Aula 003 - Obrigações - FONTES DAS OBRIGAÇÕES E ESPÉCIES DE OBRIGAÇÃO
1. Ficha de Aula – Direito Civil III – Obrigações
Aula 03
UNIDADE – II FONTES DAS OBRIGAÇÕES
2.1 Contratos
2.2 Atos unilaterais
2.3 Atos ilícitos
UNIDADE III - ESPÉCIES DE OBRIGAÇÃO
3.1 – obrigação de dar
3.1.1 – obrigação de dar coisa certa
3.1.2 – obrigação de restituir
3.1.3 – obrigação de dar coisa incerta
3.2 – obrigação de fazer
3.2.1 – fungível
3.2.2 – infungível
3.3 – Obrigação de não-fazer
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2. Ficha de Aula – Direito Civil III – Obrigações
UNIDADE – II FONTES DAS OBRIGAÇÕES
O Direito se origina dos fatos = ex facto iur oritur.
As fontes do Direito, conforme estudado em Introdução ao Direito, são:
• a lei;
• a jurisprudência;
• a doutrina, e
• os costumes.
No caso das obrigações, quais são as suas fontes? De onde se originam as obrigações?
Ressalto que há muitas obrigações que interessam a outras áreas jurídicas e que têm por
fonte a lei, ex: obrigação de alimentar os parentes necessitados, assunto de Direito de Família
(1.696); obrigação de votar, assunto de Direito Eleitoral; obrigação de pagar impostos, assunto
de Direito Tributário; obrigação dos homens de prestar serviço militar, etc.
Mas e as obrigações patrimoniais privadas? Como surgem as relações concretas entre
particulares tendo por objeto determinada prestação?
São três as fontes segundo o Código Civil, vejamos:
1 – Contratos: esta é a principal e maior fonte de obrigação. Através dos contratos as partes
assumem obrigações (ex: compra e venda, onde o comprador se obriga a pagar o preço e o
vendedor se obriga a entregar a coisa). No próximo semestre serão estudados com detalhes os
inúmeros contratos (ex: locação, doação, empréstimo, seguro, transporte, mandato, fiança,
etc).
2 – Atos unilaterais: segundo nosso Código, são os quatro capítulos entre os arts. 854 e 886,
com destaque para a promessa de recompensa (ex: perdi meu cachorro e pago cem a quem
encontrá-lo, obrigando-me perante qualquer pessoa que cumpra a tarefa). Não temos aqui um
contrato, mas um ato unilateral gerador de obrigação.
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3 – Atos ilícitos: estudado com a Teoria do Negócio Jurídico, leiam o art. 186 (ex: João bate no
carro de Maria e se obriga a reparar os prejuízos). O estudo dos atos ilícitos deve ser
aprofundado na importante disciplina Responsabilidade Civil (927).
UNIDADE III - ESPÉCIES DE OBRIGAÇÃO
São três, duas positivas (dar e fazer) e uma negativa (obrigação de não-fazer).
3.1 – obrigação de dar: conduta humana que tem por objeto uma coisa, subdividindo-se em
três: obrigação de dar coisa certa, obrigação de restituir e obrigação de dar coisa incerta.
3.1.1 – obrigação de dar coisa certa: vínculo jurídico pelo qual o devedor se compromete a
entregar ao credor determinado bem móvel ou imóvel, perfeitamente individualizado.
Tal obrigação é regulada pelo Código Civil a partir do art. 233, salvo acordo entre as partes, ou
seja, se as partes não ajustarem de modo diferente, vão prevalecer as disposições legais.
Na autonomia privada, como dito na aula 1, a liberdade das partes é grande, e o Código Civil
serve mais para completar a vontade das partes caso haja omissão no ajuste entre elas. Diz-se
por isso que a maioria das normas de direito privado são supletivas, enquanto a maioria das
normas de direito público são imperativas = obrigatórias.
O que vai caracterizar a obrigação de dar coisa certa é porque o objeto da prestação é coisa
única e preciosa, ex: a raquete de Guga, o capacete de Ayrton Senna, a camisa dez de Pelé, etc.
(235).
O devedor obrigado a dar coisa certa não pode dar coisa diferente, ainda que mais valiosa,
salvo acordo com o credor (313 – mais uma norma supletiva).
Se o devedor recebe o preço e se recusa a entregar a coisa, o credor não pode tomá-la,
resolvendo-se o litígio em perdas e danos (389). Qual é o objeto da obrigação? É a prestação e
não a coisa! Por isso, dizer que a obrigação não geral direito real ( = sobre a coisa), mas
apenas direito pessoal ( = sobre a conduta).
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Excepcionalmente, admite-se efeito real caso a coisa continue na posse do devedor (ex: A
combina vender a B o capacete de Ayrton Senna, B paga mas depois A recebe uma oferta
melhor e termina vendendo o capacete a C; B não pode tomar o capacete de C, mas caso
estivesse ainda com A (vendedor) poderia fazê-lo através do Juiz; esta é a interpretação do art.
475 do CC que vocês estudarão na Teoria Geral dos Contratos, denomina-se Execução in
natura / forçada da obrigação). Então o 389 é a regra e o 475 (execução forçada do contrato) é
a exceção.
E se a obrigação não gera direito real, o que vai gerar? Resposta: a tradição para as coisas
móveis e o registro para as coisas imóveis. Tradição e registro são assuntos de Direitos Reais
mas que já devo adiantar. Tradição é a entrega efetiva da coisa móvel (1226 e 1267), então
quando compro uma geladeira, pago a vista e aguardo em casa sua chegada, só serei dono da
coisa quando recebê-la. Ao contrário, se compro um celular a prazo e saio com ele da loja, o
aparelho já será meu embora não tenha pago o preço (237). Eventual perda/roubo da
geladeira/celular trará prejuízo para o dono, seja ele a loja ou o consumidor, a depender do
momento da tradição. É a confirmação do brocardo romano res perit domino (= a coisa perece
para o dono), seja o comprador ou o vendedor, até a tradição (492). Se o devedor danificar a
coisa antes da tradição, terá que indenizar o comprador por perdas e danos (239).
Por sua vez, o registro é a inscrição da propriedade imobiliária no Cartório de Imóveis, de
modo que o dono do apartamento não é quem mora nele, não é quem pagou o preço ou
quem tem as chaves. O dono da coisa imóvel é aquele cujo nome está registrado no Cartório
de Imóveis (1245 e § 1º). Mais detalhes sobre tradição e registro em Direitos Reais.
3.1.2 – obrigação de restituir: é também chamada de obrigação de devolver. Difere da
obrigação de dar, pois nesta a coisa pertence ao devedor (devedor na obrigação de dar é quem
deve entregar a coisa, portanto, na compra e venda, o devedor é o vendedor) até a tradição,
enquanto na obrigação de restituir a coisa pertence ao credor, apenas sua posse é que foi
transferida ao devedor.
Posse e propriedade são conceitos que serão estudados em Direitos Reais, mas dá para
entender que quando se aluga um filme, a locadora continua sendo proprietária do filme, é
apenas a posse que se transfere ao cliente. Então na locação o cliente/devedor tem a
obrigação de restituir o bem ao locador após o prazo acertado (569, IV).
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Como se vê, na obrigação de restituir a prestação consiste em devolver uma coisa cuja
propriedade já era do credor antes do surgimento da obrigação. Igualmente se eu empresto
um carro a meu vizinho, eu continuo dono/proprietário do carro, apenas a posse é que é
transferida, ficando o vizinho com a obrigação de devolver o veículo após o uso.
Locação e empréstimo são exemplos de obrigação de restituir, ficando a coisa em poder do
devedor, mas mantendo o credor direito real de propriedade sobre ela. Como a coisa é do
credor, seu extravio antes da devolução trará prejuízo ao próprio credor (240), enquanto na
obrigação de dar o extravio antes da tradição traz prejuízo ao devedor. Em ambos os casos,
sempre prevalece a máxima res perit domino. Mas é preciso cuidado para evitar fraudes (238,
ex: alugo um carro que depois é furtado, o prejuízo será da loja, por isso é prudente a locadora
sempre fazer seguro). Outro exemplo de obrigação de restituir está no art. 1.233, então se
“achado não é roubado”, também não pode ser apropriado, devendo quem encontrar agir
conforme o p.ú. do mesmo artigo.
3.1.3 – obrigação de dar coisa incerta: nesta espécie de obrigação a coisa não é única,
singular, exclusiva e preciosa como na obrigação de dar coisa certa, mas sim é uma coisa
genérica determinável pelo gênero e pela quantidade (243). Ao invés de uma coisa
determinada/certa, temos aqui uma coisa determinável/incerta (ex: cem sacos de café; dez
cabeças de gado, um carro popular, etc). Tal coisa incerta, indicada apenas pelo gênero e pela
quantidade no início da relação obrigacional, vem a se tornar determinada por escolha no
momento do pagamento.
Ressalto que coisa “incerta” não é “qualquer coisa”, mas coisa sujeita a determinação futura.
Então se João deve cem laranjas a José, estas frutas precisam ser escolhidas no momento do
pagamento para serem entregues ao credor.
Esta escolha chama-se juridicamente de concentração. Conceito: processo de escolha da coisa
devida, de média qualidade, feita via de regra pelo devedor (244). A concentração implica
também em separação, pesagem, medição, contagem e expedição da coisa, conforme o
caso. As partes podem combinar que a escolha será feita pelo credor, ou por um terceiro,
tratando-se este artigo 244 de uma norma supletiva, que apenas completa a vontade das
partes em caso de omissão no contrato entre elas.
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Após a concentração a coisa incerta se torna certa (245). Antes da concentração a coisa
devida não se perde pois genus nunquam perit (o gênero nunca perece). Se João deve cem
laranjas a José não pode deixar de cumprir a obrigação alegando que as laranjas se
estragaram, pois cem laranjas são cem laranjas, e se a plantação de João se perdeu ele pode
comprar as frutas em outra fazenda (246).
Todavia, após a concentração, caso as laranjas se percam (ex: incêndio no armazém) a
obrigação se extingue, voltando as partes ao estado anterior, devolvendo-se eventual preço
pago, sem se exigir perdas e danos (234, 389, 402). Pela importância da concentração, o
credor deve ser cientificado quando o devedor for realizá-la, até para que o credor fiscalize a
qualidade média da coisa a ser escolhida.
3.2 – obrigação de fazer: conduta humana que tem por objeto um serviço. Conceito: espécie
de obrigação positiva pela qual o devedor se compromete a praticar algum serviço lícito em
benefício do credor.
Enquanto na obrigação de dar o objeto da prestação é uma coisa, na obrigação de fazer o
objeto da prestação é um serviço (ex: professor ministrar uma aula, advogado redigir uma
petição, cantor fazer um show, pedreiro construir um muro, médico realizar uma consulta,
etc.). E se eu quero comprar um quadro e encomendo a um artista, a obrigação será de fazer
ou de dar? Se o quadro já estiver pronto a obrigação será de dar, se ainda for confeccionar o
quadro a obrigação será de fazer.
A obrigação de fazer tem duas espécies:
3.2.1 – fungível: quando o serviço puder ser prestado por uma terceira pessoa, diferente do
devedor, ou seja, quando o devedor for facilmente substituível, sem prejuízo para o credor, a
obrigação é fungível (ex: pedreiro, eletricista, mecânico, caso não possam fazer o serviço e
mandem um substituto, a princípio para o credor não há problema). As obrigações de dar são
sempre fungíveis pois visam a uma coisa, não importa quem seja o devedor (304).
3.2.2 – infungível: ao credor só interessa que o devedor, pelas suas qualidades pessoais, faça o
serviço (ex: médico e advogado são profissionais de estrita confiança dos pacientes e clientes).
Chama-se esta espécie de obrigação de personalíssima ou intuitu personae ( = em razão da
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pessoa). São as circunstâncias do caso e a vontade do credor que tornarão a obrigação de
fazer fungível ou não.
Em caso de inexecução da obrigação de fazer o credor só pode exigir perdas e danos (247).
Viola a dignidade humana constranger o devedor a fazer o serviço por ordem judicial, de modo
que na obrigação de fazer não se pode exigir a execução forçada como na obrigação de dar
coisa certa (art. 475 – sublinhem exigir-lhe o cumprimento). Imaginem um cantor se recusar a
subir no palco, não é razoável o Juiz mandar a polícia para forçá-lo a trabalhar “manu militari”,
o coerente é o credor do show exigir perdas e danos (389). Ninguém pode ser diretamente
coagido a praticar o ato a que se obrigara. Assim, a execução “in natura” do art. 475 do CC
deve ser substituída por perdas e danos quando for impossível (ex: a coisa devida não está
mais com o devedor) ou quando causar constrangimento físico ao devedor (ex: obrigação de
fazer).
Se ocorrer recusa do devedor de executar obrigação fungível, o credor pode pedir a um
terceiro para fazer o serviço, às custas do devedor (249). Havendo urgência, o credor pode
agir sem ordem judicial, num autêntico caso de realização de Justiça pelas próprias mãos (pú
do 249, ex: consertar o telhado de casa ameaçando cair).
Mas se tal recusa decorre de um caso fortuito (ex: o cantor gripou e perdeu a voz), extingue-
se a obrigação (248).
3.3 – Obrigação de não-fazer: trata-se de uma obrigação negativa cujo objeto da prestação é
uma omissão ou abstenção. Os romanos chamavam de obrigação ad non faciendum.
Conceito: vínculo jurídico pelo qual o devedor se compromete a se abster de fazer certo ato,
que poderia livremente praticar, se não tivesse se obrigado em benefício do credor. O
devedor vai ter que sofrer, tolerar ou se abster de algum ato em benefício do credor.
Exemplos: o engenheiro químico que se obriga a não revelar a fórmula do perfume da fábrica
onde trabalha; o condômino que se obriga a não criar cachorro no apartamento onde reside; o
professor que se obriga a não dar aula em outra faculdade; o comerciante que se obriga a não
fazer concorrência a outro, etc. Pode haver limite temporal para a obrigação (1.147).
Como na autonomia privada a liberdade é grande, as obrigações negativas podem ser bem
variadas, mas obrigações imorais e anti-sociais, ou que sacrifiquem a liberdade das pessoas,
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8. Ficha de Aula – Direito Civil III – Obrigações
são proibidas, ex: obrigação de não se casar, de não trabalhar, de não ter religião, etc. Tudo é
uma questão de bom senso, ou de razoabilidade. Gosto muito da expressão “razoável”, é uma
expressão muito ligada ao Direito!
A violação da obrigação negativa se resolve em perdas e danos, então se o engenheiro
divulgar a fórmula do perfume terá que indenizar a fábrica. Mas se for viável, o credor poderá
exigir o desfazimento pelo devedor (ex: José se obriga a não subir o muro para não tirar a
ventilação do seu vizinho João, caso José aumente o muro, João poderá exigir a demolição,
251). No caso do perfume não há como desfazer a revelação do segredo, então uma
indenização por perdas e danos é a solução (389).
Neste exemplo do muro, se José se mudar, o novo morador terá que respeitar a obrigação?
Não, pois quem celebrou o contrato não foi ele. Mas se João, ao invés de um simples contrato
de obrigação negativa, fizer com José uma servidão predial, todos os futuros proprietários da
casa não poderão aumentar o muro (1.378).
Servidão predial é assunto de Direitos Reais, e por se tratar de um direito real, já se percebe
sua maior força em relação a um direito obrigacional. Enquanto uma obrigação vincula
pessoas (João a José), uma servidão predial vincula uma pessoa a uma coisa, então a
segurança para o credor é bem maior.
Ainda tratando do exemplo do muro, e se a Prefeitura obrigar José a aumentar o muro por
uma questão de estética ou urbanismo? José terá que obedecer e João nada poderá fazer,
pois o Direito Público predomina sobre o Direito Privado (250 – é o chamado “Fato do
Príncipe”, em alusão aos monarcas que governavam os países na Europa medieval).
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