O documento resume a história das neurociências, desde os primeiros registros no Egito Antigo até descobertas modernas no Brasil. Algumas ideias importantes incluem: (1) Hipócrates associou o cérebro à mente e às emoções; (2) Herófilo e Erasístrato fizeram as primeiras descrições anatômicas do cérebro; (3) Galeno popularizou a neuroanatomia comparada; (4) Descartes propôs a teoria do dualismo mente-corpo.
2. História das neurociências
Prof. Dr. Caio Maximino
‘‘Dans les champs de l’observation le hazard ne
favorise que les esprits prepare’’
3. ●
Séc. VII a.C. - Papiro
Cirúrgico de Edwin Smith
– Primeira referência ao cérebro
em qualquer registro humano
– A palavra só aparece oito vezes
no registro egípcio antigo
– A seção descreve os sintomas,
diagnósticos e prognóstico de
dois pacientes com fraturas
múltiplas no crânio
Antiguidade
4. Alcmeão de Crotona (535 - ? a.C.)
●
Discípulo de Pitágoras na
Magna Grécia
●
Descreveu o nervo óptico
●
Propôs que o encéfalo é a
sede das sensações e da
atividade mental
5. Hipócrates de Kos (460-370 a.C.)
●
“O homem deve saber que de nenhum outro
lugar, mas apenas do encéfalo, vem a alegria,
o prazer, o riso e a diversão, o pesar, o luto,
o desalento e a lamentação. E por isso, de
uma maneira especial, nós adquirimos
sabedoria e conhecimento e enxergamos e
ouvimos e sabemos o que é justo e injusto, o
que é bom e o que é ruim, o que é doce e o
que é insípido... E pelo mesmo órgão nos
tornamos loucos e delirantes, e medos e
terrores nos assombram... Todas essas coisas
nós temos de suportar do encéfalo quando
não está sadio... Nesse sentido, opino que é
o encéfalo quem exerce o maior poder sobre
o homem” -Sobre a Doena Sagrada
6. O Egito da Era Helenística
● Herófilo da Calcedônia (335-280 a.C.) - Distinguia
entre cérebro e cerebelo; fez a primeira descrição
dos ventrículos
● Erasístrato de Chio (300-240 a.C.) - Descrição dos
nervos periféricos e suas origens; acreditava que
esses nervos transportavam um “espírito nervoso” a
partir do cérebro
7. Aelius Galenus (129-216 d.C.) e a
neuroanatomia comparada
●
Dissecou os encéfalos de ovelhas, macacos, cães,
suínos e outros mamíferos não-humanos
●
Concluiu que, como o cerebelo é mais denso do
que o cérebro, deve ser responsável pelo controle
dos músculos
●
Modularidade dos nervos espinhais
●
A substância mental é a substância física; ambas
podem ser estudadas fisicamente
●
Acreditava que o cérebro funcionava pelo
movimento dos espíritos animais através dos
ventrículos
8. O conhecimento do cérebro na
Era Dourada do Islã
●
Yuhanna Ibn Masawyh (777-857) –
'Distúrbios do Olho' e 'Conhecimento dos
Exames dos Oculistas'
●
Al Tabari (810-855) – 'O Paraíso da
Sabedoria' contém um capítulo sobre
afecções do SN
●
Al Razi (850-923) – escreveu sobre como
o cérebro opera os músculos
●
Ibn Al-Nafis (1213-?) - dissecação resolveu
várias concepções erradas sobre o cérebro
9. Trepanações no Império Inca
●
Séc. X d.C.
●
Técnica usada em homens adultos
para tratar ferimentos sofridos em
combate
●
Técnicas cirúrgicas padronizadas e
aperfeiçoadas com o tempo
●
Por volta do séc. XV, as taxas de
sobrevivência eram de ~90%
10. Andreas Vesalius (1514-1564)
●
Dissecações descreveu→
características estruturais do
encéfalo e do SN
●
Registrou o putamen e o corpo
caloso
●
Propôs que o encéfalo é
constituído por sete pares de
nervos, cada qual com uma função
especializada
11. René Descartes (1596-1650)
●
Propôs o dualismo de substância como forrma
de resolver o problema mente-corpo
– O corpo é físico, tem extensão espacial
– A substância mental não apresenta extensão
●
Propôs que a mente interage com o corpo na
glândula pineal;
– A mente é unitária, assim como a pineal
– A pineal está localizada próxima aos ventrículos,
controlando o movimento dos “espíritos animais”
nessa estrutura e os fluindo para os nervos do
corpo.
●
A mente controla o corpo, mas esse também
pode influenciar a mente (p. ex., emoções)
12. Luigi Galvani e a eletricidade animal
●
Demonstração do papel da eletricidade na
contração muscular
●
Inspirou campos importantes da física, assim
como da cultura popular (Frankenstein)
●
Controvérsia com Alessandro Volta sobre a
origem do fenômeno
– Frederick von Humboldt – dois fenômenos
independentes
– Carlo Matteucci – detectou o fluxo de corrente
em músculo
– Emil du Bois-Reymond – mensuração em
nervos
15. Jean Pierre Flourens e
o campo agregado
●
Produção experimental de traumas
cerebrais em pombos e coelhos;
observou que funções específicas
não eram prejudicadas com as
lesões
●
Argumentou contra a localização de
funções, afirmando que o cérebro
funciona como um “campo
agregado”, e é a extensão da lesão,
e não a localização, que é
responsável pelo dano
16. John Hughlings Jackson
● Estudos anatomo-clínicos em
pacientes epilépticos
●
Observação dos padrões de
convulsões leva à conclusão
de que a ativação motora é
semelhante, sugerindo
localização específica →
concepção topográfica do
cérebro
18. Emil Kraepelin, o pai da psiquiatria
●
Criou um sistema de classificação de
transtornos psiquiátricos baseada em
síndromes – padrões de sintomas
constantes no tempo
●
Descreveu os transtornos de humor,
esquizofrenia, e transtorno de
personalidade antissocial
●
Junto com Alois Alzheimer, descreveu
a base patológica da doença
19. O surgimento da neuroquímica
●
Bernard e Vulpian – experimentos com curare demonstram o sítio de ação na placa motora, e não no
músculo
●
Elliot (1904): “o ponto no qual o estímulo do excitante químico [adrenalina] é recebido, e transformado
no que pode causar a mudança na tensão da fibra muscular, é talvez um mecanismo desenvolvido pela
célula muscular em resposta a sua união com a fibra simpática [que faz uma sinapse]. A adrenalina pode
ser então o estimulante químico liberado a cada ocasião quando o impulso chega na periferia”
●
Otto Loewi: “vagusstoff”
●
Cannon: papel da noradrenalina e da adrenalina nas respostas viscerais e comportamentais da ativação
simpática
●
Dale (déc. 1930) demonstração da liberação da ACh pelo nervo estimulado
20. A controvérsia entre
farmacologistas e eletrofisiologistas
●
Controvérsia levantada entre o neurofisiologista australiano John
Eccles, o último orientando de Sherrington, e Henry Dale
● “E segue a controvérsia. Dale, ao discuti-la, observou que não faz
sentido supor que a natureza iria prover a liberação no gânglio da
acetilcolina, o mais potente estimulante de células ganglionares
conhecido, somente para enganar os fisiologistas. A isso, Monnier
respondeu que tambem é irracional supor que os potenciais de ação
cheguem às sinapses com voltagens aparentemente adequadas para
excitar as células ganglionares somente para enganar os fisiologistas”
21. O eletrodo intracelular
resolve a controvérsia
●
Utilizando microeletrodos que podiam perfurar a membrana celular,
diversos grupos (Gopfert e Schaefer (1938) na Alemanha, Feng
(1941) na China, Eccles e colaboradores (1939) na Austrália)
observaram que o potencial de ação que chega ao terminal nervoso
primeiro inicia um “potencial de placa terminal” local no músculo,
que só então leva ao início do potencial de ação muscular.
●
Esse resultado sugere que uma substância poderia ser liberada pelo
terminal pré-sináptico e agir no terminal pós-sináptico, causando um
potencial pós-sináptico.
23. Neurobiologia do desenvolvimento
no início do séc. XX
●
1919: Spemman funda uma escola em Freiburg que se
tornará um centro de estudos de desenvolvimento;
Viktor Hamburger e Johannes Holtfreter
● Em 1924, publica um artigo clássico com Hilde
Mangold demonstrando a formação de uma segunda
placa neural após a implantação, sugerindo
propriedades organizadoras do tecido
24. A descoberta do NGF
●
A remoção experimental de membros em embriões produz uma
redução dramática do número de neurônios sensoriais e motores na
medula espinhal (Margaret Shorey, 1909; Viktor Hamburger, 1932)
1) Os alvos, isso é, a musculatura e os órgãos dos sentidos, geram dois
agentes específicos, um controlando os gânglios espinhais e outro
controlando as colunas motoras laterais.
2) Os agentes são transportados retrogradamente nos nervos aos seus
centros nervosos específicos, as colunas motoras laterais e os gânglios
espinhais
3) Os agentes regulam o desenvolvimento dos centros nervosos de forma
quantitativa
25. A descoberta do NGF
●
Resultados contraditórios com Hamburger o levam a
convidar Levi-Montalcini para rodar experimentos em seu
laboratório
●
Demonstram morte celular não só na proximidade do
membro, mas também em áreas centrais não-afetadas
●
Elmer Bueker – um sarcoma implantado estimula fortemente
o crescimento de nervos sensoriais sugere uma→
preparação que pode produzir um “fator de crescimento”
●
Experimentos in vitro realizados na UFRJ registram de forma
semi-quantitativa o efeito
●
Tentativa de purificar o fator usando veneno de cobra levam
à descoberta da presença do fator em glândula salivar de
camundongo
26. Miguel Ozório de Almeida e a
neurofisiologia brasileira
●
“L'Inhibition et la
facilitation dans le système
nerveuz central et
périphérique” (1944)
●
Especial interesse pela
epilepsie experimental
(trabalho com Haiti
Moussatché)
27. Thales Martins e a
endocrinologia brasileira
●
1926-1936: inicia a pesquisa no
“laboratório dos Ozório”, iniciando o
campo da endocrinologia no Brasil.
●
Trabalho de orientação farmacológica,
usando principalmente cachorros.
●
Década de 1930: Colaboração
importante com Ribeiro do Valle no
Instituto Butantã (SP) e fundação da
cadeira de fisiologia na Escola Paulista
de Medicina.
28. Miguel Rolando Covian
●
Década de 1950: Miguel Covian vai à
Ribeirão Preto chefiar o Departamento
de Fisiologia da Faculdade de Medicina
da USP,enquanto Mauricio Rocha e Silva
irá chefiar o Departamento de
Farmacologia.
●
Formou diversos neurocientistas
importantes, incluindo César Timo-Iaria
(São Paulo), José Antunes Rodrigues
(Ribeirão Preto), Negreiros e Paiva
(Campinas), e Katsumasa Hoshino
(Bauru).
29. O Instituto de Biofísica
●
Mensuração do potencial de membrana no
poraquê.
●
Efeitos da doença de Chagas nos potenciais em
cultura de miocárdio e tecido neural.
●
Expandiu-se enormemente, transformando-se em
Instituto de Biofísica em 1946.
●
Aristides Leão (depressão alastrante), Paes de
Carvalho (miocárdio), Eduardo Oswaldo-Cruz
Filho (neurofisiologia do sistema visual), Carlos
Eduardo Guinle da RochaMiranda (neuroanatomia
e neurofisiologia do sistema olfatório), Rita Levi-
Montalcini (NGF na retina in vitro)
30. Depressão alastrante
● Aristides Azevedo
Pacheco Leão
descreveu o fenômeno,
no qual uma onda de
redução na amplitude
do EEG segue a
estimulação
epileptogênica