Este documento discute as principais anomalias congênitas detectadas na tomografia computadorizada de tórax, incluindo anomalias broncopulmonares como agenesia, atresia brônquica e enfisema lobar; anomalias vasculares como drenagem venosa pulmonar anômala e malformação arteriovenosa pulmonar; e anomalias combinadas como a síndrome da cimitarra e seqüestro pulmonar.
1. Alterações congênitas
Gustavo de Souza Portes Meirelles1
1 – Doutor em Radiologia pela Escola Paulista de Medicina – UNIFESP
1 – Introdução
As anomalias do desenvolvimento pulmonar são habitualmente detectadas no período neonatal e na
infância. Podem ser divididas em três categorias: broncopulmonares, vasculares e uma combinação de
ambas. Serão abordadas neste capítulo as principais alterações congênitas na TC de tórax.
2 – Anomalias broncopulmonares
2.1 – Agenesia
Simula pneumectomia, com redução volumétrica do hemitórax, desvio homolateral das estruturas
mediastinais e hiperinsuflação do outro pulmão (figura 1).
Figura 1. Agenesia do lobo superior direito. TC mostrando ausência do brônquio do lobo
superior direito e desvio das estruturas mediastinais para este lado.
2.2 – Atresia brônquica congênita
Ocorre mais comumente no lobo superior esquerdo, mas outros lobos podem ser acometidos. Os achados
na TC incluem massa hilar, hiperinsuflação do pulmão periférico devido ao aprisionamento do ar que chega
por vias colaterais e brônquios dilatados contendo secreções e assumindo aspecto de dedos de luva (figura
2).
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2. Figura 2. Atresia brônquica. TC mostrando formação expansiva paramediastinal na base direita,
preenchida por líquido em formato de “dedos de luva”.
2.3 – Enfisema lobar congênito
É mais comum no sexo masculino e mais freqüente nos lobos superior esquerdo e médio (figura 3). O
aspecto na TC é de hiperinsuflação lobar, com pobreza vascular e desvio contralateral das estruturas
mediastinais.
Figura 3. Enfisema lobar congênito. TC evidenciando hiperinsuflação do lobo inferior esquerdo com
pobreza vascular e discreto desvio contralateral das estruturas mediastinais.
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3. 2.4 – Malformação adenomatóide cística
Consiste de uma proliferação adenomatóide de bronquíolos formando cistos em vez de alvéolos. É
comumente diagnosticada nos 2 primeiros anos de vida. Quando detectada na vida adulta pode mimetizar
neoplasia. Os cistos podem ser únicos ou múltiplos e conter ar e/ou líquido (figura 4).
Figura 4. Malformação adenomatóide cística. TC demonstrando múltiplos espaços císticos
preenchidos por ar e líquido (setas vermelhas), no segmento posterior do lobo superior direito.
2.5 – Cisto broncogênico
Cerca de 90% são mediastinais (figura 5). É usualmente solitário, tem parede fina e conteúdo homogêneo,
podendo ser complicado por infecções.
Figura 5. Cisto broncogênico mediastinal, caracterizado por volumosa formação cística infracarinal.
2.6 – Brônquio traqueal
Ocorre quase exclusivamente à direita, até 2,0 cm cranialmente em relação à carina (figura 6).
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4. Figura 6. TC com reformatação coronal da árvore traqueobrônquica demonstrando
brônquio traqueal (seta vermelha) dirigido para o segmento apical do lobo superior direito.
3 – Anomalias vasculares
3.1 – Drenagem venosa pulmonar anômala
Resulta num desvio do fluxo sanguíneo esquerdo-direito, com o sangue venoso pulmonar fluindo
diretamente para o lado direito do coração ou para veias sistêmicas (figura 7). Pode ser parcial ou total.
Figura 7. Drenagem venosa pulmonar anômala. TC em planos axiais seqüenciais evidenciando veia pulmonar superior
direita (seta vermelha) drenando para a veia cava superior (seta verde).
3.2 – Malformação arteriovenosa pulmonar
Pode ocorrer isoladamente, ser múltipla ou fazer parte de um processo sistêmico como na doença de
Rendu-Osler-Weber. Quando solitária, é mais comum no segmento lateral do lobo médio e na língula. Por
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5. vezes simula nódulo ou massa na radiografia simples e a tomografia computadorizada esclarece sua
natureza vascular (figura 8).
Figura 8. Malformação arteriovenosa. TC após injeção venosa do meio de contraste evidenciando formação nodular
serpiginosa no lobo inferior esquerdo.
4 – Anomalias broncopulmonares e vasculares combinaads
4.1 – Síndrome da cimitarra ou síndrome venolobar congênita
O pulmão é pequeno e associado com uma artéria pulmonar pequena ou ausente, com suprimento arterial
sistêmico. O retorno venoso anômalo geralmente ocorre para a veia cava inferior, mais comumente abaixo
da cúpula frênica direita. Na maior parte das vezes a drenagem venosa anômala forma a familiar opacidade
curvilínea tubular (cimitarra) dirigida para a veia cava inferior (figura 9). O pulmão afetado é pequeno e
hipertransparente, seu arranjo vascular não tem o aspecto habitual e o outro pulmão é hiperinsuflado
compensatoriamente, com desvio mediastinal para o lado afetado.
Figura 9. Síndrome da cimitarra. A radiografia simples e a TC evidenciam discreta redução volumétrica do pulmão
direito e veia calibrosa anômala (seta vermelha) drenando para a veia cava inferior.
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6. 4.2 – Seqüestro broncopulmonar
Representa uma anomalia da ramificação traqueobrônquica com retenção do suprimento arterial sistêmico
embrionário. Esta é a teoria mais aceita, embora alguns autores postulem a origem adquirida. No seqüestro
intralobar (figura 10), o suprimento sistêmico costuma vir de um ramo da aorta, de vasos do abdome
superior e mesmo de artérias coronárias, sem colaboração da artéria pulmonar. A drenagem é feita por
veias pulmonares. Os sítios mais comuns são os lobos inferiores (60% à esquerda; 40% à direita). O
pulmão adjacente apresenta hiperinsuflação localizada (mais provavelmente representando aprisionamento
aéreo).
Figura 10. Seqüestro pulmonar intralobar. TC após injeção venosa de meio de contraste evidenciando
consolidação no lobo inferior esquerdo (seta vermelha) suprida por duas artérias sistêmicas (seta verde)
originadas da aorta descendente.
4.3 – Seqüestro extralobar
É muito menos freqüente (1:6), mais comum no sexo masculino (80%) e tem seu próprio revestimento
pleural, sendo mais comum à esquerda junto ao diafragma. O suprimento arterial é a partir de pequenas
artérias originadas da aorta, mas pode haver suprimento pela artéria pulmonar; a drenagem venosa se faz
para veias sistêmicas (ázigos e hemiázigos). Seus brônquios podem se conectar com o trato digestivo.
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7. 5 – Leitura recomendada
Zylak CJ, Eyler WR, Spizarny, DL, Stone CH. Developmental lung anomalies in the adult: Radiologic-pathologic
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Cunningam ML, Mann N. Pulmonary agenesis: a predictor of ipsilateral malformations. Am J Med Genet
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