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A percepção de alunos dos 7º anos do Ensino Fundamental sobre os
modos de relação estabelecidos na escola: uma análise da perspectiva da
Psicologia Histórico-Cultural1
Marília Luiza Galante Cavani2
Vera Lúcia Trevisan de Souza3
1
Este relatório é produto de pesquisa de Iniciação Científica realizada com bolsa FAPIC/Reitoria.
2
Graduanda em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas
E-mail: mah.cavani@hotmail.com
3
Professora da Pós-Graduação em Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Campinas
E-mail: vtrevisan@puc-campinas.edu.br
2
RESUMO
CAVANI, Marília Luiza Galante; SOUZA, Vera Lúcia Trevisan de. A percepção de
alunos dos 7º anos do Ensino Fundamental sobre os modos de relação estabelecidos na
escola: uma análise da perspectiva da Psicologia Histórico-Cultural. 2015. Relatório de
Iniciação Científica - Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Centro de Ciências da
Vida, Programa de Pós-Graduação em Psicologia, Campinas, 2015.
Este estudo, orientado pela Profª Drª Vera Lúcia Trevisan de Souza, tem como objetivo
investigar a percepção de alunos do ensino fundamental sobre os modos de relação
estabelecidos na escola, envolvendo as relações aluno-escola e professor-escola. Para isso,
como fonte de informações para a pesquisa utilizou-se entrevistas semiestruturadas e
observações em sala de aula de alunos do 8º ano do Ensino Fundamental, que frequentam
uma sala de recuperação de uma escola da rede Estadual localizada em uma cidade do
interior do estado de São Paulo. A análise dos dados foi realizada com base nos
pressupostos da Psicologia Histórico-Cultural, especialmente os desenvolvidos por
Vigotski. Observou-se que a escola, sobretudo a frequência nas salas de recuperação, vem
perdendo o sentido para os alunos que não sabem o motivo de estarem alocados nessas
salas. A mesma falta de sentido também está presente nos profissionais da escola em
relação as salas de recuperação. A questão do conhecimento, central aos objetivos da
educação escolar, não se mostra como preponderante na percepção de alunos e professores
sobre a escola, dando lugar à simples socialização. Concomitante a isso, também
encontramos uma percepção polarizada quanto aos modos de relação na escola, tanto pelos
alunos quanto pelos professores, que ora idealizam a função da instituição, ora a
subestimam. Não obstante, destacamos o papel da imaginação neste processo, a qual teria
a função extremamente importante de permitir a construção de uma escola possível, pelo
estabelecimento de uma síntese entre a escola ideal e real, fugindo, portanto, da visão
polarizada que em nossa concepção contribui para sua estagnação.
Palavras-chave: Psicologia Histórico-Cultural; Adolescência; Imaginação; Psicologia
Escolar; Modos de Relação.
3
ABSTRACT
CAVANI, Marília Luiza Galante; SOUZA, Vera Lúcia Trevisan de. The perception of
students from 7th grade of elementary school about the ways of relating established at
school: an analysis from the perspective of Historical-Cultural Psychology. 2015.
Relatório de Iniciação Científica - Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Centro
de Ciências da Vida, Programa de Pós-Graduação em Psicologia, Campinas, 2015.
This study, directed by Prof. Dr. Vera Lucia Trevisan de Souza, aims to investigate the
perception of elementary school students about the modes of relationship established at
school, involving the relationships student-school and teacher-school. For this, as a source
of information for the research we used semi-structured interviews and observations in a
8th grade of elementary school classroom, who attend a school recovery room of a school
from the State network located in a city in the state from Sao Paulo. Data analysis was
based on assumptions of Historical-Cultural Psychology, especially those developed by
Vigotski. It was noted that the school, especially the frequency in school recovery rooms,
is losing sense for students who do not know why they were allocated in these rooms. The
same lack of direction is also present in the school personnel regarding the school recovery
rooms. The question of knowledge, central to the objectives of school education, does not
seem as prevalent in the perception of students and teachers about school, giving way to
simple socializing. Concomitant to this, we also found a polarized perception of the ways
of relating in school, both by students and by teachers who now idealize the function of the
institution, sometimes to underestimate. Nevertheless, we highlight the role of imagination
in this process, which would have the extremely important function of allowing the
construction of a possible school, the establishment of a synthesis between the ideal and
real school, running away, so the polarized vision that in our conception contributes to its
stagnation.
Indexing terms: Historical-Cultural Psychology; Adolescence; Imagination; School
Psychology; Relationship Modes.
4
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO .......................................................................................................................5
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA.......................................................................................12
2.1. A ADOLESCÊNCIA E SUA GÊNESE SOCIAL ...................................................................12
2.2. A IMAGINAÇÃO ..............................................................................................................14
3. OBJETIVOS ..........................................................................................................................22
4. METODOLOGIA ..................................................................................................................23
4.1. CONCEPÇÃO METODOLÓGICA .....................................................................................23
4.2. O CONTEXTO DA PESQUISA...........................................................................................24
4.3. CARACTERIZAÇÃO DOS PARTICIPANTES ....................................................................24
4.4. PROCEDIMENTOS ...........................................................................................................25
4.5. FONTES DE INFORMAÇÃO .............................................................................................26
5. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS .............................................................27
5.1. MODO DE RELAÇÃO: ALUNO-ESCOLA........................................................................27
5.1.1. A SALA DE AULA DE RECUPERAÇÃO: ESPAÇO DE IGUALDADE X EXCLUSÃO.27
5.1.2. OS MODOS DE EXPRESSÃO (REAIS) DOS ALUNOS X AS NORMAS (IDEAIS)
IMPOSTAS PELA ESCOLA .......................................................................................................33
5.1.3. INFORMAÇÃO X CONHECIMENTO .......................................................................37
5.2. MODO DE RELAÇÃO: PROFESSOR-ESCOLA ...............................................................40
5.2.1. A ESCOLA IDEAL X A ESCOLA REAL ...................................................................40
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS...............................................................................................52
7. REFERÊNCIAS ....................................................................................................................54
8. ANEXOS.................................................................................................................................58
8.1. ROTEIRO DE OBSERVAÇÃO ..........................................................................................58
8.2. ROTEIRO DE ENTREVISTA ............................................................................................59
8.3. DIÁRIOS DE CAMPO.......................................................................................................60
8.4. CATEGORIAS DE ANÁLISE ..........................................................................................111
5
1. INTRODUÇÃO
Este plano de trabalho vincula-se ao projeto-mãe intitulado “O PAPEL DA
LINGUAGEM NA PROMOÇÃO DO DESENVOLVIMENTO: um estudo com alunos e
educadores de escolas públicas da Educação Básica”, do grupo de pesquisa Processos de
Constituição do Sujeito em Práticas Educativas – PROSPED, do Programa de pós-
graduação em Psicologia da PUC-Campinas, liderado pela professora Doutora Vera Lúcia
Trevisan de Souza.
Sua problemática deriva de pesquisas desenvolvidas pelo grupo. Uma de Iniciação
Científica, realizada no ano de 2011, intitulada “O papel dos afetos nas relações
escolares”, em que Bordignon e Souza revelam que a dimensão afetiva é preponderante
nas atitudes dos adolescentes na escola e parece determiná-las, ressaltando que este modo
de funcionar guiado pelo afetivo se objetiva em condutas que assumem um aspecto de
descompromisso, apatia e indisciplina na visão daqueles que convivem no cotidiano
escolar com o público adolescente, sobretudo os professores. Condutas como toques
corporais abundantes, com tonalidades que vão da agressão ao cuidado, conversas
incessantes, atividades alheias à aula, xingamentos recíprocos e outros são exemplos
classificados pelos professores como indisciplina ou violência.
Porém, apesar desse aparente aspecto negativo que caracteriza essas condutas, o
que foi observado é que os adolescentes as vivenciam como brincadeira, evidenciando que
estes comportamentos se configuram, para além de um aspecto violento, como um modo
próprio dos adolescentes se relacionarem e se comunicarem na escola (Bordignon &
Souza, 2011).
Os adolescentes configuram sentidos sobre a escola, em sua maioria, de nuances
negativas, utilizando-se de expressões para se referirem a ela como “um lixo”, “um tédio”
6
e “vontade de ir embora”. Bordignon & Souza (2011) afirmam que uma hipótese que
poderia explicar esses sentimentos é o fato de que a escola, a família ou quaisquer outros
meios sociais não oferecem espaço para os jovens expressarem e elaborarem suas
emoções, que ganham relevância nesta fase de transição que caracteriza a adolescência.
Nesse cenário, pensamos que a imaginação seria uma via importante para essa expressão e
elaboração, contudo ela parece não ser considerada pelos educadores como dimensão a se
investir.
A impossibilidade de elaborar as emoções, de modo a significá-las e atribuir-lhes
sentido prejudica o próprio processo de ensino-aprendizagem, que se expressa, sobretudo,
na falta de domínio pelos alunos da forma culta da língua portuguesa, por exemplo, apesar
de cursarem os anos finais do ensino fundamental.
Há ainda uma pesquisa de Iniciação Científica desenvolvida por Cavani & Souza,
no ano de 2014, intitulada “Histórias de Adolescentes: um estudo sobre a imaginação no
contexto escolar”, que derivou de uma pesquisa de mestrado (Barbosa, 2012) e a de
doutorado em andamento. Essas três pesquisas (Bordignon & Souza, 2011; Cavani &
Souza, 2014; Barbosa, 2012) têm em comum a temática da imaginação e o lugar
fundamental que ela ocupa na apropriação de conhecimentos abstratos.
Na referida pesquisa de IC, durante as observações em sala de aula, foi possível
notar que as atividades envolvendo cópia de texto da lousa ou do próprio livro são práticas
frequentes na escola e também muito valorizadas tanto por professores quanto pelos
próprios alunos. Em sala de aula, foram raros os momentos em que foram realizadas
atividades que tivessem como objetivo o exercício da imaginação e criatividade dos
alunos.
7
Temos clareza que a reprodução faz parte do processo de ensino e aprendizagem,
porém, o que parece ocorrer na escola é que não há um espaço para que a reprodução seja
superada e avançada, não favorecendo o desenvolvimento do pensamento abstrato. Parece
que na escola todo conteúdo ensinado se caracteriza por informações que devem ser
passadas aos alunos que, por sua vez, devem reproduzi-las, sem necessariamente ter
clareza ou refletir sobre elas. O mesmo ocorre com as relações, cujos modos parecem
naturalizados – “são assim mesmo, não há o que ensinar ou sobre o que refletir”. Esta
forma de ensino, que exige somente a reprodução e, algumas vezes, a memorização, não
favorece a apropriação de conhecimentos por não oferecer oportunidade para a atribuição
de sentidos ao que é ensinado, tampouco às relações que são empreendidas, seja com os
colegas ou com o professor e o conhecimento.
Para Vigotski (1931/2006), o desenvolvimento de todas as funções psicológicas
superiores no adolescente tem como centro o desenvolvimento do pensamento categorial,
por conceitos que, por sua vez, tem em seu cerne a imaginação. É somente a partir do
desenvolvimento desta modalidade de pensar que se torna possível o aprendizado de
conhecimentos abstratos, daí a relevância da imaginação e da importância de se investir
em seu exercício na escola.
Ainda no que se refere às relações, também acessamos que os modos de relacionar
dos adolescentes em diferentes contextos evidenciam a resolução de conflitos por meio de
agressões físicas e verbais (Cavani & Souza, 2014). Para nós, essas condutas parecem
indicar que não há outra possibilidade para esses alunos se colocarem diante de situações
de tensão e conflito.
Há que se considerar, também, o fato de que o adolescente é um sujeito vivendo em
determinada época e cultura, e na nossa cultura tudo o que é veiculado sobre a
8
adolescência remete à rapidez, imediatismo, transitoriedade, etc. O modo como os jovens
vivenciam essas experiências se reflete em suas atitudes em relação à escola. O ensino
oferecido na escola que se caracteriza como local em que a cognição e a reflexão são
privilegiadas, exigindo do estudante que pense, reflita e preste atenção, enfim, que dedique
tempo e esforço para se apropriar dos conhecimentos veiculados em sala de aula poderia
ganhar em qualidade caso os educadores lançassem mão de estratégias e conhecimentos
que demandam a imaginação dos jovens, fazendo-os perceber que podem acessar espaços
e conhecimentos que estão muito além do que podem acessar presencialmente. Enfim,
faze-los perceber que a mesma função que utilizam para operar um jogo de vídeo game, ou
para compreender um filme ou música é a que utilizam para aprender um novo
conhecimento: a imaginação.
O adolescente e a adolescência são aqui concebidos sócio-historicamente, ou seja, a
adolescência é compreendida como uma etapa da vida que se desenvolve na sociedade,
uma fase do desenvolvimento e uma etapa na história da humanidade, tal como a postula
Vigotski (1931/2006).
Esta concepção “despatologiza” o desenvolvimento humano na medida em que o
torna histórico. É a sociedade, criada por nós mesmos, que nos permite “ser” ou “não ser”
de um determinado modo, e a “normalidade” é compreendida como o que os homens
valorizam como “normal” e não um estado natural e eterno (Aguiar, Bock & Ozella,
2007).
A qualidade das relações que o adolescente vivencia na escola, seja com o próprio
objeto de estudo, seja com os professores e colegas é o que irá contribuir para um
desenvolvimento pleno e saudável, assim como para sua formação como sujeito ativo na
sociedade e na própria vida (Dér & Ferrari, 2000).
9
A Psicologia Histórico-Cultural sustenta uma visão de homem abalizada na
integração de vários fatores e, sobretudo, dentro de uma perspectiva social. Vigotski, um
de seus principais representantes, explica o sujeito partindo do princípio de que corpo,
cognição e afeto se constituem embasados na gama de experiências sociais e históricas por
ele vivenciadas (Vigotski 1925/2001, 1927/2004, 1935/2007). O contexto onde ele está
inserido é uma espécie de trama que respalda seu desenvolvimento físico, afetivo e social.
Não há como dizer que o meio é determinante no desenvolvimento, ao contrário,
para Vigotski (1930/2010), o meio é fonte para que esse processo desenvolvimental
aconteça, isto é, ele oferece as condições necessárias para que o sujeito se desenvolva
como tal, ao mesmo tempo em que esse sujeito imprime sua marca nesse meio. Podemos
dizer, então, que o caminho do processo de desenvolvimento se constrói na e pela relação
estabelecida entre os sujeitos e o meio em que se inserem.
Para nós, a imaginação contribui sobremaneira para a construção e constituição
desses novos modos de se relacionar, pois ela permite a reflexão, o desenvolvimento do
pensamento, e a elaboração da situação vivida, ou seja, possibilita que novas vivencias
sejam empreendidas nas relações estabelecidas.
Enquanto psicólogos, não poderíamos deixar de considerar essa dimensão
relacional, visto ser esse nosso foco de atuação. No entanto, ao adentrarmos os espaços
escolares parece que os modos de agir dos adolescentes são uma resposta à falta de
cuidado para com suas próprias demandas afetivas, às suas singularidades, às questões da
sexualidade e envolvimento efetivo com o meio. Então se atacam mutuamente, assumindo
a atribuição feita pela escola (e muitas vezes pela sociedade) de agressivos, revoltados e
indisciplinados. Esta visão é também por eles apropriada, como demonstram os
complementos de frase quando apontam que o que há de “pior” ou “mais difícil” na escola
10
é “a bagunça”, “alunos bagunceiros”, “desrespeito”. Se por um lado há uma culpabilização
do outro pela bagunça, por outro não há um processo de reflexão que permita identificar
onde exatamente está o desrespeito e em que medida o próprio sujeito adolescente
contribui ou não para que a escola se caracterize deste modo. (Bordignon & Souza, 2011).
Caberia oferecer um espaço de expressão e reflexão para os alunos, ampliando
suas experiências sobre estes modos de se relacionar, comunicar e se expressar, para que
assim, rompendo a alienação com que são pautadas as suas relações na escola, viessem a
desenvolver uma maneira mais elaborada de se relacionar tanto entre si, quanto com o
meio e, sobretudo, com o conhecimento, elemento fundamental para que avancem em seu
processo crítico-reflexivo (Bordignon & Souza, 2011).
Sendo assim, surge nossa primeira inquietação: como o psicólogo pode contribuir
na promoção da expressão e reflexão dos adolescentes sobre seus modos de se relacionar,
comunicar e se expressar? Fato que consideramos extremamente importante, uma vez que
os poucos aspectos positivos atribuídos pelos adolescentes à escola, como apontam
Bordignon & Souza (2011), parecem ser repetições de discursos incansavelmente
proferidos pelas propagandas políticas, tais como: “para um futuro melhor” e “para ser
melhor cidadão”, mas destituídos de qualquer sentido e significado para os adolescentes,
uma vez que suas ações são contrárias às suas falas, como já discutido acima.
Segundo Meira (2009), o psicólogo deve atuar no processo de elaboração das
condições necessárias para a superação de conflitos por meio da mediação entre processos
de subjetivação/objetivação dos sujeitos. Esta ação se dá quando o psicólogo se coloca em
uma posição de moderador, investigando, questionando e compreendendo as queixas como
um processo permeado por contradições e para captá-lo, o profissional deve compreender
os movimentos dos sujeitos, do contexto e ultrapassar os limites aparentes das queixas.
11
Diante do exposto, a questão que elegemos investigar é: qual a percepção de
alunos e professores sobre os modos de se relacionar empreendidos na escola e o
papel desempenhado pela imaginação na resolução de conflitos, resultando em novos
modos de relacionar-se?
O recorte que se pretende neste estudo é investigar a relação dos adolescentes com
seus pares e professores, contudo é importante elucidar que, os modos de se relacionar
com os colegas são constituídos por meio das diversas interações com pais, professores,
gestores, dentre outros.
12
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
2.1. A ADOLESCÊNCIA E SUA GÊNESE SOCIAL
O grande interesse pelo estudo da adolescência é evidente se levado em
consideração o amplo número de pesquisas da área da psicologia e da educação que
abordam esse tema (Bock, 2007). A nosso ver, uma hipótese para tal interesse é de que
existe uma necessidade de se compreender de maneira científica os conflitos que parecem
ser característicos dessa fase do desenvolvimento e como lidar com tais crises.
Assim como Bock (2007), percebemos que muitas dessas pesquisas têm se
pautado em uma visão que universaliza e naturaliza a adolescência, além de estarem
pautadas em um indivíduo do sexo masculino, branco, burguês e ocidental, o que está
muito distante de ser condizente com a realidade da grande maioria da população mundial.
Dessa forma, tais estudos acabam por contribuir ainda mais para uma visão
descontextualizada da adolescência e de suas especificidades.
Além disso, em grande parte dessas pesquisas encontramos um adolescente que é
tratado ora como um ser tomado por paixões e tormentas, ora completamente racional
(Oliveira, 2006). Bock (2007) cita alguns estudos que concebem o adolescente como
alguém sem controle, que tem uma capacidade abundante de se opor ao outro, inseguro,
depressivo, carente e com baixa auto-estima. Tal visão não é compartilhada nem por Bock
nem por Vigotski, autor em que se baseia este estudo.
Partindo de uma perspectiva sócio-histórica, que entende que os sujeitos se
constituem no social e pelo social, compreendemos que a forma como a adolescência se
constrói historicamente é muito mais relevante para nosso estudo do que a simples
definição de adolescência, ou seja, priorizamos a necessidade de se compreender a gênese
13
histórica da adolescência para então entender seu desenvolvimento. Para tal recorremos,
mais uma vez à Bock (2007), que por sua vez pede auxílio à Clímaco (1991).
Para esse autor a adolescência surge no contexto das revoluções industriais que
permearam os séculos 18, 19 e 20. Nesse momento histórico em que as máquinas passam a
ocupar o lugar dos indivíduos do mercado de trabalho acontece um aumento no
desemprego e a necessidade de uma maior qualificação de mão-de-obra. Assim sendo, os
jovens são afastados do trabalhado para que haja espaço para os mais experientes, e são
mandados de volta à escola, onde recebem a capacitação exigida pelo mercado. Além
disso, há uma grande e rápida evolução científica, que entre outras coisas, aumenta a
expectativa de vida dos indivíduos e auxilia no processo de cura e prevenção de doenças
que até então faziam com que os pais de família temessem por acabar deixando seus entes
sozinhos e sem condições de se manterem, e dessa forma levassem seus filhos para
trabalhar ainda muito jovens. Com tais evoluções, aumenta-se a necessidade de se
prorrogar a permanência dessas pessoas nas escolas (Bock, 2007).
Dessa forma, para Bock (2007):
[...] os jovens passaram, então, a estar colocados em uma nova condição social: o
jovem, apesar de possuir todas as condições cognitivas, afetivas e fisiológicas para
participar do mundo adulto, estava desautorizado a isso, devendo permanecer em
um compasso de espera para esse ingresso; vai ficando distante do mundo do
trabalho e distante também das possibilidades de obter autonomia e condições de
sustento. Vai aumentando o vínculo de dependência do adulto, apesar de já possuir
todas as condições para estar na sociedade de outro modo (p.69).
14
Assim sendo, características que refletem essas novas exigências impostas aos
jovens passam a surgir. São elas: “crises de identidade e busca de si mesmo; tendência
grupal; necessidade de intelectualizar e fantasiar; atitude rebelde; onipotência” (p.69).
Se formos analisar esses atributos, percebemos que eles são vistos e estudados
pela Psicologia como naturais, o que não acontece perante uma perspectiva vigotskiana,
que as concebe, como dito anteriormente, construídas social e culturalmente. Assim sendo,
é possível entender que a adolescência não é um período obrigatório do desenvolvimento
social humano, e pode estar mais evidente em uma sociedade do que em outra, estar
presente em um lugar e não em outro.
Diante disso entendemos que não existe uma única forma de adolescência e seu
conceito não deve ser restrito à apenas um grupo homogêneo, à uma faixa etária
específica, ou à uma determinada classe social, mas todos esses pontos, e outros ainda
como gênero e contexto sócio-histórico, devem ser articulados para a definição de cenários
de adolescência (Checchia, 2010).
Complementando, Bock (2007) cita que “não há uma adolescência, enquanto
possibilidade de ser; há uma adolescência enquanto significado social, mas suas
possibilidades de expressão são muitas” (p.70). A ideia da existência de uma “pluralidade
de juventudes” é reiterada por Checchia (2010), que frisa que há um conjunto único de
atitudes, valores, símbolos e sentimentos próprios de cada subgrupo de adolescentes.
2.2. A IMAGINAÇÃO
Em seus textos é possível perceber que Vigotski “enfoca e analisa” a imaginação
como algo particular ao humano, que está diretamente ligado à atividade criadora do
15
homem, ou seja, à habilidade de criar algo novo, podendo esse novo estar presente no
mundo externo ao indivíduo ou habitar apenas a mente e os sentimentos daquele que cria
(Vigotski, 1930/2010).
Ainda segundo Vigotski (1930/2010), é possível encontrar dois tipos de atividade
no comportamento humano. A primeira, a atividade reprodutora, está intimamente ligada à
memória, uma vez que consiste em reproduzir o que já foi criado anteriormente. Se o
homem se limitasse a apenas a atividade reprodutora seria um ser voltado ao passado.
Assim, para que os indivíduos possam viver para o futuro é que existe o que Vigotski
denomina de atividade criadora, e que a psicologia chama de imaginação ou fantasia, que
seria a capacidade do homem de combinar o passado para criar o futuro (Vigotski,
1930/2010).
Dessa forma, a imaginação está na base de toda criação, seja ela artística, científica
ou técnica. “Nesse sentido, necessariamente todo o mundo da cultura, diferentemente do
mundo da natureza, tudo isso é produto da imaginação e da criação humana que nela se
baseia” (Vigotski, 2010, p.14).
A atividade criadora pode ser considerada “condição necessária da existência”
(p.17), e, em determinadas culturas, como a nossa é facilmente observada desde logo cedo,
nas brincadeiras infantis, pois não se trata apenas de reproduzir o que a criança observa ou
ouve dos adultos, uma vez que não repetem as ações como elas acontecem na realidade,
mas pode ser vista como “reelaboração criativa de impressões vivenciadas” (p.17), ou seja,
uma recombinação dessas vivências que cria uma realidade nova, a qual materializa as
“aspirações e anseios da criança” (Vigotski, 1930/2010, p.17).
Vigotski entende que a atividade criadora de combinação se desenvolve de forma
lenta e gradual, partindo das maneiras mais elementares até alcançar níveis extremamente
16
complexos. Segundo ele, existem expressões singulares correspondentes às diferentes
faixas etárias, possuindo formas características de criação para cada uma. Além disso, é
intrínseca a qualquer comportamento humano, e está diretamente ligada ao acúmulo de
experiências, não podendo ser considerada “um divertimento ocioso da mente, uma
atividade suspensa no ar, mas uma função vital necessária” (Vigotski, 1930/2010, p.20).
Ainda nessa linha de raciocínio pode-se ver que existem algumas formas de relação
entre imaginação e realidade, sendo que a primeira delas se dá pelo fato de que toda obra
da imaginação se utiliza de elementos adotados da realidade e das experiências passadas da
pessoa para se consolidar. Isso pode ser comprovado pela “análise científica das
construções mais fantasiosas e distantes da realidade” (p.20), como mitos, lendas, contos e
sonhos, mostrando que nada mais são do que a combinação de elementos extraídos da
realidade, que foram reelaborados na imaginação, ou seja, separadamente, todos esses
elementos representam o real, e apenas quando combinados criam o fantástico. Assim
sendo, conclui-se que “a imaginação depende diretamente da riqueza e da diversidade da
experiência anterior da pessoa” (p.20), já que essas experiências são o material principal
para a construção do novo. Dessa forma pode-se entender que há grande necessidade de
ampliar as experiências das crianças, a fim de construir bases fortes para que ela
desenvolva seu potencial de criação (Vigotski, 1930/2010).
A segunda lei a qual a imaginação se subordina, está intimamente ligada à
primeira, porém é muito mais complexa, uma vez que no primeiro caso o produto final da
imaginação é irreal, enquanto que no segundo, os elementos conhecidos pelo indivíduo são
combinados para criar algo real, que esse indivíduo desconhece. “Essa forma de relação
torna-se possível somente graças à experiência alheia ou experiência social” (p.25), já que
nesse caso a imaginação não é um aspecto livre, mas está orientada pelo outro,
17
diferenciando da primeira lei na medida em que nesta a experiência pode ser somente do
indivíduo e na segunda ela é fundamentalmente guiada (Vigotski, 1930/2010).
Tal proposição nos remete à importância da imaginação, uma vez que ela permite,
com o auxílio de outra pessoa, que o indivíduo experimente o novo, não se limitando
apenas “ao círculo e a limites estreitos de sua própria experiência” (Vigotski, 1930/2010,
p.25).
Assim, há uma dependência dupla e mútua entre imaginação e experiência. Se no
primeiro caso a imaginação apoia-se na experiência, no segundo é a própria
experiência que se apoia na imaginação (Vigotski, 1930/2010, p.25).
A terceira lei manifesta-se de duas formas, e liga a imaginação e a realidade pelo
caráter emocional. A primeira forma demonstra que os sentimentos têm a capacidade de
agrupar elementos isolados da realidade, sem que haja, necessariamente, uma lógica entre
as imagens. Esses elementos sem ligação lógica dão margem para a atividade criadora se
desenvolver (Vigotski, 1930/2010).
“Entretanto, existe ainda uma relação inversa entre imaginação e emoção.
Enquanto, no primeiro caso descrito, os sentimentos influem na imaginação, nesse outro,
inverso, a imaginação influi no sentimento”, ou seja, nesse segundo caso, a imaginação
suscita as emoções (Vigotski, 1930/2010, p.28).
A quarta e última lei que rege a relação entre fantasia e realidade coloca que a
imaginação pode se tornar realidade. A construção da fantasia pode ser algo
completamente novo, sem precedentes nas experiências da pessoa ou sem nenhuma
correspondência com algo real. Porém, ao ser cristalizada, materializada, essa imaginação
se faz objeto e passa a existir e influir no mundo real, diferentemente da segunda lei, na
18
qual o produto daquela imaginação já existia no mundo real porém era desconhecida pela
indivíduo. A imaginação combinatória do homem cria um novo elemento, nunca antes
visto (Vigotski, 1930/2010).
Os elementos de que são construídos foram hauridos da realidade pela pessoa.
Internamente, em seu pensamento, foram submetidos a uma complexa
reelaboração, transformando-se em produtos da imaginação. Finalmente, ao se
encarnarem, retornam à realidade, mas já como uma nova força ativa que a
modifica (Vigotski, 1930/2010, p.30).
A criação é apenas o produto final de um longo processo, o qual é repleto de etapas
e elementos. No início desse movimento encontram-se as percepções externas e internas
do indivíduo, as quais fazem parte da experiência. Assim, tudo o que a criança vê e ouve
serve de material para uma possível futura criação (Vigotski, 1930/2010, p.35).
Esse material, então passa pela dissociação, associação e combinação, ou seja, um
todo é fragmentado em partes (dissociação), e estas podem ser unidas com outras partes do
mesmo material ou de outros (associação e combinação). Para que a associação possa
ocorrer é importante que a pessoa seja capaz de romper com a ordem natural com a qual o
material foi percebido, fato que está irrevogavelmente na base do pensamento abstrato, da
formação de conceitos (Vigotski, 1930/2010, p.36).
Pode-se dizer que “na base da criação há sempre uma inadaptação da qual surgem
necessidades, anseios e desejos”, isso porque o homem busca a todo o momento adaptar-se
a seu meio, e assim cria na tentativa de melhorar suas condições de vida. Mas para que a
invenção aconteça, é necessária a existência do que Ribot chama de “ressurreição
espontânea de imagens” (p.40), ou seja, a ressurreição que acontece sem motivo aparente,
19
mas que está ligada a motivos ocultos em “formas latentes do pensamento por analogia, do
estado afetivo, do funcionamento inconsciente do cérebro” (Vigotski, 1930/2010).
Porém, a imaginação, ao contrário do que se pensa, não é uma atividade
exclusivamente interna, está intimamente ligada ao ambiente, como diz Vigotski
(1930/2010): “o ímpeto para a criação é sempre inversamente proporcional à simplicidade
do ambiente” (p.41), ou seja, o indivíduo é fruto do seu meio e de suas experiências tal
como sua imaginação. Assim, “mesmo um gênio, é sempre um fruto de seu tempo e de seu
meio” (p.42), considerando-se que suas necessidades existiam antes mesmo dele, e que a
criação é um processo de herança histórica, não podendo nada ser criado sem que antes
existam condições materiais e psicológicas para tal (Vigotski, 1930/2010).
Diante de tudo isso se percebe que a atividade da imaginação é extremamente
complexa e dependente de diferentes fatores. Visto que todos esses fatores adquirem
diferentes formas ao longo da vida devido aos interesses e à relação do sujeito com o meio,
“que, por sua complexidade ou simplicidade, por suas tradições ou influências, pode
estimular e orientar o processo de criação” (p.43), é compreensível que a imaginação é
diferenciada na criança e no adulto (Vigotski, 1930/2010).
Diferente do que se comumente pensa, a imaginação da criança é menos rica do
que a do adulto. Isto porque as experiências dela são mais pobres, seus interesses muito
mais simples e elementares, e suas relações com o meio “não possuem a complexidade, a
sutileza e a multiplicidade” das do adulto (Vigotski, 1930/2010, p.44).
Conforme a criança cresce também se desenvolve sua imaginação e, à medida que
se aproxima da adolescência, “a potente ascensão da imaginação e os primeiros rudimentos
de amadurecimento da fantasia unem-se” (p.45), os interesses da quando era criança vão
20
dando lugar a novos interesses, e ao atingir o “amadurecimento geral” (p.45), finalmente
sua imaginação toma uma forma final (Vigotski, 1930/2010).
Vigotski (1930/2010), citando estudos de Ribot afirma que a imaginação e a razão
se desenvolvem quase que paralelamente na infância, o que faz dessa imaginação
“expressão não de riqueza, mas de pobreza da fantasia infantil” (p.46).
Então porque a imaginação da criança é vista como maior que a do adulto? Na
infância o indivíduo “confia mais nos produtos de sua imaginação e os controla menos”
(p.46) do que os adultos. Porém essa diferença não se restringe apenas ao material mais
empobrecido da criança, mas conta também com “o caráter, a qualidade e a diversidade
das combinações” que se junta a ele, que é significativamente mais humilde quando
comparados ao do homem adulto (Vigotski, 1930/2010, p.46-47).
Ainda segundo Ribot (citado por Vigotski, 1930/2010), no homem adulto
(contendo casos de exceção) “a imaginação adapta-se às condições racionais” (p.48), não
sendo mais uma atividade pura, e sim mista. Com o passar do tempo a imaginação criativa
entra em declínio, regride sem desaparecer, uma vez que a pessoa passa a viver numa vida
prática. Assim ela transforma-se em casualidade (Vigotski, 1930/2010).
Na adolescência a imaginação deixa de ser subjetiva, transformando-se em
objetiva, ou seja, passa a ser mais prática, isso devido ao período de transição que o
psicológico do adolescente está passando, que faz com que o tempo todo a pessoa viva
entre “a subjetividade pura da imaginação e a objetividade dos processos racionais, ou
seja, em outras palavras, entre a instabilidade e a estabilidade da mente” (p.48). Nesse
período fica evidente que as pessoas, em geral, abandonam os desenhos, expressão mais
marcante da imaginação infantil, e se voltam para a literatura, forma mais popular da
imaginação adolescente. A criação literária é impulsionada pelo crescimento das vivências
21
subjetivas, “pela ampliação e pelo aprofundamento da vida íntima do adolescente”, de
forma que, nesse momento, ele passa a construir em si um “mundo interno específico”
(Vigotski, 1930/2010, p.48-49).
Concluindo, entende-se que o ato criador é concebido historicamente, e se
desenvolve por meio do contato do sujeito com a sua realidade e na combinação dos
elementos de suas vivências. Assim sendo, a imaginação apresenta papel fundamental no
desenvolvimento dos indivíduos, uma vez que os torna capaz de conceber fenômenos
impossíveis de serem realizadas, possibilitando que ele seja capaz de vivenciar
experiências distintas, de suprir necessidades difíceis (e muitas vezes até mesmo
impossíveis) de serem satisfeitas, e de propiciar uma possibilidade de elaboração de
sentimentos e emoções (Vigotski, 1931/2006, 1930/2010).
22
3. OBJETIVOS
3.1. GERAL
Identificar e analisar a percepção de alunos e professores do 8º ano do Ensino
Fundamental sobre as relações estabelecidas na escola e o papel da imaginação na
promoção de diferentes modos de se relacionar.
3.2. ESPECÍFICOS
o Identificar os modos de se relacionar dos adolescentes na escola;
o Analisar a percepção de alunos e professores sobre as relações escolares;
o Analisar de que modo a imaginação atua nas relações dos alunos entre si, com o
professor e o conhecimento;
o Discutir a percepção de alunos e professores sobre as salas de recuperação.
23
4. METODOLOGIA
4.1. CONCEPÇÃO METODOLÓGICA
Este trabalho assume o método utilizado pelo grupo de pesquisa ao qual se vincula,
Processos de Constituição do Sujeito em Práticas Educativas (PROSPED), da PUC-
Campinas, que utiliza como referencial teórico-metodológico os pressupostos da
Psicologia Histórico-Cultural, sobretudo os de Vigotski.
Em seus estudos Vigotski questiona os métodos utilizados pela Psicologia em vigor
na época, dizendo que além de apoiarem-se em uma visão fragmentada de homem são de
base mecanicista ou idealista. Segundo Delari Jr. (2011), Vigotski, na tentativa de criar
uma nova psicologia, propõe uma teoria que teria por objetivo a análise do
desenvolvimento psicológico como algo indissociável da história do sujeito e de sua
relação com o social. Dessa forma, o indivíduo estaria sendo estudado em sua totalidade.
Ainda segundo a teoria, a análise dos fenômenos investigados deve ser feita de forma a
considerar a dialética entre os fatores.
Dugnani (2011) aponta que Vigotski propõe três princípios norteadores para a
realização de pesquisas: a historicidade, ou seja, a necessidade de ter como foco o processo
percorrido ao longo do desenvolvimento do fenômeno e não somente seu produto final; a
explicação do fenômeno e não sua mera descrição; e, por fim, a necessidade de dar atenção
às condutas automatizadas dos indivíduos, mas que tiveram um inicio, ou, como nomeou
Vigotski, aos comportamentos fossilizados. Pode-se entender que dessa forma Vigotski
nos coloca frente à importância de não se prender ao evidente, mas tentar buscar conhecer
a gênese dos fenômenos analisados.
24
4.2. O CONTEXTO DA PESQUISA
Este estudo foi realizado em uma escola estadual de Ensino Fundamental e Ensino
Médio, de uma cidade do interior do estado de São Paulo. Tal escola atende a
aproximadamente 1000 alunos em três períodos: manhã, tarde e noite, divididos em 30
turmas, sendo que uma delas é a classe de recuperação intensiva.
Tal classe foi criada dando seguimento a um projeto realizado no ano de 2014,
quando foram montadas duas turmas de recuperação intensiva, com alunos identificados
com dificuldades, segundo os professores, em leitura, escrita e raciocínio lógico, que são
retirados de suas turmas e organizados em uma nova turma. Essas turmas concentram um
número menor de alunos (no máximo 20), e funcionam no mesmo período das outras
turmas da série, ou seja, são turmas de recuperação intensiva de ensino regular. A
diferença entre essas turmas e as regulares é apenas a forma de trabalho com os alunos,
levando em conta suas dificuldades mais acentuadas, porém os conteúdos e as avaliações
são iguais para todas as turmas do ano. A ideia inicial é de que esses alunos retornem às
suas turmas de origem no ano seguinte.
Os professores dessas classes de recuperação também são selecionados pela gestão,
e não são obrigados a aceitar a função, mas são convidados, na maioria das vezes por suas
especialidades e manejo com os alunos. A escola conta com 50 professores e tem no total
de funcionários, contando equipe gestora e outros, 68 funcionários.
4.3. CARACTERIZAÇÃO DOS PARTICIPANTES
Esta pesquisa foi realizada em uma sala de recuperação do 8º ano da escola
mencionada anteriormente. Estão matriculados nessa turma 18 alunos, sendo 10 meninas e
25
8 meninos, com média de idade de 13/14 anos, que foram selecionados no início do ano
letivo pela coordenação da instituição para terem aulas diferenciadas, recebendo atenção
especial às suas necessidades, segundo a coordenadora pedagógica Adriana4
, não por conta
de dificuldades de aprendizagem, mas por serem mais “lentos” que os demais.
A maior parte desses alunos é de classe média baixa, e residem em bairros pobres
da cidade onde se localiza a escola. Dos alunos que responderam à entrevista feita no
segundo e terceiro encontro, observamos que grande parte reside apenas com a mãe e
irmãos.
4.4. PROCEDIMENTOS
A leitura dos pressupostos teóricos da Psicologia Histórico-Cultural, em especial
sobre a adolescência e a imaginação, a partir de diferentes autores, permeou a construção
de todo o referencial teórico deste estudo. A partir de tais leituras foram elaborados
fichamentos.
Foram efetuados seis encontros com os alunos, que visavam à realização de
atividades que demonstrassem a forma como eles entendem suas relações dentro da escola,
seja entre eles mesmos, com os professores, com a instituição ou com o local físico,
sempre tentando utilizar a imaginação como forma de mobilizar tais discussões. Ao final
de cada atividade foi pedido que os alunos descrevessem brevemente como havia sido o
encontro para si. Todas essas informações, juntamente com as transcrições dos áudios
gravados nos encontros com a autorização dos alunos e com observações foram
transformadas em diários de campo.
4
Todos os nomes utilizados na pesquisa são fictícios.
26
Foram, então, realizadas consecutivas leituras desses materiais em busca de
indicadores dos modos de relação dos alunos na escola e do papel da imaginação na
constituição de suas percepções sobre essas relações.
4.5. FONTES DE INFORMAÇÃO
As fontes de informações utilizadas neste estudo foram os diários de campo
produzidos após cada encontro realizado com os alunos, que continham as transcrições da
intervenção e observações feitas pela pesquisadora, além de desenhos produzidos pelos
alunos e professores e relatos dos mesmos de como foi cada encontro para si. Uma vez
selecionadas as fontes de informação foram feitas leituras aprofundadas dos dados visando
encontrar regularidades que permitissem a elaboração de categorias de análise.
Tais fontes de informação possibilitaram a construção de quatro categorias de
análise, conforme apresentamos abaixo:
5.1. Aluno-Escola
5.1.1. A sala de aula de recuperação: espaço de igualdade X
espaço de exclusão
5.1.2. Os modos de expressão (reais) dos alunos X As normas
(ideais) impostas pela escola
5.1.3. Informação X Conhecimento
5.2. Professor-Escola 5.2.1. A docência ideal X A docência real
27
5. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
5.1. MODO DE RELAÇÃO: ALUNO-ESCOLA
5.1.1. A SALA DE AULA DE RECUPERAÇÃO: ESPAÇO DE IGUALDADE X
EXCLUSÃO
Ao buscar investigar a percepção de alunos e professores sobre os modos de
relação no contexto escolar falamos de um lugar específico, visto tratar-se de um estudo
com alunos e professores que frequentam e trabalham em uma sala de recuperação. Como
será que estes sujeitos percebem o contexto escolar a partir da ótica da sala de
recuperação? Será que tal contexto diferenciado influencia no modo como percebem o
contexto escolar? Estas são algumas questões que pretendemos discutir ao longo da análise
desta categoria. Mas antes, é necessário ampliar a compreensão sobre as salas de
recuperação neste contexto.
Segundo informações obtidas em conversas com a equipe gestora da escola, as
turmas de sala de recuperação foram criadas diante da necessidade de uma atenção
especial para alunos que, conforme avaliação dos professores, tinham dificuldades com
escrita, leitura e raciocínio lógico. As aulas nas salas de recuperação acontecem no período
regular, respeitando um limite de 20 alunos por sala, para que dessa forma os professores
pudessem dar mais atenção à dificuldade específica de cada estudante, sendo que a
intenção é de que no ano seguinte estes voltem para as salas regulares.
Segundo a gestão, apesar da proposta de se trabalhar de forma diferenciada com
estes alunos, os conteúdos e os processos de avaliação são os mesmos para todos os
estudantes da série. Dessa forma, o aspecto que realmente diferencia as turmas regulares
28
das de recuperação é o número reduzido de estudantes por sala e a velocidade com que os
conteúdos são transmitidos aos alunos.
Porém, em nossas intervenções encontramos um a falta de sentido para os alunos
em estarem na turma de recuperação, pois muitos não sabiam exatamente o que significava
estar nesta turma nem o porquê de estarem ali, como podemos constatar nos trechos
abaixo, extraídos das falas dos próprios alunos mediante as questões feitas pela
pesquisadora durante os encontros de intervenção (“Porque você está nesta sala?” e “Como
é para você estar nessa sala?”):
“O fato de eu estar nessa sala, pra mim é pra aprender algo a mais, ser alguém na
vida. Como é pra mim? Não sei responder. Não sei porque estou aqui.” (Aluno
Enrico - Diário de Campo 11/3/2015).
“Estou nessa sala porque me colocaram. Acho que pra eu aprender mais porque
aqui tem menos aluno. Ela é mais quieta que as outras. Gosto da sala.” (Aluno
Gabriel - Diário de Campo 11/3/2015).
“Estou nessa sala, porque eu conversava muito com a Paula... acho que é por
causa disso. É normal estar aqui. Gosto mais ou menos de estar aqui. Também
aqui a matéria é mais atrasada, então está mais fácil acompanhar a matéria.”
(Aluna Julia - Diário de Campo 11/3/2015).
“Eu to nessa sala pra estudar, aprender, e ter mais incentivo. Ta sendo bom, é
melhor estar aqui do que estar na rua.” (Aluno Leandro - Diário de Campo
11/3/2015).
“To aqui porque eu tenho dificuldade de aprender algumas matérias, e por
exemplo, se eu tivesse numa sala que tem 30 alunos, eu não ia aprender tanto
29
quanto aqui. No começo eu não gostei porque eu não conversava com o pessoal
daqui, mas agora eu gosto.” (Aluna Bianca - Diário de Campo 17/3/2015).
“Estou aqui pra prestar, mais atenção, melhorar, sei lá... Pra aprender mais. Acho
legal estar aqui.” (Aluna Valentina - Diário de Campo 17/3/2015).
A partir dos trechos acima percebemos que para esses alunos o real motivo de
estarem numa sala de recuperação era desconhecido. A grande maioria entende que é
porque conversavam muito com colegas que agora estão em outras salas, outros porque
não prestavam atenção, e alguns simplesmente reproduzem um discurso apresentado pelos
professores.
A falta de sentido quanto à frequentar a sala de recuperação por parte dos alunos
também é percebida pelos profissionais da escola, conforme observa-se abaixo:
“Quero tirar uma dúvida, porque eu estou vendo que eles não sabem o porquê eles
estão nessa sala. Quando veio para nós no ano passado a oportunidade de abrir
uma sala diferenciada novamente, todos os que estão aqui foram escolhidos a
dedo, não é qualquer um que vem pra essa sala. E foi escolhido com o maior
carinho. Não é um castigo. Não é uma diferenciação, vocês não são diferentes das
outras 8ª. Mas vocês sempre apresentaram uma dificuldade, então foi pra isso que
essa sala foi aberta. Pra vocês terem uma oportunidade de ter uma base maior do
EF que vocês não conseguiram até hoje, pra no ano que vem, no EM vocês
deslancharem. Essa sala foi feita pra isso.” (Fala da coordenadora Adriana sobre o
porquê dos alunos estarem na sala de recuperação - Diário de Campo 11/3/2015).
30
Esta fala da coordenadora Adriana nos traz outra questão que queremos abordar
nessa categoria: a sala de recuperação é um lugar de igualdade ou de exaltação das
diferenças?
Se em um primeiro momento o discurso da coordenadora Adriana coloca que os
alunos da sala de recuperação não são diferentes dos outros estudantes do 8º ano, num
segundo momento ela parece ressaltar as diferenças, porém sempre tentando fazer parecer
que eles devem se sentir privilegiados por estarem ali.
“Vocês não são diferentes de ninguém, mas cada um tem um tempo diferente pra
aprender. Essa é uma oportunidade que vocês estão tendo que muitos aqui
precisavam e que não tiveram.” (Fala da coordenadora Adriana sobre o porque dos
alunos estarem na sala de recuperação - Diário de Campo 11/3/2015).
Este discurso que se contradiz nos faz pensar se as questões sobre o
encaminhamento do ensino nas salas de recuperação estão claras para os profissionais da
escola. A menor quantidade de alunos por si só é suficiente para favorecer a recuperação
destes? Diminuir a velocidade de transmissão de conteúdos não deixará esses alunos
defasados ao final do ano letivo? Estas simples questões parecem não ser suficientes para
responder à complexidade envolvida no assunto.
Torna-se importante esclarecer que a Resolução SE nº 02, de 12-1-2012, que
dispõe sobre mecanismos de apoio escolar aos alunos do Ensino Fundamental e Médio da
rede pública estadual, e a Resolução SE 53, de 2-10-2014, que dispõe sobre a
reorganização do Ensino Fundamental em Regime de Progressão Continuada e sobre os
Mecanismos de Apoio Escolar aos alunos dos Ensinos Fundamental e Médio das escolas
estaduais, não apontam claramente a forma como as turmas de recuperação devem ser
formadas e conduzidas, e nem esclarecem o que seria a dificuldade de aprendizado que
31
levaria um aluno a estar em uma sala de recuperação, deixando a cargo da gestão e equipe
pedagógica tomar decisões importantes, para as quais muitas vezes não foram preparadas
em sua formação.
Assim como nessas resoluções, encontramos na Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (Brasil, 1996) artigos e parágrafos que regulamentam a recuperação
nas escolas:
Art. 12º. Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as do seu
sistema de ensino, terão a incumbência de:
V - prover meios para a recuperação dos alunos de menor rendimento;
Art. 13º. Os docentes incumbir-se-ão de:
IV - estabelecer estratégias de recuperação para os alunos de menor rendimento;
Art. 24º. A educação básica, nos níveis fundamental e médio, será organizada de
acordo com as seguintes regras comuns:
V - a verificação do rendimento escolar observará os seguintes critérios:
e) obrigatoriedade de estudos de recuperação, de preferência paralelos ao período
letivo, para os casos de baixo rendimento escolar, a serem disciplinados pelas
instituições de ensino em seus regimentos;
Porém, mais uma vez, encontramos que apesar da regulamentação, a lei não
oferece caminhos a serem seguidos para que essas ações sejam efetivas, a não ser pela
preferência de que a recuperação aconteça de forma paralela ao período letivo, o que não
acontece na escola campo desta pesquisa. Assim, apesar de existir algumas legislações que
32
apontam para a necessidade de um tratamento diferenciado para os alunos denominados
com dificuldade de aprendizagem não há um consenso do que caracterizaria tal
dificuldade.
Estudos realizados por nosso grupo de pesquisa apontam que para os professores a
dificuldade de aprendizagem está vinculada não somente à apropriação dos conteúdos
escolares, mas à memorização das informações, à capacidade de prestar atenção e também
a atitudes e comportamentos tidos como inapropriados em sala de aula (Jesus & Souza,
2012; Jesus & Souza, 2013). Muitas vezes, a indisciplina, a rebeldia, entre outras
características de alguns alunos são enquadradas como uma dificuldade de aprendizado.
Então, como é possível planejar uma sala de recuperação se não há clareza quanto o que é
dificuldade de aprendizagem?
Diante disso, parece-nos que tanto a equipe gestora da escola quanto os professores
não possuem a clareza das necessidades específicas quanto a transmissão do conhecimento
para os alunos que não conseguem aprender no contexto de sala de aula regular. Este não
saber, em nossa concepção, favorece o discurso e a prática igualitária em relação a esses
alunos. O termo “igualdade” que tanto circula no discurso dos professores e da equipe
gestora em relação aos alunos da sala de recuperação parece estar associado a uma
igualdade de tratamento, de estratégias de ensino, e não a igualdade de direitos de todos
terem acesso ao conhecimento formal, que permitiria uma igualdade de oportunidade e de
acesso à realidade.
33
5.1.2. OS MODOS DE EXPRESSÃO (REAIS) DOS ALUNOS X AS NORMAS (IDEAIS)
IMPOSTAS PELA ESCOLA
Durante nossas visitas à escola nos deparamos com uma perturbadora presença, que
nos desviava o olhar para além dos alunos, professores e equipe escolar. Era notável à
agressão que aquele espaço físico sofria todos os dias e o incomodo de alguns alunos e dos
professores que se evidenciava a cada intervenção que realizávamos. A pichação tomava
conta das paredes e do teto da sala de aula, da lousa, das carteiras e cadeiras, das grades
das janelas.
As fotos abaixo, tiradas na sala de aula na qual realizávamos as intervenções,
mostram grande parte do que vimos na escola.
(Diário de Campo - 25/3 e 1/4/2015).
34
(Diário de Campo - 25/3 e 1/4/2015).
(Diário de Campo - 25/3 e 1/4/2015).
A observação deste fenômeno que ocorre na escola nos permite levantar diversas
questões: Qual a percepção dos alunos sobre a escola para estabelecer tal relação com este
contexto? O que os alunos dizem por meio destas pichações?
Durante o contato com os alunos observamos que as pichações rementem a
significados que de certo modo são abolidos pelo regularmente da escola, voltados
principalmente à utilização de drogas. Parece que a pichação é uma forma dupla de
35
transgredir as normas da escola: danificar um património público e a divulgação das
drogas.
No entanto, o significado que tal transgressão parece assumir para os alunos
relaciona-se a algo prazeroso, que de certo modo mantém tal atitude e promove
identificação. O que parece é que tal identificação ocorre não pelos modos ideais de fala
que permeiam a escola (ou seja, a fala escolarizada ou formal), mas sim pela fala
apreendida em outros espaços não formais, como no bairro, com os amigos, etc.
Apesar disto, a maioria dos alunos parece compreender que a pichação não é algo
que deveria ocorrer no contexto escolar, conforme observa-se nas falas abaixo:
“O que eu menos gosto? De fazer lição de matemática, porque eu não sou muito
bom. Eu acho a escola boa, só não gosto das pichações” (fala do aluno Gabriel
sobre o que mais gosta e o que menos gosta na escola - Diário de Campo
11/3/2015).
“O que eu mais gosto na escola? Os amigos, acho que é só. O que eu não gosto?
Estudar. O que eu acho da escola? Tipo, a escola é boa, só tirando os alunos que
picham a sala... ai complica” (fala da aluna Julia sobre o que acha da escola -
Diário de Campo 11/3/2015).
“O que eu não gosto. Eu vou chorar. É da agressividade que tem na escola. Então
pra mim a pichação é uma agressividade, as brigas, a resposta dura é
agressividade” (fala da professora Joana sobre o que menos gosta da escola -
Diário de Campo 11/3/2015).
Ao mesmo tempo em que a pichação parece ser um elemento de identificação
também incomoda os alunos, sendo vista como elemento repressor na medida em que
36
transforma o ambiente num lugar sujo e maltratado e acaba por desencorajar alguns alunos
a se envolverem com atividades produtivas.
A questão que surge nessa categoria é a do Ideal X Real. A expressão dos alunos se
encontra no âmbito do real, enquanto que as regras da instituição escolar estão na esfera do
ideal. Tais normas são sempre concebidas a partir do melhor que o homem pode executar.
Dessa forma, a escola promove que todos se comportem com respeito, tolerância,
dignidade etc., ou seja, da melhor forma que os indivíduos podem se comportar. Porém, na
medida em que os sujeitos passam a se relacionar com a escola, assim como com todas as
instituições, a tendência é de que surjam conflitos, uma vez que lidamos com sujeitos reais,
contextualizados e históricos, e apenas sujeitos potencialmente ideais. Entretanto, o que
parece acontecer com os alunos é que não há uma interação entre este ideal e o real que
promova uma síntese possível que favoreça o desenvolvimento.
Acreditamos que uma forma de superação dessa situação pode ser a tomada da
pichação como forma de mediação para o conhecimento e para o entendimento do social,
transformando a linguagem desses adolescentes em uma linguagem possível e
compartilhada. A linguagem precisa se tornar escolarizada, ascender ao que Vigotski
(1934/1991) chama de conceitos científicos, ou seja, a linguagem precisa ganhar novas
qualidades para promover o desenvolvimento do pensamento. Caso contrário os alunos
serão alijados de pensarem de um modo mais abstrato, de acessar outras realidades que
permitam conceber a escola e a si próprio a partir de uma outra ótica, assunto este que será
aprofundado na categoria a seguir.
37
5.1.3. INFORMAÇÃO X CONHECIMENTO
Em uma das intervenções que realizamos surge o tema, muito comum e já até
esperado pela força que as redes sociais e a internet de forma geral têm nos dias de hoje,
principalmente para com os adolescentes, do papel da internet na educação.
Vemos abaixo o trecho de uma conversa que aconteceu durante nossa intervenção.
Neste momento, em meio às questões relacionadas à internet, perguntamos aos alunos se
eles acreditavam que a internet é capaz de substituir a escola.
“Pesquisadora 1: vocês acham que a internet substitui a escola, por exemplo?
Não Não Não
Levi: da pra substituir!
Julia: da pra substituir, mas não completamente.
Levi: 30% dá.
Enrico: Pra mim acho que 70%.
Valentina: Não! 50%
Pesquisadora 1: O que você acha, professora?
Professora Tatiana: Eu acho que se complementam, porque a escola traz um
elemento fundamental que é a convivência. Isso a internet não da pra gente. Na
internet todo mundo é lindo, maravilhoso, cheiroso. E essa aqui é a nossa verdade.
A escola, na verdade, eu acho, é o local onde você encontra todos os tipos de
pessoas. Tudo é muito democrático. E outra, a pessoa pra ter acesso a internet ela
tem que ter dinheiro pra comprar um computador. Na escola não. Se ela tiver
dinheiro ou não ela ta na escola.” (Diário de Campo 25/3 e 1/4/2015).
38
Podemos perceber que apesar de, no início, termos ouvido um coro de uma
resposta negativa, como se aquilo fosse o que seria o certo dizer, os alunos começam a
discutir entre si e apontar que eles acreditam sim que a internet substitui a escola.
“Levi: acho que tem muito aprendizado também na internet. Igual, o que o sol faz
de manhã? Nasce. Ai na internet eu descobri que o sol não nasce, é só o
movimento da terra.
Valentina: você aprendeu isso na quinta série.
Risos
Professora Tatiana: Eu já ensinei isso duas vezes, agora você vai no facebook e
aprende?” (Diário de Campo 25/3 e 1/4/2015).
“Levi: acho que o Whatsapp e o facebook, Dona, só ajudou numa coisa, porque ele
fez a nossa geração ser a geração que mais lê, só isso.
Pesquisadora: Lê o que?
Levi: Lê. Acho que o meu avô não leu tanto quanto eu leio.
Pesquisadora: mas o que você lê no facebook?
Levi: tudo! O que as pessoas ficam falando.
Pesquisadora: você lê sobre a vida dos outros, é isso?
Levi: eu só leio porque ele publicou, se não tivesse publicado eu não ia saber nada
da pessoa.” (Diário de Campo 25/3 e 1/4/2015).
Nas falas os alunos demonstram que a internet pode ser uma ferramenta que ajuda
na apropriação do conhecimento e que muitas vezes pode substituir a escola. A reflexão
dos alunos traz como tema central a relação entre Informação X Conhecimento, visto que
parece que para eles a informação disseminada nas redes sociais assemelha-se ao
conhecimento que circula na escola.
39
Entendemos que a informação está muito mais próxima aos conceitos cotidianos do
que aos conceitos científicos, que são aqueles adquiridos através do processo de ensino-
aprendizagem mediado pela escola, ou seja, aqueles que, segundo Vigotski (1934/1991)
são base para a apropriação do conhecimento. Na medida em que os alunos colocam que a
internet pode substituir a escola, percebemos que não sabem diferenciar informação e o
conhecimento, ou seja, parecem não perceber a importância da mediação da escola no
processo de aprendizagem.
Tal falta de sentido também transparece na fala de alguns professores, como vemos
a seguir:
“Professora Tatiana: quando vocês estavam falando me ocorreu o seguinte: a
gente precisa do outro pra viver. E a escola não é nada sem o aluno, e o aluno
também precisa do professor, pra ter uma direção. Eu acho que as vezes a internet
propõe um isolamento. As pessoas ficam com celular e fone de ouvido. Ninguém
esta disposto a ouvir e conversar. Essa prática tem mudado bastante. E eu acho
isso muito perigoso, porque pra você viver numa sociedade bacana você precisa se
relacionar com as pessoas. Às vezes as pessoas querem ouvir só o que agrada. Não
tem muita paciência pra prestar atenção. E eu acho que o ouvir é o grande lance.
Você saber ouvir o outro. Como você vai confiar numa pessoa? Pra confiar você
precisa saber ler o colega.” (Diário de Campo 25/3 e 1/4/2015).
Esta fala da professora de ciências nos faz refletir sobre sua percepção sobre a
escola. A professora deixa entender que para ela a escola é um espaço de socialização (no
sentido de estar junto de outras pessoas), sobrepondo-se à um local onde o professor faz a
mediação do conhecimento.
40
Não queremos aqui desmerecer o papel da tecnologia e da internet na
aprendizagem, porque entendemos que ela deve sim estar presente nesse processo como
complemento e gerador de discussões. No entanto, defendemos a necessidade dos alunos
reconhecerem que a escola proporciona um saber diferenciado, visto disseminar o
conhecimento formal que dificilmente o aluno é capaz de aprender em outro espaço. É o
conhecimento formal ou escolarizado que promove um salto no desenvolvimento do
pensamento, assim como as demais funções psicológicas superiores, fazendo com que o
sujeito seja capaz de pensar muito além da realidade concreta e possa desenvolver sua
liberdade.
Para Vigotski (1931/2006), o conceito de liberdade relaciona-se à lógica de que
quanto mais o sujeito conhece maiores serão suas possibilidades de ser livre. E um dos
principais meios de apropriação do social é através do conhecimento.
O desenvolvimento do pensamento por conceito, característico da fase da
adolescência e que é base para o desenvolvimento da liberdade, só será desenvolvido pela
apropriação dos conceitos formais que dará suporte para o sujeito significar a realidade a
partir de uma outra perspectiva (Vigotski, 1931/2006).
5.2. MODO DE RELAÇÃO: PROFESSOR-ESCOLA
5.2.1. A ESCOLA IDEAL X A ESCOLA REAL
A escolha de um curso de graduação está diretamente ligada à ideia da escolha por
uma profissão. Qualquer que seja essa escolha, ela está permeada por motivações
provenientes de várias dimensões. Toda e qualquer motivação está sujeita a alterações,
ainda mais quando se passa por um processo de aquisição de conhecimentos, experiências,
41
vivências e reflexões, aspectos que possibilitam a elaboração e reelaboração dessas
motivações. Tais elaborações e reelaborações permitem o desenvolvimento de uma
consciência crítica em relação a tudo o que nos cerca, profissional e pessoalmente. Dessa
forma, é possível entender que essa consciência desenvolvida a partir desse processo irá
permear e conduzir nossas ações (Venancio, 2014).
A idealização faz parte, inicialmente, do processo de escolha de uma profissão.
Porém, essa idealização deveria dar lugar à realidade, na medida em que o indivíduo se
insere e passa a trabalhar e modificar sua consciência em relação a essa profissão.
Contudo, percebemos que as professoras e também a coordenadora da escola onde
realizamos este estudo, apresentam um discurso sustentado muito mais no âmbito da
idealização do que no contexto da realidade.
Em nossas intervenções na escola, que se sustentam na parceria com seus
profissionais, uma das ações primordiais é receber e integrar em nossas atividades os
professores que demonstrassem o desejo de participar. No caso desta pesquisa, em todas as
atividades tivemos a companhia da professora responsável pela turma no horário que nos
foi disponibilizado, e muitas vezes também a de outros professores que teriam o horário
vago e até mesmo da coordenadora da escola.
Os resultados de nossas intervenções nos fizeram pensar que a percepção dos
professores sobre a escola parece, grande parte das vezes, polarizada, no sentido de que ora
a escola é vista como um espaço ruim, como instituição que se encontra submetida a toda
sorte de influências negativas e, portanto, sem saída ou impossibilitada de superar essas
mesmas condições, ora ela é idealizada e percebe-se uma visão romântica, bastante
distante da realidade, com um romantismo exacerbado, como apresentamos abaixo:
42
“O que eu mais gosto da escola é que eu to com gente nova que me deixa nova.
Vocês são responsáveis pelo meu pensamento não envelhecer. O que eu não gosto.
Eu vou chorar... É da agressividade que tem na escola. Então pra mim a pichação
é uma agressividade, as brigas, a resposta dura é agressividade. Onde tem gente
com cabeça legal não tinha que ter isso. Outra coisa que eu também não gosto da
escola e que é cada vez mais presente: a droga. Eu acho que a vida da gente é tão
curta e não tem nada que deixar a vida mais curta. Isso eu não gosto da escola. O
que eu acho da escola. A escola é um ponto que a gente se reúne, que a gente troca
experiências, que faz com que a gente perceba que o mundo é maior do que dentro
de casa, e que o mundo tem que ser maior do que a escola. Eu tento fazer com que
eu enquanto professora, mostre pra vocês que até a 8ª serie, a gente cuida muito de
vocês, tem um carinho enorme por vocês, mas que as etapas da vida vão mudando
e acho que a escola proporciona isso.” (Fala da professora Joana sobre o que gosta
e o que não gosta na escola - Diário de Campo 11/3/2015).
Percebemos nessa fala tal contradição: se a escola é o melhor lugar do mundo, qual
a origem de tanto sofrimento e desmotivação? Por que as pessoas que a frequentam não
cuidam do espaço físico? Qual o motivo de tantas greves e milhares de pedidos de
melhorias?
Essa idealização Tal romantização é presente também aparece em outras em muitas
falas das professoras:
“O mais legal também de ser professor é o fator social. O que eu aprendi é uma
judiação ficar só comigo e se eu aprendi isso eu posso proporcionar isso pra
alguém pra que esse conhecimento seja dividido e fazer com que pra vocês isso
tenha uma função.” (Fala da professora Joana - Diário de Campo 11/3/2015).
43
“O que eu acho da escola. É o futuro de todo mundo, senão ela não existiria até
hoje.” (Fala da coordenadora Adriana - Diário de Campo 11/3/2015).
“O que eu acho da escola. Eu gosto daqui, tanto que eu voltei. Eu estava fora da
escola e acabei voltando, não fui pra nenhuma outra escola. Eu gosto daqui, eu
gosto da comunidade, eu gosto dos alunos. Acho que vocês, apesar dos problemas
que alguns tem fora da escola, a gente acaba se envolvendo, vocês são muito
próximos da gente. Eu me sinto próxima de vocês” (Fala da professora Isadora -
Diário de Campo 17/3/2015).
Estas falas nos apresentam um discurso completamente voltado para a idealização e
amor incondicional da profissão de professor e de suas implicações. Observamos nesses
recortes de falas o amor pela escola, a idealização da docência sustentada por um suposto
amor necessário ao seu exercício e o discurso de que a escola é a única possibilidade de
futuro, porém não encontramos nessas falas, ou em outros momentos de nossas
observações, uma reflexão crítica sobre as reais condições que a caracterizam, e nos
perguntamos sobre o que estaria na base desse modo de pensar a escola pelos professores e
como estas concepções afetam suas práticas pedagógicas e a relação com os alunos. em
momento algum uma crítica real, ou mesmo uma reflexão, a todo o sofrimento que
acompanha essa profissão.
Em atividade desenvolvida em uma das intervenções pedimos que todos (alunos e
professores) desenhassem algo que os remetessem à escola e a seus sentimentos em
relação a ela, e depois falassem sobre o desenho. Eis as produções das professoras e suas
reflexões e explicações acerca dos desenhos:
44
(Desenho da Professora Joana - Diário de Campo - 25/3 e 1/4/2015).
“Tudo ai é meio representativo. Eu pensei em fazer a escola, não só como uma
estrutura essencial da vida, mas a escola pro mundo. A bola então é a Terra. E os
caminhos que ligam essa escola pra terra, podem ser coloridos, mas nem sempre é
o caminho mais reto. É um caminho as vezes de idas e voltas. O livro eu pensei: o
que pode representar o conhecimento do mundo. O livro. É que eu sou do século
passado. Os meninos iam desenhar um celular, um computador, algo assim. Então
é um menino que olha pro conhecimento do mundo e ele só pode estar ai pela
escola. Os fios emendam a escola com o mundo. Não são coisas separadas. É uma
coisa pra outra.” (Professora Joana - Diário de Campo 25/3 e 1/4/2015).
45
(Desenho da Professora Tatiana - Diário de Campo - 25/3 e 1/4/2015).
“Professora Tatiana: a escola pra mim tem tudo a ver com o amor. Irracional até,
não é muito racional não. Escola pra mim é tudo. O que eu amo. Faz todo sentido
pra mim. Porque através da escola eu me desenvolvi como pessoa, ainda me
desenvolvo. E o principal é que eu acho que a escola é um lugar democrático. A
democracia, a liberdade, você poder ter chance de desenvolver seu pensamento,
sua convivência. Eu gosto demais da escola.” (Professora Tatiana - Diário de
Campo 25/3 e 1/4/2015).
46
Aqui está presente, novamente, a idealização da profissão de professor,
representada como um coração e verbalizada como um “amor irracional”, o que não
condiz com o que presenciamos e ouvimos nos relatos de professores. Esta atitude pode ser
uma forma de sobrevivência na profissão, mas que aliena o sujeito e o impede de lutar a
favor de mudanças.
Entendemos que os modos de relação dos professores com a escola, ou seja, a
forma como os professores percebem e vivenciam a escola é fonte de configuração de
sentido da escola para os alunos. Assim sendo, entendemos a grande necessidade de
compreender as percepções dos professores sobre o contexto escolar para desvendarmos a
percepção dos alunos sobre os modos de relação na escola.
Percebemos, pelas falas dos alunos, e também por seus desenhos, que a escola ora é
vista como um espaço muito idealizado ora como algo sem sentido ou que não tem mais
solução.
Encontramos nos desenhos dos alunos uma fala extremamente polarizada quanto ao
sentido atribuído à escola, assemelhando-se ao movimento apresentado pelas professoras
no início da análise desta categoria:
47
(Desenho de Bianca, 14 anos - Diário de Campo 25/3 e 1/4/2015).
Bianca apresenta a escola envolta por corações, em dissonância com sua fala de
que não gosta do que acontece ao redor da escola, que é o uso de drogas. Entretanto, não
manifesta uma visão crítica às drogas, apenas algo que a incomoda em função do cheiro,
ou seja, fica no âmbito do sensível:
“Eu não gosto... não sei... de menino que fica fumando maconha atrás da escola,
porque é ruim o cheiro” (aluna Bianca quando questionada sobre o que não gosta
na escola - Diário de Campo 17/3/2015).
Em contraponto ao “idealismo” ou alienação manifesta no desenho e fala do
desenho de Bianca encontramos o “negativismo” de Leandro e Bernardo, que desenham a
escola pegando fogo e com forma de presídio, respectivamente:
48
(Desenho de Leandro, 14 anos - Diário de Campo 25/3 e 1/4/2015).
“Que a escola parece uma cadeia. Por mim eu colocava fogo. Não é que eu não
gosto, é que parece uma cadeia mesmo. Essas grades. A gente quer beber água e o
portão está fechado. A gente tem aula vaga e não pode ir lá fora.” (Aluno Leandro
falando sobre seu desenho - Diário de Campo 25/3 e 1/4/2015).
49
(Desenho de Bernardo, 14 anos - Diário de Campo 25/3 e 1/4/2015).
(Desenho de Julia, 13 anos - Diário de Campo 11/3/2015).
50
“Professora Joana: pelas cores, o fundo escuro e o vermelhão, o coração ta em
evidencia, em destaque. Ta tão pintado, tão forte, que parece que os contornos que
ela da pra esse desenho, é como se a intenção de dar movimento pra ele. Por esse
motivo eu acho que a Julia gosta da escola. Mas não é um coração único, ele é
transpassado. Eu não sei se é um amor intenso ou se é um amor dolorido, porque
da flecha. A flecha foi pintada com um outro material que da um certo brilho, que
lembra sangue. Então dai eu fiquei entre, ela vê coisas muito boas, mas não deixa
de ser um certo sofrimento.
Julia: [chora] é exatamente isso. Como ela falou da outra vez a escola é boa, mas
depende dos alunos. A escola faz o aluno e o aluno faz a escola. Então a aula
depende dos alunos. Igual na aula da professora Tatiana, eu pedi pros alunos
pararem, e eles não pararam. A professora fica triste. Só que não tem como a
professora falar alguma coisa porque ai o aluno vai ficar com raiva. Só que eu
acho que ela fica triste. Foi mais por isso também.” (Diário de Campo 11/3/2015).
O desenho de Julia nos mostra mais uma vez uma idealização da escola, que é
representada por um coração, assim como o desenho da professora Tatiana. O desenho da
aluna também se contradiz com sua fala, que aponta muito mais coisas negativas do que
positivas na escola. Em momento algum, seja nos desenhos ou nas falas, tanto de alunos
quanto de professores, encontramos a representação de uma escola possível.
A imaginação se desenvolve intensamente com as experiências dos indivíduos, ou
seja, é a partir das experiências dos sujeitos que a imaginação é capaz de se desenvolver, e,
dialeticamente, essa imaginação possibilita que eles experimentem novas experiências na
medida em que o sujeito torna-se capaz de imaginar a escola a partir desta ótica tão
polarizada (ora como o melhor lugar ora como o pior lugar para se permanecer) não
51
favorece uma síntese possível do que ela poderia ser. Deste modo, parece que não há um
espaço para imaginar uma escola possível, real, que integrasse tanto seus aspectos
positivos quanto negativos e que favorecesse horizontes para uma transformação. Neste
sentido, vemos a necessidade da criação de um espaço em que a imaginação dos alunos e
professores possa ser desenvolvida a fim de conseguirem visualizar uma escola real,
possível.
Segundo Vigotski (1930/2010), a imaginação é regida por quatro leis, sendo que a
segunda indica que ela se relaciona com situações que ele não vivenciou até então, ao
combinar e recombinar elementos de vivências passadas.
Entendemos aqui que a imaginação desses adolescentes poderia ser usada para a
construção de uma escola possível, sem que acontecesse o que vimos: um romantismo
ideológico, indiferença ou fatalismo - nada é possível. Dessa forma, podemos supor que os
alunos não possuem a experiência de como poderia vir a ser uma escola próxima ao ideal,
porém possível, o que nos leva a concluir que eles reproduzem a visão polarizada de
educação que nos foi exibida pelos professores e coordenadora.
Neste sentido, há muitas questões complexas que guiam a percepção de alunos e
professores sobre os modos de relação na escola, o que exige um aprofundamento e um
olhar para toda a complexidade presente no contexto escolar, em especial no que tange às
salas de recuperação.
52
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este estudo teve como objetivo identificar e analisar a percepção de alunos e
professores do 8º ano do Ensino Fundamental sobre as relações estabelecidas na escola e o
papel da imaginação na promoção de diferentes modos de se relacionar.
Percebemos durante a realização desse trabalho que a escola vem perdendo sentido
para os alunos, que não sabem porque estão em uma sala de recuperação, a qual deveria
ser um espaço para que os alunos que possuem alguma dificuldade de aprendizagem
pudessem ser melhor atendidos pelos professores e alcançar o nível de aprendizagem
esperado para cada ano/série. Observamos que a própria gestão e o corpo docente não têm
um suporte legislativo para guiar e pautar suas atuações com os alunos no que concerne à
recuperação. Dessa forma, a sala de recuperação parece mais um espaço de exclusão de
alunos que por algum motivo não têm o mesmo desempenho aproveitamento escolar dos
demais, aspecto que é a todo momento apontado e reforçado pelos alunos e profissionais
da escola.
A questão do conhecimento, central aos objetivos da educação escolar, não
encontra-se como preponderante na percepção de alunos e professores sobre a escola. Os
alunos reproduzem um comportamento mais cotidiano na escola, como a questão das
pichações, não atingindo desenvolvendo formas ideias de desenvolvimento que deveriam
permear a prática escolar - como, por exemplo, o domínio da língua culta.
O que parece guiar a percepção de alunos e professores sobre as relações na escola
é sua contribuição como um espaço de socialização, de aprendizado pelas e com as
diferenças. O conhecimento em si foi pouco citado pelos alunos e professores.
53
Concomitante a isto, ressaltamos a polarização presente na percepção de alunos e
professores sobre a escola. A visão romantizada da escola concorre simultaneamente com
a visão da escola como estática, sem possibilidades de transformação, sem solução ou
esperança, percepção esta que promove certa estagnação das ações na escola.
Neste sentido, vemos a importância de mais trabalhos que focalizem a percepção
de professores e alunos sobre o contexto escolar a partir de uma visão contextualizada de
ensino e de educação, visto a complexidade que tal temática apresenta. Em especial com o
tema da classe de recuperação, encontramos poucos estudos na psicologia e na educação
que pudessem oferecer subsídios teóricos e práticos para compreender tal realidade.
Também, acreditamos ser importante uma melhor regulamentação em relação as
salas de recuperação, uma vez que encontramos muitas falhas nas leis existentes que dão
brechas para que erros sejam cometidos. Não queremos ter uma fórmula pronta para a
formação dessas turmas, já que acreditamos que as individualidades devem ser levadas em
conta, mas entendemos que há a necessidade de apontamentos que norteiem o trabalho da
equipe com os alunos.
54
7. REFERÊNCIAS
Aguiar, W. M., Bock, A. M., & Ozella, S. (2007). A orientação profissional com
adolescentes: Um exemplo de prática na abordagem sócio-histórica. In: A. M. Bock, M.
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psicológicos superiores. Organizadores Michel Cole et. al., tradução José Cipolla Neto,
Luís Silveira Menna Barreto, Solange Castro Afeche. 7ª ed. São Paulo, SP: Editora
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57
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Editora Ática. (original publicado em 1930).
Vygotski, L.S. (2006) Obras Escogidas Tomo IV. Madrid, Espanha: Visor. (Original
publicado em 1931).
Vigotski, L.S. (2001) Psicologia da Arte. Tradução Paulo Bezerra. São Paulo: Martins
Fontes. (original publicado em 1925).
Vigotski, L. S. (2004). Teoria e Método em psicologia. São Paulo: Martins Fontes.
(original publicado em 1927).
Vygotsky, L. S. (1991). Pensamento e Linguagem (3°ed.). São Paulo: Martins Fontes.
(Original publicado em 1934).
58
8. ANEXOS
8.1. ROTEIRO DE OBSERVAÇÃO
- Como eles se comportam em sala? Conversam entre eles, fazem perguntas ao professor,
conversam com o professor...
- O que os alunos fazem durante a explicação do professor?
- Como os alunos se relacionam entre si?
- Como se dá a relação entre professor-aluno?
- Qual a conduta do professor frente à sala?
- Há gritaria ou falta de respeito entre professor e alunos?
- Qual a relação dos alunos com as atividades e conteúdos passadas pelo professor?
- De que modo a imaginação aparece nas aulas?
- Os alunos saem com frequência da sala? Sozinhos?
- Há diferença no comportamento dos alunos em diferentes espaços da escola?
- Em que momentos os alunos se utilizam mais de gestos para se comunicarem?
- Em que momentos os alunos se utilizam mais de palavras para se comunicarem? Que tipo
de palavras utiliza?
- Sobre o que os alunos conversam?
- Quais são os conflitos existentes e como são resolvidos?
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8.2. ROTEIRO DE ENTREVISTA
- Nome e Idade
- Em qual bairro você mora?
- Com quem você mora?
- O que fazem seus pais?
- O que você mais gosta da escola? Porque?
- O que você menos gosta da escola? Porque?
- O que você acha da escola?
- Como é a dinâmica em sala de aula? Vocês conversam? Se sim, sobre o que e como
conversam?
- Fora de sala, o que vocês gostam de fazer na escola?
- As conversas dentro e fora de sala de aula são as mesmas?
- O que os professores falam do comportamento de vocês em sala?
- O que faz quando não está na escola?
- O que mais gosta de fazer?
- Tem computador em casa?
- Tem smartphone? Como vocês o usam? Para conversar?
- Ouve música? De que tipo? Com que frequência ouve? Quando ouve?
- Canta ou gosta de cantar? Que tipo de música? Onde canta?
- Porque você está nesta sala?
- Como é para você estar nesta sala?
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8.3. DIÁRIOS DE CAMPO
8.3.1. 18/NOV/2014
Ao chegar à escola fui levada diretamente até a sala do 8º ano, que já esperava
Pesquisadora 1. A atividade seria conduzida por ela, e consistia na apresentação das
músicas que os alunos haviam escolhido para a montagem de um CD.
A sala é inteira pichada com palavras que não entendo, inclusive as carteiras. Nas
paredes leio: “salve -” e “às vezes acho que a sina de todo homem pegador é se perder em
diversas paixões atrás do amor!!!” - trecho da música “ela chora” do Projota.
Meninos e meninas ficam separados na aula.
Ao entrarmos em sala a professora pede que um menino feche a porta, mas
Pesquisadora 1 se antecipa, e mesmo assim a professora agradece ao menino. Durante todo
o encontro, apesar de prestarem muita atenção à Pesquisadora 1, grande parte dos alunos
mexia no celular e conversava.
Após a turma começar a se dispersar e as conversinhas passarem a atrapalhar a
atividade, uma das garotas sentada ao fundo grita pedindo que os colegas fiquem quietos.
A professora está a todo o momento envolvida na atividade, conversando com
Pesquisadora 1 sobre as músicas e pedindo que os alunos permaneçam em silêncio.
Durante a atividade alguns alunos deitam nas carteiras, muitas risadas são ouvidas,
mas a grande maioria tenta descobrir quem escolheu cada música - mais intensamente
quando é uma música romântica. A conversa e as risadas aumentam cada vez mais e outros
alunos passam a gritar pedindo silêncio. Para isso utilizam de palavrões e formas
grosseiras de falar.
Em determinado momento começa a tocar a música “retrato de um playboy” de
Gabriel, o Pensador:
Pergunta prum playboy o que ele pensa da vida.
Sabe o que ele te diz?
Nada. Ele baixa a porrada
É mais ou menos assim:
Sou playboy e meto porrada
Eu dou porrada, eu enfio a porrada
61
Só ando com a galera e bato nos mané
Mas quando eu tô sozinho eu só bato nas mulhé
Eu pego muita gata no mata-leão
"É isso aí, meu cumpádi, my brother, meu irmão!"
Se alguma coisa tá na moda, eu faço também
Eu tenho um pitbull chamado Bush Hussein
O Bush é pitbull mas eu sou mais ainda
Arranquei a orelha de uma lora burra linda
Tinha um cara dançando com essa mulhé na boate
Então pensei: "tá na hora do combate"
E falei: "tu pisou no meu pé, meu irmão!"
Ele disse que não; eu dei logo um socão
Ele foi pro hospital e ela veio me dar mole
Eu pedi um chope, ela me pediu um gole
Me levou pro motel, vou te contar um segredo:
Quando ela tirou a roupa eu fiquei até com medo
Veio me beijando e chamando de gostoso
Veio me abraçando e eu fiquei meio nervoso
Veio se esfregando e eu fiquei com nojo dela
Mandei um mordidão e um chute na costela!
Sou playboy, filhinho de papai
Eu tenho um pitbull e imito o que ele faz
Sou playboy, filhinho de papai
Eu era um debilóide, fiquei ainda mais
O papai e a mamãe me dão do bom e do melhor
E quando eles viajam eu fico com a vovó
Papai é meio ausente, eu sou meio carente
Mas se falar do meu papai cê vai ficar sem dente
Já sou bem grande, já sei me virar
Sei até dirigir, só não aprendi a conversar
Eu não discuto, eu chuto! Eu não debato, eu bato!
Não sei bater papo mas resolvo no sopapo
Eu entro no meu carro e o pedal vai no chão
"Olha o cara ultrapassando, pisa aí meu irmão!"
O cara me encarou, aí eu dei uma fechada
Peguei o extintor e parti pra porrada
Sai de baixo, que eu sou muito macho
Eu sou muito macho, pelo menos eu acho
Macho não vacila, macho arrasa
Macho não leva desaforo pra casa
Macho é isso, não brinca em serviço
Macho é robusto, macho é roliço
Macho é parrudo, macho é pescoçudo
Macho é poderoso, macho é tudo!
Macho é o que há! E eu gosto muito rapaz!
Macho é lindo, macho é demais!
Eu sou igual aquele cara do casseta
Me excito mais com uma boa briga do que com uma boate
Lotada de gata
Se não tiver porrada, a noitada não tem graça
62
Aí é melhor trabalhar... Os músculos, né?
Malhar é melhor do que mulher
Por falar em malhar, me lembrei da Maria
Aquela popozuda que eu peguei na academia
Levei ela pra praia e fiquei amarradão:
A isca perfeita pra arrumar confusão
Um cara olhou pras suas coxa e ficou com a cara roxa
Outro olhou pras suas costa e levou fratura exposta
A Maria se amarrou no meu show
Mulher adora essas coisa, brôu
É até engraçado
Tô na delegacia, encarando o delegado
Eu não decido nada, tô esperando o advogado
Papai já tá chegando pra deixar tudo acertado
Dei até entrevista, vou sair na TV
Que maneiro, eu adoro aparecer
E na hora da foto, eu fiz cara de mau
Amanhã minha galera vai me ver no jornal ae
Eu sou igual aquele cara do casseta
Me excito mais com uma boa briga do que com uma boate
Lotada de gata
Se não tiver porrada, a noitada não tem graça
Aí é melhor trabalhar... Os músculos, né?
Malhar é melhor do que mulher
Por falar em malhar, me lembrei da Maria
Aquela popozuda que eu peguei na academia
Levei ela pra praia e fiquei amarradão:
A isca perfeita pra arrumar confusão
Um cara olhou pras suas coxa e ficou com a cara roxa
Outro olhou pras suas costa e levou fratura exposta
A Maria se amarrou no meu show
Mulher adora essas coisa, brôu
É até engraçado
Tô na delegacia, encarando o delegado
Eu não decido nada, tô esperando o advogado
Papai já tá chegando pra deixar tudo acertado
Dei até entrevista, vou sair na TV
Que maneiro, eu adoro aparecer
E na hora da foto, eu fiz cara de mau
Amanhã minha galera vai me ver no jornal ae
Esse é o retrato da nossa gente fina
Seja lá no açaí ou ali na cocaína
É assim que cuidamos do futuro do Brasil
A que ponto nós chegamos, hein! Puta que o pariu!!
Essa música parece ser muito significativa para os modos como esses adolescentes
se relacionam.
63
De forma geral a professora parece ter controle sobre a sala e é bem respeitada
pelos alunos. A professora pergunta ao menino que escolheu a música do rapper o que ele
entende da música. Nesse momento outro aluno assume a fala e fiz que “bater é zoeira de
amigo”. O menino que escolheu a música diz que a maior parte das coisas que Gabriel, O
Pensador fala é verdade, e que playboy é quem tem dinheiro. - surge aqui a questão da
desigualdade social.
Os alunos começam a conversar cada vez mais alto, porém, devido ao barulho
vindo do pátio e a música na sala, se tornou impossível entender do que se tratavam as
conversas.
Uma menina grita “cala a boca esse grupo aí, vocês só atrapalham”. A professora
pede que o grupo se separe e Rafael se irrita.
Começa então a tocar “eu não pedi pra nascer” do Facção Central. A música é
muito pesada e a professora fica meio assustada com a letra. Durante essa música todos
ficaram em silêncio prestando atenção na letra.
Minha mão pequena bate no vidro do carro
No braço se destacam as queimaduras de cigarro, a chuva forte ensopa a camisa e
o short
Qualquer dia a pneumonia me faz tossir até a morte
Uma moeda, um passe me livra do inferno, me faz chegar em casa e não apanhar
de fio de ferro
O meu playground não tem balança, escorregador, sua mãe Vadia perguntando
quanto você ganhou
Jogando na cara que tentou me abortar, que tomou umas 5 injeções pra me tirar
Quando eu era nenê tentou me vender uma pa de vez, quase fui criado por um
casal inglês
Olho roxo, escoriação, porra, que foi que eu fiz? em vez de tá brincando tá
colecionando cicatriz
Porque não pensou antes de abrir as pernas, filho não nasce pra sofrer não pede
pra vir pra Terra.
O seu papel devia ser cuidar de mim, cuidar de mim, cuidar de mim
não espancar, torturar, machucar, me bater, eu não pedi pra nascer
O seu papel devia ser cuidar de mim, cuidar de mim, cuidar de mim
Não espancar, torturar, machucar, me bater, eu não pedi pra nasce
Minha goma é suja, louça sem lavar, seringa usada, camisinha em todo lugar
Cabelo despenteado, bafo de aguardente é raro quando ela escova os dentes
Várias armas dos outros muquiadas no teto, na pia mosquitos, baratas, disputam
os restos
Cenário ideal pra chocar a UNICEF, Habitat natural onde os assassinos crescem
Eu não queria Playstation nem bicicleta, só ouvir a palavra "filho" da boca dela
64
Ouvir o grito da janela "A comida tá pronta", não ser espancado pra ficar no farol
a noite toda
Qualquer um ora pra Deus pra pedir que ele ajude, dê dinheiro, felicidade, saúde
Eu oro pra pedir coragem e ódio em dobro pra amarrar minha mãe na cama por
querosene e meter fogo
O seu papel devia ser cuidar de mim, cuidar de mim, cuidar de mim
não espancar, torturar, machucar, me bater, eu nao pedi pra nascer
O seu papel devia ser cuidar de mim, cuidar de mim, cuidar de mim
não espancar, torturar, machucar, me bater, eu nao pedi pra nascer
Outro dia a infância dominou meu coração, gastei o dinheiro que eu ganhei com
um álbum do Timão
Queria ser criança normal que ninguém pune, que pula amarelinha, joga bolinha
de gude
Cansei de só olhar o parquinho ali perto, senti inveja dos moleque fazendo castelo
Foda-se se eu vou morrer por isso, Obrigado meu Deus por um dia de Sorriso
A noite as costas arderam no coro da cinta, tacou minha cabeça no chão
Batia, Batia, me fez engolir figurinha por figurinha
Espetou meu corpo inteiro com uma faca de cozinha
Olhei pro teto vi as armas num pacote, subi na mesa catei logo a Glock
Mãe, devia te matar mas não sou igual você, invés de me sujar com seu sangue eu
prefiro morrer....Bum!
O seu papel devia ser cuidar de mim, cuidar de mim.
Não me espancar, torturar, machucar me bater, eu não pedi pra nascer.
O seu papel devia ser cuidar de mim, cuidar de mim.
Não me espancar, torturar, machucar me bater, eu não pedi pra nascer.
Segundo os alunos essa música fala do papel da mãe, de uma realidade.
Observei também que muitas das músicas falam sobre Deus, e que grande parte dos
alunos sabiam essas letras.
Já mais para o final da aula percebo que os alunos começam a ficar mais apáticos, e
os que antes reclamavam do barulho excessivo agora ficam quietos. Um aluno chega a
dormir mesmo. Demora para acordar quando a professora chama.
A maioria dos alunos parece gostar de rap e cantam a última música juntos. A
música cita o rapper Tupac, e os alunos contam um pouco do que sabem sobre ele. Em
pesquisa que fiz encontrei que a maioria de suas canções trata sobre como crescer no meio
da violência e da miséria nos guetos, o racismo, os problemas da sociedade e os conflitos
com outros rappers. Tupac foi assassinado em setembro de 1996 com quatro tiros.
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A percepção de alunos dos 7º anos do Ensino Fundamental sobre os modos de relação estabelecidos na escola: uma análise da perspectiva da Psicologia Histórico-Cultural

  • 1. A percepção de alunos dos 7º anos do Ensino Fundamental sobre os modos de relação estabelecidos na escola: uma análise da perspectiva da Psicologia Histórico-Cultural1 Marília Luiza Galante Cavani2 Vera Lúcia Trevisan de Souza3 1 Este relatório é produto de pesquisa de Iniciação Científica realizada com bolsa FAPIC/Reitoria. 2 Graduanda em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas E-mail: mah.cavani@hotmail.com 3 Professora da Pós-Graduação em Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Campinas E-mail: vtrevisan@puc-campinas.edu.br
  • 2. 2 RESUMO CAVANI, Marília Luiza Galante; SOUZA, Vera Lúcia Trevisan de. A percepção de alunos dos 7º anos do Ensino Fundamental sobre os modos de relação estabelecidos na escola: uma análise da perspectiva da Psicologia Histórico-Cultural. 2015. Relatório de Iniciação Científica - Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Centro de Ciências da Vida, Programa de Pós-Graduação em Psicologia, Campinas, 2015. Este estudo, orientado pela Profª Drª Vera Lúcia Trevisan de Souza, tem como objetivo investigar a percepção de alunos do ensino fundamental sobre os modos de relação estabelecidos na escola, envolvendo as relações aluno-escola e professor-escola. Para isso, como fonte de informações para a pesquisa utilizou-se entrevistas semiestruturadas e observações em sala de aula de alunos do 8º ano do Ensino Fundamental, que frequentam uma sala de recuperação de uma escola da rede Estadual localizada em uma cidade do interior do estado de São Paulo. A análise dos dados foi realizada com base nos pressupostos da Psicologia Histórico-Cultural, especialmente os desenvolvidos por Vigotski. Observou-se que a escola, sobretudo a frequência nas salas de recuperação, vem perdendo o sentido para os alunos que não sabem o motivo de estarem alocados nessas salas. A mesma falta de sentido também está presente nos profissionais da escola em relação as salas de recuperação. A questão do conhecimento, central aos objetivos da educação escolar, não se mostra como preponderante na percepção de alunos e professores sobre a escola, dando lugar à simples socialização. Concomitante a isso, também encontramos uma percepção polarizada quanto aos modos de relação na escola, tanto pelos alunos quanto pelos professores, que ora idealizam a função da instituição, ora a subestimam. Não obstante, destacamos o papel da imaginação neste processo, a qual teria a função extremamente importante de permitir a construção de uma escola possível, pelo estabelecimento de uma síntese entre a escola ideal e real, fugindo, portanto, da visão polarizada que em nossa concepção contribui para sua estagnação. Palavras-chave: Psicologia Histórico-Cultural; Adolescência; Imaginação; Psicologia Escolar; Modos de Relação.
  • 3. 3 ABSTRACT CAVANI, Marília Luiza Galante; SOUZA, Vera Lúcia Trevisan de. The perception of students from 7th grade of elementary school about the ways of relating established at school: an analysis from the perspective of Historical-Cultural Psychology. 2015. Relatório de Iniciação Científica - Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Centro de Ciências da Vida, Programa de Pós-Graduação em Psicologia, Campinas, 2015. This study, directed by Prof. Dr. Vera Lucia Trevisan de Souza, aims to investigate the perception of elementary school students about the modes of relationship established at school, involving the relationships student-school and teacher-school. For this, as a source of information for the research we used semi-structured interviews and observations in a 8th grade of elementary school classroom, who attend a school recovery room of a school from the State network located in a city in the state from Sao Paulo. Data analysis was based on assumptions of Historical-Cultural Psychology, especially those developed by Vigotski. It was noted that the school, especially the frequency in school recovery rooms, is losing sense for students who do not know why they were allocated in these rooms. The same lack of direction is also present in the school personnel regarding the school recovery rooms. The question of knowledge, central to the objectives of school education, does not seem as prevalent in the perception of students and teachers about school, giving way to simple socializing. Concomitant to this, we also found a polarized perception of the ways of relating in school, both by students and by teachers who now idealize the function of the institution, sometimes to underestimate. Nevertheless, we highlight the role of imagination in this process, which would have the extremely important function of allowing the construction of a possible school, the establishment of a synthesis between the ideal and real school, running away, so the polarized vision that in our conception contributes to its stagnation. Indexing terms: Historical-Cultural Psychology; Adolescence; Imagination; School Psychology; Relationship Modes.
  • 4. 4 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO .......................................................................................................................5 2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA.......................................................................................12 2.1. A ADOLESCÊNCIA E SUA GÊNESE SOCIAL ...................................................................12 2.2. A IMAGINAÇÃO ..............................................................................................................14 3. OBJETIVOS ..........................................................................................................................22 4. METODOLOGIA ..................................................................................................................23 4.1. CONCEPÇÃO METODOLÓGICA .....................................................................................23 4.2. O CONTEXTO DA PESQUISA...........................................................................................24 4.3. CARACTERIZAÇÃO DOS PARTICIPANTES ....................................................................24 4.4. PROCEDIMENTOS ...........................................................................................................25 4.5. FONTES DE INFORMAÇÃO .............................................................................................26 5. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS .............................................................27 5.1. MODO DE RELAÇÃO: ALUNO-ESCOLA........................................................................27 5.1.1. A SALA DE AULA DE RECUPERAÇÃO: ESPAÇO DE IGUALDADE X EXCLUSÃO.27 5.1.2. OS MODOS DE EXPRESSÃO (REAIS) DOS ALUNOS X AS NORMAS (IDEAIS) IMPOSTAS PELA ESCOLA .......................................................................................................33 5.1.3. INFORMAÇÃO X CONHECIMENTO .......................................................................37 5.2. MODO DE RELAÇÃO: PROFESSOR-ESCOLA ...............................................................40 5.2.1. A ESCOLA IDEAL X A ESCOLA REAL ...................................................................40 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS...............................................................................................52 7. REFERÊNCIAS ....................................................................................................................54 8. ANEXOS.................................................................................................................................58 8.1. ROTEIRO DE OBSERVAÇÃO ..........................................................................................58 8.2. ROTEIRO DE ENTREVISTA ............................................................................................59 8.3. DIÁRIOS DE CAMPO.......................................................................................................60 8.4. CATEGORIAS DE ANÁLISE ..........................................................................................111
  • 5. 5 1. INTRODUÇÃO Este plano de trabalho vincula-se ao projeto-mãe intitulado “O PAPEL DA LINGUAGEM NA PROMOÇÃO DO DESENVOLVIMENTO: um estudo com alunos e educadores de escolas públicas da Educação Básica”, do grupo de pesquisa Processos de Constituição do Sujeito em Práticas Educativas – PROSPED, do Programa de pós- graduação em Psicologia da PUC-Campinas, liderado pela professora Doutora Vera Lúcia Trevisan de Souza. Sua problemática deriva de pesquisas desenvolvidas pelo grupo. Uma de Iniciação Científica, realizada no ano de 2011, intitulada “O papel dos afetos nas relações escolares”, em que Bordignon e Souza revelam que a dimensão afetiva é preponderante nas atitudes dos adolescentes na escola e parece determiná-las, ressaltando que este modo de funcionar guiado pelo afetivo se objetiva em condutas que assumem um aspecto de descompromisso, apatia e indisciplina na visão daqueles que convivem no cotidiano escolar com o público adolescente, sobretudo os professores. Condutas como toques corporais abundantes, com tonalidades que vão da agressão ao cuidado, conversas incessantes, atividades alheias à aula, xingamentos recíprocos e outros são exemplos classificados pelos professores como indisciplina ou violência. Porém, apesar desse aparente aspecto negativo que caracteriza essas condutas, o que foi observado é que os adolescentes as vivenciam como brincadeira, evidenciando que estes comportamentos se configuram, para além de um aspecto violento, como um modo próprio dos adolescentes se relacionarem e se comunicarem na escola (Bordignon & Souza, 2011). Os adolescentes configuram sentidos sobre a escola, em sua maioria, de nuances negativas, utilizando-se de expressões para se referirem a ela como “um lixo”, “um tédio”
  • 6. 6 e “vontade de ir embora”. Bordignon & Souza (2011) afirmam que uma hipótese que poderia explicar esses sentimentos é o fato de que a escola, a família ou quaisquer outros meios sociais não oferecem espaço para os jovens expressarem e elaborarem suas emoções, que ganham relevância nesta fase de transição que caracteriza a adolescência. Nesse cenário, pensamos que a imaginação seria uma via importante para essa expressão e elaboração, contudo ela parece não ser considerada pelos educadores como dimensão a se investir. A impossibilidade de elaborar as emoções, de modo a significá-las e atribuir-lhes sentido prejudica o próprio processo de ensino-aprendizagem, que se expressa, sobretudo, na falta de domínio pelos alunos da forma culta da língua portuguesa, por exemplo, apesar de cursarem os anos finais do ensino fundamental. Há ainda uma pesquisa de Iniciação Científica desenvolvida por Cavani & Souza, no ano de 2014, intitulada “Histórias de Adolescentes: um estudo sobre a imaginação no contexto escolar”, que derivou de uma pesquisa de mestrado (Barbosa, 2012) e a de doutorado em andamento. Essas três pesquisas (Bordignon & Souza, 2011; Cavani & Souza, 2014; Barbosa, 2012) têm em comum a temática da imaginação e o lugar fundamental que ela ocupa na apropriação de conhecimentos abstratos. Na referida pesquisa de IC, durante as observações em sala de aula, foi possível notar que as atividades envolvendo cópia de texto da lousa ou do próprio livro são práticas frequentes na escola e também muito valorizadas tanto por professores quanto pelos próprios alunos. Em sala de aula, foram raros os momentos em que foram realizadas atividades que tivessem como objetivo o exercício da imaginação e criatividade dos alunos.
  • 7. 7 Temos clareza que a reprodução faz parte do processo de ensino e aprendizagem, porém, o que parece ocorrer na escola é que não há um espaço para que a reprodução seja superada e avançada, não favorecendo o desenvolvimento do pensamento abstrato. Parece que na escola todo conteúdo ensinado se caracteriza por informações que devem ser passadas aos alunos que, por sua vez, devem reproduzi-las, sem necessariamente ter clareza ou refletir sobre elas. O mesmo ocorre com as relações, cujos modos parecem naturalizados – “são assim mesmo, não há o que ensinar ou sobre o que refletir”. Esta forma de ensino, que exige somente a reprodução e, algumas vezes, a memorização, não favorece a apropriação de conhecimentos por não oferecer oportunidade para a atribuição de sentidos ao que é ensinado, tampouco às relações que são empreendidas, seja com os colegas ou com o professor e o conhecimento. Para Vigotski (1931/2006), o desenvolvimento de todas as funções psicológicas superiores no adolescente tem como centro o desenvolvimento do pensamento categorial, por conceitos que, por sua vez, tem em seu cerne a imaginação. É somente a partir do desenvolvimento desta modalidade de pensar que se torna possível o aprendizado de conhecimentos abstratos, daí a relevância da imaginação e da importância de se investir em seu exercício na escola. Ainda no que se refere às relações, também acessamos que os modos de relacionar dos adolescentes em diferentes contextos evidenciam a resolução de conflitos por meio de agressões físicas e verbais (Cavani & Souza, 2014). Para nós, essas condutas parecem indicar que não há outra possibilidade para esses alunos se colocarem diante de situações de tensão e conflito. Há que se considerar, também, o fato de que o adolescente é um sujeito vivendo em determinada época e cultura, e na nossa cultura tudo o que é veiculado sobre a
  • 8. 8 adolescência remete à rapidez, imediatismo, transitoriedade, etc. O modo como os jovens vivenciam essas experiências se reflete em suas atitudes em relação à escola. O ensino oferecido na escola que se caracteriza como local em que a cognição e a reflexão são privilegiadas, exigindo do estudante que pense, reflita e preste atenção, enfim, que dedique tempo e esforço para se apropriar dos conhecimentos veiculados em sala de aula poderia ganhar em qualidade caso os educadores lançassem mão de estratégias e conhecimentos que demandam a imaginação dos jovens, fazendo-os perceber que podem acessar espaços e conhecimentos que estão muito além do que podem acessar presencialmente. Enfim, faze-los perceber que a mesma função que utilizam para operar um jogo de vídeo game, ou para compreender um filme ou música é a que utilizam para aprender um novo conhecimento: a imaginação. O adolescente e a adolescência são aqui concebidos sócio-historicamente, ou seja, a adolescência é compreendida como uma etapa da vida que se desenvolve na sociedade, uma fase do desenvolvimento e uma etapa na história da humanidade, tal como a postula Vigotski (1931/2006). Esta concepção “despatologiza” o desenvolvimento humano na medida em que o torna histórico. É a sociedade, criada por nós mesmos, que nos permite “ser” ou “não ser” de um determinado modo, e a “normalidade” é compreendida como o que os homens valorizam como “normal” e não um estado natural e eterno (Aguiar, Bock & Ozella, 2007). A qualidade das relações que o adolescente vivencia na escola, seja com o próprio objeto de estudo, seja com os professores e colegas é o que irá contribuir para um desenvolvimento pleno e saudável, assim como para sua formação como sujeito ativo na sociedade e na própria vida (Dér & Ferrari, 2000).
  • 9. 9 A Psicologia Histórico-Cultural sustenta uma visão de homem abalizada na integração de vários fatores e, sobretudo, dentro de uma perspectiva social. Vigotski, um de seus principais representantes, explica o sujeito partindo do princípio de que corpo, cognição e afeto se constituem embasados na gama de experiências sociais e históricas por ele vivenciadas (Vigotski 1925/2001, 1927/2004, 1935/2007). O contexto onde ele está inserido é uma espécie de trama que respalda seu desenvolvimento físico, afetivo e social. Não há como dizer que o meio é determinante no desenvolvimento, ao contrário, para Vigotski (1930/2010), o meio é fonte para que esse processo desenvolvimental aconteça, isto é, ele oferece as condições necessárias para que o sujeito se desenvolva como tal, ao mesmo tempo em que esse sujeito imprime sua marca nesse meio. Podemos dizer, então, que o caminho do processo de desenvolvimento se constrói na e pela relação estabelecida entre os sujeitos e o meio em que se inserem. Para nós, a imaginação contribui sobremaneira para a construção e constituição desses novos modos de se relacionar, pois ela permite a reflexão, o desenvolvimento do pensamento, e a elaboração da situação vivida, ou seja, possibilita que novas vivencias sejam empreendidas nas relações estabelecidas. Enquanto psicólogos, não poderíamos deixar de considerar essa dimensão relacional, visto ser esse nosso foco de atuação. No entanto, ao adentrarmos os espaços escolares parece que os modos de agir dos adolescentes são uma resposta à falta de cuidado para com suas próprias demandas afetivas, às suas singularidades, às questões da sexualidade e envolvimento efetivo com o meio. Então se atacam mutuamente, assumindo a atribuição feita pela escola (e muitas vezes pela sociedade) de agressivos, revoltados e indisciplinados. Esta visão é também por eles apropriada, como demonstram os complementos de frase quando apontam que o que há de “pior” ou “mais difícil” na escola
  • 10. 10 é “a bagunça”, “alunos bagunceiros”, “desrespeito”. Se por um lado há uma culpabilização do outro pela bagunça, por outro não há um processo de reflexão que permita identificar onde exatamente está o desrespeito e em que medida o próprio sujeito adolescente contribui ou não para que a escola se caracterize deste modo. (Bordignon & Souza, 2011). Caberia oferecer um espaço de expressão e reflexão para os alunos, ampliando suas experiências sobre estes modos de se relacionar, comunicar e se expressar, para que assim, rompendo a alienação com que são pautadas as suas relações na escola, viessem a desenvolver uma maneira mais elaborada de se relacionar tanto entre si, quanto com o meio e, sobretudo, com o conhecimento, elemento fundamental para que avancem em seu processo crítico-reflexivo (Bordignon & Souza, 2011). Sendo assim, surge nossa primeira inquietação: como o psicólogo pode contribuir na promoção da expressão e reflexão dos adolescentes sobre seus modos de se relacionar, comunicar e se expressar? Fato que consideramos extremamente importante, uma vez que os poucos aspectos positivos atribuídos pelos adolescentes à escola, como apontam Bordignon & Souza (2011), parecem ser repetições de discursos incansavelmente proferidos pelas propagandas políticas, tais como: “para um futuro melhor” e “para ser melhor cidadão”, mas destituídos de qualquer sentido e significado para os adolescentes, uma vez que suas ações são contrárias às suas falas, como já discutido acima. Segundo Meira (2009), o psicólogo deve atuar no processo de elaboração das condições necessárias para a superação de conflitos por meio da mediação entre processos de subjetivação/objetivação dos sujeitos. Esta ação se dá quando o psicólogo se coloca em uma posição de moderador, investigando, questionando e compreendendo as queixas como um processo permeado por contradições e para captá-lo, o profissional deve compreender os movimentos dos sujeitos, do contexto e ultrapassar os limites aparentes das queixas.
  • 11. 11 Diante do exposto, a questão que elegemos investigar é: qual a percepção de alunos e professores sobre os modos de se relacionar empreendidos na escola e o papel desempenhado pela imaginação na resolução de conflitos, resultando em novos modos de relacionar-se? O recorte que se pretende neste estudo é investigar a relação dos adolescentes com seus pares e professores, contudo é importante elucidar que, os modos de se relacionar com os colegas são constituídos por meio das diversas interações com pais, professores, gestores, dentre outros.
  • 12. 12 2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 2.1. A ADOLESCÊNCIA E SUA GÊNESE SOCIAL O grande interesse pelo estudo da adolescência é evidente se levado em consideração o amplo número de pesquisas da área da psicologia e da educação que abordam esse tema (Bock, 2007). A nosso ver, uma hipótese para tal interesse é de que existe uma necessidade de se compreender de maneira científica os conflitos que parecem ser característicos dessa fase do desenvolvimento e como lidar com tais crises. Assim como Bock (2007), percebemos que muitas dessas pesquisas têm se pautado em uma visão que universaliza e naturaliza a adolescência, além de estarem pautadas em um indivíduo do sexo masculino, branco, burguês e ocidental, o que está muito distante de ser condizente com a realidade da grande maioria da população mundial. Dessa forma, tais estudos acabam por contribuir ainda mais para uma visão descontextualizada da adolescência e de suas especificidades. Além disso, em grande parte dessas pesquisas encontramos um adolescente que é tratado ora como um ser tomado por paixões e tormentas, ora completamente racional (Oliveira, 2006). Bock (2007) cita alguns estudos que concebem o adolescente como alguém sem controle, que tem uma capacidade abundante de se opor ao outro, inseguro, depressivo, carente e com baixa auto-estima. Tal visão não é compartilhada nem por Bock nem por Vigotski, autor em que se baseia este estudo. Partindo de uma perspectiva sócio-histórica, que entende que os sujeitos se constituem no social e pelo social, compreendemos que a forma como a adolescência se constrói historicamente é muito mais relevante para nosso estudo do que a simples definição de adolescência, ou seja, priorizamos a necessidade de se compreender a gênese
  • 13. 13 histórica da adolescência para então entender seu desenvolvimento. Para tal recorremos, mais uma vez à Bock (2007), que por sua vez pede auxílio à Clímaco (1991). Para esse autor a adolescência surge no contexto das revoluções industriais que permearam os séculos 18, 19 e 20. Nesse momento histórico em que as máquinas passam a ocupar o lugar dos indivíduos do mercado de trabalho acontece um aumento no desemprego e a necessidade de uma maior qualificação de mão-de-obra. Assim sendo, os jovens são afastados do trabalhado para que haja espaço para os mais experientes, e são mandados de volta à escola, onde recebem a capacitação exigida pelo mercado. Além disso, há uma grande e rápida evolução científica, que entre outras coisas, aumenta a expectativa de vida dos indivíduos e auxilia no processo de cura e prevenção de doenças que até então faziam com que os pais de família temessem por acabar deixando seus entes sozinhos e sem condições de se manterem, e dessa forma levassem seus filhos para trabalhar ainda muito jovens. Com tais evoluções, aumenta-se a necessidade de se prorrogar a permanência dessas pessoas nas escolas (Bock, 2007). Dessa forma, para Bock (2007): [...] os jovens passaram, então, a estar colocados em uma nova condição social: o jovem, apesar de possuir todas as condições cognitivas, afetivas e fisiológicas para participar do mundo adulto, estava desautorizado a isso, devendo permanecer em um compasso de espera para esse ingresso; vai ficando distante do mundo do trabalho e distante também das possibilidades de obter autonomia e condições de sustento. Vai aumentando o vínculo de dependência do adulto, apesar de já possuir todas as condições para estar na sociedade de outro modo (p.69).
  • 14. 14 Assim sendo, características que refletem essas novas exigências impostas aos jovens passam a surgir. São elas: “crises de identidade e busca de si mesmo; tendência grupal; necessidade de intelectualizar e fantasiar; atitude rebelde; onipotência” (p.69). Se formos analisar esses atributos, percebemos que eles são vistos e estudados pela Psicologia como naturais, o que não acontece perante uma perspectiva vigotskiana, que as concebe, como dito anteriormente, construídas social e culturalmente. Assim sendo, é possível entender que a adolescência não é um período obrigatório do desenvolvimento social humano, e pode estar mais evidente em uma sociedade do que em outra, estar presente em um lugar e não em outro. Diante disso entendemos que não existe uma única forma de adolescência e seu conceito não deve ser restrito à apenas um grupo homogêneo, à uma faixa etária específica, ou à uma determinada classe social, mas todos esses pontos, e outros ainda como gênero e contexto sócio-histórico, devem ser articulados para a definição de cenários de adolescência (Checchia, 2010). Complementando, Bock (2007) cita que “não há uma adolescência, enquanto possibilidade de ser; há uma adolescência enquanto significado social, mas suas possibilidades de expressão são muitas” (p.70). A ideia da existência de uma “pluralidade de juventudes” é reiterada por Checchia (2010), que frisa que há um conjunto único de atitudes, valores, símbolos e sentimentos próprios de cada subgrupo de adolescentes. 2.2. A IMAGINAÇÃO Em seus textos é possível perceber que Vigotski “enfoca e analisa” a imaginação como algo particular ao humano, que está diretamente ligado à atividade criadora do
  • 15. 15 homem, ou seja, à habilidade de criar algo novo, podendo esse novo estar presente no mundo externo ao indivíduo ou habitar apenas a mente e os sentimentos daquele que cria (Vigotski, 1930/2010). Ainda segundo Vigotski (1930/2010), é possível encontrar dois tipos de atividade no comportamento humano. A primeira, a atividade reprodutora, está intimamente ligada à memória, uma vez que consiste em reproduzir o que já foi criado anteriormente. Se o homem se limitasse a apenas a atividade reprodutora seria um ser voltado ao passado. Assim, para que os indivíduos possam viver para o futuro é que existe o que Vigotski denomina de atividade criadora, e que a psicologia chama de imaginação ou fantasia, que seria a capacidade do homem de combinar o passado para criar o futuro (Vigotski, 1930/2010). Dessa forma, a imaginação está na base de toda criação, seja ela artística, científica ou técnica. “Nesse sentido, necessariamente todo o mundo da cultura, diferentemente do mundo da natureza, tudo isso é produto da imaginação e da criação humana que nela se baseia” (Vigotski, 2010, p.14). A atividade criadora pode ser considerada “condição necessária da existência” (p.17), e, em determinadas culturas, como a nossa é facilmente observada desde logo cedo, nas brincadeiras infantis, pois não se trata apenas de reproduzir o que a criança observa ou ouve dos adultos, uma vez que não repetem as ações como elas acontecem na realidade, mas pode ser vista como “reelaboração criativa de impressões vivenciadas” (p.17), ou seja, uma recombinação dessas vivências que cria uma realidade nova, a qual materializa as “aspirações e anseios da criança” (Vigotski, 1930/2010, p.17). Vigotski entende que a atividade criadora de combinação se desenvolve de forma lenta e gradual, partindo das maneiras mais elementares até alcançar níveis extremamente
  • 16. 16 complexos. Segundo ele, existem expressões singulares correspondentes às diferentes faixas etárias, possuindo formas características de criação para cada uma. Além disso, é intrínseca a qualquer comportamento humano, e está diretamente ligada ao acúmulo de experiências, não podendo ser considerada “um divertimento ocioso da mente, uma atividade suspensa no ar, mas uma função vital necessária” (Vigotski, 1930/2010, p.20). Ainda nessa linha de raciocínio pode-se ver que existem algumas formas de relação entre imaginação e realidade, sendo que a primeira delas se dá pelo fato de que toda obra da imaginação se utiliza de elementos adotados da realidade e das experiências passadas da pessoa para se consolidar. Isso pode ser comprovado pela “análise científica das construções mais fantasiosas e distantes da realidade” (p.20), como mitos, lendas, contos e sonhos, mostrando que nada mais são do que a combinação de elementos extraídos da realidade, que foram reelaborados na imaginação, ou seja, separadamente, todos esses elementos representam o real, e apenas quando combinados criam o fantástico. Assim sendo, conclui-se que “a imaginação depende diretamente da riqueza e da diversidade da experiência anterior da pessoa” (p.20), já que essas experiências são o material principal para a construção do novo. Dessa forma pode-se entender que há grande necessidade de ampliar as experiências das crianças, a fim de construir bases fortes para que ela desenvolva seu potencial de criação (Vigotski, 1930/2010). A segunda lei a qual a imaginação se subordina, está intimamente ligada à primeira, porém é muito mais complexa, uma vez que no primeiro caso o produto final da imaginação é irreal, enquanto que no segundo, os elementos conhecidos pelo indivíduo são combinados para criar algo real, que esse indivíduo desconhece. “Essa forma de relação torna-se possível somente graças à experiência alheia ou experiência social” (p.25), já que nesse caso a imaginação não é um aspecto livre, mas está orientada pelo outro,
  • 17. 17 diferenciando da primeira lei na medida em que nesta a experiência pode ser somente do indivíduo e na segunda ela é fundamentalmente guiada (Vigotski, 1930/2010). Tal proposição nos remete à importância da imaginação, uma vez que ela permite, com o auxílio de outra pessoa, que o indivíduo experimente o novo, não se limitando apenas “ao círculo e a limites estreitos de sua própria experiência” (Vigotski, 1930/2010, p.25). Assim, há uma dependência dupla e mútua entre imaginação e experiência. Se no primeiro caso a imaginação apoia-se na experiência, no segundo é a própria experiência que se apoia na imaginação (Vigotski, 1930/2010, p.25). A terceira lei manifesta-se de duas formas, e liga a imaginação e a realidade pelo caráter emocional. A primeira forma demonstra que os sentimentos têm a capacidade de agrupar elementos isolados da realidade, sem que haja, necessariamente, uma lógica entre as imagens. Esses elementos sem ligação lógica dão margem para a atividade criadora se desenvolver (Vigotski, 1930/2010). “Entretanto, existe ainda uma relação inversa entre imaginação e emoção. Enquanto, no primeiro caso descrito, os sentimentos influem na imaginação, nesse outro, inverso, a imaginação influi no sentimento”, ou seja, nesse segundo caso, a imaginação suscita as emoções (Vigotski, 1930/2010, p.28). A quarta e última lei que rege a relação entre fantasia e realidade coloca que a imaginação pode se tornar realidade. A construção da fantasia pode ser algo completamente novo, sem precedentes nas experiências da pessoa ou sem nenhuma correspondência com algo real. Porém, ao ser cristalizada, materializada, essa imaginação se faz objeto e passa a existir e influir no mundo real, diferentemente da segunda lei, na
  • 18. 18 qual o produto daquela imaginação já existia no mundo real porém era desconhecida pela indivíduo. A imaginação combinatória do homem cria um novo elemento, nunca antes visto (Vigotski, 1930/2010). Os elementos de que são construídos foram hauridos da realidade pela pessoa. Internamente, em seu pensamento, foram submetidos a uma complexa reelaboração, transformando-se em produtos da imaginação. Finalmente, ao se encarnarem, retornam à realidade, mas já como uma nova força ativa que a modifica (Vigotski, 1930/2010, p.30). A criação é apenas o produto final de um longo processo, o qual é repleto de etapas e elementos. No início desse movimento encontram-se as percepções externas e internas do indivíduo, as quais fazem parte da experiência. Assim, tudo o que a criança vê e ouve serve de material para uma possível futura criação (Vigotski, 1930/2010, p.35). Esse material, então passa pela dissociação, associação e combinação, ou seja, um todo é fragmentado em partes (dissociação), e estas podem ser unidas com outras partes do mesmo material ou de outros (associação e combinação). Para que a associação possa ocorrer é importante que a pessoa seja capaz de romper com a ordem natural com a qual o material foi percebido, fato que está irrevogavelmente na base do pensamento abstrato, da formação de conceitos (Vigotski, 1930/2010, p.36). Pode-se dizer que “na base da criação há sempre uma inadaptação da qual surgem necessidades, anseios e desejos”, isso porque o homem busca a todo o momento adaptar-se a seu meio, e assim cria na tentativa de melhorar suas condições de vida. Mas para que a invenção aconteça, é necessária a existência do que Ribot chama de “ressurreição espontânea de imagens” (p.40), ou seja, a ressurreição que acontece sem motivo aparente,
  • 19. 19 mas que está ligada a motivos ocultos em “formas latentes do pensamento por analogia, do estado afetivo, do funcionamento inconsciente do cérebro” (Vigotski, 1930/2010). Porém, a imaginação, ao contrário do que se pensa, não é uma atividade exclusivamente interna, está intimamente ligada ao ambiente, como diz Vigotski (1930/2010): “o ímpeto para a criação é sempre inversamente proporcional à simplicidade do ambiente” (p.41), ou seja, o indivíduo é fruto do seu meio e de suas experiências tal como sua imaginação. Assim, “mesmo um gênio, é sempre um fruto de seu tempo e de seu meio” (p.42), considerando-se que suas necessidades existiam antes mesmo dele, e que a criação é um processo de herança histórica, não podendo nada ser criado sem que antes existam condições materiais e psicológicas para tal (Vigotski, 1930/2010). Diante de tudo isso se percebe que a atividade da imaginação é extremamente complexa e dependente de diferentes fatores. Visto que todos esses fatores adquirem diferentes formas ao longo da vida devido aos interesses e à relação do sujeito com o meio, “que, por sua complexidade ou simplicidade, por suas tradições ou influências, pode estimular e orientar o processo de criação” (p.43), é compreensível que a imaginação é diferenciada na criança e no adulto (Vigotski, 1930/2010). Diferente do que se comumente pensa, a imaginação da criança é menos rica do que a do adulto. Isto porque as experiências dela são mais pobres, seus interesses muito mais simples e elementares, e suas relações com o meio “não possuem a complexidade, a sutileza e a multiplicidade” das do adulto (Vigotski, 1930/2010, p.44). Conforme a criança cresce também se desenvolve sua imaginação e, à medida que se aproxima da adolescência, “a potente ascensão da imaginação e os primeiros rudimentos de amadurecimento da fantasia unem-se” (p.45), os interesses da quando era criança vão
  • 20. 20 dando lugar a novos interesses, e ao atingir o “amadurecimento geral” (p.45), finalmente sua imaginação toma uma forma final (Vigotski, 1930/2010). Vigotski (1930/2010), citando estudos de Ribot afirma que a imaginação e a razão se desenvolvem quase que paralelamente na infância, o que faz dessa imaginação “expressão não de riqueza, mas de pobreza da fantasia infantil” (p.46). Então porque a imaginação da criança é vista como maior que a do adulto? Na infância o indivíduo “confia mais nos produtos de sua imaginação e os controla menos” (p.46) do que os adultos. Porém essa diferença não se restringe apenas ao material mais empobrecido da criança, mas conta também com “o caráter, a qualidade e a diversidade das combinações” que se junta a ele, que é significativamente mais humilde quando comparados ao do homem adulto (Vigotski, 1930/2010, p.46-47). Ainda segundo Ribot (citado por Vigotski, 1930/2010), no homem adulto (contendo casos de exceção) “a imaginação adapta-se às condições racionais” (p.48), não sendo mais uma atividade pura, e sim mista. Com o passar do tempo a imaginação criativa entra em declínio, regride sem desaparecer, uma vez que a pessoa passa a viver numa vida prática. Assim ela transforma-se em casualidade (Vigotski, 1930/2010). Na adolescência a imaginação deixa de ser subjetiva, transformando-se em objetiva, ou seja, passa a ser mais prática, isso devido ao período de transição que o psicológico do adolescente está passando, que faz com que o tempo todo a pessoa viva entre “a subjetividade pura da imaginação e a objetividade dos processos racionais, ou seja, em outras palavras, entre a instabilidade e a estabilidade da mente” (p.48). Nesse período fica evidente que as pessoas, em geral, abandonam os desenhos, expressão mais marcante da imaginação infantil, e se voltam para a literatura, forma mais popular da imaginação adolescente. A criação literária é impulsionada pelo crescimento das vivências
  • 21. 21 subjetivas, “pela ampliação e pelo aprofundamento da vida íntima do adolescente”, de forma que, nesse momento, ele passa a construir em si um “mundo interno específico” (Vigotski, 1930/2010, p.48-49). Concluindo, entende-se que o ato criador é concebido historicamente, e se desenvolve por meio do contato do sujeito com a sua realidade e na combinação dos elementos de suas vivências. Assim sendo, a imaginação apresenta papel fundamental no desenvolvimento dos indivíduos, uma vez que os torna capaz de conceber fenômenos impossíveis de serem realizadas, possibilitando que ele seja capaz de vivenciar experiências distintas, de suprir necessidades difíceis (e muitas vezes até mesmo impossíveis) de serem satisfeitas, e de propiciar uma possibilidade de elaboração de sentimentos e emoções (Vigotski, 1931/2006, 1930/2010).
  • 22. 22 3. OBJETIVOS 3.1. GERAL Identificar e analisar a percepção de alunos e professores do 8º ano do Ensino Fundamental sobre as relações estabelecidas na escola e o papel da imaginação na promoção de diferentes modos de se relacionar. 3.2. ESPECÍFICOS o Identificar os modos de se relacionar dos adolescentes na escola; o Analisar a percepção de alunos e professores sobre as relações escolares; o Analisar de que modo a imaginação atua nas relações dos alunos entre si, com o professor e o conhecimento; o Discutir a percepção de alunos e professores sobre as salas de recuperação.
  • 23. 23 4. METODOLOGIA 4.1. CONCEPÇÃO METODOLÓGICA Este trabalho assume o método utilizado pelo grupo de pesquisa ao qual se vincula, Processos de Constituição do Sujeito em Práticas Educativas (PROSPED), da PUC- Campinas, que utiliza como referencial teórico-metodológico os pressupostos da Psicologia Histórico-Cultural, sobretudo os de Vigotski. Em seus estudos Vigotski questiona os métodos utilizados pela Psicologia em vigor na época, dizendo que além de apoiarem-se em uma visão fragmentada de homem são de base mecanicista ou idealista. Segundo Delari Jr. (2011), Vigotski, na tentativa de criar uma nova psicologia, propõe uma teoria que teria por objetivo a análise do desenvolvimento psicológico como algo indissociável da história do sujeito e de sua relação com o social. Dessa forma, o indivíduo estaria sendo estudado em sua totalidade. Ainda segundo a teoria, a análise dos fenômenos investigados deve ser feita de forma a considerar a dialética entre os fatores. Dugnani (2011) aponta que Vigotski propõe três princípios norteadores para a realização de pesquisas: a historicidade, ou seja, a necessidade de ter como foco o processo percorrido ao longo do desenvolvimento do fenômeno e não somente seu produto final; a explicação do fenômeno e não sua mera descrição; e, por fim, a necessidade de dar atenção às condutas automatizadas dos indivíduos, mas que tiveram um inicio, ou, como nomeou Vigotski, aos comportamentos fossilizados. Pode-se entender que dessa forma Vigotski nos coloca frente à importância de não se prender ao evidente, mas tentar buscar conhecer a gênese dos fenômenos analisados.
  • 24. 24 4.2. O CONTEXTO DA PESQUISA Este estudo foi realizado em uma escola estadual de Ensino Fundamental e Ensino Médio, de uma cidade do interior do estado de São Paulo. Tal escola atende a aproximadamente 1000 alunos em três períodos: manhã, tarde e noite, divididos em 30 turmas, sendo que uma delas é a classe de recuperação intensiva. Tal classe foi criada dando seguimento a um projeto realizado no ano de 2014, quando foram montadas duas turmas de recuperação intensiva, com alunos identificados com dificuldades, segundo os professores, em leitura, escrita e raciocínio lógico, que são retirados de suas turmas e organizados em uma nova turma. Essas turmas concentram um número menor de alunos (no máximo 20), e funcionam no mesmo período das outras turmas da série, ou seja, são turmas de recuperação intensiva de ensino regular. A diferença entre essas turmas e as regulares é apenas a forma de trabalho com os alunos, levando em conta suas dificuldades mais acentuadas, porém os conteúdos e as avaliações são iguais para todas as turmas do ano. A ideia inicial é de que esses alunos retornem às suas turmas de origem no ano seguinte. Os professores dessas classes de recuperação também são selecionados pela gestão, e não são obrigados a aceitar a função, mas são convidados, na maioria das vezes por suas especialidades e manejo com os alunos. A escola conta com 50 professores e tem no total de funcionários, contando equipe gestora e outros, 68 funcionários. 4.3. CARACTERIZAÇÃO DOS PARTICIPANTES Esta pesquisa foi realizada em uma sala de recuperação do 8º ano da escola mencionada anteriormente. Estão matriculados nessa turma 18 alunos, sendo 10 meninas e
  • 25. 25 8 meninos, com média de idade de 13/14 anos, que foram selecionados no início do ano letivo pela coordenação da instituição para terem aulas diferenciadas, recebendo atenção especial às suas necessidades, segundo a coordenadora pedagógica Adriana4 , não por conta de dificuldades de aprendizagem, mas por serem mais “lentos” que os demais. A maior parte desses alunos é de classe média baixa, e residem em bairros pobres da cidade onde se localiza a escola. Dos alunos que responderam à entrevista feita no segundo e terceiro encontro, observamos que grande parte reside apenas com a mãe e irmãos. 4.4. PROCEDIMENTOS A leitura dos pressupostos teóricos da Psicologia Histórico-Cultural, em especial sobre a adolescência e a imaginação, a partir de diferentes autores, permeou a construção de todo o referencial teórico deste estudo. A partir de tais leituras foram elaborados fichamentos. Foram efetuados seis encontros com os alunos, que visavam à realização de atividades que demonstrassem a forma como eles entendem suas relações dentro da escola, seja entre eles mesmos, com os professores, com a instituição ou com o local físico, sempre tentando utilizar a imaginação como forma de mobilizar tais discussões. Ao final de cada atividade foi pedido que os alunos descrevessem brevemente como havia sido o encontro para si. Todas essas informações, juntamente com as transcrições dos áudios gravados nos encontros com a autorização dos alunos e com observações foram transformadas em diários de campo. 4 Todos os nomes utilizados na pesquisa são fictícios.
  • 26. 26 Foram, então, realizadas consecutivas leituras desses materiais em busca de indicadores dos modos de relação dos alunos na escola e do papel da imaginação na constituição de suas percepções sobre essas relações. 4.5. FONTES DE INFORMAÇÃO As fontes de informações utilizadas neste estudo foram os diários de campo produzidos após cada encontro realizado com os alunos, que continham as transcrições da intervenção e observações feitas pela pesquisadora, além de desenhos produzidos pelos alunos e professores e relatos dos mesmos de como foi cada encontro para si. Uma vez selecionadas as fontes de informação foram feitas leituras aprofundadas dos dados visando encontrar regularidades que permitissem a elaboração de categorias de análise. Tais fontes de informação possibilitaram a construção de quatro categorias de análise, conforme apresentamos abaixo: 5.1. Aluno-Escola 5.1.1. A sala de aula de recuperação: espaço de igualdade X espaço de exclusão 5.1.2. Os modos de expressão (reais) dos alunos X As normas (ideais) impostas pela escola 5.1.3. Informação X Conhecimento 5.2. Professor-Escola 5.2.1. A docência ideal X A docência real
  • 27. 27 5. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS 5.1. MODO DE RELAÇÃO: ALUNO-ESCOLA 5.1.1. A SALA DE AULA DE RECUPERAÇÃO: ESPAÇO DE IGUALDADE X EXCLUSÃO Ao buscar investigar a percepção de alunos e professores sobre os modos de relação no contexto escolar falamos de um lugar específico, visto tratar-se de um estudo com alunos e professores que frequentam e trabalham em uma sala de recuperação. Como será que estes sujeitos percebem o contexto escolar a partir da ótica da sala de recuperação? Será que tal contexto diferenciado influencia no modo como percebem o contexto escolar? Estas são algumas questões que pretendemos discutir ao longo da análise desta categoria. Mas antes, é necessário ampliar a compreensão sobre as salas de recuperação neste contexto. Segundo informações obtidas em conversas com a equipe gestora da escola, as turmas de sala de recuperação foram criadas diante da necessidade de uma atenção especial para alunos que, conforme avaliação dos professores, tinham dificuldades com escrita, leitura e raciocínio lógico. As aulas nas salas de recuperação acontecem no período regular, respeitando um limite de 20 alunos por sala, para que dessa forma os professores pudessem dar mais atenção à dificuldade específica de cada estudante, sendo que a intenção é de que no ano seguinte estes voltem para as salas regulares. Segundo a gestão, apesar da proposta de se trabalhar de forma diferenciada com estes alunos, os conteúdos e os processos de avaliação são os mesmos para todos os estudantes da série. Dessa forma, o aspecto que realmente diferencia as turmas regulares
  • 28. 28 das de recuperação é o número reduzido de estudantes por sala e a velocidade com que os conteúdos são transmitidos aos alunos. Porém, em nossas intervenções encontramos um a falta de sentido para os alunos em estarem na turma de recuperação, pois muitos não sabiam exatamente o que significava estar nesta turma nem o porquê de estarem ali, como podemos constatar nos trechos abaixo, extraídos das falas dos próprios alunos mediante as questões feitas pela pesquisadora durante os encontros de intervenção (“Porque você está nesta sala?” e “Como é para você estar nessa sala?”): “O fato de eu estar nessa sala, pra mim é pra aprender algo a mais, ser alguém na vida. Como é pra mim? Não sei responder. Não sei porque estou aqui.” (Aluno Enrico - Diário de Campo 11/3/2015). “Estou nessa sala porque me colocaram. Acho que pra eu aprender mais porque aqui tem menos aluno. Ela é mais quieta que as outras. Gosto da sala.” (Aluno Gabriel - Diário de Campo 11/3/2015). “Estou nessa sala, porque eu conversava muito com a Paula... acho que é por causa disso. É normal estar aqui. Gosto mais ou menos de estar aqui. Também aqui a matéria é mais atrasada, então está mais fácil acompanhar a matéria.” (Aluna Julia - Diário de Campo 11/3/2015). “Eu to nessa sala pra estudar, aprender, e ter mais incentivo. Ta sendo bom, é melhor estar aqui do que estar na rua.” (Aluno Leandro - Diário de Campo 11/3/2015). “To aqui porque eu tenho dificuldade de aprender algumas matérias, e por exemplo, se eu tivesse numa sala que tem 30 alunos, eu não ia aprender tanto
  • 29. 29 quanto aqui. No começo eu não gostei porque eu não conversava com o pessoal daqui, mas agora eu gosto.” (Aluna Bianca - Diário de Campo 17/3/2015). “Estou aqui pra prestar, mais atenção, melhorar, sei lá... Pra aprender mais. Acho legal estar aqui.” (Aluna Valentina - Diário de Campo 17/3/2015). A partir dos trechos acima percebemos que para esses alunos o real motivo de estarem numa sala de recuperação era desconhecido. A grande maioria entende que é porque conversavam muito com colegas que agora estão em outras salas, outros porque não prestavam atenção, e alguns simplesmente reproduzem um discurso apresentado pelos professores. A falta de sentido quanto à frequentar a sala de recuperação por parte dos alunos também é percebida pelos profissionais da escola, conforme observa-se abaixo: “Quero tirar uma dúvida, porque eu estou vendo que eles não sabem o porquê eles estão nessa sala. Quando veio para nós no ano passado a oportunidade de abrir uma sala diferenciada novamente, todos os que estão aqui foram escolhidos a dedo, não é qualquer um que vem pra essa sala. E foi escolhido com o maior carinho. Não é um castigo. Não é uma diferenciação, vocês não são diferentes das outras 8ª. Mas vocês sempre apresentaram uma dificuldade, então foi pra isso que essa sala foi aberta. Pra vocês terem uma oportunidade de ter uma base maior do EF que vocês não conseguiram até hoje, pra no ano que vem, no EM vocês deslancharem. Essa sala foi feita pra isso.” (Fala da coordenadora Adriana sobre o porquê dos alunos estarem na sala de recuperação - Diário de Campo 11/3/2015).
  • 30. 30 Esta fala da coordenadora Adriana nos traz outra questão que queremos abordar nessa categoria: a sala de recuperação é um lugar de igualdade ou de exaltação das diferenças? Se em um primeiro momento o discurso da coordenadora Adriana coloca que os alunos da sala de recuperação não são diferentes dos outros estudantes do 8º ano, num segundo momento ela parece ressaltar as diferenças, porém sempre tentando fazer parecer que eles devem se sentir privilegiados por estarem ali. “Vocês não são diferentes de ninguém, mas cada um tem um tempo diferente pra aprender. Essa é uma oportunidade que vocês estão tendo que muitos aqui precisavam e que não tiveram.” (Fala da coordenadora Adriana sobre o porque dos alunos estarem na sala de recuperação - Diário de Campo 11/3/2015). Este discurso que se contradiz nos faz pensar se as questões sobre o encaminhamento do ensino nas salas de recuperação estão claras para os profissionais da escola. A menor quantidade de alunos por si só é suficiente para favorecer a recuperação destes? Diminuir a velocidade de transmissão de conteúdos não deixará esses alunos defasados ao final do ano letivo? Estas simples questões parecem não ser suficientes para responder à complexidade envolvida no assunto. Torna-se importante esclarecer que a Resolução SE nº 02, de 12-1-2012, que dispõe sobre mecanismos de apoio escolar aos alunos do Ensino Fundamental e Médio da rede pública estadual, e a Resolução SE 53, de 2-10-2014, que dispõe sobre a reorganização do Ensino Fundamental em Regime de Progressão Continuada e sobre os Mecanismos de Apoio Escolar aos alunos dos Ensinos Fundamental e Médio das escolas estaduais, não apontam claramente a forma como as turmas de recuperação devem ser formadas e conduzidas, e nem esclarecem o que seria a dificuldade de aprendizado que
  • 31. 31 levaria um aluno a estar em uma sala de recuperação, deixando a cargo da gestão e equipe pedagógica tomar decisões importantes, para as quais muitas vezes não foram preparadas em sua formação. Assim como nessas resoluções, encontramos na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Brasil, 1996) artigos e parágrafos que regulamentam a recuperação nas escolas: Art. 12º. Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as do seu sistema de ensino, terão a incumbência de: V - prover meios para a recuperação dos alunos de menor rendimento; Art. 13º. Os docentes incumbir-se-ão de: IV - estabelecer estratégias de recuperação para os alunos de menor rendimento; Art. 24º. A educação básica, nos níveis fundamental e médio, será organizada de acordo com as seguintes regras comuns: V - a verificação do rendimento escolar observará os seguintes critérios: e) obrigatoriedade de estudos de recuperação, de preferência paralelos ao período letivo, para os casos de baixo rendimento escolar, a serem disciplinados pelas instituições de ensino em seus regimentos; Porém, mais uma vez, encontramos que apesar da regulamentação, a lei não oferece caminhos a serem seguidos para que essas ações sejam efetivas, a não ser pela preferência de que a recuperação aconteça de forma paralela ao período letivo, o que não acontece na escola campo desta pesquisa. Assim, apesar de existir algumas legislações que
  • 32. 32 apontam para a necessidade de um tratamento diferenciado para os alunos denominados com dificuldade de aprendizagem não há um consenso do que caracterizaria tal dificuldade. Estudos realizados por nosso grupo de pesquisa apontam que para os professores a dificuldade de aprendizagem está vinculada não somente à apropriação dos conteúdos escolares, mas à memorização das informações, à capacidade de prestar atenção e também a atitudes e comportamentos tidos como inapropriados em sala de aula (Jesus & Souza, 2012; Jesus & Souza, 2013). Muitas vezes, a indisciplina, a rebeldia, entre outras características de alguns alunos são enquadradas como uma dificuldade de aprendizado. Então, como é possível planejar uma sala de recuperação se não há clareza quanto o que é dificuldade de aprendizagem? Diante disso, parece-nos que tanto a equipe gestora da escola quanto os professores não possuem a clareza das necessidades específicas quanto a transmissão do conhecimento para os alunos que não conseguem aprender no contexto de sala de aula regular. Este não saber, em nossa concepção, favorece o discurso e a prática igualitária em relação a esses alunos. O termo “igualdade” que tanto circula no discurso dos professores e da equipe gestora em relação aos alunos da sala de recuperação parece estar associado a uma igualdade de tratamento, de estratégias de ensino, e não a igualdade de direitos de todos terem acesso ao conhecimento formal, que permitiria uma igualdade de oportunidade e de acesso à realidade.
  • 33. 33 5.1.2. OS MODOS DE EXPRESSÃO (REAIS) DOS ALUNOS X AS NORMAS (IDEAIS) IMPOSTAS PELA ESCOLA Durante nossas visitas à escola nos deparamos com uma perturbadora presença, que nos desviava o olhar para além dos alunos, professores e equipe escolar. Era notável à agressão que aquele espaço físico sofria todos os dias e o incomodo de alguns alunos e dos professores que se evidenciava a cada intervenção que realizávamos. A pichação tomava conta das paredes e do teto da sala de aula, da lousa, das carteiras e cadeiras, das grades das janelas. As fotos abaixo, tiradas na sala de aula na qual realizávamos as intervenções, mostram grande parte do que vimos na escola. (Diário de Campo - 25/3 e 1/4/2015).
  • 34. 34 (Diário de Campo - 25/3 e 1/4/2015). (Diário de Campo - 25/3 e 1/4/2015). A observação deste fenômeno que ocorre na escola nos permite levantar diversas questões: Qual a percepção dos alunos sobre a escola para estabelecer tal relação com este contexto? O que os alunos dizem por meio destas pichações? Durante o contato com os alunos observamos que as pichações rementem a significados que de certo modo são abolidos pelo regularmente da escola, voltados principalmente à utilização de drogas. Parece que a pichação é uma forma dupla de
  • 35. 35 transgredir as normas da escola: danificar um património público e a divulgação das drogas. No entanto, o significado que tal transgressão parece assumir para os alunos relaciona-se a algo prazeroso, que de certo modo mantém tal atitude e promove identificação. O que parece é que tal identificação ocorre não pelos modos ideais de fala que permeiam a escola (ou seja, a fala escolarizada ou formal), mas sim pela fala apreendida em outros espaços não formais, como no bairro, com os amigos, etc. Apesar disto, a maioria dos alunos parece compreender que a pichação não é algo que deveria ocorrer no contexto escolar, conforme observa-se nas falas abaixo: “O que eu menos gosto? De fazer lição de matemática, porque eu não sou muito bom. Eu acho a escola boa, só não gosto das pichações” (fala do aluno Gabriel sobre o que mais gosta e o que menos gosta na escola - Diário de Campo 11/3/2015). “O que eu mais gosto na escola? Os amigos, acho que é só. O que eu não gosto? Estudar. O que eu acho da escola? Tipo, a escola é boa, só tirando os alunos que picham a sala... ai complica” (fala da aluna Julia sobre o que acha da escola - Diário de Campo 11/3/2015). “O que eu não gosto. Eu vou chorar. É da agressividade que tem na escola. Então pra mim a pichação é uma agressividade, as brigas, a resposta dura é agressividade” (fala da professora Joana sobre o que menos gosta da escola - Diário de Campo 11/3/2015). Ao mesmo tempo em que a pichação parece ser um elemento de identificação também incomoda os alunos, sendo vista como elemento repressor na medida em que
  • 36. 36 transforma o ambiente num lugar sujo e maltratado e acaba por desencorajar alguns alunos a se envolverem com atividades produtivas. A questão que surge nessa categoria é a do Ideal X Real. A expressão dos alunos se encontra no âmbito do real, enquanto que as regras da instituição escolar estão na esfera do ideal. Tais normas são sempre concebidas a partir do melhor que o homem pode executar. Dessa forma, a escola promove que todos se comportem com respeito, tolerância, dignidade etc., ou seja, da melhor forma que os indivíduos podem se comportar. Porém, na medida em que os sujeitos passam a se relacionar com a escola, assim como com todas as instituições, a tendência é de que surjam conflitos, uma vez que lidamos com sujeitos reais, contextualizados e históricos, e apenas sujeitos potencialmente ideais. Entretanto, o que parece acontecer com os alunos é que não há uma interação entre este ideal e o real que promova uma síntese possível que favoreça o desenvolvimento. Acreditamos que uma forma de superação dessa situação pode ser a tomada da pichação como forma de mediação para o conhecimento e para o entendimento do social, transformando a linguagem desses adolescentes em uma linguagem possível e compartilhada. A linguagem precisa se tornar escolarizada, ascender ao que Vigotski (1934/1991) chama de conceitos científicos, ou seja, a linguagem precisa ganhar novas qualidades para promover o desenvolvimento do pensamento. Caso contrário os alunos serão alijados de pensarem de um modo mais abstrato, de acessar outras realidades que permitam conceber a escola e a si próprio a partir de uma outra ótica, assunto este que será aprofundado na categoria a seguir.
  • 37. 37 5.1.3. INFORMAÇÃO X CONHECIMENTO Em uma das intervenções que realizamos surge o tema, muito comum e já até esperado pela força que as redes sociais e a internet de forma geral têm nos dias de hoje, principalmente para com os adolescentes, do papel da internet na educação. Vemos abaixo o trecho de uma conversa que aconteceu durante nossa intervenção. Neste momento, em meio às questões relacionadas à internet, perguntamos aos alunos se eles acreditavam que a internet é capaz de substituir a escola. “Pesquisadora 1: vocês acham que a internet substitui a escola, por exemplo? Não Não Não Levi: da pra substituir! Julia: da pra substituir, mas não completamente. Levi: 30% dá. Enrico: Pra mim acho que 70%. Valentina: Não! 50% Pesquisadora 1: O que você acha, professora? Professora Tatiana: Eu acho que se complementam, porque a escola traz um elemento fundamental que é a convivência. Isso a internet não da pra gente. Na internet todo mundo é lindo, maravilhoso, cheiroso. E essa aqui é a nossa verdade. A escola, na verdade, eu acho, é o local onde você encontra todos os tipos de pessoas. Tudo é muito democrático. E outra, a pessoa pra ter acesso a internet ela tem que ter dinheiro pra comprar um computador. Na escola não. Se ela tiver dinheiro ou não ela ta na escola.” (Diário de Campo 25/3 e 1/4/2015).
  • 38. 38 Podemos perceber que apesar de, no início, termos ouvido um coro de uma resposta negativa, como se aquilo fosse o que seria o certo dizer, os alunos começam a discutir entre si e apontar que eles acreditam sim que a internet substitui a escola. “Levi: acho que tem muito aprendizado também na internet. Igual, o que o sol faz de manhã? Nasce. Ai na internet eu descobri que o sol não nasce, é só o movimento da terra. Valentina: você aprendeu isso na quinta série. Risos Professora Tatiana: Eu já ensinei isso duas vezes, agora você vai no facebook e aprende?” (Diário de Campo 25/3 e 1/4/2015). “Levi: acho que o Whatsapp e o facebook, Dona, só ajudou numa coisa, porque ele fez a nossa geração ser a geração que mais lê, só isso. Pesquisadora: Lê o que? Levi: Lê. Acho que o meu avô não leu tanto quanto eu leio. Pesquisadora: mas o que você lê no facebook? Levi: tudo! O que as pessoas ficam falando. Pesquisadora: você lê sobre a vida dos outros, é isso? Levi: eu só leio porque ele publicou, se não tivesse publicado eu não ia saber nada da pessoa.” (Diário de Campo 25/3 e 1/4/2015). Nas falas os alunos demonstram que a internet pode ser uma ferramenta que ajuda na apropriação do conhecimento e que muitas vezes pode substituir a escola. A reflexão dos alunos traz como tema central a relação entre Informação X Conhecimento, visto que parece que para eles a informação disseminada nas redes sociais assemelha-se ao conhecimento que circula na escola.
  • 39. 39 Entendemos que a informação está muito mais próxima aos conceitos cotidianos do que aos conceitos científicos, que são aqueles adquiridos através do processo de ensino- aprendizagem mediado pela escola, ou seja, aqueles que, segundo Vigotski (1934/1991) são base para a apropriação do conhecimento. Na medida em que os alunos colocam que a internet pode substituir a escola, percebemos que não sabem diferenciar informação e o conhecimento, ou seja, parecem não perceber a importância da mediação da escola no processo de aprendizagem. Tal falta de sentido também transparece na fala de alguns professores, como vemos a seguir: “Professora Tatiana: quando vocês estavam falando me ocorreu o seguinte: a gente precisa do outro pra viver. E a escola não é nada sem o aluno, e o aluno também precisa do professor, pra ter uma direção. Eu acho que as vezes a internet propõe um isolamento. As pessoas ficam com celular e fone de ouvido. Ninguém esta disposto a ouvir e conversar. Essa prática tem mudado bastante. E eu acho isso muito perigoso, porque pra você viver numa sociedade bacana você precisa se relacionar com as pessoas. Às vezes as pessoas querem ouvir só o que agrada. Não tem muita paciência pra prestar atenção. E eu acho que o ouvir é o grande lance. Você saber ouvir o outro. Como você vai confiar numa pessoa? Pra confiar você precisa saber ler o colega.” (Diário de Campo 25/3 e 1/4/2015). Esta fala da professora de ciências nos faz refletir sobre sua percepção sobre a escola. A professora deixa entender que para ela a escola é um espaço de socialização (no sentido de estar junto de outras pessoas), sobrepondo-se à um local onde o professor faz a mediação do conhecimento.
  • 40. 40 Não queremos aqui desmerecer o papel da tecnologia e da internet na aprendizagem, porque entendemos que ela deve sim estar presente nesse processo como complemento e gerador de discussões. No entanto, defendemos a necessidade dos alunos reconhecerem que a escola proporciona um saber diferenciado, visto disseminar o conhecimento formal que dificilmente o aluno é capaz de aprender em outro espaço. É o conhecimento formal ou escolarizado que promove um salto no desenvolvimento do pensamento, assim como as demais funções psicológicas superiores, fazendo com que o sujeito seja capaz de pensar muito além da realidade concreta e possa desenvolver sua liberdade. Para Vigotski (1931/2006), o conceito de liberdade relaciona-se à lógica de que quanto mais o sujeito conhece maiores serão suas possibilidades de ser livre. E um dos principais meios de apropriação do social é através do conhecimento. O desenvolvimento do pensamento por conceito, característico da fase da adolescência e que é base para o desenvolvimento da liberdade, só será desenvolvido pela apropriação dos conceitos formais que dará suporte para o sujeito significar a realidade a partir de uma outra perspectiva (Vigotski, 1931/2006). 5.2. MODO DE RELAÇÃO: PROFESSOR-ESCOLA 5.2.1. A ESCOLA IDEAL X A ESCOLA REAL A escolha de um curso de graduação está diretamente ligada à ideia da escolha por uma profissão. Qualquer que seja essa escolha, ela está permeada por motivações provenientes de várias dimensões. Toda e qualquer motivação está sujeita a alterações, ainda mais quando se passa por um processo de aquisição de conhecimentos, experiências,
  • 41. 41 vivências e reflexões, aspectos que possibilitam a elaboração e reelaboração dessas motivações. Tais elaborações e reelaborações permitem o desenvolvimento de uma consciência crítica em relação a tudo o que nos cerca, profissional e pessoalmente. Dessa forma, é possível entender que essa consciência desenvolvida a partir desse processo irá permear e conduzir nossas ações (Venancio, 2014). A idealização faz parte, inicialmente, do processo de escolha de uma profissão. Porém, essa idealização deveria dar lugar à realidade, na medida em que o indivíduo se insere e passa a trabalhar e modificar sua consciência em relação a essa profissão. Contudo, percebemos que as professoras e também a coordenadora da escola onde realizamos este estudo, apresentam um discurso sustentado muito mais no âmbito da idealização do que no contexto da realidade. Em nossas intervenções na escola, que se sustentam na parceria com seus profissionais, uma das ações primordiais é receber e integrar em nossas atividades os professores que demonstrassem o desejo de participar. No caso desta pesquisa, em todas as atividades tivemos a companhia da professora responsável pela turma no horário que nos foi disponibilizado, e muitas vezes também a de outros professores que teriam o horário vago e até mesmo da coordenadora da escola. Os resultados de nossas intervenções nos fizeram pensar que a percepção dos professores sobre a escola parece, grande parte das vezes, polarizada, no sentido de que ora a escola é vista como um espaço ruim, como instituição que se encontra submetida a toda sorte de influências negativas e, portanto, sem saída ou impossibilitada de superar essas mesmas condições, ora ela é idealizada e percebe-se uma visão romântica, bastante distante da realidade, com um romantismo exacerbado, como apresentamos abaixo:
  • 42. 42 “O que eu mais gosto da escola é que eu to com gente nova que me deixa nova. Vocês são responsáveis pelo meu pensamento não envelhecer. O que eu não gosto. Eu vou chorar... É da agressividade que tem na escola. Então pra mim a pichação é uma agressividade, as brigas, a resposta dura é agressividade. Onde tem gente com cabeça legal não tinha que ter isso. Outra coisa que eu também não gosto da escola e que é cada vez mais presente: a droga. Eu acho que a vida da gente é tão curta e não tem nada que deixar a vida mais curta. Isso eu não gosto da escola. O que eu acho da escola. A escola é um ponto que a gente se reúne, que a gente troca experiências, que faz com que a gente perceba que o mundo é maior do que dentro de casa, e que o mundo tem que ser maior do que a escola. Eu tento fazer com que eu enquanto professora, mostre pra vocês que até a 8ª serie, a gente cuida muito de vocês, tem um carinho enorme por vocês, mas que as etapas da vida vão mudando e acho que a escola proporciona isso.” (Fala da professora Joana sobre o que gosta e o que não gosta na escola - Diário de Campo 11/3/2015). Percebemos nessa fala tal contradição: se a escola é o melhor lugar do mundo, qual a origem de tanto sofrimento e desmotivação? Por que as pessoas que a frequentam não cuidam do espaço físico? Qual o motivo de tantas greves e milhares de pedidos de melhorias? Essa idealização Tal romantização é presente também aparece em outras em muitas falas das professoras: “O mais legal também de ser professor é o fator social. O que eu aprendi é uma judiação ficar só comigo e se eu aprendi isso eu posso proporcionar isso pra alguém pra que esse conhecimento seja dividido e fazer com que pra vocês isso tenha uma função.” (Fala da professora Joana - Diário de Campo 11/3/2015).
  • 43. 43 “O que eu acho da escola. É o futuro de todo mundo, senão ela não existiria até hoje.” (Fala da coordenadora Adriana - Diário de Campo 11/3/2015). “O que eu acho da escola. Eu gosto daqui, tanto que eu voltei. Eu estava fora da escola e acabei voltando, não fui pra nenhuma outra escola. Eu gosto daqui, eu gosto da comunidade, eu gosto dos alunos. Acho que vocês, apesar dos problemas que alguns tem fora da escola, a gente acaba se envolvendo, vocês são muito próximos da gente. Eu me sinto próxima de vocês” (Fala da professora Isadora - Diário de Campo 17/3/2015). Estas falas nos apresentam um discurso completamente voltado para a idealização e amor incondicional da profissão de professor e de suas implicações. Observamos nesses recortes de falas o amor pela escola, a idealização da docência sustentada por um suposto amor necessário ao seu exercício e o discurso de que a escola é a única possibilidade de futuro, porém não encontramos nessas falas, ou em outros momentos de nossas observações, uma reflexão crítica sobre as reais condições que a caracterizam, e nos perguntamos sobre o que estaria na base desse modo de pensar a escola pelos professores e como estas concepções afetam suas práticas pedagógicas e a relação com os alunos. em momento algum uma crítica real, ou mesmo uma reflexão, a todo o sofrimento que acompanha essa profissão. Em atividade desenvolvida em uma das intervenções pedimos que todos (alunos e professores) desenhassem algo que os remetessem à escola e a seus sentimentos em relação a ela, e depois falassem sobre o desenho. Eis as produções das professoras e suas reflexões e explicações acerca dos desenhos:
  • 44. 44 (Desenho da Professora Joana - Diário de Campo - 25/3 e 1/4/2015). “Tudo ai é meio representativo. Eu pensei em fazer a escola, não só como uma estrutura essencial da vida, mas a escola pro mundo. A bola então é a Terra. E os caminhos que ligam essa escola pra terra, podem ser coloridos, mas nem sempre é o caminho mais reto. É um caminho as vezes de idas e voltas. O livro eu pensei: o que pode representar o conhecimento do mundo. O livro. É que eu sou do século passado. Os meninos iam desenhar um celular, um computador, algo assim. Então é um menino que olha pro conhecimento do mundo e ele só pode estar ai pela escola. Os fios emendam a escola com o mundo. Não são coisas separadas. É uma coisa pra outra.” (Professora Joana - Diário de Campo 25/3 e 1/4/2015).
  • 45. 45 (Desenho da Professora Tatiana - Diário de Campo - 25/3 e 1/4/2015). “Professora Tatiana: a escola pra mim tem tudo a ver com o amor. Irracional até, não é muito racional não. Escola pra mim é tudo. O que eu amo. Faz todo sentido pra mim. Porque através da escola eu me desenvolvi como pessoa, ainda me desenvolvo. E o principal é que eu acho que a escola é um lugar democrático. A democracia, a liberdade, você poder ter chance de desenvolver seu pensamento, sua convivência. Eu gosto demais da escola.” (Professora Tatiana - Diário de Campo 25/3 e 1/4/2015).
  • 46. 46 Aqui está presente, novamente, a idealização da profissão de professor, representada como um coração e verbalizada como um “amor irracional”, o que não condiz com o que presenciamos e ouvimos nos relatos de professores. Esta atitude pode ser uma forma de sobrevivência na profissão, mas que aliena o sujeito e o impede de lutar a favor de mudanças. Entendemos que os modos de relação dos professores com a escola, ou seja, a forma como os professores percebem e vivenciam a escola é fonte de configuração de sentido da escola para os alunos. Assim sendo, entendemos a grande necessidade de compreender as percepções dos professores sobre o contexto escolar para desvendarmos a percepção dos alunos sobre os modos de relação na escola. Percebemos, pelas falas dos alunos, e também por seus desenhos, que a escola ora é vista como um espaço muito idealizado ora como algo sem sentido ou que não tem mais solução. Encontramos nos desenhos dos alunos uma fala extremamente polarizada quanto ao sentido atribuído à escola, assemelhando-se ao movimento apresentado pelas professoras no início da análise desta categoria:
  • 47. 47 (Desenho de Bianca, 14 anos - Diário de Campo 25/3 e 1/4/2015). Bianca apresenta a escola envolta por corações, em dissonância com sua fala de que não gosta do que acontece ao redor da escola, que é o uso de drogas. Entretanto, não manifesta uma visão crítica às drogas, apenas algo que a incomoda em função do cheiro, ou seja, fica no âmbito do sensível: “Eu não gosto... não sei... de menino que fica fumando maconha atrás da escola, porque é ruim o cheiro” (aluna Bianca quando questionada sobre o que não gosta na escola - Diário de Campo 17/3/2015). Em contraponto ao “idealismo” ou alienação manifesta no desenho e fala do desenho de Bianca encontramos o “negativismo” de Leandro e Bernardo, que desenham a escola pegando fogo e com forma de presídio, respectivamente:
  • 48. 48 (Desenho de Leandro, 14 anos - Diário de Campo 25/3 e 1/4/2015). “Que a escola parece uma cadeia. Por mim eu colocava fogo. Não é que eu não gosto, é que parece uma cadeia mesmo. Essas grades. A gente quer beber água e o portão está fechado. A gente tem aula vaga e não pode ir lá fora.” (Aluno Leandro falando sobre seu desenho - Diário de Campo 25/3 e 1/4/2015).
  • 49. 49 (Desenho de Bernardo, 14 anos - Diário de Campo 25/3 e 1/4/2015). (Desenho de Julia, 13 anos - Diário de Campo 11/3/2015).
  • 50. 50 “Professora Joana: pelas cores, o fundo escuro e o vermelhão, o coração ta em evidencia, em destaque. Ta tão pintado, tão forte, que parece que os contornos que ela da pra esse desenho, é como se a intenção de dar movimento pra ele. Por esse motivo eu acho que a Julia gosta da escola. Mas não é um coração único, ele é transpassado. Eu não sei se é um amor intenso ou se é um amor dolorido, porque da flecha. A flecha foi pintada com um outro material que da um certo brilho, que lembra sangue. Então dai eu fiquei entre, ela vê coisas muito boas, mas não deixa de ser um certo sofrimento. Julia: [chora] é exatamente isso. Como ela falou da outra vez a escola é boa, mas depende dos alunos. A escola faz o aluno e o aluno faz a escola. Então a aula depende dos alunos. Igual na aula da professora Tatiana, eu pedi pros alunos pararem, e eles não pararam. A professora fica triste. Só que não tem como a professora falar alguma coisa porque ai o aluno vai ficar com raiva. Só que eu acho que ela fica triste. Foi mais por isso também.” (Diário de Campo 11/3/2015). O desenho de Julia nos mostra mais uma vez uma idealização da escola, que é representada por um coração, assim como o desenho da professora Tatiana. O desenho da aluna também se contradiz com sua fala, que aponta muito mais coisas negativas do que positivas na escola. Em momento algum, seja nos desenhos ou nas falas, tanto de alunos quanto de professores, encontramos a representação de uma escola possível. A imaginação se desenvolve intensamente com as experiências dos indivíduos, ou seja, é a partir das experiências dos sujeitos que a imaginação é capaz de se desenvolver, e, dialeticamente, essa imaginação possibilita que eles experimentem novas experiências na medida em que o sujeito torna-se capaz de imaginar a escola a partir desta ótica tão polarizada (ora como o melhor lugar ora como o pior lugar para se permanecer) não
  • 51. 51 favorece uma síntese possível do que ela poderia ser. Deste modo, parece que não há um espaço para imaginar uma escola possível, real, que integrasse tanto seus aspectos positivos quanto negativos e que favorecesse horizontes para uma transformação. Neste sentido, vemos a necessidade da criação de um espaço em que a imaginação dos alunos e professores possa ser desenvolvida a fim de conseguirem visualizar uma escola real, possível. Segundo Vigotski (1930/2010), a imaginação é regida por quatro leis, sendo que a segunda indica que ela se relaciona com situações que ele não vivenciou até então, ao combinar e recombinar elementos de vivências passadas. Entendemos aqui que a imaginação desses adolescentes poderia ser usada para a construção de uma escola possível, sem que acontecesse o que vimos: um romantismo ideológico, indiferença ou fatalismo - nada é possível. Dessa forma, podemos supor que os alunos não possuem a experiência de como poderia vir a ser uma escola próxima ao ideal, porém possível, o que nos leva a concluir que eles reproduzem a visão polarizada de educação que nos foi exibida pelos professores e coordenadora. Neste sentido, há muitas questões complexas que guiam a percepção de alunos e professores sobre os modos de relação na escola, o que exige um aprofundamento e um olhar para toda a complexidade presente no contexto escolar, em especial no que tange às salas de recuperação.
  • 52. 52 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS Este estudo teve como objetivo identificar e analisar a percepção de alunos e professores do 8º ano do Ensino Fundamental sobre as relações estabelecidas na escola e o papel da imaginação na promoção de diferentes modos de se relacionar. Percebemos durante a realização desse trabalho que a escola vem perdendo sentido para os alunos, que não sabem porque estão em uma sala de recuperação, a qual deveria ser um espaço para que os alunos que possuem alguma dificuldade de aprendizagem pudessem ser melhor atendidos pelos professores e alcançar o nível de aprendizagem esperado para cada ano/série. Observamos que a própria gestão e o corpo docente não têm um suporte legislativo para guiar e pautar suas atuações com os alunos no que concerne à recuperação. Dessa forma, a sala de recuperação parece mais um espaço de exclusão de alunos que por algum motivo não têm o mesmo desempenho aproveitamento escolar dos demais, aspecto que é a todo momento apontado e reforçado pelos alunos e profissionais da escola. A questão do conhecimento, central aos objetivos da educação escolar, não encontra-se como preponderante na percepção de alunos e professores sobre a escola. Os alunos reproduzem um comportamento mais cotidiano na escola, como a questão das pichações, não atingindo desenvolvendo formas ideias de desenvolvimento que deveriam permear a prática escolar - como, por exemplo, o domínio da língua culta. O que parece guiar a percepção de alunos e professores sobre as relações na escola é sua contribuição como um espaço de socialização, de aprendizado pelas e com as diferenças. O conhecimento em si foi pouco citado pelos alunos e professores.
  • 53. 53 Concomitante a isto, ressaltamos a polarização presente na percepção de alunos e professores sobre a escola. A visão romantizada da escola concorre simultaneamente com a visão da escola como estática, sem possibilidades de transformação, sem solução ou esperança, percepção esta que promove certa estagnação das ações na escola. Neste sentido, vemos a importância de mais trabalhos que focalizem a percepção de professores e alunos sobre o contexto escolar a partir de uma visão contextualizada de ensino e de educação, visto a complexidade que tal temática apresenta. Em especial com o tema da classe de recuperação, encontramos poucos estudos na psicologia e na educação que pudessem oferecer subsídios teóricos e práticos para compreender tal realidade. Também, acreditamos ser importante uma melhor regulamentação em relação as salas de recuperação, uma vez que encontramos muitas falhas nas leis existentes que dão brechas para que erros sejam cometidos. Não queremos ter uma fórmula pronta para a formação dessas turmas, já que acreditamos que as individualidades devem ser levadas em conta, mas entendemos que há a necessidade de apontamentos que norteiem o trabalho da equipe com os alunos.
  • 54. 54 7. REFERÊNCIAS Aguiar, W. M., Bock, A. M., & Ozella, S. (2007). A orientação profissional com adolescentes: Um exemplo de prática na abordagem sócio-histórica. In: A. M. Bock, M. D. Gonçalves, O. Furtado, & (Orgs.), Psicologia Sócio-Histórica (Uma perspectiva crítica em psicologia) (pp. 163-178). São Paulo: Cortez. Bock, A. M. B. (2007). A adolescência como construção social: estudo sobre livros destinados a pais e educadores. Revista da Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional, ABRAPEE, v.2, n.1, p.63-76. Bordignon, J. C.; Souza, V.L.T. (2011). O papel dos afetos nas relações escolares de adolescentes. Revista Perspectivas em Psicologia, v.15, p. 132-144. Barbosa, E. T. (2012). Os sentidos do respeito na escola: uma análise da perspectiva da psicologia histórico-cultural. Dissertação de Mestrado, Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Programa de Pós Graduação em Psicologia, Campinas. Brasil. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 20 dez. 1996. Cavani, M. L. G.; Souza, V. L. T. (2014). Histórias de Adolescentes: um estudo sobre a imaginação no contexto escolar. Relatório de Iniciação Científica (não publicado), Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Programa de Pós Graduação em Psicologia, Campinas. Recuperado em 22 de junho de 2015. Obtido em:< http://pt.slideshare.net/julianajsj/marlia-luiza-galante-cavani>
  • 55. 55 Checchia, A. K. A. (2010). Adolescência e escolarização numa perspectiva crítica em psicologia escolar (1ª ed.). Campinas – SP: Editora Alínea. Dér, L. C., & Ferrari, S. C. (2000). Estágio da Puberdade e da Adolescência. In: e. Laurinda Ramalho de Almeida, Henri Wallon- psicologia e educação (pp. 59-70). São Paulo: Edições Loyola. Delari Jr., Achilles (2011). Questões de método em Vigotski – busca da verdade e caminhos da cognição. Umuarama. Mimeo. 16p. [texto didático em formato de artigo sistematizando e ampliando o conteúdo dos slides de nov. 2010]. Dugnani, L. A. C. (2011). Os sentidos do trabalho para o orientador pedagógico: uma análise da perspectiva da psicologia histórico-cultural-. Dissertação de Mestrado, Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Programa de Pós Graduação em Psicologia, Campinas. Jesus, J. S.; Souza, V. L. T. (2012). Medicalização na escola: uma nova forma de exclusão?. Relatório de Iniciação Científica (não publicado), Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Programa de Pós Graduação em Psicologia, Campinas. Recuperado em 22 de junho de 2015. Obtido em: <http://pt.slideshare.net/julianajsj/medicalizao-na-escola>. Jesus, J. S.; Souza, V. L. T. (2013). Afinal, o que é dificuldade de aprendizagem? Um estudo sobre os sentidos atribuídos por professores do Ensino Fundamental. Relatório de Iniciação Científica (não publicado), Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Programa de Pós Graduação em Psicologia, Campinas. Recuperado em 22 de junho de 2015. Obtido em:< http://pt.slideshare.net/julianajsj/afinal-o-que-dificuldade>.
  • 56. 56 Meira, M. E. M. (2009b, novembro). Saúde mental e educação: o psicólogo como mediador no desenvolvimento de práticas educativas transformadoras [Versão eletrônica]. Anais do XV Encontro Nacional da Associação Brasileira de Psicologia Social, Maceió, AL, Brasil. Oliveira, M. C. S. L. (2006). Identidade, narrativa e desenvolvimento na adolescência: uma revisão crítica. Psicologia em Estudo, Maringá, v.11, n.2, p.427-436, mai/ago. Resolução SE nº 02, de 12 de janeiro de 2012 (2012). Dispõe sobre mecanismos de apoio escolar aos alunos do ensino fundamental e médio da rede pública estadual. Recuperado em 22 de junho de 2015. Obtido em:< http://siau.edunet.sp.gov.br/ItemLise/arquivos/02_12.HTM?Time=1>. Resolução SE nº 53, de 02 de outubro de 2014 (2014). Dispõe sobre a reorganização do ensino fundamental em regime de progressão continuada e sobre os mecanismos de apoio escolar aos alunos dos ensinos fundamental e médio das escolas estaduais. Recuperado em 22 de junho de 2015. Obtido em:< http://siau.edunet.sp.gov.br/ItemLise/arquivos/53_14.HTM?Time=01/11/2014%2020:3 5:28>. Venancio, M. M. R. (2014). A formação psico-educacional em questão: a dimensão ética e estética na promoção da humanização [Tese de Doutorado em andamento]. Vigotski, L.S. (2007) A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. Organizadores Michel Cole et. al., tradução José Cipolla Neto, Luís Silveira Menna Barreto, Solange Castro Afeche. 7ª ed. São Paulo, SP: Editora Martins Fontes. (Original publicado em 1935).
  • 57. 57 Vigotski, L. S. (2010). Imaginação e criação na infância. (1ªedição). São Paulo, SP: Editora Ática. (original publicado em 1930). Vygotski, L.S. (2006) Obras Escogidas Tomo IV. Madrid, Espanha: Visor. (Original publicado em 1931). Vigotski, L.S. (2001) Psicologia da Arte. Tradução Paulo Bezerra. São Paulo: Martins Fontes. (original publicado em 1925). Vigotski, L. S. (2004). Teoria e Método em psicologia. São Paulo: Martins Fontes. (original publicado em 1927). Vygotsky, L. S. (1991). Pensamento e Linguagem (3°ed.). São Paulo: Martins Fontes. (Original publicado em 1934).
  • 58. 58 8. ANEXOS 8.1. ROTEIRO DE OBSERVAÇÃO - Como eles se comportam em sala? Conversam entre eles, fazem perguntas ao professor, conversam com o professor... - O que os alunos fazem durante a explicação do professor? - Como os alunos se relacionam entre si? - Como se dá a relação entre professor-aluno? - Qual a conduta do professor frente à sala? - Há gritaria ou falta de respeito entre professor e alunos? - Qual a relação dos alunos com as atividades e conteúdos passadas pelo professor? - De que modo a imaginação aparece nas aulas? - Os alunos saem com frequência da sala? Sozinhos? - Há diferença no comportamento dos alunos em diferentes espaços da escola? - Em que momentos os alunos se utilizam mais de gestos para se comunicarem? - Em que momentos os alunos se utilizam mais de palavras para se comunicarem? Que tipo de palavras utiliza? - Sobre o que os alunos conversam? - Quais são os conflitos existentes e como são resolvidos?
  • 59. 59 8.2. ROTEIRO DE ENTREVISTA - Nome e Idade - Em qual bairro você mora? - Com quem você mora? - O que fazem seus pais? - O que você mais gosta da escola? Porque? - O que você menos gosta da escola? Porque? - O que você acha da escola? - Como é a dinâmica em sala de aula? Vocês conversam? Se sim, sobre o que e como conversam? - Fora de sala, o que vocês gostam de fazer na escola? - As conversas dentro e fora de sala de aula são as mesmas? - O que os professores falam do comportamento de vocês em sala? - O que faz quando não está na escola? - O que mais gosta de fazer? - Tem computador em casa? - Tem smartphone? Como vocês o usam? Para conversar? - Ouve música? De que tipo? Com que frequência ouve? Quando ouve? - Canta ou gosta de cantar? Que tipo de música? Onde canta? - Porque você está nesta sala? - Como é para você estar nesta sala?
  • 60. 60 8.3. DIÁRIOS DE CAMPO 8.3.1. 18/NOV/2014 Ao chegar à escola fui levada diretamente até a sala do 8º ano, que já esperava Pesquisadora 1. A atividade seria conduzida por ela, e consistia na apresentação das músicas que os alunos haviam escolhido para a montagem de um CD. A sala é inteira pichada com palavras que não entendo, inclusive as carteiras. Nas paredes leio: “salve -” e “às vezes acho que a sina de todo homem pegador é se perder em diversas paixões atrás do amor!!!” - trecho da música “ela chora” do Projota. Meninos e meninas ficam separados na aula. Ao entrarmos em sala a professora pede que um menino feche a porta, mas Pesquisadora 1 se antecipa, e mesmo assim a professora agradece ao menino. Durante todo o encontro, apesar de prestarem muita atenção à Pesquisadora 1, grande parte dos alunos mexia no celular e conversava. Após a turma começar a se dispersar e as conversinhas passarem a atrapalhar a atividade, uma das garotas sentada ao fundo grita pedindo que os colegas fiquem quietos. A professora está a todo o momento envolvida na atividade, conversando com Pesquisadora 1 sobre as músicas e pedindo que os alunos permaneçam em silêncio. Durante a atividade alguns alunos deitam nas carteiras, muitas risadas são ouvidas, mas a grande maioria tenta descobrir quem escolheu cada música - mais intensamente quando é uma música romântica. A conversa e as risadas aumentam cada vez mais e outros alunos passam a gritar pedindo silêncio. Para isso utilizam de palavrões e formas grosseiras de falar. Em determinado momento começa a tocar a música “retrato de um playboy” de Gabriel, o Pensador: Pergunta prum playboy o que ele pensa da vida. Sabe o que ele te diz? Nada. Ele baixa a porrada É mais ou menos assim: Sou playboy e meto porrada Eu dou porrada, eu enfio a porrada
  • 61. 61 Só ando com a galera e bato nos mané Mas quando eu tô sozinho eu só bato nas mulhé Eu pego muita gata no mata-leão "É isso aí, meu cumpádi, my brother, meu irmão!" Se alguma coisa tá na moda, eu faço também Eu tenho um pitbull chamado Bush Hussein O Bush é pitbull mas eu sou mais ainda Arranquei a orelha de uma lora burra linda Tinha um cara dançando com essa mulhé na boate Então pensei: "tá na hora do combate" E falei: "tu pisou no meu pé, meu irmão!" Ele disse que não; eu dei logo um socão Ele foi pro hospital e ela veio me dar mole Eu pedi um chope, ela me pediu um gole Me levou pro motel, vou te contar um segredo: Quando ela tirou a roupa eu fiquei até com medo Veio me beijando e chamando de gostoso Veio me abraçando e eu fiquei meio nervoso Veio se esfregando e eu fiquei com nojo dela Mandei um mordidão e um chute na costela! Sou playboy, filhinho de papai Eu tenho um pitbull e imito o que ele faz Sou playboy, filhinho de papai Eu era um debilóide, fiquei ainda mais O papai e a mamãe me dão do bom e do melhor E quando eles viajam eu fico com a vovó Papai é meio ausente, eu sou meio carente Mas se falar do meu papai cê vai ficar sem dente Já sou bem grande, já sei me virar Sei até dirigir, só não aprendi a conversar Eu não discuto, eu chuto! Eu não debato, eu bato! Não sei bater papo mas resolvo no sopapo Eu entro no meu carro e o pedal vai no chão "Olha o cara ultrapassando, pisa aí meu irmão!" O cara me encarou, aí eu dei uma fechada Peguei o extintor e parti pra porrada Sai de baixo, que eu sou muito macho Eu sou muito macho, pelo menos eu acho Macho não vacila, macho arrasa Macho não leva desaforo pra casa Macho é isso, não brinca em serviço Macho é robusto, macho é roliço Macho é parrudo, macho é pescoçudo Macho é poderoso, macho é tudo! Macho é o que há! E eu gosto muito rapaz! Macho é lindo, macho é demais! Eu sou igual aquele cara do casseta Me excito mais com uma boa briga do que com uma boate Lotada de gata Se não tiver porrada, a noitada não tem graça
  • 62. 62 Aí é melhor trabalhar... Os músculos, né? Malhar é melhor do que mulher Por falar em malhar, me lembrei da Maria Aquela popozuda que eu peguei na academia Levei ela pra praia e fiquei amarradão: A isca perfeita pra arrumar confusão Um cara olhou pras suas coxa e ficou com a cara roxa Outro olhou pras suas costa e levou fratura exposta A Maria se amarrou no meu show Mulher adora essas coisa, brôu É até engraçado Tô na delegacia, encarando o delegado Eu não decido nada, tô esperando o advogado Papai já tá chegando pra deixar tudo acertado Dei até entrevista, vou sair na TV Que maneiro, eu adoro aparecer E na hora da foto, eu fiz cara de mau Amanhã minha galera vai me ver no jornal ae Eu sou igual aquele cara do casseta Me excito mais com uma boa briga do que com uma boate Lotada de gata Se não tiver porrada, a noitada não tem graça Aí é melhor trabalhar... Os músculos, né? Malhar é melhor do que mulher Por falar em malhar, me lembrei da Maria Aquela popozuda que eu peguei na academia Levei ela pra praia e fiquei amarradão: A isca perfeita pra arrumar confusão Um cara olhou pras suas coxa e ficou com a cara roxa Outro olhou pras suas costa e levou fratura exposta A Maria se amarrou no meu show Mulher adora essas coisa, brôu É até engraçado Tô na delegacia, encarando o delegado Eu não decido nada, tô esperando o advogado Papai já tá chegando pra deixar tudo acertado Dei até entrevista, vou sair na TV Que maneiro, eu adoro aparecer E na hora da foto, eu fiz cara de mau Amanhã minha galera vai me ver no jornal ae Esse é o retrato da nossa gente fina Seja lá no açaí ou ali na cocaína É assim que cuidamos do futuro do Brasil A que ponto nós chegamos, hein! Puta que o pariu!! Essa música parece ser muito significativa para os modos como esses adolescentes se relacionam.
  • 63. 63 De forma geral a professora parece ter controle sobre a sala e é bem respeitada pelos alunos. A professora pergunta ao menino que escolheu a música do rapper o que ele entende da música. Nesse momento outro aluno assume a fala e fiz que “bater é zoeira de amigo”. O menino que escolheu a música diz que a maior parte das coisas que Gabriel, O Pensador fala é verdade, e que playboy é quem tem dinheiro. - surge aqui a questão da desigualdade social. Os alunos começam a conversar cada vez mais alto, porém, devido ao barulho vindo do pátio e a música na sala, se tornou impossível entender do que se tratavam as conversas. Uma menina grita “cala a boca esse grupo aí, vocês só atrapalham”. A professora pede que o grupo se separe e Rafael se irrita. Começa então a tocar “eu não pedi pra nascer” do Facção Central. A música é muito pesada e a professora fica meio assustada com a letra. Durante essa música todos ficaram em silêncio prestando atenção na letra. Minha mão pequena bate no vidro do carro No braço se destacam as queimaduras de cigarro, a chuva forte ensopa a camisa e o short Qualquer dia a pneumonia me faz tossir até a morte Uma moeda, um passe me livra do inferno, me faz chegar em casa e não apanhar de fio de ferro O meu playground não tem balança, escorregador, sua mãe Vadia perguntando quanto você ganhou Jogando na cara que tentou me abortar, que tomou umas 5 injeções pra me tirar Quando eu era nenê tentou me vender uma pa de vez, quase fui criado por um casal inglês Olho roxo, escoriação, porra, que foi que eu fiz? em vez de tá brincando tá colecionando cicatriz Porque não pensou antes de abrir as pernas, filho não nasce pra sofrer não pede pra vir pra Terra. O seu papel devia ser cuidar de mim, cuidar de mim, cuidar de mim não espancar, torturar, machucar, me bater, eu não pedi pra nascer O seu papel devia ser cuidar de mim, cuidar de mim, cuidar de mim Não espancar, torturar, machucar, me bater, eu não pedi pra nasce Minha goma é suja, louça sem lavar, seringa usada, camisinha em todo lugar Cabelo despenteado, bafo de aguardente é raro quando ela escova os dentes Várias armas dos outros muquiadas no teto, na pia mosquitos, baratas, disputam os restos Cenário ideal pra chocar a UNICEF, Habitat natural onde os assassinos crescem Eu não queria Playstation nem bicicleta, só ouvir a palavra "filho" da boca dela
  • 64. 64 Ouvir o grito da janela "A comida tá pronta", não ser espancado pra ficar no farol a noite toda Qualquer um ora pra Deus pra pedir que ele ajude, dê dinheiro, felicidade, saúde Eu oro pra pedir coragem e ódio em dobro pra amarrar minha mãe na cama por querosene e meter fogo O seu papel devia ser cuidar de mim, cuidar de mim, cuidar de mim não espancar, torturar, machucar, me bater, eu nao pedi pra nascer O seu papel devia ser cuidar de mim, cuidar de mim, cuidar de mim não espancar, torturar, machucar, me bater, eu nao pedi pra nascer Outro dia a infância dominou meu coração, gastei o dinheiro que eu ganhei com um álbum do Timão Queria ser criança normal que ninguém pune, que pula amarelinha, joga bolinha de gude Cansei de só olhar o parquinho ali perto, senti inveja dos moleque fazendo castelo Foda-se se eu vou morrer por isso, Obrigado meu Deus por um dia de Sorriso A noite as costas arderam no coro da cinta, tacou minha cabeça no chão Batia, Batia, me fez engolir figurinha por figurinha Espetou meu corpo inteiro com uma faca de cozinha Olhei pro teto vi as armas num pacote, subi na mesa catei logo a Glock Mãe, devia te matar mas não sou igual você, invés de me sujar com seu sangue eu prefiro morrer....Bum! O seu papel devia ser cuidar de mim, cuidar de mim. Não me espancar, torturar, machucar me bater, eu não pedi pra nascer. O seu papel devia ser cuidar de mim, cuidar de mim. Não me espancar, torturar, machucar me bater, eu não pedi pra nascer. Segundo os alunos essa música fala do papel da mãe, de uma realidade. Observei também que muitas das músicas falam sobre Deus, e que grande parte dos alunos sabiam essas letras. Já mais para o final da aula percebo que os alunos começam a ficar mais apáticos, e os que antes reclamavam do barulho excessivo agora ficam quietos. Um aluno chega a dormir mesmo. Demora para acordar quando a professora chama. A maioria dos alunos parece gostar de rap e cantam a última música juntos. A música cita o rapper Tupac, e os alunos contam um pouco do que sabem sobre ele. Em pesquisa que fiz encontrei que a maioria de suas canções trata sobre como crescer no meio da violência e da miséria nos guetos, o racismo, os problemas da sociedade e os conflitos com outros rappers. Tupac foi assassinado em setembro de 1996 com quatro tiros.