Este documento discute os problemas filosóficos do aperfeiçoamento biológico humano. Apresenta os argumentos de bioconservadores contra a ideia de que os humanos devem alterar sua própria natureza biológica. Também resume as objeções de Michael Sandel, incluindo que a modificação genética pode reduzir a humildade, aumentar a responsabilidade de forma insuportável, e enfraquecer a solidariedade com os menos afortunados.

1. FILOSOFIA 11.º ano
FILOSOFIA 11.º ano
Luís Rodrigues
O Problema do
aperfeiçoamento biológico do
ser humano

2. Aperfeiçoamento biológico
Os cientistas acreditam que a medicina tal como a conhecemos
atualmente irá sofrer uma revolução com a qual nem os contadores de
histórias sonhariam. Mais do que curar e tratar doenças a «medicina da
longevidade» promete melhorar e aperfeiçoar o ser humano tornando-o
mais duradouro e ao mesmo tempo mais ágil, mais forte, mais alto, mais
inteligente. Quem recusaria o melhoramento ou aperfeiçoamento da
sua inteligência, memória, aparência e desempenho físico? Quem não
gostaria de melhorar as suas funções mentais ou físicas?
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3. Há quem pense que há aspetos profundamente negativos neste
«admirável mundo novo» que se anuncia para... pouco depois de
2020.
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4. • Receia-se que se mude radicalmente a espécie humana, se ceda ao
desejo de fabricar tipos humanos ideais.
• Na verdade, trata-se para os defensores destes avanços científicos e
técnicos no campo da biologia de aperfeiçoar a natureza humana e
de fazer com que o ser humano não seja o simples resultado da
evolução, mas intervenha nessa evolução modificando a sua
natureza.
• Trata-de fazer com que os seres humanos não fiquem à mercê, no
plano biológico, dos acasos da natureza que favorecem uns e
desfavorecem muitas vezes dramaticamente outros.
• Basicamente, o ser humano deve ser o «senhor do seu destino
biológico»?
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Aperfeiçoamento biológico

5. A discussão
Os bioconservadores estão contra o aperfeiçoamento porque para eles
a natureza humana seria o fundamento da dignidade, liberdade e
autonomia humanas.
Para os bioconservadores, o aperfeiçoamento seria moralmente
condenável em dois sentidos:
O primeiro é que o aperfeiçoamento pode alterar ou até mesmo
destruir a natureza humana.
O segundo é que, se a alterar ou destruir, isso vai comprometer a nossa
capacidade de determinar o bem, no sentido em que ele é determinado
pela nossa natureza.
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6. E os que são trans-humanistas apostam na razão e na ciência para
alterar a natureza humana: consideram que a humanidade está
perante a possibilidade de ampliar e atualizar as suas potencialidades
(human plus).
Apostam no uso racional e criterioso da biotecnociência para fins de
aperfeiçoamento humano.
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A discussão

7. Objeções à ideia de aperfeiçoamento humano
1. Devemos dar prioridade ao que é natural face ao artificial porque o
que é natural é, em geral, bom e o que não é natural é mau.
2. Ao querermos aperfeiçoara a natureza humana estamos a «brincar
a Deus» e por isso a ser arrogantes.
3. As intervenções técnicas da engenharia genética na natureza
humana são muito caras, e só os mais favorecidos poderão delas
beneficiar.
4. Por outro lado, não aceitar as contingências da lotaria genética e
fazer com que a natureza humana seja o resultado de escolhas
controladas artificialmente reduziria o peso de valores como a
humildade e a solidariedade.
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8. Michael Sandel
contra o aperfeiçoamento genético dos seres humanos
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9. • Os desenvolvimentos da genética constituem uma promessa e um
desafio.
• A promessa é a de que cedo poderemos tratar e prevenir doenças
muito debilitantes.
• O desafio é o de que este novo conhecimento genético também
permitirá manipular a nossa natureza humana – aperfeiçoar os
músculos, a memória e os comportamentos, escolher o sexo, a altura
e os traços genéticos dos nossos filhos.
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10. • Para avaliar moralmente a moralidade do aperfeiçoamento, devemos
confrontar-nos com questões que o mundo moderno em grande
parte perdeu de vista: questões acerca da relação apropriada dos
seres humanos com o mundo ou a natureza que lhes foram dados.
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11. Modificar a natureza é diminuir o sentido de
humildade e tudo querer controlar
Há algo de perturbante nestes cenários de manipulação genética.
Mas o que há de errado nestes eventuais usos da engenharia genética
com o objetivo de nos transformar em atletas biónicos e os nossos
filhos em algo quase completamente projetado ou «desenhado por
nós» como se fôssemos arquitetos e engenheiros a projetar e construir
casas?
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12. Há quem diga que a engenharia genética é um atalho para o
sucesso que reduz de modo acentuado o valor do esforço e do mérito
pessoal.
Um atleta que usa o doping genético evita o trabalho árduo e o treino
rigoroso. Suponha que as proezas do seu atleta favorito de devem a
modificações genéticas. A sua admiração diminuiria certamente.
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Modificar a natureza é diminuir o sentido de
humildade e tudo querer controlar

13. • Mas o problema do aperfeiçoamento genético não consiste
unicamente no facto de diminuir ou reduzir em muito a importância
do esforço.
• O perigo mais profundo é o de que representa uma forma de
aspiração prometaica de refazer a natureza, incluindo a natureza
humana, para servir os nossos desejos, propósitos e ambições.
• O que este impulso de radical modificação da nossa natureza perde
de vista é a devida apreciação do facto de que os nossos sucessos e
realizações são dons – presentes – da natureza. Reduz a nossa
humanidade.
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14. Reconhecer a vida como dom natural é reconhecer que os
nossos talentos e capacidades não se devem só a nós, apesar do
esforço que fazemos para os desenvolver. Este reconhecimento conduz
a uma certa humildade e à abertura ao inesperado.
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15. Modificar a natureza é transformar a
responsabilidade num fardo insuportável.
• Pensa-se que a engenharia genética, ao desvalorizar o esforço,
torna a responsabilidade pelo que somos e fazemos uma coisa sem
sentido.
• Mas muito mais do que erosão da responsabilidade, aquilo a que
assistiríamos seria a uma explosão da responsabilidade. Esta
assumiria proporções gigantescas e insuportáveis, dado o
desaparecimento da humildade, ou seja, dado o impulso para tudo
controlar e dominar.
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16. Modificar a natureza é perder o sentido da
solidariedade com os menos afortunados.
• Paradoxalmente, a explosão da responsabilidade pelo nosso próprio
destino e pelo dos nosso filhos pode diminuir o nosso sentido de
responsabilidade – solidariedade – a respeito dos menos afortunados
do que nós.
• Por que razão os mais bem-sucedidos e afortunados devem algo aos
outros membros menos favorecidos da sociedades? A resposta
baseia-se essencialmente na noção de dom.
• Os talentos naturais que possibilitam o florescimento dos mais bem-
sucedidos não são obra sua, mas sobretudo obra do acaso, da boa
fortuna.
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17. • Nenhum de nós é completamente responsável pelo seu sucesso ou
pelo seu fracasso. Estamos, em certa medida, no mesmo barco. Tudo
é contingente, e os ricos não são ricos porque são mais merecedores
do que os pobres.
• Se a engenharia genética pusesse fim à lotaria genética e substituísse
o acaso pela escolha, os bem-sucedidos conceber-se-iam, bem mais
do que agora, como autossuficientes e autores de si mesmos e do
seu sucesso. A meritocracia tornar-se-ia bem mais intolerante.
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Modificar a natureza é perder o sentido da
solidariedade com os menos afortunados.

18. • É tentador julgar que projetar e preparar geneticamente os nossos
filhos para o sucesso numa sociedade competitiva é um exercício de
liberdade.
• Mas mudar a nossa natureza para nos adaptarmos ao mundo e não o
contrário é a mais profunda forma de enfraquecimento da nossa
liberdade e da nossa ação. Deixamos de refletir criticamente sobre o
mundo e matar o impulso de transformação política e social.
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Modificar a natureza é perder o sentido da
solidariedade com os menos afortunados.

19. • «Assim, em vez de desenharmos geneticamente o futuro dos nossos
filhos para nos ajustarmos ao mundo, criemos formas de organização
política e social mais hospitaleiras para os dons e as limitações dos
seres humanos imperfeitos que somos.»
Michael Sandel, REITH LECTURES 2009: A NEW CITIZENSHIP - Lecture 3: Genetics and Morals
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Modificar a natureza é perder o sentido da
solidariedade com os menos afortunados.