Conforme nos lembra Hely Lopes Meirelles1
o
conceito de domínio público não está indene a
controvérsias, não carreando unanimidade na
doutrina. Segundo o administrativista, o conceito
tem dois desdobramentos, um político, referente ao
domínio iminente, e um jurídico, referente ao
domínio patrimonial. Passa a definir o domínio
iminente como "o poder político pelo qual o Estado
submete à sua vontade todas as coisas de seu
território", mas frisa que se trata de exercício da
soberania interna e não de um direito de
propriedade, de tal sorte que alcança não só os
bens pertencentes às entidades públicas, mas
também os bens privados2
.
Já o domínio patrimonial é definido como "direito
de propriedade, mas de direito de propriedade
pública, sujeito a um regime administrativo
especial". Tomada esta última definição, tem-se por
oportuna a advertência de Cretella Júnior segundo
o qual "a expressão domínio público apresenta
extensão menor do que a expressão bem público.
Há bens públicos que ultrapassam a área do
domínio público, enquadrando-se em campo regido
1 Hely Lopes Meirelles: "O conceito de domínio público não é
uniforme na doutrina, mas os administrativistas concordam em
que tal domínio, como direito de propriedade, só é exercido
sobre bens pertencentes às entidades públicas e, como poder
de Soberania interna, alcança tanto bens públicos como coisas
particulares de interesse coletivo." E segue: "A expressão
domínio público ora significa o poder que o Estado exerce sobre
os bens próprios e alheios, ora designa a condição desses bens.
A mesma expressão pode ainda ser tomada como o conjunto de
bens destinados ao uso público (direito ou indireto - geral ou
especial - ‘uti singuli’ ou ‘uti universi’), como pode designar o
regime a que se subordina esse complexo de coisas afetadas de
interesse público" (Direito Administrativo Brasileiro, Malheiros,
30a
ed. 2005, p. 498). Também Cretella Júnior manifesta-se
demonstrando a dificuldade de definição da expressão, verbis;
"A expressão domínio público, que se contrapõe à expressão
domínio privado, conquanto simples na aparência, oferece
extrema dificuldade para ser conceituada." (Direito
Administrativo Brasileiro, Forense, 2a
ed., 2000, p. 805).
2 Em nome do domínio iminente é que são estabelecidas as
limitações ao uso da propriedade privada, as servidões
administrativas, e desapropriação, as medidas de polícia e o
regime jurídico especial de certos bens particulares de interesse
público
por princípios do direito comum". Também Maria
Sylvia Zanella Di Petro refere-se à distinção vigente
no direito italiano, sendo "demanio" (domínio
público) próprio dos bens de uso comum do povo, e
bens patrimoniais, que se subdividem em bens do
patrimônio disponível e indisponível.
Maria Sylvia Zanella Di Pietro leciona3
que: "A
expressão domínio público é equívoca, no sentido
de que admite vários significados: 1. Em sentido
amplo, é utilizada para designar o conjunto de bens
pertencentes às pessoas jurídicas de direito público
interno, políticas e administrativas (União, Estados
e Municípios, Distrito Federal, Territórios e
autarquias). 2. em sentido menos amplo, utilizado
na referida classificação do direito francês, designa
os bens afetados a um fim público, os quais, no
direito brasileiro, compreendem os de uso comum
do povo e os de uso especial. 3. Em sentido restrito,
fala-se em bens do domínio público para designar
apenas os destinados ao uso comum do povo,
correspondendo ao demanio do direito italiano;
como não eram considerados, por alguns autores,
como pertencentes ao poder público, dizia-se que
estavam no domínio público; o seu titular seria, na
realidade, o povo."
Concluindo, ressaltamos que ao domínio público se
contrapõe o domínio privado4
. O domínio público
implica uma disciplina exorbitante e derrogatória do
direito privado dando ensejo à constituição de um
regime jurídico de direito público que mais adiante
será explicitado.
2. Classificação dos Bens Públicos.
A classificação dos bens públicos segue a linha
traçada pelo Código Civil, em seu art. 99, verbis:
“São bens públicos:
I – os de uso comum do povo, tais como rios,
mares, estradas, ruas e praças;
II – os de uso especial, tais como edifícios ou
terrenos destinados a serviço ou estabelecimento
da administração federal, estadual, territorial ou
municipal, inclusive os de suas autarquias;
III – os dominicais, que constituem o patrimônio das
pessoas jurídicas de direito público, como objeto de
direito pessoal, ou real, de cada uma dessas
entidades.
Parágrafo único – não dispondo a lei em contrário,
consideram-se dominicais os bens pertencentes às
3 Direito Administrativo, Atlas, 18a
ed. 2005, p. 581.
4 Contudo calha a lembrança de Pontes de Miranda, segundo a
qual: "Os dois conceitos, de bem particular e de bem público,
não correspondem, exatamente, à precipuidade da satisfação
dos interesses privados, ou públicos. Há caminhos abertos ao
público que pertencem a particulares e deveres e obrigações de
direito público que se integram no conteúdo do direito de
propriedade e, pois, o limitam. O problema de se distinguirem os
bens particulares e os bens públicos é, pois, de solução a
posteriori. Cada sistema jurídico diz quais são os bens públicos.
Tanto quanto o outro problema, inconfundível com esse, de se
precisar dentro de quais limites fica o direito de propriedade,
quais os deveres e obrigações que se lhe impõe."(Tratado de
Direito Privado, Borsói, 1954, t. II, § 155, p. 155-156)
- 4 -
5. Roteiro DAd - Resp Civil Estado - Bens PúblicosRoteiro DAd - Resp Civil Estado - Bens Públicos
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pessoas jurídicas de direito público a que se tenha
dado estrutura de direito privado.”
Como visto nos dispositivos retrocitados, não se
pode vislumbrar grande dificuldade na sua
classificação, uma vez que as disposições de lei
foram suficientemente claras, não obstante a
objetividade e singeleza com que referiram ao tema.
2.1. Bens de uso comum
Dentro da proposta de acrescermos às definições
do Código Civil as considerações da doutrina,
façamos a invocação dos mestres. Na definição de
Di Pietro, bens de uso comum são aqueles que "por
determinação legal ou por sua própria natureza,
podem ser utilizados por todos em igualdade de
condições, sem necessidade de consentimento
individualizado por parte da Administração"5
.
Cretella Júnior aduz que "bem de uso comum é
todo imóvel ou móvel sobre o qual o povo, o
público, anonimamente, coletivamente, exerce
direitos de uso e gozo, como por exemplo, o
exercido sobre as estradas, os rios, as costas do
mar". Hely Lopoes Meirelles os define afirmando
que bens de uso comum são aqueles que "como
exemplifica a própria lei, são os mares, praias, rios,
estradas, ruas e praças. Enfim, todos os locais
abertos à utilização pública adquirem este caráter
de comunidade, de uso coletivo, de fruição própria
do povo". Como se pode observar, a marcante
característica dos bens de uso comum reside na
possibilidade de sua utilização pelo povo,
independentemente de autorização especial,
estando sua fruição ao alcance de todos desde que
respeitado o direito dos demais.
2.2. Bens de uso especial
Segundo o mesmo Hely Lopes Meirelles, estes são
"os que se destinam especialmente à execução dos
serviços públicos e, por isso mesmo, são
considerados instrumentos desses serviços; não
integram propriamente a Administração, mas
constituem o aparelhemento administrativo, tais
como os edifícios das repartições públicas, os
terrenos aplicados aos serviços públicos, os
veículos da Administração, os matadouros, os
mercados e outras serventias que o Estado põe à
disposição do público, mas com destinação
especial. Tais bens, como têm uma finalidade
pública permanente, são também chamados de
bens patrimoniais".
No escólio de Cretella Júnior, bens de uso especial
"são os imóveis, edifícios e terrenos aplicados a
serviço de repartições ou de estabelecimento
público, bem como os imóveis e material,
indispensáveis para o funcionamento de tais
serviços, tais como os veículos do Estado,
matadouros, mercados". Segundo ele, "os bens de
que se utiliza, instrumentalmente, a Administração,
excluindo os administrados, são porções do
território, construções ou terrenos, assim como o
5 Direito Administrativo, Atlas, 18a
ed. 2005, p. 583.
aparelhamento necessário para que o serviço
público se concretize, o mobiliário, estático ou
dinâmico, situado nas porções de terreno ou nos
edifícios; não integram, por excelência, a
Administração, mas servem, instrumentalmente,
para a consecução dos serviços públicos,
funcionando como causa material, meio para que o
Estado atinja seus fins. Se há uso especial ou
privativo, o usuário não é o particular, as a pessoa
jurídica pública (União, Estados e Municípios) à
qual se acha afetado o bem". Para Celso Antônio
Bandeira de Mello são "os afetados a um serviço,
os estabelecimentos públicos, como as repartições
públicas, isto é, locais onde se realiza a atividade
pública ou onde está á disposição dos
administrados um serviço, como teatros,
universidades, museus e outros abertos à visitação
pública". Finalmente, para Maria Sylvia Zanella Di
Pietro "são todas as coisas, móveis e imóveis,
corpóreas ou incorpóreas, utilizadas pela
Administração Pública para a realização de suas
atividades e consecução de seus fins". Completa a
autora que a expressão “destinados a serviço” do
inciso II, do art. 99 do CC, deve ser entendida em
sentido amplo, para abranger toda a atividade de
interesse geral exercida sob autoridade ou sob
fiscalização do poder público, nem sempre se
destinando ao uso direto pela administração,
podendo ter por objeto o uso por particular, como
ocorre com o mercado municipal, o cemitério
público, o aeroporto, a terra dos silvícolas etc.
Assim sendo, ainda para a doutrinadora, seriam
exemplos de bens de uso especial, além destes já
mencionados e de uso por particulares: os imóveis
onde estão instaladas as repartições públicas, os
bens móveis utilizados pela Administração, museus,
bibliotecas, veículos oficiais, e agora, pela nova
Constituição, as terras devolutas ou arrecadadas
pelos Estados, por ações discriminatórias,
necessárias a proteção de ecossistemas naturais.
Como se vê, ditos bens não perdem o caráter de
públicos, porque são de propriedade do Estado, no
entanto, sua utilização não é conferida a qualquer
do povo, pois estão afetos a uma destinação
específica relacionada a um serviço ou atividade de
cunho público.
Por fim cabe ressaltar que a expressão bens de uso
especial não grassa acolhida unânime entre a
doutrina, preferindo alguns a denominação bens do
patrimônio indisponível6
.
6 Como lembra Di Pietro: "A expressão ´´uso especial´´, para
designar essa modalidade de bem, não é muito feliz, porque se
confunde com outro sentido em que é utilizada, quer no direito
estrangeiro, quer no direito brasileiro, para indicar o uso privativo
do bem público por particular e também para abranger
determinada modalidade de uso comum sujeito a maiores
restrições, como pagamento de pedágios e autorização para a
circulação de veículos especiais. É mas adequada a expressão
utilizada pelo direito italiano e pelo Código de Contabilidade
Pública, ou seja, bens do patrimônio indisponível.; por aí se
ressalta o caráter patrimonial do bem (ou seja, a sua
possibilidade de ser economicamente avaliado) e sua
- 5 -
6. Roteiro DAd - Resp Civil Estado - Bens PúblicosRoteiro DAd - Resp Civil Estado - Bens Públicos
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2.3. Bens Dominicais
Conforme a lição de Celso Antônio Bandeira de
Mello, estes são "os próprios do Estado como
objeto de direito real, não aplicados nem ao uso
comum, nem ao uso especial, tais os terrenos ou
terras em geral, sobre os quais tem senhoria, à
moda de qualquer proprietário, ou que, do mesmo
modo, lhe assistam em conta de direito pessoal".
Hely Lopes Meirelles preconiza que "são aqueles
que, embora integrando o dominio público como os
demais, deles diferem pela possibilidade sempre
presente de serem utilizados em qualquer fim ou,
mesmo, alienados pela Administração, se assim o
desejar. Daí por que recebem também a
denominação de bens patrimoniais disponíveis ou
de bens do patrimônio fiscal. Tais bens integram o
patrimônio do Estado como objeto de direito
pessoal ou real, isto é, sobre eles a Administração
exerce ´´poderes de propriedade, segundo os
preceitos de direitos constitucional e administrativo
´´, na autorizada expressão de Clóvis Beviláqua".
Maria Sylvia Zanella Di Pietro os define afirmando
que "os bens do domínio privado do Estado,
chamados de bens dominicais pelo Código Civil, e
bens do patrimônio disponível pelo Código de
Contabilidade Pública, são definidos legalmente
como ´´os que constituem o patrimônio da União,
dos Estados ou Municípios, como objeto de direito
pessoal ou real de cada uma dessas entidades".
Para Cretella Júnior "o vocábulo dominical é
legítimo e bem formado atributo, designando, em
nossa lingua, o tipo de coisa ou bem que pertence
ao dominus, senhor ou proprietário. O bem
dominical é igualmente conhecido pelos nomes
de bem disponível, bem do patrimônio
disponível, bem patrimonial disponível, bem do
patrimônio fiscal, bem patrimonial do estado e
bem do domínio privado do Estado. As
expressões ´´bem dominical´´, bem patrimonial do
Estado´´ ou ´´bem do patrimônio disponível ´´
servem para designar a parcela de bens
pertencente ao Estado, em sua qualidade de
proprietário. Ao lado dos bens do patrimônio
indispensável, os bens do patrimônio disponível ou
dominicais constituem os bens do domínio privado
do Estado; os primeiros, afetos aos serviços
públicos, não se alienam, enquanto durar a
afetação, os outros, não afetados aos serviços
públicos, são suscetíveis de serem alienados,
mediante a forma que a lei especial autorizar”.
Como se pode ver, no caso dos bens dominicais a
relação jurídica existente é semelhante a de direito
privado, pois o Estado dispõe do bem por direito
pessoal ou real da mesma forma que o particular, o
que, contudo, não implica a derrogação dos
princípios a que está adstrita a Administração
indisponibilidade, que resulta, não da natureza do bem, mas do
fato de estar ele afetado a um fim público" Ressalva adiante que
o sentido de serviço há de ser o mais lato, não se limitando à
utilização direta pela Administração. (Direito Administrativo cit, p.
583).
Pública no trato da res públicae como em todas as
suas atividades. Mas por certo, a rigidez a que se
submete a sua utilização não é tão extremada
quanto às demais categorias.
3. Regime Jurídico dos Bens Públicos
Os bens públicos sujeitam-se a uma disciplina
especial, haja vista a titularidade da propriedade e
sua destinação. Esta disciplina especial constitui o
denominado "regime jurídico dos bens públicos"
que passaremos a explicitar. Desde já podemos
adiantar que nas atividades relacionadas aos bens
públicos sobressai a mesma limitação a que está
submetida a Administração Pública no que
concerne aos fins a que se destina, ou mais
especificamente ao escopo magno do bem comum.
Desta situação deflui a aplicação imediata dos
princípios do Direito Administrativo, mais de perto
os princípios da legalidade, publicidade, finalidade e
indisponibilidade. Tratemos aqui dos princípios
específicos da disciplina dos bens públicos que são
a inalienabilidade, imprescritibilidade, a
impenhorabilidade e a impossibilidade de oneração.
a) Inalienabilidade
Os bens de uso comum e especial são inalienáveis
a teor do artigo 67 do CC revogado e 100 do novo
CC, pois estão fora do comércio jurídico de direito
privado (não podem sofrer compra e venda,
doação, permuta, hipoteca, penhor, comodato,
locação, posse ad usucapionem etc.),
excepcionalmente e nos casos definidos em lei,
podem haver casos de mutabilidade dominial,
passando o bem de um ente político para outro ou
para um entidade (caso da criação de uma
fundação governamental, por exemplo). Mesmo,
nos casos de bens dominicais, deve seguir
normatização legal, como será visto adiante
b) Imprescritibilidade:
Os bens públicos constituem em substância res
extracomercium. Contra eles não pode correr
prescrição aquisitiva. Não obstante, grassou longa
polêmica acerca da possibilidade de usucapião
sobre terras públicas. Após a vigência do Código
Civil revogado, e seguindo o assento da corrente
predominante na jurispudência, vieram o Decreto
22.785 de 31-5-1933, o Decreto- lei n 710, de 17-
09-1938, e o Decreto-lei 9.760, de 5-09-1946,
proibindo o usucapião sobre imóveis públicos, além
da súmula nº 340 do Supremo Tribunal Federal.
As Constituições de 1937 e 1946 permitiam a
usucapião através do chamado usucapião pro
labore. A Constituição de 1967 permitiu se
viabilizasse, via legislação infraconstitucional, o
estabelecimento de condições para legitimação de
posse e de preferência para aquisição, o que
sobreveio pela lei 6.383/76. Após, com o advento
da Lei 6.969, de 10/12/1981, voltou-se a contemplar
a possibilidade de um usucapião pro labore. A nova
Constituição proíbe peremptoriamente o usucapião
nos artigos 183, § 3º, e 191, parágrafo único.
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Igualmente o novo Código Civil é peremptório em
vedar o usucapião de bens públicos (artigo 102).
c) Impenhorabilidade
A penhora constitui procedimento prévio à
alienação. Sendo inalienáveis, a priori, os bens
públicos não se sujeitam à penhora. Da mesma
forma, o artigo 100 da Constituição de 1988 prevê a
disciplina de precatórios para o pagamento das
obrigações por parte da Administração Pública,
afastando, por conseguinte, a possibilidade de
hasta pública sobre bens do Estado.
d) Não-oneração
São indenes, também, os bens públicos a
onerações, não se podendo sobre eles constituir
penhor, hipoteca ou anticrese. Esta é a tese
defendida por Meirelles, a nosso ver com acerto,
fundamentado na sua impenhorabilidade e
inalienabilidade. Realmente, ditas onerações
perderiam sentido frente a impossibilidade de
alienação do bem, tornando-se vazias de conteúdo.
4. Afetação e Desafetação
A inalienabilidade os bens não é, todavia, absoluta,
posto que podem ser afetados ou desafetados,
mudando de categoria e tornando-se alienáveis.
Uma vez desafetados, os bens públicos de uso
comum ou especial passam a ser bens dominicais e
passíveis de alienação. Mas os princípios da
legalidade e da indisponibilidade da coisa pública,
somados ao princípios da publicidade, da igualdade
dos administrados frente à Administração e da
moralidade, impõe limitações concernentes à forma
pela qual se processam as alienações de bens
públicos.
O princípio da legalidade, expressamente
contemplado na Constituição Federal, artigo 37,
limita atuação da Administração à rigorosa
observância da legalidade estrita de modo que à
Administração não é dado fazer o que a lei permite,
mas sim o que ela determina e tão somente isto. Na
definição da doutrina, o princípio toma matizes
diferenciado, mas convergentes. Hely Lopes
Meirelles ao tratar da legalidade, aduz: " A
legalidade, como princípio da administração(CF art
37, caput), significa que o administrador público
esta, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos
mandamentos da lei e à exigências do bem comum,
e deles não se pode afastar ou desviar sob pena de
praticar ato inválido e expor-se às responsabilidade
disciplinar, civil e criminal, conforme o caso. A
eficácia de toda a atividade administrativa está
condicionada ao atendimento da lei. Na
Administração pública não há liberdade nem
vontade pessoal. Enquanto na administração
particular é lícito fazer tudo o que a lei não proíbe,
na Administração Pública só é permitido fazer o que
a lei autoriza. A lei para o particular significa ´´ pode
fazer assim´´; para o administrador público significa
´´deve fazer assim´´(...).Tais poderes, conferidos à
Administração Pública para serem utilizados em
benefício da coletividade, não podem ser
renunciados ou descumpridos pelo administrador
sem ofensa ao bem comum, que é o supremo e
único objetivo de toda a ação administrativa".
Maria Sylvia Zanella Di Pietro traz à colação a
seguinte definição: "Segundo o princípio da
legalidade, a administração só pode fazer o que a
lei permite....Em decorrência disso, a Administração
não pode, por simples ato administrativo, conceder
direitos de qualquer espécie, criar obrigações ou
impor vedações aos administrados; para tanto ela
depende de lei"
Também a moralidade pública constitui um
pressuposto de qualquer ato jurídico, e ela só
estará presente mediante a observância de um a
série de circunstâncias denotadoras de licitude e
honestidade, entroncando-se com princípios da
moral comum e da ética. O princípio da publicidade
tem um entroncamento com outros princípios, pois
é a publicidade que permite aferir-se a observância
dos outros princípios, como a igualdade e a
moralidade administrativas. Meirelles nos lembra
que a publicidade não é elemento formativo do ato,
mas sim requisito de eficácia e moralidade.
A igualdade dos administrados perante a
administração é outro princípio presente, corolário,
aliás, do princípio da isonomia, consagrado no
artigo 5º caput, e inciso 1, da CF/88, e se traduz no
princípio da impessoalidade. Não pode a
Administração, no seu atuar, estabelecer
discriminações ilegais e indevidas a favor de quem
quer que seja, e isto vale para todos os seus atos.
Ressalta Di Pietro que o principio pode tomar duas
conotações. Afirma a autora que "no primeiro
sentido, o princípio estaria relacionado com a
finalidade pública que deve nortear toda atividade
administrativa. Significa que a Administração não
pode atuar com vistas a prejudicar ou beneficiar
pessoas determinadas, uma vez que é sempre o
interesse público que tem de nortear o seu
comportamento”.
A aplicação enfeixada destes princípios implica a
submissão das alienações de bens públicos a uma
disciplina legal rígida, carecendo a alienação de
bens imóveis de autorização legislativa e
obediência de qualquer alienação aos ditames da
oferta pública (licitação). A afetação, ao revés
implica tornar inalienável o bem na medida em que
ingressa em categoria de bens não sujeitos a
alienação. Entram em voga os artigos 17, 19, 22 e
23 da lei 8.666/93 no caso de alienação.
Resumindo, para alienação, em regra, de bens
dominicais imóveis teríamos as seguintes
condições:
Interesse público;
Prévia avaliação;
Em regra, licitação, por meio de concorrência;
Autorização legislativa, exceto para os bens
das empresas públicas e sociedades de economia
mista.
E tratando-se de móveis:
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Interesse público;
Prévia avaliação; e
Em regra, licitação, por meio de leilão.
5. Aquisição de bens públicos pela
Administração
Os bens de propriedade do Estado são
adquiridos por formas próprias do direito público e
por formas comuns do direito privado. Pode o
Estado, por exemplo, aceitar doações e é também
sucessor dos bens vagos. O recebimento de
doações, contudo carece de autorização legislativa
a teor do artigo 19 da Constituição, se feitas com
encargo. Os bens de heranças vagas passarão ao
patrimônio do Estado, Município ou União conforme
se situem em seus territórios. Quanto à compra,
como visto linhas atrás, está a Administração
jungida à observância da Lei de Licitações
(8.666/94).
6. Utilização de bens públicos por particular
Quanto ao critério de utilização do bem:
a) NORMAL – é a que se exerce de acordo com a
destinação principal do bem.
b) ANORMAL – é a que atende a finalidades
diversas ou acessórias
a) COMUM – é o que se exerce em igualdade de
condições por todos os membros da coletividade.
Características:
sem necessi// de consentimento da Adm.
gratuito, em geral
sujeito ao poder de polícia (regulamentação do
uso, fiscalização e aplicação de medidas
coercitivas)
regras: generalidade; liberdade; igualdade e
gratuidade. Quando forem seguidas todas estas
regras o uso será comum ordinário, caso contrário,
comum extraordinário.
b) PRIVATIVO ou especial – A administração
confere mediante título jurídico individual, a pessoa
ou grupo, para que exerçam com exclusividade.
Este título jurídico individual pode ser conferido por
dois meios: público (em regra, para utilização de
bens comuns ou especiais), podendo ser por
autorização de uso, permissão de uso e concessão
de direito real de uso e cessão de uso; ou privados
(em regra, para bens dominicais), podendo ser por
enfiteuse, locação ou comodato.
Permissão, Autorização, Cessão e Concessão
Estes institutos aplicam-se aos bens de uso comum
e especial. A autorização é definida como o ato
unilateral, discricionário e precário, pelo qual a
Administração consente na prática de determinada
atividade individual incidente sobre um bem público,
não tendo forma nem requisitos especiais para sua
efetivação, pois que se presta a atividades
transitórias para a Administração.
Di Pietro elenca as características da autorização:
a) reveste-se de maior precariedade do que a
permissão e a concessão; b) é outorgada, no mais
das vezes em caráter transitório; c) confere
menores poderes e garantias ao usuário; d)
dispensa licitação e autorização legislativa; e) não
cria para o usuário um dever de utilização, mas
simples faculdade. Segundo a mesma autora, as
autorizações podem ser simples ou qualificadas,
estas últimas ocorrendo quando ocorre a fixação de
prazo, o que faz com que se gere uma certa
estabilidade na medida em que a Administração
obriga-se a respeitar o prazo da autorização. Mas é
de ser lembrado que a possibilidade de dispensa de
licitação, que surge pelo caráter precário da
autorização, não torna a autorização um ato
administrativo indene ao controle de sua legalidade
pelos meios ordinários. Nos concursos, na verdade
o que tem diferenciado este tipo do seguinte
(permissão de uso) é o fato de prevalecer o
interesse do utente ou autorizatário (na permissão a
prevalência do interesse é o público)
A permissão de uso é o ato negocial, unilateral,
discricionário e precário, através do qual a
Administração faculta ao particular a utilização
individual de determinado bem público, podendo ser
com ou sem condições, gratuita ou remunerada, por
tempo certo ou indeterminado, atingindo qualquer
espécie de bem. Podemos classificá-las em
permissão de primeiro e de segundo grau,
consoante se proceda a utilização com empresa ou
não, entendida empresa como a utilização de
instalações onerosas que se aprofundem no solo ou
que aparelhem a parte do domínio ocupado para
melhor aproveitamento do local.
A concessão é o contrato administrativo pelo qual a
Administração Pública faculta ao particular a
utilização privativa de bem público para que a
exerça conforme sua destinação. Na definição de
Hely Lopes Meirelles, a concessão "é o contrato
administrativo pelo qual o Poder Público atribui a
utilização exclusiva de um bem de seu domínio a
particular, para que o explore segundo sua
destinação específica", podendo ser ou não
remunerada ou gratuita, mas sempre precedida de
autorização legal.
Da sua natureza contratual deflui uma estabilidade
e uma proeminência do interesse público que a
torna incedível sem prévia autorização. Da mesma
forma, como contrato administrativo, pode ter suas
cláusulas alteradas mediante composição dos
danos. Haja vista esta sua característica, presta-se
preferencialmente à atividades públicas de maior
envergadura.
Temos ainda a cessão de uso, que é a
transferência gratuita da posse de um bem público
de uma entidade ou órgão para outro, a fim de que
o cessionário o utilize nas condições estabelecidas
no respectivo termo, por tempo certo ou
indeterminado, sendo um ato de colaboração entre
repartições públicas. Para Di Pietro, tratar-se-ia de
uma espécie do gênero concessão. Invocando a
legislação, mais precisamente os artigos 125 e 126
da lei 9.760/46 e Decreto-lei 178/67, a autora
ressalva que a cessão será sempre por tempo
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determinado, discrepando da posição antes
referida.
Enfiteuse, locação e comodato
Devido não ser o enfoque do edital, daremos
apenas uma prévia explanação:
Enfiteuse – é o arrendamento perpétuo de terras;
Locação – é o empréstimo remunerado de bens
infungíveis.
Comodato - é o empréstimo gratuito de bens
infungíveis.
7. Dos bens públicos em espécie
a) Das Terras Públicas
Trataremos mais de perto das terras públicas. Em
linha de princípio, todos as terras públicas
pertenciam à Coroa Portuguesa e sua transferência
aos particulares deu-se de forma paulatina através
das denominadas sesmarias e datas. Somente com
a Lei Imperial 601, de 18/09/1850, surge algo mais
consistente em termos legislativos, tendo sido tal
legislação regulamentada pelo Decreto Imperial de
30/11/1854. A Constituição de 1891 tratou das
terras devolutas atribuindo-as ao Estados,
reservando à União somente aquelas que fossem
necessárias à defesa nacional (art. 64). Na atual
Constituição, a matéria vem disciplinada nos arts 20
e 26..
Encontramos disciplina acerca das terras públicas
ainda em diversas outras leis como v.g. o Estatuto
da Terra. Vejamos as espécies sob as quais
surgem as terras públicas.
a.1) Terrenos de Marinha
Os terrenos de marinha compreendem aqueles
localizados até 15 braças craveiras (33 metros),
para dentro da terra, contadas a partir do ponto em
que chega a preamar médio e pertencem à União.
Ditas áreas necessitam de autorização para sua
utilização caso não estejam compreendidas em
áreas urbanizadas, quando, então, tem sua
regulamentação afeta às municipalidades. Além dos
terrenos de marinha, encontram-se sujeitos às
mesmas disposições os terrenos acrescidos, ou
seja, aqueles formados a partir da aluvião ou da
avulsão.
a.2) Terrenos Reservados
Terrenos reservados são as faixas de terras
particulares, marginais dos rios, lagos e canais
públicos, na largura de quinze metros, onerados
com a servidão de trânsito, instituída pelo artigo 39
da Lei Imperial 1.507 de 1867 e revigorada pelos
art. 11, 12 e 14 do Decreto Federal 24. 643/34
(Código de Águas). No artigo 39 da lei 1.507
constava: "fica reservada para a servidão pública
nas margens dos rios navegáveis e de que se
fazem os navegáveis, fora do alcance das marés,
salvas as concessões legítimas feitas até a data da
publicação da presente lei, a zona de sete braças
contadas do ponto médio das enchentes ordinárias
para o interior e o Governo autorizado para
concedê-las em lotes razoáveis na forma das
disposições sobre os terrenos da marinha". Já o
Decreto nº 4.105 dispunha no art. 1º, § 2º, que os
terrenos reservados para servidão pública incluiriam
todos os terrenos situados às margens dos rios
navegáveis e dos que se fazem os navegáveis,
como todos os que, banhados pelas águas dos
ditos rios, fora do alcance das mares, vão até a
distância de sete braças craveiras (15,4 metros)
para a parte da terra, contadas desde o ponto
médio das enchentes ordinárias.
Semelhante disciplina consta do Código de Águas
anterior á recente Lei de Águas. Grassa
controvérsia acerca da propriedade destes terrenos.
O artigo 31 do Código de Águas determina que são
dos Estados os terrenos acaso por outro motivo não
pertençam à União. Mas a opinião, arrimada na
letra da lei, que determina serem bens dominicais
ditas áreas sofre forte crítica de Hely Lopes
Meirelles, que afirma que o fato de se haver
reservado a incidência de servidão sobre estas
áreas não as transfere ao domínio público. Segundo
suas palavras: "Tal servidão, entretanto, não tem
sido entendida corretamente por muitos dos nossos
juristas, que a consideram como transferência da
propriedade particular para o domínio público. O
equívoco destes intérpretes é manifesto, pois as
terras particulares atingidas por essa servidão
administrativa não passaram para o domínio
público, nem ficaram impedidas de ser utilizadas
por seus proprietários, desde que nelas não façam
construções ou quaisquer outras obras que
prejudiquem o uso normal das águas públicas ou
impeçam seu policiamento pelos agentes da
Administração.". Assim sendo, o domínio continua
particular, apenas havendo a constituição de uma
servidão.
a.3) Ilhas
As ilhas marítimas, fluviais e lacustres também
estão, via de regra, dentre as terras públicas. As
ilhas fluviais e lacustres situadas em zonas
limítrofes com outros países bem como as
oceânicas e costeiras que não pertençam ao
Estados são bens da União. Obviamente as ilhas
referidas aqui são aquelas que estão em águas
públicas, posto que as localizadas em águas
situadas em áreas particulares aos seus
proprietários pertencem.
a.4) Terras Indígenas
Nesta epígrafe estão compreendidas as terras
tradicionalmente ocupadas pelo índios nos termos
do artigo 20, inc. XI da CF/88. O artigo 231, § 1º,
por seu turno, as define como as terras habitadas
pelos índios em caráter, permanente, as utilizadas
para suas atividades produtivas, as imprescindíveis
à preservação dos recursos ambientais necessários
a seu bem-estar e as necessárias à sua reprodução
física e cultural, segundo seus usos costumes e
tradições. É preciso que se diga que a referência a
tradicionalmente ocupadas nada tem com uma
prescrição imemorial e o que se lhes foi assegurada
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(aos indígenas) não foi a posse civil, mas uma
posse "ab origine", nos moldes romanos. Incluem-
se entre os bens públicos de uso especial,
podendo-se, mediante autorização do Congresso
Nacional e ouvidas as comunidades afetadas,
efetuar-se o aproveitamento dos recursos hídricos,
incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a
lavra das riquezas minerais, assegurando-se aos
índios participação nos resultados da lavra por
forma a ser disposta em lei.
a.5) Terras Devolutas
Esta, sem dúvida, uma das questões mais ricas em
se tratando de terras públicas. O marco
fundamental da disciplina das terras devolutas é a
Lei Imperial 601, de 18.09.1850, que veio disciplinar
a ausência de escrituração referente às concessões
das sesmarias, diploma este que foi regulamentado
pelo Decreto 1.318 de 1854. Segundo o artigo 3º da
lei, são terras devolutas as que não se acharem
aplicadas a algum uso público nacional, provincial
ou municipal; as que não se acharem no domínio
particular por qualquer título legítimo, nem forem
havidas por sesmarias e outras concessões do
governo geral ou provincial, não incursas em
comisso por falta de cumprimento das condições de
medição, confirmação e cultura; as que não se
acharem dadas por sesmarias ou outras
concessões do governo e apesar de não se
fundarem em título legítimo, forem legitimados por
esta lei. O artigo 5º do Decreto-lei 9.760/46 tem
uma definição mais ampla. Segundo o dispositivo,
seriam devolutas, na faixa de fronteira, nos
Territórios Federais e no Distrito Federal, as terras
que, não sendo próprias nem aplicadas a algum uso
público federal, estadual ou municipal, não se
incorporarem domínio privado: a) por força da lei nº
601, 18.09.1850, Decreto nº 1.318, de 30.1.1854, e
outras leis de decretos gerais, federais e estaduais.
b) em virtude de alienação, concessão ou
reconhecimento por parte da União ou dos Estados;
c) em virtude de lei ou concessão emanada de
governo estrangeiro e ratificada ou reconhecida,
expressa ou implicitamente, pelo Brasil, em tratado
ou convenção de limites; d) em virtude de sentença
judicial com força de coisa julgada; e) por se
acharem em posse contínua e incontestada com
justo título e boa-fé, por termo superior a 20 anos. f)
por se acharem em posse pacífica e ininterrupta,
por 30 anos, independentemente de justo título e
boa-fé; g) por força de sentença declaratória nos
termos do artigo 148 da Constituição Federal de
1937. [80]
Classificam-se como bens dominicais.
Para regular a questão das terras devolutas criou-
se a Ação Discriminatória, disciplinada, a princípio,
pelo Decreto-lei nº 9.760/46, que previa uma fase
administrativa e uma fase judicial. Após, veio a Lei
3.081/56, prevendo apenas uma instância judicial.
O Estatuto da Terra reavivou a instância
administrativa. Sobreveio a lei 6.383/76 mantendo
uma duplicidade de processo administrativo e
judicial, ambos pautando-se por um procedimento
bifásico compreendendo uma fase de chamamento
dos interessados e uma fase demarcatória. O
processo judicial tem cabimento quando dispensado
o processo administrativo ou interrompido por
presumida ineficácia, quando houver atentado e
contra os que não atenderem ao chamamento
administrativo. Segue o processo judicial o rito
sumário determinando deslocamento da
competência para a Justiça Federal.
a.6) Faixa de Fronteira
Quanto a estas, somente as terras devolutas que se
encontrem na faixa de fronteira pertencem à União.
Mas há restrições quanto ao uso do solo na faixa de
150 Km da fronteira, competindo ao Conselho de
Defesa Nacional a propositura de critérios para a
utilização desta faixa de terras. as restrições
encontram-se atualmente na lei 6.634/79.
a.7) Plataforma Continental
Compreende o leito e o subsolo das áreas
submarinas que se estendem além de seu mar
territorial, em toda a extensão do prolongamento
natural de seu território terrestre, até o bordo
exterior da margem continental, ou até uma
distância de duzentas milhas marítimas das linhas
de base, a partir das quais se mede a largura do
mar territorial, nos casos em que o bordo exterior da
margem continental não atinja a essa distância (Lei
8.617/93, art. 11).
b) águas públicas
c) jazidas
d) florestas
e) fauna
f) espaço aéreo
g) patrimônio histórico
h) proteção ambiental
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Obs: sobre estes temas, o
mestre Hely os esgota. Para os
interessados será
disponibilizada extrato do livro
na xérox do Curso. Procurar o
Mário Sérgio. Observar apenas
os ptos principais, pois caem
pouco em prova, a não ser os
dispositivos constitucionais
sobre os mesmos.