1. OBRIGAÇÃO
Conceito:
Num conceito mais simples, a obrigação é o direito do credor contra o devedor.
Num conceito mais completo, a obrigação é um vínculo jurídico transitório em virtude
do qual uma pessoa fica sujeita a satisfazer uma prestação econômica em proveito de
outra. Expliquemos:
- vínculo jurídico: o vínculo é o motor da obrigação e precisa interessar ao
Direito;
- transitório: a obrigação é efêmera, tem vida curta (ex: uma compra e venda de
balcão dura segundos), podendo até ser duradoura (ex: alugar uma casa por um ano),
mas não dura para sempre. Inclusive um direito de crédito se extingue quando é
exercido (ex: José bate no carro de Maria, quando Maria cobra o prejuízo e José paga, a
obrigação se extingue). Já os Direitos Reais são permanentes, e quanto mais exercidos
mais se fortalecem (ex: a propriedade sobre uma fazenda passa por gerações de pai para
filho, e quanto mais a fazenda for usada mais cumprirá sua função social, ficando livre
de invasões e desapropriação).
- prestação: é o objeto da obrigação e se trata de uma conduta ou omissão
humana, ou seja, sempre é dar uma coisa, fazer um serviço ou se abster de alguma
conduta. Dar, fazer e não-fazer, estas três são as espécies de obrigação.
- econômica: toda obrigação precisa ter um valor econômico para viabilizar a
responsabilidade patrimonial do inadimplente se não for espontaneamente cumprida.
Em outras palavras, se uma dívida não for paga no vencimento o credor mune-se de
uma pretensão e a dívida se transforma em responsabilidade patrimonial. Que pretensão
é esta de que se arma, de que se mune o credor? É a pretensão a executar o devedor para
atacar/tomar seus bens através do Juiz (391, 942). E se o devedor/inadimplente não tiver
bens? Então não há nada a fazer pois, como dito, a responsabilidade é patrimonial e não
pessoal. Ao credor só resta espernear, é o chamado na brincadeira “jus sperniandi”.
Realmente já se foi o tempo em que o devedor poderia ser preso, escravizado,
esquartejado e morto por dívidas, pois isto hoje atenta contra a dignidade humana.
Elementos da obrigação: são três:
a) duplo sujeito: o Direito das Obrigações trata das relações entre pessoas, então
toda obrigação tem dois sujeitos, um ativo, chamado credor, e um passivo, chamado
devedor. Não existe relação obrigacional com apenas um sujeito (381). Pode haver num
dos pólos mais de um credor e mais de um devedor (257). Numa relação simples, sabe-
se exatamente qual das partes é a credora e qual é a devedora (ex: José bate no carro de
Maria, então José é devedor e Maria é credora), mas numa relação complexa ambos os
sujeitos são simultaneamente credores e devedores (ex: contrato de compra e venda,
onde o comprador deve o dinheiro e é credor da coisa, e o vendedor deve a coisa e é
credor do dinheiro). Tais obrigações complexas são também chamadas de
sinalagmáticas. Os sujeitos precisam ser bem identificados para que o devedor saiba a
quem prestar, e o credor saiba de quem receber. Excepcionalmente o devedor pode ser
desconhecido (ex: qualquer pessoa que adquira imóvel hipotecado responde pela dívida,
2. apesar de não ter originariamente assumido a obrigação; 303, mais detalhes em Civil 5)
e o credor também pode ser desconhecido (ex: o credor faleceu ou desapareceu, deve
então o devedor pagar na Justiça para se livrar da obrigação, 334; outro ex: 855).
b) vínculo jurídico: o vínculo liga os sujeitos ao objeto da obrigação. O vínculo é
a força motriz da relação obrigacional. O vínculo seria qualquer acontecimento
relevante para o direito capaz de fazer nascer uma obrigação (ex: um acidente de
trânsito gera um ato ilícito, um acordo de vontades produz um contrato, etc).
c) objeto: atenção com o objeto! O objeto da obrigação não é uma coisa, mas um
fato humano/uma conduta ou omissão do devedor chamada prestação. A prestação
possui três espécies: dar, fazer, ou não-fazer. Na obrigação de dar o objeto da prestação
é uma coisa (ex: dar dinheiro, dar uma TV), mas o objeto da obrigação é a ação de
entregar a coisa, não a coisa em si. Na obrigação de fazer o objeto da prestação é um
serviço (ex: o cantor realiza um show, o advogado redige uma petição, o professor
ministra uma aula). Finalmente, na obrigação de não-fazer, o objeto da prestação é uma
omissão/abstenção (ex: o químico da fábrica de perfume é demitido e se obriga a não
revelar a fórmula do perfume).
Como o objeto da obrigação é a prestação, mesmo na obrigação de dar o credor
não tem poder sobre a coisa, mas sim sobre a prestação (ex: compro uma geladeira e a
loja promete me entregar em casa, mas a loja não cumpre, não posso por isso invadir a
loja e pegar a geladeira à força, devo sim exigir perdas e danos, 389 – trata-se da
responsabilidade patrimonial do devedor, como dito acima).
As obrigações de dar e de fazer são positivas, e a de não-fazer é a chamada
obrigação negativa.
O objeto da obrigação para ser válido precisa ser lícito (ex: comprar drogas,
contratar o serviço de um “pistoleiro”, etc), possível (ex: viagem no tempo, procurar um
anel no mar, encontrar um dinossauro vivo), determinável (a coisa devida precisa ser
identificada, 243) e ter valor econômico para viabilizar o ataque ao patrimônio do
devedor em caso de inadimplemento (947). Acrescentem “valor econômico” ao art.
104, II, do CC.
FONTES DAS OBRIGAÇÕES
O Direito se origina dos fatos = ex facto iur oritur. As fontes do Direito são a
lei, a jurisprudência, a doutrina e os costumes, conforme estudado em Introdução ao
Direito. No caso das obrigações, quais suas fontes? De onde se originam as obrigações?
Ressalto que há muitas obrigações que interessam a outras áreas jurídicas e que têm por
fonte a lei, ex: obrigação de alimentar os parentes necessitados, assunto de Direito de
Família (1.696); obrigação de votar, assunto de Direito Eleitoral; obrigação de pagar
impostos, assunto de Direito Tributário; obrigação dos homens de prestar serviço
militar, etc.
Mas e as obrigações patrimoniais privadas? Como surgem as relações concretas
entre particulares tendo por objeto determinada prestação? São três as fontes segundo o
Código Civil, vejamos:
3. 1 – Contratos: esta é a principal e maior fonte de obrigação. Através dos
contratos as partes assumem obrigações (ex: compra e venda, onde o comprador se
obriga a pagar o preço e o vendedor se obriga a entregar a coisa). No próximo semestre
serão estudados com detalhes os inúmeros contratos (ex: locação, doação, empréstimo,
seguro, transporte, mandato, fiança, etc).
2 – Atos unilaterais: segundo nosso Código, são os quatro capítulos entre os
arts. 854 e 886, com destaque para a promessa de recompensa (ex: perdi meu cachorro e
pago cem a quem encontrá-lo, obrigando-me perante qualquer pessoa que cumpra a
tarefa). Não temos aqui um contrato, mas um ato unilateral gerador de obrigação, como
será visto no próximo semestre.
3 – Atos ilícitos: já estudados no semestre passado, revisem o art. 186 (ex: João
bate no carro de Maria e se obriga a reparar os prejuízos). O estudo dos atos ilícitos
deve ser aprofundado na importante disciplina Responsabilidade Civil (927).
ESPÉCIES DE OBRIGAÇÃO
São três, duas positivas (dar e fazer) e uma negativa (obrigação de não-fazer).
1 – obrigação de dar: conduta humana que tem por objeto uma coisa,
subdividindo-se em três: obrigação de dar coisa certa, obrigação de restituir e obrigação
de dar coisa incerta.
1.1 – obrigação de dar coisa certa: vínculo jurídico pelo qual o devedor se
compromete a entregar ao credor determinado bem móvel ou imóvel, perfeitamente
individualizado.
Tal obrigação é regulada pelo Código Civil a partir do art. 233, salvo acordo
entre as partes, ou seja, se as partes não ajustarem de modo diferente, vão prevalecer as
disposições legais. Na autonomia privada, como dito na aula 1, a liberdade das partes é
grande, e o Código Civil serve mais para completar a vontade das partes caso haja
omissão no ajuste entre elas. Diz-se por isso que a maioria das normas de direito
privado são supletivas, enquanto a maioria das normas de direito público são
imperativas = obrigatórias.
O que vai caracterizar a obrigação de dar coisa certa é porque o objeto da
prestação é coisa única e preciosa, ex: a raquete de Guga, o capacete de Ayrton Senna, a
camisa dez de Pelé, etc. (235). O devedor obrigado a dar coisa certa não pode dar coisa
diferente, ainda que mais valiosa, salvo acordo com o credor (313 – mais uma norma
supletiva).
Se o devedor recebe o preço e se recusa a entregar a coisa, o credor não pode
tomá-la, resolvendo-se o litígio em perdas e danos (389). A obrigação não geral direito
real ( = sobre a coisa), mas apenas direito pessoal ( = sobre a conduta).
Excepcionalmente, admite-se efeito real caso a coisa continue na posse do devedor (ex:
A combina vender a B o capacete de Ayrton Senna, B paga mas depois A recebe uma
oferta melhor e termina vendendo o capacete a C; B não pode tomar o capacete de C,
mas caso estivesse ainda com A poderia fazê-lo através do Juiz; esta é a interpretação
4. do art. 475 do CC que vocês estudarão em Civil 3). Então o 389 é a regra e o 475
(execução forçada do contrato) é a exceção.
E se a obrigação não gera direito real, o que vai gerar? Resposta: a tradição para
as coisas móveis e o registro para as coisas imóveis. Tradição e registro são assuntos de
Direitos Reais mas que já devo adiantar. Tradição é a entrega efetiva da coisa móvel
(1226 e 1267), então quando compro uma geladeira, pago a vista e aguardo em casa sua
chegada, só serei dono da coisa quando recebê-la. Ao contrário, se compro um celular a
prazo e saio com ele da loja, o aparelho já será meu embora não tenha pago o preço
(237). Eventual perda/roubo da geladeira/celular trará prejuízo para o dono, seja ele a
loja ou o consumidor, a depender do momento da tradição. É a confirmação do brocardo
romano res perit domino (= a coisa perece para o dono), seja o comprador ou o
vendedor, até a tradição (492). Se o devedor danificar a coisa antes da tradição, terá que
indenizar o comprador por perdas e danos (239).
Por sua vez, o registro é a inscrição da propriedade imobiliária no Cartório de
Imóveis, de modo que o dono do apartamento não é quem mora nele, não é quem pagou
o preço ou quem tem as chaves. O dono da coisa imóvel é aquele cujo nome está
registrado no Cartório de Imóveis (1245 e § 1º). Mais detalhes sobre tradição e registro
em Civil 4.
1.2 – obrigação de restituir: é também chamada de obrigação de devolver. Difere
da obrigação de dar, pois nesta a coisa pertence ao devedor até a tradição, enquanto na
obrigação de restituir a coisa pertence ao credor, apenas sua posse é que foi transferida
ao devedor. Posse e propriedade são conceitos que serão estudados em Direitos Reais,
mas dá para entender que quando se aluga um filme, a locadora continua sendo
proprietária do filme, é apenas a posse que se transfere ao cliente. Então na locação o
cliente/devedor tem a obrigação de restituir o bem ao locador após o prazo acertado
(569, IV). Como se vê, na obrigação de restituir a prestação consiste em devolver uma
coisa cuja propriedade já era do credor antes do surgimento da obrigação. Igualmente se
eu empresto um carro a meu vizinho, eu continuo dono/proprietário do carro, apenas a
posse é que é transferida, ficando o vizinho com a obrigação de devolver o veículo após
o uso. Locação e empréstimo são exemplos de obrigação de restituir, ficando a coisa em
poder do devedor, mas mantendo o credor direito real de propriedade sobre ela. Como a
coisa é do credor, seu extravio antes da devolução trará prejuízo ao próprio credor
(240), enquanto na obrigação de dar o extravio antes da tradição traz prejuízo ao
devedor. Em ambos os casos, sempre prevalece a máxima res perit domino. Mas é
preciso cuidado para evitar fraudes (238, ex: alugo um carro que depois é furtado, o
prejuízo será da loja, por isso é prudente a locadora sempre fazer seguro). Outro
exemplo de obrigação de restituir está no art. 1.233, então se “achado não é roubado”,
também não pode ser apropriado, devendo quem encontrar agir conforme o p.ú. do
mesmo artigo.
1.3 – obrigação de dar coisa incerta: nesta espécie de obrigação a coisa não é única,
singular, exclusiva e preciosa como na obrigação de dar coisa certa, mas sim é uma
coisa genérica determinável pelo gênero e pela quantidade (243). Ao invés de uma coisa
determinada/certa, temos aqui uma coisa determinável/incerta (ex: cem sacos de café;
dez cabeças de gado, um carro popular, etc). Tal coisa incerta, indicada apenas pelo
gênero e pela quantidade no início da relação obrigacional, vem a se tornar determinada
por escolha no momento do pagamento. Ressalto que coisa “incerta” não é “qualquer
5. coisa”, mas coisa sujeita a determinação futura. Então se João deve cem laranjas a José,
estas frutas precisam ser escolhidas no momento do pagamento para serem entregues ao
credor.
Esta escolha chama-se juridicamente de concentração. Conceito: processo de
escolha da coisa devida, de média qualidade, feita via de regra pelo devedor (244). A
concentração implica também em separação, pesagem, medição, contagem e expedição
da coisa, conforme o caso. As partes podem combinar que a escolha será feita pelo
credor, ou por um terceiro, tratando-se este artigo 244 de uma norma supletiva, que
apenas completa a vontade das partes em caso de omissão no contrato entre elas.
Após a concentração a coisa incerta se torna certa (245). Antes da concentração
a coisa devida não se perde pois genus nunquam perit (o gênero nunca perece). Se João
deve cem laranjas a José não pode deixar de cumprir a obrigação alegando que as
laranjas se estragaram, pois cem laranjas são cem laranjas, e se a plantação de João se
perdeu ele pode comprar as frutas em outra fazenda (246).
Todavia, após a concentração, caso as laranjas se percam (ex: incêndio no
armazém) a obrigação se extingue, voltando as partes ao estado anterior, devolvendo-se
eventual preço pago, sem se exigir perdas e danos (234, 389, 402). Pela importância da
concentração, o credor deve ser cientificado quando o devedor for realizá-la, até para
que o credor fiscalize a qualidade média da coisa a ser escolhida.
2 – obrigação de fazer: conduta humana que tem por objeto um serviço. Conceito:
espécie de obrigação positiva pela qual o devedor se compromete a praticar algum
serviço lícito em benefício do credor. Enquanto na obrigação de dar o objeto da
prestação é uma coisa, na obrigação de fazer o objeto da prestação é um serviço (ex:
professor ministrar uma aula, advogado redigir uma petição, cantor fazer um show,
pedreiro construir um muro, médico realizar uma consulta, etc.). E se eu quero comprar
um quadro e encomendo a um artista, a obrigação será de fazer ou de dar? Se o quadro
já estiver pronto a obrigação será de dar, se ainda for confeccionar o quadro a obrigação
será de fazer.
A obrigação de fazer tem duas espécies:
2.1 – fungível: quando o serviço puder ser prestado por uma terceira pessoa,
diferente do devedor, ou seja, quando o devedor for facilmente substituível, sem
prejuízo para o credor, a obrigação é fungível (ex: pedreiro, eletricista, mecânico, caso
não possam fazer o serviço e mandem um substituto, a princípio para o credor não há
problema). As obrigações de dar são sempre fungíveis pois visam a uma coisa, não
importa quem seja o devedor (304).
2.2 – infungível: ao credor só interessa que o devedor, pelas suas qualidades
pessoais, faça o serviço (ex: médico e advogado são profissionais de estrita confiança
dos pacientes e clientes). Chama-se esta espécie de obrigação de personalíssima ou
intuitu personae ( = em razão da pessoa). São as circunstâncias do caso e a vontade do
credor que tornarão a obrigação de fazer fungível ou não.
6. Em caso de inexecução da obrigação de fazer o credor só pode exigir perdas e
danos (247). Viola a dignidade humana constranger o devedor a fazer o serviço por
ordem judicial, de modo que na obrigação de fazer não se pode exigir a execução
forçada como na obrigação de dar coisa certa (art. 475 – sublinhem exigir-lhe o
cumprimento). Imaginem um cantor se recusar a subir no palco, não é razoável o Juiz
mandar a polícia para forçá-lo a trabalhar “manu militari”, o coerente é o credor do
show exigir perdas e danos (389). Ninguém pode ser diretamente coagido a praticar o
ato a que se obrigara. Assim, a execução “in natura” do art. 475 do CC deve ser
substituída por perdas e danos quando for impossível (ex: a coisa devida não está mais
com o devedor) ou quando causar constrangimento físico ao devedor (ex: obrigação de
fazer).
Se ocorrer recusa do devedor de executar obrigação fungível, o credor pode
pedir a um terceiro para fazer o serviço, às custas do devedor (249). Havendo urgência,
o credor pode agir sem ordem judicial, num autêntico caso de realização de Justiça pelas
próprias mãos (pú do 249, ex: consertar o telhado de casa ameaçando cair).
Mas se tal recusa decorre de um caso fortuito (ex: o cantor gripou e perdeu a
voz), extingue-se a obrigação (248).
3 – Obrigação de não-fazer: trata-se de uma obrigação negativa cujo objeto da prestação
é uma omissão ou abstenção. Os romanos chamavam de obrigação ad non faciendum.
Conceito: vínculo jurídico pelo qual o devedor se compromete a se abster de fazer certo
ato, que poderia livremente praticar, se não tivesse se obrigado em benefício do credor.
O devedor vai ter que sofrer, tolerar ou se abster de algum ato em benefício do credor.
Exemplos: o engenheiro químico que se obriga a não revelar a fórmula do perfume da
fábrica onde trabalha; o condômino que se obriga a não criar cachorro no apartamento
onde reside; o professor que se obriga a não dar aula em outra faculdade; o comerciante
que se obriga a não fazer concorrência a outro, etc. Pode haver limite temporal para a
obrigação (1.147).
Como na autonomia privada a liberdade é grande, as obrigações negativas
podem ser bem variadas, mas obrigações imorais e anti-sociais, ou que sacrifiquem a
liberdade das pessoas, são proibidas, ex: obrigação de não se casar, de não trabalhar, de
não ter religião, etc. Tudo é uma questão de bom senso, ou de razoabilidade. Gosto
muito da expressão “razoável”, é uma expressão muito ligada ao Direito, inclusive tem
um artigo no site sobre a razoabilidade na aplicação da lei, confiram!
A violação da obrigação negativa se resolve em perdas e danos, então se o
engenheiro divulgar a fórmula do perfume terá que indenizar a fábrica. Mas se for
viável, o credor poderá exigir o desfazimento pelo devedor (ex: José se obriga a não
subir o muro para não tirar a ventilação do seu vizinho João, caso José aumente o muro,
João poderá exigir a demolição, 251). No caso do perfume não há como desfazer a
revelação do segredo, então uma indenização por perdas e danos é a solução (389).
Neste exemplo do muro, se José se mudar, o novo morador terá que respeitar a
obrigação? Não, pois quem celebrou o contrato não foi ele. Mas se João, ao invés de um
simples contrato de obrigação negativa, fizer com José uma servidão predial, todos os
futuros proprietários da casa não poderão aumentar o muro (1.378). Servidão predial é
assunto de Civil 5, e por se tratar de um direito real, já se percebe sua maior força em
7. relação a um direito obrigacional. Enquanto uma obrigação vincula pessoas (João a
José), uma servidão predial vincula uma pessoa a uma coisa, então a segurança para o
credor é bem maior. Mais detalhes em Civil 5 (vide no site aulas 8 e 9 de Direitos Reais
na Coisa Alheia).
Ainda tratando do exemplo do muro, e se a Prefeitura obrigar José a aumentar o
muro por uma questão de estética ou urbanismo? José terá que obedecer e João nada
poderá fazer, pois o Direito Público predomina sobre o Direito Privado (250 – é o
chamado “Fato do Príncipe”, em alusão aos monarcas que governavam os países na
Europa medieval).
CLASSIFICAÇÃO ou MODALIDADES DE OBRIGAÇÕES
São várias modalidades, mas que sempre irão corresponder a uma das três espécies de
dar, fazer ou não-fazer. A primeira modalidade é:
1 – Obrigação Natural: a obrigação civil produz todos os efeitos jurídicos, mas a
obrigação natural não, pois corresponde a uma obrigação moral. Há autores que a
chamam de obrigação degenerada. São exemplos: obrigação de dar gorjeta, obrigação
de pagar dívida prescrita (205), obrigação de pagar dívida de jogo (814), etc.
A obrigação natural não pode ser exigida pelo credor, e o devedor só vai pagar
se quiser, bem diferente da obrigação civil. Vocês sabem que se uma dívida não for
paga no vencimento o direito do credor mune-se de uma pretensão, e a dívida se
transforma em responsabilidade patrimonial. Mas tratando-se de obrigação natural, o
credor não terá a pretensão para executar o devedor e tomar seus bens (189). A dívida
natural existe, mas não pode ser judicialmente cobrada, não podendo o credor recorrer à
Justiça.
Conceito: obrigação natural é aquela a cuja execução não pode o devedor ser
constrangido, mas cujo cumprimento voluntário é pagamento verdadeiro.
Por que a obrigação natural interessa ao Direito se corresponde a uma obrigação
moral? Porque a obrigação natural, mesmo sendo moral, possui um efeito jurídico:
soluti retentio ou retenção do pagamento.
Mesmo tratando-se de uma obrigação moral, o pagamento de obrigação natural é
pagamento verdadeiro e o credor pode retê-lo. Então se João paga dívida prescrita e
depois se arrepende não pode pedir o dinheiro de volta, pois o credor tem direito à
retenção do pagamento (882). Como diz a doutrina, “a obrigação natural não se afirma
senão quando morre”, ou seja, é com o pagamento e sua extinção que a obrigação
natural vai existir para o direito, ensejando ao credor a soluti retentio.
Mas não se confunda obrigação natural com obrigação inexistente: se João paga
dívida inexistente o credor não pode ficar com o dinheiro, e João terá direito à repetitio
indebiti ( = devolução do indébito; em direito “repetir” significa “devolver”, e
“indébito” é o que não é devido). Então quem efetua pagamento indevido pode exigir a
devolução do dinheiro ( = repetitio indebiti) para que outrem não enriqueça sem motivo.
O credor de obrigação natural tem direito à soluti retentio, mas quem recebe dívida
inexistente não (ex: pago a meu credor João da Silva, mas por engano faço o depósito
8. na conta de outro João da Silva, que terá que devolver o dinheiro, 876). Na obrigação
natural não cabe a repetitio indebiti, pois o credor dispõe da soluti retentio. Falaremos
mais de enriquecimento sem causa e pagamento indevido na aula 12.
Em suma, a obrigação natural não se cumpre por bondade ou liberalidade ou
doação, mas por um dever moral, e a moral influencia o Direito, tanto que a lei lhe
atribui o efeito jurídico da soluti retentio.
Falando de doação, vocês verão em Civil 3 que o donatário deve ser grato ao
doador, então se João doa um carro a Maria, Maria lhe deve gratidão pelo resto da vida,
não podendo agredi-lo ou ofendê-lo sob pena de perder a doação (557). Mas se por trás
dessa doação existe uma obrigação natural, tal doação não se revoga por ingratidão
(564, III; ex: João deve dinheiro a Maria mas a dívida prescreveu, porém mesmo assim
João resolveu pagar e doou uma jóia a Maria; pois bem, caso Maria venha no futuro a
agredir João, tal doação não se extinguirá já que não foi feita por liberalidade, mas sim
em cumprimento de obrigação natural).
Finalizando, gostaria de transcrever a valiosa opinião de Washington de Barros
Monteiro sobre a raridade da obrigação natural e a absurda proteção que a lei dá ao
devedor no nosso ordenamento:
- numa época em que a noção do prazo tende a desaparecer, substituída pelo
espírito de moratória e pela esperança da revisão; em que o devedor conhece a arte de
não pagar as dívidas e em que aquele que paga com exatidão no dia devido não passa
de um ingênuo, que não tem direito a nada; em que as leis se enchem de piedade pelos
devedores e em que as vias judiciárias se mostram imprescindíveis como imposição ao
devedor civil, aparece como verdadeiro anacronismo a obrigação natural, suscetível de
pagamento voluntário, apesar de desprovida de ação
2 – Obrigação Alternativa
A obrigação simples só possui um objeto, mas a obrigação alternativa tem por objeto
duas ou mais prestações, mas apenas uma será cumprida como pagamento. É muito
comum na prática, até para facilitar e estimular os negócios (ex: vendo esta casa por
vinte mil ou troco por terreno na praia; outro ex: um artista bate no seu carro e se
compromete a fazer um show na sua casa ou a pagar o conserto; mais um ex: o
comerciante que se obriga com outro a não lhe fazer concorrência, ou então a lhe pagar
certa quantia; exemplo da lei: art. 1701, outro exemplo da lei, art 442).
Características da obrigação alternativa:
a) nasce com objeto composto, ou seja, duas ou mais possibilidades de
prestação;
b) o adimplemento de qualquer das prestações resulta no cumprimento da
obrigação, o que aumenta a chance de satisfação do credor, sem ter que se
partir para as perdas e danos, caso qualquer das prestações venha a perecer.
Como o credor aceitou mais de uma prestação como pagamento, qualquer
delas vai satisfazer o credor (253 e 256); a exoneração do devedor se dá
mediante a realização de uma única prestação.
9. c) o devedor pode optar por qualquer das prestações, cabendo o direito de
escolha, de regra, ao próprio devedor (252); mas o contrato pode prever que
a escolha será feita pelo credor, por um terceiro, ou por sorteio (817); essa
escolha chama-se de concentração, semelhante a da obrigação de dar coisa
incerta; ressalto todavia que não se confunde a obrigação alternativa com a
de dar coisa incerta; nesta o objeto é único, embora indeterminado até a
concentração; já na obrigação alternativa há pelo menos dois objetos;
d) se o devedor, ignorando que a obrigação era alternativa, fizer o pagamento,
pode repeti-lo para exercer a opção. É um caso raro de retratação da
concentração, e cabe ao devedor a prova de que não sabia da possibilidade
de escolha (877).
e) nas obrigações periódicas admite-se o jus variandi, ou seja, pode-se mudar
a opção a cada período (§ 2 o do art. 252). A doutrina critica essa mudança de
prestação porque gera instabilidade para o credor.
3 - Obrigação Facultativa
É parecida, é uma prima pobre, mas não se confunde com a obrigação
alternativa. É também muito rara, tanto que nosso Código não reservou para ela um
capítulo próprio. Sua fonte está mais na lei do que no contrato, conforme exemplos que
veremos abaixo. Ou seja, há casos específicos na lei que contemplam obrigações
facultativas, porque as partes dificilmente contratam prevendo uma obrigação
facultativa.
Conceito: é aquela cujo objeto da prestação é único, mas confere ao devedor o
direito excepcional de substitui-lo por outro.
Exemplo: art. 1234, assunto de Civil 4, então quem encontra coisa perdida deve
restitui-la ao dono, e o dono fica obrigado a recompensar quem encontrou; mas o dono
pode, ao invés de pagar a recompensa, abandonar a coisa, e aí quem encontrou poderá
ficar com ela; pagar a recompensa é a prestação principal do devedor, já abandonar a
coisa é prestação acessória do seu dono. O abandono da coisa não é obrigação, mas
faculdade do seu dono. Ao invés de pagar a recompensa, tem o devedor a faculdade de
dar a coisa ao credor.
Outro exemplo: art. 1382, assunto de Civil 5, então imaginem que da Fazenda A
sai um aqueduto para a Fazenda B, levando água, com a obrigação, ajustada em
contrato, de que o dono da Fazenda A deverá conservar a obra. Pois bem, ao invés de
manter o aqueduto, tem o dono da Fazenda A a obrigação facultativa de abandonar suas
terras para o dono da Fazenda B. Ao invés de conservar o aqueduto, o devedor tem a
faculdade de abandonar suas terras, dando-as ao vizinho.
Ao nascer a obrigação o objeto é único, mas para facilitar o pagamento, o
devedor tem a excepcional faculdade de se liberar mediante prestação diferente. É
vantajosa assim para o devedor.
10. Na obrigação facultativa, ao contrário da alternativa, o credor nunca tem a opção
e só pode exigir a prestação principal, pois a prestação devida é única e só o devedor
pode optar pela prestação facultativa.
Ressalto que a impossibilidade de cumprimento da prestação principal extingue
a obrigação, resolvendo-se em perdas e danos, não se aplicando o art. 253, pois, como já
dito, a prestação acessória não é obrigação, mas faculdade do devedor. Então quem
encontrar coisa perdida e não receber a recompensa, não poderá exigir o abandono da
coisa, mas sim deverá processar o devedor pelo valor da recompensa.
4 – Obrigação divisível e indivisível
Em geral, numa obrigação existe apenas um credor e um devedor. Mas caso existam na
mesma relação vários devedores ou vários credores, o razoável é que cada devedor
pague apenas parte da dívida, e que cada credor tenha direito apenas a parte da
prestação. Essa regra sofre exceção nos casos de indivisibilidade, que veremos hoje, e
de solidariedade, na próxima aula. Tanto na indivisibilidade como na solidariedade,
embora concorram várias pessoas, cada credor pode reclamar a prestação por inteiro, e
cada devedor responde também pelo todo (259 e 264). Comecemos pela divisibilidade e
indivisibilidade:
Obrigação divisível é aquela cuja prestação pode ser parcialmente cumprida sem
prejuízo de sua qualidade e de seu valor (ex: uma dívida de cem reais pode ser paga em
duas metades; um curso de Direito Civil pode ser ministrado em várias aulas). Mas a
depender do acordo entre as partes, o devedor deve pagar de uma vez só, mesmo que a
prestação seja divisível (314).
Já na obrigação indivisível a prestação só pode ser cumprida por inteiro (ex:
quem deve um cavalo não pode dar o animal em partes, 258; mas se tal cavalo perecer e
a dívida se converter em pecúnia, deixa de ser indivisível, 263).
Como dito, a indivisibilidade vai despertar interesse prático quando houver mais
de um credor ou mais de um devedor.
- pluralidade de devedores: imaginem que um pai morre e deixa dívidas, seus
filhos irão pagar estas dívidas dentro dos limites da herança recebida do pai (1792,
1997). Então o credor do pai terá mais de um filho para cobrar esta dívida. Se a
prestação for divisível, cada filho responde pela parte correspondente a sua herança, e a
insolvência de um deles não aumentará a quota dos demais (257). Mas se a prestação for
indivisível, cada filho responde pela dívida toda, e aquele que pagar ao credor, cobrará o
quinhão correspondente de cada irmão (259 e pú – veremos sub-rogação em breve). A
relação obrigacional antes era do credor com os filhos do pai morto, agora é do irmão
pagador contra os outros irmãos.
- e se a pluralidade for de credores? Sendo divisível a prestação, cada credor só
pode exigir sua parte (257). Mas sendo indivisível aplica-se o 260, pelo que o devedor
deverá pagar a todos os credores juntos, para que um não engane os outros. Ou então o
devedor deverá pagar àquele credor que prestar uma garantia ( = caução) de que
repassará o pagamento aos outros (ex: João deve um carro a três pessoas, mas não
encontra os três para pagar, assim, para se livrar logo daquela obrigação, paga ao credor
11. que ofereceu uma fiança; se este credor não repassar o carro aos demais credores, o
fiador poderá ser processado pelos prejudicados; fiança é assunto de Civil 3). Se o
devedor pagar sem as cautelas do art. 260, terá que pagar de novo àquele credor que,
eventualmente, venha a ser lesado pelo credor que recebeu todo o pagamento, afinal
quem paga mal paga duas vezes, concordam? Diz-se por isso que o pagamento integral
da dívida a um só dos vários credores pode não desobrigar o devedor com relação aos
demais concredores. Mas pagando o devedor corretamente, caberá aos credores buscar
sua parte com o credor que recebeu tudo (261). Tratando-se de coisa indivisível (ex:
carro, barco, casa), poderão os credores usar a coisa em condomínio, ou então vendê-la
e dividir o dinheiro (1320).
Espécies de indivisibilidade: a) física: a prestação é indivisível pela sua própria
natureza, pois sua divisão alteraria sua substância ou prejudicaria seu uso (ex: obrigação
de dar um cavalo, obrigação de restituir o imóvel locado, etc); b) econômica: o objeto
da prestação fisicamente poderia ser dividido, mas perderia valor (ex: obrigação de dar
um diamante, art. 87); c) legal: é a lei que proíbe a divisão (ex: a lei 6.766/79, que
dispõe sobre o parcelamento do solo urbano, determina no art. 4º, II, que os lotes nos
loteamentos terão no mínimo 125 metros quadrados, então um lote deste tamanho não
pode ser dividido em dois); d) convencional: é o acordo entre as partes que torna a
prestação indivisível (art. 88, ex: dois devedores se obrigam a pagar juntos certa quantia
em dinheiro, o que vai favorecer o credor que poderá exigir tudo de qualquer deles, 258
in fine, e 259).
Percebe-se que qualquer das três espécies de obrigação (dar, fazer e não-fazer)
pode ser divisível ou indivisível (ex: dar dinheiro é divisível, mas dar um cavalo é
indivisível; pintar um quadro é obrigação de fazer indivisível, mas plantar cem árvores é
divisível; não revelar segredo é indivisível, mas não pescar e não caçar na fazenda do
vizinho é divisível).
5 – Obrigações solidárias
Como visto na aula passada, quando numa obrigação indivisível concorrem
vários devedores, todos estão obrigados pela dívida toda, como se existisse uma
solidariedade entre eles (259). Assim, se várias pessoas devem coisa indivisível, a
obrigação é também solidária. Mas pode haver obrigação solidária mesmo de coisa
divisível devida por várias pessoas.
Conceito legal: há solidariedade quando na mesma obrigação concorre mais de
um credor, ou mais de um devedor, cada um com direito ou com responsabilidade pela
dívida toda, como se fosse o único (264).
As obrigações solidárias e indivisíveis têm conseqüências práticas semelhantes,
mas são obrigações diferentes, vejamos:
- a obrigação indivisível é impossível pagar por partes, pois resulta da natureza
da prestação (ex: cavalo, lote urbano, diamante, barco, fazer um quadro, etc). Já a
obrigação solidária até poderia ser paga por partes, mas por força de contrato não pode,
tratando-se de uma garantia para favorecer o credor. Na solidariedade cada devedor
deve tudo, na indivisibilidade cada devedor só deve uma parte, mas tem que pagar tudo
diante da natureza da prestação. Pelas suas características a solidariedade não se
12. presume, decorre de contrato ou da lei (265). Exemplo de solidariedade decorrente de
lei é a patroa que responde pelos danos causados a terceiros por sua empregada
doméstica (932, III, 942 e pú).
- pode haver obrigação solidária de coisa divisível (ex: dinheiro), de modo que
todos os devedores vão responder integralmente pela dívida, mesmo sendo coisa
divisível. Tal solidariedade nas coisas divisíveis serve para reforçar o vínculo e facilitar
a cobrança pelo credor.
- o devedor a vários credores de coisa indivisível precisa pagar a todos os
credores juntos (260, I), mas o devedor a vários credores solidários se desobriga
pagando a qualquer deles (269).
- se a coisa devida em obrigação solidária perece, converte-se em perdas e
danos, torna-se divisível, mas permanece a solidariedade (271 e 279). Se a coisa devida
em obrigação indivisível perece, converte-se em perdas e danos e os co-devedores
deixam de ser responsáveis pelo todo (263).
- o devedor de obrigação solidária que paga sozinho a dívida ao credor, vai
cobrar dos demais co-devedores a quota de cada um, sem solidariedade que não se
presume (265 e 283). Então A, B e C devem solidariamente dinheiro a D. Se A pagar a
dívida toda ao credor, A vai cobrar a quota de B e C sem solidariedade entre B e C.
Elementos da obrigação solidária: a) multiplicidade de credores ou de
devedores, ou ainda, de uns e de outros; b) unidade de prestação; c) co-responsabilidade
dos interessados.
5.1 - Solidariedade ativa
Configura-se pela presença de vários credores, chamados concredores, todos
com o mesmo direito de exigir integralmente a dívida ao devedor comum (267).
A solidariedade ativa é rara porque na sua principal característica está sua
principal inconveniência (269). Assim, o devedor não precisa pagar a todos os
concredores juntos, como na obrigação indivisível (260, I). Pagando apenas a um dos
credores solidários, mesmo sem autorização dos demais, o devedor se desobriga, e se
este credor for desonesto ou incompetente, e reter ou perder a quota dos demais, os
concredores nada poderão reclamar do devedor, terão sim que reclamar daquele que
embolsou o pagamento.
Mas caso algum dos concredores já esteja executando judicialmente o devedor, o
pagamento deverá ser feito ao mesmo (268), o que se chama de prevenção, ficando tal
credor prevento para receber o pagamento com prioridade em nome de todos os
concredores.
Outro inconveniente é que se um dos credores perdoar a dívida, o devedor fica
liberado, e os demais concredores terão que exigir sua parte daquele que perdoou (272).
13. Como se vê, na solidariedade ativa cada credor fica sujeito à honestidade dos
outros concredores. Por estes inconvenientes a solidariedade ativa é rara, afinal não
interessa ao credor.
5.2 – Solidariedade passiva
Esta é comum e importante, devendo ser estimulada já que protege o crédito,
reforça o vínculo, facilita a cobrança e aumenta a chance de pagamento, pois o credor
terá várias pessoas para cobrar a dívida toda.
E quanto mais se protege o credor, mais as pessoas emprestam dinheiro, e com
mais dinheiro os consumidores se equipam, as lojas vendem, as fábricas produzem, os
patrões lucram, geram empregos e o governo arrecada tributos. Como se sabe: proteger
o crédito é estimular o desenvolvimento sócio-econômico. Entendo até que, por isso
mesmo, para proteger o crédito, a solidariedade passiva, não a ativa, deveria ser
presumida. Violando o art. 265, o art. 829 acertadamente faz presumir a solidariedade
passiva conforme será visto em fiança.
Conceito: ocorre a solidariedade passiva quando mais de um devedor, chamado
coobrigado, com seu patrimônio (391), se obriga ao pagamento da dívida toda (275).
Assim, havendo três devedores solidários, o credor terá três pessoas para
processar e exigir pagamento integral, mesmo que a obrigação seja divisível. O credor
escolhe se quer processar um ou todos os devedores (pú do 275). Aquele devedor que
pagar integralmente a dívida, terá direito de regresso contra os demais coobrigados
(283).
Na solidariedade passiva não se aplica o benefício de divisão e nem o benefício
de ordem. O que é isso?
Pelo benefício de divisão o devedor pode exigir a citação de todos os
coobrigados no processo para juntos se defenderem. Isto é ruim para o credor porque
atrasa o processo, por isso a solidariedade passiva não concede tal benefício aos co-
devedores.
Pelo benefício de ordem, o coobrigado tem o direito de ver executado primeiro
os bens do devedor principal (ex: fiança, 827). Mas o fiador pode renunciar ao benefício
de ordem e se equiparar ao devedor solidário (828, II). O avalista nunca tem benefício
de ordem, sempre é devedor solidário, por isso se algum amigo lhe pedir para ser
avalista não aceite, mas se ele insistir seja seu fiador com benefício de ordem, mas
jamais fiador-solidário ou avalista.
Fiança e aval são exemplos de solidariedade passiva decorrente de acordo de
vontades. Então a Universidade quando financia o curso de um estudante, geralmente
exige um fiador ou um avalista (897), de modo que se o devedor não pagar a dívida no
vencimento, o credor irá processar o devedor, o fiador ou o avalista. Fiança será
estudada em Civil 3 e aval em Direito Empresarial.
14. Exemplos de solidariedade passiva decorrente da lei estão na responsabilidade
civil (932), no comodato (585) e na gestão de negócios (pú do 867).
6 - Obrigações líquidas e ilíquidas
Líquida é a obrigação certa e determinada, ou seja, certa quanto à sua existência e
determinada quanto à sua qualidade, quantidade, natureza e objeto. Em outras palavras,
obrigação líquida é aquele cuja existência é certa e cujo valor é conhecido.
Vocês sabem que se uma dívida não for paga no vencimento o credor mune-se de
uma pretensão e a dívida se transforma em responsabilidade patrimonial. Esta
pretensão consiste no poder de executar o devedor para tomar seus bens através do Juiz
e satisfazer o credor. Pois bem, a ação de execução só é possível quando a obrigação é
líquida.
Sendo a obrigação ilíquida e não havendo acordo entre as partes, precisa ser
apurada pelo Juiz em processo de liquidação para poder ser executada, afinal não se
pode executar obrigação ilíquida (947).
Inclusive entendo que o Juiz deve sempre proferir sentenças líquidas para evitar
mais demoras ao credor. Exemplo: o Juiz condena João a indenizar Maria porque João
matou o pai dela, devendo o Juiz dizer logo o valor da indenização, e não deixar isso
para uma fase posterior do processo, 946. E de quanto é essa indenização por morte? A
lei responde no art. 948. Assim, um crime interessa ao Direito Penal para a punição
com a prisão do infrator, e também interessa ao Direito Civil para a punição ao bolso do
infrator. A punição civil é mais rápida e não depende de Delegado e nem de Promotor,
dispensando parte do burocrático aparelho estatal. Mas se o infrator não tiver bens, só
haverá punição penal, pois liberdade todos têm para perder. Mais detalhes na importante
disciplina Responsabilidade Civil.
7 – Obrigação principal e acessória
Principal é a obrigação autônoma, ou seja, tem vida própria, já a obrigação
acessória depende da principal, agregando-se a ela. Então uma compra e venda, um
empréstimo e uma locação são contratos que geram obrigações autônomas. Por outro
lado, a fiança, a hipoteca e o penhor produzem obrigações acessórias que vão se agregar
a uma obrigação principal, por exemplo, como a locação.
Então quem aluga uma casa celebra um contrato principal de locação e pode exigir
um contrato acessório de fiança para garantir o pagamento do aluguel na hipótese de
inadimplência do inquilino. A locação existe sem a fiança, mas o contrário não.
Inclusive, sendo nula a locação, nula será a fiança, mas o inverso não (art. 184, 2ª parte).
8 – Obrigação cumulativa ou conjuntiva
Caracteriza-se pela pluralidade de prestações (ex: troco uma casa por um carro e
uma lancha). Não se trata de obrigação alternativa (carro OU lancha), mas obrigação
cumulativa (carro E lancha). Na obrigação cumulativa todas as prestações interessam ao
credor, na alternativa apenas uma delas. Na cumulativa, muitas prestações estão na
obrigação e muitas no pagamento. Já na alternativa, muitas prestações estão na
15. obrigação e apenas uma no pagamento. Exemplo legal de obrigação cumulativa é o
contrato de empreitada onde o engenheiro pode fazer o serviço E dar os materiais para a
construção de uma casa (610).
9 – Obrigação pura
É a obrigação simples, ou seja, é toda aquela cuja eficácia não está subordinada a
qualquer das três modalidades dos negócios jurídicos: a condição, o termo (ou prazo) e
o encargo (ou modo, ou ônus). Estas modalidades vocês conhecem de Civil 1, vamos
exemplificar:
- obrigação condicional: subordina a obrigação a evento futuro e incerto (ex: o
alfaiate compra tecido da fábrica e combina só pagar o preço se vender as roupas;
vender as roupas não é uma certeza, pode ou não acontecer, 121, 876) Condições
absurdas são proibidas (ex: alugo minha casa a você, mas você não pode entrar nela,
isso é o que a lei chama de “privar de todo efeito o negócio jurídico”, no art. 122).
- obrigação a termo: subordina a obrigação a evento futuro e certo (ex: pagarei o
tecido em trinta dias; trinta dias são o prazo e o prazo é um evento certo, só depende do
inexorável passar do tempo, 132).
- obrigação modal: o modo (ou encargo, ou ônus) é imposto ao beneficiário de
uma liberalidade como uma doação ou herança. Então pode-se doar uma fazenda com o
ônus de construir uma escola para as crianças carentes da região (553, 136). Ou pode-se
deixar uma herança para um sobrinho com o ônus de mandar rezar mensalmente uma
missa para o falecido. O encargo precisa ser pequeno para não caracterizar uma
contraprestação (ex: dou um carro a meu vizinho com o ônus de levar meus filhos e eu
para a escola e o trabalho diariamente; ora, isso não é doação, mas contratação de um
motorista). Se o encargo for de interesse público (ex: construir uma escola), o Promotor
de Justiça fiscalizará sua execução (pú do 553, este é um dos poucos casos de
participação do Ministério Público no direito patrimonial, afinal o Ministério é público e
o Direito Civil é privado. Se o encargo for absurdo (ex: mandar rezar missa todo dia
para o falecido) o Juiz pode interferir na obrigação privada para modificá-la.
Então obrigação simples é aquela que não for condicional, a termo ou modal.
10ª e última modalidade de obrigação: Obrigação Real
Trata-se de uma obrigação propter rem ( = em razão da coisa). Não decorre de
um contrato, mas da propriedade sobre um bem. Quem adquire certo bem, adquire
automaticamente essa obrigação real, decorrente da coisa (real = res = coisa). O
adquirente do bem vai se tornar devedor, mesmo sem querer, em decorrência de sua
condição de dono desse bem.
Exemplo: 1.345, a lei determina que quem compra um apartamento com dívida
de condomínio assume esta obrigação, embora tenha sido o dono anterior que não pagou
a taxa. A obrigação está vinculada à coisa, por isso chama-se obrigação real (res =
coisa). Esta vinculação da obrigação à coisa, qualquer que seja seu dono, deriva da
sequela, que é uma característica dos Direitos Reais. Sequela é uma palavra que se
origina do verbo seguir, então a obrigação segue a coisa, não importa quem seja seu
16. dono. O proprietário da coisa assume a obrigação automaticamente, apenas pelo fato de
ter sucedido o dono-devedor anterior na propriedade da coisa.
É também chamada de obrigação mista porque apresenta características de
Direito das Coisas ( = Direito Real) e de Direito das Obrigações ( = Direito Pessoal). O
Direito Real e o Direito das Obrigações formam o Direito Patrimonial Privado (vide
aula 1), sendo natural que algumas vezes eles se interpenetrem.
Conceito: obrigação real corresponde ao vínculo jurídico que se origina da lei
com característica dos Direitos Reais e transmissão automática ao novo proprietário da
coisa.
Observação sobre o conceito: a OR se origina apenas da lei, e não do contrato.
Os contratos podem ser inventados pelas partes, são numerus apertus (425), mas os
direitos reais não, só a lei pode criá-los, sendo numerus clausus (1225), por isso as
obrigações reais originam-se sempre da lei. Originando-se da lei, a OR é irrecusável,
não podendo o devedor deixar de assumi-la.
Outra observação: o devedor da obrigação real varia caso a coisa mude de dono,
então se a coisa é vendida, o novo dono se tornará o devedor. Quem se torna titular do
direito real ( = propriedade), torna-se devedor de eventual obrigação real sobre o bem
apropriado.
Mais exemplos de OR: art. 1297 (quem compra uma fazenda tem a obrigação de
fazer a cerca, embora a cerca tenha caído na época do dono anterior), art. 1383 (quem
compra imóvel com servidão predial tem a obrigação de manter a servidão, por isso
observem sempre o registro do imóvel antes de fazer a compra, para não comprar barato
um terreno e depois, por exemplo, descobrir que nele não se pode construir para não
tirar a vista do edifício de trás; este exemplo corresponde a uma servidão predial de
vista, assunto de Civil 5).
Em suma, a obrigação propriamente dita vincula uma pessoa (credor) a outra
pessoa (devedor), já a obrigação real está vinculada a uma coisa, e quem for proprietário
dessa coisa será o devedor.
CLÁUSULA PENAL
Concluído o estudo das dez modalidades de obrigações, vamos encerrar a
primeira unidade deste semestre tratando da cláusula penal (CP).
Conceito: CP é a cláusula acessória a um contrato pelo qual as partes fixam
previamente o valor das perdas e danos que por acaso se verifiquem em conseqüência
da inexecução culposa da obrigação (408, ex: um promotor de eventos contrata um
cantor para fazer um show, e já fixa no contrato que, se o artista desistir, terá que pagar
uma indenização de cem mil).
A cláusula penal é acessória, não é obrigatória, então se a dívida não for paga no
vencimento ( = se o cantor não fizer o show), e não existir cláusula penal no contrato, é
o Juiz quem irá fixar a indenização devida pelo cantor, tornando a obrigação líquida
17. (vide aula 9), para só depois possibilitar o ataque pelo credor (o promotor de eventos) ao
patrimônio do cantor.
Essa é a grande vantagem da cláusula penal: pré-fixar as perdas e danos,
economizando tempo, eliminando recursos processuais ao dispensar o Juiz de calcular o
valor previsto no art. 402 do CC.
Outra vantagem da CP é a de intimidar o devedor, ou seja, ele já fica sabendo
que terá uma pena se não cumprir a obrigação. É verdade que a lei prevê
automaticamente uma punição ao devedor (389), mas a CP reitera essa sanção.
Quando uso no conceito a expressão inexecução “culposa”, refiro-me à culpa em
sentido amplo (lato sensu), que corresponde ao dolo (inexecução voluntária) e à culpa
stricto sensu (em sentido restrito = imprudência e negligência). Então se o cantor não
fez o show porque não quis (dolo) ou porque bebeu demais e perdeu a voz
(imprudência), terá que pagar a CP. Mas se o cantor não fez o show porque pegou uma
gripe, trata-se de um caso fortuito que isenta de responsabilidade (393 e pú).
Se a obrigação for cumprida pelo devedor, a cláusula penal se extingue; se a
obrigação principal for nula, a cláusula penal também o será, afinal, como cláusula
acessória, segue o destino da principal (184, in fine).
A CP geralmente reverte em favor do credor, mas o contrato pode prever que
será paga a terceiros (ex: se o cantor não fizer o show, pagará cem mil ao Hospital do
Câncer). A CP geralmente é pactuada em dinheiro, mas pode corresponder a obrigação
de dar outra coisa, ou a fazer, ou não-fazer algum serviço, com ampla liberdade para as
partes.
Espécies: a) CP compensatória: aplica-se em caso de inexecução (=
inadimplemento) da obrigação pelo devedor (410, então o credor poderá optar pela
obrigação principal ou pela cláusula penal, semelhante a uma obrigação alternativa); b)
CP moratória: aplica-se em caso de atraso (= retardo, mora) do devedor no
cumprimento da obrigação, pelo que o devedor pagará a multa pelo atraso e cumprirá a
obrigação, 411 (ex: multa de 10% em caso de atraso no pagamento de aluguel, 416).
Ambas as espécies estão previstas no art. 409.
Se a cláusula penal compensatória tiver um valor muito alto, o Juiz deverá
reduzi-la (412, 413). Mas é justo o Estado-Juiz se imiscuir nos contratos privados,
alterando aquilo que foi estabelecido livremente pelos particulares? Reflitam! O velho
CC, no art. 924, que corresponde a esse 413, usava o verbo “poderá”, enquanto o novo
CC usa o verbo “deverá”, como consequência da publicização do Direito e a proteção
maior que o Estado dá hoje aos devedores. Critico a publicização num artigo no site
sobre a importância do Direito Privado e os riscos da intervenção estatal na autonomia
dos cidadãos, atrofiando a economia e trazendo insegurança jurídica. Confiram!
EXTINÇÃO DAS OBRIGAÇÕES
Uma obrigação é um fenômeno jurídico que ocorre a todo momento, que nasce e
se extingue a todo instante. Enquanto estamos aqui conversando, existem inúmeras
obrigações, contratos, atos ilícitos, etc., sendo realizados/ocorrendo lá fora na rua.
18. Vocês hoje, por exemplo, celebraram algum contrato, assumiram alguma obrigação,
compraram alguma coisa, tomaram algo emprestado, usaram o telefone? Acredito que
sim, então vocês hoje fizeram acontecer uma obrigação jurídica.
Veremos nesta 2ª unidade do curso de Direito Civil 2 os vários modos pelos
quais as obrigações se extinguem, e o primeiro e principal desses modos é o pagamento.
1 - Pagamento: é a principal forma de extinção das obrigações. O pagamento é
muito comum e ocorre com grande frequência na sociedade, pois toda obrigação nasce
para ser satisfeita. A imensa maioria das obrigações são cumpridas/pagas, de modo que
o devedor fica liberado. Só uma minoria das obrigações é que não são satisfeitas, pelo
que o devedor poderá ser judicialmente processado pelo credor.
Conceito: num conceito mais simples, pagamento é a morte natural da
obrigação, ou a realização real da obrigação, mas nem sempre em dinheiro (ex: A paga
a B para pintar um quadro, de modo que a obrigação de B será fazer o quadro, o
pagamento de B será realizar o serviço). O leigo tende a achar que todo pagamento é em
dinheiro, mas nem sempre, pois em linguagem jurídica pagar é executar a obrigação,
seja essa obrigação de dar uma coisa, de fazer um serviço ou de se abster de alguma
conduta (não-fazer).
Num conceito mais completo, pagamento é o ato jurídico formal, unilateral, que
corresponde à execução voluntária e exata por parte do devedor da prestação devida ao
credor, no tempo, modo e lugar previstos no título constitutivo. Vamos comentar este
conceito:
- formal: o pagamento é formal pois a prova do pagamento é o recibo; tal recibo
em direito é chamado de quitação, e deve atender às formalidade do art. 320. Muitas
vezes, em pequenos contratos, nós não pedimos recibo pra não perder tempo, é um
hábito que nós temos e vocês sabem que o costume é também uma fonte do direito.
Falaremos mais da quitação adiante.
- unilateral: pois é de iniciativa do devedor, que é o sujeito passivo da obrigação.
- voluntário e exato: lembrem-se sempre disso, pagamento é voluntário e exato;
se o devedor só paga após ser judicialmente executado, tecnicamente isto não é
pagamento pois foi feito sob intervenção judicial, ao penhorar/tomar bens do devedor;
além de voluntário, o pagamento deve ser exato, então se A deve cinquenta a B e paga
com um livro, tecnicamente isto não foi pagamento. De qualquer modo, em ambos os
casos, mesmo pagando sob força judicial, ou pagando coisa diferente da devida, se o
credor aceitou e se satisfez, isto é o que importa. Mas tecnicamente, em linguagem
jurídica, pagamento é aquele voluntário e exato.
- prestação: é o objeto da obrigação, e vocês já sabem que tal prestação é uma
conduta humana, pode ser um dar, um fazer ou um omitir-se (não-fazer). Pagar é
cumprir esta prestação.
- tempo, modo e lugar: o pagamento precisa atender a estas regras previstas no
contrato na lei ou na sentença que fez nascer a obrigação, respeitando a data, o lugar e a
maneira de pagar.
19. Regras do pagamento: 1) satisfação voluntária e rigorosa da prestação (dar uma
coisa, fazer um serviço, ou abster-se de uma conduta) porque o pagamento é exato; 2) o
credor não pode ser obrigado a receber prestação diferente, ainda que mais valiosa (art.
313); o credor pode aceitar receber prestação diferente, mas não pode ser forçado a
aceitar (356); 3) o credor não pode ser obrigado a receber por partes uma dívida que
deve ser paga por inteiro (314); esta regra tem duas exceções, no art. 962, que dispõe
sobre o concurso de credores, assunto do final do semestre, e no art. 1.997, que dispõe
sobre pagamento pelos herdeiros de dívida do falecido, assunto de Civil 7.
Quem deve pagar? O devedor, mas nada impede que um terceiro pague, afinal o
credor quer receber. Se o devedor quer impedir que um terceiro pague sua dívida deve
se antecipar e pagar logo ao credor. Em geral para o credor não importa quem seja o
solvens, quem esteja pagando. Solvens é o pagador, seja ele o devedor ou não, e o
accipiens é quem recebe o pagamento, seja ele o credor ou não. Se a obrigação for
personalíssima (ex: A contrata o cantor B para fazer um show), o solvens só pode ser o
devedor. Mas se a obrigação não for personalíssima, o credor vai aceitar o pagamento
de qualquer pessoa. Para evitar especulações ou constrangimentos, a lei trata diferente o
terceiro que paga por interesse jurídico do terceiro que paga sem interesse jurídico,
apenas por pena ou para humilhar. Assim, o terceiro que paga com interesse jurídico
(ex: fiador, avalista, herdeiro) vai se sub-rogar nos direitos do credor (349, veremos
sub-rogação em breve). O terceiro que paga sem interesse jurídico (ex: o pai, o inimigo,
etc) vai poder cobrar do devedor original, mas sem eventuais privilégios ou vantagens
(ex: hipoteca, penhor, 305). Em suma, o terceiro interessado tem reembolso e sub-
rogação nos eventuais privilégios, já o terceiro juridicamente desinteressado só tem
direito ao reembolso.
A quem se deve pagar? Ao credor, ou a seu representante, sob pena do
pagamento ser feito outra vez, pois quem paga mal paga duas vezes (308). Se o credor é
menor ou louco, pague a seu pai ou curador, sob pena de anulabilidade (310). Credor
putativo: é aquele que parece o credor mas não o é (ex: A deve a B, mas B morre e
deixa um testamento nomeando C seu herdeiro, então A paga a C, mas depois o Juiz
anula o testamento, A não vai precisar pagar novamente pois pagou a um credor
putativo; C é que vai ter que devolver o dinheiro ao verdadeiro herdeiro de B, 309).
Idem no caso do 311, pois se considera um representante do credor aquele que está com
o recibo, embora depois se prove que tal accipiens furtou o recibo do credor; neste caso
o devedor não vai pagar outra vez, o credor deverá buscar o pagamento do accipiens
falso.
Como se prova o pagamento? Já dissemos, com o recibo/quitação. Quitação vem
do latim “quietare”, que significa aquietar, acalmar, tranqüilizar. Quitação é o
documento escrito em que o credor reconhece ter recebido o pagamento e exonera o
devedor da obrigação. A quitação tem vários requisitos no art. 320, mas em muitos
casos da vida prática a quitação é informal/verbal e decorre dos costumes (ex: compra e
venda em banca de revista/bombom). Se o credor não quiser fazer a quitação, o devedor
poderá não pagar (319). Mas pagar não é só uma obrigação do devedor, pagar é também
um direito, pois o devedor tem o direito de ficar livre das suas obrigações, é até um
alívio para muita gente pagar seus débitos. Assim, o devedor pode consignar/depositar o
pagamento se o credor não quiser dar a quitação, e o Juiz fará a quitação no lugar do
credor. Veremos em breve pagamento em consignação. Espécies de quitação: 1) pela
20. entrega do recibo, é a mais comum; 2) pela devolução do título de crédito (324), assunto
que vocês vão estudar em Direito Empresarial/Comercial.
Ônus da prova: quem deve provar que houve pagamento? Se a obrigação é
positiva, ou seja, de dar e de fazer, o ônus da prova é do devedor, assim se você é
devedor, guarde bem seu recibo. Se a obrigação é negativa o ônus da prova é do credor,
cabe ao credor provar que o devedor descumpriu o dever de abstenção, pois não é
razoável exigir que o devedor prove que se omitiu, e mais fácil exigir que o credor
prove que o devedor deixou de se omitir, fazendo o que não podia, descumprindo aquela
obrigação negativa.
MODOS DE EXTINÇÃO DAS OBRIGAÇÕES
1 – PAGAMENTO
Lugar: onde o pagamento deve ser feito? No local de livre escolha das partes,
afinal no Direito Civil predomina a autonomia da vontade (art. 78). Se o
contrato/sentença for omisso, o lugar do pagamento será no domicílio do devedor (327 e
pú). Tratando-se de imóvel, o local da coisa determina o lugar do pagamento (328). A
doutrina classifica as dívidas em quesível (querable) e portável (portable): nesta, cabe
ao devedor ir pagar no domicílio do credor, sob pena de juros e multa ( = mora, assunto
do final do semestre, 395). Já na dívida querable cabe ao credor ir exigir o pagamento
no domicílio do devedor, a iniciativa é do credor, sob pena de mora do credor (394, 400,
bom, veremos mora mais adiante).
Tempo: quando deve ser feito o pagamento? No vencimento previsto no título, e
se não houver vencimento é porque o credor pode exigir o pagamento imediatamente. É
a chamada satisfação imediata do art. 331. Mas deve-se sempre tolerar um prazo moral,
que é aquele prazo razoável, do bom-senso, para dar ao devedor um tempo mínimo de
se organizar, sacar o dinheiro no banco, esperar a mercadoria chegar do exterior, etc. O
vencimento é uma data que favorece o devedor, então o devedor pode pagar antes do
vencimento, mas o credor só pode exigir a partir do vencimento, sob as penas do 939. A
lei todavia permite, excepcionalmente, cobrança antes do vencimento caso o devedor
esteja em dificuldade financeira, nos casos do art. 333.
Enriquecimento sem causa e pagamento indevido:
Enriquecer sem causa é enriquecer repentinamente sem motivo justo, sem
trabalhar, sem herdar. Uma das hipóteses de enriquecimento sem causa é através do
pagamento indevido, por isso estes dois assuntos devem ser estudados em conjunto.
Ocorre pagamento indevido quando o devedor paga a alguém que não é o
credor, ou seja, o accipiens não é o credor, e o devedor agiu por engano. Quem recebe
pagamento indevido enriquece sem causa (ex: A deve a José da Silva, mas paga a outro
José da Silva, homônimo do verdadeiro credor; A efetuou pagamento indevido e vai ter
que pagar de novo ao verdadeiro credor, pois quem paga mal paga duas vezes; A
obviamente vai exigir o dinheiro de volta do outro José da Silva que enriqueceu sem
causa, mas o verdadeiro credor não precisa esperar, ele não tem nada a ver com isso).
21. Ocorre enriquecimento sem causa quando alguém aufere um aumento
patrimonial, em prejuízo de outrém, sem justa causa. Há outros casos de enriquecimento
sem causa além das hipóteses de pagamento indevido, ex: 578, 1255, pú do 1817, etc.
Estudaremos esses exemplos oportunamente, ao longo do extenso curso de Direito
Civil.
Dois efeitos do pagamento indevido:
1 – aquele que enriqueceu sem causa fica obrigado a devolver o indevidamente
auferido, não só por uma questão moral (= direito natural), mas também por uma
questão de ordem civil (876, 884) e tributária, afinal como explicar à Receita Federal
um súbito aumento de patrimônio? O objetivo dessa devolução é reequilibrar os
patrimônios do devedor e do falso credor, alterados sem fundamento jurídico, sem causa
justa.
2 – se o falso credor não quiser voluntariamente devolver o pagamento, surge o
segundo efeito que é o direito do devedor de propor ação de repetição do indébito
(repetitio indebiti) contra tal accipiens. Esta ação tem este nome pois, em linguagem
jurídica, “repetir” significa “devolver” e “indébito” é aquilo que não é devido. Então a
ação é para o falso credor devolver aquilo que não lhe era devido. Tal ação prescreve
em três anos (206, § 3º, IV).
Também se aplicam as regras do pagamento indevido quando se paga mais do
que se deve. Porém não cabe a repetição quando o “solvens” agiu por liberalidade (ex:
doação, 877) ou em cumprimento de obrigação natural (ex: gorjeta, dívida de jogo,
dívida prescrita, 882, 814) ou quando o “solvens” deu alguma coisa para obter fim
ilícito, afinal ninguém pode se beneficiar da própria torpeza (ex: pagou ao pistoleiro
errado para cometer um homicídio, não cabe devolução, 883).
E se o objeto do pagamento indevido já tiver sido alienado pelo falso credor a
um terceiro? Bem, se tal objeto era coisa móvel, tal alienação vale por uma questão de
segurança das relações jurídicas e porque em geral os móveis são menos valiosos do que
os imóveis. De qualquer modo o falso credor vai responder pelo equivalente em
dinheiro.
Mas se o objeto do pagamento indevido for um imóvel que o falso credor já
tenha alienado a um terceiro, tal alienação só valerá se feita onerosamente (venda sim,
doação não) e o terceiro estiver de boa-fé. Caso contrário o solvens poderá perseguir o
imóvel e recuperá-lo do terceiro (879).
2 - IMPUTAÇÃO DE PAGAMENTO: o normal é entre duas pessoas haver apenas uma
obrigação, mas pode acontecer de alguém ter mais de uma dívida com o mesmo credor.
Assim, se A deve a B cem reais decorrentes de um empréstimo e outros cem reais
decorrentes de um ato ilícito (ex: A bateu no carro de B), quando A vai pagar apenas
uma destas dívidas precisa dizer a B qual está quitando. Imputar o pagamento é
determinar em qual dívida o pagamento está incidindo. Num conceito mais técnico,
imputação de pagamento é a operação pela qual o devedor de mais de uma dívida
vencida da mesma natureza a um só credor, indica qual das dívidas está pagando por ser
tal pagamento inferior ao total das dívidas (352). É preciso que haja mais de uma dívida,
todas vencidas, da mesma natureza (ex: obrigação de dar dinheiro) e o pagamento ser
22. menor do que a soma das dívidas. Cabe ao devedor fazer a imputação, dizer qual dívida
está quitando, e o devedor deve ser orientado por seu advogado para quitar logo a dívida
de juro maior e a dívida com garantia (ex: hipoteca, penhor, fiança, porque aí o devedor
libera a coisa dada em garantia/o devedor libera o fiador). Se o devedor não imputar, o
credor poderá fazê-lo (353), devendo o credor ser orientado por seu advogado para pedir
a quitação na dívida de juro menor e na dívida quirografária ( = dívida sem garantia).
Lembrem-se que pelo art. 314 o credor não está obrigado a receber pagamento parcial,
mas na prática pode ser melhor o credor aceitar alguma coisa e depois brigar pelo
restante. Se o devedor e o credor não fizerem a imputação, a lei fará na dívida de maior
valor, conforme art. 355 ( = imputação legal).
3 – PAGAMENTO POR CONSIGNAÇÃO
Este é o terceiro dos modos de extinção das obrigações que nós estamos
estudando. É através da consignação que o devedor vai exercer o seu direito de pagar,
afinal já dissemos que pagar não é só um dever, é um direito também, concordam?
Imaginem que o locador morreu e o inquilino desconhece seu herdeiro, deve então
consignar o aluguel para evitar a mora e o despejo. Consignar onde? Em Juízo, e o Juiz
vai procurar o sucessor do credor. A parte operacional da consignação em pagamento
vocês vão estudar em processo civil, mas conhecendo o direito, o processo fica fácil de
aprender (335, III – credor desconhecido). Outro exemplo, imaginem que alguém morre
e deixa a mulher como beneficiária do seguro de vida, só que o falecido tinha uma
esposa e uma companheira, então a seguradora vai pagar a qual das duas? Paga em
Juízo, numa conta a disposição do Juiz, o Juiz dá uma sentença à seguradora, que
servirá de quitação, enquanto as duas mulheres seguem no processo disputando o
dinheiro (793, 335, IV). É prudente a seguradora fazer isso até para não correr risco de
pagar à mulher errada e efetuar pagamento indevido.
Conceito: pagamento por consignação consiste no depósito judicial da coisa
devida, realizada pelo devedor nas hipóteses do art. 335 do CC. Este artigo é taxativo (=
exaustivo), não é exemplificativo, de modo que não há outras possibilidades de
consignação. Outro detalhe importante: só existe consignação nas obrigações de dar,
pois não se pode depositar um serviço (obrigação de fazer) ou uma omissão (obrigação
de não-fazer), mas apenas coisas, em geral dinheiro. Admite-se também depósito de
imóveis, gado, colheita, etc (341), e o Juiz vai ter que arranjar um depositário para
cuidar dessas coisas até o credor aparecer (343). Quando o depósito é de pecúnia
(dinheiro) coloca-se em banco oficial: Banco do Brasil ou Caixa Econômica Federal,
em conta à disposição do Juiz.
Percebam que na ação de consignação o autor é o devedor, o credor é o réu e a
quitação vem com a sentença. A sentença dirá se a consignação equivale ao pagamento,
se o devedor teve razão ao consignar e se a obrigação está extinta. Excepcionalmente
admite-se o credor como autor da ação quando mais de uma pessoa se diz credor, então
qualquer deles pede ao devedor que consigne o pagamento, enquanto os credores
discutem em Juízo (345).
Em algumas consignações o credor está certo de não querer receber pois o
devedor quer pagar menos do que deve, e vocês sabem que o credor não está obrigado a
receber por partes. Então o devedor consigna com base no inc. I do 335, alegando que o
credor se recusa a receber, mas existe uma “justa causa” para isso no 314. Isso acontece
23. na prática quando o devedor usa o cheque especial, atrasa o cartão de crédito, etc. e
depois quer pagar sem incluir os juros contratados. Ora, quando o devedor precisou de
crédito o banco emprestou, então na hora de pagar é preciso cumprir o contrato,
concordam?
No Código de Processo existe uma consignação extra-judicial, para dívidas em
dinheiro, que podem ser feitas diretamente no banco, sem precisar de advogado ou Juiz.
Vocês verão isso lá em Processo Civil.
Efeitos do pagamento por consignação: 1) liberatório: libera/exonera o devedor da
obrigação; 2) extintivo: a consignação extingue a obrigação (334).
4 – Pagamento por sub-rogação
Sub-rogar é substituir o credor, de modo que o pagamento por sub-rogação
assemelha-se à cessão de crédito por se tratar da substituição da pessoa do credor (348;
veremos cessão de crédito mais adiante).
Conceito: ocorre a sub-rogação quando a dívida de alguém é paga por um
terceiro que adquire o crédito e satisfaz o credor, mas não extingue a dívida e nem libera
o devedor, que passa a dever a esse terceiro. Ex: A deve cem a B, mas C resolve pagar
essa dívida, então B vai se satisfazer e A vai passar a dever a C. Via de regra não há
prejuízo para o devedor que passa a dever a outrem.
Como vocês já sabem, a lei permite que qualquer pessoa pague a dívida dos
outros, então se o devedor quer evitar isso, deve se antecipar e cumprir logo suas
obrigações. O terceiro que paga essa dívida pode ou não ter interesse jurídico, vimos
isso algumas aulas atrás, lembram?
Se o terceiro solvens tem interesse jurídico vai se sub-rogar nos direitos do
credor primitivo, ou seja, vai adquirir todas as eventuais vantagens, privilégios,
garantias e preferências do credor primitivo, além de, é óbvio, exigir o reembolso. Ex: A
deve cem a B com uma garantia de fiança ou hipoteca; se C pagar essa dívida terá
direito a cobrar os cem de A, mas só terá direito à garantia da fiança ou da hipoteca caso
C possua interesse jurídico (346, III). Veremos fiança e hipoteca, respectivamente, em
Civil 3 e Civil 5. Caso C não possua interesse jurídico só terá direito ao reembolso
(305). A lei trata diferente para evitar especulações e constrangimentos, depois revisem
a aula 11.
Efeitos da sub-rogação: 1) satisfativo em relação ao credor primitivo. O credor
primitivo vai se satisfazer com o pagamento feito pelo terceiro, mas a obrigação
permanece para o devedor; a sub-rogação não extingue a dívida; 2) translativo: o novo
credor vai receber todas as vantagens e direitos do credor primitivo, desde que o
pagamento tenha sido feito por sub-rogação (349).
Espécies de sub-rogação: 1) legal: decorrente da lei, nas hipóteses do art. 346; a
lei determina independente da vontade das partes; 2) convencional: depende de acordo
escrito entre as partes, quando o terceiro solvens faz acordo com o credor primitivo e
fica com o direito de sub-rogação mesmo sem interesse jurídico e mesmo sem a
24. anuência do devedor. Através de acordo escrito se transferem todas as vantagens do
credor primitivo para o solvens, igual a uma cessão de crédito (347 e 348).
5 – Dação em pagamento
É dar alguma coisa em pagamento, diferente da coisa devida. Os romanos
chamavam de datio in solutum. Dação vem assim do verbo dar. Por favor, não é “da
ação” em pagamento, mas “dação” mesmo, do verbo dar.
Conceito: é o acordo liberatório em que o credor concorda em receber do
devedor prestação diversa da ajustada (356). Não pode haver imposição do devedor em
pagar algo diferente do devido (313), afinal quem deve dinheiro só paga com um objeto
se o credor aceitar. Ex: devo dinheiro e pago com uma TV, um livro, uma casa, etc.
Requisitos da dação: 1) consentimento, concordância, anuência do credor; 2)
prestação diversa da ajustada, então não se trata de obrigação alternativa, pois nesta a
obrigação nasce com duas opções de pagamento; na dação é só depois que as partes
trocam o objeto do pagamento.
Efeitos da dação: 1) satisfatório em relação ao credor, mesmo recebendo outra
coisa, pois o credor pode preferir receber coisa diversa do que receber com atraso ou
nada receber; 2) liberatório em relação ao devedor, pois a dívida se extingue e o devedor
se exonera da obrigação. Estes dois efeitos são os mesmos do pagamento natural.
Evicção: imaginem que A deve 100 e paga com um objeto furtado, que não era
dele, então o verdadeiro dono vai exigir a devolução da coisa e a obrigação vai renascer
(359). Ser “evicto” é ser afastado da coisa recebida em pagamento. Ocorre a evicção
quando alguém perde a propriedade da coisa em virtude de decisão judicial que
reconhece a outrem direito anterior sobre essa coisa. Veremos evicção em Civil 3.
6 – Novação: está em desuso e é rara, por isso não vamos estudá-la. Saibam
apenas que se trata da extinção de uma obrigação por outra diferente, destinada a
substituí-la. Com a novação se extingue uma dívida e se cria uma nova dívida entre as
mesmas partes, enfim não se muda muita coisa, continua a existir uma obrigação entre
as mesmas partes. É mais prático fazer uma dação em pagamento ou uma cessão de
crédito.
7 – COMPENSAÇÃO: é um modo de extinção das obrigações que deve ser estimulado
pois representa a lei do menor esforço, por uma questão de lógica e de simplicidade.
Conceito: a compensação extingue as obrigações do mesmo gênero das pessoas que
são, reciprocamente, credoras e devedoras entre si, até onde as dívidas se compensem.
Ex: A deve cem a B decorrente de um empréstimo e B deve cem a A porque bateu no
carro de A, então um não vai cobrar do outro, a compensação vai extinguir as duas
obrigações mediante um pagamento fictício (art. 368). A compensação exige
pluralidade de obrigações, não existindo compensação numa obrigação única, como
uma compra e venda, onde o comprador deve o preço e o vendedor deve a coisa. A
compensação pode ser parcial caso a outra dívida seja inferior, o que vai representar
mais uma exceção ao art. 314, afinal a compensação deve ser estimulada.
25. Espécies: a) compensação legal: ocorre por força da lei, mesmo que uma das
partes se oponha, sempre que as dívidas forem líquidas ( = valor certo), vencidas e
homogêneas (= mesma espécie e qualidade, 369); b) compensação judicial:
determinada pelo Juiz no caso concreto, ao entender que deve haver compensação por
uma questão de economia processual, por uma questão de praticidade, dando o Juiz seus
motivos/fundamentos na sentença; c) compensação convencional: decorre do acordo de
vontades, decorre da transação entre as partes, e no direito civil a liberdade das partes é
grande, as partes podem dispor de seus bens com ampla liberdade, é a chamada
autonomia privada. Dívidas de qualquer tipo podem ser compensadas, sejam ilíquidas,
heterogenias ou não vencidas, ninguém tem nada a ver com isso, nem Promotor, nem
Juiz, nem Delegado, afinal cada um sabe o que faz com seu patrimônio. Mas, repito,
depende de acordo, não pode haver imposição de uma parte sobre outra.
Vedações: algumas obrigações, pela sua natureza, não podem ser compensadas,
pois elas fogem ao direito patrimonial privado. São aquelas obrigações de caráter
alimentar e tributário. Então se meu filho bate com meu carro eu não posso deixar de
sustentá-lo (ex: deixar de pagar a faculdade alguns meses) para compensar o prejuízo,
afinal os alimentos são indispensáveis por uma questão de sobrevivência. Idem se meu
carro cai num buraco na rua, eu não posso deixar de pagar imposto de renda para
compensar com o governo o prejuízo pela não conservação das ruas, afinal o interesse
público do governo em receber tributos é maior do que o interesse particular do cidadão
que teve seu carro avariado. Por isso já foi revogado o art. 374 do novo CC.
Efeitos da compensação: os mesmos do pagamento: extingue a obrigação,
satisfaz o credor e libera o devedor.
8 – CONFUSÃO: esta confusão aqui, do direito das obrigações, é diferente da confusão
dos direitos reais, do art. 1272, que corresponde à mistura de líquidos, e que
estudaremos em Civil 4. A confusão que nos interessa hoje é mais um modo de extinção
das obrigações semelhante ao pagamento por impossibilidade lógica de permanecer o
vínculo. Art 381, ex: A é inquilino de seu pai B, mas o pai morre e A herda o
apartamento, extinguindo a obrigação de pagar aluguel face à confusão, pois B vai
reunir as qualidades de credor e devedor, afinal ninguém pode ser devedor ou credor de
si mesmo. A confusão exige identidade de pessoas e de patrimônios, de modo que o
dono de uma pessoa jurídica pode dever a sua empresa, e vice-versa.
9 – REMISSÃO: escreve-se com dois “s”, ao contrário de remição, instituto da
execução contra devedor que vocês vão estudar em processo civil. A remissão (com
dois “s”) é o popular perdão da dívida. Conceito: remissão é a liberação do devedor pela
autoridade do credor que, voluntariamente, dispensa o crédito, perdoa o débito e
extingue a obrigação (385). Mas como pagar é um direito do devedor, se ele não aceitar
a remissão deve consignar o pagamento. Mas em geral a remissão é aceita e se
assemelha a uma doação.
Espécies de remissão: pode ser total ou parcial (parte da dívida ou dispensa dos juros);
pode ser expressa (por escrito) ou tácita (ex: devolução do título de crédito); pode ser
gratuita (mais comum) ou onerosa (nesta remissão o credor perdoa a dívida mas pede
algo em troca, o que se assemelha a uma transação, veremos transação em breve).
26. Ressalto que remissão é gesto nobre de pessoas solventes, ou seja, quem está em
dificuldades financeiras não pode perdoar seus devedores, afinal estará prejudicando
seus próprios credores (385, in fine). Assim se A é insolvente (tem muitos credores) não
pode perdoar seus devedores para não caracterizar uma fraude contra seus credores,
como prevê o art. 158. Trata-se inclusive de uma presunção absoluta de fraude a
remissão de dívida feita pelo insolvente, como vocês estudaram no semestre passado.
10 – TRANSAÇÃO
Trata-se na verdade de um contrato, o Código Civil trata como contrato, mas
para alguns autores a transação é modo de extinção das obrigações. Eu entendo que é
um contrato, mas no próximo semestre vocês terão muito assunto para estudar, pois
Civil 3 é a cadeira mais extensa do curso de Direito Civil. Assim, vamos logo conhecer
aqui a transação que corresponde a um acordo, a uma conciliação para extinguir a
obrigação. O Juiz inclusive deve incentivar a transação entre as partes, conforme art.
125, IV, do Código de Processo. Conforme ditado popular, “é melhor acordo ruim do
que briga boa”. Vocês conhecem a expressão “intransigente”? Pois intransigente é
aquele que não faz transação, que não faz concessões.
Conceito da doutrina: transação é a solução contratual da lide; conceito da lei:
transação é o contrato pelo qual as partes terminam ou previnem um litígio mediante
concessões mútuas, art. 840. É essencial que na transação existam concessões mútuas,
ou seja, cada uma das partes perde e ganha um pouco. As concessões podem ser
desproporcionais, ou seja, uma parte pode se quiser perder mais do que a outra, mas as
concessões têm que ser mútuas. Se uma das partes perde tudo e esta parte é o credor
existe remissão da dívida (vide item 9), mas não transação. Igualmente, se o devedor
perde tudo existe pagamento, mas não transação.
É curioso que se uma das cláusulas do contrato de transação for nula, o contrato
todo será anulado, pois a nulidade de uma cláusula quebra esse equilíbrio das
concessões que as partes buscaram (848). Diz-se que a transação é por isso indivisível.
Aplicação: a transação não se aplica a todas as obrigações, mas apenas às
obrigações de caráter patrimonial privado (841), que são justamente estas obrigações
que nós encontramos aqui no Direito Civil. Todavia, tolera-se transação em outras
áreas, como no Direito de Família, quando as partes transacionam sobre pensão
alimentícia; ou no Direito do Trabalho quando as partes transacionam sobre salários
atrasados; ou no Direito Penal quando o Ministério Público transaciona com o réu, e o
réu reconhece a culpa em troca de uma pena menor; ou no Direito Administrativo
quando o Governo transaciona com o contribuinte para receber impostos. Enfim, a
transação é típica do Direito Civil, mas pelas suas vantagens admite-se cada vez mais
em outras áreas.
Falando de Direito Penal, devo dizer que a transação civil sobre fato que
constitui crime não extingue a ação penal. Ex: se A agride B e quebra seu braço, vai
responder penalmente por lesão corporal e civilmente pelos danos causados a B com
27. tratamento médico, tempo que ficou sem trabalhar, danos morais se for o caso, etc. Se A
e B fazem uma transação civil, não impede o Promotor de continuar processando A
criminalmente para receber uma pena de prisão (846). Vocês verão em responsabilidade
civil a relação entre a Justiça Penal e a Civil quando um mesmo fato interessa a ambas
(935).
Espécies: a) preventiva: visa evitar uma ação judicial, ou seja, as partes fazem
um acordo antes de submeter a lide ao Judiciário; pode ser feita por instrumento
particular, ou seja, por contrato escrito e assinado pelas partes, testemunhas e
advogados, se houver; b) terminativa ou judicial: é a transação feita na Justiça, após
iniciado o processo, quando o acordo é homologado pelo Juiz. Vamos encontrar estas
duas espécies no art. 842.
A vantagem da transação judicial é que ela não pode ser mais discutida, pois foi
feita perante o Juiz, tornando-se coisa julgada. Já a transação preventiva, embora
também segura, sempre pode ser questionada em Juízo, alegando uma das partes que foi
coagida, que se enganou, etc. (849) Eu repudio a banalização destes argumentos pois já
disse a vocês que a transação é um contrato, e contrato é para ser cumprido por uma
questão de segurança na sociedade. País nenhum se desenvolveu sem respeitar dois
institutos de Direito Civil: contratos e propriedade.
Efeito: a transação extingue a obrigação decorrente daquela controvérsia entre as
partes.
11 – ARBITRAGEM
Nosso CC chama a arbitragem de compromisso e existe uma lei específica
sobre arbitragem de nº 9.307/96, conhecida como Lei Marco Maciel, pela influência
deste político pernambucano na sua aprovação. Trata-se de um tema moderno e
maravilhoso para uma monografia de final de curso.
Conceito: arbitragem é o acordo pela qual as partes, por não chegarem à
transação, concordam em ter sua lide submetida à decisão de um árbitro, de um “juiz
particular”, afastando tal lide da Justiça Estatal. Através da arbitragem as partes
pedem a um terceiro que aprecie a lide, e tal decisão deverá ser cumprida pelas
partes, como se fosse uma sentença judicial. Ressalto que na transação, através de
mediação, as partes escolhem a solução da lide, enquanto na arbitragem as partes
escolhem o árbitro, mas não escolhem a decisão.
Esta lei 9.307 foi alvo de muitas controvérsias, até que o Supremo, em 2002,
julgou sua constitucionalidade, e desde então a arbitragem vem crescendo em todo o
país e contribuindo para desafogar a Justiça.
Vantagens da arbitragem:
a) celeridade: maior rapidez na solução da lide, tendo em vista a conhecida
sobrecarga do Judiciário e os entraves da legislação processual;
b) custo menor: quando se ganha tempo também se ganha dinheiro;
28. c) sigilo: o processo arbitral não é público como o processo judicial, onde as decisões
são divulgadas na internet e no Diário Oficial, provocando desgaste emocional;
d) escolha do árbitro: não se pode escolher o Juiz, pois depende sempre das regras de
competência e da distribuição no Fórum, porém se pode escolher o árbitro, que deve
ser uma pessoa idônea, preparada, conhecida das partes, especialista na área do
litígio (ex: engenheiro, médico, contador); isto é uma questão crucial pois o Juiz não
entende de medicina, engenharia, contabilidade, etc, e precisa sempre nomear um
perito para lhe ajudar a julgar processos nestas áreas;
e) impossibilidade de recurso: a decisão do árbitro é irrecorrível, e se a parte
sucumbente não cumpri-la, a parte vencedora vai executá-la perante o Juiz; só aqui é
que o Juiz entra, para executar a decisão arbitral com a força do Estado, caso o
sucumbente voluntariamente não acate; já na Justiça Estatal existem inúmeros
recursos (cerca de trinta), graus de jurisdição (cerca de oito), entraves burocráticos e
formalidades desnecessárias previstas no arcaico Código de Processo Civil; f) paz
social: a solução rápida da arbitragem traz paz social e elimina as incertezas entre
particulares que atrapalhem a realização de negócios e a circulação de dinheiro na
sociedade;
g) alivia a Justiça: a utilização da arbitragem deixa o Judiciário com mais tempo para
agir nas questões onde a presença do Estado é indispensável, como nas questões
penais, administrativas e tributárias.
Desvantagens da arbitragem: ela só faz sentido para casos sofisticados e de
valor elevado; é preciso pagar os honorários do árbitro e as despesas do Tribunal;
tem que ser conduzida por árbitros com conhecimento e tribunais com estrutura para
fazer perícias e produzir provas; caso contrário a solução será injusta com o
agravante que não cabe apelação.
Aplicação da arbitragem: no Direito Internacional, na solução de divergências
obrigacionais entre empresas multinacionais, ou na solução de disputas entre países
soberanos (ex: dúvidas sobre a fronteira entre dois países); no Direito Civil em
matéria patrimonial (852, ex: direito de vizinhança, contratos, direito da informática,
direito autoral, responsabilidade civil, etc). Na Espanha inclusive, conforme
publicado no Jornal do Magistrado da AMB, edição de outubro de 2003, funciona
uma corte arbitral com mais de mil anos, na cidade de Valencia. É um tribunal
privado que julga problemas com o uso de água entre os agricultores numa região
árida, e os árbitros são os próprios agricultores.
Espécies: a) cláusula compromissória (853): as partes celebram um contrato e
dispõem numa cláusula que, se houver algum litígio futuro entre elas, a lide será
submetida à arbitragem e não à Justiça; esta cláusula é mera precaução; b)
compromisso arbitral (851): já existe litígio entre as partes e elas resolvem submeter
a questão a um árbitro e não a um Juiz para solucionar a controvérsia.
Atualmente já há vários escritórios de advocacia especialistas em arbitragem.
Alguns Juízes são contra a arbitragem por achar que vão perder poder, mas eu discordo,
29. acho que é pura vaidade destes colegas, e nós devemos aceitar tudo que venha para
desafogar a Justiça e beneficiar a população, estimulando mais negócios e comércio.
DO INADIMPLEMENTO DAS OBRIGAÇÕES
Concluímos os modos de extinção das obrigações, vamos agora avançar para a
mora e o inadimplemento das obrigações. A regra é toda obrigação ser cumprida, é todo
contrato ser cumprido, afinal o contrato faz lei entre as partes, e como diziam os
romanos “pacta sunt servanda”.
Porém, excepcionalmente, as obrigações podem não ser cumpridas por culpa do
devedor ou por culpa do credor ou por algum acidente ( = caso fortuito ou de força
maior).
A culpa do devedor pode ensejar a mora ou o inadimplemento. A mora é o
atraso no pagamento enquanto o inadimplemento é a falta de pagamento. Curioso é que
a mora pode também ser do credor, ou seja, o credor pode se negar a aceitar o
pagamento (ex: A deve milho a B, mas B se recusa a aceitar alegando que os grãos estão
estragados). Vejamos primeiro a mora e seus efeitos, e na próxima aula
inadimplemento:
MORA: é o atraso no pagamento ou no recebimento, tanto por culpa do devedor (mora
solvendi) como por culpa do credor (mora accipiendi). Se ambos tiverem culpa não
haverá mora, pois as moras recíprocas se anulam. Conceito: mora é a impontualidade
culposa do devedor no pagamento ou do credor no recebimento (394). Se o devedor
atrasa sem culpa (ex: por causa de um acidente, uma greve, uma cheia, um caso fortuito
ou de força maior) não haverá mora (396). Mas a mora do credor independe de culpa e o
devedor nesse caso deve consignar o pagamento. Assim não importam os motivos da
mora do credor, o devedor precisa exercer seu dever e seu direito de pagar através da
consignação (335 , I – observem que tal inciso usa a expressão “se o credor não puder”,
não importando assim os motivos pelos quais o credor não pôde ir buscar o pagamento,
mesmo que sejam decorrentes de um caso fortuito). A mora do credor é mais rara.
Efeitos da mora do credor: o credor que não quiser ou não for receber o
pagamento conforme acertado sujeita-se a quatro efeitos: 1) o credor em mora libera o
devedor da responsabilidade pela conservação da coisa (ex: A deve um cavalo a B que
ficou de ir buscá-lo na fazenda de A; a mora de B não responsabiliza A caso o cavalo
venha a morrer mordido por uma cobra após o vencimento; § 2º do 492); 2) o credor em
mora deve ressarcir o devedor com as despesas pela conservação da coisa (no exemplo
do cavalo, B deve pagar as despesas de A com ração e medicamento desde o
vencimento); 3) obriga o credor a pagar um preço mais alto pela coisa se a cotação
subir; este efeito se aplica a coisas que têm preço na bolsa de valores, como ações,
açúcar, café, soja, etc. No art. 400 do CC vamos encontrar estes três efeitos; 4) último
efeito: o credor em mora não pode cobrar juros do devedor desse período, afinal foi do
credor a culpa pela atraso no pagamento.
Mora do devedor: a mora solvendi pode se equiparar ao inadimplemento e o
credor exigir então perdas e danos (389). Ex: A compra docinhos para o casamento da
filha, mas a comida atrasa e chega depois da festa, é evidente que esta mora corresponde
a um inadimplemento (pú do 395). Se o atraso foi por culpa da doceira, além de
30. devolver o dinheiro, vai ter que pagar as perdas e danos do 389. Mas se o atraso foi por
causa de uma enchente que derrubou a ponte, a doceira só terá que devolver o dinheiro,
sem os acréscimos das perdas e danos. Se eu atraso o pagamento do condomínio eu
estou em mora e vou pagar a multa, mas é evidente que esta mora não corresponde a um
inadimplemento pois interessa ao condomínio receber o pagamento atrasado. (veremos
mais perdas e danos em breve)
Pressupostos da mora do devedor: 1) crédito vencido (397); 2) culpa do devedor:
esta é a culpa lato sensu (= em sentido amplo) que corresponde ao dolo e à culpa stricto
sensu (= em sentido restrito), que se divide em imprudência e negligência, como vocês
estudaram em ato ilícito no semestre passado; se não há qualquer culpa, mas caso
fortuito ou de força maior não existe mora do devedor (393, 396); 3) possibilidade de
cumprimento tardio da obrigação com utilidade para o credor, caso contrário teremos
inadimplemento e não mora (pú do 395).
Efeitos da mora do devedor: 1) o devedor responde pelos prejuízos causados,
mais multa, juros, etc (395); 2) o devedor em mora responde pelo caso fortuito ou de
força maior ocorridos durante o atraso (399, ex: A deve um cavalo campeão a B, mas
A entrou em mora para levar o cavalo para B, então vem uma cheia e mata o cavalo, A
irá responder por perdas e danos, salvo se conseguir provar que a cheia também atingiu
a fazenda de B e que o cavalo morreria do mesmo jeito se estivesse lá; se a cheia
chegasse antes do vencimento A também não iria responder perante B pela morte do
cavalo pois se tratou de um caso fortuito ou de força maior).
Purgação da mora: purgar significa emendar, reparar, remediar; purgar a mora é
consertar/sanar as consequências da mora, tanto para o devedor como para o credor,
conforme art. 401. Em caso de inadimplemento do devedor não se purga mais a mora,
resolvendo-se em perdas e danos. A mora do devedor pode também ser purgada se o
credor perdoar/remir/dispensar as perdas e danos do 395.
JUROS LEGAIS: um dos efeitos da mora do devedor é o pagamento de juros ao credor
(395), principalmente nas obrigações de dar dinheiro ( = pecuniárias). Conceito de juro:
é a remuneração que o credor exige por emprestar dinheiro ao devedor. Juro é igual a
rendimento, é igual a fruto civil.
Os frutos em direito podem ser civis, naturais ou industriais. Os frutos civis são
os juros e os rendimentos; os frutos naturais são as frutas das árvores e as crias dos
animais; os frutos industriais são, por exemplo, os carros produzidos por uma fábrica de
automóveis. Não confundam frutos com produtos, pois estes se esgotam (ex: uma
pedreira, uma mina de ouro, um poço de petróleo), enquanto os frutos se renovam.
Bom, vocês já estudaram frutos e produtos lá em Civil 1 (art. 95).
Voltando aos juros, estes são livres, conforme art. 406, sendo fixados pelas
partes no contrato ou pelo mercado financeiro. Depois de assinado o contrato, não
adianta dizer que os juros são altos, pois contrato é para ser cumprido. Se as partes não
fixarem os juros, estes serão de um por cento ao mês, conforme art. 406 do CC
combinado com o art. 161, § 1º do Código Tributário Nacional, pois este é o juro devido
no pagamento de impostos.