1) O documento discute os mitos de Platão sobre a educação, especificamente o Mito da Caverna, presente em A República.
2) Para Platão, a educação não é simplesmente transmitir conhecimento, mas sim converter a alma do indivíduo, levando-o da ignorância ao conhecimento.
3) Platão propõe uma hierarquia das ciências, com a matemática e a dialética no topo, por conduzirem à inteligência e à compreensão da essência das coisas.
1. A Educação nos Mitos de
Platão
A República
Livro VII
Mito da caverna
Livro X
Mito de Er
2. Breve Histórico
Sócrates - filósofo grego
(Atenas 470 - 399 a . C .).
Não deixou obra escrita,
mas seus ensinamentos
são conhecidos por
fontes indiretas,
principalmente por
Platão, seu maior
3. Breve Histórico
Platão - filósofo grego
(Atenas 427 a .C. - 347 a . C.).
Foi discípulo de Sócrates e
professor de Aristóteles. É
considerado um dos grandes
pensadores da história da
filosofia. Sua obra, escrita
em forma de diálogos.
Fonte imagem: Grande Enciclopédia Larousse Cultural
4. Breve História da Grécia Antiga
ORIGENS
A civilização grega surgiu entre os mares Egeu,
Jônico e Mediterrâneo, por volta de 2000 AC.
Formou-se após a migração de tribos nômades de
origem indo-européia: aqueus, jônios, eólios e
dórios.
A pólis (cidades-estado), é a forma de vida
política dos gregos, que surgiu por volta do
século VIII a.C. As duas mais importantes da
Grécia foram: Esparta e Atenas.
5. Breve História da Grécia Antiga
Cultura e religião
Foi na Grécia Antiga, na cidade de Olímpia,
que surgiram os Jogos Olímpicos em
homenagem aos deuses.
Os gregos também desenvolvem uma rica
mitologia que até os dias de hoje é referência
para estudos e livros.
A filosofia atingiu um desenvolvimento
surpreendente, especialmente em Atenas, no
século V (Período Clássico). Sócrates e Platão são
os filósofos mais importantes deste período.
7. O MITO DA CAVERNA
SÓCRATES - Agora imagina a maneira como segue o estado
da nossa natureza relativamente à instrução e à ignorância.
Imagina homens numa morada subterrânea, em forma de
caverna, com uma entrada aberta à luz; esses homens
estão aí desde a infância, de pernas e pescoço
acorrentados, de modo que não podem mexer-se nem ver
senão o que está diante deles, pois as correntes os
impedem de voltar a cabeça; a luz chega-lhes de uma
fogueira acesa numa colina que se ergue por detrás deles;
entre o fogo e os prisioneiros passa uma estrada
ascendente. Imagina que ao longo dessa estrada está
construído um pequeno muro, semelhante às divisórias que
os apresentadores de títeres armam diante de si e por cima
das quais exibem as suas maravilhas.
8. O MITO DA CAVERNA
Glauco - Estou vendo.
Sócrates - Imagina agora, ao longo desse
pequeno muro, homens que
transportam objetos de toda espécie,
que o transpõem: estatuetas de
homens e animais, de pedra, madeira e
toda espécie de matéria; naturalmente,
entre esses transportadores, uns falam
e outros seguem em silêncio.
9. O MITO DA CAVERNA
Sócrates - Considera agora que se liberte
um desses prisioneiros, que seja ele
obrigado a endireitar-se, a voltar o
pescoço, a caminhar, a erguer os olhos
para a luz: ao fazer todos estes
movimentos sofrerá, e o deslumbramento
impedi-lo-á de distinguir os objetos de que
antes via as sombras
10. MITO DA CAVERNA
. Que achas que responderá se alguém lhe vier
dizer que não viu até então senão
fantasmas, mas que agora, mais perto da
realidade e voltado para objetos mais reais,
vê com mais justeza?
Se, enfim, mostrando-lhe cada uma das coisas
que passam, o obrigar, à força de perguntas,
a dizer o que é? Não achas que ficará
embaraçado e que as sombras que via
outrora lhe parecerão mais verdadeiras do
que os objetos que lhe mostram agora?
11. O MITO DA CAVERNA
Sócrates - E se o arrancarem à força da sua
caverna, o obrigarem a subir a encosta
rude e escarpada e não o largarem antes
de o terem arrastado até a luz do Sol, não
sofrerá vivamente e não se queixará de
tais violências? E, quando tiver chegado à
luz, poderá, com os olhos ofuscados pelo
seu brilho, distinguir uma só das coisas que
ora denominamos verdadeiras?
Glauco - Não o conseguirá, pelo menos de início.
12. O MITO DA CAVERNA
Sócrates - Terá, creio eu, necessidade de se
habituar a ver os objetos da região superior.
Começará por distinguir mais facilmente as
sombras; em seguida, as imagens dos homens e
dos outros objetos que se refletem nas águas;
por último, os próprios objetos. Depois disso,
poderá, enfrentando a claridade dos astros e da
Lua, contemplar mais facilmente, durante a noite,
os corpos celestes e o próprio céu do que,
durante o dia, o Sol e a sua luz.
Glauco - Sem dúvida.
13. O MITO DA CAVERNA
Sócrates - Por fim, suponho eu, será o
Sol, e não as suas imagens refletidas
nas águas ou em qualquer outra coisa,
mas o próprio Sol, no seu verdadeiro
lugar, que poderá ver e contemplar tal
como é.
Glauco - Necessariamente.
14. O MITO DA CAVERNA
Sócrates – Agora é preciso aplicar, ponto por
ponto, esta imagem ao que dissemos atrás e
comparar o mundo que nos cerca com a vida
da prisão na caverna, e a luz do fogo que a
ilumina com a força do Sol. Quanto à subida à
região superior e à contemplação dos seus
objetos, se a considerares como a ascensão
da alma para a mansão inteligível, não te
enganarás quanto à minha idéia, visto que
também tu desejas conhecê-la. Só Deus sabe
se ela é verdadeira.
15. MITO DA CAVERNA
Quanto a mim, a minha opinião é esta: no
mundo inteligível, a idéia do bem é a última a
ser apreendida, e com dificuldade, mas não se
pode apreendê-la sem concluir que ela é a
causa de tudo o que de reto e belo existe em
todas as coisas; no mundo visível, ela
engendrou a luz e o soberano da luz; no
mundo inteligível, é ela que é soberana e
dispensa a verdade e a inteligência; e é preciso
vê-la para se comportar com sabedoria na vida
particular e na vida pública.
16. Qual é o equívoco sobre a educação?
Sócrates - Se tudo isto é verdadeiro,
temos de concluir o seguinte:
a educação não é o que alguns
proclamam que é, porquanto
pretendem introduzi-la na alma onde
ela não está, como quem tentasse dar
vista a olhos cegos.
Glauco - Mais uma verdade.
17. O que é para Platão a educação?
Sócrates - A educação é, pois, a arte que
se propõe este objetivo, a conversão da
alma, e que procura os meios mais
fáceis e mais eficazes de o conseguir.
Não consiste em dar visão ao órgão da
alma, visto que já a tem; mas, como ele
está mal orientado e não olha para
onde deveria, ela esforça-se por
encaminhá-lo na boa direção.
Glauco - Assim parece.
18. Para Platão qual é a missão do filósofo?
Sócrates - Será nossa tarefa, portanto,
obrigar os mais bem dotados a orientarem-
se para essa ciência que há pouco
reconhecemos como a mais sublime, a
verem o bem e a procederem a essa
ascensão; mas, depois de se terem assim
elevado e contemplado suficientemente o
bem, evitemos permitir-lhes o que hoje se
lhes permite.
Glauco - O quê?
19. Sócrates - Ficar lá em cima, negar-se a
descer de novo até os prisioneiros e
compartilhar com eles trabalhos e honras,
seja qual for o caso em que isso deva ser
feito.
Glauco - Como assim?! Cometeremos em
relação a eles a injustiça de os forçar a
levar uma vida miserável, quando poderiam
desfrutar uma condição mais feliz?
20. MITO DA CAVERNA
Sócrates - Esqueces, meu amigo, que a lei não se
ocupa de garantir uma felicidade excepcional a
uma classe de cidadãos, mas esforça-se por
realizar a felicidade de toda a cidade, unindo os
cidadãos pela persuasão ou a sujeição e levando-
os a compartilhar as vantagens que cada classe
pode proporcionar à comunidade; e que, se ela
forma tais homens na cidade, não é para lhes
dar a liberdade de se voltarem para o lado que
lhes agrada, mas para os levar a participar na
fortificação do laço do Estado.
Glauco - É verdade, tinha me esquecido disso.
21. Sócrates - Aliás, Glauco, nota que não seremos
culpados de injustiça para com os filósofos que se
formarem entre nós, mas teremos justas razões a
apresentar-lhes, forçando-os a encarregar-se da
orientação e da guarda dos outros. Diremos a eles:
Nas outras cidades, é natural que aqueles que se
tornaram filósofos não participem nos trabalhos da
vida pública, visto que se formaram a si mesmos,
apesar do governo dessas cidades; ora, é justo que
aquele que se forma a si mesmo e não deve o
sustento a ninguém não queira pagar o preço disso
a quem quer que seja. Mas vós fostes formados por
nós, tanto no interesse do Estado como no vosso,
para serdes o que são: os reis nas colméias; demos-
vos uma educação melhor e mais perfeita que a
desses filósofos e tornamos-vos mais capazes de
aliar a condução dos negócios ao estudo da
filosofia.
22. Por isso, é preciso que desçais, cada um por sua
vez, à morada comum e vos acostumeis às
trevas que aí reinam; quando vos tiverdes
familiarizado com elas, vereis mil vezes melhor
que os habitantes desse lugar e conhecereis a
natureza de cada imagem e de que objeto ela é
a imagem, porque tereis contemplado
verdadeiramente o belo, o justo e o bem. Assim,
o governo desta cidade, que é a vossa e a
nossa, será uma realidade, e não um apenas
sonho, como o das cidades atuais, onde os
chefes se batem por sombras e disputam a
autoridade, que consideram um grande bem.
Glauco - Perfeitamente.
23. O que é, para Platão, a verdadeira filosofia?
Sócrates - Queres que examinemos
agora como se formarão homens com
este caráter e como os faremos subir
para a luz, como se diz daqueles que
do Hades subiram à mansão dos
deuses?
Glauco - Por que não quereria eu?
24. A verdadeira filosofia?
Sócrates - Não será, certamente, um
simples jogo, rápido e fortuito. Tratar-
se-á de operar a conversão da alma
de um dia tão tenebroso como a noite
para o dia verdadeiro, isto é, elevá-la
até o ser. E é a isso que chamaremos
a verdadeira filosofia.
Glauco - Perfeitamente.
25. Por que tal ciência ainda não foi descoberta?
Sócrates - Se é assim, isso deve-se a dois
motivos:
em primeiro lugar, nenhum Estado honra estas
pesquisas e, como são difíceis, trabalha-se bem
pouco nelas;
em segundo lugar, os investigadores precisam de
um diretor, sem o qual os seus esforços serão
baldados. Temos conosco que é difícil encontrá-
lo. E, se o encontrássemos, no estado atual das
coisas, os que se ocupam destas investigações
não lhe obedeceriam por terem demasiada
arrogância.
26. Por que a ciência da educação sobrevive?
.
Pois, mesmo nos dias de hoje
desprezada pelo vulgo, truncada por
investigadores que não entendem a
sua utilidade, apesar de tudo isso, e só
pela força de seu encanto, ela exerce o
seu fascínio. Portanto, não é de
admirar que esteja na situação em que
a vemos.
27. Como Platão divide e hierarquiza as ciências?
Sócrates - Bastará, então, chamar ciência à primeira
divisão, conhecimento discursivo à segunda, fé à
terceira e imaginação à quarta; as duas últimas
denominaremos opinião, e as duas primeiras,
inteligência. A opinião terá por objeto a
mutabilidade, e a inteligência, a essência.
Devemos acrescentar que a essência está para a
mutabilidade como a inteligência está para a
opinião, a ciência para a fé e o conhecimento
discursivo para a imaginação.
Glauco - Até onde te entendo, concordo contigo.
29. QUAIS CIÊNCIAS DÃO SUPORTE À EDUCAÇÃO?
a ciência dos números
e do cálculo;
a segunda, a geometria;
a terceira, a astronomia;
a dialética.
30. COMO ELAS CONTRIBUEM?
► O RACIOCÍNIO MATEMÁTICO:
conduz naturalmente à pura inteligência;
pode-se ver com mais clareza;
convida insistentemente a refletir;
o entendimento é obrigado a ver a grandeza e
a pequenez não mais misturadas, mas
separadas;
pudemos definir o inteligível e o visível;
visão da unidade em altíssimo grau: vemos a
mesma coisa ao mesmo tempo una e múltipla
até o infinito.
31. COMO ELAS CONTRIBUEM?
► O RACIOCÍNIO GEOMÉTRICO:
busca: a linha reta entre dois pontos;
busca: a planificação das superfícies.
► A ASTRONOMIA:
se ocupa: dos objetos em movimento
e que possuem profundidade;
ciência que faz olhar para o alto.
32. COMO ELAS CONTRIBUEM?
► A DIALÉTICA:
busca a harmonia dos
contrários;
eleva ao sublime;
alcança uma verdade superior.
33.
34. Por que a preferência pela “dialética”?
Portanto, o método dialético é o único
que se eleva, destruindo as hipóteses, até
o próprio princípio para estabelecer com
solidez as suas conclusões, e que
realmente afasta, pouco a pouco, o olhar
da alma da lama grosseira em que está
mergulhado e o eleva para a região
superior, usando como auxiliares para esta
conversão as artes que enumeramos.
37. Qual é a causa do descrédito da filosofia (educação)?
Sócrates - O erro que hoje se comete
provém do fato de se entregarem a este
estudo os que não são dignos dele.
Essa é a causa do desprezo que pesa
sobre a filosofia. Em verdade, não
deveriam se ocupar dela talentos
bastardos, mas apenas talentos legítimos.
Glauco - Não te compreendi.
38. Sócrates - Primeiro, aquele que deseja
consagrar-se a esse estudo não deve ser
manco no seu amor ao trabalho, ou seja,
dedicado para uma parte da tarefa e indolente
para a outra.
Esse é o caso do homem que gosta da ginástica
e da caça e se entrega com afinco a todos os
trabalhos físicos, mas não tem, por outro lado,
nenhum apreço pelo estudo nem pela pesquisa
e é avesso a todo trabalho deste tipo. Também
é manco aquele cujo amor pelo labor se voltou
para o lado oposto.
Glauco - Concordo plenamente.
40. Quais são as qualidades importantes do educador?
Sócrates - E, no que se refere à temperança, à
coragem, à grandeza de alma e a todas as partes
da virtude, devemos atentar em distinguir o indivíduo
bastardo do indivíduo legítimo. Por não saberem
diferenciá-los, os particulares e os Estados não vêem
que acabam escolhendo gente claudicante e bastarda:
aqueles como amigos, estes como chefes.
Glauco - Isso é muito comum.
Sócrates - Assim sendo, devemos tomar sérias
precauções contra todos esses equívocos e
consagrarmos a estudos e a exercícios desta monta só
homens bem constituídos de físico e intelecto.
42. O que diz Platão sobre o uso da força
na educação?
Sócrates - Assim, caríssimo, não uses
de violência para educar as crianças,
mas age de modo que aprendam
brincando, pois assim poderás
perceber mais facilmente as
tendências naturais de cada uma.
Glauco - Como sempre, tuas palavras têm
lógica.
44. Qual é o significado da analogia da criança adotada?
Sócrates - Imagina que uma criança adotada,
criada no seio das riquezas de uma família
numerosa e nobre, no meio de uma multidão de
aduladores, descobrisse, ao tornar-se homem, que
não é o filho daqueles que se dizem seus pais, sem
ter meios de descobrir aqueles que o geraram.
Podes adivinhar os sentimentos que
experimentaria para com os seus aduladores e os
pais adotivos, antes de ter conhecimento da sua
adoção e depois disso?
46. Sócrates - Porém, quando vier a saber a
verdade, adivinho que o seu respeito e as
suas honras diminuirão para com os pais e
aumentarão para com os aduladores, que
obedecerá a estes muito mais do que fazia
antes, dirigirá a sua conduta pelos seus
conselhos e viverá abertamente na sua
companhia, ao mesmo tempo que não se
importará com o pai e os supostos
antepassados, a não ser que seja de
índole muito indulgente.
48. Como pode-se “minar”, segundo
Platão,
uma boa educação e desacreditá-la?
Sócrates - Mas, quando não mais acreditar
que estes princípios são dignos de respeito e
preciosos à sua alma, sem, contudo, ter
descoberto os princípios verdadeiros, será
possível que chegue a um gênero de vida
diferente do que o lisonjeia?
Glauco - Não é possível.
Sócrates - Então, veremos esse homem, de
submisso que era, tornar-se rebelde às leis.
Glauco - Assim terá de ser.
49. E, a mulher pode ser educadora?
Sócrates - E as governantas
também, Glauco, porque
não penses tu que o que eu
disse se aplica mais aos
homens do que às mulheres
que tiverem aptidões
naturais suficientes.
Glauco - Está claro, já que tudo
deve ser igual e comum entre
elas e os homens.
50. EDUCAÇÃO É UTOPIA?
Sócrates - Pois! Concordais agora que as nossas idéias
concernentes ao Estado e à constituição não são
simples utopias, que a sua realização é difícil, mas
possível, de alguma maneira, e não de modo
diferente do que foi dito? Que, quando os
verdadeiros filósofos, quer vários, quer apenas um,
tornados senhores de um Estado, desprezarem as
honras que ora procuram, considerando-as indignas
de um homem livre e desprovidas de todo valor,
fizerem maior caso do dever e das honras, que são
na verdade a sua recompensa e, considerando a
justiça como o bem mais importante e mais
necessário, servindo-a e trabalhando para a sua
prosperidade, organizarão a sua cidade de acordo
com as leis?
51. MITO de ER
Sócrates - Não é a história de Alcino que te vou contar,
mas a de um homem valoroso: Er, filho de Armênio. Ele
morrera numa batalha; dez dias depois, quando
recolhiam os cadáveres já putrefatos, o seu foi
encontrado intacto. Levaram-no para casa, a fim de o
enterrarem, mas, ao décimo segundo dia, quando
estava estendido na pira, ressuscitou. Assim que
recuperou os sentidos, contou o que tinha visto no
além. Quando, disse ele, a sua alma deixara o corpo,
pusera-se a caminhar com muitas outras, e juntos
chegaram a um lugar divino onde se viam na terra duas
aberturas situadas lado a lado, e no céu, ao alto, duas
outras que lhes ficavam fronteiras.
52. MITO DE ER
No meio estavam sentados juízes, que, tendo
dado a sua sentença, ordenavam aos justos que
se dirigissem à direita na estrada que subia até
o céu, depois de terem posto à sua frente um
letreiro contendo o seu julgamento; e aos maus
que se dirigissem à esquerda na estrada
descendente, levando, eles também, mas atrás,
um letreiro em que estavam indicadas todas as
suas ações. Como ele se aproximasse, por seu
turno, os juízes disseram-lhe que devia ser para
os homens o mensageiro do além e
recomendaram-lhe que ouvisse e observasse
tudo o que se passava naquele lugar.
53. MITO DE ER
Viu as almas que se iam, uma vez julgadas, pelas
duas aberturas correspondentes do céu e da terra;
pelas duas outras entravam almas que, de um lado,
subiam das profundezas da terra, cobertas de sujeira
e pó. Do outro, desciam, puras, do céu, e todas
essas almas que chegavam sem cessar, pareciam ter
feito uma longa viagem. Chegavam à planície com
alegria e acampavam aí como num dia de festa. As
que se conheciam desejavam-se as boas-vindas, e as
que vinham do seio da terra informavam-se do que
se passava no céu. As demais, que vinham do céu,
informavam do que se passava debaixo da terra.
54. MITO DE ER
Diziam muitas coisas, Glauco, que exigiriam
muito tempo para ser relatadas. Mas aqui está
o resumo, segundo Er. Por determinado
número de injustiças que tinha cometido em
detrimento de uma pessoa e por determinado
número de pessoas em detrimento das quais
tinha cometido a injustiça, cada alma recebia,
para cada falta, dez vezes a sua punição e
cada punição durava cem anos, ou seja, a
duração da vida humana, a fim de que a
expiação fosse o décuplo do crime.
55. MITO DE ER
Os que, em vez disso, tinham praticado o bem
à sua volta, tinham sido justos e piedosos,
recebiam, na mesma proporção, a
recompensa merecida. A respeito dos que
foram mortos ainda na infância ou que
viveram apenas alguns dias, Er dava outros
pormenores, que não merece a pena referir.
Para a impiedade e a piedade em relação aos
deuses e aos pais e para o homicídio, havia,
segundo ele, castigos e recompensas ainda
maiores.
56. Qual será o pior castigo
Vimos de súbito esse tal Ardieu com outros, a maior
parte, tiranos como ele, mas havia também particulares
que se tinham tornado culpados de grandes crimes.
Estes julgavam poder subir, mas a abertura recusou-lhes
a passagem e mugia sempre que tentava sair um desses
homens que se tinham consagrado inteiramente ao mal.
Quanto a Ardieu e aos outros, depois de lhes terem
manietado e amarrado os pés e a cabeça, derrubaram-
nos, esfolaram-nos, depois arrastaram-nos para fora do
caminho e fizeram-nos dobrar sobre arbustos
espinhosos, declarando a todos os que passavam por
que motivo os tratavam assim e que iam precipitá-los no
Tártaro”.
57. O Tártaro
Nesse lugar tinham sentido terrores de toda
espécie, mas este sobrepunha-se a todos:
cada um temia que o mugido se fizesse ouvir
no momento em que deveria subir e foi para
eles uma viva alegria poderem subir sem
que ele rompesse o silêncio. Tais eram, mais
ou menos, as penas e os castigos, assim
como as recompensas correspondentes.
59. Parece que é aqui, Glauco, que reside
para o homem o maior perigo. Aqui
está a razão por que cada um de nós,
pondo de lado qualquer outro estudo,
deve, sobretudo, preocupar-se em
procurar e cultivar este, ver se está em
condições de conhecer e descobrir o
homem que lhe dará a capacidade e a
ciência de distinguir as boas e as más
condições e, na medida do possível,
escolher sempre as melhores.
60. A ESCOLHA DECIDE O FUTURO
Na verdade, vimos que, durante esta vida e depois
da morte, é a melhor escolha que se pode fazer. E é
preciso defender esta opinião com absoluta
inflexibilidade ao descer ao Hades, para que também
lá não se deixe deslumbrar pelas riquezas e pelos
miseráveis objetos desta natureza; não se exponha,
lançando-se sobre tiranias ou condições afins,
causando, assim, males sem número e sem remédio
e sofrendo, por conseguinte, outros ainda maiores;
para saber, pelo contrário, escolher sempre uma
condição intermediária e evitar os excessos nos dois
sentidos, nesta vida, tanto quanto possível, e em
toda a vida futura, porque é a isto que se liga a
maior felicidade humana.
62. FELICIDADE PRESENTE
E foi assim, Glauco, que o mito foi salvo do
esquecimento e não se perdeu, e pode
salvar-nos, se lhe prestarmos fé; então
atravessaremos com facilidade o Lete e não
mancharemos a nossa alma. Portanto, se
acreditas em mim, crendo que a alma é
imortal e capaz de suportar todos os males,
assim como todos os bens, nos
manteremos sempre na estrada ascendente
e, de qualquer maneira, praticaremos a
justiça e a sabedoria.
63. A FELICIDADE FUTURA
Assim estaremos de acordo conosco e
com os deuses, enquanto estivermos
neste mundo e quando tivermos
conseguido os prêmios da justiça, como
os vencedores que se dirigem à
assembléia para receberem os seus
presentes. E seremos felizes neste mundo
e ao longo da viagem de mil anos que
acabamos de relatar.
64. EDUCAÇÃO É TRASCENDÊNCIA
No sentido inter-pessoal = EU TU
No sentido social = EU NÓS
No sentido espiritual = EU DEUS
66. A HISTÓRIA DA GRANDE TORRE
Num tempo não muito distante do nosso, a
humanidade ficou tão caótica que os homens
fizeram um grande concurso. Eles queriam saber
qual a profissão mais importante da sociedade.
Os organizadores do evento construíram uma
grande torre dentro de um enorme estádio com
degraus de ouro, cravejados de pedras preciosas.
A torre era belíssima. Chamaram a imprensa
mundial, a TV, os jornais, as revistas e as rádios
para realizarem a cobertura.
67. AS REGRAS DA DISPUTA
O mundo estava plugado no evento. No estádio,
pessoas de todas as classes sociais se espremiam
para ver a disputa de perto. As regras eram as
seguintes: cada profissão era representada por
um ilustre orador. O orador deveria subir
rapidamente num degrau da torre e fazer um
discurso eloqüente e convincente sobre os
motivos pelos quais sua profissão era a mais
importante da sociedade moderna. O orador tinha
de permanecer na torre até o final da disputa. A
votação era mundial e pela Internet.
68. O PRIMEIRO ORADOR: O PSIQUIATRA
Ele subiu na torre e a plenos pulmões
proclamou: “As sociedades modernas se
tornarão uma fábrica de estresse. A depressão
e a ansiedade são as doenças do século. As
pessoas perderam o encanto pela existência.
Muitas desistem de viver. A indústria dos
antidepressivos e dos tranquilizantes se tornou
a mais importante do mundo.”
69. 0 SEGUNDO ORADOR: O JUIZ
Ele subiu num degrau mais alto e num gesto
de ousadia desferiu palavras que abalaram os
ouvintes: “Observem os índices de violência!
Eles não param de aumentar. Os seqüestros,
assaltos e a violência no trânsito enchem as
páginas dos jornais. A agressividade nas
escolas, os maus-tratos infantis, a
discriminação racial e social fazem parte da
nossa rotina. Os homens amam seus direitos
e desprezam seus deveres.”
70. O TERCEIRO ORADOR: O MILITAR
Com uma voz vibrante e sem delongas, ele
discursou: “Os homens desprezam o valor da vida.
Eles se matam por muito pouco. O terrorismo
elimina milhares de pessoas. A guerra comercial
mata milhões de fome. A espécie humana se
esfacelou em dezenas de tribos. As nações só se
respeitam pela economia e pelas armas que
possuem. Quem quiser a paz tem de se preparar
para a guerra. Os poderes econômico e bélico, e
não o diálogo, são os fatores de equilíbrio num
mundo espúrio.”
71. AÇÃO X DISCURSO
Quando todos pensavam que a disputa havia
se encerrado, ouviu-se uma conversa no sopé
da torre. De quem se tratava? Desta vez eram
os professores. Havia um grupo deles da pré-
escola, do ensino fundamental, do médio e do
universitário. Eles estavam encostados na
torre dialogando com um grupo de pais.
Ninguém sabia o que estavam fazendo. A TV
os focalizou e projetou num telão. O mediador
gritou para um deles subir na torre. Eles se
recusaram.
72. A EDUCAÇÃO COMEÇA PELA BASE
Quando todos pensavam que eles eram frágeis, os
professores, com o incentivo dos pais, começaram a
debater as idéias, permanecendo no mesmo lugar.
Todos se faziam representar.
Um dos professores, olhando para o alto, disse para
o representante dos psiquiatras: “Nós não queremos
ser mais importantes do que vocês. Apenas
queremos ter condições para educar a emoção dos
nossos alunos, formar jovens livres e felizes, para
que eles não adoeçam e sejam tratados por vocês.”
O representante dos psiquiatras recebeu um golpe
na alma.
73. EDUCAR É TER DIREITOS
Em seguida, um outro professor que estava no
lado direito da torre olhou para o representante
dos magistrados e disse: “Jamais tivemos a
pretensão de ser mais importantes do que os
juízes. Desejamos apenas ter condições para
lapidar a inteligência dos nossos jovens, fazendo-
os amar a arte de pensar e aprender a grandeza
dos direitos e dos deveres humanos. Assim,
esperamos que jamais se sentem num banco dos
réus.” O representante dos magistrados tremeu
na torre.
74. A FORÇA DO AMOR
Uma professora do lado esquerdo da torre encarou o
representante das forças armadas e falou: “Os
professores do mundo todo nunca desejaram ser
mais poderosos nem mais importantes do que os
membros das forças armadas. Desejamos apenas ser
importantes no coração das nossas crianças.
Almejamos levá-las a compreender que cada ser
humano não é mais um número na multidão, mas
um ser insubstituível, um ator único no teatro da
existência.”
75. EDUCAR É TER AMOR PELA VIDA
A professora fez uma pausa e completou: “Assim,
eles se apaixonarão pela vida, e, quando estiverem
no controle da sociedade, jamais farão guerras,
sejam guerras físicas que retiram o sangue, sejam
as comerciais que retiram o pão. Pois cremos que os
fracos usam a força, mas os fortes usam o diálogo
para resolver seus conflitos. Cremos ainda que a
vida é obra-prima de Deus, um espetáculo que
jamais deve ser interrompido pela violência
humana.”
76. EDUCAÇÃO É UM IDEAL DE VIDA
Diante disso, os políticos, os
representantes das classes profissionais e
os empresários fizeram uma reunião com
os professores em cada cidade de cada
nação. Reconheceram que tinham
cometido um crime contra a educação.
Pediram desculpas e rogaram para que eles
não abandonassem seus filhos.
77. EDUCAÇÃO É PRIORIDADE
Pela primeira vez, a sociedade colocou
a educação no centro das suas
atenções. A luz começou a brilhar
depois da longa tempestade... No final
de dez anos os resultados apareceram,
e depois de vinte anos todos ficaram
boquiabertos.
78. compartilhe
A editora e o autor permitem o uso do
texto da “grande torre” para encenação
teatral nas escolas, com o objetivo de
homenagear os pais e os mestres, desde
que citada a fonte (NA).
CURY, Augusto. Pais brilhantes – Professores
fascinantes. Rio de Janeiro: Sextante, 2003.
79. ONDE ENCONTRAR
As lâminas aqui apresentadas se encontram
a disposição no site:
www.nereuhaag.com.br
no ícone Palestras
Muito obrigado pela oportunidade.
Prof. Nereu Ruben Haag