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V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22 - setembro 2005.




      A FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA A DIVERSIDADE NA
               PERSPECTIVA DE PAULO FREIRE

                                      Abigail Guedes Magalhães1
                                    Anderson dos Santos Romualdo2
                                      Maria Cristina Garcia Lima3
                                     Regina Coeli Barbosa Pereira4
                                   Sâmya Petrina Pessoa de Oliveira5

RESUMO

       A discussão sobre a formação de professores nos leva a refletir uma educação acessível a todos e
       que respeite as peculiaridades humanas, o que nos remete ao pensamento de Paulo Freire. Torna-se
       necessária uma (re)significação nos diversos segmentos sociais e a escola, como uma instituição
       inserida numa sociedade plural e cambiante, discute a possibilidade de mudança, buscando romper
       com os entraves pelos quais a educação vem passando. Na realização de uma prática escolar
       inclusiva devem-se considerar os sujeitos historicamente constituídos como seres capazes da
       transformação e com direito a participar do processo de construção do mundo. O objetivo de nosso
       trabalho é oportunizar aos educadores uma reflexão crítica da historicidade do processo
       educacional, visando uma educação humanista, que tem como um de seus principais pilares a
       realização de uma práxis voltada para a diversidade.
       Palavras-chave: Formação de professores – diversidade – educação.


                            Se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade
                            muda. Se a nossa opção é progressista, se estamos a favor da vida e não da morte, da
                            eqüidade e não da injustiça, do direito e não do arbítrio, da convivência com o
                            diferente e não de sua negação, não temos outro caminho se não viver plenamente a
                            nossa opção. Encarná-la, diminuindo assim a distância entre o que fizemos e o que
                            fazemos. (FREIRE, 2000, p. 67).


Nos dias atuais os debates sobre a educação para a diversidade fazem-se cada vez mais
intensos pela urgência das mudanças que se fazem necessárias e que oportunize uma educação
para todos. Dessa forma, buscamos discutir uma prática que compreenda o desenvolvimento
do sujeito numa dimensão histórica, social e cultural que atenda as suas peculiaridades e
respeite as diferenças. Buscamos, assim, na pedagogia humanista esses fundamentos cuja
reflexão Paulo Freire (2003) denomina como prática-educativo-progressista, que deve se
desenvolver baseada numa relação de autonomia do educando, ou seja, transformar sua
curiosidade ingênua e crítica em conhecimento.

Compreender o desenvolvimento da consciência crítico-reflexiva como uma característica de
construção faz parte de uma ética universal. Mas será que nós educadores e educadoras
estamos preparados para exercer essa prática crítico-reflexiva? Ao discorrer sobre essas
questões, Freire (2003) nos esclarece que:



1
  Especialista em Educação. Núcleo de Educação Especial da UFJF (abigailguedes@terra.com.br).
2
  Graduando em Pedagogia pela UFJF e bolsista IC/CNPq (asaromualdo@yahoo.com.br).
3
  Graduanda em Pedagogia pela UFJF e bolsista PIBIC-UFJF/CNPq. (jequeri@sdnet.com.br).
4
  Doutora em Filosofia. Professora da UFJF (nesp@faced.ufjf.br).
5
  Graduanda em Pedagogia pela UFJF (samyapetrina@hotmail.com).

                                                                                                           1
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                        Não é possível pensar os seres humanos longe sequer da ética, quanto mais fora
                        dela. Estar longe ou pior, fora da ética, entre nós, mulheres e homens é uma
                        transgressão. É por isso que transformar a experiência educativa em puro
                        treinamento técnico é amesquinhar o que há de fundamentalmente humano no
                        exercício educativo: o seu caráter formador. Se se respeita a natureza do ser
                        humano, o ensino dos conteúdos não pode dar-se alheio à formação moral do
                        educando. (p.33).


Nesse aspecto, temos que considerar a ética presente também nas ações e relações do nosso
cotidiano escolar que se fortalece nas atitudes e comportamentos vivenciados quando
permitimos que o educando ou a educanda atue como ser histórico-social escolhendo,
intervindo, criticando, rompendo, comparando, e tomando decisões. Sendo assim, a
problematização das questões deve ser debatida no coletivo de nossas salas de aula e
apoiarem-se no respeito às opiniões do outro. Neste sentido, Freire (2001) ressalta que a tarefa
fundamental do educador e da educadora é:

                        [...] uma tarefa libertadora. Não é para encorajar os objetivos do educador e as
                        aspirações e os sonhos a serem reproduzidos nos educandos, os alunos, mas para
                        originar a possibilidade de que os estudantes se tornem donos de sua própria
                        história. É assim que eu entendo a necessidade que os professores têm de
                        transcender sua tarefa meramente instrutiva e assumir a postura ética de um
                        educador que acredita verdadeiramente na autonomia total, liberdade e
                        desenvolvimento daqueles que ele ou ela educa. (p.78).


Quando aprofundamos essa discussão compreendemos que a construção do conhecimento se
faz de forma mais dinâmica, em ambientes heterogêneos, onde a diferença seja percebida
como aspecto positivo no processo educativo. As diferenças de gêneros, etnias, religiosas e
outras passarão a ser consideradas como fatores desencadeantes de novos construtos. Os
embates e conflitos decorrentes desse novo momento onde se estabelecem as mudanças nos
apontarão para um fazer coletivo diferenciado e, conseqüentemente, para a busca de
metodologias que atendam a todos os alunos.

Ao afirmar que “formar é muito mais que puramente treinar o educando no desempenho de
destrezas” (FREIRE, 2003, p.14), Freire nos convida a repensar nossa prática educativa. É
necessário que o professor assuma-se como sujeito da produção do saber e saiba que ensinar
não é transferir conhecimentos, mas criar possibilidades para a sua construção. Portanto,
formar e ser professor, é uma relação de comunhão, aceitação de valores inerentes a cada
sujeito de aprendizagem envolvido nesse processo.

Uma adequada formação do professor é de fundamental importância para o exercício de sua
prática, pela postura que irá adotar no encaminhamento de suas ações. Nos últimos anos, essa
formação tem passado por uma revisão crítica substantiva, uma vez que muito se tem
questionado sobre o papel da educação na sociedade e a falta de clareza sobre a função do
educador.

Isso remete à questão da formação tradicional dos educadores que acontece desvinculada da
situação político-social e cultural do país e que considera o professor como um especialista
em conteúdos, um transmissor de saberes acumulados, desvinculados da realidade do aluno e
do contexto social mais amplo.


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No início dos anos 70, essa formação apresentou um caráter simplesmente instrumental, como
conseqüência da influência do desenvolvimento tecnológico e científico. A educação se
constituía em elaboração e execução de planos de ensino dentro de uma visão sistêmica.

O professor foi transformado em um simples transmissor acrítico e mecânico de
conhecimentos e informações. Sua formação ficou reduzida à aquisição de instrumentos que
propiciassem a transmissão desse conteúdo. A ênfase exclusiva no treinamento técnico do
professor acabou prejudicando sua formação profissional. Este aprendeu como fazer, mas não
aprendeu para que fazer.

A partir dos anos 80 surge um movimento de consciência política e cultural no país e ao
mesmo tempo emerge a necessidade do professor estar ciente de seu papel de agente sócio-
político. Foi preciso analisar e redimensionar a função da dimensão pedagógica do ensino,
neste novo contexto. E ainda superar a preocupação maior com a modernização de métodos
de ensino e recursos tecnológicos para se preocupar com as novas funções sociais e políticas
da educação.

A perspectiva crítica educacional fez com que essa formação tomasse novos rumos. O
discurso do compromisso político do professor, a procura de novas alternativas de
competência, a conscientização sobre o seu papel e da educação para a sociedade passaram a
ser a principal preocupação dos envolvidos com a tarefa docente. O questionamento dos
educadores apontava para o que seria uma competência profissional englobando a dimensão
política do ato pedagógico. Neste sentido, Freire (2003) nos remete a seguinte reflexão:

                        E que dizer de educadores que se dizem progressistas mas de prática pedagógico-
                        política eminentemente autoritária? Não é por outra razão que insisti tanto, em
                        Professora sim, Tia não, na necessidade de criarmos, em nossa prática docente, entre
                        outras, a virtude da coerência. Não há nada talvez que desgaste mais um professor
                        que se diz progressista do que sua prática racista, por exemplo. É interessante
                        observar como há mais coerência entre os intelectuais autoritários, de direita ou de
                        esquerda. Dificilmente, um deles ou uma delas respeita e estimula a curiosidade
                        crítica nos educandos, o gosto da aventura. Dificilmente contribui, de maneira
                        deliberada e consciente, para a constituição e a solidez da autonomia do ser do
                        educando. De modo geral, teimam em depositar nos alunos apassivados a descrição
                        do perfil dos conteúdos, em lugar de desafiá-los a apreender a substantividade dos
                        mesmos, enquanto objetos gnosiológicos, somente como os aprendem. (p.109-10).


Ser sujeito de experiência não é somente ser sujeito de informação, de opinião, do trabalho,
do saber, do julgar, do fazer, do poder, do querer, pois, o verdadeiro sentido de experiência se
fundamenta no diálogo, que permite que haja transformação dos sujeitos envolvidos nesse
processo. É saber escutar, refletir, apreender a lentidão, dialogar com o outro, para enxergar
neste a diversidade dos saberes, tendo consciência de que somos seres inacabados enquanto
estivermos convivendo e experimentando com o outro o prazer da busca do conhecimento.
Este conhecimento sempre virá a somar na formação humana, jamais podendo defini-la.

Os homens então, dotados de uma racionalidade, estão a cada momento em busca de ser mais,
em busca de sua própria compreensão enquanto sujeitos sócio-histórico-interacionistas.
Portanto, Freire entende os homens e mulheres como seres inconclusos, ou seja, em constante
processo de busca e construção. E ainda os reconhece como:


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                        [...] seres que estão sendo, seres inacabados, inconclusos em e com uma realidade
                        que, sendo histórica também, é igualmente inacabada. Na verdade, diferentemente
                        dos outros animais, que são apenas inacabados, mas não são históricos, os homens
                        se sabem inacabados. Têm a consciência de sua inconclusão. (FREIRE, 2002, p. 72-
                        3).


E esse inacabamento, ou melhor, a consciência dele, é condição sine qua non do ser humano.
E a partir desta conscientização, o homem e a mulher possibilitam a abertura para buscar em
seu interior sua própria transformação; tornam-se mais críticos para o enfrentamento das
situações-limites que lhes são impostas socialmente. Nas palavras de Freire (2003):
                        É na inconclusão do ser, que se sabe como tal, que se funda a educação como
                        processo permanente. Mulheres e homens se tornaram educáveis na medida em que
                        se reconheceram inacabados. Não foi a educação que fez mulheres e homens
                        educáveis, mas a consciência de sua inconclusão é que gerou sua educabilidade. É
                        também na inconclusão de que nos tornamos conscientes e que nos inserta no
                        movimento permanente de procura que se alicerça a esperança. “Não sou
                        esperançoso”, disse certa vez, por pura teimosia, mas por exigência ontológica.
                        (p.58).


Para apreendermos este sentido de experiência é preciso entender que a aprendizagem se dá
nas interações, nas interlocuções, nas trocas, portanto, a nossa busca é constante e não
passageira, enquanto sujeitos inconclusos e abertos a desvendar os saberes que a experiência
tem a nos oferecer.

Freire (2002) nos aclara essa questão do ser inconcluso, em especial educador ou educadora e
sua práxis, quando diz que:
                        Aí se encontram as raízes da educação mesma, como manifestação exclusivamente
                        humana. Isto é, na inconclusão dos homens e na consciência que dela têm. Daí que
                        seja a educação um quefazer permanente. Permanente, na razão da inconclusão dos
                        homens e do devenir da realidade. Desta maneira, a educação se re-faz
                        constantemente na práxis. Para ser tem que estar sendo. (p.73).


O ser ex-posto na experiência corre o risco de ser transformado por esta, pois, se ele não
consegue problematizar as ações do cotidiano escolar, ele não internalizará estas
transformações, nunca terá sensação de completude. O sujeito de experiência corre o perigo
de se indignar, ou seja, não se conformar com a situação posta, buscando sempre respostas às
suas indagações, nunca se acomodando. Portanto, experiência não é prática, pois essa nem
sempre está sensível e reflexiva ao momento vivido.

A formação de um profissional competente, necessário às novas condições econômicas,
políticas, sociais e culturais do país exige um preparo adequado. As dimensões técnica e
política da educação tornam-se os elementos norteadores das propostas de ensino.

A escola hoje requisita um professor que expresse em seu fazer pedagógico as dimensões
humana, tecnológica e política e que seja capaz de visualizar os efeitos sociais do trabalho
pedagógico e dos condicionamentos que nele interferem, que saiba selecionar criticamente as
orientações de sua práxis.

A preocupação básica na formação de professores não pode ser somente a de lhes oferecer os
conteúdos das disciplinas pedagógicas, mas também a de preparar profissionais

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comprometidos com um projeto de sociedade voltado para a construção do homem integral –
ético, estético, político e social.

A competência técnica e o compromisso político do professor certamente eliminará de sua
prática o subterfúgio de culpar somente o aluno pelo fracasso escolar e excluir aqueles que
apresentem dificuldades de aprendizagem.

Há urgência em preparar educadores aptos a enfrentar os desafios colocados por uma
sociedade em mudança. Ser educador nesta nova dimensão significa comprometimento com a
construção de uma nova realidade.

É preciso formar o professor restaurando-lhe o seu “ser docente”, no sentido ontológico para
que possa exercer uma prática humanizada.

A prática pedagógica se desenvolve como instrumento de manutenção ou transformação do
status quo. A formação do professor pode significar a tentativa de modificar ou manter não
somente o trabalho pedagógico-educativo, mas também o processo histórico da sociedade
como um todo.

Freire faz uma crítica à pedagogia tradicional denominada por ele “educação bancária”, sendo
esta o exercício de uma prática massificadora, de treinamento, na qual os educandos tornam-
se meros receptores de conteúdos que são “depositados” pelos educadores de forma a manter
os primeiros à margem do conhecimento e de sua razão de existir. Nesta educação, a relação
existente entre os envolvidos no processo ocorre verticalmente, já que os educandos
transformam-se em reprodutores e copiadores, ou seja, sujeitos a-críticos, tendo o discurso do
educador como verdade absoluta, não intervindo no processo educacional em momento
algum. Freire (2002) ressalta que este tipo de educação:

                        [...] conduz os educandos à memorização mecânica do conteúdo narrado [...] os
                        transforma em “vasilhas”, em recipientes a serem “enchidos” pelo educador. Quanto
                        mais vá “enchendo” os recipientes com seus “depósitos”, tanto melhor educador
                        será. Quanto mais se deixarem docilmente “encher”, tanto melhores educandos
                        serão. Desta forma, a educação se torna um ato de depositar, em que os educandos
                        são os depositários e o educador o depositante (p.58).


Contrapondo-se a esta prática, Freire propõe uma educação problematizadora, que forme um
sujeito crítico, participativo e atuante na sociedade com o objetivo de transformá-la para que
todos tenham iguais oportunidades. Esta é a “educação libertadora” que Freire defende como
justa e igualitária e que desperta no indivíduo a sua vocação ontológica, ou seja, ser sujeito de
sua própria realidade. Nesta perspectiva, a relação existente é horizontal, pois a troca de
experiências e conhecimentos entre educador e educando é constante, e um não se sobrepõe
ao outro. Nas palavras de Freire (2002):

                        Não seria possível à educação problematizadora, que rompe com os esquemas
                        verticais característicos da educação bancária, realizar-se como prática da liberdade,
                        sem superar a contradição entre o educador e os educandos. [...] Desta maneira, o
                        educador já não é o que apenas educa, mas o que, enquanto educa, é educado, em
                        diálogo com o educando que, ao ser educado, também educa. Ambos, assim, se



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                               tornam sujeitos do processo em que crescem juntos e em que os “argumentos de
                               autoridade” já não valem. (p. 68).


A prática pedagógica não comporta mais o ato de depositar ou de apenas transmitir
conhecimentos e valores que condicionam o aluno a uma visão parcializada da realidade. Ela
deve se estabelecer a partir do conhecimento existente, elaborando novos conhecimentos.
Assim, esta prática se transforma em uma situação gnosiológica, com o desenvolvimento de
uma postura ativa e co-participante dos sujeitos nela envolvidos.

Por ser tarefa de “sujeitos”, o conhecimento exige ação e reflexão do homem sobre o mundo,
sobre a realidade em que vive. A reflexão leva os alunos a assumirem uma postura crítica
diante dos problemas com os quais se deparam no dia-a-dia.

Para Freire (1981), o ato de conhecer envolve um movimento dialético que vai da ação à
reflexão sobre ela e desta a uma nova ação “para o educando conhecer o que antes não
conhecia, deve engajar-se num autêntico processo de abstração por meio do qual reflete sobre
a totalidade “ação-objeto”, ou, em outras palavras, sobre formas de orientação no mundo”
(p.50).

Todo problema requer contextualização. Ele não pode ser analisado de modo parcial,
isoladamente, mas numa perspectiva global, relacionando-se o aspecto em questão com o
contexto no qual acontece. A problematização elimina a memorização e a repetição mecânica
dos conhecimentos e faz com que o aluno perceba a realidade dos fatos de forma mais
aprofundada. É a problematização, portanto, que torna autêntica a aprendizagem e propicia o
domínio do conhecimento de forma efetiva.

A conscientização possibilita ao aluno inserir-se no processo histórico; reconhecer que o
homem faz a história e que é capaz de mudar o seu rumo. Conforme Freire (1980), a
conscientização produz a desmitologização, ou seja, propicia ao educando reconhecer os
mitos que camuflam a realidade social para melhor decifrá-la. A conscientização acontece
quando se ultrapassa a simples apreensão do fato, para analisá-lo de forma crítica. Quando se
permite aflorar a consciência racional o homem passa a orientar suas ações pelo pensamento,
por meio da lógica. Dessa forma, educar pela conscientização significa possibilitar a busca de
plenitude da condição humana.

Segundo Freire (2002):
                               Somente o diálogo, que implica um pensar crítico, é capaz, também, de gerá-lo. Sem
                               ele não há comunicação e sem esta não há verdadeira educação. A que, operando a
                               superação da contradição educador-educandos, se instaura como situação
                               gnosiológica, em que os sujeitos incidem seu ato cognoscente sobre o objeto
                               cognoscível que os mediatiza. (p.83).


Agindo assim, o educador possibilita ao aluno a oportunidade de elaborar seu pensamento,
aprofundar a compreensão que tem de si, do outro, do mundo, do contexto social mais amplo.
Este método de ensino dialógico acompanha algo da maiêutica socrática6, fazendo com que o

6
  O método socrático, como é denominado, consiste numa dialética, em que a discussão se desenvolve em dois tempos, - a
ironia e a maiêutica. A ironia socrática consiste em perguntar, fingindo desconhecer o assunto (= dúvida fictícia e
metódica), com vistas a refutar a tese contrária e preparar a tese verdadeira. A maiêutica (de: "4 , b T = parir) de Sócrates
conduz o interlocutor a descobrir paulatinamente o conhecimento sobre o objeto de discussão. No caso de Sócrates que

                                                                                                                        6
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aluno por si, sob orientação do professor possa elaborar conhecimento, adquirir informações.

A reflexão, a conscientização, só podem acontecer por meio do diálogo do qual o educador
deverá fazer uso constante. Na medida em que a prática educativa não pode acontecer pela
simples transferência acrítica do conhecimento, o diálogo torna-se, portanto, elemento
imprescindível para o processo educativo. Ele se constitui no encontro de sujeitos
interlocutores na busca da compreensão e significação para o conhecimento que se desvela.
Acontece com a co-participação de sujeitos no ato de pensar.

É na dialogicidade e na problematização que educador e educando, conjuntamente, adquirem
uma postura crítica e o domínio do conhecimento. De acordo com Freire (2003), não pode
haver diálogo se não há humildade e se não se reconhece a possibilidade de uma constante
troca com o outro. O autor nos questiona:

                              Como posso dialogar, se alieno a ignorância, isto é, se a vejo sempre no outro, nunca
                              em mim?


Como posso dialogar, se me admito como um homem diferente, virtuoso por herança, diante
dos outros, meros “isto”, em quem não reconheço outros eu?

                              Como posso dialogar, se me sinto participante de um gueto de homens puros, donos
                              da verdade e do saber, para quem todos os que estão fora são “essa gente”, ou são
                              “nativos inferiores”? Como posso dialogar se parto de que a pronúncia do mundo é
                              tarefa de homens seletos e que a presença das massas na história é sinal de sua
                              deterioração que devo evitar? Como posso dialogar, se me fecho à contribuição dos
                              outros, que jamais reconheço, e até me sinto ofendido com ela? Como posso
                              dialogar se temo a superação e se, só em pensar nela, sofro e definho? (p. 80-1).


É pelo diálogo que o professor vai fazer com que o aluno caminhe, desenvolva seu raciocínio,
tome posicionamentos. Mas, em Freire, o diálogo não exclui o conflito, e sim, ativa
discussões, solicita participação e presença do educando. O diálogo não é uma discussão
polêmica nem mesmo hostil entre o educador e o educando, mas é o elemento básico da
conscientização, da busca do saber, da verdade. É uma ação conjunta, que requer
envolvimento de todos os envolvidos no processo ensino-aprendizagem. Para isso, o professor
precisa ter atitude de abertura, de aceitação do outro com sua subjetividade. Daí o que se põe
em evidência é a unidade educador-educando, num processo de intercomunicação. O
professor que tem respostas prontas obriga o aluno a se calar, elimina o diálogo e estabelece
uma relação de poder entre eles, ao mesmo tempo em que bloqueia a capacidade de pensar do
educando, ou melhor, sua capacidade de ser.

Com a chamada quebra de paradigmas, deflagradas na Modernidade e refletidas na atual
sociedade, muitas das práticas educacionais que por vezes se mostraram puramente
tecnicistas, vieram à tona nas discussões de toda a esfera educacional. E, no que tange aos
indivíduos envolvidos nesse processo, os educandos passaram a ser vistos, por uma corrente

supunha haver idéias inatas, a maiêutica consistia, mais precisamente, em fazer recordar, despertando os conhecimentos
virtualmente possuídos. [...]. Além disto, a maiêutica era caracterizada pela sua concepção inatista, bem como pelo fato de
havê-la denominado em função à profissão de sua mãe, que era parteira. (http://www.cfh.ufsc.br/~simpozio/
novo/2216y098.htm).


                                                                                                                      7
V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22 - setembro 2005.




progressista, como agentes da transformação social, ou seja, como seres-sujeito do quefazer.

Sendo assim, a questão da individualidade impulsionou, ou ao menos abriu espaço para uma
reflexão crítica, um novo olhar dos educadores, que até então mantinham a idéia de classe
homogênea. Cada ser é dotado de individualidade, contexto social e, principalmente, um fato
que é essencial na educação, cada educando tem seu nível de desenvolvimento.
Conseqüentemente, uma classe escolar é heterogênea em todos os seus aspectos.

Os alunos considerados fora dos padrões socialmente estabelecidos de “normalidade”, em
face de um pensamento conservador, ficam marginalizados, estereotipados, segregados do
convívio com os ditos “normais”. Em algumas sociedades, ser negro, ser velho, ser mulher,
ser criança, ser deficiente etc., representou ao longo dos tempos – e ainda representa – uma
condição de subalternidade de direitos e desempenho de funções sociais.

As diversas formas de discriminação são reflexos da padronização social, que é ingenuamente
explicada, por uma visão caritativa ou mesmo de proteção, chegando até no discurso em prol
da segregação para se fazer um treinamento para posterior convívio social.

É nesse contexto de discriminação que Freire se posicionou contra todo um sistema social que
exclui um indivíduo mediante um fator peculiar do sujeito. Isto é uma perversidade do
homem moderno. Freire (2003) declarou que:

                        Aceitar e respeitar a diferença é uma dessas virtudes sem o que a escuta não se pode
                        dar. Se discrimino o menino ou menina pobre, a menina ou o menino negro, o
                        menino índio, a menina rica; se discrimino a mulher, a camponesa, a operária, não
                        posso evidentemente escutá-las e se não as escuto, não posso falar com eles, mas a
                        eles, de cima para baixo. Sobretudo, me proíbo entendê-los. Se me sinto superior ao
                        diferente, não importa quem seja, recuso-me escutá-lo ou escutá-la. O diferente não
                        é o outro a merecer respeito é um isto ou aquilo, destratável ou desprezível. (p. 120-
                        1).


Na realização de uma prática escolar inclusiva devem-se considerar os sujeitos historicamente
constituídos como seres capazes da transformação e com direito a participar do processo de
construção do mundo. Para isso torna-se necessária a construção de uma nova ética. Neste
sentido, Freire (2003), em relação à ética universal esclarece que:

                        Quando, porém, falo da ética universal do ser humano estou falando da ética
                        enquanto marca da natureza humana, enquanto algo absolutamente indispensável à
                        convivência humana. Ao fazê-lo estou advertido das possíveis críticas que, infiéis ao
                        meu pensamento, me apontarão como ingênuo e idealista. Na verdade, falo da ética
                        universal do ser humano da mesma forma como falo de sua vocação ontológica para
                        o ser mais, como falo de sua natureza constituindo-se social e historicamente não
                        como um a priori da História. (p.18).


Dessa forma, compreender o conceito de inclusão em seu sentido amplo significa reestruturar
a nossa práxis, reavaliar as interações do nosso cotidiano escolar e adequá-las à realidade
social e cultural de nossos alunos. A escola inclusiva deve ser aquela que busca construir no
coletivo uma pedagogia que atenda a todos os alunos e que compreenda a diversidade humana
como fator impulsionador dessa nova forma de organizar as aprendizagens.


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Se um dos princípios da inclusão é a celebração das diferenças, entendê-la como agente de
transformação de nossa realidade educacional é respeitar nos educandos suas singularidades.
É fazer do nosso espaço escolar o lugar onde as experiências coletivas sejam vivenciadas
considerando as atitudes éticas adotadas pelo grupo como condições indispensáveis, capazes
de promover mudanças significativas nos processos sociais. Entretanto, para isso, torna-se
necessário investir na formação de professores no sentido de aprofundar os questionamentos
de como realizar uma prática escolar que acompanhe as mudanças ocorridas em decorrência
dos avanços trazidos, sobretudo pelas novas tecnologias que nos oferecem outra forma de
cognição e conseqüentemente outras formas de relações sociais.

A concepção de educação tradicional que se apóia na idéia de padrão, de homogêneo não se
insere mais nesse espaço-tempo que estamos acompanhando hoje. Assim, compreender o
verdadeiro papel de um educador ou uma educadora progressista, com vistas a realizar uma
pedagogia que atenda a todos os alunos significa formar para o múltiplo e para o heterogêneo,
ou seja, conscientizar-se da necessidade de adotar uma nova concepção de educação. No
entanto, para realizá-la, precisamos rever nossos planejamentos curriculares, nosso sistema de
avaliação, a função de seus administradores, a importância da formação continuada dos
professores, e a relação professor/aluno, considerando em todas elas os conceitos da ética nas
relações, que devem direcionar os pilares dessa nova escola.

Essa proposta de uma nova formação docente encontra em Paulo Freire uma vasta
argumentação considerando que os fundamentos de sua obra apóiam-se em pilares que
norteiam a realização de uma educação para todos. As categorias estruturais do pensamento
freireano discutem as práticas desenvolvidas no espaço escolar considerando a historicidade,
o diálogo, a conscientização, a inconclusão, a utopia (inédito viável), a comunhão e a
libertação como realidades que deverão permear todo o trabalho do educador ou da educadora
com vistas a essa construção baseando-se no respeito às diferenças sociais, culturais, étnicas
e adequando-as ao espaço-tempo atual.


REFERÊNCIAS

BONDÍA, Jorge Larrosa. Notas sobre a experiência e o saber de experiência. Disponível em:
<http://www.miniweb.com.br/Atualidade/INFO/textos/saber.htm >. Acesso em 21 jul. 2005.
(tradução: João Wanderley Geraldi).
FREIRE, Paulo. Extensão ou Comunicação. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo:
Paz e Terra, 2003.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Indignação: cartas pedagógicas e outros escritos. São Paulo:
UNESP, 2000.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002.
FREIRE, Paulo. Pedagogia dos sonhos possíveis. São Paulo: UNESP, 2001.
PAULI, Evaldo. Segundo Período da Filosofia Antiga. In: Enciclopédia Simpozio. Disponível
em: < http://www.cfh.ufsc.br/~simpozio/novo/2216y098.htm > Acesso em: 25 jul. 2005.




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CONCEPÇÃO DIALÓGICA E AS NTICS: A EDUCOMUNICAÇÃO E OS
            ECOSSISTEMAS COMUNICATIVOS

                                         Ademilde Silveira Sartori1
                                         Maria Salete Prado Soares

RESUMO

         Alicerce do pensamento latino-americano sobre a inter-relação comunicação e educação, Paulo
         Freire iluminou as bases de um novo modelo comunicacional considerado por Jesús Martín-
         Barbero como a primeira teoria latino-americana de comunicação. Paulo Freire desponta como o
         educador que definiu bases sólidas para gestar os espaços dos ecossistemas comunicativos, pois
         sua teoria dialógica, baseada em colaboração, união, organização e síntese cultural, aproxima-se
         do conceito de Educomunicação. A Educomunicação é um campo teórico-prático integrado e
         integrador que pressupõe um modus operandi que reconceitua a relação comunicação e educação.
         Nestes termos, o educomunicador é aquele profissional que, tendo em conta as possibilidades
         comunicativas colocadas pelas NTIC, gera e gerencia ecossistemas comunicativos.
         Palavras-chave: Educação dialógica – educomunicação – ecossistemas comunicativos.


INTRODUÇÃO

O século XX apresentou significativas transformações em quase todos os âmbitos: sociais,
econômicos, políticos, culturais que abalaram a sociedade vigente e que estão diretamente
ligadas ao surgimento das tecnologias da comunicação e da informação. Elas reorganizaram
práticas, vivências, estruturas, infiltrando-se em praticamente todos os setores da sociedade,
alterando rotinas sedimentadas tanto na vida empresarial quanto na particular.

Neste século da comunicação, a globalização também contribuiu para abalar estruturas e
quadros de referência que serviam de parâmetros a indivíduos e coletividades. Capaz de
uniformizar a sociedade, de manipular e impor padrões alheios à sociedade local e,
paradoxalmente, promover um renascimento de valores culturais locais, a globalização trouxe,
no rastro de sua passagem, uma exacerbação das desigualdades sociais e acirramento da
exclusão social, tanto internamente aos Estados quanto no plano internacional, o que gerou
uma evidente erosão social da cidadania.          7




As novas tecnologias possibilitaram a construção de uma malha de conexão entre áreas do
conhecimento distintas e a criação de uma dimensão por onde transitam idéias e conceitos
díspares, permitindo à humanidade vivenciar novas experiências no saber, no fazer, no sentir.

A importância que a comunicação assumiu na sociedade atual nos obriga a olhá-la como uma
nova força nas relações cotidianas, em todas as esferas sociais. O século XIX reorganizou-se
econômica, política e socialmente em função do desenvolvimento industrial e do crescimento
1
    Doutora em Ciências da Comunicação pela ECA/USP, UESC (ademilde@matrix.com.br)
7
    Mestre em Ciências da Comunicação pela ECA/USP (salete.soares@gmail.com.).




                                                                                                            1
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das relações entre povos e culturas; o século XX confrontou-se com a onipresença dos meios
de comunicação que escancarou a força dos dispositivos de informação presentes em cada
canto do planeta de forma instantânea, produzindo sentidos, induzindo ideologias; tudo isso
acarretou profundas conseqüências na vida individual e coletiva dos séculos XX e XXI,
inclusive na educação. Martín-Barbero (1996) afirma que estamos diante de um ecossistema
comunicativo conformado não pelas máquinas ou meios, mas por linguagens, saberes e
escritas, pela hegemonia da linguagem audiovisual sobre a tipográfica que desordenam e
remodelam as formas de aquisição do saber e do conhecimento.

Para o educador Paulo Freire, a comunicação é elemento fundamental pois é ela que
transforma seres humanos em Sujeitos. Freire estabelece a relação entre comunicação e
educação, na medida em que esta última é vista como um processo daquela, já que é uma
construção partilhada do conhecimento mediada por relações dialéticas entre os homens e o
mundo.

A COMUNICAÇÃO

O campo da Comunicação transita por diferentes áreas, incorporando um espírito
transdisciplinar, o que longe de enfraquecê-la, confere-lhe uma vitalidade ímpar nessa
transgressão de fronteiras disciplinares e cruzamento de posturas científicas.

Para Pierre Bourdieu, campo é um universo que “[...] possui sua doxa específica, conjunto de
pressupostos inseparavelmente cognitivos e avaliativos cuja aceitação é inerente à própria
pertinência” (BOURDIEU, 2001, p. 122). Identifica, assim, vários campos como o científico,
o jornalístico, o literário, o artístico, e cada um consiste em uma institucionalização de um
ponto de vista, “[...] um conjunto de pressupostos e de crenças partilhadas [...] inscritas em
certo sistema de categorias de pensamento” (BOURDIEU, 1997, p. 67). Ao contemplar uma
determinada problemática, um campo é:

                        [...] um espaço social estruturado, um campo de forças – há dominantes e
                        dominados, há relações constantes, permanentes, de desigualdade, que se exercem
                        no interior desse espaço – que é também um campo de lutas para transformar ou
                        conservar esse campo de forças. Cada um, no interior desse universo, empenha em
                        sua concorrência com os outros a força (relativa) que detém e que define sua posição
                        no campo e, em conseqüência, suas estratégias. (BOURDIEU, 1997, p. 57).


Neste sentido, em “História das Teorias da Comunicação”, Armand Mattelart e Michèlle
Mattelart entendem o campo da comunicação como um:

                        [...] campo de observação científica que, historicamente, se inscreveu em tensão
                        entre redes físicas e imateriais, entre o biológico e o social, a natureza e a cultura, os
                        dispositivos técnicos e o discurso, a economia e a cultura, as perspectivas micro e
                        macro, o local e o global, o ator e o sistema, o indivíduo e a sociedade, o livre-
                        arbítrio e os determinismos sociais. (MATTELART e MATTELART, 1999, p. 10).


Esse campo em profunda e contínua mutação é caracterizado por Venício Lima (2001) como
“desarticulado, conflituoso e em permanente crise teórica”, o que não impede a Comunicação
de, mesmo possuindo contornos vagos e indefinidos, estar na centralidade da discussão no
final do século XX e início do XXI, prestando-se aos mais diversos usos estratégicos.

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A palavra “comunicação” é entendida, muitas vezes pelos especialistas, como possuidora de
duas faces: como um processo em que A envia uma mensagem para B, sobre o qual a
mensagem tem um efeito determinado ou pode ser enfocada como uma negociação e um
intercâmbio de sentido, no qual as mensagens, as pessoas, suas culturas e a “realidade”
interagem para possibilitar a produção de sentido, ou seja, a sua compreensão.
(O´SULLIVAN, 2001, p. 52).

O autor latino-americano Jorge Huergo (2001) explica que, etimologicamente, a palavra
“comunicação” provém da palavra latina “communis” que significa “tornar comum”. São dois
sentidos apresentados pelo verbo: o primeiro, como transitivo, tem o significado de
“transmitir” e “persuadir” e está intimamente ligado a “divulgação”, quer dizer, enquanto um
fala, o outro escuta. Estabelece-se uma relação de poder em que um é o que transmite, detém
o conhecimento e o outro simplesmente recebe, numa relação vertical que se torna mais
acentuada ainda quando levamos em consideração os meios de comunicação de massa. Esse
sentido do verbo comunicar foi chamado por Paulo Freire, no livro Educação como Prática da
Liberdade (1967), de alienação da ignorância, pois o outro que recebe não pode ter o processo
de conhecimento sem a “doação” daquele que detém o saber.

A segunda interpretação entende o verbo como reflexivo e, nesse sentido, ‘comunicar’ é
‘tornar comum’, ‘partilhar’ e ‘dialogar’. Transformou-se, em alguns casos, em um sentido
quase religioso, como a idéia de comunidade ideal de comunicação, de Jürgen Habermas,
baseada na vontade subjetiva dos participantes (comunicação intersubjetiva) e na idéia de
comunicação como uma condição da vida social. A comunicação seria um agir, um
comportamento, uma expressão humana observável e identificável. No agir comunicacional,
as ações são orientadas para o entendimento mútuo, o ser que inicia o processo
comunicacional é também produto dos processos de socialização.

Se o conceito de comunicação apresenta, como diz Lima (2001), a ambigüidade de ter no seu
significado dois extremos – de transmitir, sentido unidirecional e o de compartilhar, processo
participativo – o significado também sofreu alterações ao longo do tempo. Ela teve vários
sentidos, tais como: “(a) de objeto tornado comum – uma comunicação ou comunicado; (b) de
meios físicos de transporte, as vias de comunicação – estradas, rios, canais; e (c) os meios
tecnológicos de transmissão de informação, isto é, a (imprensa, cinema, rádio, televisão)”
(LIMA, op. cit., p. 25).

Oscilando entre a transmissão – aí envolvida a técnica (ou a funcional como quer Dominique
Wolton, 2002) – e a comunicação como interação, há, contemporaneamente, uma tendência a
associar o conceito de comunicação aos meios de comunicação de massa, face às radicais
transformações por que passaram as tecnologias da comunicação no final do século passado.

A dissolução de barreiras entre os diferentes meios tecnológicos, do analógico ao digital, que
acontece com aparatos como telefone, televisão, máquina fotográfica, computador e que estão
convergindo para um único sistema e convivendo num mesmo aparelho só reforça a posição
central que a comunicação assume no mundo contemporâneo. Ela passa a ser considerada
como legitimadora de discursos, comportamentos, ações e atua como um instrumento de
consenso, assim como foram “a religião nas sociedades tradicionais, o progresso nas
sociedades modernas ou a produção na sociedade industrial” (RODRIGUES, 1999, p. 13).



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 Forma-se o que Adriano Duarte Rodrigues chama de uma “ideologia comunicacional”
(RODRIGUES, op. cit.) no processo da modernidade; a ela caberia redefinir um novo tipo de
racionalidade, já que os modelos lógicos fundamentados ou na vertente racionalista, baseada
na razão técnico-científica ou na anti-racionalista, vanguardista, exauriram-se durante o
processo. Apresentando-se de modo confuso, com pretensões arcaizantes de sociabilidade, a
ideologia da comunicação vem carregada de anseios de refundação, de recomeço, de nova era.
É do autor a seguinte definição de comunicação:

                        A comunicação não é um produto, mas um processo de troca simbólica
                        generalizada, processo de que a sociabilidade, que gera os laços sociais que
                        estabelecemos com os outros, sobrepondo-se às relações naturais que estabelecemos
                        com o meio ambiente. Se todos os seres vivos estabelecem em permanência trocas
                        imediatas e espontâneas com o mundo natural que os rodeia, nos homens esta
                        interação não é imediata; é mediatizada por símbolos culturais concebidos,
                        elaborados e legados por sucessivas gerações, como a linguagem verbal, os gestos e
                        os comportamentos, o vestuário, a arte, a disposição e o arranjo do espaço público
                        ou do espaço privado. Discursos e silêncios, gestos, comportamentos, ações e
                        omissões constituem as manifestações dos processos comunicacionais, na medida
                        em que correspondem a expectativas geradas pelas regularidades que formam o
                        tecido das relações sociais. (RODRIGUES, 1999, p. 22).


A comunicação é um processo de expressão da participação social, de estabelecimento de
contato entre pessoas, grupos e classes:

                        A comunicação estuda a produção, a veiculação e recepção das mensagens, tanto a
                        nível pessoal como social, tanto na esfera do privado como na esfera pública, e a
                        interação dos emissores-receptores numa determinada conformação econômica,
                        política e cultural, num determinado tempo e espaço, onde se liga o factual do
                        cotidiano com o conjuntural e estrutural. (MORAN, 1993, p. 15).


Assim, tão importante quanto estudar e refletir sobre a comunicação intransitiva, centrada nos
dispositivos de que se valem os media, é investigar as possibilidades contidas na comunicação
transitiva, proporcionada por complexas redes interpessoais.

Na medida em que a educação transformou-se em espaço privilegiado de discussão e
cidadania, é um importante tecido comunicativo, torna-se vital colocar a comunicação no
centro no fazer pedagógico, quer para questionar os mecanismos não transitivos nas suas
diferentes feições, entendê-los e poder agir sobre eles, quer para promover ecossistemas
comunicativos que destravem os nós pelos quais a educação está passando.

OS ECOSSISTEMAS COMUNICATIVOS

Walter Benjamin (1982) foi, talvez, o primeiro a entrever o nascimento do novo sensorium
que se formava no intervalo entre as novas condições de produção e as transformações
culturais promovidas pelas novas tecnologias da comunicação e informação. Essa mudança
permite uma aproximação com tudo aquilo que até então estava distante para as massas – a
arte, por exemplo, mas não só ela – desmistificando, com a ajuda das técnicas, aquilo que
possuía a aura de sagrado, o que era mantido resguardado e inacessível à população em geral.
Esse sensorium permite romper o distanciamento e revigorar o sentimento de igualdade da
massa diante da cultura, prerrogativa antes apenas da elite.

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Por intermédio das novas tecnologias e do desenvolvimento da nova sensibilidade, criou-se
uma energia que perpassa os novos mecanismos de apreensão do mundo “pela mediação de
conectar-se ou desconectar-se dos aparelhos, sempre com destaque para a televisão”
(BACCEGA, 2000, p. 10), que pode ser percebida nas empatias cognitivas e expressivas,
desenvolvidas, principalmente, pelos jovens. Martín-Barbero explica que “frente à língua e ao
território, as (linguagens) eletrônicas, audiovisuais, musicais, ultrapassam essa limitação,
produzindo comunidades hermenêuticas que respondem a novos modos de perceber e narrar a
identidade” (MARTÍN-BARBERO, 1998, p. 58). Identidades que são capazes de “amalgamar
e fazer conviver ingredientes de universos culturais diversos” (MARTÍN-BARBERO, op. cit.,
p. 13). Instaura-se, assim, um ecossistema tão vital quanto o ambiental: o ecossistema
comunicativo:

                        Se trata de una experiencia cultural nueva, o como W. Benjamin lo llamó, un
                        sensorium nuevo, unos nuevos modos de percibir y de sentir, de oír y de ver, una
                        nueva sensibilidad que en muchos aspectos choca y rompe con el sensorium de los
                        adultos. Un buen campo de experimentación de estos cambios y de su capacidad de
                        distanciar a la gente joven de sus propios padres se halla en la velocidad y la
                        sonoridad. No sólo en la velocidad de los autos, sino en la de las imágenes, en la
                        velocidad del discurso televisivo, especialmente en la publicidad y los videoclips, y
                        en la velocidad de los relatos audiovisuales. Y lo mismo sucede con la sonoridad,
                        con la manera con que los jóvenes se mueven entre las nuevas sonoridades: esas
                        nuevas articulaciones sonoras que para la mayoría de los adultos marcan la frontera
                        entre la música y el ruido, mientras para los jóvenes es allí donde empieza su
                        experiencia musical. (MARTÍN-BARBERO, 2000, p. 49).


Para a Biologia, a noção de ecossistema inclui tanto fatores bióticos (vivos: animais, plantas,
bactéria entre outros) quanto abióticos (ambiente físico) inter-relacionados dinamicamente.
Pode ser considerado como o conjunto dos relacionamentos mútuos entre os seres vivos e o
meio ambiente. No ecossistema, acontecem trocas e ele está em contínuo dinamismo; não é
determinado por seu tamanho, mas por sua estrutura e seus padrões de organização.

Jésus Martín-Barbero (2000) quem articulou o conceito de ecossistema comunicativo, não
apenas conformado pelas tecnologias e meios de comunicação, mas também pela trama de
configurações constituída pelo conjunto de linguagens, representações e narrativas que
penetra na vida cotidiana de modo transversal.

Adilson Citelli (2000, p. 246) é enfático ao assegurar que, diante das experiências culturais
descentradas (formas de socialização, de dispositivos de identificação, de cultura) e onde
“nada acontece na esfera pública sem que exista uma mediação de alguma mídia, de alguma
forma de trânsito internacional”, é preciso “[...] assegurar a base democrática aos cidadãos”.

Esta é a razão pela qual, para Martín-Barbero (2000), é vital que a escola absorva a idéia de
que é preciso incorporar um trabalho sério que contemple o novo sensorium e os media, além
de evitar que se aprofunde o fosso entre a sensibilidade e a cultura dos professores e dos
alunos. Por esse viés, a escola prioriza a interação com os novos campos de experiência
surgidos da reorganização dos saberes, dos fluxos de informação, das redes de intercâmbio,
além de interatuar com os novos modos de representação e de ações cidadãs, que interligam o
local com o mundial. Dessa forma, deve, portanto, assumir o trabalho com o ecossistema
comunicativo como a dimensão estratégica da cultura (MARTÍN-BARBERO, 1996). O
desafio é como inserir na escola um ecossistema comunicativo que contemple ao mesmo
tempo: experiências culturais heterogêneas, o entorno das novas tecnologias da informação e
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da comunicação, além de configurar o espaço educacional como um lugar onde o processo de
aprendizagem conserve seu encanto. (MARTÍN-BARBEIRO, 1996)

As políticas culturais e comunicacionais na educação devem passar pelas “ambiguas y
complejas interacciones entre el ecosistema comunicacional y el sistema político en su
indelegable responsabilidad de dinamizar la educación y creatividad cultural, incluyendo em
ambas la invención científica y la innovación tecnológica” (MARTÍN-BARBEIRO, 2002, p.
56). Uma postura crítica aos meios de comunicação só será eficiente quando inserida em um
projeto educativo cultural mais amplo.

Ismar de Oliveira Soares (1999) desenvolve o conceito de ecossistema comunicativo de modo
mais abrangente. O pesquisador deseja estabelecer bases sólidas para a inter-relação
comunicação e educação, a qual chama de Educomunicação, que trabalha “a partir de um
substrato comum que é a ação comunicativa no espaço educativo, ou seja, a comunicação
inter-pessoal, grupal, organizacional e massiva promovida com o objetivo de produzir e
desenvolver ecossistemas comunicativos através da atividade educativa e formativa”. Soares
insere o conceito na perspectiva da gestão comunicativa: compreende “a organização do
ambiente, a disponibilidade dos recursos, o modus faciendi dos sujeitos envolvidos e o
conjunto das ações que caracterizam determinado tipo de educação comunicacional”
(SOARES, 2002b, p. 125).

Por esse ângulo, falar em ecossistema comunicativo implica buscar a descentralização de
vozes, a dialogicidade, a interação. As relações devem buscar equilíbrio e harmonia em
ambientes onde convivem diferentes atores. Não é apenas no mundo tecnológico que atua o
ecossistema comunicativo, mas em todas as esferas e a comunicação.

Assim como há a necessidade de uma relação equilibrada entre homens e natureza, é
necessária a criação de “verdadeiros "ecossistemas comunicativos" nos espaços educativos,
que cuide da saúde e do bom fluxo das relações entre as pessoas e os grupos humanos, bem
como do acesso de todos ao uso adequado das tecnologias da informação”. (SOARES,
2002c).

Para Soares, o conceito de Educomunicação está intrinsecamente ligado ao de ecossistema
comunicativo, já que a primeira é representada pelo “conjunto de ações que permitem que
educadores, comunicadores e outros agentes promovam e ampliem as relações de
comunicação entre as pessoas que compõem a comunidade educativa”. (SOARES, op. cit.).
Ou seja, o lócus de ação da Educomunicação são os ecossistemas comunicativos, que, para
Soares, devem conter fluxos comunicativos positivos; existe mesmo uma recomendação de
que ao geri-los “é interessante começar a partir dos pontos de consenso” (Ibidem), evitando
conflitos.

EDUCOMUNICAÇÃO

Importante questão referente à inter-relação comunicação e educação diz respeito ao papel da
comunicação nas relações interpessoais, de trocas entre sujeitos. Nesse sentido, pode ser
entendida como uma comunicação transitiva, “é o processo de expressão da participação
social, do estabelecimento de contato entre pessoas, grupos e classes. A comunicação
expressa a dinâmica do cotidiano, a existência social do indivíduo e a do indivíduo na

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sociedade”, conforme José Manuel Moran (1993, p. 11). É fundamentalmente uma prática
vivida, um campo de trocas e de interações que possibilita a expressão, o relacionamento, o
ensino e o aprendizado.

Essa outra maneira de ver a comunicação passa pela perspectiva do compartilhamento, da
troca e de entendimento entre as pessoas. Nesse sentido, aproxima-se da visão de teóricos da
educação, como Paulo Freire, para quem a comunicação é fundamental nas relações humanas,
assim como a inter-relação de seus elementos básicos no processo educativo. Para haver
conhecimento, é necessária uma relação social igualitária e dialogal entre os sujeitos, que
resulta em uma prática social transformadora.

Baseado em Freire, Francisco Gutierrez defendia o princípio de que o “processo de
comunicação é essencial à educação” e que “o processo de aprendizagem é autêntico quando
se efetua uma mudança naquele que aprende. Por esse motivo a aprendizagem pressupõe a
interação, o intercâmbio.” (GUTIÉRREZ, 1978, p. 33-39).

O princípio da ação e do diálogo comunicativos podem ser alargados se relacionarmos com a
dimensão da comunicação pessoal de José Manuel Moran:

                        A comunicação caminha na direção da inclusão, da integração. Da inclusão de
                        pessoas diferentes, de formas distintas de ver. Caminha na aproximação de mais
                        pessoas, de mais grupos; no estabelecimento de vínculos, de pontes para aproximar-
                        nos das pessoas, sem isolar-nos em grupinhos, “panelinhas”, ou seitas. [...] Pela
                        comunicação não só expresso emoções, sentimentos, como também lido com afeto.
                        Pela comunicação busco afeto, carinho, ser querido, amado. Se essas emoções são
                        bem gerenciadas, são positivas, facilitaremos todas as atividades em todas as
                        dimensões e direções das nossas vidas. A rejeição, a falta de afeto, de aceitação nos
                        desestrutura, nos joga para fora de nós mesmos numa busca frenética de qualquer
                        compensação, reconhecimento, aceitação. (MORAN, 1998, p. 10-16).
                        [...] Ou seja, ao falarmos de ecossistema comunicativo seria interessante pensar na
                        qualidade das relações interpessoais do processo, visto que não podemos
                        desconsiderar que, antes de tudo, temos seres humanos que estão interagindo. Jorge
                        Huergo já havia percebido esse fato ao analisar o sentido de diálogo que contém o
                        termo “comunicação”. Para ele, a interação entre sujeitos nem sempre acontece de
                        modo perfeito. La comunicación rara vez es simétrica, en el sentido de "entre
                        iguales", y armoniosa, en el sentido de "no conflictiva"; por eso vamos a considerar
                        a la comunicación dialógica como un encuentro, antes que como un acuerdo: un
                        encuentro donde los que se encuentran cargan con sus memorias, sus conflictos, sus
                        diferencias. (HUERGO, 2001).


A inter-relação comunicação-educação gerou estudos que foram desenvolvidos pelo Núcleo
de Comunicação e Educação da Escola de Comunicações e Artes da Universidade São Paulo
(NCE-ECA/USP), preocupado em fundamentar, pesquisar, desenvolver e solidificar um novo
campo, a Educomunicação, que por sua natureza inter-relacional, “estrutura-se de modo
processual, mediático, transdisciplinar e interdiscursivo”, sendo vivenciado pelos seus atores
através de áreas concretas de intervenção social, que podem constituir-se em vertentes”, de
acordo com Ismar de Oliveira Soares. (SOARES, 1999, p. 65). O autor define a
Educomunicação como:

                        O conjunto das ações inerentes ao planejamento, implementação e avaliação de
                        processos, programas e produtos destinados a criar e fortalecer ecossistemas


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                        comunicativos em espaços educativos presenciais ou virtuais, assim como a
                        melhorar o coeficiente comunicativo das ações educativas, incluindo as relacionadas
                        ao uso dos recursos da informação no processo de aprendizagem." (SOARES,
                        2002a, p. 115).


Quatro áreas de intervenção foram sistematizadas ao se pensar a abrangência da
Educomunicação:

a) Educação para a Comunicação, preocupada com a reflexão a respeito dos impactos e
influências dos media, na relação entre os pólos do processo de comunicação (Estudos de
Recepção) e no campo pedagógico pelos programas de formação de receptores autônomos e
críticos frente aos meios (Educação para a Comunicação, “Media Education” ou “Media
Literacy”). No continente latino-americano, também é conhecida como “leitura crítica dos
meios”, “educação para a televisão” ou “educação para os meios”;

b) Mediação tecnológica na educação que compreende os procedimentos e as reflexões em
torno da presença e dos múltiplos usos das tecnologias da informação na educação;

c) Gestão comunicativa, voltada para o planejamento, execução e realização dos processos e
procedimentos que se articulam no âmbito da Comunicação/Cultura/Educação. Dela faz parte
o planejamento das relações entre os professores e alunos, entre direção, corpo docente e
alunos ou nas relações entre a escola e a comunidade onde está inserida. Além disso, também
há o planejamento de ações voltadas à criação de ambientes favoráveis ao desenvolvimento
do ensino, à implantação de projetos de educação frente aos meios de comunicação, à
implementação do exercício artístico, ou mesmo, à disseminação das tecnologias num plano
de ensino.

d) Reflexão epistemológica que vê a inter-relação Comunicação e Educação como fenômeno
cultural emergente e instiga projetos de pesquisa para legitimação do novo campo e
investigações sobre as vertentes que compõem a Educomunicação, constituindo-se uma
reflexão acadêmica.

A inter-relação Comunicação/Educação já tinha acontecido em épocas e momentos anteriores,
ainda que mais intuitiva e não tão sistematizada. Célestin Freinet na França e Paulo Freire no
Brasil são considerados os desbravadores da área Educação para Comunicação. Embora
atuassem em contextos bem diversos, trabalhassem com públicos distintos – Freinet na
educação de zero a 14 anos, Freire na educação de adulto – e apresentassem objetivos
diferentes – o francês visava mudanças na estrutura e pedagogia escolares, o brasileiro
buscava uma reorganização sócio-política do mundo – havia muitas semelhanças entre eles.
Ambos tinham uma concepção política da educação, acreditavam na não neutralidade do ato
pedagógico, sustentavam o diálogo e a colaboração, alertavam para a manipulação do ser
humano e, sobretudo, estavam convictos da possibilidade de transformação do indivíduo e da
sociedade. A vista de acesso era a livre expressão, o diálogo e a cooperação.

PAULO FREIRE

Para entender a história da inter-relação comunicação e educação latino-americana após os
anos 70, é preciso voltar os olhos para Paulo Freire que desenvolveu fundamentos sólidos

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para um novo modelo educomunicacional, essencialmente horizontal, democrático e
dialógico. A matriz freireana perpassa o pensamento de vários teóricos da comunicação da
América Latina, principalmente Mário Kaplún, Jesús Martín-Barbero, Guillermo Orozco-
Gómez, Francisco Gutiérrez. Martín-Barbero atribui a Freire “la primera teoria
latinoamericana de comunicación, ya que no sólo tematizó prácticas y procesos
comunicativos de estos países sino que puso a comunicar a América Latina consigo misma y
con el resto del mundo”. (MARTÍN-BARBERO, 2002, p. 20).

O educador brasileiro, mais do que inaugurar um pensamento dialógico, democrático e
libertador na pedagogia nacional e latino-americana, transformou-se em um marco na história
da Educação. Sua concepção de educação popular abalou as bases do ensino elitista vigente,
repercutiu internacionalmente e produziu uma ruptura no percurso histórico da
educação/comunicação. Ele apostava na educação por intermédio do audiovisual. Já na
década de 60, a Conferência Nacional dos Bispos havia aprovado o uso da Telescola no
Movimento de Educação de Base (MEB). Além disso, acreditava também na educação em
outros espaços que não o da educação formal.

Extensão ou Comunicação? elaborado em 1968/1969, reflete a importância da comunicação
no processo de conhecimento. Básica nas relações humanas, ela se apresenta como uma
relação social igualitária, dialogal, na co-participação dos sujeitos no ato de conhecer.

A explosão das tecnologias da comunicação e informação leva o pensador a afirmar que mais
que a utilização de uma técnica ou tecnologia, a problematização e a conscientização são
fundamentais no ato pedagógico.

Isso não significa ignorar ou rejeitar novas tecnologias ou linguagens; ao contrário, é preciso
apropriar-se delas, com critério, para reavivar a humanização do homem: é preciso discutir os
meios de comunicação e a quem eles servem. É uma crítica política e não tecnológica.

O projeto educacional que construiu visava ao fim da opressão e das desigualdades sociais por
intermédio do desenvolvimento da consciência crítica e histórica. Suas bases alicerçavam-se
em uma teoria do conhecimento que se pautava pelo respeito ao educando, pela busca da
autonomia e pela dialogicidade, a partir de um pensamento crítico e libertador, na busca pela
igualdade, justiça e união, pressupostos orientadores na construção de novos paradigmas
educacionais.

Ao partir da realidade do educando para encontrar temas geradores que vivificassem a
educação, Freire substituía uma visão mais simplista por outra crítica, e partia do pressuposto
de que havia em cada ser humano um saber único, ainda que rudimentar, mas de onde era
possível estabelecer uma nova relação com a vida. Inaugurava, assim, uma metodologia
dialógica que renegava a transmissão vertical de conteúdos: do mestre, que detém o
conhecimento, para o aluno, que devia absorvê-la. Essa educação que chamou de “bancária”
estava na raiz da dominação cultural.

Para Freire, não existe educação neutra, é impossível separar o processo de aprendizagem do
processo político, já que ao construir significados de uma realidade, estamos atribuindo
valores que podem ser imobilizantes ou, ao contrário, ativos, que acreditem que reflexão e
ação podem transformá-la. A educação problematizadora desenvolvida por ele procura

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desvelar o mundo e é calcada numa relação dialógica entre educador e educando. “O educador
já não é mais o que apenas educa, mas o que enquanto educa, é educado, em diálogo com o
educando que, ao ser educado, também educa. [...] Os homens se educam em comunhão,
mediatizados pelo mundo.” (FREIRE, 1978, p. 78-79).

O sentido atribuído ao diálogo, que pressupõe uma relação horizontal entre os seres, fundado
“no amor, na humildade, na fé dos homens”, é fundamental para a estrutura do conhecimento,
visto que o ato cognoscente não termina no objeto cognoscível, uma vez que se comunica a
outros sujeitos igualmente cognoscentes. “A educação é comunicação, é diálogo, na medida
em que não é a transferência de saber, mas um encontro de sujeitos interlocutores que buscam
a significação dos significados.” (FREIRE, 1979, p. 69). Tem-se, assim, uma teia de
interações que estabelece a sintonia entre comunicação e educação.

A comunicação é o elemento pelo qual é possível transformar o ser humano em sujeito da sua
própria história, vivendo uma relação dialética, em diálogo, que o conduz a uma consciência
crítica e a uma transformação.

O mundo social humano não existiria se não fosse capaz de se comunicar. A comunicação é
um processo de interação de Sujeitos em diálogo, elemento estruturante e intrínseco ao ser
humano. Este é o primeiro dos três níveis, chamado de antropológico: a comunicação como
constitutiva do ser humano. (LIMA, 1981).

O segundo nível, epistemológico, parte do pressuposto de que só acorre conhecimento na
comunicação; ele é o resultado da relação social entre dois sujeitos mediatizados pelo objeto
que querem conhecer: “o sujeito pensante não pode pensar sozinho; não pode pensar sem a
co-participação de outros sujeitos no ato de pensar...” (LIMA, op. cit, p. 63).

A dimensão política, terceiro nível, é entendida quando lembramos que não há conhecimento
e nem comunicação se a relação entre os sujeitos não for igual. A comunicação para Freire,
diz Venício Lima, é uma relação social igualitária, dialogal que produz conhecimento, uma
prática transformadora e política.

A visão que Freire tem da comunicação dialógica parte de um paradigma sócio-estrutural; não
se trata de um enfoque no âmbito pessoal, mas social e político, muito diferente do
individualismo baseado na auto-realização. Ele condena os que acreditam que indivíduos
possam ser transformados enquanto as estruturas sociais são mantidas intactas.

Isso não significa que Freire não se preocupe com o indivíduo, com o particular; pelo
contrário, a esfera pessoal só encontra sua plenitude quando está inserida no todo; a auto-
realização só tem sentido na medida em que está conectada ao outro.

A dialogicidade como essência da educação libertadora apresenta algumas características
importantes: a colaboração (a ação dialógica só se realiza entre sujeitos), união (fundamental
para a consciência de classe ou de grupo), organização (momento da aprendizagem em que se
busca transformar) e síntese cultural (instrumento de superação da cultura):




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                        La puerta a la comunicación que nos abre P. Freire es básicamente a su estructura
                        dialógica. Pues hay comunicación cuando el lenguaje da forma a la conflictiva
                        experiencia del convivir, cuando se constituye en horizonte de reciprocidad de cada
                        hombre con los otros en el mundo. (MARTÍN-BARBERO, 2002, p. 30).


TEORIA DIALÓGICA EM PRÁTICA: UM EXEMPLO.

No cerne da Educomunicação está a concepção dialógica de Freire. Trabalhos desenvolvidos
nesse campo interdisciplinar colocam em prática os princípios de colaboração, união,
organização e síntese cultural. Um exemplo foi o projeto Educom TV – a linguagem
audiovisual na escola: uma ação educomunicativa, desenvolvido pelo Núcleo de
Comunicação e Educação - NCE, do Departamento de Comunicação e Artes, da Escola de
Comunicação da Universidade de São Paulo, ECA-USP, em parceria com a CENP/SEE -
Secretaria de Educação do Estado de São Paulo e a GIP/DTE. Este projeto constitui-se de
um curso que capacitou 2.243 professores da rede pública do estado de São Paulo para o uso
do audiovisual em sala de aula, por intermédio de atividades on-line realizadas por meio de
um Ambiente Virtual de Aprendizagem, em 2002.

A estrutura do Educom TV era constituída de 3 coordenadores, 35 tutores – cada um
responsável por uma sala virtual de aprendizagem com cerca de 65 cursistas –, equipe
operacional, equipe de suporte técnico, além de articuladores. O conteúdo pedagógico foi
distribuído ao longo dos meses de junho a dezembro em 10 módulos. Esses se compunham de
parte teórico-reflexiva, exercícios dissertativos relacionados à prática diária docente e ao uso
das NTCI, além de solicitarem intensa navegação por hipertextos e discussões em chats e
fóruns.

O projeto foi educomunicativo e lastrado em Freire, pois tanto no desenho pedagógico interno
do curso - concepção do AVA, seleção dos tutores, elaboração do material didático e relações
travadas entre tutores, coordenadores, suporte técnico – quanto nas relações com os alunos,
atendia aos três princípios apontados por SIERRA (2000, p.21-22), da relacionabilidade, da
alteridade e da dialogicidade:

                        A escolha dos tutores para o projeto Educom TV foi norteada pelos princípios da
                        Educomunicação. Recrutados entre alunos de pós-graduação, mestrandos ou
                        doutorandos, vinham de diferentes áreas do conhecimento: Pedagogia, Cinema,
                        Filosofia, Física, Biologia, Letras, Sociologia, Antropologia, Geografia, Artes e
                        Jornalismo. A heterogeneidade da formação dessas pessoas foi fator determinante
                        para a construção de um saber conjunto, partilhado pelo grupo, que contribuiu para a
                        união e o estabelecimento de laços de confiança entre os membros da equipe.
                        (SOARES et al, 2004).


O tutor tinha tripla função: a primeira, pessoal, era estabelecer uma relação de cordialidade e
confiança entre os participantes; a segunda, tecnológica, deveria orientar seus educandos a
utilizar as ferramentas disponibilizadas pelo curso e a terceira, pedagógica, consistia em
avaliar e comentar as respostas dos cursistas aos exercícios, dentro do ritmo de cada um,
estimulando-os a reverem sua prática pedagógica de modo a que pudessem ter um novo olhar
sobre a educação, sobre os meios de comunicação e as novas tecnologias, sem, contudo,
desqualificar as crenças que carregassem:



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                        Os textos e os exercícios, assim como o contato com os tutores, valorizavam a
                        aprendizagem como “construção de significados”, em uma dimensão cooperativa ou
                        colaborativa da aprendizagem que pôs em evidência o papel dos pares e a tutela do
                        “adulto” nas situações de aprendizagem (ou seja, aprendizagem como ato social).
                        (SOARES et al, op. cit.).


Dentro da concepção dialógica, as três funções desempenhadas pelos tutores do Educom TV
“convergiam para a valorização e a ressignificação do papel do professor que deveria, ele
também, sentir-se parte integrante de uma teia colaborativa de seres humanos envolvidos em
questões pedagógicas e educacionais.” (SOARES et al, op.ci.t) A relação dialógica entre os
pares criou um ecossistema comunicativo eficiente e permitiu que os professores-cursistas
questionassem suas práticas e conceitos e incorporassem uma nova visão sobre sua prática
pedagógica.

                        [...] A forma em que se deu a relação entre cursistas, tutores, coordenação geral,
                        equipe operacional e equipe técnica, teceu laços colaborativos consistentes
                        evidenciados pela troca dialógica e assídua de experiências e idéias que culminaram
                        com o bom resultado do projeto. Os resultados deste curso aparecem
                        consubstanciados nos trabalhos finais - alguns surpreendentemente rigorosos em
                        relação aos conceitos envolvidos e outros dotados de acentuada criatividade.
                        (SOARES et al, op.cit.).


De fato, os resultados obtidos ao final do curso indicam que o professor se transformou ao
final do projeto Educom TV. Foram elaborados, em parcerias, 980 projetos interdisciplinares,
o índice de permanência esteve em torno de 91% (considerado muito bom para cursos on-
line) e a pesquisa avaliativa final realizada com os professores revelou que houve efetiva
contribuição na qualidade do ensino ministrada pelos professores.

CONCLUSÃO

No mundo atual em que é preciso educar numa sociedade em que os dispositivos tecnológicos
e midiáticos produzem outras sensibilidades, deslocalizam o saber, inauguram novas formas
de expressão, Comunicação e Educação caminham juntas.

Ao despontar como educador que percebeu a “comunicação humana como diálogo.” (Lima,
op. cit. 71) e entendeu as inter-relações entre educação e comunicação, Paulo Freire forneceu
uma base teórica sólida para a gestão de ecossistemas comunicativos, pois sua teoria
dialógica, baseada em colaboração, união, organização e síntese cultural, aproxima-se do
conceito de Educomunicação. A Educomunicação configura-se assim como campo teórico-
prático integrado e integrador que pressupõe um modus operandi que reconceitua a relação
comunicação e educação. Como diz Venício Lima:

                        No momento em que as potencialidades das tecnologias interativas acenam para a
                        quebra da unidirecionalidade e da centralização das comunicações, o conceito de
                        comunicação dialógica, relacional e transformadora de Freire oferece uma referência
                        normativa revitalizada, criativa e desafiadora para todos aqueles que acreditavam na
                        prevalência de um modelo social comunicativo humano e libertador. (LIMA, op.
                        cit., p.69).




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V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22 - setembro 2005.




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         A RELAÇÃO EDUCADOR-EDUCANDO NA PERSPECTIVA
                         FREIREANA

                                        Adriana Marques Ferreira1
                                          Leonardo Docena Pina2
                                         Thagnani Reis do Carmo3

RESUMO

       O trabalho aborda as contribuições de Paulo Freire a respeito das relações entre educadores e
       educandos. Para tal faz-se necessário abordamos as críticas freireanas ao modelo de educação que
       desconsidera a diversidade como característica maior dos sujeitos. Freire destaca a postura que o
       professor assume de detentor do conhecimento, colocando o aluno na posição de mero receptor
       desse; numa relação vertical, denominando-a de educação bancária. Contrapondo-se a esse perfil
       de educação, evidenciamos a educação para a liberdade que considera todo indivíduo como agente
       de sua transformação, neste modelo a relação é horizontal, dialógica para que assim, o educando
       possa ter consciência de que não esta apenas no mundo, mas com o mundo, buscando formas de
       transformar a realidade.
       Palavras-chave: Relação educador – educando, diálogo, diversidade.


Este trabalho é fruto de um projeto de pesquisa financiado pelo CNPq (Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico) intitulado “Uma leitura crítica da Educação
Especial a caminho da inclusão”, cujo objetivo é analisar a contribuição que Paulo Freire,
Vygotsky e Michel Foucault deram no processo de ruptura paradigmática da exclusão para a
inclusão. Neste cenário Paulo Freire ocupa um lugar de destaque na defesa dos direitos
humanos e na valorização de todas as pessoas como sujeitos historicamente inseridos no
processo permanente de mudança de si e da realidade.

Para tal, é utilizada a metodologia da análise de discurso, “AD”, em sua vertente francesa, que
busca compreender os efeitos de sentidos derivados e/ou constitutivos dos movimentos dos
discursos.

Paulo Freire em suas obras sempre se demonstrou preocupado com a relação do ensino e
aprendizagem desenvolvidos no sistema educacional. Preocupação esta que possui seu cerne
na relação estabelecida entre educador ou educadora e educando ou educanda.

Primeiramente, vale pontuarmos que o ato de ensinar inexiste sem aprender, pois foi a partir
da condição humana de que todos são capazes de aprender que ao longo dos tempos, homens
e mulheres foram desenvolvendo maneiras, métodos de educar. Desta forma, é o ato de
aprender que justifica a relação estabelecida entre professores e professoras com seus alunos e
alunas.

Perante essa relevância do ato de aprender de todo ser humano, na relação educador (a) e
educando (a), Freire (2002, p. 25) pontua que não há docência sem discência, ou seja, “quem

1
  Graduanda em Pedagogia pela UFJF e bolsista BIC/UFJF.(didisl@ig.com.br).
2
  Graduando em Educação Física pela UFJF(limiaranaerobio@yahoo.com.br).
3
  Graduanda em Pedagogia pela UFJF (thagnani@yahoo.com.br).


                                                                                                           2
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ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender”. Quando o (a) educador (a) se
vê como sujeito formador do processo educativo e seus alunos e alunas como “objetos” que
devem ser formados, e que, portanto recebem passivamente conhecimento pertencente ao
sujeito que sabe e que são a eles transferidos, ocorre um esvaziamento da relação dialética de
aprendizagem de toda pessoa humana.

Quanto a isso, Freire (2004) faz uma crítica severa, na qual a educação se torna o ato de
depositar conhecimentos, em que os educandos e educandas são os depositários e os
educadores e educadoras os depositantes. Essa seria a chamada concepção bancária de
educação, na qual a prática pedagógica é reduzida ao ato de depositar, transferir e transmitir
valores e conhecimentos:

                        Em lugar de comunicar-se, o educador faz “comunicados” e depósitos que os
                        educandos, meras incidências, recebem pacientemente, memorizam e repetem. Eis aí
                        a concepção “bancária” da educação, em que a única margem de ação que se oferece
                        aos educandos é a de receberem os depósitos, guardá-los e arquivá-los (FREIRE,
                        2004, p. 58).


Na visão bancária da educação, o saber torna-se uma doação dos que se julgam sábios aos que
julgam nada saber. Doação que se funda numa das manifestações instrumentais da ideologia
da opressão, representada pela dicotomia opressor e oprimido, sendo que ao primeiro é
previsto a detenção de todo o saber e conseqüentemente, todo o poder, e ao segundo, sua
impossibilidade de problematizar questões relacionadas à realidade que o oprime, tendo então
que simplesmente aceitá-la como ela é.

Esta estratificação implícita na relação é uma distorção ética; se posicionar acima do outro,
seja ele quem for, significa distorcer o sentido da existência humana, já que todos são seres de
mesmo valor. O domínio do saber científico, a posição de professor (a), não dá a este (a) o
direito de olhar os (as) alunos (as) de cima; da mesma forma, não saber determinado conteúdo
não remete a idéia de o (a) aluno (a) ter menor valor.

Para Freire (2004), a educação bancária “é uma concepção que, implicando uma prática,
somente pode interessar aos opressores, que estarão tão mais em paz, quanto mais adequados
estejam os homens ao mundo” (p.63). Daí que esse modelo de educação tende a reduzir a
existência dos homens e mulheres ao mero viver; tende a fazê-los seres da adaptação, do
ajustamento. Assim, lhes é negada a possibilidade de exercerem sua vocação ontológica de
ser sujeito, de estar no mundo e com o mundo, de existir ao invés de apenas sobreviver. Freire
(1996) destaca que é essa capacidade ou possibilidade de ligação comunicativa do existente
com o mundo objetivo, contida na própria etimologia da palavra, que incorpora ao existir o
sentido de criticidade que não há no simples viver. Transcender, discernir, dialogar
(comunicar e participar), são exclusividades do existir.

Neste modelo educacional, a relação educador-educando se faz vertical, de cima para baixo,
definindo os que sabem e os que não sabem, reproduzindo na escola a relação opressor-
oprimido. O pragmatismo ocupa o lugar da esperança. A opressão é legitimada, suprimindo-
se o direito fundamental de todo homem e mulher de agirem em sua própria história. Não são
reconhecidas todas as potencialidades dos sujeitos, ao contrário, as diferenças são realçadas,
vistas como entraves ao desenvolvimento. A diversidade é desconsiderada diante das
dificuldades formuladas e postas em prática pelo opressor, e a mudança é considerada como

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um sonho impossível de se realizar. Para os acomodados não há o que fazer além de excluir
do sistema aqueles que “fogem” aos padrões de normalidade.

Observa-se que muitas condições sociais têm sido consideradas e tratadas como desviantes,
fato que reflete, nas diversas situações, um julgamento social, julgamento que se requinta na
medida em que as sociedades se aprimoram tecnologicamente em função de valores e de
atitudes culturais específicas. Em algumas sociedades, ser negro (a), ser velho (a), ser mulher,
ser criança, etc, representou ao longo dos tempos, como ainda representa, uma condição de
subalternidade de direitos e desempenho de funções sociais. E é neste contexto de complexa
trama de relações sociais, dentro e fora da escola, que se manifestam as diversas formas de
controle, discriminação e opressão em relação aos ditos desviantes, ou seja, é no contexto
social que se manifestam as mais variadas formas de preconceito e/ou aceitação daquilo que
se apresenta como “diferente” ou “indesejado”, atitudes contra as quais Freire sempre se
posicionou de forma contundente. Um exemplo clássico desta situação é o (a) aluno (a)
considerado (a) portador (a) de necessidades especiais, principalmente o (a) chamado (a)
deficiente. Ao considerá-lo (a) como incapacitado (a) a sociedade cria práticas
assistencialistas, contexto este que favorece uma relação professor–aluno fundada na piedade
e no sentimento de caridade, que nada mais faz do que posicionar este (a) aluno (a) no lugar
de “pobre coitado (a)”, “inválido (a)”, etc.

 No caso específico da deficiência, pode-se afirmar, em conformidade com Fonseca (1987),
que a mesma reflete, em muitos aspectos, a maturidade humana e cultural de uma
determinada comunidade. O que não se pode negar é que há, implicitamente, uma importante
variável cultural e que se encontra na base do julgamento que estabelece a distinção entre
“deficientes” e “não deficientes”. Segundo Fonseca (1987), “Essa relatividade obscura, tênue,
sutil e confusa, procura, de alguma forma, afastar ou excluir os indesejáveis, cuja presença
ofende, perturba e ameaça a ordem social” (p.9).

Direcionando o olhar para dentro da escola, encontramos, de um lado, professores e
professoras conservadores, ingênuos e/ou acomodados, que facilitam o crescimento contínuo
da ideologia opressora, cuja discriminação é ato corriqueiro, muitas vezes imperceptível por
ser considerado comum; de outro lado, encontramos professores e professoras progressistas,
considerando-se realmente educadores e educadoras comprometidos na medida em que lutam
contra qualquer forma de discriminação, na medida em que se colocam em favor da esperança
que os animam, e, apesar de tudo, na medida em que se colocam frente ao embate ideológico
como lutadores (as) obstinados (as), que se cansam, mas não desistem.

O (a) educador (a) que aliena a ignorância se mantém em posições fixas, invariáveis, com
uma visão fatalista da realidade. E a rigidez destas posições nega a educação e o
conhecimento como processo de infinita busca.

Freire (2004) chama a atenção dos (as) verdadeiros (as) humanistas para o fato de que eles
(as) não podem, na busca pela libertação, servir-se da concepção “bancária”, sob pena de se
contradizerem em sua busca. “Assim como também não pode esta concepção tornar-se legado
da sociedade opressora à sociedade revolucionária”. (FREIRE, 2004, p.66).

Contrapondo-se à educação “bancária”, Paulo Freire evidencia a educação libertadora, que
considera todo indivíduo como agente de transformação, reconhecendo-o como sujeito

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histórico inserido na realidade de forma crítica. Desse modo, a relação educador-educando é
amparada pela irrecusável prática do inteligir, do sempre desafiar o (a) educando (a) com
quem se comunica a produzir sua própria compreensão do que vem sendo comunicado.

A educação para a libertação deve privilegiar o exercício da compreensão crítica da realidade
e possibilitar não só a leitura da palavra, a leitura do texto, mas também a leitura do contexto,
a leitura do mundo:

                        A educação que se impõe aos que verdadeiramente se comprometem com a
                        libertação não pode fundar-se numa compreensão dos homens como seres “vazios” a
                        quem o mundo “encha” de conteúdos; não pode basear-se numa consciência
                        especializada, mecanicistamente compartimentada, mas nos homens como “corpos
                        conscientes” e na consciência como consciência intencionada ao mundo. Não pode
                        ser a do depósito de conteúdos, mas a da problematização dos homens em suas
                        relações com o mundo. (FREIRE, 2004, p.67).


Nesse modelo de educação, o (a) educador (a) progressista, comprometido (a) com a
mudança, não pode apenas falar aos educandos e educandas sobre sua visão do mundo, ou
tentar impô-la. É preciso dialogar para que ambos possam realizar uma leitura crítica sobre as
verdadeiras causas da degradação humana. O papel do (a) educador (a) progressista é desafiar
a curiosidade ingênua do (a) educando (a) para, com ele (a), partejar a curiosidade
epistemológica. E é a partir da relação dialógica entre educadores (as) e educandos (as) que a
prática educativa se afirma como desocultadora de verdades escondidas.

Desta maneira, Freire (2004) afirma que:

                        [...] o educador já não é mais aquele que apenas educa, mas o que, enquanto educa, é
                        educado, em diálogo com o educando que, ao ser educado, também educa. Ambos,
                        assim, se tornam sujeitos do processo em que crescem juntos e em que os
                        “argumentos de autoridade” já não valem. E para ser autoridade, funcionalmente, é
                        necessário estar a favor da liberdade e não contra a mesma. E ninguém educa
                        ninguém e tão pouco educa a si próprio: os homens educam em comunhão
                        mediatizados pelo mundo. Mediatizados pelos objetos cognoscíveis que, na prática
                        bancária, são possuídos pelo educador que os descreve ou os deposita nos educandos
                        passivos. (p.68).


Assim, a “educação problematizadora” ou “educação para a liberdade” ocorre numa relação
horizontal, onde educador (a) e educando (a) estabelecem constante diálogo, buscando
transformar a realidade. O respeito ao conhecimento prévio que o (a) educando (a) possui é de
fundamental importância, para que se possa propor, e nunca impor, o que, e como será
desenvolvido o trabalho em sala de aula. Para Freire (2004), “A educação como prática da
liberdade, ao contrário daquela que é prática da dominação, implica na negação do homem
abstrato, isolado, solto, desligado do mundo, assim também na negação do mundo como uma
realidade ausente dos homens” (p.70). A educação problematizadora é uma relação dialógico-
dialética entre educador (a) e educando (a), ou seja, ambos aprendem e ensinam juntos.

 “Se há uma prática exemplar como negação da experiência formadora é a que dificulta ou
inibe a curiosidade do educando”. (FREIRE, 2002, p.94). Os questionamentos, as perguntas, e
as comparações que partem dos (as) alunos (as) durante as aulas, abrem espaço para
considerações que, além de enriquecer o processo de construção do conhecimento, ampliam

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A formação de professores para a diversidade na perspectiva de paulo freire
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A formação de professores para a diversidade na perspectiva de paulo freire

  • 1. V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22 - setembro 2005. A FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA A DIVERSIDADE NA PERSPECTIVA DE PAULO FREIRE Abigail Guedes Magalhães1 Anderson dos Santos Romualdo2 Maria Cristina Garcia Lima3 Regina Coeli Barbosa Pereira4 Sâmya Petrina Pessoa de Oliveira5 RESUMO A discussão sobre a formação de professores nos leva a refletir uma educação acessível a todos e que respeite as peculiaridades humanas, o que nos remete ao pensamento de Paulo Freire. Torna-se necessária uma (re)significação nos diversos segmentos sociais e a escola, como uma instituição inserida numa sociedade plural e cambiante, discute a possibilidade de mudança, buscando romper com os entraves pelos quais a educação vem passando. Na realização de uma prática escolar inclusiva devem-se considerar os sujeitos historicamente constituídos como seres capazes da transformação e com direito a participar do processo de construção do mundo. O objetivo de nosso trabalho é oportunizar aos educadores uma reflexão crítica da historicidade do processo educacional, visando uma educação humanista, que tem como um de seus principais pilares a realização de uma práxis voltada para a diversidade. Palavras-chave: Formação de professores – diversidade – educação. Se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda. Se a nossa opção é progressista, se estamos a favor da vida e não da morte, da eqüidade e não da injustiça, do direito e não do arbítrio, da convivência com o diferente e não de sua negação, não temos outro caminho se não viver plenamente a nossa opção. Encarná-la, diminuindo assim a distância entre o que fizemos e o que fazemos. (FREIRE, 2000, p. 67). Nos dias atuais os debates sobre a educação para a diversidade fazem-se cada vez mais intensos pela urgência das mudanças que se fazem necessárias e que oportunize uma educação para todos. Dessa forma, buscamos discutir uma prática que compreenda o desenvolvimento do sujeito numa dimensão histórica, social e cultural que atenda as suas peculiaridades e respeite as diferenças. Buscamos, assim, na pedagogia humanista esses fundamentos cuja reflexão Paulo Freire (2003) denomina como prática-educativo-progressista, que deve se desenvolver baseada numa relação de autonomia do educando, ou seja, transformar sua curiosidade ingênua e crítica em conhecimento. Compreender o desenvolvimento da consciência crítico-reflexiva como uma característica de construção faz parte de uma ética universal. Mas será que nós educadores e educadoras estamos preparados para exercer essa prática crítico-reflexiva? Ao discorrer sobre essas questões, Freire (2003) nos esclarece que: 1 Especialista em Educação. Núcleo de Educação Especial da UFJF (abigailguedes@terra.com.br). 2 Graduando em Pedagogia pela UFJF e bolsista IC/CNPq (asaromualdo@yahoo.com.br). 3 Graduanda em Pedagogia pela UFJF e bolsista PIBIC-UFJF/CNPq. (jequeri@sdnet.com.br). 4 Doutora em Filosofia. Professora da UFJF (nesp@faced.ufjf.br). 5 Graduanda em Pedagogia pela UFJF (samyapetrina@hotmail.com). 1
  • 2. V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22 - setembro 2005. Não é possível pensar os seres humanos longe sequer da ética, quanto mais fora dela. Estar longe ou pior, fora da ética, entre nós, mulheres e homens é uma transgressão. É por isso que transformar a experiência educativa em puro treinamento técnico é amesquinhar o que há de fundamentalmente humano no exercício educativo: o seu caráter formador. Se se respeita a natureza do ser humano, o ensino dos conteúdos não pode dar-se alheio à formação moral do educando. (p.33). Nesse aspecto, temos que considerar a ética presente também nas ações e relações do nosso cotidiano escolar que se fortalece nas atitudes e comportamentos vivenciados quando permitimos que o educando ou a educanda atue como ser histórico-social escolhendo, intervindo, criticando, rompendo, comparando, e tomando decisões. Sendo assim, a problematização das questões deve ser debatida no coletivo de nossas salas de aula e apoiarem-se no respeito às opiniões do outro. Neste sentido, Freire (2001) ressalta que a tarefa fundamental do educador e da educadora é: [...] uma tarefa libertadora. Não é para encorajar os objetivos do educador e as aspirações e os sonhos a serem reproduzidos nos educandos, os alunos, mas para originar a possibilidade de que os estudantes se tornem donos de sua própria história. É assim que eu entendo a necessidade que os professores têm de transcender sua tarefa meramente instrutiva e assumir a postura ética de um educador que acredita verdadeiramente na autonomia total, liberdade e desenvolvimento daqueles que ele ou ela educa. (p.78). Quando aprofundamos essa discussão compreendemos que a construção do conhecimento se faz de forma mais dinâmica, em ambientes heterogêneos, onde a diferença seja percebida como aspecto positivo no processo educativo. As diferenças de gêneros, etnias, religiosas e outras passarão a ser consideradas como fatores desencadeantes de novos construtos. Os embates e conflitos decorrentes desse novo momento onde se estabelecem as mudanças nos apontarão para um fazer coletivo diferenciado e, conseqüentemente, para a busca de metodologias que atendam a todos os alunos. Ao afirmar que “formar é muito mais que puramente treinar o educando no desempenho de destrezas” (FREIRE, 2003, p.14), Freire nos convida a repensar nossa prática educativa. É necessário que o professor assuma-se como sujeito da produção do saber e saiba que ensinar não é transferir conhecimentos, mas criar possibilidades para a sua construção. Portanto, formar e ser professor, é uma relação de comunhão, aceitação de valores inerentes a cada sujeito de aprendizagem envolvido nesse processo. Uma adequada formação do professor é de fundamental importância para o exercício de sua prática, pela postura que irá adotar no encaminhamento de suas ações. Nos últimos anos, essa formação tem passado por uma revisão crítica substantiva, uma vez que muito se tem questionado sobre o papel da educação na sociedade e a falta de clareza sobre a função do educador. Isso remete à questão da formação tradicional dos educadores que acontece desvinculada da situação político-social e cultural do país e que considera o professor como um especialista em conteúdos, um transmissor de saberes acumulados, desvinculados da realidade do aluno e do contexto social mais amplo. 2
  • 3. V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22 - setembro 2005. No início dos anos 70, essa formação apresentou um caráter simplesmente instrumental, como conseqüência da influência do desenvolvimento tecnológico e científico. A educação se constituía em elaboração e execução de planos de ensino dentro de uma visão sistêmica. O professor foi transformado em um simples transmissor acrítico e mecânico de conhecimentos e informações. Sua formação ficou reduzida à aquisição de instrumentos que propiciassem a transmissão desse conteúdo. A ênfase exclusiva no treinamento técnico do professor acabou prejudicando sua formação profissional. Este aprendeu como fazer, mas não aprendeu para que fazer. A partir dos anos 80 surge um movimento de consciência política e cultural no país e ao mesmo tempo emerge a necessidade do professor estar ciente de seu papel de agente sócio- político. Foi preciso analisar e redimensionar a função da dimensão pedagógica do ensino, neste novo contexto. E ainda superar a preocupação maior com a modernização de métodos de ensino e recursos tecnológicos para se preocupar com as novas funções sociais e políticas da educação. A perspectiva crítica educacional fez com que essa formação tomasse novos rumos. O discurso do compromisso político do professor, a procura de novas alternativas de competência, a conscientização sobre o seu papel e da educação para a sociedade passaram a ser a principal preocupação dos envolvidos com a tarefa docente. O questionamento dos educadores apontava para o que seria uma competência profissional englobando a dimensão política do ato pedagógico. Neste sentido, Freire (2003) nos remete a seguinte reflexão: E que dizer de educadores que se dizem progressistas mas de prática pedagógico- política eminentemente autoritária? Não é por outra razão que insisti tanto, em Professora sim, Tia não, na necessidade de criarmos, em nossa prática docente, entre outras, a virtude da coerência. Não há nada talvez que desgaste mais um professor que se diz progressista do que sua prática racista, por exemplo. É interessante observar como há mais coerência entre os intelectuais autoritários, de direita ou de esquerda. Dificilmente, um deles ou uma delas respeita e estimula a curiosidade crítica nos educandos, o gosto da aventura. Dificilmente contribui, de maneira deliberada e consciente, para a constituição e a solidez da autonomia do ser do educando. De modo geral, teimam em depositar nos alunos apassivados a descrição do perfil dos conteúdos, em lugar de desafiá-los a apreender a substantividade dos mesmos, enquanto objetos gnosiológicos, somente como os aprendem. (p.109-10). Ser sujeito de experiência não é somente ser sujeito de informação, de opinião, do trabalho, do saber, do julgar, do fazer, do poder, do querer, pois, o verdadeiro sentido de experiência se fundamenta no diálogo, que permite que haja transformação dos sujeitos envolvidos nesse processo. É saber escutar, refletir, apreender a lentidão, dialogar com o outro, para enxergar neste a diversidade dos saberes, tendo consciência de que somos seres inacabados enquanto estivermos convivendo e experimentando com o outro o prazer da busca do conhecimento. Este conhecimento sempre virá a somar na formação humana, jamais podendo defini-la. Os homens então, dotados de uma racionalidade, estão a cada momento em busca de ser mais, em busca de sua própria compreensão enquanto sujeitos sócio-histórico-interacionistas. Portanto, Freire entende os homens e mulheres como seres inconclusos, ou seja, em constante processo de busca e construção. E ainda os reconhece como: 3
  • 4. V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22 - setembro 2005. [...] seres que estão sendo, seres inacabados, inconclusos em e com uma realidade que, sendo histórica também, é igualmente inacabada. Na verdade, diferentemente dos outros animais, que são apenas inacabados, mas não são históricos, os homens se sabem inacabados. Têm a consciência de sua inconclusão. (FREIRE, 2002, p. 72- 3). E esse inacabamento, ou melhor, a consciência dele, é condição sine qua non do ser humano. E a partir desta conscientização, o homem e a mulher possibilitam a abertura para buscar em seu interior sua própria transformação; tornam-se mais críticos para o enfrentamento das situações-limites que lhes são impostas socialmente. Nas palavras de Freire (2003): É na inconclusão do ser, que se sabe como tal, que se funda a educação como processo permanente. Mulheres e homens se tornaram educáveis na medida em que se reconheceram inacabados. Não foi a educação que fez mulheres e homens educáveis, mas a consciência de sua inconclusão é que gerou sua educabilidade. É também na inconclusão de que nos tornamos conscientes e que nos inserta no movimento permanente de procura que se alicerça a esperança. “Não sou esperançoso”, disse certa vez, por pura teimosia, mas por exigência ontológica. (p.58). Para apreendermos este sentido de experiência é preciso entender que a aprendizagem se dá nas interações, nas interlocuções, nas trocas, portanto, a nossa busca é constante e não passageira, enquanto sujeitos inconclusos e abertos a desvendar os saberes que a experiência tem a nos oferecer. Freire (2002) nos aclara essa questão do ser inconcluso, em especial educador ou educadora e sua práxis, quando diz que: Aí se encontram as raízes da educação mesma, como manifestação exclusivamente humana. Isto é, na inconclusão dos homens e na consciência que dela têm. Daí que seja a educação um quefazer permanente. Permanente, na razão da inconclusão dos homens e do devenir da realidade. Desta maneira, a educação se re-faz constantemente na práxis. Para ser tem que estar sendo. (p.73). O ser ex-posto na experiência corre o risco de ser transformado por esta, pois, se ele não consegue problematizar as ações do cotidiano escolar, ele não internalizará estas transformações, nunca terá sensação de completude. O sujeito de experiência corre o perigo de se indignar, ou seja, não se conformar com a situação posta, buscando sempre respostas às suas indagações, nunca se acomodando. Portanto, experiência não é prática, pois essa nem sempre está sensível e reflexiva ao momento vivido. A formação de um profissional competente, necessário às novas condições econômicas, políticas, sociais e culturais do país exige um preparo adequado. As dimensões técnica e política da educação tornam-se os elementos norteadores das propostas de ensino. A escola hoje requisita um professor que expresse em seu fazer pedagógico as dimensões humana, tecnológica e política e que seja capaz de visualizar os efeitos sociais do trabalho pedagógico e dos condicionamentos que nele interferem, que saiba selecionar criticamente as orientações de sua práxis. A preocupação básica na formação de professores não pode ser somente a de lhes oferecer os conteúdos das disciplinas pedagógicas, mas também a de preparar profissionais 4
  • 5. V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22 - setembro 2005. comprometidos com um projeto de sociedade voltado para a construção do homem integral – ético, estético, político e social. A competência técnica e o compromisso político do professor certamente eliminará de sua prática o subterfúgio de culpar somente o aluno pelo fracasso escolar e excluir aqueles que apresentem dificuldades de aprendizagem. Há urgência em preparar educadores aptos a enfrentar os desafios colocados por uma sociedade em mudança. Ser educador nesta nova dimensão significa comprometimento com a construção de uma nova realidade. É preciso formar o professor restaurando-lhe o seu “ser docente”, no sentido ontológico para que possa exercer uma prática humanizada. A prática pedagógica se desenvolve como instrumento de manutenção ou transformação do status quo. A formação do professor pode significar a tentativa de modificar ou manter não somente o trabalho pedagógico-educativo, mas também o processo histórico da sociedade como um todo. Freire faz uma crítica à pedagogia tradicional denominada por ele “educação bancária”, sendo esta o exercício de uma prática massificadora, de treinamento, na qual os educandos tornam- se meros receptores de conteúdos que são “depositados” pelos educadores de forma a manter os primeiros à margem do conhecimento e de sua razão de existir. Nesta educação, a relação existente entre os envolvidos no processo ocorre verticalmente, já que os educandos transformam-se em reprodutores e copiadores, ou seja, sujeitos a-críticos, tendo o discurso do educador como verdade absoluta, não intervindo no processo educacional em momento algum. Freire (2002) ressalta que este tipo de educação: [...] conduz os educandos à memorização mecânica do conteúdo narrado [...] os transforma em “vasilhas”, em recipientes a serem “enchidos” pelo educador. Quanto mais vá “enchendo” os recipientes com seus “depósitos”, tanto melhor educador será. Quanto mais se deixarem docilmente “encher”, tanto melhores educandos serão. Desta forma, a educação se torna um ato de depositar, em que os educandos são os depositários e o educador o depositante (p.58). Contrapondo-se a esta prática, Freire propõe uma educação problematizadora, que forme um sujeito crítico, participativo e atuante na sociedade com o objetivo de transformá-la para que todos tenham iguais oportunidades. Esta é a “educação libertadora” que Freire defende como justa e igualitária e que desperta no indivíduo a sua vocação ontológica, ou seja, ser sujeito de sua própria realidade. Nesta perspectiva, a relação existente é horizontal, pois a troca de experiências e conhecimentos entre educador e educando é constante, e um não se sobrepõe ao outro. Nas palavras de Freire (2002): Não seria possível à educação problematizadora, que rompe com os esquemas verticais característicos da educação bancária, realizar-se como prática da liberdade, sem superar a contradição entre o educador e os educandos. [...] Desta maneira, o educador já não é o que apenas educa, mas o que, enquanto educa, é educado, em diálogo com o educando que, ao ser educado, também educa. Ambos, assim, se 5
  • 6. V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22 - setembro 2005. tornam sujeitos do processo em que crescem juntos e em que os “argumentos de autoridade” já não valem. (p. 68). A prática pedagógica não comporta mais o ato de depositar ou de apenas transmitir conhecimentos e valores que condicionam o aluno a uma visão parcializada da realidade. Ela deve se estabelecer a partir do conhecimento existente, elaborando novos conhecimentos. Assim, esta prática se transforma em uma situação gnosiológica, com o desenvolvimento de uma postura ativa e co-participante dos sujeitos nela envolvidos. Por ser tarefa de “sujeitos”, o conhecimento exige ação e reflexão do homem sobre o mundo, sobre a realidade em que vive. A reflexão leva os alunos a assumirem uma postura crítica diante dos problemas com os quais se deparam no dia-a-dia. Para Freire (1981), o ato de conhecer envolve um movimento dialético que vai da ação à reflexão sobre ela e desta a uma nova ação “para o educando conhecer o que antes não conhecia, deve engajar-se num autêntico processo de abstração por meio do qual reflete sobre a totalidade “ação-objeto”, ou, em outras palavras, sobre formas de orientação no mundo” (p.50). Todo problema requer contextualização. Ele não pode ser analisado de modo parcial, isoladamente, mas numa perspectiva global, relacionando-se o aspecto em questão com o contexto no qual acontece. A problematização elimina a memorização e a repetição mecânica dos conhecimentos e faz com que o aluno perceba a realidade dos fatos de forma mais aprofundada. É a problematização, portanto, que torna autêntica a aprendizagem e propicia o domínio do conhecimento de forma efetiva. A conscientização possibilita ao aluno inserir-se no processo histórico; reconhecer que o homem faz a história e que é capaz de mudar o seu rumo. Conforme Freire (1980), a conscientização produz a desmitologização, ou seja, propicia ao educando reconhecer os mitos que camuflam a realidade social para melhor decifrá-la. A conscientização acontece quando se ultrapassa a simples apreensão do fato, para analisá-lo de forma crítica. Quando se permite aflorar a consciência racional o homem passa a orientar suas ações pelo pensamento, por meio da lógica. Dessa forma, educar pela conscientização significa possibilitar a busca de plenitude da condição humana. Segundo Freire (2002): Somente o diálogo, que implica um pensar crítico, é capaz, também, de gerá-lo. Sem ele não há comunicação e sem esta não há verdadeira educação. A que, operando a superação da contradição educador-educandos, se instaura como situação gnosiológica, em que os sujeitos incidem seu ato cognoscente sobre o objeto cognoscível que os mediatiza. (p.83). Agindo assim, o educador possibilita ao aluno a oportunidade de elaborar seu pensamento, aprofundar a compreensão que tem de si, do outro, do mundo, do contexto social mais amplo. Este método de ensino dialógico acompanha algo da maiêutica socrática6, fazendo com que o 6 O método socrático, como é denominado, consiste numa dialética, em que a discussão se desenvolve em dois tempos, - a ironia e a maiêutica. A ironia socrática consiste em perguntar, fingindo desconhecer o assunto (= dúvida fictícia e metódica), com vistas a refutar a tese contrária e preparar a tese verdadeira. A maiêutica (de: "4 , b T = parir) de Sócrates conduz o interlocutor a descobrir paulatinamente o conhecimento sobre o objeto de discussão. No caso de Sócrates que 6
  • 7. V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22 - setembro 2005. aluno por si, sob orientação do professor possa elaborar conhecimento, adquirir informações. A reflexão, a conscientização, só podem acontecer por meio do diálogo do qual o educador deverá fazer uso constante. Na medida em que a prática educativa não pode acontecer pela simples transferência acrítica do conhecimento, o diálogo torna-se, portanto, elemento imprescindível para o processo educativo. Ele se constitui no encontro de sujeitos interlocutores na busca da compreensão e significação para o conhecimento que se desvela. Acontece com a co-participação de sujeitos no ato de pensar. É na dialogicidade e na problematização que educador e educando, conjuntamente, adquirem uma postura crítica e o domínio do conhecimento. De acordo com Freire (2003), não pode haver diálogo se não há humildade e se não se reconhece a possibilidade de uma constante troca com o outro. O autor nos questiona: Como posso dialogar, se alieno a ignorância, isto é, se a vejo sempre no outro, nunca em mim? Como posso dialogar, se me admito como um homem diferente, virtuoso por herança, diante dos outros, meros “isto”, em quem não reconheço outros eu? Como posso dialogar, se me sinto participante de um gueto de homens puros, donos da verdade e do saber, para quem todos os que estão fora são “essa gente”, ou são “nativos inferiores”? Como posso dialogar se parto de que a pronúncia do mundo é tarefa de homens seletos e que a presença das massas na história é sinal de sua deterioração que devo evitar? Como posso dialogar, se me fecho à contribuição dos outros, que jamais reconheço, e até me sinto ofendido com ela? Como posso dialogar se temo a superação e se, só em pensar nela, sofro e definho? (p. 80-1). É pelo diálogo que o professor vai fazer com que o aluno caminhe, desenvolva seu raciocínio, tome posicionamentos. Mas, em Freire, o diálogo não exclui o conflito, e sim, ativa discussões, solicita participação e presença do educando. O diálogo não é uma discussão polêmica nem mesmo hostil entre o educador e o educando, mas é o elemento básico da conscientização, da busca do saber, da verdade. É uma ação conjunta, que requer envolvimento de todos os envolvidos no processo ensino-aprendizagem. Para isso, o professor precisa ter atitude de abertura, de aceitação do outro com sua subjetividade. Daí o que se põe em evidência é a unidade educador-educando, num processo de intercomunicação. O professor que tem respostas prontas obriga o aluno a se calar, elimina o diálogo e estabelece uma relação de poder entre eles, ao mesmo tempo em que bloqueia a capacidade de pensar do educando, ou melhor, sua capacidade de ser. Com a chamada quebra de paradigmas, deflagradas na Modernidade e refletidas na atual sociedade, muitas das práticas educacionais que por vezes se mostraram puramente tecnicistas, vieram à tona nas discussões de toda a esfera educacional. E, no que tange aos indivíduos envolvidos nesse processo, os educandos passaram a ser vistos, por uma corrente supunha haver idéias inatas, a maiêutica consistia, mais precisamente, em fazer recordar, despertando os conhecimentos virtualmente possuídos. [...]. Além disto, a maiêutica era caracterizada pela sua concepção inatista, bem como pelo fato de havê-la denominado em função à profissão de sua mãe, que era parteira. (http://www.cfh.ufsc.br/~simpozio/ novo/2216y098.htm). 7
  • 8. V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22 - setembro 2005. progressista, como agentes da transformação social, ou seja, como seres-sujeito do quefazer. Sendo assim, a questão da individualidade impulsionou, ou ao menos abriu espaço para uma reflexão crítica, um novo olhar dos educadores, que até então mantinham a idéia de classe homogênea. Cada ser é dotado de individualidade, contexto social e, principalmente, um fato que é essencial na educação, cada educando tem seu nível de desenvolvimento. Conseqüentemente, uma classe escolar é heterogênea em todos os seus aspectos. Os alunos considerados fora dos padrões socialmente estabelecidos de “normalidade”, em face de um pensamento conservador, ficam marginalizados, estereotipados, segregados do convívio com os ditos “normais”. Em algumas sociedades, ser negro, ser velho, ser mulher, ser criança, ser deficiente etc., representou ao longo dos tempos – e ainda representa – uma condição de subalternidade de direitos e desempenho de funções sociais. As diversas formas de discriminação são reflexos da padronização social, que é ingenuamente explicada, por uma visão caritativa ou mesmo de proteção, chegando até no discurso em prol da segregação para se fazer um treinamento para posterior convívio social. É nesse contexto de discriminação que Freire se posicionou contra todo um sistema social que exclui um indivíduo mediante um fator peculiar do sujeito. Isto é uma perversidade do homem moderno. Freire (2003) declarou que: Aceitar e respeitar a diferença é uma dessas virtudes sem o que a escuta não se pode dar. Se discrimino o menino ou menina pobre, a menina ou o menino negro, o menino índio, a menina rica; se discrimino a mulher, a camponesa, a operária, não posso evidentemente escutá-las e se não as escuto, não posso falar com eles, mas a eles, de cima para baixo. Sobretudo, me proíbo entendê-los. Se me sinto superior ao diferente, não importa quem seja, recuso-me escutá-lo ou escutá-la. O diferente não é o outro a merecer respeito é um isto ou aquilo, destratável ou desprezível. (p. 120- 1). Na realização de uma prática escolar inclusiva devem-se considerar os sujeitos historicamente constituídos como seres capazes da transformação e com direito a participar do processo de construção do mundo. Para isso torna-se necessária a construção de uma nova ética. Neste sentido, Freire (2003), em relação à ética universal esclarece que: Quando, porém, falo da ética universal do ser humano estou falando da ética enquanto marca da natureza humana, enquanto algo absolutamente indispensável à convivência humana. Ao fazê-lo estou advertido das possíveis críticas que, infiéis ao meu pensamento, me apontarão como ingênuo e idealista. Na verdade, falo da ética universal do ser humano da mesma forma como falo de sua vocação ontológica para o ser mais, como falo de sua natureza constituindo-se social e historicamente não como um a priori da História. (p.18). Dessa forma, compreender o conceito de inclusão em seu sentido amplo significa reestruturar a nossa práxis, reavaliar as interações do nosso cotidiano escolar e adequá-las à realidade social e cultural de nossos alunos. A escola inclusiva deve ser aquela que busca construir no coletivo uma pedagogia que atenda a todos os alunos e que compreenda a diversidade humana como fator impulsionador dessa nova forma de organizar as aprendizagens. 8
  • 9. V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22 - setembro 2005. Se um dos princípios da inclusão é a celebração das diferenças, entendê-la como agente de transformação de nossa realidade educacional é respeitar nos educandos suas singularidades. É fazer do nosso espaço escolar o lugar onde as experiências coletivas sejam vivenciadas considerando as atitudes éticas adotadas pelo grupo como condições indispensáveis, capazes de promover mudanças significativas nos processos sociais. Entretanto, para isso, torna-se necessário investir na formação de professores no sentido de aprofundar os questionamentos de como realizar uma prática escolar que acompanhe as mudanças ocorridas em decorrência dos avanços trazidos, sobretudo pelas novas tecnologias que nos oferecem outra forma de cognição e conseqüentemente outras formas de relações sociais. A concepção de educação tradicional que se apóia na idéia de padrão, de homogêneo não se insere mais nesse espaço-tempo que estamos acompanhando hoje. Assim, compreender o verdadeiro papel de um educador ou uma educadora progressista, com vistas a realizar uma pedagogia que atenda a todos os alunos significa formar para o múltiplo e para o heterogêneo, ou seja, conscientizar-se da necessidade de adotar uma nova concepção de educação. No entanto, para realizá-la, precisamos rever nossos planejamentos curriculares, nosso sistema de avaliação, a função de seus administradores, a importância da formação continuada dos professores, e a relação professor/aluno, considerando em todas elas os conceitos da ética nas relações, que devem direcionar os pilares dessa nova escola. Essa proposta de uma nova formação docente encontra em Paulo Freire uma vasta argumentação considerando que os fundamentos de sua obra apóiam-se em pilares que norteiam a realização de uma educação para todos. As categorias estruturais do pensamento freireano discutem as práticas desenvolvidas no espaço escolar considerando a historicidade, o diálogo, a conscientização, a inconclusão, a utopia (inédito viável), a comunhão e a libertação como realidades que deverão permear todo o trabalho do educador ou da educadora com vistas a essa construção baseando-se no respeito às diferenças sociais, culturais, étnicas e adequando-as ao espaço-tempo atual. REFERÊNCIAS BONDÍA, Jorge Larrosa. Notas sobre a experiência e o saber de experiência. Disponível em: <http://www.miniweb.com.br/Atualidade/INFO/textos/saber.htm >. Acesso em 21 jul. 2005. (tradução: João Wanderley Geraldi). FREIRE, Paulo. Extensão ou Comunicação. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992. FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 2003. FREIRE, Paulo. Pedagogia da Indignação: cartas pedagógicas e outros escritos. São Paulo: UNESP, 2000. FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002. FREIRE, Paulo. Pedagogia dos sonhos possíveis. São Paulo: UNESP, 2001. PAULI, Evaldo. Segundo Período da Filosofia Antiga. In: Enciclopédia Simpozio. Disponível em: < http://www.cfh.ufsc.br/~simpozio/novo/2216y098.htm > Acesso em: 25 jul. 2005. 9
  • 10. V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22 - setembro 2005. CONCEPÇÃO DIALÓGICA E AS NTICS: A EDUCOMUNICAÇÃO E OS ECOSSISTEMAS COMUNICATIVOS Ademilde Silveira Sartori1 Maria Salete Prado Soares RESUMO Alicerce do pensamento latino-americano sobre a inter-relação comunicação e educação, Paulo Freire iluminou as bases de um novo modelo comunicacional considerado por Jesús Martín- Barbero como a primeira teoria latino-americana de comunicação. Paulo Freire desponta como o educador que definiu bases sólidas para gestar os espaços dos ecossistemas comunicativos, pois sua teoria dialógica, baseada em colaboração, união, organização e síntese cultural, aproxima-se do conceito de Educomunicação. A Educomunicação é um campo teórico-prático integrado e integrador que pressupõe um modus operandi que reconceitua a relação comunicação e educação. Nestes termos, o educomunicador é aquele profissional que, tendo em conta as possibilidades comunicativas colocadas pelas NTIC, gera e gerencia ecossistemas comunicativos. Palavras-chave: Educação dialógica – educomunicação – ecossistemas comunicativos. INTRODUÇÃO O século XX apresentou significativas transformações em quase todos os âmbitos: sociais, econômicos, políticos, culturais que abalaram a sociedade vigente e que estão diretamente ligadas ao surgimento das tecnologias da comunicação e da informação. Elas reorganizaram práticas, vivências, estruturas, infiltrando-se em praticamente todos os setores da sociedade, alterando rotinas sedimentadas tanto na vida empresarial quanto na particular. Neste século da comunicação, a globalização também contribuiu para abalar estruturas e quadros de referência que serviam de parâmetros a indivíduos e coletividades. Capaz de uniformizar a sociedade, de manipular e impor padrões alheios à sociedade local e, paradoxalmente, promover um renascimento de valores culturais locais, a globalização trouxe, no rastro de sua passagem, uma exacerbação das desigualdades sociais e acirramento da exclusão social, tanto internamente aos Estados quanto no plano internacional, o que gerou uma evidente erosão social da cidadania. 7 As novas tecnologias possibilitaram a construção de uma malha de conexão entre áreas do conhecimento distintas e a criação de uma dimensão por onde transitam idéias e conceitos díspares, permitindo à humanidade vivenciar novas experiências no saber, no fazer, no sentir. A importância que a comunicação assumiu na sociedade atual nos obriga a olhá-la como uma nova força nas relações cotidianas, em todas as esferas sociais. O século XIX reorganizou-se econômica, política e socialmente em função do desenvolvimento industrial e do crescimento 1 Doutora em Ciências da Comunicação pela ECA/USP, UESC (ademilde@matrix.com.br) 7 Mestre em Ciências da Comunicação pela ECA/USP (salete.soares@gmail.com.). 1
  • 11. V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22 - setembro 2005. das relações entre povos e culturas; o século XX confrontou-se com a onipresença dos meios de comunicação que escancarou a força dos dispositivos de informação presentes em cada canto do planeta de forma instantânea, produzindo sentidos, induzindo ideologias; tudo isso acarretou profundas conseqüências na vida individual e coletiva dos séculos XX e XXI, inclusive na educação. Martín-Barbero (1996) afirma que estamos diante de um ecossistema comunicativo conformado não pelas máquinas ou meios, mas por linguagens, saberes e escritas, pela hegemonia da linguagem audiovisual sobre a tipográfica que desordenam e remodelam as formas de aquisição do saber e do conhecimento. Para o educador Paulo Freire, a comunicação é elemento fundamental pois é ela que transforma seres humanos em Sujeitos. Freire estabelece a relação entre comunicação e educação, na medida em que esta última é vista como um processo daquela, já que é uma construção partilhada do conhecimento mediada por relações dialéticas entre os homens e o mundo. A COMUNICAÇÃO O campo da Comunicação transita por diferentes áreas, incorporando um espírito transdisciplinar, o que longe de enfraquecê-la, confere-lhe uma vitalidade ímpar nessa transgressão de fronteiras disciplinares e cruzamento de posturas científicas. Para Pierre Bourdieu, campo é um universo que “[...] possui sua doxa específica, conjunto de pressupostos inseparavelmente cognitivos e avaliativos cuja aceitação é inerente à própria pertinência” (BOURDIEU, 2001, p. 122). Identifica, assim, vários campos como o científico, o jornalístico, o literário, o artístico, e cada um consiste em uma institucionalização de um ponto de vista, “[...] um conjunto de pressupostos e de crenças partilhadas [...] inscritas em certo sistema de categorias de pensamento” (BOURDIEU, 1997, p. 67). Ao contemplar uma determinada problemática, um campo é: [...] um espaço social estruturado, um campo de forças – há dominantes e dominados, há relações constantes, permanentes, de desigualdade, que se exercem no interior desse espaço – que é também um campo de lutas para transformar ou conservar esse campo de forças. Cada um, no interior desse universo, empenha em sua concorrência com os outros a força (relativa) que detém e que define sua posição no campo e, em conseqüência, suas estratégias. (BOURDIEU, 1997, p. 57). Neste sentido, em “História das Teorias da Comunicação”, Armand Mattelart e Michèlle Mattelart entendem o campo da comunicação como um: [...] campo de observação científica que, historicamente, se inscreveu em tensão entre redes físicas e imateriais, entre o biológico e o social, a natureza e a cultura, os dispositivos técnicos e o discurso, a economia e a cultura, as perspectivas micro e macro, o local e o global, o ator e o sistema, o indivíduo e a sociedade, o livre- arbítrio e os determinismos sociais. (MATTELART e MATTELART, 1999, p. 10). Esse campo em profunda e contínua mutação é caracterizado por Venício Lima (2001) como “desarticulado, conflituoso e em permanente crise teórica”, o que não impede a Comunicação de, mesmo possuindo contornos vagos e indefinidos, estar na centralidade da discussão no final do século XX e início do XXI, prestando-se aos mais diversos usos estratégicos. 1
  • 12. V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22 - setembro 2005. A palavra “comunicação” é entendida, muitas vezes pelos especialistas, como possuidora de duas faces: como um processo em que A envia uma mensagem para B, sobre o qual a mensagem tem um efeito determinado ou pode ser enfocada como uma negociação e um intercâmbio de sentido, no qual as mensagens, as pessoas, suas culturas e a “realidade” interagem para possibilitar a produção de sentido, ou seja, a sua compreensão. (O´SULLIVAN, 2001, p. 52). O autor latino-americano Jorge Huergo (2001) explica que, etimologicamente, a palavra “comunicação” provém da palavra latina “communis” que significa “tornar comum”. São dois sentidos apresentados pelo verbo: o primeiro, como transitivo, tem o significado de “transmitir” e “persuadir” e está intimamente ligado a “divulgação”, quer dizer, enquanto um fala, o outro escuta. Estabelece-se uma relação de poder em que um é o que transmite, detém o conhecimento e o outro simplesmente recebe, numa relação vertical que se torna mais acentuada ainda quando levamos em consideração os meios de comunicação de massa. Esse sentido do verbo comunicar foi chamado por Paulo Freire, no livro Educação como Prática da Liberdade (1967), de alienação da ignorância, pois o outro que recebe não pode ter o processo de conhecimento sem a “doação” daquele que detém o saber. A segunda interpretação entende o verbo como reflexivo e, nesse sentido, ‘comunicar’ é ‘tornar comum’, ‘partilhar’ e ‘dialogar’. Transformou-se, em alguns casos, em um sentido quase religioso, como a idéia de comunidade ideal de comunicação, de Jürgen Habermas, baseada na vontade subjetiva dos participantes (comunicação intersubjetiva) e na idéia de comunicação como uma condição da vida social. A comunicação seria um agir, um comportamento, uma expressão humana observável e identificável. No agir comunicacional, as ações são orientadas para o entendimento mútuo, o ser que inicia o processo comunicacional é também produto dos processos de socialização. Se o conceito de comunicação apresenta, como diz Lima (2001), a ambigüidade de ter no seu significado dois extremos – de transmitir, sentido unidirecional e o de compartilhar, processo participativo – o significado também sofreu alterações ao longo do tempo. Ela teve vários sentidos, tais como: “(a) de objeto tornado comum – uma comunicação ou comunicado; (b) de meios físicos de transporte, as vias de comunicação – estradas, rios, canais; e (c) os meios tecnológicos de transmissão de informação, isto é, a (imprensa, cinema, rádio, televisão)” (LIMA, op. cit., p. 25). Oscilando entre a transmissão – aí envolvida a técnica (ou a funcional como quer Dominique Wolton, 2002) – e a comunicação como interação, há, contemporaneamente, uma tendência a associar o conceito de comunicação aos meios de comunicação de massa, face às radicais transformações por que passaram as tecnologias da comunicação no final do século passado. A dissolução de barreiras entre os diferentes meios tecnológicos, do analógico ao digital, que acontece com aparatos como telefone, televisão, máquina fotográfica, computador e que estão convergindo para um único sistema e convivendo num mesmo aparelho só reforça a posição central que a comunicação assume no mundo contemporâneo. Ela passa a ser considerada como legitimadora de discursos, comportamentos, ações e atua como um instrumento de consenso, assim como foram “a religião nas sociedades tradicionais, o progresso nas sociedades modernas ou a produção na sociedade industrial” (RODRIGUES, 1999, p. 13). 1
  • 13. V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22 - setembro 2005. Forma-se o que Adriano Duarte Rodrigues chama de uma “ideologia comunicacional” (RODRIGUES, op. cit.) no processo da modernidade; a ela caberia redefinir um novo tipo de racionalidade, já que os modelos lógicos fundamentados ou na vertente racionalista, baseada na razão técnico-científica ou na anti-racionalista, vanguardista, exauriram-se durante o processo. Apresentando-se de modo confuso, com pretensões arcaizantes de sociabilidade, a ideologia da comunicação vem carregada de anseios de refundação, de recomeço, de nova era. É do autor a seguinte definição de comunicação: A comunicação não é um produto, mas um processo de troca simbólica generalizada, processo de que a sociabilidade, que gera os laços sociais que estabelecemos com os outros, sobrepondo-se às relações naturais que estabelecemos com o meio ambiente. Se todos os seres vivos estabelecem em permanência trocas imediatas e espontâneas com o mundo natural que os rodeia, nos homens esta interação não é imediata; é mediatizada por símbolos culturais concebidos, elaborados e legados por sucessivas gerações, como a linguagem verbal, os gestos e os comportamentos, o vestuário, a arte, a disposição e o arranjo do espaço público ou do espaço privado. Discursos e silêncios, gestos, comportamentos, ações e omissões constituem as manifestações dos processos comunicacionais, na medida em que correspondem a expectativas geradas pelas regularidades que formam o tecido das relações sociais. (RODRIGUES, 1999, p. 22). A comunicação é um processo de expressão da participação social, de estabelecimento de contato entre pessoas, grupos e classes: A comunicação estuda a produção, a veiculação e recepção das mensagens, tanto a nível pessoal como social, tanto na esfera do privado como na esfera pública, e a interação dos emissores-receptores numa determinada conformação econômica, política e cultural, num determinado tempo e espaço, onde se liga o factual do cotidiano com o conjuntural e estrutural. (MORAN, 1993, p. 15). Assim, tão importante quanto estudar e refletir sobre a comunicação intransitiva, centrada nos dispositivos de que se valem os media, é investigar as possibilidades contidas na comunicação transitiva, proporcionada por complexas redes interpessoais. Na medida em que a educação transformou-se em espaço privilegiado de discussão e cidadania, é um importante tecido comunicativo, torna-se vital colocar a comunicação no centro no fazer pedagógico, quer para questionar os mecanismos não transitivos nas suas diferentes feições, entendê-los e poder agir sobre eles, quer para promover ecossistemas comunicativos que destravem os nós pelos quais a educação está passando. OS ECOSSISTEMAS COMUNICATIVOS Walter Benjamin (1982) foi, talvez, o primeiro a entrever o nascimento do novo sensorium que se formava no intervalo entre as novas condições de produção e as transformações culturais promovidas pelas novas tecnologias da comunicação e informação. Essa mudança permite uma aproximação com tudo aquilo que até então estava distante para as massas – a arte, por exemplo, mas não só ela – desmistificando, com a ajuda das técnicas, aquilo que possuía a aura de sagrado, o que era mantido resguardado e inacessível à população em geral. Esse sensorium permite romper o distanciamento e revigorar o sentimento de igualdade da massa diante da cultura, prerrogativa antes apenas da elite. 1
  • 14. V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22 - setembro 2005. Por intermédio das novas tecnologias e do desenvolvimento da nova sensibilidade, criou-se uma energia que perpassa os novos mecanismos de apreensão do mundo “pela mediação de conectar-se ou desconectar-se dos aparelhos, sempre com destaque para a televisão” (BACCEGA, 2000, p. 10), que pode ser percebida nas empatias cognitivas e expressivas, desenvolvidas, principalmente, pelos jovens. Martín-Barbero explica que “frente à língua e ao território, as (linguagens) eletrônicas, audiovisuais, musicais, ultrapassam essa limitação, produzindo comunidades hermenêuticas que respondem a novos modos de perceber e narrar a identidade” (MARTÍN-BARBERO, 1998, p. 58). Identidades que são capazes de “amalgamar e fazer conviver ingredientes de universos culturais diversos” (MARTÍN-BARBERO, op. cit., p. 13). Instaura-se, assim, um ecossistema tão vital quanto o ambiental: o ecossistema comunicativo: Se trata de una experiencia cultural nueva, o como W. Benjamin lo llamó, un sensorium nuevo, unos nuevos modos de percibir y de sentir, de oír y de ver, una nueva sensibilidad que en muchos aspectos choca y rompe con el sensorium de los adultos. Un buen campo de experimentación de estos cambios y de su capacidad de distanciar a la gente joven de sus propios padres se halla en la velocidad y la sonoridad. No sólo en la velocidad de los autos, sino en la de las imágenes, en la velocidad del discurso televisivo, especialmente en la publicidad y los videoclips, y en la velocidad de los relatos audiovisuales. Y lo mismo sucede con la sonoridad, con la manera con que los jóvenes se mueven entre las nuevas sonoridades: esas nuevas articulaciones sonoras que para la mayoría de los adultos marcan la frontera entre la música y el ruido, mientras para los jóvenes es allí donde empieza su experiencia musical. (MARTÍN-BARBERO, 2000, p. 49). Para a Biologia, a noção de ecossistema inclui tanto fatores bióticos (vivos: animais, plantas, bactéria entre outros) quanto abióticos (ambiente físico) inter-relacionados dinamicamente. Pode ser considerado como o conjunto dos relacionamentos mútuos entre os seres vivos e o meio ambiente. No ecossistema, acontecem trocas e ele está em contínuo dinamismo; não é determinado por seu tamanho, mas por sua estrutura e seus padrões de organização. Jésus Martín-Barbero (2000) quem articulou o conceito de ecossistema comunicativo, não apenas conformado pelas tecnologias e meios de comunicação, mas também pela trama de configurações constituída pelo conjunto de linguagens, representações e narrativas que penetra na vida cotidiana de modo transversal. Adilson Citelli (2000, p. 246) é enfático ao assegurar que, diante das experiências culturais descentradas (formas de socialização, de dispositivos de identificação, de cultura) e onde “nada acontece na esfera pública sem que exista uma mediação de alguma mídia, de alguma forma de trânsito internacional”, é preciso “[...] assegurar a base democrática aos cidadãos”. Esta é a razão pela qual, para Martín-Barbero (2000), é vital que a escola absorva a idéia de que é preciso incorporar um trabalho sério que contemple o novo sensorium e os media, além de evitar que se aprofunde o fosso entre a sensibilidade e a cultura dos professores e dos alunos. Por esse viés, a escola prioriza a interação com os novos campos de experiência surgidos da reorganização dos saberes, dos fluxos de informação, das redes de intercâmbio, além de interatuar com os novos modos de representação e de ações cidadãs, que interligam o local com o mundial. Dessa forma, deve, portanto, assumir o trabalho com o ecossistema comunicativo como a dimensão estratégica da cultura (MARTÍN-BARBERO, 1996). O desafio é como inserir na escola um ecossistema comunicativo que contemple ao mesmo tempo: experiências culturais heterogêneas, o entorno das novas tecnologias da informação e 1
  • 15. V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22 - setembro 2005. da comunicação, além de configurar o espaço educacional como um lugar onde o processo de aprendizagem conserve seu encanto. (MARTÍN-BARBEIRO, 1996) As políticas culturais e comunicacionais na educação devem passar pelas “ambiguas y complejas interacciones entre el ecosistema comunicacional y el sistema político en su indelegable responsabilidad de dinamizar la educación y creatividad cultural, incluyendo em ambas la invención científica y la innovación tecnológica” (MARTÍN-BARBEIRO, 2002, p. 56). Uma postura crítica aos meios de comunicação só será eficiente quando inserida em um projeto educativo cultural mais amplo. Ismar de Oliveira Soares (1999) desenvolve o conceito de ecossistema comunicativo de modo mais abrangente. O pesquisador deseja estabelecer bases sólidas para a inter-relação comunicação e educação, a qual chama de Educomunicação, que trabalha “a partir de um substrato comum que é a ação comunicativa no espaço educativo, ou seja, a comunicação inter-pessoal, grupal, organizacional e massiva promovida com o objetivo de produzir e desenvolver ecossistemas comunicativos através da atividade educativa e formativa”. Soares insere o conceito na perspectiva da gestão comunicativa: compreende “a organização do ambiente, a disponibilidade dos recursos, o modus faciendi dos sujeitos envolvidos e o conjunto das ações que caracterizam determinado tipo de educação comunicacional” (SOARES, 2002b, p. 125). Por esse ângulo, falar em ecossistema comunicativo implica buscar a descentralização de vozes, a dialogicidade, a interação. As relações devem buscar equilíbrio e harmonia em ambientes onde convivem diferentes atores. Não é apenas no mundo tecnológico que atua o ecossistema comunicativo, mas em todas as esferas e a comunicação. Assim como há a necessidade de uma relação equilibrada entre homens e natureza, é necessária a criação de “verdadeiros "ecossistemas comunicativos" nos espaços educativos, que cuide da saúde e do bom fluxo das relações entre as pessoas e os grupos humanos, bem como do acesso de todos ao uso adequado das tecnologias da informação”. (SOARES, 2002c). Para Soares, o conceito de Educomunicação está intrinsecamente ligado ao de ecossistema comunicativo, já que a primeira é representada pelo “conjunto de ações que permitem que educadores, comunicadores e outros agentes promovam e ampliem as relações de comunicação entre as pessoas que compõem a comunidade educativa”. (SOARES, op. cit.). Ou seja, o lócus de ação da Educomunicação são os ecossistemas comunicativos, que, para Soares, devem conter fluxos comunicativos positivos; existe mesmo uma recomendação de que ao geri-los “é interessante começar a partir dos pontos de consenso” (Ibidem), evitando conflitos. EDUCOMUNICAÇÃO Importante questão referente à inter-relação comunicação e educação diz respeito ao papel da comunicação nas relações interpessoais, de trocas entre sujeitos. Nesse sentido, pode ser entendida como uma comunicação transitiva, “é o processo de expressão da participação social, do estabelecimento de contato entre pessoas, grupos e classes. A comunicação expressa a dinâmica do cotidiano, a existência social do indivíduo e a do indivíduo na 1
  • 16. V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22 - setembro 2005. sociedade”, conforme José Manuel Moran (1993, p. 11). É fundamentalmente uma prática vivida, um campo de trocas e de interações que possibilita a expressão, o relacionamento, o ensino e o aprendizado. Essa outra maneira de ver a comunicação passa pela perspectiva do compartilhamento, da troca e de entendimento entre as pessoas. Nesse sentido, aproxima-se da visão de teóricos da educação, como Paulo Freire, para quem a comunicação é fundamental nas relações humanas, assim como a inter-relação de seus elementos básicos no processo educativo. Para haver conhecimento, é necessária uma relação social igualitária e dialogal entre os sujeitos, que resulta em uma prática social transformadora. Baseado em Freire, Francisco Gutierrez defendia o princípio de que o “processo de comunicação é essencial à educação” e que “o processo de aprendizagem é autêntico quando se efetua uma mudança naquele que aprende. Por esse motivo a aprendizagem pressupõe a interação, o intercâmbio.” (GUTIÉRREZ, 1978, p. 33-39). O princípio da ação e do diálogo comunicativos podem ser alargados se relacionarmos com a dimensão da comunicação pessoal de José Manuel Moran: A comunicação caminha na direção da inclusão, da integração. Da inclusão de pessoas diferentes, de formas distintas de ver. Caminha na aproximação de mais pessoas, de mais grupos; no estabelecimento de vínculos, de pontes para aproximar- nos das pessoas, sem isolar-nos em grupinhos, “panelinhas”, ou seitas. [...] Pela comunicação não só expresso emoções, sentimentos, como também lido com afeto. Pela comunicação busco afeto, carinho, ser querido, amado. Se essas emoções são bem gerenciadas, são positivas, facilitaremos todas as atividades em todas as dimensões e direções das nossas vidas. A rejeição, a falta de afeto, de aceitação nos desestrutura, nos joga para fora de nós mesmos numa busca frenética de qualquer compensação, reconhecimento, aceitação. (MORAN, 1998, p. 10-16). [...] Ou seja, ao falarmos de ecossistema comunicativo seria interessante pensar na qualidade das relações interpessoais do processo, visto que não podemos desconsiderar que, antes de tudo, temos seres humanos que estão interagindo. Jorge Huergo já havia percebido esse fato ao analisar o sentido de diálogo que contém o termo “comunicação”. Para ele, a interação entre sujeitos nem sempre acontece de modo perfeito. La comunicación rara vez es simétrica, en el sentido de "entre iguales", y armoniosa, en el sentido de "no conflictiva"; por eso vamos a considerar a la comunicación dialógica como un encuentro, antes que como un acuerdo: un encuentro donde los que se encuentran cargan con sus memorias, sus conflictos, sus diferencias. (HUERGO, 2001). A inter-relação comunicação-educação gerou estudos que foram desenvolvidos pelo Núcleo de Comunicação e Educação da Escola de Comunicações e Artes da Universidade São Paulo (NCE-ECA/USP), preocupado em fundamentar, pesquisar, desenvolver e solidificar um novo campo, a Educomunicação, que por sua natureza inter-relacional, “estrutura-se de modo processual, mediático, transdisciplinar e interdiscursivo”, sendo vivenciado pelos seus atores através de áreas concretas de intervenção social, que podem constituir-se em vertentes”, de acordo com Ismar de Oliveira Soares. (SOARES, 1999, p. 65). O autor define a Educomunicação como: O conjunto das ações inerentes ao planejamento, implementação e avaliação de processos, programas e produtos destinados a criar e fortalecer ecossistemas 1
  • 17. V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22 - setembro 2005. comunicativos em espaços educativos presenciais ou virtuais, assim como a melhorar o coeficiente comunicativo das ações educativas, incluindo as relacionadas ao uso dos recursos da informação no processo de aprendizagem." (SOARES, 2002a, p. 115). Quatro áreas de intervenção foram sistematizadas ao se pensar a abrangência da Educomunicação: a) Educação para a Comunicação, preocupada com a reflexão a respeito dos impactos e influências dos media, na relação entre os pólos do processo de comunicação (Estudos de Recepção) e no campo pedagógico pelos programas de formação de receptores autônomos e críticos frente aos meios (Educação para a Comunicação, “Media Education” ou “Media Literacy”). No continente latino-americano, também é conhecida como “leitura crítica dos meios”, “educação para a televisão” ou “educação para os meios”; b) Mediação tecnológica na educação que compreende os procedimentos e as reflexões em torno da presença e dos múltiplos usos das tecnologias da informação na educação; c) Gestão comunicativa, voltada para o planejamento, execução e realização dos processos e procedimentos que se articulam no âmbito da Comunicação/Cultura/Educação. Dela faz parte o planejamento das relações entre os professores e alunos, entre direção, corpo docente e alunos ou nas relações entre a escola e a comunidade onde está inserida. Além disso, também há o planejamento de ações voltadas à criação de ambientes favoráveis ao desenvolvimento do ensino, à implantação de projetos de educação frente aos meios de comunicação, à implementação do exercício artístico, ou mesmo, à disseminação das tecnologias num plano de ensino. d) Reflexão epistemológica que vê a inter-relação Comunicação e Educação como fenômeno cultural emergente e instiga projetos de pesquisa para legitimação do novo campo e investigações sobre as vertentes que compõem a Educomunicação, constituindo-se uma reflexão acadêmica. A inter-relação Comunicação/Educação já tinha acontecido em épocas e momentos anteriores, ainda que mais intuitiva e não tão sistematizada. Célestin Freinet na França e Paulo Freire no Brasil são considerados os desbravadores da área Educação para Comunicação. Embora atuassem em contextos bem diversos, trabalhassem com públicos distintos – Freinet na educação de zero a 14 anos, Freire na educação de adulto – e apresentassem objetivos diferentes – o francês visava mudanças na estrutura e pedagogia escolares, o brasileiro buscava uma reorganização sócio-política do mundo – havia muitas semelhanças entre eles. Ambos tinham uma concepção política da educação, acreditavam na não neutralidade do ato pedagógico, sustentavam o diálogo e a colaboração, alertavam para a manipulação do ser humano e, sobretudo, estavam convictos da possibilidade de transformação do indivíduo e da sociedade. A vista de acesso era a livre expressão, o diálogo e a cooperação. PAULO FREIRE Para entender a história da inter-relação comunicação e educação latino-americana após os anos 70, é preciso voltar os olhos para Paulo Freire que desenvolveu fundamentos sólidos 1
  • 18. V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22 - setembro 2005. para um novo modelo educomunicacional, essencialmente horizontal, democrático e dialógico. A matriz freireana perpassa o pensamento de vários teóricos da comunicação da América Latina, principalmente Mário Kaplún, Jesús Martín-Barbero, Guillermo Orozco- Gómez, Francisco Gutiérrez. Martín-Barbero atribui a Freire “la primera teoria latinoamericana de comunicación, ya que no sólo tematizó prácticas y procesos comunicativos de estos países sino que puso a comunicar a América Latina consigo misma y con el resto del mundo”. (MARTÍN-BARBERO, 2002, p. 20). O educador brasileiro, mais do que inaugurar um pensamento dialógico, democrático e libertador na pedagogia nacional e latino-americana, transformou-se em um marco na história da Educação. Sua concepção de educação popular abalou as bases do ensino elitista vigente, repercutiu internacionalmente e produziu uma ruptura no percurso histórico da educação/comunicação. Ele apostava na educação por intermédio do audiovisual. Já na década de 60, a Conferência Nacional dos Bispos havia aprovado o uso da Telescola no Movimento de Educação de Base (MEB). Além disso, acreditava também na educação em outros espaços que não o da educação formal. Extensão ou Comunicação? elaborado em 1968/1969, reflete a importância da comunicação no processo de conhecimento. Básica nas relações humanas, ela se apresenta como uma relação social igualitária, dialogal, na co-participação dos sujeitos no ato de conhecer. A explosão das tecnologias da comunicação e informação leva o pensador a afirmar que mais que a utilização de uma técnica ou tecnologia, a problematização e a conscientização são fundamentais no ato pedagógico. Isso não significa ignorar ou rejeitar novas tecnologias ou linguagens; ao contrário, é preciso apropriar-se delas, com critério, para reavivar a humanização do homem: é preciso discutir os meios de comunicação e a quem eles servem. É uma crítica política e não tecnológica. O projeto educacional que construiu visava ao fim da opressão e das desigualdades sociais por intermédio do desenvolvimento da consciência crítica e histórica. Suas bases alicerçavam-se em uma teoria do conhecimento que se pautava pelo respeito ao educando, pela busca da autonomia e pela dialogicidade, a partir de um pensamento crítico e libertador, na busca pela igualdade, justiça e união, pressupostos orientadores na construção de novos paradigmas educacionais. Ao partir da realidade do educando para encontrar temas geradores que vivificassem a educação, Freire substituía uma visão mais simplista por outra crítica, e partia do pressuposto de que havia em cada ser humano um saber único, ainda que rudimentar, mas de onde era possível estabelecer uma nova relação com a vida. Inaugurava, assim, uma metodologia dialógica que renegava a transmissão vertical de conteúdos: do mestre, que detém o conhecimento, para o aluno, que devia absorvê-la. Essa educação que chamou de “bancária” estava na raiz da dominação cultural. Para Freire, não existe educação neutra, é impossível separar o processo de aprendizagem do processo político, já que ao construir significados de uma realidade, estamos atribuindo valores que podem ser imobilizantes ou, ao contrário, ativos, que acreditem que reflexão e ação podem transformá-la. A educação problematizadora desenvolvida por ele procura 1
  • 19. V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22 - setembro 2005. desvelar o mundo e é calcada numa relação dialógica entre educador e educando. “O educador já não é mais o que apenas educa, mas o que enquanto educa, é educado, em diálogo com o educando que, ao ser educado, também educa. [...] Os homens se educam em comunhão, mediatizados pelo mundo.” (FREIRE, 1978, p. 78-79). O sentido atribuído ao diálogo, que pressupõe uma relação horizontal entre os seres, fundado “no amor, na humildade, na fé dos homens”, é fundamental para a estrutura do conhecimento, visto que o ato cognoscente não termina no objeto cognoscível, uma vez que se comunica a outros sujeitos igualmente cognoscentes. “A educação é comunicação, é diálogo, na medida em que não é a transferência de saber, mas um encontro de sujeitos interlocutores que buscam a significação dos significados.” (FREIRE, 1979, p. 69). Tem-se, assim, uma teia de interações que estabelece a sintonia entre comunicação e educação. A comunicação é o elemento pelo qual é possível transformar o ser humano em sujeito da sua própria história, vivendo uma relação dialética, em diálogo, que o conduz a uma consciência crítica e a uma transformação. O mundo social humano não existiria se não fosse capaz de se comunicar. A comunicação é um processo de interação de Sujeitos em diálogo, elemento estruturante e intrínseco ao ser humano. Este é o primeiro dos três níveis, chamado de antropológico: a comunicação como constitutiva do ser humano. (LIMA, 1981). O segundo nível, epistemológico, parte do pressuposto de que só acorre conhecimento na comunicação; ele é o resultado da relação social entre dois sujeitos mediatizados pelo objeto que querem conhecer: “o sujeito pensante não pode pensar sozinho; não pode pensar sem a co-participação de outros sujeitos no ato de pensar...” (LIMA, op. cit, p. 63). A dimensão política, terceiro nível, é entendida quando lembramos que não há conhecimento e nem comunicação se a relação entre os sujeitos não for igual. A comunicação para Freire, diz Venício Lima, é uma relação social igualitária, dialogal que produz conhecimento, uma prática transformadora e política. A visão que Freire tem da comunicação dialógica parte de um paradigma sócio-estrutural; não se trata de um enfoque no âmbito pessoal, mas social e político, muito diferente do individualismo baseado na auto-realização. Ele condena os que acreditam que indivíduos possam ser transformados enquanto as estruturas sociais são mantidas intactas. Isso não significa que Freire não se preocupe com o indivíduo, com o particular; pelo contrário, a esfera pessoal só encontra sua plenitude quando está inserida no todo; a auto- realização só tem sentido na medida em que está conectada ao outro. A dialogicidade como essência da educação libertadora apresenta algumas características importantes: a colaboração (a ação dialógica só se realiza entre sujeitos), união (fundamental para a consciência de classe ou de grupo), organização (momento da aprendizagem em que se busca transformar) e síntese cultural (instrumento de superação da cultura): 1
  • 20. V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22 - setembro 2005. La puerta a la comunicación que nos abre P. Freire es básicamente a su estructura dialógica. Pues hay comunicación cuando el lenguaje da forma a la conflictiva experiencia del convivir, cuando se constituye en horizonte de reciprocidad de cada hombre con los otros en el mundo. (MARTÍN-BARBERO, 2002, p. 30). TEORIA DIALÓGICA EM PRÁTICA: UM EXEMPLO. No cerne da Educomunicação está a concepção dialógica de Freire. Trabalhos desenvolvidos nesse campo interdisciplinar colocam em prática os princípios de colaboração, união, organização e síntese cultural. Um exemplo foi o projeto Educom TV – a linguagem audiovisual na escola: uma ação educomunicativa, desenvolvido pelo Núcleo de Comunicação e Educação - NCE, do Departamento de Comunicação e Artes, da Escola de Comunicação da Universidade de São Paulo, ECA-USP, em parceria com a CENP/SEE - Secretaria de Educação do Estado de São Paulo e a GIP/DTE. Este projeto constitui-se de um curso que capacitou 2.243 professores da rede pública do estado de São Paulo para o uso do audiovisual em sala de aula, por intermédio de atividades on-line realizadas por meio de um Ambiente Virtual de Aprendizagem, em 2002. A estrutura do Educom TV era constituída de 3 coordenadores, 35 tutores – cada um responsável por uma sala virtual de aprendizagem com cerca de 65 cursistas –, equipe operacional, equipe de suporte técnico, além de articuladores. O conteúdo pedagógico foi distribuído ao longo dos meses de junho a dezembro em 10 módulos. Esses se compunham de parte teórico-reflexiva, exercícios dissertativos relacionados à prática diária docente e ao uso das NTCI, além de solicitarem intensa navegação por hipertextos e discussões em chats e fóruns. O projeto foi educomunicativo e lastrado em Freire, pois tanto no desenho pedagógico interno do curso - concepção do AVA, seleção dos tutores, elaboração do material didático e relações travadas entre tutores, coordenadores, suporte técnico – quanto nas relações com os alunos, atendia aos três princípios apontados por SIERRA (2000, p.21-22), da relacionabilidade, da alteridade e da dialogicidade: A escolha dos tutores para o projeto Educom TV foi norteada pelos princípios da Educomunicação. Recrutados entre alunos de pós-graduação, mestrandos ou doutorandos, vinham de diferentes áreas do conhecimento: Pedagogia, Cinema, Filosofia, Física, Biologia, Letras, Sociologia, Antropologia, Geografia, Artes e Jornalismo. A heterogeneidade da formação dessas pessoas foi fator determinante para a construção de um saber conjunto, partilhado pelo grupo, que contribuiu para a união e o estabelecimento de laços de confiança entre os membros da equipe. (SOARES et al, 2004). O tutor tinha tripla função: a primeira, pessoal, era estabelecer uma relação de cordialidade e confiança entre os participantes; a segunda, tecnológica, deveria orientar seus educandos a utilizar as ferramentas disponibilizadas pelo curso e a terceira, pedagógica, consistia em avaliar e comentar as respostas dos cursistas aos exercícios, dentro do ritmo de cada um, estimulando-os a reverem sua prática pedagógica de modo a que pudessem ter um novo olhar sobre a educação, sobre os meios de comunicação e as novas tecnologias, sem, contudo, desqualificar as crenças que carregassem: 2
  • 21. V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22 - setembro 2005. Os textos e os exercícios, assim como o contato com os tutores, valorizavam a aprendizagem como “construção de significados”, em uma dimensão cooperativa ou colaborativa da aprendizagem que pôs em evidência o papel dos pares e a tutela do “adulto” nas situações de aprendizagem (ou seja, aprendizagem como ato social). (SOARES et al, op. cit.). Dentro da concepção dialógica, as três funções desempenhadas pelos tutores do Educom TV “convergiam para a valorização e a ressignificação do papel do professor que deveria, ele também, sentir-se parte integrante de uma teia colaborativa de seres humanos envolvidos em questões pedagógicas e educacionais.” (SOARES et al, op.ci.t) A relação dialógica entre os pares criou um ecossistema comunicativo eficiente e permitiu que os professores-cursistas questionassem suas práticas e conceitos e incorporassem uma nova visão sobre sua prática pedagógica. [...] A forma em que se deu a relação entre cursistas, tutores, coordenação geral, equipe operacional e equipe técnica, teceu laços colaborativos consistentes evidenciados pela troca dialógica e assídua de experiências e idéias que culminaram com o bom resultado do projeto. Os resultados deste curso aparecem consubstanciados nos trabalhos finais - alguns surpreendentemente rigorosos em relação aos conceitos envolvidos e outros dotados de acentuada criatividade. (SOARES et al, op.cit.). De fato, os resultados obtidos ao final do curso indicam que o professor se transformou ao final do projeto Educom TV. Foram elaborados, em parcerias, 980 projetos interdisciplinares, o índice de permanência esteve em torno de 91% (considerado muito bom para cursos on- line) e a pesquisa avaliativa final realizada com os professores revelou que houve efetiva contribuição na qualidade do ensino ministrada pelos professores. CONCLUSÃO No mundo atual em que é preciso educar numa sociedade em que os dispositivos tecnológicos e midiáticos produzem outras sensibilidades, deslocalizam o saber, inauguram novas formas de expressão, Comunicação e Educação caminham juntas. Ao despontar como educador que percebeu a “comunicação humana como diálogo.” (Lima, op. cit. 71) e entendeu as inter-relações entre educação e comunicação, Paulo Freire forneceu uma base teórica sólida para a gestão de ecossistemas comunicativos, pois sua teoria dialógica, baseada em colaboração, união, organização e síntese cultural, aproxima-se do conceito de Educomunicação. A Educomunicação configura-se assim como campo teórico- prático integrado e integrador que pressupõe um modus operandi que reconceitua a relação comunicação e educação. Como diz Venício Lima: No momento em que as potencialidades das tecnologias interativas acenam para a quebra da unidirecionalidade e da centralização das comunicações, o conceito de comunicação dialógica, relacional e transformadora de Freire oferece uma referência normativa revitalizada, criativa e desafiadora para todos aqueles que acreditavam na prevalência de um modelo social comunicativo humano e libertador. (LIMA, op. cit., p.69). 2
  • 22. V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22 - setembro 2005. REFERÊNCIAS BACCEGA, M. A. Novas tecnologias, novas sensibilidades. Revista Comunicação & Educação. n. 18. São Paulo: Segmento, 2000. p. 7-14. Benjamin, W. A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica. In: ADORNO, T. et al . Teoria da Cultura de Massa. 3 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982. CITELLI, A. Comunicação e Educação. A linguagem em movimento. São Paulo: SENAC, 2000. FREIRE, P. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1967. ________________. Extensão ou comunicação? Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1975. ________________. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978. ________________. A importância do ato de ler. Em três artigos que se completam. 19. ed., São Paulo: Cortez Editora: Autores Associados, 1987. GADOTTI, M. (Org.). Paulo Freire. Uma Biobliografia. São Paulo: Cortez: Instituto Paulo Freire / UNESCO, 1996. GUTIERREZ, F. Linguagem Total. Uma pedagogia dos meios de comunicação. São Paulo: Summus, 1978. HUERGO, J. La popularización de la Ciencia y la tecnología. Interpelaciones desde la Comunicación. RED-POP - Cono Sur. La Plata: 2001. Disponível em: <http://www.redpop.org/publicaciones/mainlapopularizacion.html> Acesso em: 27 maio 2003. LIMA, V. A. de. Mídia. Teoria e Política. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2001. MARTÍN-BARBERO, J. M. Heredando el Futuro. Pensar la Educación desde la Comunicación. In: Nómadas. Boggotá, septiembre de 1996, n 5, p.10-22. __________ Cidade Virtual: Novos Cenários da Comunicação. Revista Comunicação & Educação n 11. São Paulo: Moderna, 1998, p.53-67. __________ Retos culturales de la comunicación a la educación. Elementos para una reflexión que está por comenzar. Revista Reflexiones Académicas. N 12 p.45-57, Santiago: Universidad Diego Portales, 2000. __________. La educación desde la comunicación. Buenos Aires: Grupo Editorial Norma, 2002. MATTELART, A. e MATTELART, M. História das teorias da comunicação. São Paulo: Loyola, 1999. MORAN, J. M. Leituras dos Meios de Comunicação. São Paulo: Pancast, 1993. __________. Mudanças na Comunicação Pessoal. São Paulo: Paulinas, 1998, p. 10-16. O´SULLIVAN, T. ; HARTLEY, J. ; SAUNDERS, D.; MONTGOMERY, M.; FISKE, J. Conceitos-chave em Estudos de Comunicação e Cultura. Piracicaba: Editora Unimep, 2001. RODRIGUES, A. D. Comunicação e Cultura. A experiência cultural na era da informação. Lisboa: Editorial Presença, 1999. 2
  • 23. V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22 - setembro 2005. SIERRA, F. Introducción a la teoría de la comunicación educativa. Sevilla: Ed. MAD, 2000. SOARES, Ismar de O. (1999) Comunicação/Educação: a emergência de um novo campo e o perfil de seus profissionais. In: Contato: Revista Brasileira de Comunicação, Educação e Arte. Brasília: UNB, ano 1, n. 2, p. 5-75, jan./mar., 1999. _________ (2000a) Educomunicação: um campo de mediações. Revista Comunicação & Educação n. 19. São Paulo: Segmento/ECA/USP, ano 7, p.12-24, set./dez. 1996. _________ (2000b) Educomunicação: as perspectivas do reconhecimento de um novo campo de intervenção social. O caso dos Estados Unidos. In: ECCOS, UNINOVE, São Paulo, v.2 n.2, p.61-80, dez., 2000. _________ (2002a) Metodologias da Educação para Comunicação e Gestão Comunicativa no Brasil e na América Latina. In: BACCEGA, M. A. (Org.). Gestão de Processos Comunicacionais. São Paulo: Atlas, 2002. _________(2002b) Gestão comunicativa e educação: caminhos da educomunicação. In: BACCEGA, M. A. (Org.) Comunicação & Educação. São Paulo: ECA/USP/Salesiana, n.23, p.16-25, jan./abr., 2002. _______ (2002c) A Educomunicação e suas áreas de intervenção. Educom/TV, tópico 1, ECA/USP, 2002. Disponível mediante senha em: [http://www.educomtv.see.inf.br/]. Acesso em 3 nov. 2003. ________(2003) Comunicação / Educação emergência de um novo campo e o perfil de seus profissionais. Disponível em [http://www.eca.usp.br/nucleos/nce/perfil_ismar.html]. Acesso em 20 abr. 2003. ________ et al (2004). O Projeto Educom TV: Formação on-line de professores numa perspectiva educomunicativa. In: Revista Te@D, PUC/SP vol.1, n. 1, nov. 2004. Disponível em [http://www.pucsp.br/tead/n1/artigos2/artigo2.htm]. Acesso em 25 de mar. 2005. WOLTON, D. Comunicação: um grande desafio científico e político do século XXI. Revista Famecos, n 19. Porto Alegre, EDIPUCS, p. 7-18, dez. 2002. 2
  • 24. V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22 - setembro 2005. A RELAÇÃO EDUCADOR-EDUCANDO NA PERSPECTIVA FREIREANA Adriana Marques Ferreira1 Leonardo Docena Pina2 Thagnani Reis do Carmo3 RESUMO O trabalho aborda as contribuições de Paulo Freire a respeito das relações entre educadores e educandos. Para tal faz-se necessário abordamos as críticas freireanas ao modelo de educação que desconsidera a diversidade como característica maior dos sujeitos. Freire destaca a postura que o professor assume de detentor do conhecimento, colocando o aluno na posição de mero receptor desse; numa relação vertical, denominando-a de educação bancária. Contrapondo-se a esse perfil de educação, evidenciamos a educação para a liberdade que considera todo indivíduo como agente de sua transformação, neste modelo a relação é horizontal, dialógica para que assim, o educando possa ter consciência de que não esta apenas no mundo, mas com o mundo, buscando formas de transformar a realidade. Palavras-chave: Relação educador – educando, diálogo, diversidade. Este trabalho é fruto de um projeto de pesquisa financiado pelo CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) intitulado “Uma leitura crítica da Educação Especial a caminho da inclusão”, cujo objetivo é analisar a contribuição que Paulo Freire, Vygotsky e Michel Foucault deram no processo de ruptura paradigmática da exclusão para a inclusão. Neste cenário Paulo Freire ocupa um lugar de destaque na defesa dos direitos humanos e na valorização de todas as pessoas como sujeitos historicamente inseridos no processo permanente de mudança de si e da realidade. Para tal, é utilizada a metodologia da análise de discurso, “AD”, em sua vertente francesa, que busca compreender os efeitos de sentidos derivados e/ou constitutivos dos movimentos dos discursos. Paulo Freire em suas obras sempre se demonstrou preocupado com a relação do ensino e aprendizagem desenvolvidos no sistema educacional. Preocupação esta que possui seu cerne na relação estabelecida entre educador ou educadora e educando ou educanda. Primeiramente, vale pontuarmos que o ato de ensinar inexiste sem aprender, pois foi a partir da condição humana de que todos são capazes de aprender que ao longo dos tempos, homens e mulheres foram desenvolvendo maneiras, métodos de educar. Desta forma, é o ato de aprender que justifica a relação estabelecida entre professores e professoras com seus alunos e alunas. Perante essa relevância do ato de aprender de todo ser humano, na relação educador (a) e educando (a), Freire (2002, p. 25) pontua que não há docência sem discência, ou seja, “quem 1 Graduanda em Pedagogia pela UFJF e bolsista BIC/UFJF.(didisl@ig.com.br). 2 Graduando em Educação Física pela UFJF(limiaranaerobio@yahoo.com.br). 3 Graduanda em Pedagogia pela UFJF (thagnani@yahoo.com.br). 2
  • 25. V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22 - setembro 2005. ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender”. Quando o (a) educador (a) se vê como sujeito formador do processo educativo e seus alunos e alunas como “objetos” que devem ser formados, e que, portanto recebem passivamente conhecimento pertencente ao sujeito que sabe e que são a eles transferidos, ocorre um esvaziamento da relação dialética de aprendizagem de toda pessoa humana. Quanto a isso, Freire (2004) faz uma crítica severa, na qual a educação se torna o ato de depositar conhecimentos, em que os educandos e educandas são os depositários e os educadores e educadoras os depositantes. Essa seria a chamada concepção bancária de educação, na qual a prática pedagógica é reduzida ao ato de depositar, transferir e transmitir valores e conhecimentos: Em lugar de comunicar-se, o educador faz “comunicados” e depósitos que os educandos, meras incidências, recebem pacientemente, memorizam e repetem. Eis aí a concepção “bancária” da educação, em que a única margem de ação que se oferece aos educandos é a de receberem os depósitos, guardá-los e arquivá-los (FREIRE, 2004, p. 58). Na visão bancária da educação, o saber torna-se uma doação dos que se julgam sábios aos que julgam nada saber. Doação que se funda numa das manifestações instrumentais da ideologia da opressão, representada pela dicotomia opressor e oprimido, sendo que ao primeiro é previsto a detenção de todo o saber e conseqüentemente, todo o poder, e ao segundo, sua impossibilidade de problematizar questões relacionadas à realidade que o oprime, tendo então que simplesmente aceitá-la como ela é. Esta estratificação implícita na relação é uma distorção ética; se posicionar acima do outro, seja ele quem for, significa distorcer o sentido da existência humana, já que todos são seres de mesmo valor. O domínio do saber científico, a posição de professor (a), não dá a este (a) o direito de olhar os (as) alunos (as) de cima; da mesma forma, não saber determinado conteúdo não remete a idéia de o (a) aluno (a) ter menor valor. Para Freire (2004), a educação bancária “é uma concepção que, implicando uma prática, somente pode interessar aos opressores, que estarão tão mais em paz, quanto mais adequados estejam os homens ao mundo” (p.63). Daí que esse modelo de educação tende a reduzir a existência dos homens e mulheres ao mero viver; tende a fazê-los seres da adaptação, do ajustamento. Assim, lhes é negada a possibilidade de exercerem sua vocação ontológica de ser sujeito, de estar no mundo e com o mundo, de existir ao invés de apenas sobreviver. Freire (1996) destaca que é essa capacidade ou possibilidade de ligação comunicativa do existente com o mundo objetivo, contida na própria etimologia da palavra, que incorpora ao existir o sentido de criticidade que não há no simples viver. Transcender, discernir, dialogar (comunicar e participar), são exclusividades do existir. Neste modelo educacional, a relação educador-educando se faz vertical, de cima para baixo, definindo os que sabem e os que não sabem, reproduzindo na escola a relação opressor- oprimido. O pragmatismo ocupa o lugar da esperança. A opressão é legitimada, suprimindo- se o direito fundamental de todo homem e mulher de agirem em sua própria história. Não são reconhecidas todas as potencialidades dos sujeitos, ao contrário, as diferenças são realçadas, vistas como entraves ao desenvolvimento. A diversidade é desconsiderada diante das dificuldades formuladas e postas em prática pelo opressor, e a mudança é considerada como 2
  • 26. V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22 - setembro 2005. um sonho impossível de se realizar. Para os acomodados não há o que fazer além de excluir do sistema aqueles que “fogem” aos padrões de normalidade. Observa-se que muitas condições sociais têm sido consideradas e tratadas como desviantes, fato que reflete, nas diversas situações, um julgamento social, julgamento que se requinta na medida em que as sociedades se aprimoram tecnologicamente em função de valores e de atitudes culturais específicas. Em algumas sociedades, ser negro (a), ser velho (a), ser mulher, ser criança, etc, representou ao longo dos tempos, como ainda representa, uma condição de subalternidade de direitos e desempenho de funções sociais. E é neste contexto de complexa trama de relações sociais, dentro e fora da escola, que se manifestam as diversas formas de controle, discriminação e opressão em relação aos ditos desviantes, ou seja, é no contexto social que se manifestam as mais variadas formas de preconceito e/ou aceitação daquilo que se apresenta como “diferente” ou “indesejado”, atitudes contra as quais Freire sempre se posicionou de forma contundente. Um exemplo clássico desta situação é o (a) aluno (a) considerado (a) portador (a) de necessidades especiais, principalmente o (a) chamado (a) deficiente. Ao considerá-lo (a) como incapacitado (a) a sociedade cria práticas assistencialistas, contexto este que favorece uma relação professor–aluno fundada na piedade e no sentimento de caridade, que nada mais faz do que posicionar este (a) aluno (a) no lugar de “pobre coitado (a)”, “inválido (a)”, etc. No caso específico da deficiência, pode-se afirmar, em conformidade com Fonseca (1987), que a mesma reflete, em muitos aspectos, a maturidade humana e cultural de uma determinada comunidade. O que não se pode negar é que há, implicitamente, uma importante variável cultural e que se encontra na base do julgamento que estabelece a distinção entre “deficientes” e “não deficientes”. Segundo Fonseca (1987), “Essa relatividade obscura, tênue, sutil e confusa, procura, de alguma forma, afastar ou excluir os indesejáveis, cuja presença ofende, perturba e ameaça a ordem social” (p.9). Direcionando o olhar para dentro da escola, encontramos, de um lado, professores e professoras conservadores, ingênuos e/ou acomodados, que facilitam o crescimento contínuo da ideologia opressora, cuja discriminação é ato corriqueiro, muitas vezes imperceptível por ser considerado comum; de outro lado, encontramos professores e professoras progressistas, considerando-se realmente educadores e educadoras comprometidos na medida em que lutam contra qualquer forma de discriminação, na medida em que se colocam em favor da esperança que os animam, e, apesar de tudo, na medida em que se colocam frente ao embate ideológico como lutadores (as) obstinados (as), que se cansam, mas não desistem. O (a) educador (a) que aliena a ignorância se mantém em posições fixas, invariáveis, com uma visão fatalista da realidade. E a rigidez destas posições nega a educação e o conhecimento como processo de infinita busca. Freire (2004) chama a atenção dos (as) verdadeiros (as) humanistas para o fato de que eles (as) não podem, na busca pela libertação, servir-se da concepção “bancária”, sob pena de se contradizerem em sua busca. “Assim como também não pode esta concepção tornar-se legado da sociedade opressora à sociedade revolucionária”. (FREIRE, 2004, p.66). Contrapondo-se à educação “bancária”, Paulo Freire evidencia a educação libertadora, que considera todo indivíduo como agente de transformação, reconhecendo-o como sujeito 2
  • 27. V Colóquio Internacional Paulo Freire – Recife, 19 a 22 - setembro 2005. histórico inserido na realidade de forma crítica. Desse modo, a relação educador-educando é amparada pela irrecusável prática do inteligir, do sempre desafiar o (a) educando (a) com quem se comunica a produzir sua própria compreensão do que vem sendo comunicado. A educação para a libertação deve privilegiar o exercício da compreensão crítica da realidade e possibilitar não só a leitura da palavra, a leitura do texto, mas também a leitura do contexto, a leitura do mundo: A educação que se impõe aos que verdadeiramente se comprometem com a libertação não pode fundar-se numa compreensão dos homens como seres “vazios” a quem o mundo “encha” de conteúdos; não pode basear-se numa consciência especializada, mecanicistamente compartimentada, mas nos homens como “corpos conscientes” e na consciência como consciência intencionada ao mundo. Não pode ser a do depósito de conteúdos, mas a da problematização dos homens em suas relações com o mundo. (FREIRE, 2004, p.67). Nesse modelo de educação, o (a) educador (a) progressista, comprometido (a) com a mudança, não pode apenas falar aos educandos e educandas sobre sua visão do mundo, ou tentar impô-la. É preciso dialogar para que ambos possam realizar uma leitura crítica sobre as verdadeiras causas da degradação humana. O papel do (a) educador (a) progressista é desafiar a curiosidade ingênua do (a) educando (a) para, com ele (a), partejar a curiosidade epistemológica. E é a partir da relação dialógica entre educadores (as) e educandos (as) que a prática educativa se afirma como desocultadora de verdades escondidas. Desta maneira, Freire (2004) afirma que: [...] o educador já não é mais aquele que apenas educa, mas o que, enquanto educa, é educado, em diálogo com o educando que, ao ser educado, também educa. Ambos, assim, se tornam sujeitos do processo em que crescem juntos e em que os “argumentos de autoridade” já não valem. E para ser autoridade, funcionalmente, é necessário estar a favor da liberdade e não contra a mesma. E ninguém educa ninguém e tão pouco educa a si próprio: os homens educam em comunhão mediatizados pelo mundo. Mediatizados pelos objetos cognoscíveis que, na prática bancária, são possuídos pelo educador que os descreve ou os deposita nos educandos passivos. (p.68). Assim, a “educação problematizadora” ou “educação para a liberdade” ocorre numa relação horizontal, onde educador (a) e educando (a) estabelecem constante diálogo, buscando transformar a realidade. O respeito ao conhecimento prévio que o (a) educando (a) possui é de fundamental importância, para que se possa propor, e nunca impor, o que, e como será desenvolvido o trabalho em sala de aula. Para Freire (2004), “A educação como prática da liberdade, ao contrário daquela que é prática da dominação, implica na negação do homem abstrato, isolado, solto, desligado do mundo, assim também na negação do mundo como uma realidade ausente dos homens” (p.70). A educação problematizadora é uma relação dialógico- dialética entre educador (a) e educando (a), ou seja, ambos aprendem e ensinam juntos. “Se há uma prática exemplar como negação da experiência formadora é a que dificulta ou inibe a curiosidade do educando”. (FREIRE, 2002, p.94). Os questionamentos, as perguntas, e as comparações que partem dos (as) alunos (as) durante as aulas, abrem espaço para considerações que, além de enriquecer o processo de construção do conhecimento, ampliam 2