Este documento discute os riscos éticos do aperfeiçoamento genético humano. A manipulação genética poderia criar desigualdades na sociedade e diminuir a humildade e solidariedade entre as pessoas. Em vez de tentar controlar a natureza humana através da engenharia genética, devemos aceitar as limitações humanas e criar uma sociedade mais inclusiva.
2. Contra o aperfeiçoamento genético dos seres humanos.
«Os desenvolvimentos da genética constituem uma promessa e
um desafio. A promessa é a de que cedo poderemos tratar e prevenir
doenças muito debilitantes. O desafio é o de que este novo
conhecimento genético também permitirá manipular a nossa natureza
humana – aperfeiçoar os músculos, a memória e os comportamentos,
escolher o sexo, a altura e os traços genéticos dos nossos filhos.»
Michael Sandel
FILOSOFIA 11.º ano
3. Os músculos
Comecemos pelos músculos. Será razoável aprovar uma terapia
genética que trate a distrofia muscular? Com certeza que sim, mas e se
a mesma terapia fosse usada para produzir atletas geneticamente
alterados e melhorados?
Michael Sandel
FILOSOFIA 11.º ano
4. Os investigadores fizeram uma experiência com ratos injetando nas
células dos músculos destes um gene sintético que produz o seu
crescimento significativo e previne a sua deterioração com a idade.
Embora a terapia ainda não seja aprovada para uso humano, a
perspetiva de haver halterofilistas, ciclistas e sprinters geneticamente
aperfeiçoados é muito sedutora.
Sabe-se por exemplo que os esteroides têm efeitos colaterais
pertinentes, mas e se o aperfeiçoamento muscular fosse seguro para os
atletas, será que se devia avançar? Haveria atletas a correr velozmente
ou a carregar pesos enormes e estariam todos, em princípio, em
condições de beneficiar deste aperfeiçoamento genético.
Michael Sandel
FILOSOFIA 11.º ano
Os músculos
5. A memória e a inteligência
Tal como no aperfeiçoamento do corpo, a questão é a mesma,
deverão apenas curar-se doenças e lesões ou tentar dar-se um passo à
frente e «aperfeiçoarmo-nos», criando seres mais inteligentes? Mais
uma vez, haverá o perigo de nem todos terem acesso a esse
aperfeiçoamento…
Michael Sandel
FILOSOFIA 11.º ano
6. A altura
Muitos pais hoje em dia se confrontam com a altura dos seus filhos e
com o desejo de que sejam mais altos. Desde 1980 que está aprovado o
uso da hormona humana do crescimento para o caso de crianças cuja
altura ficaria, sem ela, significativamente abaixo da média.
No entanto, há pais que solicitam o uso da hormona mesmo para
crianças com altura dentro da média, argumentando, por exemplo que
gostariam que a mesma integrasse uma equipa de basquetebol.
Mais uma vez se coloca a mesma questão. Deveremos aperfeiçoar, o
que à partida já está «perfeito»? Deverão os pais gastar fortunas para que
o seu filho seja uns centímetros mais alto?
Michael Sandel
FILOSOFIA 11.º ano
7. A escolha do sexo
Desde a Antiguidade que os pais tentaram escolher o sexo dos seus
filhos. Tudo se tentou. Mas só agora as novas tecnologias da biologia
conseguem satisfazer esse desejo. Uma técnica de seleção sexual
derivou de testes pré-natais como a amniocentese. Estas tecnologias
médicas foram desenvolvidas para detetar anomalias genéticas. Mas
também podem revelar o sexo do feto, permitindo assim, em princípio,
o aborto do feto cujo sexo não é desejado.
Outra técnica que favorece a escolha do sexo está associada à
fertilização in vitro. Para os casais que recorrem a esta técnica, é
possível escolher o sexo da criança antes de o ovo fertilizado ser
inserido no útero.
Michael Sandel
FILOSOFIA 11.º ano
8. A escolha do sexo
Será que conseguiria haver um equilíbrio na natureza se se
conseguisse escolher o sexo do bebé? Será que não haveria sociedades
em que apenas se escolheria o sexo masculino, por exemplo?
E se fosse possível escolher, não só o sexo, mas também a altura, a
cor dos olhos, a cor da pele, a orientação sexual, o quociente inteletual,
a aptidão musical e as proezas atléticas?
Michael Sandel
FILOSOFIA 11.º ano
9. Modificar a natureza é diminuir o sentido de
humildade e tudo querer controlar.
Há algo de perturbador nestes cenários de manipulação genética. Mas o
que há de errado nestes eventuais usos da engenharia genética com o objetivo
de nos transformar em atletas biónicos e os nossos filhos em algo quase
completamente projetado ou «desenhado por nós» como se fôssemos
arquitetos e engenheiros a projetar e construir casas?
Qualquer um quereria atingir o sucesso sem trabalho árduo, mas será que
alguém lhe atribuiria mérito ou o devido valor?
Não haveria, talvez, humildade ou reconhecimento pelo esforço feito para
desenvolver as capacidades que julgamos ter.
Se «escolhêssemos» os nossos filhos, não os amaríamos, tal como eles são,
mas sim como algo criado por nós e segundo os nossos gostos e desejos.
Michael Sandel
FILOSOFIA 11.º ano
10. Modificar a natureza é transformar a
responsabilidade num fardo insuportável.
Nós somos responsáveis pelos nossos atos, por cuidarmos dos
nossos filhos, mas ao mesmo tempo somos humildes ao aceitar que
nem tudo depende de nós e que não podemos controlar tudo.
Será que se fôssemos responsáveis pela escolha da altura, do sexo…
conseguiríamos suportar algo que corresse mal? Não será que a
responsabilidade por tudo controlar e dominar assumiria proporções
tão grandes que nos aniquilaria?
Michael Sandel
FILOSOFIA 11.º ano
11. Modificar a natureza é perder o sentido de
solidariedade com os menos afortunados.
Ao aceitarmos que os mais bem-sucedidos o são por obra do acaso, também assim achamos que
deve haver solidariedade por parte daqueles que não tiveram essa sorte. Há como que uma obrigação
de partilha para com os que, sem sua culpa, não possuem dons ou riqueza comparável.
Acha-se que, se formos responsáveis pelo nosso próprio destino e pelo dos nossos filhos, então
haverá um decréscimo na responsabilidade/solidariedade pelos outros.
Será que nos devemos mudar a nós para nos adaptarmos ao mundo? Ou será que não devamos fazer
o contrário? Tentar mudar o mundo ou tentar adaptá-lo ao ser humano.
Diz Michael Sandel: «Assim, em vez de desenharmos geneticamente o futuro dos nossos filhos para
nos ajustarmos ao mundo, criemos formas de organização política e social mais hospitaleiras para os
dons e as limitações dos seres humanos imperfeitos que somos.»
Michael Sandel
FILOSOFIA 11.º ano