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Filosofia 11
Os textos que aqui se apresentam funcionam como complemento ao
estudo da Filosofia.
 Clássica
 Flipcard
 Revista
 Mosaico
 Barra lateral
 Instantâneo
 Timeslide
1.
Nov
28
Alguns excercícios de escolha
múltipla
1. Tens de reconhecer que a tese empirista é verdadeira, porque todo o
conhecimento provém da experiência.
Qual é a falácia informal em que incorre o orador que apresenta este
argumento?
A. Apelo à força, porque é obrigatório aceitar a conclusão.
B. Petição de princípio, pois a premissa é uma explicitação da conclusão.
C. Apelo à ignorância, porque a conclusão é mais informativa do que a
premissa.
D. Causa falsa, porque procura fundar a conclusão na observação de uma
regularidade.
2. O melhor é votar na Marianapara delegada de turma. Ela passoucom duas
negativas e, por isso, anda muito abatida, coitada. Acho que ser eleita
delegada de turma pode ajudá-la a aumentar a autoestima.
Qual é a falácia informal em que incorre o orador que apresenta este
argumento?
A. Apeloàignorância,porquevotaremalguémparadelegadodeturmaresulta
de uma simples preferência pessoal.
B. Apelo à misericórdia,pois a premissa «a Mariana anda muito abatida»
exprime um juízo subjetivo.
C. Apeloàignorância,poisapremissa«sereleitadelegadade turmaaumenta
a autoestima» é hipotética.
D. Apeloàmisericórdia,porque aconclusãoé fundadaemfactosque suscitam
a simpatia pela Mariana. [não sai no teste]
3. Algumas estratégias de persuasão não são formas de manipulação.
A afirmação anterior é…
A. Verdadeira, porque não há persuasão sem manipulação.
B. Falsa, porque não há manipulação sem persuasão.
C. Verdadeira, porque há estratégias racionais de persuasão.
D. Falsa, porque a persuasão visa o controlo emocional dos interlocutores.
4. Ou aceitas o racionalismoounegas as verdades da matemática.Ora, se não
negas as verdades da matemática, resta-te aceitar o racionalismo.
Qual é a falácia informal em que incorre o orador que apresenta este
argumento?
A. Falso dilema, porque o orador ignora as alternativas.
B. Falso dilema, porque o orador apresenta alternativas falsas.
C. Apelo à força, porque o orador ameaça o interlocutor.
D. Apelo à força, porque o orador apela ao poder da matemática.
5. Nietzscheenlouqueceu.Portanto,pensoquenãodeveríamosestudarasideias
dele nas aulas de Filosofia.
O orador que apresenta este argumento incorre numa falácia informal,
porque…
A. Desvaloriza as ideias de Nietzsche com base em dados da sua vida.
B. A premissaapresentadanãopode sercomprovada.
C. A loucurade Nietzsche contribuiuparaa projeçãodasua filosofia.
D. Não é verdade que Nietzsche tenhaenlouquecido.
6. Qual dos seguintes argumentos é um entimema? [não sai no teste]
A. Lamego e Ovar são cidades portuguesas. Portanto, Lamego é uma cidade
portuguesa.
B. As cidades europeias são frias. Logo, a cidade da Guarda é fria.
C. As cidades portuguesas são bonitas, pelo que Beja, que é uma cidade
portuguesa, é bonita.
D. O Funchal fica na ilha da Madeira, porque fica na ilha da Madeira.
7. Como se distingue a persuasão racional da manipulação?
A. A manipulação nem sempre é eficaz, mas a persuasão racional é.
B. A manipulaçãotememconsideraçãoascaracterísticas doauditório,masa
persuasão racional não.
C. A persuasão racional tem em vista a verdade, mas a manipulação não.
D. A persuasãoracional tememconsideraçãoasemoçõesdaspessoas,masa
manipulação não.
8. Um orador incorre numa petição de princípiose, ao argumentar…
A. Propuser como premissa um princípio que o auditório pode rejeitar.
B. Numa premissa admitir como provado aquilo que pretende provar.
C. Em nenhuma premissa considerar provado aquilo que pretende provar.
D. Propuser como premissa um princípio que o auditório não pode rejeitar.
9. Ou reconheces que todos temos um destino que explicao que nos sucede, ou
defendes que a vida de cada pessoa é apenas fruto dos jogos do acaso. Ora,
dado que é inconcebível que a nossavida seja obra do acaso,resta-te aceitar
que existe um destino que nos comanda.
Quem apresenta o argumento anterior incorre na falácia…
A. Ad hominem.
B. Apeloàforça.
C. Causafalsa.
D. Falsodilema.
10. Qual das seguintes opções é um argumento por analogia?
A. Conservar a saúde é importante. Ora, o controlo do peso é indispensável
para conservara saúde.Além disso, é falso que «a gordura é formosura».
B. Um edifício, para não cair na ruína, tem de ser conservado pelos seus
proprietários. O teu corpo é como um edifício. Por isso, se não o
conservares, ele arruinar-se-á.
C. Um edifício tem de ser conservado pelos seus proprietários. Como o teu
corpo é um edifício, tu és o proprietário do teu corpo.
D. Conservara saúde é importante.Comoocontrolodo pesoé indispensável
para conservar a saúde, deves controlar o teu peso.
1. B
2. D
3. C
4. A
5. A
6. B
7. C
8. B
9. D
10. B
Publicado 28th November 2015 por Rui Mendes
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2.
Nov
28
Alguns exercícios de escolha múltipla
1. «Todos os seres humanos orgulhosos rejeitam aopinião dos outros, pois todas
as pessoas orgulhosas que conheço rejeitaram sempre a minha opinião.»
O raciocínio expresso é um
(A) argumento indutivo por generalização.
(B) argumento indutivo por previsão.
(C) argumento por analogia.
(D) argumento de apelo à autoridade.
2. A demonstração distingue-se da argumentação porque
(A) a demonstração expressa-se sempre em linguagem natural e a
argumentação em linguagem formal.
(B) a lógica formal define os limites da argumentação informal.
(C) a demonstração expressa-se em linguagem formal inequívoca, enquanto a
argumentação usa uma linguagem natural equívoca.
(D) a demonstração depende sempre da capacidade do orador e a
argumentação depende do auditório.
3. «O discurso argumentativo está necessariamente ligado ao auditório.»
Esta afirmação é:
(A) verdadeira, porque cabe ao auditório determinar a validade dedutiva da
argumentação.
(B) verdadeira, porque argumentar pressupõe sempre a adesão do auditório
às teses apresentadas.
(C) falsa, porque o auditório nunca influencia o curso do discurso
argumentativo.
(D) falsa, porque o discurso argumentativo nunca depende do seu auditório.
4. Considere as afirmações que se seguem e selecione a alternativa correta.
1. Para os sofistas, a verdade é relativa, dado que o conhecimento se reduz à
opinião.
2. Para Platão, a retórica é determinante para o ensino dos atenienses.
3. Para Aristóteles, o ethos liga-se à persuasão pelo raciocínio lógico.
(A) 1 é verdadeira; 2 e 3 são falsas.
(B) Todas são verdadeiras.
(C) 1 e 2 são verdadeiras; 2 é falsa.
(D) 1 é verdadeira; 2 e 3 são falsas.
5. Consideram-se falácias informais
(A) os argumentos em que não se respeita a sua forma canónica.
(B) os argumentos em linguagem natural que são aparentemente fortes, mas que
contêm um ou mais erros de raciocínio.
(C) os argumentos que não cumprem as regras de inferência válida.
(D) os argumentos em linguagem natural que são aparentemente fortes, mas que
infringem regras de validade silogística.
6. Considere as seguintes falácias.
1. É impossível falarsemusarpalavras,umavezque aspalavrassãonecessárias
para falar.
2. Ninguém conseguiu provar que a reincarnação existe. Portanto, a
reincarnação existe.
3. Quemnão aprova todas as nossas decisõesé contra nós.Como não aprovas
todas as nossas decisões, és contra nós.
4. A filosofia de Sartre é irrelevante porque o autor é ateu.
Deve afirmar-se que:
(A) 1. é petição de princípio; 2. é apelo à ignorância; 3. é falso dilema; 4. é ad
hominem.
(B) 1. é petição de princípio; 2. é ad hominem; 3. é falso dilema; 4. é apelo à
ignorância.
(C) 1. é falso dilema; 2. é apelo à ignorância. 3. é ad hominem; 4. é petição de
princípio.
(D) 1. É petição de princípio; 2. é apelo à ignorância; 3. É ad hominem; 4. É falso
dilema.
7. O uso manipulador da retórica caracteriza-se pelo facto de o orador
(A) reconhecer as limitações da racionalidade do auditório.
(B) ignorar as limitações da racionalidade do auditório.
(C) tentar tirar partido das limitações da racionalidade do auditório.
(D) tentar ultrapassar as limitações da racionalidade do auditório.
8. «A crença no livre-arbítrio é universal, porque todas as pessoas acreditam que
escolhem realmente o que fazem». Este argumento incorre na falácia
A. do boneco de palha.
B. petição de princípio.
C. falso dilema.
D. apelo à ignorância.
9. Na Grécia Antiga a afirmação da retórica deveu-se
(A) ao reconhecimento público de Platão e de Sócrates como bons oradores.
(B) à afirmação da Filosofia ateniense feita pelos sofistas.
(C) à necessidade de se constituir um conhecimentometódico e fundamentadona
oratória.
(D) à construçãoda democraciae à necessidade de afirmaçãopúblicadoscidadãos.
10. Considere asafirmaçõesquese seguemacercadaretóricae selecioneospensadores
que as poderiam ter proferido.
1. A retórica é útil. É a habilidade de avaliar, em cada caso particular, os meios
adequados para se persuadir pela palavra.
2. A retóricaé obemsupremoedáaquemapossuiodomíniosobre osoutrosna cidade.
3. A retórica não é uma arte, é uma forma de manipulação.
(A) 1 Aristóteles; 2 Platão; 3 Sofistas.
(B) 1 Platão; 2 Sofistas; 3 Platão.
(C) 1 Sócrates; 2 Sofistas; 3 Platão.
(D) 1 Aristóteles; 2 Sofistas; 3 Platão.
1. A
2. C
3. B
4. A
5. B
6. A
7. C
8. B
9. D
10. D
Publicado 28th November 2015 por Rui Mendes
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3.
Nov
23
Temas a estudar para a 2ª prova de
avaliação escrita
1. Testar a validade de um silgismo.
1.1.) Construir silogismos válidos, tendo em conta a figura e o modo.
2. Relacionar ethos, pathos e logos enquanto géneros de prova da retórica.
3. Distinguir demonstração e argumentação.
4. Definir e identificar tipos de argumentos e de falácias informais.
5. Refletir acerca da retórica no contexto da democracia ateniense, confrontando
a perspetiva dos sofistas e a de Platão.
5.1. Distinguir os dois usos da retórica.
Publicado 23rd November 2015 por Rui Mendes
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4.
Nov
20
Unidade 2 – O conhecimento e a
racionalidade científica e tecnológica
1. Descrição e interpretação da atividade cognoscitiva
1.1. Estrutura do ato de conhecer
1.1.1. Análise fenomenológica do conhecimento / Interação sujeito-objeto
A fenomenologia é um método de descrição do ato de conhecerque não pretende explicar
o conhecimento, pois isso é função da gnosiologia. Pelo contrário, ela é anterior a toda a
explicação, servindo como meio de preparação a essa mesma explicação.
A fenomenologia descreve-nos o que ocorre quando dizemos que conhecemos algo,
nomeadamente a existência de três elementos indispensáveis ao conhecimento:
- o sujeito;
- o objeto;
- a imagem ou representação.
Sujeito e objeto encontram-se frente a frente. O sujeito cognoscente é a parte ativa desta
relação e é a ele que cabe o movimento mental de sair da sua esfera, ir até à esfera do objeto e
captar as suas qualidades, construindo uma imagemdo mesmo.
Podemos, então,dizer que a relação do conhecimento dá-se em três tempos: o sujeito sai
de si, o sujeito está fora de si e o sujeito regressa a si. É o sujeito que fica a ganharnesta relação,
é ele que sofre uma alteração, que constrói uma imagem que anteriormente não tinha. O objeto é
o elemento passivo desta relação, uma vez que não sofre qualquer tipo de alteração.
Há ainda que referir que sujeito e objeto são transcendentes, pelo que a relação que se
estabelece entre eles é uma correlação irreversível: o sujeito é sempre sujeito e o objeto é sempre
objeto, não sendo,portanto,possívelalterarem as suas posições.Dito de outro modo: a função do
sujeito é sempre conhecer o objeto e a função do objeto é sempre ser conhecido pelo sujeito
O conhecimento não é um ato efetuado por um sujeito no estado puro que apreende um
objeto no estado puro. Com efeito, o sujeito interage com a realidade e é desse processo que o
conhecimento emerge. Representar o objeto é também, em certa medida, construir o objeto, isto
é, o conhecimento é sempre uma integração de novos elementos no conjunto de significações e de
referências que fazem parte do mundo do sujeito.
1.1.2. Definição de conhecimento
a) Tipos de conhecimento
O saber-fazer refere-se ao conhecimento prático, a uma atividade, à capacidade,
aptidão ou competência para fazer alguma coisa. Por exemplo, saber pintar uma casa.
O saber que refere-se ao conhecimento proposicional ou conhecimento de verdades.
Por exemplo, saber que Portugal é um país europeu.
O conhecimento por contacto refere-se ao conhecimento direto de alguma realidade,
seja de pessoas ou lugares. Por exemplo, conhecer pessoalmente determinado indivíduo ou ter
visitado determinado lugar.
b) Definição tradicional
No diálogo “Teeteto”, Platão pergunta pela Natureza do conhecimento. Segundo o seu
ponto de vista, os sentidos não conseguematingir nem o ser, nem a verdade, nem o saber. Platão
vai distinguir aquilo que entende por doxa (opinião ou crença), aletheia (verdade), logos
(justificação) e episteme (conhecimento), considerando esta como uma crença verdadeira
justificada. Assim, quem chega à crença verdadeira sobre algo, mas sem ser capaz de dar uma
justificação sobre isso,não conhece; sóquem é capaz de dar uma explicação tem o saber. Dito
de outro modo: todas as três condições referidas – crença, verdade e justificação – são
necessárias para que haja conhecimento. Consideradas isoladamente, nenhuma delas é condição
suficiente. Resumindo, a definição tradicional que temorigem em Platão é:
S sabe que p se, e apenas se, (1) S acredita que p, (2) p é verdadeira; (3) S tem uma
justificação para acreditar que p. Por exemplo: se uma pessoa sabe que Marte é um planeta, então
tem a crença verdadeira justificada de que Marte é um planeta, e, se tem essa crença verdadeira
justificada, então sabe tal coisa.
c) Críticas à definição tradicional
Edmund Gettier contestou a definição tradicional de conhecimento, apresentando
contraexemplos que nos revelam a possibilidade de termos uma crença verdadeira justificada sem
que tal crença equivalha a um efetivo conhecimento. Segundo Gettier, ainda que se verifiquem as
três condições (crença, verdade e justificação), o sujeito pode não possuir o conhecimento. Os
contraexemplos apresentados por este pensador colocamo chamado problema de Gettier.
Consideremos um dos contraexemplos que ilustra esta possibilidade. Imaginemos que
Pedro tem boas razões para acreditar que quem vai conseguir um certo emprego não é ele, mas
Tomás, e que viu há pouco que Tomás tem dez moedas no bolso. Deste modo, Pedro tem uma
crença justificada na seguinte proposição:
A. Tomás vai conseguir o emprego e Tomás tem dez moedas no bolso.
Tomando A como premissa, Pedro deduz a seguinte conclusão:
B. O homem que vai conseguir o emprego tem dez moedas no bolso.
Dado que Pedro acredita justificadamente em A e infere corretamente B a partir de A,
podemos dizer que tem também uma crença justificada em B. Mas imaginemos agora que Tomás
acabará por não conseguir o emprego e que, na verdade, é o próprio Pedro que ficará com ele –
isto significa que a proposição A é falsa. E suponhamos também que Pedro, ainda que não o saiba,
também tem dez moedas no bolso.
Concentremo-nos na proposição B. Pedro acredita justificadamente nesta proposição – e,
afinal, B é uma proposição verdadeira. Portanto, Pedro tem uma crença verdadeira justificada em
B. Mas, apesar de as três condições da análise platónica serem satisfeitas neste caso, a verdade é
que Pedro não sabe que o homem que vai conseguiro emprego tem dez moedas no bolso. Afinal,
aquilo que torna B verdadeira são os factos de ele (e não Tomás) vir a conseguiro emprego e de
ele (e não Tomás) ter dez moedas no bolso,e Pedro ignora completamente estes factos.Épor mero
acaso que Pedro acaba por ter uma crença verdadeira justificada em B.
Acrescente-se um contraexemplo mais simples do que o referido anteriormente.
Imaginemos que Joana tem fortes razões para acreditar que um certo relógio público é altamente
fiável. Certo dia, ela passa pelo relógio e vê que este indica que são oito horas da manhã. Joana
forma então a crença de que são oito horas da manhã, e esta crença está justificada pelos dados
que revelam a fiabilidade do relógio. Contudo, sem que Joana o saiba, o relógio está parado há
algum tempo, mas, curiosamente, parou quando eram oito horas. Nestas circunstâncias, Joana
acredita justificadamente que são oito horas da manhã e a sua crença é verdadeira, só que ela não
sabe que são oito horas da manhã. Afinal, teve apenas a sorte de passar pelo relógio num momento
em que este indicava a hora correta.
1.1.3. Conhecimento a priori e a posteriori
Os conhecimentos podem ser a priori ou a posteriori.
A distinção entre conhecimento a priori e a posteriori encontra-se
implícita em muitos filósofos (Platão, Aristóteles, Descartes, John Locke), mas
foi em Kant que se tornou mais clara.
O conhecimento a priori é defendido pelos filósofos racionalistas que
consideram que só a razão é fonte de conhecimento e o garante universal do
mesmo. Sendo assim, de acordo com os racionalistas todo o conhecimento terá
de seranterior e independente à experiência. Do mesmo modo, um argumento
é a priori se, e só se, todas as suas premissas são a priori.
O conhecimento a posteriori é defendido pelos filósofos empiristas que
consideram que só a experiência é fonte de conhecimento e o garante da
objetividade do mesmo. Sendo assim, de acordo com os empiristas todo o
conhecimento terá de derivar necessariamente da experiência. Do mesmo
modo, um argumento é a posteriori se, e só se, pelo menos uma das premissas
é a posteriori.
Em síntese:
O conhecimento a priori é o conhecimento que, baseado em juízos a
priori (isto é, que antecedem qualquer tipo de experiência), tem a sua fonte ou
origem apenas na razão (por exemplo, 2 + 2 = 4), não sendo necessário recorrer
à experiência para o saber.
O conhecimento a posteriori é o conhecimento que, baseado em juízos a
posteriori (isto é, que derivam da experiência), tem a sua origem na experiência.
Trata-se do conhecimento empírico (por exemplo, o fogo queima).
1.2. Análise comparativa de duas teorias explicativas do
conhecimento: racionalismo e empirismo
1.2.1. Origem e possibilidade do conhecimento
Estas teorias colocam a questão sobre a proveniência do
conhecimento: de onde é que provém? Da razão ou da experiência? O
racionalismo e o empirismo dão respostas diferentes a estas questões.
O racionalismo é a teoria que defende que o nosso conhecimento
deriva da razão, sendo, portanto, esta capaz de conhecer verdadeiramente todas as
coisas. Além disso, os filósofos racionalistas (como Descartes) defendem a
existência de ideias inatas. Segundo estes pensadores, o conhecimento verdadeiro
é totalmente independente da experiência sensível, logicamente necessário,
porque tem de ser assim, caso contrário entraríamos em contradição, e
universalmente válido, porque vale sempre, em todo o lado e para todos os seres
humanos. O modelo do conhecimento verdadeiro, de acordo com o racionalismo,
é-nos dado pela matemática.
O empirismo é a teoria que defende que o nosso conhecimento deriva
da experiência, estando, por isso, limitado à experiência possível. Além disso, os
filósofos empiristas (como David Hume) defendem que a mente humana é uma
página em branco onde vão ser inscritas todas as nossas experiências e
conhecimentos.
1.2.2. René Descartes: o racionalismo cartesiano
O projeto cartesiano
Descartes, filósofo francês do século XVII, defendeu que a razão é a principal fonte do
conhecimento. Foi considerado, por muitos, um dos impulsionadores da ciência moderna e
desenvolveu uma das mais conhecidasrespostas ao ceticismo radical.Na defesa da possibilidade
do conhecimento humano, propôs-se desenvolver e implementar um método que pudesse
conduzir-nos ao conhecimento seguro. Descartes viveu numa época marcada por grandes
transformações sociais, políticas e ideológicas. Foram descobertos novos continentes, povos e
culturas. Investigações pioneiras no campo da Física (nomeadamente, as de Galileu)
revolucionaram o entendimento do universo e do lugar do Homem no mesmo. Num período
relativamente curto, as velhas certezas tradicionais foram postas em causa e assistiu-se a um
profundo abalo das convicções amplamente enraizadas. Instalou-se, assim , um clima de
ceticismo generalizado no que dizrespeito à nossa capacidadede alcançar qualquer espéciede
conhecimento sólido e duradouro.
Apesar disso,Descartes não estava disposto a deixar-sevencer por esta ameaça sem tentar,
pelo menos uma vez na vida,escapar à conclusão aparentemente inevitável deque nada sepode
saber. Com este objetivo em mente, Descartes decide levar o ceticismo ao extremo e vencê-lo
no seu próprio jogo,ou seja,decide recorrer à própria dúvida cética como método para provar
a impossibilidade do ceticismo. Se seguisse os caminhos mais extremos da dúvida, talvez
pudesse encontrar algo de absolutamente indubitável, ou seja,uma crença básica quefossede
tal modo autoevidente que nem a mais extrema dúvida a pusesse em causa. Uma crença com
estas característicasconstituiria uma basesólida sobrea qual poderia edificar com segurança o
conhecimento.
Em suma, o objetivo de Descartes era estabelecer um conhecimento seguro e indubitável,
ou seja, encontrar pelo menos uma crença básica que pudesse servir de fundamento para o
conhecimento. O seu método era a dúvida:duvidar de tudo o que sepossa imaginar eaveriguar
o que resista a esseprocesso.Por razões óbvias,este procedimento ficou conhecido por dúvida
metódica.
Dúvida cartesiana vs. dúvida cética
Embora Descartes recorra à dúvida cética,a dúvida cartesiananão seidentifica inteiramente
com a dúvida cética original.Descartes subverte-a,instrumentalizando-a,isto é,servindo-sedela
como método para alcançar o conhecimento e provar a insustentabilidadedo próprio ceticismo.
Assim,contrariamente ao que acontecia com a dúvida cética original,a dúvida cartesiana não é
um ponto de chegada – o que seria o desfecho inevitável de um rigoroso processo de reflexão -
, mas sim um ponto de partida – o que constitui um meio para alcançar a verdade.
Para Descartes,trata-se,portanto,de uma decisão deconsiderar provisoriamente falso tudo
o que seja minimamente duvidoso.Isto significaque,à partida,a dúvida cartesiananão conhece
limites e não há nada de que não seja legítimo duvidar. Neste sentido, ela é absolutamente
universal; por princípio, pode aplicar-se a tudo, pelo menos até que se encontre algo que seja
absolutamente indubitável. Com esse objetivo em mente, Descartes leva a dúvida ao seu
extremo, de tal modo que não se limita a suspender o juízo, mas rejeita como falso tudo aquilo
que seja meramente duvidoso, razão pela qual também se apelida a dúvida cartesiana de
hiperbólica.
Podemos, por isso, enumerar algumas características da dúvida cartesiana:
Metódica – a dúvida constitui-se num método para encontrar um conhecimento seguro;
Provisória – subsiste apenas até que se encontre algo absolutamente certo e indubitável;
Universal – pode aplicar-se a todas as nossas crenças;
Hiperbólica – não se limita a pôr tudo em dúvida, mas rejeita como falso o meramente
duvidoso.
Razões para duvidar (ilusões dos sentidos, indistinção vigília-sono, errosde raciocínio, hipótese
dos Deus Enganador e a Hipótese do Génio Maligno)
Como vimos, inicialmente Descartes vai recorrer a uma argumentação cética para pôr
em causa tudo aquilo quejulgamos saber,deitar abaixo todas asnossasconvicções everificar se
existe alguma que resista a tamanha devastação.Esses argumentos são geralmente conhecidos
por “razões para duvidar”,pois a sua conclusão éjustamente a de que não podemos confiar em
crenças que tenham uma determinada origem.
As ilusões dos sentidos
O primeiro argumento de Descartes baseia-se nas ilusões dos sentidos, que nos enganam em
diversas ocasiões. Por exemplo, quando vemos uma cana mergulhada na água parece que está
partida; muitas vezes, objetos longínquos parecem redondos, quando na realidade são
quadrados; por vezes, parece que nos estão a chamar e afinal é só o vento a passar; pode
parecer-nos que cheira a batatas fritas quando alguém está a fritar rissóis; olhamos para o céu
ao longo do dia e parece-nos que o Sol se move em torno da Terra, etc.
Aplicando o princípio hiperbólico da dúvida, segundo o qual devemos rejeitar como falso tudo
aquilo que seja minimamente duvidoso, Descartes conclui que não temos justificação para
acreditar em nada que tenha origem nos sentidos. O argumento pode ser reformulado do
seguinte modo:
(1) Os nossos sentidos enganam-nos algumas vezes.
(2) Se os nossos sentidos nos enganam, então não podemos saber se nos estão a enganar neste
momento ou não.
(3) Se não podemos saber seos nossos sentidosnos estão a enganar,então não podemos confiar
nas informações adquiridas através deles.
(4) Logo, não podemos confiar nas informações adquiridas através dos sentidos.
A indistinção vigília-sono
Descartes reforça o argumento das ilusões dos sentidos com uma razão adicional para
duvidarmos de tudo aquilo que tenha origem na experiência sensível. Segundo o argumento da
indistinção vigília-sono, uma vez que a vivacidade e a intensidade de certos sonhos nos
convencem muitas vezes de que estamos a ter experiências reais,quando na realidadeestamos
a sonhar, não temos forma de distinguir as nossas experiências de vigília daquelas que temos
quando sonhamos;consequentemente, as crenças queformamos a partir daexperiênciasensível
ou são falsas (porqueestamos apenas a sonhar) ou,aindaquesejamverdadeiras,são-no apenas
por acaso (porque não podemos saber se estamos apenas a sonhar ou não) e, portanto, não
podem constituir conhecimento.
Erros de raciocínio
O argumento dos erros de raciocínio baseia-se na ideia de que, uma vez que todos podemos
cometer erros nos raciocíniosmaissimples,não podemos justificadamenteacreditar em crenças
que tenham origem no nosso raciocínio.
A Hipótese do Génio Maligno
Para abalar a nossa confiança nas proposições mais triviais e elementares da geometria e da
aritmética,adúvida cartesiana vai extremar-se ainda mais,levando Descartes a territóriosonde,
aparentemente, nada se pode saber com certeza.
Descartes começa por fazer notar que desde muito novo lhe foi incutida a crença de que fomos
criados por um ser superior, sumamente inteligente e de poderes ilimitados. Ora, um ser com
estas características poderia introduzir nas nossas mentes as ideias que bem entendesse,
fazendo-nos tomar por evidências os maiores absurdos que possamos imaginar. Poderia, por
exemplo, fazer-nos acreditar que um quadrado tem quatro lados quando na realidade teria
apenas três. Como podemos saber que isso não está, de facto, a acontecer?
Descartes apercebe-se de imediato que esta suposição, conhecida como Hipótese do Deus
Enganador, enfrenta sérias dificuldades,pois a ideia deum Deus Enganador é uma contradição
nos termos. Sendo Deus um ser perfeito por definição, não pode possuir qualquer espécie de
defeito, como, por exemplo, ser enganador. Por este motivo, Descartes vê-se forçado a
abandonar a Hipótese do deus Enganador e a recorrer a uma espécie de Plano B: a Hipótese do
Génio Maligno. Concebe uma experiência mental que consiste na suposição de que existe um
ser tão poderoso quanto perverso, que designa por Génio Maligno para evitar os problemas
associadosà ideiadeumDeus Enganador,que sediverte a usar os seus poderes para nos induzir
em erro relativamente a tudo. Uma vez que não se espera que este ser exiba a perfeição moral
característica de um ser perfeito, não corremos o risco de cair em contradição.
O argumento do Génio Maligno diz-nos o seguinte: uma vez que não podemos saber seo Génio
Maligno existeou não,a maioria das nossascrençassão falsas,ou,ainda quesejamverdadeiras,
são-no apenas por acaso (pois não temos nenhuma justificação para acreditar que não se trata
de mais uma das suas maquinações). Logo, não temos qualquer espécie de conhecimento (pois
só temos conhecimentos se tivermos crenças verdadeiras justificadas). Enquanto a Hipótese do
Génio Maligno não for afastada, não podemos, aparentemente, estar certos de nada. O Génio
Maligno pode fazer-nos acreditar que estamos a ter determinadas experiências, pode
introduzir-nos falsas memórias e pode virar o nosso intelecto do avesso, de forma que até as
mais elementares demonstrações matemáticas não passem de ilusões que este introduz nas
nossas mentes.
Se acreditar que tudo o que penso conhecer não é senão um sonho ou ficção (ou realidade
virtual) produzida por um génio maligno,restará alguma coisasegura quenemo sonho nem esse
ser possam transformar em falso? O que é que resiste a esta dúvida? Será este argumento
inabalável?
O papel do Cogito no racionalismo cartesiano:
- O triunfo sobre o ceticismo
O próprio Descartes mostra que o argumento do Génio Maligno não é tão inabalável quanto
à primeira vista possa parecer. Pelo contrário, em vez de conduzir à conclusão de que nada se
sabe, a Hipótese do Génio Maligno conduz à conclusão de que existe algo que podemos,
garantidamente, saber.
Pode ser que não exista nenhuma das coisas que os meus sentidos me mos tram, pode ser
que o meu corpo não exista;porém, mesmo que toda a minha experiência econhecimento sejam
resultado da ação de um génio maligno que me engana, o próprio facto de estar a ser enganado
demonstra que existo, pois se não existissenão poderia ser enganado. Se duvido, se sonho, se
estou a ser enganado, devo existir para poder duvidar, sonhar e ser enganado. É esta a célebre
conclusão de Descartes: “Penso, logo existo”. Mesmo que o Génio Maligno exista e se esforce
tanto quanto pode para me enganar, nunca me poderá convencer de que não existo, pois, para
que me possa convencer seja do que for, eu tenho necessariamente de existir. Existe, portanto,
algo que posso saber com toda a certeza: que existo. Esta crença é geralmente abreviada pela
expressão cogito, pois muitos dos leitores da obra de Descartes contactaram com a sua
formulação em latim: Cogito, ergo sum. A sua verdade não pode consistentemente ser posta
em causa, pois para sepoder duvidar do que quer que seja é preciso existir.Quem quer que se
questione acerca da veracidadedo cogito tem automaticamente justificação paraacreditar nele.
Assim, Descartes refuta o ceticismo por redução ao absurdo. Assumindo como premissa a
ideia de que nada se pode saber, somos conduzidos a uma contradição, pois para podermos
duvidar da possibilidadedo conhecimento somos forçados a admitir queexistealgo quesabemos
com toda a certeza: sabemos que existimos,caso contrário não poderíamos duvidar fossedo que
fosse.
A importância do cogito no racionalismo cartesiano éinquestionável. O cogito é uma crença
básica, que não precisa de ser justificada com base noutras crenças e, por conseguinte, pode
estabelecer-se como primeira evidência, fornecendo os alicerces seguros que Descartes
procurava para edificar o conhecimento. Deste modo, podemos considerar que o cogito
representa o tão desejado triunfo sobre o ceticismo. Por mais extremas que as nossas dúvidas
possamser, existirá semprepelo menos uma coisa que podemos saber com toda a certeza: que
existimos.
Mas será esta crença suficientepara fundar todo o nosso conhecimento do mundo? Será que
saber que existimos é suficiente para saber que temos um corpo e restaurar a nossa confiança
nas nossas experiências sensíveis? Não, na verdade o cogito não é, por si só, capaz de
estabelecer a verdade de nenhuma destas coisas,pois enquanto não afastarmos definitivamente
o fantasma do Génio Maligno não temos a certeza de que não estamos a ser enganados por ele,
acreditando erradamente que temos um corpo, mãos, olhos, nariz, etc.
- Uma coisa pensante (res cogitans)
Só há uma coisa dequepodemos estar certos,ainda queo Génio nos engane: temos de existir
de algum modo para que este nos possa enganar. Mas isso não implica que tenhamos
necessariamente um corpo. A única coisa que sabemos, com toda a certeza, é que existimos
enquanto coisa que pensa, ou res cogitans (coisa/substância pensante em latim), mas nada
sabemos acerca do mundo físico, do mundo da matéria, do mundo das coisas extensas (que
ocupamum espaço),ou seja,nada sabemos acerca da resextensa (coisa/substânciaextensa,em
latim).
Isto significa que o cogito estabelece apenas a existência de uma substância pensante, mas
não oferece qualquer garantia da existência da realidade sensível. Como tal, o cogito não é
suficiente para nos assegurar que temosum corpo, nem que as nossas experiências percetivas
são fiáveis.
Ao tomar consciência de que pode imaginar que não tem um corpo, sem que isso implique
que não existe, mas não pode duvidar da sua existência enquanto pensamento, Descartes
conclui que é essencialmente uma substância pensante, isto é, uma mente ou alma imaterial
que existe independentemente do corpo e que é de natureza inteiramente distinta do mesmo.
Podemos formular as diferentes etapas deste argumento do seguinte modo:
(1) Posso conceber que existo sem ter um corpo.
(2) Não posso conceber que existo sem ter uma mente/alma.
(3) Se posso conceber que existo sem ter um corpo, mas não posso conceber que existo sem ter
uma mente/alma, então a mente/alma não é igual ao corpo.
(4) Logo, a mente/alma não é igual ao corpo.
Uma vez que estabelece a distinção entreduas esferas da realidadedenatureza inteiramente
diferente – o corpo e a mente -, esta posição ficou conhecida por Dualismo Cartesiano ou
Dualismo mente-corpo. Depois de estabelecer esta distinção,Descartes apercebe-se que a sua
essência, ou natureza, se identifica com a mente e não com o corpo.
Mas se a única coisa que Descartes conseguiu demonstrar, até ao momento, foi a sua
existência enquanto coisa pensante,poderá elealguma vez estar certo de que sabealguma coisa
para além disso? Descartes acreditava que sim. Verás em seguida porquê.
- Um critério de verdade
Descartes considerava que, uma vez que o que torna o cogito uma crença tão evidente não
é mais do que o seu elevado grau de clareza e distinção, estas características deveriam ser
adotadas como critério de verdade, ou seja, como procedimento que nos permite distinguir o
que é absolutamente verdadeiro do que é meramente duvidoso ou falso.Assim,o cogito não só
fornece um fundamento seguro para o conhecimento mas também um modelo daquilo que
devemos perseguir na procura de um saber seguro e indubitável.
Deste modo, para saber se uma determinada proposição é verdadeira (por exemplo: Posso
estar certo do cogito), bastará queDescartes a conceba claraedistintamente. Mas será que,para
além do cogito, existe alguma proposição com estas características?
A ideia de Deus
À primeira vista, Descartes parece ser incapaz de dar um passo além do cogito. É como se
estivessesozinho no seu sólido rochedo,mas rodeado por um tumultuoso mar de dúvidas,para
além do qual não pode passar. Contudo, munido do seu recém-adquirido critério de verdade,
Descartes decide vasculhara sua mente em busca deoutras ideias que,à semelhança do cogito,
se possam conceber clara e distintamente.
Ao inventariar as suas ideias apercebe-se de que tem a ideia de Deus. Pensa então: “Se eu
conseguir provar que Deus existe e não é enganador, talvez possa estar certo de muitas outras
coisas para além de saber que existo enquanto coisa pensante, pois um criador supremo e
sumamente bom não me teria feito de modo a que nunca pudesse conhecer a verdade acerca
de coisa alguma.”
O Argumento da Marca
Ao tomar consciência de que possui a ideia de Deus, ou seja, de um Ser Perfeito,
Descartes vê-se forçado a reconhecer que ele próprio não é perfeito, pois,na sua opinião, saber
é claramente melhor do que duvidar e ele está certo de que é um ser que duvida.No entanto,
apesar de não ser perfeito, ele tem a ideia de Ser Perfeito. Ora, Descartes subscreveo Princípio
da Causalidade,segundo o qual: Tudo o que existe tem uma causa. Mas qual poderá ser a causa
dessa ideia? Poderia ser ele próprio o seu autor?
Descartes vai tentar demonstrar que não pode ser ele o autor dessa ideia, pois na sua
opinião uma causa deve ter pelo menos tanta realidade quanto os seus efeitos. Isto significa
que, tal como o nada não pode dar origem seja ao que for, também o menos perfeito não pode
dar origem a algo que seja mais perfeito.Ou seja,assimcomo algo quenão existenão pode dar
origem a coisa nenhuma,também algo que é incompleto não pode dar origem a algo que é mais
completo. Assim,e uma vez que não é perfeito, Descartes conclui quenão pode ser ele a origem
da ideia deperfeição.Esta ideia deveter origem em algo queseja pelo menos tão perfeito quanto
ela, ou seja, em Deus.
Deste modo, Descartes acredita ter conseguido provar que, para além do cogito, pode
estar certo da existência de Deus. Este argumento ficou conhecido como Argumento da Marca
porque é como se, ao criar-nos,Deus tivesseintroduzido nas nossasmentes a ideia deperfeição,
para que esta funcionasse como uma espécie de marca, ou assinatura, do autor.
Em suma, a ideia de um Ser Perfeito:
 não pode ter vindo dos sentidos, por não ser visível um tal ser;
 não pode ter origem em nós mesmos, por sermos imperfeitos;
 tem de ser uma ideia inata (ou a priori) que foi posta em nós por esse tal Ser Perfeito,
«tal como o artista imprimiu uma marca na sua obra»;
 implica a sua existência por não ser possível ter uma ideia de um ser com tão grande
perfeição e tal ser não existir.UmSer Perfeito não seria perfeito senão existisse; logo,Deus
existe e é perfeito.
Explicitamente formulado, este argumento diz-nos o seguinte:
(1) Eu tenho a ideia de Ser Perfeito.
(2) Se eu tenho a ideia de Ser Perfeito, então existe um Ser Perfeito que é a origem desta ideia.
(3) Existe um Ser Perfeito que é a origem da minha ideia de perfeição.
(4) Ou eu sou o Ser Perfeito ou existe um algo para além de mim que é perfeito e que é a
verdadeira origem da minha ideia de perfeição.
(5) Se duvido, não sou perfeito.
(6) Duvido.
(7) Não sou perfeito.
(8) Logo, existealgo para alémdemim que é perfeito e que é a verdadeira origemda minha ideia
de perfeição.
O papel de Deus no racionalismo cartesiano
Deus desempenha um papel fundamental no racionalismo cartesiano,porque, uma vez
que Deus existe e não é enganador (pois enganar seria uma imperfeição), não iria criar-nos de
modo a que fôssemos incapazes de conhecer seja o que for. Pelo contrário, Deus deu-nos as
ferramentas necessárias para descobrirmos a verdade e para nos orientarmos no mundo. Mas
se Deus nos concebeu tais ferramentas, por que razão estamos sujeitos à dúvida e ao erro?
A resposta de Descartes é muito simples: Deus é perfeito e, como tal, é sumamente
bom, por isso decidiu criar-nos com livre-arbítrio. No entanto, muito embora uma vontade livre
seja, de facto, uma dádiva de valor inigualável, ela traz consigo um pequeno inconveniente: a
possibilidade de fazer escolhas acarreta a possibilidade de fazer más escolhas. Assim,Descartes
conclui queo erro não vem de Deus, que é perfeito, mas sim de nós, que, não sendo perfeitos,
fazemos por vezes um mau uso da nossa liberdade, dando assentimento a coisas que não
concebemos muito clara e distintamente.
Portanto, uma vez provado que Deus existe e não é enganador, não temos razões para
acreditar que nos possamos enganar quando concebemos algo com clareza e distinçã o.Aliás,o
próprio Descartes reconhece que é justamente por esse motivo que podemos confiar naquilo
que concebemos com clareza e distinção.
Mas, será que podemos conceber com clareza e distinção a existência do mundo?
Existência do mundo
A resposta de Descartes à pergunta formulada anteriormente é: o mundo existe, pois um
Deus perfeito (ao contrário de um génio maligno) não nos enganaria quando avaliamos a
realidade material a partir de relações matemáticas quantificáveis. Assim, Deus torna-se a
garantia de que aquilo que conhecemos com a razão corresponde a algo realmente existente.
O que é conhecer com a razão? É conhecer as relações matemáticas, aquilo que pode ser
medido, o comprimento, a largura ea profundidade.Estas são as propriedades quantitativas ou
qualidades primárias dos corpos, apreendidas pela razão de forma tão clara e nítida como a
apreensão da ideia de «cogito» ou «eu pensante». Pelo contrário,as propriedades qualitativas
ou propriedades secundárias,como cor,cheiro,sabor estão relacionadascomos nossossentidos
e, por essa razão, não descrevem objetivamente a realidade exterior, devendo, portanto, ser
rejeitadas do domínio do conhecimento verdadeiro.
De onde vem, então, o conhecimento? Serão os sentidos a fonte do nosso conhecimento do
Mundo? Descartes,como vimos, não aceita a validade do conhecimento sensorial. Ele parte do
princípio de que:
 se os sentidos nos enganam algumas vezes, poderão enganar-nos sempre;
 os sentidos apenas captamcaracterísticassubjetivas - propriedadesqualitativas das coisas,
isto é, características que dependem do efeito produzido por elas nos nossos sentidos.
Por estas razões, Descartes rejeita o conhecimento sensorial como fundamento do
conhecimento verdadeiro. O verdadeiro conhecimento tem de proceder da razão.
A Matemática era a disciplina que Descartes mais admirava e considerava que só o
procedimento matemático poderia conferir certeza ao conhecimento.
Em síntese:
Descartes começou por duvidar da validadede todo o conhecimento, experimentando a sua
veracidadeatravés da dúvida:só aceitaria como verdadeiro aqueleconhecimento que resistisse
à dúvida mais radical.
Onde o levou este procedimento de dúvida metódica?
Ao reconhecimento do «eu pensante» como sendo uma verdade indubitável, conhecida
clara e distintamente por intuição.
Foi, portanto, «o cogito» (“penso, logo existo”) que foi tomado:
 como primeira ideia indubitável e, por isso, a primeira verdade;
 como ponto de partida de toda a sua Filosofia, a partir do qual seriam deduzidas outras
verdades cada vez menos gerais;
 como modelo do critério de verdade a seguir, para distinguir o verdadeiro do falso.
Quais são as implicações destepercurso e destas descobertas de Descartes? Colocam-no na
trilha dos filósofos racionalistas, porque:
 busca um conhecimento absoluto, isto é, válido universalmentee logicamentenecessário;
 adota como modelo o conhecimento racional/matemático e o respetivo método que
aplica a todo o tipo de conhecimento;
 duvida da validade do conhecimento empírico, isto é, do conhecimento elaborado com
base em informações sensoriais;
 pressupõe a existência de ideias inatas, que fazem parte do património da nossa razão,e
que, por isso, são comuns a todos os homens.
OBJEÇÕES AO RACIONALISMO CARTESIANO
a) Eu penso, ou há pensamento em curso
Se prestarmos a devida atenção ao cogito, apercebemo-nos de que a sua certeza é
apenas momentânea – “Estou, neste momento, a pensar,logo existo”; separar depensar,posso
muito bem deixar de existir. Mas, nesse caso, o cogito dificilmente será verdadeiro, isto é,
dificilmente a consciência de que existe pensamento seria suficiente para provar a existência
de um único eu – ou seja,um ser que se reconhece como sendo o mesmo ao longo do tempo –
que reclame o pensamento atualmente em curso como seu.
Esta objeção foi primeiramente formulada pelo filósofo alemão Georg C. Lichtenberg
(tendo sido posteriormente reforçada por filósofos como Bertrand Russell e A. J. Ayer).
Lichtenberg considera que Descartes nem sequer deveria dizer “Eu penso”, deveria
dizer simplesmente “há pensamento”, como quem diz“troveja”. Segundo este autor, tudo o que
Descartes conseguiu mostrar foi que existe pensamento, mas não a existência de um qualquer
Eu a quem esse pensamento tenha necessariamente de pertencer.
b) Objeções ao Argumento da Marca
O Argumento da Marca enfrenta vários problemas. Em primeiro lugar, o argumento
pressupõe, na primeira premissa,quetemos a ideia deDeus, ou Ser Perfeito, mas esta ideia está
longe de ser consensual. Algumas tradições teológicas, como o fideísmo, afirmam que a
perfeição de Deus desafia a nossa compreensão, pois somos seres finitos e limitados,pelo que
nem sequer podemos considerar que temos a ideia de Deus, ou Ser Perfeito.
Em segundo lugar, Descartes pressupõe que duvidar é menos perfeito do que saber,
para concluir que, uma vez que duvida, não pode, ele mesmo, ser o Ser Perfeito. Mas por que
razão não podemos considerar que duvidar é mais perfeito do que possuir a totalidade do
conhecimento?
Um saber completo e perfeitamente delimitado pode ser encarado por muitos como
demasiado monótono e estático,incompatível comuma ideia dinâmica deperfeição,envolvendo
necessariamente algum esforço para o progresso.
Em terceiro lugar, o argumento também se apoia no princípio da causalidadeena ideia
de que uma causa deve ter pelo menos tanta realidade e, consequentemente, ser tão perfeita
quanto os seus efeitos. No entanto, no momento em que formula este argumento, Descartes
não tem maneira de saber se estas ideias são verdadeiras.
c) O Círculo Cartesiano
O Círculo Cartesiano é, talvez, a mais poderosa objeção que o racionalismo cartesiano
enfrenta. Esta objeção consistena acusação dequeDescartes incorrenuma petição de princípio,
pois recorreàs suascapacidades racionaisparaestabelecer a existênciadeDeus e recorrea Deus
para justificar a confiança nas suas capacidades racionais; contudo, este movimento é
claramente circular.
d) Objeções ao dualismo cartesiano (mente-corpo)
Como vimos,Descartes justificao dualismo mente-corpo com baseno facto de ser capaz
de conceber que exista sem um corpo, mas não sem uma mente. No entanto, esta estratégia
argumentativa não permite demonstrar a separação mente-corpo, pois confunde estados
mentais acerca das coisas compropriedades reais eefetivas das mesmas. Assim, do facto de eu
não conceber que existo sem uma mente, não se segue que a mente é, de facto, diferente do
corpo.
1.2.3. David Hume: o empirismo cético
Ao contrário do racionalismo cartesiano, que encarava a experiência sensível com enorme
suspeita, a teoria filosófica proposta por David Hume atribui o estatuto de crenças básicas
justamente às crenças que provêm da nossa experiência sensível imediata, como por exemplo
a crença “Estou, neste momento, a ter uma experiência da cor azul”.
Assim, em vez de recorrer a uma intuição de caráter puramente racional como o cogito,
Hume coloca na experiência sensível o maior grau de evidência a que podemos aspirar quando
procuramos saber como as coisas são.Por essemotivo, a teoria de David Hume ficou conhecida
por empirismo. Hume é um filósofo empirista que não aceita a existência de ideias inatas.
Defende antes que o conhecimento possível só pode derivar, direta ou indiretamente, da
experiência, opondo-se à possibilidade de demonstrar a existência de Deus racionalmente.
O Princípio da Cópia
David Hume era um empirista. A maioria dos empiristas tinha a crença de que, quando
nascemos, a nossa mente é como uma tábua rasa, uma folha em branco, que posteriormente
seria preenchida pela experiência. Isto significa que,para estes autores, o conteúdo das nossas
mentes tem a sua origem na experiência.São os cinco sentidos quefornecem informação sobre
o mundo, registando nas nossas mentes as impressões colhidas do exterior.
Hume escolheu o termo “perceções” para designar o conteúdo das nossas mentes – ou seja,
tudo aquilo quefazemos quando observamos,sentimos,recordamos,imaginamos,etc.Segundo
Hume, as nossas perceções podem ser de dois tipos: impressões e ideias.
- As nossas impressões correspondem aos dados da nossa experiência imediata, isto é, às
experiências que temos no momento em que observamos, sentimos, amamos, odiamos,
desejamos, e assim por diante. Por essa razão, as impressões são fortes, vivas e intensas.
- As ideias são uma imagem mental formada a partir das impressões. Por i sso, são cópias
enfraquecidas das impressões que surgem quando recorremos à memória ou à imaginação para
representarmos mentalmente impressões que tivemos anteriormente, e, portanto, são menos
intensas e menos vívidas do que as impressões.
Hume reforça esta diferença através do contraste entre sentir e pensar. Sem dúvida,sentir
uma dor é muito diferente de recordar uma dor sentida anteriormente. A primeira experiência
é forçosamente mais vívida emais intensa do quea segunda.E seem algummomento a segunda
se assemelhar à primeira no que diz respeito à sua vivacidade e intensidade, então é porque
deixamos de estar meramente a recordar uma dor e passamos a senti -la.
Deste modo, Hume reformula o velho princípio aristotélico segundo o qual “Nada está no
intelecto sem que tenha passado pelos sentidos”. Este é o princípio da cópia: todas as ideias
humanas são cópias de impressões.Hume justifica a sua aceitação deste princípio com basena
ideia de que um cego de nascença seria incapazde imaginar a cor azul, j ustamente porque não
possui qualquer impressão que corresponda a essa cor. O argumento de Hume pode ser
formulado do seguinte modo:
(1) Um cego de nascença não tem qualquer impressão de cores.
(2) Se um cego de nascença não tem qualquer impressão de cores, então ou um cego de
nascença não pode imaginar a cor azul, ou existem ideias que não correspondem a qualquer
impressão.
(3) Um cego de nascença não pode imaginar a cor azul.
(4) Logo, não existem ideias que não correspondam a qualquer impressão.
Será que Hume tem razão? Não haverá ideias quenão correspondema nenhuma impressão?
Afinas de contas, seesse for o caso, como poderíamos ter as ideias de centauro, sereia, cavalo
alado, etc.?
De acordo comHume, há ideias simples e há ideias complexas. As primeiras são aquelasque
correspondem a impressões simples,ou seja,impressões decoisasquenão podem ser divididas
em partes mais pequenas, como a cor ou a forma dos objetos; as segundas são aquelas que
correspondem a combinações de duas ou mais ideias simples, como, por exemplo, a ideia de
sereia.
Assim,através da imaginação, podemos combinar a forma de um peixe com a formade uma
mulher para criar a ideia de sereia, pois, apesar de nunca termos visto uma sereia, temos as
impressões correspondentes à forma do peixe e à forma da mulher.
Vejamos outros exemplos:
- Temos a ideia de cavalo alado, um cavalo comasas.Esta ideia resulta da combinação da ideia
de cavalo coma ideia de animal comasas.Há impressões correspondentes às ideias decavalo e
de animal com asas, mas não há nenhuma impressão correspondente à ideia de cavalo alado.
Que conclusão temos de retirar deste facto? Que esta ideia resultou do traba lho combinatório
da mente e é falsa por não existir nenhuma experiência sensorial desse animal.
- Temos a ideia de Deus. Haverá alguma impressão/sensação correspondente? Se não há, então
a ideia de Deus é uma criação da razão, a partir de ideias como «inteligência», «sabedoria»,
«bondade», «perfeição», etc. Se nunca tivéssemos tido experiências da inteligência, da
sabedoria e da bondade, não poderíamos moldar estas ideias,nem a ideia de Deus, que é uma
combinação destas.Mas enquanto aquelas são verdadeiras,por terem uma impressão que lhes
corresponde, esta, não a tendo, é uma criação ilusória da razão e deve ser rejeitada.
Assim sendo, o princípio básico do empirismo é que as nossas ideias e opiniões acerca da
realidade provêm dos sentidos.
A Bifurcação de Hume
Considerando a distinção entre ideias e impressões, Hume reduz todo o conhecimento
humano a dois tipos: relações de ideias e questões de facto. Por considerar que na busca de
conhecimento existem apenas dois caminhos a seguir, esta divisão ficou conhecida como A
Bifurcação de Hume. Assim,podemos apresentar a distinção entre relações de ideias e questões
de facto do seguinte modo:
- A relação de ideias é o tipo de conhecimento que pode ser obtido apenas mediante a análise
do significado dos conceitos envolvidos numa proposição. Por exemplo, para saber que a
proposição “Os solteirosnão são casados”éverdadeira,basta saber o significado dos conceitos
de “casado” e de “solteiro”. Trata-se de uma verdade necessária, pois a sua negação – há
solteiros casados – implica uma contradição nos termos. Este tipo de conhecimento é
característico deáreas como a matemática(por exemplo, 5 é a metade de dez), a geometria (um
hexágono tem seis lados) e a lógica. É, portanto, um conhecimento dedutivo.
- As questões de facto são o tipo de conhecimento que só pode ser obtido através de
impressões, ou seja, através da experiência, e que nos fornece informação verdadeira acerca
do mundo. Por exemplo, “A nesse é branca”é uma questão de facto, pois,para se saber que a
neve é branca,é preciso ter experiência da neve e da sua cor.Não existe nada nos conceitos de
“neve” e de “brancura” que torne a proposição “A neve não é branca” uma contradição nos
termos. Este tipo de conhecimento expressa verdades contingentes – isto é, proposições que
são verdadeiras,mas que poderiamnão o ser – e é característico deciências da natureza como
a física, por exemplo. É, portanto, um conhecimento indutivo (por exemplo, à lua nova segue-se
o quarto crescente; a água ferve a 100 graus centígrados).
Hume sustenta que apenas o conhecimento sobre questões de facto nos pode fornecer
informações sobre o mundo, pois as relações de ideias, embora expressem verdades
necessárias,referem-se apenasàs relações entre o significado das ideias envolvidas, mas nada
dizem acerca do que existe (é verdade que nenhum solteiro pode ser casado,mas isso não nos
diz se existem solteiros,ou não). Além disso,Hume reconhece que todo o conhecimento sobre
questões de facto tem de se basear na experiência.
Munido deste critério, Hume pôde, uma vez mais, reforçar a sua convicção na perspetiva
empirista:considerando que existem apenas dois tipos de conhecimento – relações de ideias e
questões de facto – e uma vez que apenas o conhecimento das questões de facto nos fornece
informações sobreo mundo, todo o nosso conhecimento do mundo se baseia necessariamente
em impressões.
Segundo David Hume, no contexto das ciências da natureza, o conhecimento das questões
de facto depende da causalidade: é porque acreditamos na regularidade da natureza que
podemos esperar que da observação de um conjunto de causas se seguirão os efeitos já
esperados.Partindo da causalidade,a ciência,por exemplo,constrói novo conhecimento através
de raciocínios indutivos. Mas a principal questão de Hume é saber se as questões de facto
permitem efetivamente construir conhecimento verdadeiro. Neste sentido, a teoria empirista
de David Hume coloca três problemas que analisaremos de seguida: causalidade, indução e
mundo exterior.
O Problema da Causalidade
A causalidade consistena associação deduas ideiasqueocorrequando representamos duas
ideias como correspondendo a uma relação causa-efeito.A consideração da causa transportaa
nossa mente para a consideração do efeito. Por exemplo, se pensamos numa ferida, é comum
pensarmos na dor que naturalmente lhe está associada. No entanto, a ideia de causalidade
coloca um enorme desafio ao empirismo de Hume, pois, embora aparentemente seja
inquestionável que somos detentores dessa ideia,a sua origem não parece ser tão clara.Afi nal,
de onde vem a ideia de causalidade?
Não setrata de uma relação deideias,pois da suanegação não resultaqualquer contradição.
Por exemplo, ao ver uma bola de bilhar mover-se em direção a outra posso perfeitamente
conceber uma série de acontecimentos alternativos: posso imaginar que ambas as bolas ficam
paradas,quea segunda fica parada ea primeira volta para trás,quea primeira para ea segunda
se desloca numa ou noutra direção,etc. Resta-nos a possibilidade de se tratar de uma questão
de facto, pelo que a veracidade do princípio da causalidade não pode ser estabelecida senão
através da experiência.No entanto, a experiência não nos respondea isto,pois tudo o quevemos
são dois acontecimentos surgirem frequentemente associados, mas não temos qualquer
impressão sensível do que é essa suposta conexão necessária entre ambos.
Apesar destas dificuldades,Hume não fica sem resposta para os problemas suscitadospelo
Princípio da Causalidade e recorre a uma experiência mental (conhecida como Um Adão
inexperiente) para nos mostrar que, apesar de não haver uma impressão que lhe corresponda
diretamente, a ideia de causalidade tem origem na experiência. Esta experiência mental
consiste em imaginar alguém que, embora seja “dotado da mais forte capacidade e ra zão
natural”, ainda não tenha tido qualquer experiência das regularidades do mundo. Como
consequência dessa falta deexperiência,por mais dotada queessa pessoa fossede um ponto de
vista racional, seria incapaz de inferir um efeito a partir da sua respetiva causa numa única
ocorrência. Se imaginarmos que essa pessoa adquire mais experiência do mundo e das suas
regularidades, percebemos que isso bastaria para que se tornasse capaz de fazer tal inferência
(isto é, seria capazdeo fazer após verificarquedois acontecimentos aparecem constantemente
um a seguir ao outro). Deste modo, Hume conclui que a ideia de relação causal ou conexão
necessária entre dois acontecimentos mais não é do que a expectativa de que um deles, a que
chamamos efeito, irá ocorrer sempre que o outro, a que chamamos causa, ocorra. Esta
expectativa resulta do hábito, ou costume, isto é, da experiência que temos de uma conjunção
constante desses dois acontecimentos pelo que não se funda na razão, mas sim num impulso
natural irresistível e fundamental para o nosso dia a dia. Esta conexão resulta unicamente da
nossa vontade de que o mundo seja previsível (atitude a que Hume designará por Princípio da
Uniformidade da Natureza).
O Problema da Indução
A solução de Hume para o problema da causalidademostra-nos que a nossa expectativa de
que causas semelhantes terão efeitos semelhantes sebaseia unicamenteno hábito – ou seja,na
nossa experiênciade certas regularidades ou repetições -, pelo que não temos legitimidadepara
postular a existência de uma força ou poder secreto da Natureza que estabelece uma relação
causal (ou conexão necessária) entre diferentes objetos ou acontecimentos. No entanto, essa
constatação não está isenta de dificuldades,pois sema garantia deque existe, de facto, uma tal
relação causal (ou conexão necessária) não temos legitimidadepara acreditar emalgo tão trivial
e tão fundamental para o nosso dia a dia como a ideia de que causas semelhantes terão efeitos
semelhantes. Chamamos a esta proposição Princípio da Uniformidade da Natureza (PUN). Este
princípio diz-nos o seguinte: a Natureza irá comportar-se no futuro conforme se tem
comportado até hoje.
O Princípio da Uniformidade da Natureza é algo que, de forma mais ou menos consciente,
todos assumimos como verdadeiro, pois sem essa crença a nossa vida quotidiana tornar -se-ia
bastante bizarra. Que razões posso apresentar para o facto de acreditar que o chão não irá
desaparecer debaixo dos meus pés quando começar a caminhar? Aparentemente, tudo o que
posso fazer é dizer que acredito que assim será porque até hoje assim foi. Mas será que isso me
oferece algumtipo degarantia? Por outras palavras,teremos alguma vezjustificação parainferir,
a partir da repetição de um grande número de casos observados,uma conclusão acerca decasos
ainda por observar? Na Unidade 1, designámos este tipo de inferências como inferências
indutivas e, por esse motivo, este problema também ficou conhecido como problema da
indução.
Hume considerou que não há maneira de justificar racionalmente a nossa confiança nas
inferências indutivas. Por maior que seja o número de casos em que experimentamos uma
determinada regularidade, jamais teremos justificação racional para acreditar que essa
regularidade se irá manter no futuro. Analisemos uma inferência indutiva:
(1) Até hoje o Sol nasceu todos os dias.
(2) Logo, o Sol irá nascer amanhã.
Verificamos aqui que a verdade das premissas não é suficiente para garantir a verdade da
conclusão. A única forma de tornar esta inferência mais sólida é acrescentando-lhe o Princípio
da Uniformidadeda Natureza como uma das suas premissas.Destemodo, a inferência assumiria
esta forma:
(1) A Natureza irá comportar-se no futuro conforme se tem comportado até hoje (PUN).
(2) Se PUN é verdadeiro, então se até hoje o Sol nasceu todos os dias, irá nascer amanhã.
(3) Até hoje o Sol nasceu todos os dias.
(4) Logo, o Sol irá nascer amanhã.
Esta última inferência é válida, mas a sua solidez depende da veracidade do Princípio da
Uniformidade da Natureza. Contudo, uma vez que não se trata de uma mera relação de ideias,
não temos forma de demonstrar a veracidade deste princípio sem recorrer à experiência, mas
isso implicaria justificar a nossa confiança nesse princípio com base na nossa experiência de
que até hoje a Natureza se tem comportado de modo uniforme. Isso significa queestaríamos a
recorrer à indução para justificar a nossaconfiançaemPUN. Ora,dado que a nossa confiança ma
própria indução pressupõea adoção dePUN,a nossa justificação torna-se viciosamente circular,
pois pressupõejustamenteaquilo quepretende justificar,incorrendo numa petição de princípio.
Deste modo, Hume é, mais uma vez, conduzido à conclusão de que a crença de que a
Natureza se irá comportar como setem comportado e a nossa confiançana indução não têm um
fundamento racional esão apenas fruto deum inegável impulso natural quenos determina a ter
esta crença.
O Problema do Mundo Exterior
A crença no Princípio da Uniformidade da Natureza não é a única crença comum cujo
fundamento é posto em causa por Hume. Sem refletir muito sobreo assunto,todos nós estamos
dispostos a assumir a existência de um mundo exterior às nossas mentes, que não depende da
nossa perceção e que é a verdadeira causa das nossas impressões. Mas, segundo Hume, é um
erro confundir os objetos exteriores e o mundo exterior à nossa mente com as perceções dos
mesmos. Para sustentar esta ideia, Hume avança o seguinte argumento:
(1) Se a mesa que vemos e que está presente na nossa mente fosse a mesa real, o seu tamanho
não se alterava em função da nossa perspetiva.
(2) Mas a mesa que está presente na nossa mente parece diminuir à medida que dela mais nos
afastamos, ou seja, o seu tamanho altera-se em função da nossa perspetiva.
(3) Logo, aquilo que está presente na nossa mente não é mesa real, mas sim uma imagem ou
representação mental da mesma.
Uma vezque se trata de uma questão que diz respeito à existência, umainvestigação desta
natureza deve ser resolvida com recurso à experiência, mas a nossa experiência não pode
alguma vez estender-se para além das nossas impressões, e estas, conforme acabámos de
constatar,não devem ser confundidas comos objetos exteriores em si mesmos. Assim, uma vez
que nunca poderemos sair do interior das nossas mentes, nunca seremos capazes de verificar
se, de facto, existe uma correspondência entre as nossas perceções eos objetos exteriores, nem
tampouco poderemos alguma vez ter justificação para acreditar na existência dos mesmos.
O Ceticismo Moderado de Hume
Assim, como consequência dos seus princípios empiristas, Hume é estranhamente
conduzido à conclusão de que existem duas crenças que, embora não possamos viver sem as
assumir como verdadeiras, estão para além de qualquer tentativa de justificação racional:
1. A crença na uniformidade da Natureza, isto é, a crença de que a Natureza se irá comportar
conforme se tem comportado até hoje (ou seja, a crença no Princípio da Indução);
2. A crença na existência do mundo exterior, isto é, a crença de que existem objetos exteriores à
nossa mente que são responsáveis pelas nossas perceções dos mesmos.
Contudo, isto não faz de Hume um cético, pelo menos não no sentido tradicional do termo,
porque considera que, uma vez que estas crenças fazem parte da natureza humana e na vida
quotidiana não conseguimos pensar nemagir semelas,não devemos rejeitá-las,nemsuspender
o juízo relativamente às mesmas. Hume acaba por defender apenas um ceticismo moderado,
que serve para nos proteger contra o dogmatismo, as decisões precipitadas e as investigações
demasiado especulativas, distantes da experiência e sem suporte empírico.
OBJEÇÕES À TEORIA EMPIRISTA DE DAVID HUME
a) Objeção à imagem da mente como tábua rasa
No século XX,o filósofo americano Jerry Fodor propôs umargumento que põe em causa
a crença partilhadapelos empiristasdeque, à nascença,a nossa mente é como uma tábua rasa
(ou folha em branco).Fodor considera queà nascença somos capazes deaprender uma Língua e
qualquer processo de aprendizagem de uma Língua pressupõe algum conhecimento linguístico
inato. Ora, se encararmos este conhecimento inato do funcionamento da língua como genuíno
conhecimento acerca do mundo, teremos de abandonar a ideia de que, à nascença, a mente é
uma tábua rasa (ou folha em branco).
b) Objeção do homúnculo
Através do Argumento da Mesa, Hume demonstrou que aquilo que está presente na
nossa mente não são os objetos reais do muno exterior, mas simuma imagem ou representação
mental dos mesmos. Esta imagem do funcionamento da mente parece implicar que somos
homúnculos (pessoas minúsculas) fechados numa espécie de cinema privado no interior das
nossas mentes, onde nos são apresentadas imagens ou representações dos objetos do mundo
exterior aos quais não temos qualquer tipo de acesso direto.
Mas os problemas levantados a propósito da nossa relação com o mundo exterior
também se aplicamà relação dessehomúnculo comas imagens presentes no ecrã do seu cinema
mental. Se a natureza da explicação semantiver inalterada,acabaremos por supor a existência
de outro homúnculo dentro da mente do primeiro e assim sucessivamente, caindo numa
regressão infinita de homúnculos, que aparentemente deixa por explicar o processo de
interação entre a mente e o mundo.
c) Objeção baseada na argumentação a favor da melhor explicação
Bertrand Russell rejeita as conclusões céticas de Hume, pois considera que a sua ideia
do que deve ser “racionalmente justificável” é demasiado estreita. Hume parece admitir que
nenhuma crença está racionalmente justificada,a menos que exista uma prova definitiva da sua
verdade. Para Russell, pode ser racional acreditar numa crença, mesmo na ausência deste tipo
de prova, pois pode simplesmente acontecer que de entre as alternativas disponíveis para a
explicar a nossaexperiência exista uma hipótesemais plausível do que todas as outras,pelo que
é mais racional acreditar na sua verdade do quem qualquer uma das alternati vas. Este tipo de
argumentação designa-seargumentação a favor da melhor explicação e é um bom exemplo de
abdução – um processo de inferência que se apoia num conjunto de dados para extrair com um
certo grau de plausibilidade uma conclusão que vai além dos mesmos. Russell acredita que a
existência de um mundo exterior às nossas mentes regido pelo princípio da causalidade é uma
explicação da nossa experiência muito mais simples e apelativa do que qualquer cenário cético
que possamos imaginar. Por isso, considera que temos uma justificação racional para acreditar
nisso.O mesmo se aplicaà ideia decausalidade:é mais razoável aceitarmos que o mundo é, de
facto,regido por leis causais,do queassumir quea existênciadeconjunções constantes éapenas
acidental.
d) Contraexemplo do tom azul desconhecido
O próprio David Hume prevê a possibilidade de se encontrar um contraexemplo ao
Princípio da Cópia e, embora o desvalorize, a verdade é que esse contraexemplo pode minar a
nossa confiançano Princípio quetem como alvo.Essecontraexemplo consisteem imaginar uma
situação em que alguém é colocado perante uma determinada gradação de tons de azul,sendo
um dos tons dessa gama propositadamente omitido. O problema surge porque alguém que
nunca tenha tido experiência desse particular tomde azul pode, ainda assim,formar uma ideia
a seu respeito, mesmo na ausência de uma impressão que lhe corresponda.Ora, isso não seria
possível se, de facto, todas as nossas ideias fossem cópias de impressões.
RACIONALlSMO (Descartes)
 O conhecimento sensível é enganador.
 A razão é a única fonte de conhecimento válido (para Descartes,há ideias inatas).
 As representações provenientes da razão são as mais certas e,por isso,devem ser
consideradaso ponto de partida de todo o conhecimento que se quer logicamente
necessário e universalmente válido.
 Conduz ao dogmatismo.
EMPIRISMO (David Hume)
 A experiência é a única fonte de conhecimento.
 Não há ideias inatas, a mente está vazia antes de receber qualquer tipo de
informação sensorial.
 Todo o conhecimento acerca das coisas,mesmo aqueleque formula leis universais,
vem da experiência; por isso, só é válido dentro dos limites do observável.
 Conduz a um ceticismo moderado.
Publicado 20th November 2015 por Rui Mendes
Etiquetas: Descrição e interpretação da atividade cognoscitiva
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5.
Oct
22
2. Argumentação e retórica
2.1. A procura de adesão do auditório: ethos, pathos e logos
A argumentação é um processo comunicativo, pois nela estão sempre presentes um
emissor (o orador), um recetor (o auditório) e uma mensagem (tese ou argumento).
O orador é aquele que, dispondo de uma opinião, a partilha com um auditório. Essa
opinião pertence ao domínio do verosímil, podendo consistirnuma tese, numa causa,numa ideia,
num ponto de vista, sendo sustentada, depois, com argumentos. O objetivo da argumentação é
levar o auditório a aderir à opinião que lhe é proposta.Mas para isso é neces sário ter em conta o
contexto de receção, ou seja, o conjunto de opiniões, valores e juízos que o auditório partilha.
Estes elementos, anteriores ao ato de argumentação, são decisivos no que se refere ao grau de
adesão à tese do orador. Dito de outro modo: o orador tem de estar atento às caraterísticas do
auditório e no decorrer da argumentação estar atento aos sinais que lhe permitem perceber se o
seu discurso está a ser entendido e a ser aceite. Neste sentido, argumentação e auditório
influenciam-se mutuamente: se, por um lado, o emissor adequa o seu discurso às características
do seu auditório, por outro lado, o auditório transforma-se por efeito das teses que lhe são
apresentadas.O discurso argumentativo constitui-se assim como um instrumento de formação da
opinião pública, condicionando comportamentos, opiniões e tomadas de posição.
Desde a antiguidade que a argumentação representa um instrumento-chave na relação
entre os seres humanos, pelo que desde cedo se constituíram disciplinas que visaram o estudo da
argumentação, tais como a oratória e a retórica.Aristóteles foi um dos pensadores que se dedicou
ao estudo da retórica e que reconheceu esta relação. Este filósofo defendeu que o orador, o
auditório e o discurso são três elementos-chave da prova utilizada pela retórica. Assim, o ethos
(representando o caráter do orador), o pathos (representando a envolvência emocional do
auditório) e o logos (simbolizando o discurso propriamente dito) são os três géneros de prova da
retórica.
O ethos relaciona-se com a credibilidade do orador. Antes mesmo da persuasão que o
discurso possa exercersobre o auditório, o reconhecimento do orador, da sua autoridade na matéria
e do seu caráter/perfil ético e moral são indispensáveis à aceitação do discurso pelo auditório.
O pathos está ligado ao auditório. O tom de voz, a convicção ou a emoção do orador
envolvem sentimentalmente o seu público. A emoção é um aspeto determinante para a aceitação
da tese apresentada na argumentação, pois um auditório emocionalmente envolvido será melhor
persuadido do que umauditório que apenas dá assentimento lógico ao discurso.
O logos constitui a prova propriamente dita, isto é, refere-se diretamente à
argumentação. Esta deve ser clara e a passagementre os diferentes argumentos deve serevidente.
Assim, na argumentação, Aristóteles põe em relação o orador (ethos), o seu auditório
(pathos) e o discurso argumentativo (logos).
Em síntese, o discurso argumentativo está diretamente relacionado com o auditório
porque:
- dirige-se a um público específico;
- centra-se na sedução do auditório a que se dirige;
- constitui-se como formador da opinião e do seu público;
- utiliza um discurso lógico-argumentativo que tem por objetivo que o auditório dê o seu
assentimento à tese ou teses apresentadas;
- dirige para o auditório as suas técnicas de persuasão (perguntas retóricas, ironia,
elementos visuais, apelo ao envolvimento pessoal, utilização de exemplos e analogias, entre
outras).
2.1.1. Demonstração e argumentação
A argumentação nunca ocorre no vazio, isto é, há sempre um orador que
tenta prevalecer a sua tese e assim persuadir o auditório. Na base da argumentação
está a retórica, a qual é definida como a arte de bem falar. A retórica nasceu na
Grécia no século V a.C., contemporânea da Filosofia e da democracia; o seu
objetivo era precisamente levar um auditório a aceitar uma determinada tese ou
opinião. Mas quais são as diferenças entre a lógica formal (demonstrativa) e a
retórica (argumentativa)?
Demonstração Argumentação
Pertence à lógica formal Pertence à lógica informal
Utiliza uma linguagem
formal/inequívoca
Utiliza a linguagem natural
Pretende provar Pretende persuadir e convencer
É impessoal É pessoal
É independente do auditório É dependente do auditório
É independente do contexto É dependente do contexto
É objetiva É subjetiva
Demonstração
A lógica formal elimina toda a ambiguidade do discurso. Neste sentido, as
suas demonstrações estabelecem uma relação necessária entre a conclusão e as
premissas que a sustentam, compelindo à sua aceitação e não dependendo do
sujeito que as profere nem do contexto ou auditório em causa. Dito de outro modo:
numa demonstração, as premissas são verdades estabelecidas que não deixam
lugar para qualquer dúvida, e a conclusão segue-se a elas de uma forma necessária.
Argumentação
A argumentação retórica não consiste na apresentação de demonstrações.
Por um lado, o orador não tem de partir de premissas inquestionavelmente
verdadeiras. As suas premissas podem consistir apenas em opiniões aceites pelo
auditório. Basta-lhe que as premissas sejam prováveis e pareçam verosímeis ao
auditório. Por outro lado, o orador não deve estar empenhado em mostrar
rigorosamente que a conclusão se segue validamente das premissas, pois o
auditório tem uma capacidade muito limitada de seguir raciocínios. Por isso, às
vezes o orador opta por apresentar os argumentos de uma forma abreviada e
sugestiva, apoiando-se em exemplos isolados e suprimindo premissas.
Convém ainda referir que o discurso argumentativo expressa-se em
linguagem natural e permite a refutação das suas teses. Além disso, depende do
contexto e do auditório em causa.
2.2. O discurso argumentativo – principais tipos de argumentos e
falácias informais
2.2.1. Tipos de argumentos
a) Argumentos indutivos [induções]
São argumentos que derivam ou de generalizações (“Todos os cisnes
que vi até hoje são brancos; logo, todos os cisnes são brancos”) ou de previsões
(“Todos os cisnes que vi até hoje são brancos; logo, o próximo cisne que vir será
branco”). Num argumento indutivo a conclusão apresentada é mais ampla do que
as premissas afirmam, uma vez que criam generalizações a partir de casos
particulares. Por esta razão, a força de um argumento indutivo depende do maior
ou menor grau de probabilidade de se verificar a sua conclusão.
Alguns cuidados a observar comargumentos que recorremà indução:
- Não se devem extrair generalizações com base numnúmero limitado de exemplos.
- Os elementos que fundamentam as generalizações devem ser representativos.
- Os elementos que sustentam as generalizações devem ser relevantes para a
conclusão.
- Não deve estar oculta informação que influencie a conclusão extraída.
b) Argumentos por analogia
Os argumentos que recorrem a uma analogia extraem conclusões com
base em semelhanças conhecidas entre objetos ou acontecimentos. Num
argumento deste tipo conclui-se que algo tem uma determinada característica
porque num outro facto ou objeto semelhante essa característica está presente. Por
exemplo:
O Universo é como uma máquina.
As máquinas são criadas por seres inteligentes.
Logo, o Universo foi criado por um ser inteligente.
Alguns cuidados a observar emargumentos por analogia:
- As semelhanças verificadas devemser suficientes.
- As semelhanças identificadas devemser relevantes para a comparação pretendida.
- Deve ser considerado, sempre que possível, um número amplo de objetos ou
fenómenos.
c) Argumentos de apelo à autoridade
Num argumento de apelo à autoridade assume-se que a conclusão é
verdadeira partindo-se de posições de pessoas ou instituições reconhecidas como
peritos no assunto em causa. Por exemplo:
Platão e Descartes acreditavam na imortalidade da alma humana.
Logo, a alma humana é imortal.
Alguns cuidados a observar emargumentos de apelo à autoridade:
- As fontes dos argumentos de autoridade devemser pormenorizadamente citadas.
- Só devem ser utilizadas fontes imparciais.
- Devem ser utilizadas fontes comamplo consenso na matéria em questão.
- A fonte citada deve ser reconhecida como especialista na matéria.
2.2.2. Falácias informais
As falácias informais são raciocínios que aparentam estar fundados em
argumentos fortes quando, na verdade, são enganadores ou ilusórios. Estas
falácias são, portanto, erros que se ligam a um uso inapropriado do conteúdo de
um argumentam.
a) Falácia da petição de princípio
Esta falácia consiste num raciocínio circular que procura provar uma
conclusão, que já se encontra assumida como verdadeira nas premissas, sem ter
apresentado qualquer prova a seu favor. Por exemplo: “Todas as pessoas com mau
humor tratam mal os outros, dado que estão sistematicamente com o seu estado
emocional alterado.”
Argumentar contra a falácia:
Para se argumentar contra esta falácia basta que se mostre que, no argumento, estar
emocionalmente alterado é equivalente a estar mal-humorado e que,desta forma, tanto a premissa
como a conclusão dizem o mesmo sem que se prove que o mau humor é causa suficiente para se
tratar mal os outros. É possível estar-se de mau humor e não se tratar mal as pessoas.
b) Falácia ad hominem
Esta falácia ocorre baseia-se no ataque contra a pessoa que defende um
determinado argumento, em vez de se atacar o argumento. Por exemplo: “Não
percebo como podes aceitar a opinião desse indivíduo, afinal ele é taxista.”
Argumentar contra a falácia:
Para demonstrar a fragilidade da falácia ad hominem deve mostrar-se que o
argumento não apresenta as razões pelas quais a opinião do taxista não é aceitável. Ter uma
determinada profissão não implica necessariamente que se tenha más opiniões.
c) Falácia do apelo à ignorância
Esta falácia ocorre quando se defende que uma proposição é
verdadeira apenas por não se conseguir provar que ela é falsa; ou que uma
proposição é falsa por não se conseguir provar que ela é verdadeira. Por exemplo:
“Deus existe porque ninguém provou que Ele não existe” ou “Deus não existe
porque ninguém provou que Ele existe”.
Argumentar contra a falácia:
Para demonstrar a fragilidade da falácia do apelo à ignorância deve mostrar-se que
não é pelo facto de não ter sido possível provar umjuízo que ele passa a ser falso.
d) Falácia do falso dilema
Esta falácia é um raciocínio em que o orador apresenta normalmente
apenas duas das alternativas possíveis quando na realidade existem mais. Ataca
de seguida a alternativa que não lhe convém e leva o auditório a aceitar a
alternativa que lhe interessa. Por exemplo: “Quem não está connosco está contra
nós Por isso, se não nos apoiam são nossos inimigos.”
Argumentar contra a falácia:
Para se argumentar contra esta falácia deve apresentar-se pelo menos mais uma
alternativa possível além das que são expostas no argumento. Neste caso, poderia contra-
argumentar-se que o facto de não se apoiar alguémnão significa que sejamos seus inimigos.
e) Falácia da derrapagem
Esta falácia comporta normalmente um raciocínio ardiloso em que
pelo menos um dos passos de que depende o raciocínio é falso. A partir desse
ponto, a conclusão está comprometida.
Por exemplo:
“Se se tomar um analgésico o organismo cria dependência desse
fármaco. De cada vez que se voltar a sentir dor, esses medicamentos
farão cada vez menos efeito. Pelo que, inevitavelmente, o uso do
analgésico contribui para o sofrimento dos doentes.”
Argumentar contra a falácia:
Para demonstrar a fragilidade desta falácia deve argumentar-se que a dependência dos
fármacos não ocorre necessariamente pela sua toma esporádica quando recomendada e
monitorizada por um profissional de saúde. O facto de se tomar um analgésico não se produz
necessariamente dependência, logo, a conclusão de que os analgésicos desencadeiamsofrimento
nos doentes não é sustentada pela cadeia de raciocínio apresentada.
f) “Boneco de palha”
A falácia do boneco de palha consiste na ridicularização ou deturpação
da argumentação apresentada por forma a refutá-la mais facilmente. Desta forma,
a contra-argumentação não ataca verdadeiramente o argumento apresentado, mas
a sua versão distorcida.
Por exemplo:
“Deputado de um partido da oposição: A taxa de desemprego real é
superior à que é apresentada na estatística, pois há muitos desempregados que
não são contabilizados como tal. Devíamos alterar o método de cálculo da taxa
de desemprego para saber com mais rigor as medidas a tomar.
Resposta de um elemento do Governo: Alterar a forma de cálculo não
serve para nada. Contabilizar na estatística o número de pessoas que não
trabalham por preguiça, independentemente das políticas adotadas, não
melhorará nada.”
Argumentar contra a falácia:
Para refutar esta falácia é necessário mostrar que o elemento do Governo deturpa o
argumento do deputado da oposição. Este deputado não diz que a taxa de desemprego está errada
unicamente porque não se contabilizam os desempregados que não querem trabalhar, haverá
outros desempregados (provavelmente, a maioria) que não são contabilizados e para os quais
medidas de emprego ajustadas seriamúteis.
3. Argumentação e filosofia
3.1. Filosofia, retórica e democracia
A retórica surge ao mesmo tempo que a Filosofia e no mesmo sítio, ou
seja, entre os séculos VII e V a.C. na Grécia Antiga. A retórica é um produto direto
de um novo regime político – a democracia. De facto, na Grécia, a palavra ganha
uma nova dimensão, servindo não apenas para comunicar mas também para
argumentar. Tendo em conta as circunstâncias especiais que se deram na Grécia,
os homens livres são chamados a dar as suas opiniões nas assembleias, nos
tribunais e na praça pública.
É neste contexto que surgem os sofistas. Estes eram um grupo especial de
pensadores, que se intitulavam sábios, especialistas em ensinar aos outros as suas
técnicas argumentativas. Além disso, defendiam a relatividade da verdade, facto
que os opôs a Sócrates e Platão. Os sofistas vinham responder à necessidade
presente na sociedade grega no que diz respeito ao ensino, sobretudo ao ensino da
retórica, que se tornava necessária para vencer na hierarquia social.
Sócrates e Platão posicionaram-se contra os sofistas, opondo à retórica a
Filosofia. Os verdadeiros filósofos preocupavam-se em descobrir a verdade, que
era apenas uma, posição contrária à dos sofistas, que defendiam a relatividade da
verdade. Surge, assim, a oposição verdade/aparência e Filosofia/retórica.
Posteriormente, Aristóteles vem defender a retórica, que se torna um saber
entre outros. Para este filósofo, a retórica não se opunha à Filosofia, já que ela não
é boa nem má, podemos é fazer um bom ou um mau uso dela.
Durante o Império Romano, nomeadamente com Cícero, a retórica retoma
a sua vertente mais estilística, relacionada com a eloquência e o ornamento do
discurso.
Na Época Moderna, a retórica é relegada para segundo plano, atrás do
espírito e da racionalidade científica.
Já em pleno século XX, dá-se a reabilitação da retórica, com a chamada
Nova Retórica, proposta por Perelman, filósofo que volta a relacioná-la com a
Filosofia. Este filósofo contemporâneo enalteceu o papel do logos (isto é, a
dimensão do discurso) ao considerar a retórica uma arte fundamental para
estabelecer consensos e suscitar a adesão do auditório universal.
A retórica, enquanto arte de argumentar, é o instrumento fundamental no
debate democrático. Sem debate, troca fundamentada de ideias, não há verdadeira
democracia. Os gregos foram os primeiros a reconhecê-lo: a palavra, à primeira
vista, substitui a violência, a prepotência, a dominação e permite o bom senso, o
consenso e o acordo. É por estas razões que a retórica que os sofistas ensinavam
aos jovens cidadãos assumia uma importância crucial na Grécia antiga. Contudo,
também hoje, como na Antiguidade, a democracia pode ver-se ameaçada pelo
mau uso da palavra, pelo discurso demagógico e manipulador. Isto significa que
o mau uso da retórica constitui uma ameaça à saúde da democracia.
3.2. Persuasão e manipulação ou os dois usos da retórica
Podemos distinguir dois possíveis usos da retórica: um bom uso, que
designamos por persuasão, e um mau uso, que designamos por manipulação.
A persuasão é a prática do discurso que tem como finalidade a livre adesão
de um auditório à tese que dado orador pretende que seja acolhida pelo primeiro
e que, com esse objetivo, abre espaço crítica, à reflexão e à liberdade de escolha
do recetor. Dito de outro modo: persuadir é levar alguém a uma mudança de
opinião e de atitude, aderindo às nossas teses. Alguns autores designam a
persuasão por retórica branca, isto é, a retórica crítica, lúcida e consciente, que
procura desmontar os discursos manipuladores.
Por outro lado, a manipulação consiste na prática abusiva do discurso que
visa impor determinada tese a um dado auditório e que, por isso, faz uso de
técnicas ilegítimas que paralisam o espírito crítico do recetor e o levam a aceitar
a mensagem sem a questionar. Neste sentido, manipular tem uma conotação
negativa, uma vez que se trata de uma prática abusiva do discurso, que obriga o
outro a aderir às nossas teses. Alguns autores designam a manipulação por retórica
negra, isto é, a retórica que visa enganar, iludir e manipular o interlocutor.
Em síntese: a retórica tanto pode servir a verdade como a mentira; tanto
pode persuadir e convencer, como manipular e enganar. Não sendo a retórica
condição suficiente para garantir o discurso verdadeiro, impõe-se a necessidade
de um uso ético da retórica, isto é, um uso que tem em vista a verdade.
3.3. Argumentação, verdade e ser
Pode-se dizer que uma proposição é verdadeira se está de acordo com
aquilo que as coisas são, se corresponde à realidade, e falsa se não está de acordo
com aquilo que as coisas são, se não corresponde à realidade.
A filosofia, tal como as ciências, é uma procura de conhecimento, é uma
tentativa de descobrir como as coisas são realmente. A argumentação filosófica,
portanto, tem em vista a verdade. Os argumentos são vistos como instrumentos na
procura da verdade, e não como formas de manipular a opinião dos outros.
Na filosofia contemporânea reconhece-se assim uma relação estreita entre
a argumentação, a verdade e o “ser” ou realidade. Conhecer a verdade é saber
como as coisas são e na filosofia recorre-se à argumentação para descobrir a
verdade.
Publicado 22nd October 2015 por Rui Mendes
Etiquetas: Argumentação e filosofia Argumentação e retórica
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6.
Sep
28
Redes concetuais: compreensão e
distribuição de termos
1. Organize por ordem crescente de compreensão os seguintes conceitos: vegetal,
flor, cravo, ser, ser vivo.
2. Organize por ordem decrescente de distribuição os seguintes conceitos: animal,
vivente, avestruz, ser, ave, vertebrado.
3. Organize por ordem crescente de distribuição os seguintes conceitos: lisboeta,
europeu, animal, Fernando Pessoa, animal racional, português.
4. Organize por ordem decrescente de compreensão os seguintes conceitos: ser
vivo, árvore, pinheiro silvestre, vegetal, pinheiro.
5. Organize por ordem crescente de compreensão os seguintes conceitos: objeto
material, calças de ganga, peças de roupa, calças.
Publicado 28th September 2015 por Rui Mendes
Etiquetas: TPC
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7.
Sep
13
Unidade 1 – Racionalidade
argumentativa e filosofia
1. Argumentação e lógica formal
1.1. A definição de lógica
A palavra lógica deriva do grego “logos”, que significa razão, pensamento,
discurso. Por isso, podemos dizer que a lógica é a disciplina que estuda as
condições de coerência do pensamento e do discurso, preocupando-se com a
correção dos argumentos. Torna-se, pois, necessário obedecer a determinadas
regras para a elaboração dos nossos raciocínios e argumentos. A lógica permite
estabelecer essas regras, de modo a distinguir os argumentos válidos daqueles que
não o são. Dito de outro modo: é a disciplina que investiga os princípios gerais do
pensamento válido.
Qual a utilidade e importância da lógica?
- A lógica analisa as condições de coerência do pensamento e do discurso;
- A lógica analisa a validade/verdade do pensamento e do discurso;
- A lógica proporciona os meios que possibilitam a organização coerente
do pensamento e do discurso.
1.1.1. A estrutura do argumento
Um argumento é um conjunto de proposições relacionadas entre si de tal
modo que umas (que designamos por premissas) devem oferecer razões para
aceitar uma outra (que designamos por conclusão).
Por exemplo:
Premissa: “Todas as coisas são seres vivos”.
Premissa: “A pedra é uma coisa”.
Conclusão: “A pedra é um ser vivo”.
Quer as premissas, quer a conclusão são proposições, e cada uma das
proposições é constituída por termos. Deste modo, o termo e a proposição são as
partes que constituem o argumento.
a) O termo
O termo é a expressão verbal do conceito. O conceito é o elemento base
do nosso pensamento, deriva de uma operação mental de abstração que reúne as
características essenciais dos seres. Há conceitos empíricos, isto é, que provêm da
experiência (por exemplo, “carro”, “rua”, “boneca”) e conceitos ideais (por
exemplo, “sereia”, “bondade” “Deus”). Convém referir que o conceito deve
restringir-se ao campo da possibilidade lógica (por exemplo, não existe o conceito
de “claridade escura” ou de “círculo quadrado”). Por outro lado, é de notar que o
termo pode ser constituído por uma ou mais palavras (por exemplo, “ser vivo”,
“animal selvagem”, “densidade populacional”, “instrumento musical”).
Podemos distinguir a compreensão e a extensão dos termos/conceitos:
- compreensão: conjunto de características ou atributos que definem um
conceito (por exemplo, podemos atribuir ao conceito de “homem” as seguintes
características: ser vivo, mamífero, bípede, racional);
- extensão: conjunto de seres a que o conceito se refere (por exemplo, a
Joana, o Alfredo, o Tomás, a Carla).
A compreensão e a extensão variam segundo uma ordem inversa: quando
aumenta a extensão diminui a compreensão e quando aumenta a compreensão
diminui a extensão. Sendo assim, quanto maior é o número de elementos a que o
conceito se aplica (extensão), menor é a quantidade de características comuns
(compreensão). Por exemplo:
Ser, ser vivo, animal, animal racional, Tomás.
O conceito de “ser” é aquele que, neste caso, possui maior extensão e
menor compreensão, enquanto que o conceito de “Tomás”, designando apenas um
indivíduo, é aquele que possui menor extensão (pois designa apenas um elemento)
e maior compreensão (pois é mais fácil enunciar características de uma só pessoa
do que características comuns a uma centena de pessoas).
Os conceitos que nos servem de exemplo estão dispostos por ordem
crescente de compreensão e por ordem decrescente de extensão.
b) A proposição
Antes de mais, refira-se que a proposição é a expressão verbal (oral ou
escrita) do juízo e só as frases declarativas é que são proposições (por exemplo:
“empresta-me o teu caderno” não é uma proposição, mas “alguns ratos são
maléficos” já é uma proposição).
A proposição corresponde a um modo específico de relacionar termos.
Ela é um enunciado que estabelece uma relação de afirmação ou de negação entre
termos, podendo tal relação ser verdadeira ou falsa. A proposição distingue-se de
outros tipos de raciocínio porque nele apenas se relacionam dois conceitos: o
primeiro conceito é o sujeito (S); o segundo conceito é o predicado (P); a relação
entre ambos faz-se através da cópula (é/não é), que é o elemento que relaciona o
sujeito com o predicado. A proposição reduz-se à fórmula “S é P”, sendo
suscetível de ser considerada verdadeira ou falsa. A relação entre S e P é uma
relação de inerência, pois o predicado é inerente ao sujeito. Por exemplo: “Todos
os filósofos [sujeito] são [cópula] sábios [predicado]”.
As proposições podem ser classificadas em relação à sua quantidade
(universais ou particulares) e em relação à sua qualidade (afirmativas ou
negativas), sendo simbolizadas pelas vogais A, E, I, O.
A – proposição universal afirmativa: “Todos os cientistas são portugueses”.
E – proposição universal negativa: “Nenhum cientista é português”.
I – proposição particular afirmativa: “Alguns cientistas são portugueses”.
O – proposição particular negativa: “Alguns cientistas não são portugueses”.
Importa salientar que há proposições que, apesar de formadas apenas
por dois elementos, podem ser transformadas na forma padrão ou forma canónica.
Por exemplo: “Ser político é ser mentiroso” equivale a ”Todos os políticos são
mentirosos”; ou “Nem todos os padres são sinceros” equivale a “Alguns padres
não são sinceros”.
c) O argumento
Tal como as proposições resultam do encadeamento de termos,
também os argumentos são encadeamentos de duas ou mais proposições, levando-
nos a uma conclusão. Assim, podemos definir o argumento como a expressão
verbal de uma inferência ou raciocínio, isto é, como a operação através da qual,
de duas ou mais proposições (chamadas de premissas), se extrai uma outra
proposição (que designamos por conclusão).
Vejamos um exemplo:
Todos os homens são mortais – Premissa maior
Santiago é homem – Premissa menor
Logo, Santiago é mortal – conclusão.
O que resulta da relação que estabelecemos entre as duas premissas é
uma nova proposição – a conclusão – que extraímos necessariamente da relação
entre as duas premissas. Designamos as duas premissas por antecedente (são as
duas proposições já conhecidas) e a conclusão por consequente (é a nova
proposição).
1.1.2. Indicadores de premissa e de conclusão
Nem sempre os argumentos se encontram na forma padrão, que é
uma tipologia preestabelecida para apresentar o argumento, onde se enunciam
primeiro as premissas e a seguir a conclusão. Em alguns casos é necessário estar
bastante atento de modo a identificar as premissas e a conclusão dos argumentos.
Os indicadores de premissa e de conclusão ajudam a identificar as várias partes
dos argumentos.
Exemplos de indicadores de
conclusão
Exemplos de indicadores de
premissa
logo… pois…
portanto… porque…
por isso… admitindo que…
segue-se que… dado que…
infere-se que… visto que…
consequentemente… tendo em conta que…
1.2. A distinção verdade-validade
Validade e verdade são dois termos que aparecem frequentemente
quando falamos em lógica. Se eu disser “Hoje está a chover”, esta frase é válida,
do ponto de vista formal está bem construída, no entanto, ela pode ser falsa, no
caso de hoje estar Sol.
Assim, a validade diz respeito à forma/estrutura da inferência ou
raciocínio. Por outro lado, a verdade diz respeito ao que é afirmado ou negado
pela proposição, ou seja, ao seu aspeto material, que pode ser verificado
empiricamente (isto é, corresponde à realidade factual). A única relação entre
validade e verdade existe apenas nos raciocínios que, sendo corretamente
construídos do ponto de vista formal, têm na sua constituição premissas
verdadeiras, das quais extraímos necessariamente uma conclusão verdadeira. Por
exemplo:
Todos os diamantes são duros.
Alguns diamantes sãos joias.
Logo, Algumas joias são duras.
Deste modo, pode acontecer que o argumento seja válido (tendo a
estrutura correta), sendo no entanto falsas todas as proposições que o constituem.
Por exemplo:
Todos os políticos são músicos.
Cristiano Ronaldo é um político.
Logo, Cristiano Ronaldo é um músico.
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  • 1. Este site utiliza cookies para ajudar a disponibilizar os respetivos serviços, para personalizar anúncios e analisar o tráfego. As informações sobre a sua utilização deste site são partilhadas com a Google. Ao utilizar este site, concorda que o mesmo utilize cookies.Obter mais informaçõesEntendi Filosofia 11 Os textos que aqui se apresentam funcionam como complemento ao estudo da Filosofia.  Clássica  Flipcard  Revista  Mosaico  Barra lateral  Instantâneo  Timeslide 1. Nov 28 Alguns excercícios de escolha múltipla 1. Tens de reconhecer que a tese empirista é verdadeira, porque todo o conhecimento provém da experiência. Qual é a falácia informal em que incorre o orador que apresenta este argumento? A. Apelo à força, porque é obrigatório aceitar a conclusão. B. Petição de princípio, pois a premissa é uma explicitação da conclusão. C. Apelo à ignorância, porque a conclusão é mais informativa do que a premissa. D. Causa falsa, porque procura fundar a conclusão na observação de uma regularidade.
  • 2. 2. O melhor é votar na Marianapara delegada de turma. Ela passoucom duas negativas e, por isso, anda muito abatida, coitada. Acho que ser eleita delegada de turma pode ajudá-la a aumentar a autoestima. Qual é a falácia informal em que incorre o orador que apresenta este argumento? A. Apeloàignorância,porquevotaremalguémparadelegadodeturmaresulta de uma simples preferência pessoal. B. Apelo à misericórdia,pois a premissa «a Mariana anda muito abatida» exprime um juízo subjetivo. C. Apeloàignorância,poisapremissa«sereleitadelegadade turmaaumenta a autoestima» é hipotética. D. Apeloàmisericórdia,porque aconclusãoé fundadaemfactosque suscitam a simpatia pela Mariana. [não sai no teste] 3. Algumas estratégias de persuasão não são formas de manipulação. A afirmação anterior é… A. Verdadeira, porque não há persuasão sem manipulação. B. Falsa, porque não há manipulação sem persuasão. C. Verdadeira, porque há estratégias racionais de persuasão. D. Falsa, porque a persuasão visa o controlo emocional dos interlocutores. 4. Ou aceitas o racionalismoounegas as verdades da matemática.Ora, se não negas as verdades da matemática, resta-te aceitar o racionalismo. Qual é a falácia informal em que incorre o orador que apresenta este argumento? A. Falso dilema, porque o orador ignora as alternativas. B. Falso dilema, porque o orador apresenta alternativas falsas. C. Apelo à força, porque o orador ameaça o interlocutor. D. Apelo à força, porque o orador apela ao poder da matemática. 5. Nietzscheenlouqueceu.Portanto,pensoquenãodeveríamosestudarasideias dele nas aulas de Filosofia. O orador que apresenta este argumento incorre numa falácia informal, porque… A. Desvaloriza as ideias de Nietzsche com base em dados da sua vida. B. A premissaapresentadanãopode sercomprovada. C. A loucurade Nietzsche contribuiuparaa projeçãodasua filosofia. D. Não é verdade que Nietzsche tenhaenlouquecido.
  • 3. 6. Qual dos seguintes argumentos é um entimema? [não sai no teste] A. Lamego e Ovar são cidades portuguesas. Portanto, Lamego é uma cidade portuguesa. B. As cidades europeias são frias. Logo, a cidade da Guarda é fria. C. As cidades portuguesas são bonitas, pelo que Beja, que é uma cidade portuguesa, é bonita. D. O Funchal fica na ilha da Madeira, porque fica na ilha da Madeira. 7. Como se distingue a persuasão racional da manipulação? A. A manipulação nem sempre é eficaz, mas a persuasão racional é. B. A manipulaçãotememconsideraçãoascaracterísticas doauditório,masa persuasão racional não. C. A persuasão racional tem em vista a verdade, mas a manipulação não. D. A persuasãoracional tememconsideraçãoasemoçõesdaspessoas,masa manipulação não. 8. Um orador incorre numa petição de princípiose, ao argumentar… A. Propuser como premissa um princípio que o auditório pode rejeitar. B. Numa premissa admitir como provado aquilo que pretende provar. C. Em nenhuma premissa considerar provado aquilo que pretende provar. D. Propuser como premissa um princípio que o auditório não pode rejeitar. 9. Ou reconheces que todos temos um destino que explicao que nos sucede, ou defendes que a vida de cada pessoa é apenas fruto dos jogos do acaso. Ora, dado que é inconcebível que a nossavida seja obra do acaso,resta-te aceitar que existe um destino que nos comanda. Quem apresenta o argumento anterior incorre na falácia… A. Ad hominem.
  • 4. B. Apeloàforça. C. Causafalsa. D. Falsodilema. 10. Qual das seguintes opções é um argumento por analogia? A. Conservar a saúde é importante. Ora, o controlo do peso é indispensável para conservara saúde.Além disso, é falso que «a gordura é formosura». B. Um edifício, para não cair na ruína, tem de ser conservado pelos seus proprietários. O teu corpo é como um edifício. Por isso, se não o conservares, ele arruinar-se-á. C. Um edifício tem de ser conservado pelos seus proprietários. Como o teu corpo é um edifício, tu és o proprietário do teu corpo. D. Conservara saúde é importante.Comoocontrolodo pesoé indispensável para conservar a saúde, deves controlar o teu peso. 1. B 2. D 3. C 4. A 5. A 6. B 7. C 8. B 9. D 10. B Publicado 28th November 2015 por Rui Mendes Etiquetas: Ficha de trabalho
  • 5. 0 Adicione um comentário 2. Nov 28 Alguns exercícios de escolha múltipla 1. «Todos os seres humanos orgulhosos rejeitam aopinião dos outros, pois todas as pessoas orgulhosas que conheço rejeitaram sempre a minha opinião.» O raciocínio expresso é um (A) argumento indutivo por generalização. (B) argumento indutivo por previsão. (C) argumento por analogia. (D) argumento de apelo à autoridade. 2. A demonstração distingue-se da argumentação porque (A) a demonstração expressa-se sempre em linguagem natural e a argumentação em linguagem formal. (B) a lógica formal define os limites da argumentação informal. (C) a demonstração expressa-se em linguagem formal inequívoca, enquanto a argumentação usa uma linguagem natural equívoca. (D) a demonstração depende sempre da capacidade do orador e a argumentação depende do auditório. 3. «O discurso argumentativo está necessariamente ligado ao auditório.»
  • 6. Esta afirmação é: (A) verdadeira, porque cabe ao auditório determinar a validade dedutiva da argumentação. (B) verdadeira, porque argumentar pressupõe sempre a adesão do auditório às teses apresentadas. (C) falsa, porque o auditório nunca influencia o curso do discurso argumentativo. (D) falsa, porque o discurso argumentativo nunca depende do seu auditório. 4. Considere as afirmações que se seguem e selecione a alternativa correta. 1. Para os sofistas, a verdade é relativa, dado que o conhecimento se reduz à opinião. 2. Para Platão, a retórica é determinante para o ensino dos atenienses. 3. Para Aristóteles, o ethos liga-se à persuasão pelo raciocínio lógico. (A) 1 é verdadeira; 2 e 3 são falsas. (B) Todas são verdadeiras. (C) 1 e 2 são verdadeiras; 2 é falsa. (D) 1 é verdadeira; 2 e 3 são falsas. 5. Consideram-se falácias informais (A) os argumentos em que não se respeita a sua forma canónica. (B) os argumentos em linguagem natural que são aparentemente fortes, mas que contêm um ou mais erros de raciocínio. (C) os argumentos que não cumprem as regras de inferência válida. (D) os argumentos em linguagem natural que são aparentemente fortes, mas que infringem regras de validade silogística.
  • 7. 6. Considere as seguintes falácias. 1. É impossível falarsemusarpalavras,umavezque aspalavrassãonecessárias para falar. 2. Ninguém conseguiu provar que a reincarnação existe. Portanto, a reincarnação existe. 3. Quemnão aprova todas as nossas decisõesé contra nós.Como não aprovas todas as nossas decisões, és contra nós. 4. A filosofia de Sartre é irrelevante porque o autor é ateu. Deve afirmar-se que: (A) 1. é petição de princípio; 2. é apelo à ignorância; 3. é falso dilema; 4. é ad hominem. (B) 1. é petição de princípio; 2. é ad hominem; 3. é falso dilema; 4. é apelo à ignorância. (C) 1. é falso dilema; 2. é apelo à ignorância. 3. é ad hominem; 4. é petição de princípio. (D) 1. É petição de princípio; 2. é apelo à ignorância; 3. É ad hominem; 4. É falso dilema. 7. O uso manipulador da retórica caracteriza-se pelo facto de o orador (A) reconhecer as limitações da racionalidade do auditório. (B) ignorar as limitações da racionalidade do auditório. (C) tentar tirar partido das limitações da racionalidade do auditório. (D) tentar ultrapassar as limitações da racionalidade do auditório. 8. «A crença no livre-arbítrio é universal, porque todas as pessoas acreditam que escolhem realmente o que fazem». Este argumento incorre na falácia A. do boneco de palha.
  • 8. B. petição de princípio. C. falso dilema. D. apelo à ignorância. 9. Na Grécia Antiga a afirmação da retórica deveu-se (A) ao reconhecimento público de Platão e de Sócrates como bons oradores. (B) à afirmação da Filosofia ateniense feita pelos sofistas. (C) à necessidade de se constituir um conhecimentometódico e fundamentadona oratória. (D) à construçãoda democraciae à necessidade de afirmaçãopúblicadoscidadãos. 10. Considere asafirmaçõesquese seguemacercadaretóricae selecioneospensadores que as poderiam ter proferido. 1. A retórica é útil. É a habilidade de avaliar, em cada caso particular, os meios adequados para se persuadir pela palavra. 2. A retóricaé obemsupremoedáaquemapossuiodomíniosobre osoutrosna cidade. 3. A retórica não é uma arte, é uma forma de manipulação. (A) 1 Aristóteles; 2 Platão; 3 Sofistas. (B) 1 Platão; 2 Sofistas; 3 Platão. (C) 1 Sócrates; 2 Sofistas; 3 Platão. (D) 1 Aristóteles; 2 Sofistas; 3 Platão.
  • 9. 1. A 2. C 3. B 4. A 5. B 6. A 7. C 8. B 9. D 10. D Publicado 28th November 2015 por Rui Mendes Etiquetas: Ficha de trabalho 0 Adicione um comentário 3. Nov 23 Temas a estudar para a 2ª prova de avaliação escrita 1. Testar a validade de um silgismo. 1.1.) Construir silogismos válidos, tendo em conta a figura e o modo. 2. Relacionar ethos, pathos e logos enquanto géneros de prova da retórica. 3. Distinguir demonstração e argumentação. 4. Definir e identificar tipos de argumentos e de falácias informais. 5. Refletir acerca da retórica no contexto da democracia ateniense, confrontando a perspetiva dos sofistas e a de Platão. 5.1. Distinguir os dois usos da retórica. Publicado 23rd November 2015 por Rui Mendes Etiquetas: TPC 0
  • 10. Adicione um comentário 4. Nov 20 Unidade 2 – O conhecimento e a racionalidade científica e tecnológica 1. Descrição e interpretação da atividade cognoscitiva 1.1. Estrutura do ato de conhecer 1.1.1. Análise fenomenológica do conhecimento / Interação sujeito-objeto A fenomenologia é um método de descrição do ato de conhecerque não pretende explicar o conhecimento, pois isso é função da gnosiologia. Pelo contrário, ela é anterior a toda a explicação, servindo como meio de preparação a essa mesma explicação. A fenomenologia descreve-nos o que ocorre quando dizemos que conhecemos algo, nomeadamente a existência de três elementos indispensáveis ao conhecimento: - o sujeito; - o objeto; - a imagem ou representação. Sujeito e objeto encontram-se frente a frente. O sujeito cognoscente é a parte ativa desta relação e é a ele que cabe o movimento mental de sair da sua esfera, ir até à esfera do objeto e captar as suas qualidades, construindo uma imagemdo mesmo. Podemos, então,dizer que a relação do conhecimento dá-se em três tempos: o sujeito sai de si, o sujeito está fora de si e o sujeito regressa a si. É o sujeito que fica a ganharnesta relação, é ele que sofre uma alteração, que constrói uma imagem que anteriormente não tinha. O objeto é o elemento passivo desta relação, uma vez que não sofre qualquer tipo de alteração. Há ainda que referir que sujeito e objeto são transcendentes, pelo que a relação que se estabelece entre eles é uma correlação irreversível: o sujeito é sempre sujeito e o objeto é sempre objeto, não sendo,portanto,possívelalterarem as suas posições.Dito de outro modo: a função do sujeito é sempre conhecer o objeto e a função do objeto é sempre ser conhecido pelo sujeito O conhecimento não é um ato efetuado por um sujeito no estado puro que apreende um objeto no estado puro. Com efeito, o sujeito interage com a realidade e é desse processo que o conhecimento emerge. Representar o objeto é também, em certa medida, construir o objeto, isto é, o conhecimento é sempre uma integração de novos elementos no conjunto de significações e de referências que fazem parte do mundo do sujeito. 1.1.2. Definição de conhecimento a) Tipos de conhecimento O saber-fazer refere-se ao conhecimento prático, a uma atividade, à capacidade, aptidão ou competência para fazer alguma coisa. Por exemplo, saber pintar uma casa. O saber que refere-se ao conhecimento proposicional ou conhecimento de verdades. Por exemplo, saber que Portugal é um país europeu.
  • 11. O conhecimento por contacto refere-se ao conhecimento direto de alguma realidade, seja de pessoas ou lugares. Por exemplo, conhecer pessoalmente determinado indivíduo ou ter visitado determinado lugar. b) Definição tradicional No diálogo “Teeteto”, Platão pergunta pela Natureza do conhecimento. Segundo o seu ponto de vista, os sentidos não conseguematingir nem o ser, nem a verdade, nem o saber. Platão vai distinguir aquilo que entende por doxa (opinião ou crença), aletheia (verdade), logos (justificação) e episteme (conhecimento), considerando esta como uma crença verdadeira justificada. Assim, quem chega à crença verdadeira sobre algo, mas sem ser capaz de dar uma justificação sobre isso,não conhece; sóquem é capaz de dar uma explicação tem o saber. Dito de outro modo: todas as três condições referidas – crença, verdade e justificação – são necessárias para que haja conhecimento. Consideradas isoladamente, nenhuma delas é condição suficiente. Resumindo, a definição tradicional que temorigem em Platão é: S sabe que p se, e apenas se, (1) S acredita que p, (2) p é verdadeira; (3) S tem uma justificação para acreditar que p. Por exemplo: se uma pessoa sabe que Marte é um planeta, então tem a crença verdadeira justificada de que Marte é um planeta, e, se tem essa crença verdadeira justificada, então sabe tal coisa. c) Críticas à definição tradicional Edmund Gettier contestou a definição tradicional de conhecimento, apresentando contraexemplos que nos revelam a possibilidade de termos uma crença verdadeira justificada sem que tal crença equivalha a um efetivo conhecimento. Segundo Gettier, ainda que se verifiquem as três condições (crença, verdade e justificação), o sujeito pode não possuir o conhecimento. Os contraexemplos apresentados por este pensador colocamo chamado problema de Gettier. Consideremos um dos contraexemplos que ilustra esta possibilidade. Imaginemos que Pedro tem boas razões para acreditar que quem vai conseguir um certo emprego não é ele, mas Tomás, e que viu há pouco que Tomás tem dez moedas no bolso. Deste modo, Pedro tem uma crença justificada na seguinte proposição: A. Tomás vai conseguir o emprego e Tomás tem dez moedas no bolso. Tomando A como premissa, Pedro deduz a seguinte conclusão: B. O homem que vai conseguir o emprego tem dez moedas no bolso. Dado que Pedro acredita justificadamente em A e infere corretamente B a partir de A, podemos dizer que tem também uma crença justificada em B. Mas imaginemos agora que Tomás acabará por não conseguir o emprego e que, na verdade, é o próprio Pedro que ficará com ele – isto significa que a proposição A é falsa. E suponhamos também que Pedro, ainda que não o saiba, também tem dez moedas no bolso. Concentremo-nos na proposição B. Pedro acredita justificadamente nesta proposição – e, afinal, B é uma proposição verdadeira. Portanto, Pedro tem uma crença verdadeira justificada em B. Mas, apesar de as três condições da análise platónica serem satisfeitas neste caso, a verdade é que Pedro não sabe que o homem que vai conseguiro emprego tem dez moedas no bolso. Afinal, aquilo que torna B verdadeira são os factos de ele (e não Tomás) vir a conseguiro emprego e de ele (e não Tomás) ter dez moedas no bolso,e Pedro ignora completamente estes factos.Épor mero acaso que Pedro acaba por ter uma crença verdadeira justificada em B. Acrescente-se um contraexemplo mais simples do que o referido anteriormente. Imaginemos que Joana tem fortes razões para acreditar que um certo relógio público é altamente fiável. Certo dia, ela passa pelo relógio e vê que este indica que são oito horas da manhã. Joana forma então a crença de que são oito horas da manhã, e esta crença está justificada pelos dados que revelam a fiabilidade do relógio. Contudo, sem que Joana o saiba, o relógio está parado há algum tempo, mas, curiosamente, parou quando eram oito horas. Nestas circunstâncias, Joana acredita justificadamente que são oito horas da manhã e a sua crença é verdadeira, só que ela não sabe que são oito horas da manhã. Afinal, teve apenas a sorte de passar pelo relógio num momento em que este indicava a hora correta. 1.1.3. Conhecimento a priori e a posteriori
  • 12. Os conhecimentos podem ser a priori ou a posteriori. A distinção entre conhecimento a priori e a posteriori encontra-se implícita em muitos filósofos (Platão, Aristóteles, Descartes, John Locke), mas foi em Kant que se tornou mais clara. O conhecimento a priori é defendido pelos filósofos racionalistas que consideram que só a razão é fonte de conhecimento e o garante universal do mesmo. Sendo assim, de acordo com os racionalistas todo o conhecimento terá de seranterior e independente à experiência. Do mesmo modo, um argumento é a priori se, e só se, todas as suas premissas são a priori. O conhecimento a posteriori é defendido pelos filósofos empiristas que consideram que só a experiência é fonte de conhecimento e o garante da objetividade do mesmo. Sendo assim, de acordo com os empiristas todo o conhecimento terá de derivar necessariamente da experiência. Do mesmo modo, um argumento é a posteriori se, e só se, pelo menos uma das premissas é a posteriori. Em síntese: O conhecimento a priori é o conhecimento que, baseado em juízos a priori (isto é, que antecedem qualquer tipo de experiência), tem a sua fonte ou origem apenas na razão (por exemplo, 2 + 2 = 4), não sendo necessário recorrer à experiência para o saber. O conhecimento a posteriori é o conhecimento que, baseado em juízos a posteriori (isto é, que derivam da experiência), tem a sua origem na experiência. Trata-se do conhecimento empírico (por exemplo, o fogo queima). 1.2. Análise comparativa de duas teorias explicativas do conhecimento: racionalismo e empirismo 1.2.1. Origem e possibilidade do conhecimento Estas teorias colocam a questão sobre a proveniência do conhecimento: de onde é que provém? Da razão ou da experiência? O racionalismo e o empirismo dão respostas diferentes a estas questões. O racionalismo é a teoria que defende que o nosso conhecimento deriva da razão, sendo, portanto, esta capaz de conhecer verdadeiramente todas as coisas. Além disso, os filósofos racionalistas (como Descartes) defendem a existência de ideias inatas. Segundo estes pensadores, o conhecimento verdadeiro é totalmente independente da experiência sensível, logicamente necessário, porque tem de ser assim, caso contrário entraríamos em contradição, e universalmente válido, porque vale sempre, em todo o lado e para todos os seres humanos. O modelo do conhecimento verdadeiro, de acordo com o racionalismo, é-nos dado pela matemática. O empirismo é a teoria que defende que o nosso conhecimento deriva da experiência, estando, por isso, limitado à experiência possível. Além disso, os filósofos empiristas (como David Hume) defendem que a mente humana é uma página em branco onde vão ser inscritas todas as nossas experiências e conhecimentos.
  • 13. 1.2.2. René Descartes: o racionalismo cartesiano O projeto cartesiano Descartes, filósofo francês do século XVII, defendeu que a razão é a principal fonte do conhecimento. Foi considerado, por muitos, um dos impulsionadores da ciência moderna e desenvolveu uma das mais conhecidasrespostas ao ceticismo radical.Na defesa da possibilidade do conhecimento humano, propôs-se desenvolver e implementar um método que pudesse conduzir-nos ao conhecimento seguro. Descartes viveu numa época marcada por grandes transformações sociais, políticas e ideológicas. Foram descobertos novos continentes, povos e culturas. Investigações pioneiras no campo da Física (nomeadamente, as de Galileu) revolucionaram o entendimento do universo e do lugar do Homem no mesmo. Num período relativamente curto, as velhas certezas tradicionais foram postas em causa e assistiu-se a um profundo abalo das convicções amplamente enraizadas. Instalou-se, assim , um clima de ceticismo generalizado no que dizrespeito à nossa capacidadede alcançar qualquer espéciede conhecimento sólido e duradouro. Apesar disso,Descartes não estava disposto a deixar-sevencer por esta ameaça sem tentar, pelo menos uma vez na vida,escapar à conclusão aparentemente inevitável deque nada sepode saber. Com este objetivo em mente, Descartes decide levar o ceticismo ao extremo e vencê-lo no seu próprio jogo,ou seja,decide recorrer à própria dúvida cética como método para provar a impossibilidade do ceticismo. Se seguisse os caminhos mais extremos da dúvida, talvez pudesse encontrar algo de absolutamente indubitável, ou seja,uma crença básica quefossede tal modo autoevidente que nem a mais extrema dúvida a pusesse em causa. Uma crença com estas característicasconstituiria uma basesólida sobrea qual poderia edificar com segurança o conhecimento. Em suma, o objetivo de Descartes era estabelecer um conhecimento seguro e indubitável, ou seja, encontrar pelo menos uma crença básica que pudesse servir de fundamento para o conhecimento. O seu método era a dúvida:duvidar de tudo o que sepossa imaginar eaveriguar o que resista a esseprocesso.Por razões óbvias,este procedimento ficou conhecido por dúvida metódica. Dúvida cartesiana vs. dúvida cética Embora Descartes recorra à dúvida cética,a dúvida cartesiananão seidentifica inteiramente com a dúvida cética original.Descartes subverte-a,instrumentalizando-a,isto é,servindo-sedela como método para alcançar o conhecimento e provar a insustentabilidadedo próprio ceticismo. Assim,contrariamente ao que acontecia com a dúvida cética original,a dúvida cartesiana não é um ponto de chegada – o que seria o desfecho inevitável de um rigoroso processo de reflexão - , mas sim um ponto de partida – o que constitui um meio para alcançar a verdade. Para Descartes,trata-se,portanto,de uma decisão deconsiderar provisoriamente falso tudo o que seja minimamente duvidoso.Isto significaque,à partida,a dúvida cartesiananão conhece limites e não há nada de que não seja legítimo duvidar. Neste sentido, ela é absolutamente universal; por princípio, pode aplicar-se a tudo, pelo menos até que se encontre algo que seja absolutamente indubitável. Com esse objetivo em mente, Descartes leva a dúvida ao seu extremo, de tal modo que não se limita a suspender o juízo, mas rejeita como falso tudo aquilo que seja meramente duvidoso, razão pela qual também se apelida a dúvida cartesiana de hiperbólica.
  • 14. Podemos, por isso, enumerar algumas características da dúvida cartesiana: Metódica – a dúvida constitui-se num método para encontrar um conhecimento seguro; Provisória – subsiste apenas até que se encontre algo absolutamente certo e indubitável; Universal – pode aplicar-se a todas as nossas crenças; Hiperbólica – não se limita a pôr tudo em dúvida, mas rejeita como falso o meramente duvidoso. Razões para duvidar (ilusões dos sentidos, indistinção vigília-sono, errosde raciocínio, hipótese dos Deus Enganador e a Hipótese do Génio Maligno) Como vimos, inicialmente Descartes vai recorrer a uma argumentação cética para pôr em causa tudo aquilo quejulgamos saber,deitar abaixo todas asnossasconvicções everificar se existe alguma que resista a tamanha devastação.Esses argumentos são geralmente conhecidos por “razões para duvidar”,pois a sua conclusão éjustamente a de que não podemos confiar em crenças que tenham uma determinada origem. As ilusões dos sentidos O primeiro argumento de Descartes baseia-se nas ilusões dos sentidos, que nos enganam em diversas ocasiões. Por exemplo, quando vemos uma cana mergulhada na água parece que está partida; muitas vezes, objetos longínquos parecem redondos, quando na realidade são quadrados; por vezes, parece que nos estão a chamar e afinal é só o vento a passar; pode parecer-nos que cheira a batatas fritas quando alguém está a fritar rissóis; olhamos para o céu ao longo do dia e parece-nos que o Sol se move em torno da Terra, etc. Aplicando o princípio hiperbólico da dúvida, segundo o qual devemos rejeitar como falso tudo aquilo que seja minimamente duvidoso, Descartes conclui que não temos justificação para acreditar em nada que tenha origem nos sentidos. O argumento pode ser reformulado do seguinte modo: (1) Os nossos sentidos enganam-nos algumas vezes. (2) Se os nossos sentidos nos enganam, então não podemos saber se nos estão a enganar neste momento ou não. (3) Se não podemos saber seos nossos sentidosnos estão a enganar,então não podemos confiar nas informações adquiridas através deles. (4) Logo, não podemos confiar nas informações adquiridas através dos sentidos.
  • 15. A indistinção vigília-sono Descartes reforça o argumento das ilusões dos sentidos com uma razão adicional para duvidarmos de tudo aquilo que tenha origem na experiência sensível. Segundo o argumento da indistinção vigília-sono, uma vez que a vivacidade e a intensidade de certos sonhos nos convencem muitas vezes de que estamos a ter experiências reais,quando na realidadeestamos a sonhar, não temos forma de distinguir as nossas experiências de vigília daquelas que temos quando sonhamos;consequentemente, as crenças queformamos a partir daexperiênciasensível ou são falsas (porqueestamos apenas a sonhar) ou,aindaquesejamverdadeiras,são-no apenas por acaso (porque não podemos saber se estamos apenas a sonhar ou não) e, portanto, não podem constituir conhecimento. Erros de raciocínio O argumento dos erros de raciocínio baseia-se na ideia de que, uma vez que todos podemos cometer erros nos raciocíniosmaissimples,não podemos justificadamenteacreditar em crenças que tenham origem no nosso raciocínio. A Hipótese do Génio Maligno Para abalar a nossa confiança nas proposições mais triviais e elementares da geometria e da aritmética,adúvida cartesiana vai extremar-se ainda mais,levando Descartes a territóriosonde, aparentemente, nada se pode saber com certeza. Descartes começa por fazer notar que desde muito novo lhe foi incutida a crença de que fomos criados por um ser superior, sumamente inteligente e de poderes ilimitados. Ora, um ser com estas características poderia introduzir nas nossas mentes as ideias que bem entendesse, fazendo-nos tomar por evidências os maiores absurdos que possamos imaginar. Poderia, por exemplo, fazer-nos acreditar que um quadrado tem quatro lados quando na realidade teria apenas três. Como podemos saber que isso não está, de facto, a acontecer? Descartes apercebe-se de imediato que esta suposição, conhecida como Hipótese do Deus Enganador, enfrenta sérias dificuldades,pois a ideia deum Deus Enganador é uma contradição nos termos. Sendo Deus um ser perfeito por definição, não pode possuir qualquer espécie de defeito, como, por exemplo, ser enganador. Por este motivo, Descartes vê-se forçado a abandonar a Hipótese do deus Enganador e a recorrer a uma espécie de Plano B: a Hipótese do Génio Maligno. Concebe uma experiência mental que consiste na suposição de que existe um ser tão poderoso quanto perverso, que designa por Génio Maligno para evitar os problemas associadosà ideiadeumDeus Enganador,que sediverte a usar os seus poderes para nos induzir em erro relativamente a tudo. Uma vez que não se espera que este ser exiba a perfeição moral característica de um ser perfeito, não corremos o risco de cair em contradição. O argumento do Génio Maligno diz-nos o seguinte: uma vez que não podemos saber seo Génio Maligno existeou não,a maioria das nossascrençassão falsas,ou,ainda quesejamverdadeiras, são-no apenas por acaso (pois não temos nenhuma justificação para acreditar que não se trata
  • 16. de mais uma das suas maquinações). Logo, não temos qualquer espécie de conhecimento (pois só temos conhecimentos se tivermos crenças verdadeiras justificadas). Enquanto a Hipótese do Génio Maligno não for afastada, não podemos, aparentemente, estar certos de nada. O Génio Maligno pode fazer-nos acreditar que estamos a ter determinadas experiências, pode introduzir-nos falsas memórias e pode virar o nosso intelecto do avesso, de forma que até as mais elementares demonstrações matemáticas não passem de ilusões que este introduz nas nossas mentes. Se acreditar que tudo o que penso conhecer não é senão um sonho ou ficção (ou realidade virtual) produzida por um génio maligno,restará alguma coisasegura quenemo sonho nem esse ser possam transformar em falso? O que é que resiste a esta dúvida? Será este argumento inabalável? O papel do Cogito no racionalismo cartesiano: - O triunfo sobre o ceticismo O próprio Descartes mostra que o argumento do Génio Maligno não é tão inabalável quanto à primeira vista possa parecer. Pelo contrário, em vez de conduzir à conclusão de que nada se sabe, a Hipótese do Génio Maligno conduz à conclusão de que existe algo que podemos, garantidamente, saber. Pode ser que não exista nenhuma das coisas que os meus sentidos me mos tram, pode ser que o meu corpo não exista;porém, mesmo que toda a minha experiência econhecimento sejam resultado da ação de um génio maligno que me engana, o próprio facto de estar a ser enganado demonstra que existo, pois se não existissenão poderia ser enganado. Se duvido, se sonho, se estou a ser enganado, devo existir para poder duvidar, sonhar e ser enganado. É esta a célebre conclusão de Descartes: “Penso, logo existo”. Mesmo que o Génio Maligno exista e se esforce tanto quanto pode para me enganar, nunca me poderá convencer de que não existo, pois, para que me possa convencer seja do que for, eu tenho necessariamente de existir. Existe, portanto, algo que posso saber com toda a certeza: que existo. Esta crença é geralmente abreviada pela expressão cogito, pois muitos dos leitores da obra de Descartes contactaram com a sua formulação em latim: Cogito, ergo sum. A sua verdade não pode consistentemente ser posta em causa, pois para sepoder duvidar do que quer que seja é preciso existir.Quem quer que se questione acerca da veracidadedo cogito tem automaticamente justificação paraacreditar nele. Assim, Descartes refuta o ceticismo por redução ao absurdo. Assumindo como premissa a ideia de que nada se pode saber, somos conduzidos a uma contradição, pois para podermos duvidar da possibilidadedo conhecimento somos forçados a admitir queexistealgo quesabemos com toda a certeza: sabemos que existimos,caso contrário não poderíamos duvidar fossedo que fosse. A importância do cogito no racionalismo cartesiano éinquestionável. O cogito é uma crença básica, que não precisa de ser justificada com base noutras crenças e, por conseguinte, pode estabelecer-se como primeira evidência, fornecendo os alicerces seguros que Descartes procurava para edificar o conhecimento. Deste modo, podemos considerar que o cogito representa o tão desejado triunfo sobre o ceticismo. Por mais extremas que as nossas dúvidas
  • 17. possamser, existirá semprepelo menos uma coisa que podemos saber com toda a certeza: que existimos. Mas será esta crença suficientepara fundar todo o nosso conhecimento do mundo? Será que saber que existimos é suficiente para saber que temos um corpo e restaurar a nossa confiança nas nossas experiências sensíveis? Não, na verdade o cogito não é, por si só, capaz de estabelecer a verdade de nenhuma destas coisas,pois enquanto não afastarmos definitivamente o fantasma do Génio Maligno não temos a certeza de que não estamos a ser enganados por ele, acreditando erradamente que temos um corpo, mãos, olhos, nariz, etc. - Uma coisa pensante (res cogitans) Só há uma coisa dequepodemos estar certos,ainda queo Génio nos engane: temos de existir de algum modo para que este nos possa enganar. Mas isso não implica que tenhamos necessariamente um corpo. A única coisa que sabemos, com toda a certeza, é que existimos enquanto coisa que pensa, ou res cogitans (coisa/substância pensante em latim), mas nada sabemos acerca do mundo físico, do mundo da matéria, do mundo das coisas extensas (que ocupamum espaço),ou seja,nada sabemos acerca da resextensa (coisa/substânciaextensa,em latim). Isto significa que o cogito estabelece apenas a existência de uma substância pensante, mas não oferece qualquer garantia da existência da realidade sensível. Como tal, o cogito não é suficiente para nos assegurar que temosum corpo, nem que as nossas experiências percetivas são fiáveis. Ao tomar consciência de que pode imaginar que não tem um corpo, sem que isso implique que não existe, mas não pode duvidar da sua existência enquanto pensamento, Descartes conclui que é essencialmente uma substância pensante, isto é, uma mente ou alma imaterial que existe independentemente do corpo e que é de natureza inteiramente distinta do mesmo. Podemos formular as diferentes etapas deste argumento do seguinte modo: (1) Posso conceber que existo sem ter um corpo. (2) Não posso conceber que existo sem ter uma mente/alma. (3) Se posso conceber que existo sem ter um corpo, mas não posso conceber que existo sem ter uma mente/alma, então a mente/alma não é igual ao corpo. (4) Logo, a mente/alma não é igual ao corpo. Uma vez que estabelece a distinção entreduas esferas da realidadedenatureza inteiramente diferente – o corpo e a mente -, esta posição ficou conhecida por Dualismo Cartesiano ou Dualismo mente-corpo. Depois de estabelecer esta distinção,Descartes apercebe-se que a sua essência, ou natureza, se identifica com a mente e não com o corpo.
  • 18. Mas se a única coisa que Descartes conseguiu demonstrar, até ao momento, foi a sua existência enquanto coisa pensante,poderá elealguma vez estar certo de que sabealguma coisa para além disso? Descartes acreditava que sim. Verás em seguida porquê. - Um critério de verdade Descartes considerava que, uma vez que o que torna o cogito uma crença tão evidente não é mais do que o seu elevado grau de clareza e distinção, estas características deveriam ser adotadas como critério de verdade, ou seja, como procedimento que nos permite distinguir o que é absolutamente verdadeiro do que é meramente duvidoso ou falso.Assim,o cogito não só fornece um fundamento seguro para o conhecimento mas também um modelo daquilo que devemos perseguir na procura de um saber seguro e indubitável. Deste modo, para saber se uma determinada proposição é verdadeira (por exemplo: Posso estar certo do cogito), bastará queDescartes a conceba claraedistintamente. Mas será que,para além do cogito, existe alguma proposição com estas características? A ideia de Deus À primeira vista, Descartes parece ser incapaz de dar um passo além do cogito. É como se estivessesozinho no seu sólido rochedo,mas rodeado por um tumultuoso mar de dúvidas,para além do qual não pode passar. Contudo, munido do seu recém-adquirido critério de verdade, Descartes decide vasculhara sua mente em busca deoutras ideias que,à semelhança do cogito, se possam conceber clara e distintamente. Ao inventariar as suas ideias apercebe-se de que tem a ideia de Deus. Pensa então: “Se eu conseguir provar que Deus existe e não é enganador, talvez possa estar certo de muitas outras coisas para além de saber que existo enquanto coisa pensante, pois um criador supremo e sumamente bom não me teria feito de modo a que nunca pudesse conhecer a verdade acerca de coisa alguma.” O Argumento da Marca Ao tomar consciência de que possui a ideia de Deus, ou seja, de um Ser Perfeito, Descartes vê-se forçado a reconhecer que ele próprio não é perfeito, pois,na sua opinião, saber é claramente melhor do que duvidar e ele está certo de que é um ser que duvida.No entanto, apesar de não ser perfeito, ele tem a ideia de Ser Perfeito. Ora, Descartes subscreveo Princípio da Causalidade,segundo o qual: Tudo o que existe tem uma causa. Mas qual poderá ser a causa dessa ideia? Poderia ser ele próprio o seu autor? Descartes vai tentar demonstrar que não pode ser ele o autor dessa ideia, pois na sua opinião uma causa deve ter pelo menos tanta realidade quanto os seus efeitos. Isto significa que, tal como o nada não pode dar origem seja ao que for, também o menos perfeito não pode
  • 19. dar origem a algo que seja mais perfeito.Ou seja,assimcomo algo quenão existenão pode dar origem a coisa nenhuma,também algo que é incompleto não pode dar origem a algo que é mais completo. Assim,e uma vez que não é perfeito, Descartes conclui quenão pode ser ele a origem da ideia deperfeição.Esta ideia deveter origem em algo queseja pelo menos tão perfeito quanto ela, ou seja, em Deus. Deste modo, Descartes acredita ter conseguido provar que, para além do cogito, pode estar certo da existência de Deus. Este argumento ficou conhecido como Argumento da Marca porque é como se, ao criar-nos,Deus tivesseintroduzido nas nossasmentes a ideia deperfeição, para que esta funcionasse como uma espécie de marca, ou assinatura, do autor. Em suma, a ideia de um Ser Perfeito:  não pode ter vindo dos sentidos, por não ser visível um tal ser;  não pode ter origem em nós mesmos, por sermos imperfeitos;  tem de ser uma ideia inata (ou a priori) que foi posta em nós por esse tal Ser Perfeito, «tal como o artista imprimiu uma marca na sua obra»;  implica a sua existência por não ser possível ter uma ideia de um ser com tão grande perfeição e tal ser não existir.UmSer Perfeito não seria perfeito senão existisse; logo,Deus existe e é perfeito. Explicitamente formulado, este argumento diz-nos o seguinte: (1) Eu tenho a ideia de Ser Perfeito. (2) Se eu tenho a ideia de Ser Perfeito, então existe um Ser Perfeito que é a origem desta ideia. (3) Existe um Ser Perfeito que é a origem da minha ideia de perfeição. (4) Ou eu sou o Ser Perfeito ou existe um algo para além de mim que é perfeito e que é a verdadeira origem da minha ideia de perfeição. (5) Se duvido, não sou perfeito. (6) Duvido. (7) Não sou perfeito. (8) Logo, existealgo para alémdemim que é perfeito e que é a verdadeira origemda minha ideia de perfeição.
  • 20. O papel de Deus no racionalismo cartesiano Deus desempenha um papel fundamental no racionalismo cartesiano,porque, uma vez que Deus existe e não é enganador (pois enganar seria uma imperfeição), não iria criar-nos de modo a que fôssemos incapazes de conhecer seja o que for. Pelo contrário, Deus deu-nos as ferramentas necessárias para descobrirmos a verdade e para nos orientarmos no mundo. Mas se Deus nos concebeu tais ferramentas, por que razão estamos sujeitos à dúvida e ao erro? A resposta de Descartes é muito simples: Deus é perfeito e, como tal, é sumamente bom, por isso decidiu criar-nos com livre-arbítrio. No entanto, muito embora uma vontade livre seja, de facto, uma dádiva de valor inigualável, ela traz consigo um pequeno inconveniente: a possibilidade de fazer escolhas acarreta a possibilidade de fazer más escolhas. Assim,Descartes conclui queo erro não vem de Deus, que é perfeito, mas sim de nós, que, não sendo perfeitos, fazemos por vezes um mau uso da nossa liberdade, dando assentimento a coisas que não concebemos muito clara e distintamente. Portanto, uma vez provado que Deus existe e não é enganador, não temos razões para acreditar que nos possamos enganar quando concebemos algo com clareza e distinçã o.Aliás,o próprio Descartes reconhece que é justamente por esse motivo que podemos confiar naquilo que concebemos com clareza e distinção. Mas, será que podemos conceber com clareza e distinção a existência do mundo? Existência do mundo A resposta de Descartes à pergunta formulada anteriormente é: o mundo existe, pois um Deus perfeito (ao contrário de um génio maligno) não nos enganaria quando avaliamos a realidade material a partir de relações matemáticas quantificáveis. Assim, Deus torna-se a garantia de que aquilo que conhecemos com a razão corresponde a algo realmente existente. O que é conhecer com a razão? É conhecer as relações matemáticas, aquilo que pode ser medido, o comprimento, a largura ea profundidade.Estas são as propriedades quantitativas ou qualidades primárias dos corpos, apreendidas pela razão de forma tão clara e nítida como a apreensão da ideia de «cogito» ou «eu pensante». Pelo contrário,as propriedades qualitativas ou propriedades secundárias,como cor,cheiro,sabor estão relacionadascomos nossossentidos e, por essa razão, não descrevem objetivamente a realidade exterior, devendo, portanto, ser rejeitadas do domínio do conhecimento verdadeiro. De onde vem, então, o conhecimento? Serão os sentidos a fonte do nosso conhecimento do Mundo? Descartes,como vimos, não aceita a validade do conhecimento sensorial. Ele parte do princípio de que:  se os sentidos nos enganam algumas vezes, poderão enganar-nos sempre;  os sentidos apenas captamcaracterísticassubjetivas - propriedadesqualitativas das coisas, isto é, características que dependem do efeito produzido por elas nos nossos sentidos. Por estas razões, Descartes rejeita o conhecimento sensorial como fundamento do conhecimento verdadeiro. O verdadeiro conhecimento tem de proceder da razão.
  • 21. A Matemática era a disciplina que Descartes mais admirava e considerava que só o procedimento matemático poderia conferir certeza ao conhecimento. Em síntese: Descartes começou por duvidar da validadede todo o conhecimento, experimentando a sua veracidadeatravés da dúvida:só aceitaria como verdadeiro aqueleconhecimento que resistisse à dúvida mais radical. Onde o levou este procedimento de dúvida metódica? Ao reconhecimento do «eu pensante» como sendo uma verdade indubitável, conhecida clara e distintamente por intuição. Foi, portanto, «o cogito» (“penso, logo existo”) que foi tomado:  como primeira ideia indubitável e, por isso, a primeira verdade;  como ponto de partida de toda a sua Filosofia, a partir do qual seriam deduzidas outras verdades cada vez menos gerais;  como modelo do critério de verdade a seguir, para distinguir o verdadeiro do falso. Quais são as implicações destepercurso e destas descobertas de Descartes? Colocam-no na trilha dos filósofos racionalistas, porque:  busca um conhecimento absoluto, isto é, válido universalmentee logicamentenecessário;  adota como modelo o conhecimento racional/matemático e o respetivo método que aplica a todo o tipo de conhecimento;  duvida da validade do conhecimento empírico, isto é, do conhecimento elaborado com base em informações sensoriais;  pressupõe a existência de ideias inatas, que fazem parte do património da nossa razão,e que, por isso, são comuns a todos os homens. OBJEÇÕES AO RACIONALISMO CARTESIANO a) Eu penso, ou há pensamento em curso Se prestarmos a devida atenção ao cogito, apercebemo-nos de que a sua certeza é apenas momentânea – “Estou, neste momento, a pensar,logo existo”; separar depensar,posso
  • 22. muito bem deixar de existir. Mas, nesse caso, o cogito dificilmente será verdadeiro, isto é, dificilmente a consciência de que existe pensamento seria suficiente para provar a existência de um único eu – ou seja,um ser que se reconhece como sendo o mesmo ao longo do tempo – que reclame o pensamento atualmente em curso como seu. Esta objeção foi primeiramente formulada pelo filósofo alemão Georg C. Lichtenberg (tendo sido posteriormente reforçada por filósofos como Bertrand Russell e A. J. Ayer). Lichtenberg considera que Descartes nem sequer deveria dizer “Eu penso”, deveria dizer simplesmente “há pensamento”, como quem diz“troveja”. Segundo este autor, tudo o que Descartes conseguiu mostrar foi que existe pensamento, mas não a existência de um qualquer Eu a quem esse pensamento tenha necessariamente de pertencer. b) Objeções ao Argumento da Marca O Argumento da Marca enfrenta vários problemas. Em primeiro lugar, o argumento pressupõe, na primeira premissa,quetemos a ideia deDeus, ou Ser Perfeito, mas esta ideia está longe de ser consensual. Algumas tradições teológicas, como o fideísmo, afirmam que a perfeição de Deus desafia a nossa compreensão, pois somos seres finitos e limitados,pelo que nem sequer podemos considerar que temos a ideia de Deus, ou Ser Perfeito. Em segundo lugar, Descartes pressupõe que duvidar é menos perfeito do que saber, para concluir que, uma vez que duvida, não pode, ele mesmo, ser o Ser Perfeito. Mas por que razão não podemos considerar que duvidar é mais perfeito do que possuir a totalidade do conhecimento? Um saber completo e perfeitamente delimitado pode ser encarado por muitos como demasiado monótono e estático,incompatível comuma ideia dinâmica deperfeição,envolvendo necessariamente algum esforço para o progresso. Em terceiro lugar, o argumento também se apoia no princípio da causalidadeena ideia de que uma causa deve ter pelo menos tanta realidade e, consequentemente, ser tão perfeita quanto os seus efeitos. No entanto, no momento em que formula este argumento, Descartes não tem maneira de saber se estas ideias são verdadeiras. c) O Círculo Cartesiano O Círculo Cartesiano é, talvez, a mais poderosa objeção que o racionalismo cartesiano enfrenta. Esta objeção consistena acusação dequeDescartes incorrenuma petição de princípio, pois recorreàs suascapacidades racionaisparaestabelecer a existênciadeDeus e recorrea Deus para justificar a confiança nas suas capacidades racionais; contudo, este movimento é claramente circular. d) Objeções ao dualismo cartesiano (mente-corpo) Como vimos,Descartes justificao dualismo mente-corpo com baseno facto de ser capaz de conceber que exista sem um corpo, mas não sem uma mente. No entanto, esta estratégia argumentativa não permite demonstrar a separação mente-corpo, pois confunde estados mentais acerca das coisas compropriedades reais eefetivas das mesmas. Assim, do facto de eu
  • 23. não conceber que existo sem uma mente, não se segue que a mente é, de facto, diferente do corpo. 1.2.3. David Hume: o empirismo cético Ao contrário do racionalismo cartesiano, que encarava a experiência sensível com enorme suspeita, a teoria filosófica proposta por David Hume atribui o estatuto de crenças básicas justamente às crenças que provêm da nossa experiência sensível imediata, como por exemplo a crença “Estou, neste momento, a ter uma experiência da cor azul”. Assim, em vez de recorrer a uma intuição de caráter puramente racional como o cogito, Hume coloca na experiência sensível o maior grau de evidência a que podemos aspirar quando procuramos saber como as coisas são.Por essemotivo, a teoria de David Hume ficou conhecida por empirismo. Hume é um filósofo empirista que não aceita a existência de ideias inatas. Defende antes que o conhecimento possível só pode derivar, direta ou indiretamente, da experiência, opondo-se à possibilidade de demonstrar a existência de Deus racionalmente. O Princípio da Cópia David Hume era um empirista. A maioria dos empiristas tinha a crença de que, quando nascemos, a nossa mente é como uma tábua rasa, uma folha em branco, que posteriormente seria preenchida pela experiência. Isto significa que,para estes autores, o conteúdo das nossas mentes tem a sua origem na experiência.São os cinco sentidos quefornecem informação sobre o mundo, registando nas nossas mentes as impressões colhidas do exterior. Hume escolheu o termo “perceções” para designar o conteúdo das nossas mentes – ou seja, tudo aquilo quefazemos quando observamos,sentimos,recordamos,imaginamos,etc.Segundo Hume, as nossas perceções podem ser de dois tipos: impressões e ideias. - As nossas impressões correspondem aos dados da nossa experiência imediata, isto é, às experiências que temos no momento em que observamos, sentimos, amamos, odiamos, desejamos, e assim por diante. Por essa razão, as impressões são fortes, vivas e intensas. - As ideias são uma imagem mental formada a partir das impressões. Por i sso, são cópias enfraquecidas das impressões que surgem quando recorremos à memória ou à imaginação para representarmos mentalmente impressões que tivemos anteriormente, e, portanto, são menos intensas e menos vívidas do que as impressões. Hume reforça esta diferença através do contraste entre sentir e pensar. Sem dúvida,sentir uma dor é muito diferente de recordar uma dor sentida anteriormente. A primeira experiência é forçosamente mais vívida emais intensa do quea segunda.E seem algummomento a segunda se assemelhar à primeira no que diz respeito à sua vivacidade e intensidade, então é porque deixamos de estar meramente a recordar uma dor e passamos a senti -la. Deste modo, Hume reformula o velho princípio aristotélico segundo o qual “Nada está no intelecto sem que tenha passado pelos sentidos”. Este é o princípio da cópia: todas as ideias
  • 24. humanas são cópias de impressões.Hume justifica a sua aceitação deste princípio com basena ideia de que um cego de nascença seria incapazde imaginar a cor azul, j ustamente porque não possui qualquer impressão que corresponda a essa cor. O argumento de Hume pode ser formulado do seguinte modo: (1) Um cego de nascença não tem qualquer impressão de cores. (2) Se um cego de nascença não tem qualquer impressão de cores, então ou um cego de nascença não pode imaginar a cor azul, ou existem ideias que não correspondem a qualquer impressão. (3) Um cego de nascença não pode imaginar a cor azul. (4) Logo, não existem ideias que não correspondam a qualquer impressão. Será que Hume tem razão? Não haverá ideias quenão correspondema nenhuma impressão? Afinas de contas, seesse for o caso, como poderíamos ter as ideias de centauro, sereia, cavalo alado, etc.? De acordo comHume, há ideias simples e há ideias complexas. As primeiras são aquelasque correspondem a impressões simples,ou seja,impressões decoisasquenão podem ser divididas em partes mais pequenas, como a cor ou a forma dos objetos; as segundas são aquelas que correspondem a combinações de duas ou mais ideias simples, como, por exemplo, a ideia de sereia. Assim,através da imaginação, podemos combinar a forma de um peixe com a formade uma mulher para criar a ideia de sereia, pois, apesar de nunca termos visto uma sereia, temos as impressões correspondentes à forma do peixe e à forma da mulher. Vejamos outros exemplos: - Temos a ideia de cavalo alado, um cavalo comasas.Esta ideia resulta da combinação da ideia de cavalo coma ideia de animal comasas.Há impressões correspondentes às ideias decavalo e de animal com asas, mas não há nenhuma impressão correspondente à ideia de cavalo alado. Que conclusão temos de retirar deste facto? Que esta ideia resultou do traba lho combinatório da mente e é falsa por não existir nenhuma experiência sensorial desse animal. - Temos a ideia de Deus. Haverá alguma impressão/sensação correspondente? Se não há, então a ideia de Deus é uma criação da razão, a partir de ideias como «inteligência», «sabedoria», «bondade», «perfeição», etc. Se nunca tivéssemos tido experiências da inteligência, da sabedoria e da bondade, não poderíamos moldar estas ideias,nem a ideia de Deus, que é uma combinação destas.Mas enquanto aquelas são verdadeiras,por terem uma impressão que lhes corresponde, esta, não a tendo, é uma criação ilusória da razão e deve ser rejeitada.
  • 25. Assim sendo, o princípio básico do empirismo é que as nossas ideias e opiniões acerca da realidade provêm dos sentidos. A Bifurcação de Hume Considerando a distinção entre ideias e impressões, Hume reduz todo o conhecimento humano a dois tipos: relações de ideias e questões de facto. Por considerar que na busca de conhecimento existem apenas dois caminhos a seguir, esta divisão ficou conhecida como A Bifurcação de Hume. Assim,podemos apresentar a distinção entre relações de ideias e questões de facto do seguinte modo: - A relação de ideias é o tipo de conhecimento que pode ser obtido apenas mediante a análise do significado dos conceitos envolvidos numa proposição. Por exemplo, para saber que a proposição “Os solteirosnão são casados”éverdadeira,basta saber o significado dos conceitos de “casado” e de “solteiro”. Trata-se de uma verdade necessária, pois a sua negação – há solteiros casados – implica uma contradição nos termos. Este tipo de conhecimento é característico deáreas como a matemática(por exemplo, 5 é a metade de dez), a geometria (um hexágono tem seis lados) e a lógica. É, portanto, um conhecimento dedutivo. - As questões de facto são o tipo de conhecimento que só pode ser obtido através de impressões, ou seja, através da experiência, e que nos fornece informação verdadeira acerca do mundo. Por exemplo, “A nesse é branca”é uma questão de facto, pois,para se saber que a neve é branca,é preciso ter experiência da neve e da sua cor.Não existe nada nos conceitos de “neve” e de “brancura” que torne a proposição “A neve não é branca” uma contradição nos termos. Este tipo de conhecimento expressa verdades contingentes – isto é, proposições que são verdadeiras,mas que poderiamnão o ser – e é característico deciências da natureza como a física, por exemplo. É, portanto, um conhecimento indutivo (por exemplo, à lua nova segue-se o quarto crescente; a água ferve a 100 graus centígrados). Hume sustenta que apenas o conhecimento sobre questões de facto nos pode fornecer informações sobre o mundo, pois as relações de ideias, embora expressem verdades necessárias,referem-se apenasàs relações entre o significado das ideias envolvidas, mas nada dizem acerca do que existe (é verdade que nenhum solteiro pode ser casado,mas isso não nos diz se existem solteiros,ou não). Além disso,Hume reconhece que todo o conhecimento sobre questões de facto tem de se basear na experiência. Munido deste critério, Hume pôde, uma vez mais, reforçar a sua convicção na perspetiva empirista:considerando que existem apenas dois tipos de conhecimento – relações de ideias e questões de facto – e uma vez que apenas o conhecimento das questões de facto nos fornece informações sobreo mundo, todo o nosso conhecimento do mundo se baseia necessariamente em impressões. Segundo David Hume, no contexto das ciências da natureza, o conhecimento das questões de facto depende da causalidade: é porque acreditamos na regularidade da natureza que podemos esperar que da observação de um conjunto de causas se seguirão os efeitos já
  • 26. esperados.Partindo da causalidade,a ciência,por exemplo,constrói novo conhecimento através de raciocínios indutivos. Mas a principal questão de Hume é saber se as questões de facto permitem efetivamente construir conhecimento verdadeiro. Neste sentido, a teoria empirista de David Hume coloca três problemas que analisaremos de seguida: causalidade, indução e mundo exterior. O Problema da Causalidade A causalidade consistena associação deduas ideiasqueocorrequando representamos duas ideias como correspondendo a uma relação causa-efeito.A consideração da causa transportaa nossa mente para a consideração do efeito. Por exemplo, se pensamos numa ferida, é comum pensarmos na dor que naturalmente lhe está associada. No entanto, a ideia de causalidade coloca um enorme desafio ao empirismo de Hume, pois, embora aparentemente seja inquestionável que somos detentores dessa ideia,a sua origem não parece ser tão clara.Afi nal, de onde vem a ideia de causalidade? Não setrata de uma relação deideias,pois da suanegação não resultaqualquer contradição. Por exemplo, ao ver uma bola de bilhar mover-se em direção a outra posso perfeitamente conceber uma série de acontecimentos alternativos: posso imaginar que ambas as bolas ficam paradas,quea segunda fica parada ea primeira volta para trás,quea primeira para ea segunda se desloca numa ou noutra direção,etc. Resta-nos a possibilidade de se tratar de uma questão de facto, pelo que a veracidade do princípio da causalidade não pode ser estabelecida senão através da experiência.No entanto, a experiência não nos respondea isto,pois tudo o quevemos são dois acontecimentos surgirem frequentemente associados, mas não temos qualquer impressão sensível do que é essa suposta conexão necessária entre ambos. Apesar destas dificuldades,Hume não fica sem resposta para os problemas suscitadospelo Princípio da Causalidade e recorre a uma experiência mental (conhecida como Um Adão inexperiente) para nos mostrar que, apesar de não haver uma impressão que lhe corresponda diretamente, a ideia de causalidade tem origem na experiência. Esta experiência mental consiste em imaginar alguém que, embora seja “dotado da mais forte capacidade e ra zão natural”, ainda não tenha tido qualquer experiência das regularidades do mundo. Como consequência dessa falta deexperiência,por mais dotada queessa pessoa fossede um ponto de vista racional, seria incapaz de inferir um efeito a partir da sua respetiva causa numa única ocorrência. Se imaginarmos que essa pessoa adquire mais experiência do mundo e das suas regularidades, percebemos que isso bastaria para que se tornasse capaz de fazer tal inferência (isto é, seria capazdeo fazer após verificarquedois acontecimentos aparecem constantemente um a seguir ao outro). Deste modo, Hume conclui que a ideia de relação causal ou conexão necessária entre dois acontecimentos mais não é do que a expectativa de que um deles, a que chamamos efeito, irá ocorrer sempre que o outro, a que chamamos causa, ocorra. Esta expectativa resulta do hábito, ou costume, isto é, da experiência que temos de uma conjunção constante desses dois acontecimentos pelo que não se funda na razão, mas sim num impulso natural irresistível e fundamental para o nosso dia a dia. Esta conexão resulta unicamente da nossa vontade de que o mundo seja previsível (atitude a que Hume designará por Princípio da Uniformidade da Natureza).
  • 27. O Problema da Indução A solução de Hume para o problema da causalidademostra-nos que a nossa expectativa de que causas semelhantes terão efeitos semelhantes sebaseia unicamenteno hábito – ou seja,na nossa experiênciade certas regularidades ou repetições -, pelo que não temos legitimidadepara postular a existência de uma força ou poder secreto da Natureza que estabelece uma relação causal (ou conexão necessária) entre diferentes objetos ou acontecimentos. No entanto, essa constatação não está isenta de dificuldades,pois sema garantia deque existe, de facto, uma tal relação causal (ou conexão necessária) não temos legitimidadepara acreditar emalgo tão trivial e tão fundamental para o nosso dia a dia como a ideia de que causas semelhantes terão efeitos semelhantes. Chamamos a esta proposição Princípio da Uniformidade da Natureza (PUN). Este princípio diz-nos o seguinte: a Natureza irá comportar-se no futuro conforme se tem comportado até hoje. O Princípio da Uniformidade da Natureza é algo que, de forma mais ou menos consciente, todos assumimos como verdadeiro, pois sem essa crença a nossa vida quotidiana tornar -se-ia bastante bizarra. Que razões posso apresentar para o facto de acreditar que o chão não irá desaparecer debaixo dos meus pés quando começar a caminhar? Aparentemente, tudo o que posso fazer é dizer que acredito que assim será porque até hoje assim foi. Mas será que isso me oferece algumtipo degarantia? Por outras palavras,teremos alguma vezjustificação parainferir, a partir da repetição de um grande número de casos observados,uma conclusão acerca decasos ainda por observar? Na Unidade 1, designámos este tipo de inferências como inferências indutivas e, por esse motivo, este problema também ficou conhecido como problema da indução. Hume considerou que não há maneira de justificar racionalmente a nossa confiança nas inferências indutivas. Por maior que seja o número de casos em que experimentamos uma determinada regularidade, jamais teremos justificação racional para acreditar que essa regularidade se irá manter no futuro. Analisemos uma inferência indutiva: (1) Até hoje o Sol nasceu todos os dias. (2) Logo, o Sol irá nascer amanhã. Verificamos aqui que a verdade das premissas não é suficiente para garantir a verdade da conclusão. A única forma de tornar esta inferência mais sólida é acrescentando-lhe o Princípio da Uniformidadeda Natureza como uma das suas premissas.Destemodo, a inferência assumiria esta forma: (1) A Natureza irá comportar-se no futuro conforme se tem comportado até hoje (PUN). (2) Se PUN é verdadeiro, então se até hoje o Sol nasceu todos os dias, irá nascer amanhã. (3) Até hoje o Sol nasceu todos os dias. (4) Logo, o Sol irá nascer amanhã. Esta última inferência é válida, mas a sua solidez depende da veracidade do Princípio da Uniformidade da Natureza. Contudo, uma vez que não se trata de uma mera relação de ideias, não temos forma de demonstrar a veracidade deste princípio sem recorrer à experiência, mas
  • 28. isso implicaria justificar a nossa confiança nesse princípio com base na nossa experiência de que até hoje a Natureza se tem comportado de modo uniforme. Isso significa queestaríamos a recorrer à indução para justificar a nossaconfiançaemPUN. Ora,dado que a nossa confiança ma própria indução pressupõea adoção dePUN,a nossa justificação torna-se viciosamente circular, pois pressupõejustamenteaquilo quepretende justificar,incorrendo numa petição de princípio. Deste modo, Hume é, mais uma vez, conduzido à conclusão de que a crença de que a Natureza se irá comportar como setem comportado e a nossa confiançana indução não têm um fundamento racional esão apenas fruto deum inegável impulso natural quenos determina a ter esta crença. O Problema do Mundo Exterior A crença no Princípio da Uniformidade da Natureza não é a única crença comum cujo fundamento é posto em causa por Hume. Sem refletir muito sobreo assunto,todos nós estamos dispostos a assumir a existência de um mundo exterior às nossas mentes, que não depende da nossa perceção e que é a verdadeira causa das nossas impressões. Mas, segundo Hume, é um erro confundir os objetos exteriores e o mundo exterior à nossa mente com as perceções dos mesmos. Para sustentar esta ideia, Hume avança o seguinte argumento: (1) Se a mesa que vemos e que está presente na nossa mente fosse a mesa real, o seu tamanho não se alterava em função da nossa perspetiva. (2) Mas a mesa que está presente na nossa mente parece diminuir à medida que dela mais nos afastamos, ou seja, o seu tamanho altera-se em função da nossa perspetiva. (3) Logo, aquilo que está presente na nossa mente não é mesa real, mas sim uma imagem ou representação mental da mesma. Uma vezque se trata de uma questão que diz respeito à existência, umainvestigação desta natureza deve ser resolvida com recurso à experiência, mas a nossa experiência não pode alguma vez estender-se para além das nossas impressões, e estas, conforme acabámos de constatar,não devem ser confundidas comos objetos exteriores em si mesmos. Assim, uma vez que nunca poderemos sair do interior das nossas mentes, nunca seremos capazes de verificar se, de facto, existe uma correspondência entre as nossas perceções eos objetos exteriores, nem tampouco poderemos alguma vez ter justificação para acreditar na existência dos mesmos. O Ceticismo Moderado de Hume Assim, como consequência dos seus princípios empiristas, Hume é estranhamente conduzido à conclusão de que existem duas crenças que, embora não possamos viver sem as assumir como verdadeiras, estão para além de qualquer tentativa de justificação racional: 1. A crença na uniformidade da Natureza, isto é, a crença de que a Natureza se irá comportar conforme se tem comportado até hoje (ou seja, a crença no Princípio da Indução);
  • 29. 2. A crença na existência do mundo exterior, isto é, a crença de que existem objetos exteriores à nossa mente que são responsáveis pelas nossas perceções dos mesmos. Contudo, isto não faz de Hume um cético, pelo menos não no sentido tradicional do termo, porque considera que, uma vez que estas crenças fazem parte da natureza humana e na vida quotidiana não conseguimos pensar nemagir semelas,não devemos rejeitá-las,nemsuspender o juízo relativamente às mesmas. Hume acaba por defender apenas um ceticismo moderado, que serve para nos proteger contra o dogmatismo, as decisões precipitadas e as investigações demasiado especulativas, distantes da experiência e sem suporte empírico. OBJEÇÕES À TEORIA EMPIRISTA DE DAVID HUME a) Objeção à imagem da mente como tábua rasa No século XX,o filósofo americano Jerry Fodor propôs umargumento que põe em causa a crença partilhadapelos empiristasdeque, à nascença,a nossa mente é como uma tábua rasa (ou folha em branco).Fodor considera queà nascença somos capazes deaprender uma Língua e qualquer processo de aprendizagem de uma Língua pressupõe algum conhecimento linguístico inato. Ora, se encararmos este conhecimento inato do funcionamento da língua como genuíno conhecimento acerca do mundo, teremos de abandonar a ideia de que, à nascença, a mente é uma tábua rasa (ou folha em branco). b) Objeção do homúnculo Através do Argumento da Mesa, Hume demonstrou que aquilo que está presente na nossa mente não são os objetos reais do muno exterior, mas simuma imagem ou representação mental dos mesmos. Esta imagem do funcionamento da mente parece implicar que somos homúnculos (pessoas minúsculas) fechados numa espécie de cinema privado no interior das nossas mentes, onde nos são apresentadas imagens ou representações dos objetos do mundo exterior aos quais não temos qualquer tipo de acesso direto. Mas os problemas levantados a propósito da nossa relação com o mundo exterior também se aplicamà relação dessehomúnculo comas imagens presentes no ecrã do seu cinema mental. Se a natureza da explicação semantiver inalterada,acabaremos por supor a existência de outro homúnculo dentro da mente do primeiro e assim sucessivamente, caindo numa regressão infinita de homúnculos, que aparentemente deixa por explicar o processo de interação entre a mente e o mundo. c) Objeção baseada na argumentação a favor da melhor explicação Bertrand Russell rejeita as conclusões céticas de Hume, pois considera que a sua ideia do que deve ser “racionalmente justificável” é demasiado estreita. Hume parece admitir que nenhuma crença está racionalmente justificada,a menos que exista uma prova definitiva da sua
  • 30. verdade. Para Russell, pode ser racional acreditar numa crença, mesmo na ausência deste tipo de prova, pois pode simplesmente acontecer que de entre as alternativas disponíveis para a explicar a nossaexperiência exista uma hipótesemais plausível do que todas as outras,pelo que é mais racional acreditar na sua verdade do quem qualquer uma das alternati vas. Este tipo de argumentação designa-seargumentação a favor da melhor explicação e é um bom exemplo de abdução – um processo de inferência que se apoia num conjunto de dados para extrair com um certo grau de plausibilidade uma conclusão que vai além dos mesmos. Russell acredita que a existência de um mundo exterior às nossas mentes regido pelo princípio da causalidade é uma explicação da nossa experiência muito mais simples e apelativa do que qualquer cenário cético que possamos imaginar. Por isso, considera que temos uma justificação racional para acreditar nisso.O mesmo se aplicaà ideia decausalidade:é mais razoável aceitarmos que o mundo é, de facto,regido por leis causais,do queassumir quea existênciadeconjunções constantes éapenas acidental. d) Contraexemplo do tom azul desconhecido O próprio David Hume prevê a possibilidade de se encontrar um contraexemplo ao Princípio da Cópia e, embora o desvalorize, a verdade é que esse contraexemplo pode minar a nossa confiançano Princípio quetem como alvo.Essecontraexemplo consisteem imaginar uma situação em que alguém é colocado perante uma determinada gradação de tons de azul,sendo um dos tons dessa gama propositadamente omitido. O problema surge porque alguém que nunca tenha tido experiência desse particular tomde azul pode, ainda assim,formar uma ideia a seu respeito, mesmo na ausência de uma impressão que lhe corresponda.Ora, isso não seria possível se, de facto, todas as nossas ideias fossem cópias de impressões. RACIONALlSMO (Descartes)  O conhecimento sensível é enganador.  A razão é a única fonte de conhecimento válido (para Descartes,há ideias inatas).  As representações provenientes da razão são as mais certas e,por isso,devem ser consideradaso ponto de partida de todo o conhecimento que se quer logicamente necessário e universalmente válido.  Conduz ao dogmatismo. EMPIRISMO (David Hume)  A experiência é a única fonte de conhecimento.  Não há ideias inatas, a mente está vazia antes de receber qualquer tipo de informação sensorial.
  • 31.  Todo o conhecimento acerca das coisas,mesmo aqueleque formula leis universais, vem da experiência; por isso, só é válido dentro dos limites do observável.  Conduz a um ceticismo moderado. Publicado 20th November 2015 por Rui Mendes Etiquetas: Descrição e interpretação da atividade cognoscitiva 0 Adicione um comentário 5. Oct 22 2. Argumentação e retórica 2.1. A procura de adesão do auditório: ethos, pathos e logos A argumentação é um processo comunicativo, pois nela estão sempre presentes um emissor (o orador), um recetor (o auditório) e uma mensagem (tese ou argumento). O orador é aquele que, dispondo de uma opinião, a partilha com um auditório. Essa opinião pertence ao domínio do verosímil, podendo consistirnuma tese, numa causa,numa ideia, num ponto de vista, sendo sustentada, depois, com argumentos. O objetivo da argumentação é levar o auditório a aderir à opinião que lhe é proposta.Mas para isso é neces sário ter em conta o contexto de receção, ou seja, o conjunto de opiniões, valores e juízos que o auditório partilha. Estes elementos, anteriores ao ato de argumentação, são decisivos no que se refere ao grau de adesão à tese do orador. Dito de outro modo: o orador tem de estar atento às caraterísticas do auditório e no decorrer da argumentação estar atento aos sinais que lhe permitem perceber se o seu discurso está a ser entendido e a ser aceite. Neste sentido, argumentação e auditório influenciam-se mutuamente: se, por um lado, o emissor adequa o seu discurso às características do seu auditório, por outro lado, o auditório transforma-se por efeito das teses que lhe são apresentadas.O discurso argumentativo constitui-se assim como um instrumento de formação da opinião pública, condicionando comportamentos, opiniões e tomadas de posição. Desde a antiguidade que a argumentação representa um instrumento-chave na relação entre os seres humanos, pelo que desde cedo se constituíram disciplinas que visaram o estudo da argumentação, tais como a oratória e a retórica.Aristóteles foi um dos pensadores que se dedicou ao estudo da retórica e que reconheceu esta relação. Este filósofo defendeu que o orador, o auditório e o discurso são três elementos-chave da prova utilizada pela retórica. Assim, o ethos (representando o caráter do orador), o pathos (representando a envolvência emocional do auditório) e o logos (simbolizando o discurso propriamente dito) são os três géneros de prova da retórica.
  • 32. O ethos relaciona-se com a credibilidade do orador. Antes mesmo da persuasão que o discurso possa exercersobre o auditório, o reconhecimento do orador, da sua autoridade na matéria e do seu caráter/perfil ético e moral são indispensáveis à aceitação do discurso pelo auditório. O pathos está ligado ao auditório. O tom de voz, a convicção ou a emoção do orador envolvem sentimentalmente o seu público. A emoção é um aspeto determinante para a aceitação da tese apresentada na argumentação, pois um auditório emocionalmente envolvido será melhor persuadido do que umauditório que apenas dá assentimento lógico ao discurso. O logos constitui a prova propriamente dita, isto é, refere-se diretamente à argumentação. Esta deve ser clara e a passagementre os diferentes argumentos deve serevidente. Assim, na argumentação, Aristóteles põe em relação o orador (ethos), o seu auditório (pathos) e o discurso argumentativo (logos). Em síntese, o discurso argumentativo está diretamente relacionado com o auditório porque: - dirige-se a um público específico; - centra-se na sedução do auditório a que se dirige; - constitui-se como formador da opinião e do seu público; - utiliza um discurso lógico-argumentativo que tem por objetivo que o auditório dê o seu assentimento à tese ou teses apresentadas; - dirige para o auditório as suas técnicas de persuasão (perguntas retóricas, ironia, elementos visuais, apelo ao envolvimento pessoal, utilização de exemplos e analogias, entre outras). 2.1.1. Demonstração e argumentação A argumentação nunca ocorre no vazio, isto é, há sempre um orador que tenta prevalecer a sua tese e assim persuadir o auditório. Na base da argumentação está a retórica, a qual é definida como a arte de bem falar. A retórica nasceu na Grécia no século V a.C., contemporânea da Filosofia e da democracia; o seu objetivo era precisamente levar um auditório a aceitar uma determinada tese ou opinião. Mas quais são as diferenças entre a lógica formal (demonstrativa) e a retórica (argumentativa)? Demonstração Argumentação Pertence à lógica formal Pertence à lógica informal Utiliza uma linguagem formal/inequívoca Utiliza a linguagem natural Pretende provar Pretende persuadir e convencer É impessoal É pessoal É independente do auditório É dependente do auditório É independente do contexto É dependente do contexto É objetiva É subjetiva Demonstração A lógica formal elimina toda a ambiguidade do discurso. Neste sentido, as suas demonstrações estabelecem uma relação necessária entre a conclusão e as premissas que a sustentam, compelindo à sua aceitação e não dependendo do sujeito que as profere nem do contexto ou auditório em causa. Dito de outro modo: numa demonstração, as premissas são verdades estabelecidas que não deixam lugar para qualquer dúvida, e a conclusão segue-se a elas de uma forma necessária. Argumentação
  • 33. A argumentação retórica não consiste na apresentação de demonstrações. Por um lado, o orador não tem de partir de premissas inquestionavelmente verdadeiras. As suas premissas podem consistir apenas em opiniões aceites pelo auditório. Basta-lhe que as premissas sejam prováveis e pareçam verosímeis ao auditório. Por outro lado, o orador não deve estar empenhado em mostrar rigorosamente que a conclusão se segue validamente das premissas, pois o auditório tem uma capacidade muito limitada de seguir raciocínios. Por isso, às vezes o orador opta por apresentar os argumentos de uma forma abreviada e sugestiva, apoiando-se em exemplos isolados e suprimindo premissas. Convém ainda referir que o discurso argumentativo expressa-se em linguagem natural e permite a refutação das suas teses. Além disso, depende do contexto e do auditório em causa. 2.2. O discurso argumentativo – principais tipos de argumentos e falácias informais 2.2.1. Tipos de argumentos a) Argumentos indutivos [induções] São argumentos que derivam ou de generalizações (“Todos os cisnes que vi até hoje são brancos; logo, todos os cisnes são brancos”) ou de previsões (“Todos os cisnes que vi até hoje são brancos; logo, o próximo cisne que vir será branco”). Num argumento indutivo a conclusão apresentada é mais ampla do que as premissas afirmam, uma vez que criam generalizações a partir de casos particulares. Por esta razão, a força de um argumento indutivo depende do maior ou menor grau de probabilidade de se verificar a sua conclusão. Alguns cuidados a observar comargumentos que recorremà indução: - Não se devem extrair generalizações com base numnúmero limitado de exemplos. - Os elementos que fundamentam as generalizações devem ser representativos. - Os elementos que sustentam as generalizações devem ser relevantes para a conclusão. - Não deve estar oculta informação que influencie a conclusão extraída. b) Argumentos por analogia Os argumentos que recorrem a uma analogia extraem conclusões com base em semelhanças conhecidas entre objetos ou acontecimentos. Num argumento deste tipo conclui-se que algo tem uma determinada característica porque num outro facto ou objeto semelhante essa característica está presente. Por exemplo: O Universo é como uma máquina. As máquinas são criadas por seres inteligentes. Logo, o Universo foi criado por um ser inteligente. Alguns cuidados a observar emargumentos por analogia: - As semelhanças verificadas devemser suficientes. - As semelhanças identificadas devemser relevantes para a comparação pretendida. - Deve ser considerado, sempre que possível, um número amplo de objetos ou fenómenos. c) Argumentos de apelo à autoridade Num argumento de apelo à autoridade assume-se que a conclusão é verdadeira partindo-se de posições de pessoas ou instituições reconhecidas como peritos no assunto em causa. Por exemplo:
  • 34. Platão e Descartes acreditavam na imortalidade da alma humana. Logo, a alma humana é imortal. Alguns cuidados a observar emargumentos de apelo à autoridade: - As fontes dos argumentos de autoridade devemser pormenorizadamente citadas. - Só devem ser utilizadas fontes imparciais. - Devem ser utilizadas fontes comamplo consenso na matéria em questão. - A fonte citada deve ser reconhecida como especialista na matéria. 2.2.2. Falácias informais As falácias informais são raciocínios que aparentam estar fundados em argumentos fortes quando, na verdade, são enganadores ou ilusórios. Estas falácias são, portanto, erros que se ligam a um uso inapropriado do conteúdo de um argumentam. a) Falácia da petição de princípio Esta falácia consiste num raciocínio circular que procura provar uma conclusão, que já se encontra assumida como verdadeira nas premissas, sem ter apresentado qualquer prova a seu favor. Por exemplo: “Todas as pessoas com mau humor tratam mal os outros, dado que estão sistematicamente com o seu estado emocional alterado.” Argumentar contra a falácia: Para se argumentar contra esta falácia basta que se mostre que, no argumento, estar emocionalmente alterado é equivalente a estar mal-humorado e que,desta forma, tanto a premissa como a conclusão dizem o mesmo sem que se prove que o mau humor é causa suficiente para se tratar mal os outros. É possível estar-se de mau humor e não se tratar mal as pessoas. b) Falácia ad hominem Esta falácia ocorre baseia-se no ataque contra a pessoa que defende um determinado argumento, em vez de se atacar o argumento. Por exemplo: “Não percebo como podes aceitar a opinião desse indivíduo, afinal ele é taxista.” Argumentar contra a falácia: Para demonstrar a fragilidade da falácia ad hominem deve mostrar-se que o argumento não apresenta as razões pelas quais a opinião do taxista não é aceitável. Ter uma determinada profissão não implica necessariamente que se tenha más opiniões. c) Falácia do apelo à ignorância Esta falácia ocorre quando se defende que uma proposição é verdadeira apenas por não se conseguir provar que ela é falsa; ou que uma proposição é falsa por não se conseguir provar que ela é verdadeira. Por exemplo: “Deus existe porque ninguém provou que Ele não existe” ou “Deus não existe porque ninguém provou que Ele existe”. Argumentar contra a falácia: Para demonstrar a fragilidade da falácia do apelo à ignorância deve mostrar-se que não é pelo facto de não ter sido possível provar umjuízo que ele passa a ser falso. d) Falácia do falso dilema Esta falácia é um raciocínio em que o orador apresenta normalmente apenas duas das alternativas possíveis quando na realidade existem mais. Ataca de seguida a alternativa que não lhe convém e leva o auditório a aceitar a
  • 35. alternativa que lhe interessa. Por exemplo: “Quem não está connosco está contra nós Por isso, se não nos apoiam são nossos inimigos.” Argumentar contra a falácia: Para se argumentar contra esta falácia deve apresentar-se pelo menos mais uma alternativa possível além das que são expostas no argumento. Neste caso, poderia contra- argumentar-se que o facto de não se apoiar alguémnão significa que sejamos seus inimigos. e) Falácia da derrapagem Esta falácia comporta normalmente um raciocínio ardiloso em que pelo menos um dos passos de que depende o raciocínio é falso. A partir desse ponto, a conclusão está comprometida. Por exemplo: “Se se tomar um analgésico o organismo cria dependência desse fármaco. De cada vez que se voltar a sentir dor, esses medicamentos farão cada vez menos efeito. Pelo que, inevitavelmente, o uso do analgésico contribui para o sofrimento dos doentes.” Argumentar contra a falácia: Para demonstrar a fragilidade desta falácia deve argumentar-se que a dependência dos fármacos não ocorre necessariamente pela sua toma esporádica quando recomendada e monitorizada por um profissional de saúde. O facto de se tomar um analgésico não se produz necessariamente dependência, logo, a conclusão de que os analgésicos desencadeiamsofrimento nos doentes não é sustentada pela cadeia de raciocínio apresentada. f) “Boneco de palha” A falácia do boneco de palha consiste na ridicularização ou deturpação da argumentação apresentada por forma a refutá-la mais facilmente. Desta forma, a contra-argumentação não ataca verdadeiramente o argumento apresentado, mas a sua versão distorcida. Por exemplo: “Deputado de um partido da oposição: A taxa de desemprego real é superior à que é apresentada na estatística, pois há muitos desempregados que não são contabilizados como tal. Devíamos alterar o método de cálculo da taxa de desemprego para saber com mais rigor as medidas a tomar. Resposta de um elemento do Governo: Alterar a forma de cálculo não serve para nada. Contabilizar na estatística o número de pessoas que não trabalham por preguiça, independentemente das políticas adotadas, não melhorará nada.” Argumentar contra a falácia: Para refutar esta falácia é necessário mostrar que o elemento do Governo deturpa o argumento do deputado da oposição. Este deputado não diz que a taxa de desemprego está errada unicamente porque não se contabilizam os desempregados que não querem trabalhar, haverá outros desempregados (provavelmente, a maioria) que não são contabilizados e para os quais medidas de emprego ajustadas seriamúteis. 3. Argumentação e filosofia 3.1. Filosofia, retórica e democracia
  • 36. A retórica surge ao mesmo tempo que a Filosofia e no mesmo sítio, ou seja, entre os séculos VII e V a.C. na Grécia Antiga. A retórica é um produto direto de um novo regime político – a democracia. De facto, na Grécia, a palavra ganha uma nova dimensão, servindo não apenas para comunicar mas também para argumentar. Tendo em conta as circunstâncias especiais que se deram na Grécia, os homens livres são chamados a dar as suas opiniões nas assembleias, nos tribunais e na praça pública. É neste contexto que surgem os sofistas. Estes eram um grupo especial de pensadores, que se intitulavam sábios, especialistas em ensinar aos outros as suas técnicas argumentativas. Além disso, defendiam a relatividade da verdade, facto que os opôs a Sócrates e Platão. Os sofistas vinham responder à necessidade presente na sociedade grega no que diz respeito ao ensino, sobretudo ao ensino da retórica, que se tornava necessária para vencer na hierarquia social. Sócrates e Platão posicionaram-se contra os sofistas, opondo à retórica a Filosofia. Os verdadeiros filósofos preocupavam-se em descobrir a verdade, que era apenas uma, posição contrária à dos sofistas, que defendiam a relatividade da verdade. Surge, assim, a oposição verdade/aparência e Filosofia/retórica. Posteriormente, Aristóteles vem defender a retórica, que se torna um saber entre outros. Para este filósofo, a retórica não se opunha à Filosofia, já que ela não é boa nem má, podemos é fazer um bom ou um mau uso dela. Durante o Império Romano, nomeadamente com Cícero, a retórica retoma a sua vertente mais estilística, relacionada com a eloquência e o ornamento do discurso. Na Época Moderna, a retórica é relegada para segundo plano, atrás do espírito e da racionalidade científica. Já em pleno século XX, dá-se a reabilitação da retórica, com a chamada Nova Retórica, proposta por Perelman, filósofo que volta a relacioná-la com a Filosofia. Este filósofo contemporâneo enalteceu o papel do logos (isto é, a dimensão do discurso) ao considerar a retórica uma arte fundamental para estabelecer consensos e suscitar a adesão do auditório universal. A retórica, enquanto arte de argumentar, é o instrumento fundamental no debate democrático. Sem debate, troca fundamentada de ideias, não há verdadeira democracia. Os gregos foram os primeiros a reconhecê-lo: a palavra, à primeira vista, substitui a violência, a prepotência, a dominação e permite o bom senso, o consenso e o acordo. É por estas razões que a retórica que os sofistas ensinavam aos jovens cidadãos assumia uma importância crucial na Grécia antiga. Contudo, também hoje, como na Antiguidade, a democracia pode ver-se ameaçada pelo mau uso da palavra, pelo discurso demagógico e manipulador. Isto significa que o mau uso da retórica constitui uma ameaça à saúde da democracia. 3.2. Persuasão e manipulação ou os dois usos da retórica Podemos distinguir dois possíveis usos da retórica: um bom uso, que designamos por persuasão, e um mau uso, que designamos por manipulação. A persuasão é a prática do discurso que tem como finalidade a livre adesão de um auditório à tese que dado orador pretende que seja acolhida pelo primeiro e que, com esse objetivo, abre espaço crítica, à reflexão e à liberdade de escolha
  • 37. do recetor. Dito de outro modo: persuadir é levar alguém a uma mudança de opinião e de atitude, aderindo às nossas teses. Alguns autores designam a persuasão por retórica branca, isto é, a retórica crítica, lúcida e consciente, que procura desmontar os discursos manipuladores. Por outro lado, a manipulação consiste na prática abusiva do discurso que visa impor determinada tese a um dado auditório e que, por isso, faz uso de técnicas ilegítimas que paralisam o espírito crítico do recetor e o levam a aceitar a mensagem sem a questionar. Neste sentido, manipular tem uma conotação negativa, uma vez que se trata de uma prática abusiva do discurso, que obriga o outro a aderir às nossas teses. Alguns autores designam a manipulação por retórica negra, isto é, a retórica que visa enganar, iludir e manipular o interlocutor. Em síntese: a retórica tanto pode servir a verdade como a mentira; tanto pode persuadir e convencer, como manipular e enganar. Não sendo a retórica condição suficiente para garantir o discurso verdadeiro, impõe-se a necessidade de um uso ético da retórica, isto é, um uso que tem em vista a verdade. 3.3. Argumentação, verdade e ser Pode-se dizer que uma proposição é verdadeira se está de acordo com aquilo que as coisas são, se corresponde à realidade, e falsa se não está de acordo com aquilo que as coisas são, se não corresponde à realidade. A filosofia, tal como as ciências, é uma procura de conhecimento, é uma tentativa de descobrir como as coisas são realmente. A argumentação filosófica, portanto, tem em vista a verdade. Os argumentos são vistos como instrumentos na procura da verdade, e não como formas de manipular a opinião dos outros. Na filosofia contemporânea reconhece-se assim uma relação estreita entre a argumentação, a verdade e o “ser” ou realidade. Conhecer a verdade é saber como as coisas são e na filosofia recorre-se à argumentação para descobrir a verdade. Publicado 22nd October 2015 por Rui Mendes Etiquetas: Argumentação e filosofia Argumentação e retórica 0 Adicione um comentário 6. Sep 28 Redes concetuais: compreensão e distribuição de termos
  • 38. 1. Organize por ordem crescente de compreensão os seguintes conceitos: vegetal, flor, cravo, ser, ser vivo. 2. Organize por ordem decrescente de distribuição os seguintes conceitos: animal, vivente, avestruz, ser, ave, vertebrado. 3. Organize por ordem crescente de distribuição os seguintes conceitos: lisboeta, europeu, animal, Fernando Pessoa, animal racional, português. 4. Organize por ordem decrescente de compreensão os seguintes conceitos: ser vivo, árvore, pinheiro silvestre, vegetal, pinheiro. 5. Organize por ordem crescente de compreensão os seguintes conceitos: objeto material, calças de ganga, peças de roupa, calças. Publicado 28th September 2015 por Rui Mendes Etiquetas: TPC 0 Adicione um comentário 7. Sep 13 Unidade 1 – Racionalidade argumentativa e filosofia 1. Argumentação e lógica formal 1.1. A definição de lógica
  • 39. A palavra lógica deriva do grego “logos”, que significa razão, pensamento, discurso. Por isso, podemos dizer que a lógica é a disciplina que estuda as condições de coerência do pensamento e do discurso, preocupando-se com a correção dos argumentos. Torna-se, pois, necessário obedecer a determinadas regras para a elaboração dos nossos raciocínios e argumentos. A lógica permite estabelecer essas regras, de modo a distinguir os argumentos válidos daqueles que não o são. Dito de outro modo: é a disciplina que investiga os princípios gerais do pensamento válido. Qual a utilidade e importância da lógica? - A lógica analisa as condições de coerência do pensamento e do discurso; - A lógica analisa a validade/verdade do pensamento e do discurso; - A lógica proporciona os meios que possibilitam a organização coerente do pensamento e do discurso. 1.1.1. A estrutura do argumento Um argumento é um conjunto de proposições relacionadas entre si de tal modo que umas (que designamos por premissas) devem oferecer razões para aceitar uma outra (que designamos por conclusão). Por exemplo: Premissa: “Todas as coisas são seres vivos”. Premissa: “A pedra é uma coisa”. Conclusão: “A pedra é um ser vivo”. Quer as premissas, quer a conclusão são proposições, e cada uma das proposições é constituída por termos. Deste modo, o termo e a proposição são as partes que constituem o argumento. a) O termo O termo é a expressão verbal do conceito. O conceito é o elemento base do nosso pensamento, deriva de uma operação mental de abstração que reúne as características essenciais dos seres. Há conceitos empíricos, isto é, que provêm da experiência (por exemplo, “carro”, “rua”, “boneca”) e conceitos ideais (por exemplo, “sereia”, “bondade” “Deus”). Convém referir que o conceito deve restringir-se ao campo da possibilidade lógica (por exemplo, não existe o conceito de “claridade escura” ou de “círculo quadrado”). Por outro lado, é de notar que o termo pode ser constituído por uma ou mais palavras (por exemplo, “ser vivo”, “animal selvagem”, “densidade populacional”, “instrumento musical”). Podemos distinguir a compreensão e a extensão dos termos/conceitos: - compreensão: conjunto de características ou atributos que definem um conceito (por exemplo, podemos atribuir ao conceito de “homem” as seguintes características: ser vivo, mamífero, bípede, racional); - extensão: conjunto de seres a que o conceito se refere (por exemplo, a Joana, o Alfredo, o Tomás, a Carla). A compreensão e a extensão variam segundo uma ordem inversa: quando aumenta a extensão diminui a compreensão e quando aumenta a compreensão diminui a extensão. Sendo assim, quanto maior é o número de elementos a que o conceito se aplica (extensão), menor é a quantidade de características comuns (compreensão). Por exemplo:
  • 40. Ser, ser vivo, animal, animal racional, Tomás. O conceito de “ser” é aquele que, neste caso, possui maior extensão e menor compreensão, enquanto que o conceito de “Tomás”, designando apenas um indivíduo, é aquele que possui menor extensão (pois designa apenas um elemento) e maior compreensão (pois é mais fácil enunciar características de uma só pessoa do que características comuns a uma centena de pessoas). Os conceitos que nos servem de exemplo estão dispostos por ordem crescente de compreensão e por ordem decrescente de extensão. b) A proposição Antes de mais, refira-se que a proposição é a expressão verbal (oral ou escrita) do juízo e só as frases declarativas é que são proposições (por exemplo: “empresta-me o teu caderno” não é uma proposição, mas “alguns ratos são maléficos” já é uma proposição). A proposição corresponde a um modo específico de relacionar termos. Ela é um enunciado que estabelece uma relação de afirmação ou de negação entre termos, podendo tal relação ser verdadeira ou falsa. A proposição distingue-se de outros tipos de raciocínio porque nele apenas se relacionam dois conceitos: o primeiro conceito é o sujeito (S); o segundo conceito é o predicado (P); a relação entre ambos faz-se através da cópula (é/não é), que é o elemento que relaciona o sujeito com o predicado. A proposição reduz-se à fórmula “S é P”, sendo suscetível de ser considerada verdadeira ou falsa. A relação entre S e P é uma relação de inerência, pois o predicado é inerente ao sujeito. Por exemplo: “Todos os filósofos [sujeito] são [cópula] sábios [predicado]”. As proposições podem ser classificadas em relação à sua quantidade (universais ou particulares) e em relação à sua qualidade (afirmativas ou negativas), sendo simbolizadas pelas vogais A, E, I, O. A – proposição universal afirmativa: “Todos os cientistas são portugueses”. E – proposição universal negativa: “Nenhum cientista é português”. I – proposição particular afirmativa: “Alguns cientistas são portugueses”. O – proposição particular negativa: “Alguns cientistas não são portugueses”. Importa salientar que há proposições que, apesar de formadas apenas por dois elementos, podem ser transformadas na forma padrão ou forma canónica. Por exemplo: “Ser político é ser mentiroso” equivale a ”Todos os políticos são mentirosos”; ou “Nem todos os padres são sinceros” equivale a “Alguns padres não são sinceros”. c) O argumento Tal como as proposições resultam do encadeamento de termos, também os argumentos são encadeamentos de duas ou mais proposições, levando- nos a uma conclusão. Assim, podemos definir o argumento como a expressão verbal de uma inferência ou raciocínio, isto é, como a operação através da qual, de duas ou mais proposições (chamadas de premissas), se extrai uma outra proposição (que designamos por conclusão). Vejamos um exemplo: Todos os homens são mortais – Premissa maior Santiago é homem – Premissa menor Logo, Santiago é mortal – conclusão.
  • 41. O que resulta da relação que estabelecemos entre as duas premissas é uma nova proposição – a conclusão – que extraímos necessariamente da relação entre as duas premissas. Designamos as duas premissas por antecedente (são as duas proposições já conhecidas) e a conclusão por consequente (é a nova proposição). 1.1.2. Indicadores de premissa e de conclusão Nem sempre os argumentos se encontram na forma padrão, que é uma tipologia preestabelecida para apresentar o argumento, onde se enunciam primeiro as premissas e a seguir a conclusão. Em alguns casos é necessário estar bastante atento de modo a identificar as premissas e a conclusão dos argumentos. Os indicadores de premissa e de conclusão ajudam a identificar as várias partes dos argumentos. Exemplos de indicadores de conclusão Exemplos de indicadores de premissa logo… pois… portanto… porque… por isso… admitindo que… segue-se que… dado que… infere-se que… visto que… consequentemente… tendo em conta que… 1.2. A distinção verdade-validade Validade e verdade são dois termos que aparecem frequentemente quando falamos em lógica. Se eu disser “Hoje está a chover”, esta frase é válida, do ponto de vista formal está bem construída, no entanto, ela pode ser falsa, no caso de hoje estar Sol. Assim, a validade diz respeito à forma/estrutura da inferência ou raciocínio. Por outro lado, a verdade diz respeito ao que é afirmado ou negado pela proposição, ou seja, ao seu aspeto material, que pode ser verificado empiricamente (isto é, corresponde à realidade factual). A única relação entre validade e verdade existe apenas nos raciocínios que, sendo corretamente construídos do ponto de vista formal, têm na sua constituição premissas verdadeiras, das quais extraímos necessariamente uma conclusão verdadeira. Por exemplo: Todos os diamantes são duros. Alguns diamantes sãos joias. Logo, Algumas joias são duras. Deste modo, pode acontecer que o argumento seja válido (tendo a estrutura correta), sendo no entanto falsas todas as proposições que o constituem. Por exemplo: Todos os políticos são músicos. Cristiano Ronaldo é um político. Logo, Cristiano Ronaldo é um músico.