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Peres VLA & Martins LRR
Rev. Psicopedagogia 2012; 29(90): 320-9
320
ARTIGO ORIGINAL
RESUMO – Os autores fazem uma reflexão sobre a produção subjetiva
da violência nas escolas, sabidamente envolvida, de forma recursiva e
contraditória, com a subjetividade social. Orientados pela Epistemologia
Qualitativa analisam informações construídas no estágio básico de alunos
de psicologia escolar da Pontifícia Universidade Católica de Goiás e, como
resultado, apresentam o indicador de que as políticas públicas, para serem
efetivas, precisam responder às necessidades singulares da escola e serem
inseridas em uma ética da responsabilidade, isto é, provocarem o respeito
às diferenças e a participação ativa dos sujeitos nos seus processos de
aprendizagem e de desenvolvimento.
UNITERMOS: Políticas públicas. Educação. Violência. Subjetividade.
Correspondência
Vannúzia Leal Andrade Peres
Rua T 37, Quadra, 128, Lote 11B, Ed. Bragança,
Apto. 1001 – Setor Bueno – Goiânia, GO, Brasil –
CEP 74230-020
E-mail: vannuzia@terra.com.br
Vannúzia Leal Andrade Peres – Professora da Pontifícia
Universidade Católica de Goiás (PUC-GO), Doutora
em Psicologia e Pós-doutoranda em Educação pela
Uni­­­versidade de Brasília (UnB), Brasília, DF, Brasil.
Luiz Roberto Rodrigues Martins – Especialista em
Políticas Públicas, trabalha no Ministério da Educação
(DEAVE/SECADE) e faz Doutorado em Educação na
Universidade de Brasília (UnB), Brasília, DF, Brasil.
A produção subjetiva da violência
nas escolas: indicador de sentido para
avaliação e desenvolvimento de
política educacional
Vannúzia Leal Andrade Peres; Luiz Roberto Rodrigues Martins
A produção subjetiva da violência nas escolas
Rev. Psicopedagogia 2012; 29(90): 320-9
321
INTRODUÇÃO
Já não é mais novidade que a violência nas
escolas é um fenômeno mundial.
Para isso é só observar as notícias veiculadas
nos meios de comunicação de massa, especial-
mente a televisão. O problema é que pouco se­­­­­­
sabe como essa violência é constituída na reali-
dade social das diferentes escolas ou como estaria
envolvida com as produções subjetivas de dife-
rentes crianças, adolescentes e seus professores
sobre essa realidade.
Em uma abordagem complexa e subjetiva
do psiquismo humano1
, o primeiro passo para a
explicação dessa problemática é uma análise de
como o sistema econômico, o sistema político-­
social e as ideologias vigentes estão sendo me-
diados por professores e alunos no cotidiano da
escola. Essa abordagem permite compreender
que os fatos sociais, econômicos e culturais que
constituem a realidade social da escola perpas-
sam pela constituição dos processos psicológicos
de professores e alunos, não de forma imediata,
mas por meio de suas produções subjetivas, que
incluem suas produções cognitivo-emocionais
geradas e expressas no espaço escolar.
Então, podemos perguntar: como o processo
ensino/aprendizagem tem envolvido os profes-
sores e seus alunos na produção subjetiva do
espaço social da escola, que ao mesmo tempo
é seu espaço social de constituição psicológica?
A subjetividade integra dialeticamente o
individual e o social, implicando, para isso, o
sujeito com sua história e o espaço social que
o constitui e que é por ele constituído em um
processo recursivo2
.
O que isso significa, senão que há uma dialé-
tica entre o sujeito e seu espaço social, no qual,
com sua ação, gera sua psique? Nesse aspecto é
necessário refletir sobre a qualidade do diálogo e
da relação dialética entre aqueles que atuam nas
escolas, especialmente professores e alunos, e so-
bre como esses processos podem estar comple­xa
e subjetivamente envolvidos com a constituição
e a expressão da violência entre eles.
Ao articular emoções, processos simbólicos
e significados, para a compreensão da orga-
nização psicológica do sujeito1-3
desenvolve
outro conceito, o de “sentido subjetivo” que nos
permite ir mais além e fazermos, finalmente, a
seguinte pergunta: que registros complexos das
experiências de relação na escola poderiam estar
envolvidos na constituição psicológica dos alunos
e dos professores e na sua produção subjetiva da
violência?
Entretanto, a ênfase, ainda hoje, é nas funções­
cognitivas mediadas por signos supostamente
internalizados, deixando-se de lado a expressão
simbólico-emocional do sujeito, fruto de sua
imaginação, de sua fantasia e de sua emoção, o
que confere à psique um caráter gerativo e não
reprodutivo1
.
Em síntese, de acordo com esse autor1
pode-
mos dizer que a ênfase no cognitivo, mediado
por aspectos da vida objetiva, de forma direta
e imediata, dificulta o desenvolvimento de um
modelo teórico que explique como as emoções,
os processos simbólicos e os significados estão
articulados na organização psicológica do sujeito
e na sua produção subjetiva de seus cenários
sociais, dentre eles, seu cenário social escolar,
violento, ou não.
Afinal, podemos mesmo dizer que a falta
desse modelo tem dificultado explicar como
o cenário escolar, no qual o foco deveria ser a
aprendizagem e o desenvolvimento do sujeito,
é, ao contrário, palco de produção de violências,
em níveis cada vez maiores.
MÉTODO
Orientados pela epistemologia qualitativa3
e
com o intuito de construir indicador de sentido
da produção da violência nas escolas, analisa-
mos informações organizadas no decorrer da
realização de uma disciplina da área de desen-
volvimento humano, denominada “Estágio Bá-
sico em Psicologia Escolar”, por nós ministrada
em três semestres consecutivos na PUC-Goiás.
A construção do indicador de sentido pos-
sibilita compreender as relações da violência
com o sistema escolar e seu envolvimento com
as produções subjetivas de alunos e professores,
por sua vez envolvidas com a cultura, o momento­
Peres VLA & Martins LRR
Rev. Psicopedagogia 2012; 29(90): 320-9
322
histórico e com as representações sociais do
processo ensino/aprendizagem, presentes em
suas expressões e conflitos relacionais no cená­
rio escolar.
O método qualitativo, fundamentado na epis-
temologia qualitativa para o estudo da subjetivi-
dade, portanto da realidade complexa e sistêmi-
ca do psiquismo humano, permite a construção
e interpretação das informações e a abertura de
novas zonas de sentido do fenômeno1,3
.
Nesse caso, a construção das informações
sobre a organização sistêmica e plurideter-
minada, de escolas conveniadas com a PUC-­
Goiás, abrangeu a abordagem das relações in­­­
terpessoais,­da organização do cenário da sala de
aula, das práticas pedagógicas e da diversidade
dos processos de aprendizagem, dentre outros,
envolvendo a comunicação com professores e
alunos das diferentes escolas, inclusive de es-
colas consideradas tradicionais, com disciplina
rígida e conceitos ainda limitados de aprendi-
zagem e desenvolvimento humano.
Para isso foram feitas, em média, oito visitas
consecutivas dos estagiários de psicologia a cada
escola-campo, momentos esses de observações
interativas seguidas de conversação com alunos
e professores, esta última mediada por atividades
como redação, desenhos, discussão de temas,
análise de filmes, complementação de frases,
con­­­­­­forme disponibilidade e interesse de ambos.
Nesse processo, indo mais além, os estagiá-
rios desenvolveram ações educativas compatí-
veis com a proposta de uma psicologia escolar
cujo foco é a aprendizagem e o desenvolvimento
humano4
, levando em conta a diversidade desses
processos em cada sujeito concreto. Assim vie-
ram ajudar na criação de espaços de reflexão e
de expressão criativa de alunos e professores no
tocante às suas necessidades e motivações para
o processo ensino/aprendizagem.
A construção desse espaço de reflexão e
expressão das necessidades de professores e
alunos, especialmente de adolescentes consi-
derados indisciplinados e incompetentes, teve
como ponto de partida ou como “disparador”,
diferentes instrumentos, por exemplo, a estória
de Ruth Rocha, Quando a Escola é de Vidro, na
qual a autora aborda a problemática da falta de
liberdade de expressão criativa de alunos que
são requisitados a seguir prescrições padroni-
zadas. A metodologia consistiu em os alunos
ouvirem a estória e se expressarem sobre ela de
diferentes formas, o que possibilitou produzirem
novos sentidos subjetivos de sua relação com os
professores e a escola.
Em outra oportunidade foram construídos
espaços lúdicos, nos quais as crianças puderam
expressar criativamente as suas visões da escola
atual e imaginarem outra escola, a “escola dos
sonhos”, ambas concretizadas por meio da ela-
boração de cartazes temáticos, expostos para
discussões abertas e dramatizações.
RESULTADOS
A análise construtivo-interpretativa das infor-
mações permitiu reconhecermos a necessidade
de articularmos dois grandes eixos temáticos
envolvidos com a produção subjetiva da vio-
lência nas escolas: a necessidade do sujeito
de expressar sua singularidade na escola; e a
subjetividade da escola e limitações da política
educacional.
A produção subjetiva da violência nas esco-
las e a necessidade do sujeito de expressar
sua singularidade
Reconhecer o envolvimento da subjetividade
no fenômeno da violência nas escolas afirma o
caráter construtivo-interpretativo da produção
do conhecimento e, portanto, da necessidade
dos pesquisadores articularem os múltiplos
aspectos sociais e psicológicos que compõem a
constituição da realidade escolar3
.
A nossa interpretação da violência expressa
pelos sujeitos nas escolas não prescindiu, con-
tudo, de outros referenciais que perpassaram e
perpassam por nossas experiências e reflexões
teóricas a respeito do tema, por exemplo, a forma
como a nossa sociedade política o tem tratado
ao longo do tempo.
O fato é que a partir de nossa interpretação
da produção subjetiva da violência nas escolas
A produção subjetiva da violência nas escolas
Rev. Psicopedagogia 2012; 29(90): 320-9
323
vislumbramos a possibilidade da abertura de
uma nova “zona de ação” nessa realidade – a
imple­­­­­­mentação de política educacional que via-
bilize a expressão singular dos alunos, isto é, de
seus pensamentos e emoções e, portanto, de sua
diversidade no processo ensino/aprendizagem.
No processo interpretativo das informações,
pudemos inferir sobre elementos que estariam
envolvendo a constituição do psiquismo social
nas escolas, dentre eles a impossibilidade dos
alunos expressarem sua singularidade, já que
são muitas vezes rotulados e reprimidos por
meio de práticas pedagógicas supostamente
autoritárias e despersonalizantes.
Em um primeiro momento, em ambas as
realidades, a da escola pública e a da escola
privada, o que chama a nossa atenção é a deman-
da explicitamente manifesta por um psicólogo
que se compatibilize com os rótulos, com as
prescrições e, portanto, com a dificuldade das
instituições de ensino romperem com a prática
da medicalização da educação, hoje difundida
em larga escala.
Nesse cenário, a discussão sobre a produção
subjetiva de alunos e professores, no processo
ensino/aprendizagem, em cada escola concreta,
não é sequer imaginada.
Assim, torna-se difícil avançar na reflexão
sobre os aspectos cognitivo-emocionais possi­
velmente envolvidos na produção da indiscipli­­­na
e da chamada dificuldade de aprendizagem, tão
presentes nas queixas das escolas e suposta­­­
mente envolvidas na produção subjetiva da
violência entre alunos e professores.
De forma indireta, entretanto, é visível como
as práticas pedagógicas não têm permitido a
diferentes crianças e adolescentes expressa-
rem suas necessidades cognitivo/afetivas nas
salas de aula e refletirem sobre emoções hostis
produzidas e expressas por eles no dia-a-dia da
vida da escola.
A respeito disso, pôde-se supor que, enquanto
alunos têm produzido um sentido subjetivo de
que há um vazio na escola ou “o nada”, notada-
mente com relação à expressão de suas necessi-
dades e à constituição de vínculos afetivos com
os professores, estes, por sua vez, têm produzido
um sentido subjetivo de que os alunos são indis-
ciplinados ou difíceis de controlar, não havendo
como se envolverem afetivamente com eles no
processo ensino-aprendizagem.
Inferimos que, ao não compreender a diver-
sidade implicada no processo de aprendizagem,
os professores se percebem impossibilitados de
transformar a realidade da escola, se transfor-
mando. Já os alunos, embora declarem o desejo
de aprender, contraditoriamente não conseguem
gerar motivação para o estudo e, portanto, mo-
tivação para participarem ativamente da cons-
tituição da sala de aula como espaço de diálogo
e de aprendizagem.
Sem dúvida podemos supor que são esses
alguns dos elementos de sentido envolvidos
com a produção subjetiva da violência nas
es­­­colas. Outros dariam maior visibilidade ao
fenômeno, como o fato de que na escola dos
sonhos, imaginada e fantasiada artisticamente
pelas crianças, elas teriam o direito de brincar,
dramatizar e criar.
Então, não seriam esses os elementos que
ajudariam essas crianças a gerar aspectos consti-
tutivos de uma psique livre e criativa? A verdade
é que, nas suas expressões criativas sobre essa
escola dos sonhos, uma escola sem violência,
as crianças expressam, imaginativamente, seu
repúdio às representações da escola construídas
para elas, cotidianamente apresentadas pela
mídia e às quais elas próprias são violentamente
expostas.
Outro elemento dessa complexa produção
subjetiva da violência são as emoções contradi-
tórias dos adolescentes sobre a escola: uma ruim,
anterior à vivência emocional de uma nova pro-
dução subjetiva sobre ela; e a outra boa, provo-
cada pela vivência emocional sobre a Escola de
Vidro, ao se inspirarem nos alunos/personagens
dessa escola, os quais romperam com a opressão
que lhes era imposta e expressaram livremente
seus interesses e necessidades.
A partir daí podemos problematizar tanto
sobre a qualidade do processo ensino/apren-
dizagem nas nossas escolas quanto sobre sua
Peres VLA & Martins LRR
Rev. Psicopedagogia 2012; 29(90): 320-9
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repercussão no desenvolvimento de seus alunos
e da sociedade como um todo.
Não será necessário construir um novo ca­­
minho para a educação? Quem sabe um ca-
minho para a expressão de subjetividades e,
con­­­­­­­­­sequentemente, para a realização de ações
efetivas que legitimem diferentes processos de
desenvolvimento humano no espaço escolar. O
grande desafio será reconhecer que as esco­­­las
necessitam de políticas públicas que levem em
conta a subjetividade social implicada com a
produção subjetiva da violência entre alunos e
professores.
Entretanto, ainda hoje, as políticas educa-
cionais são elaboradas sem levarem em conta
essa necessidade, apresentando limitações que
precisam ser criticamente analisadas e proble-
matizadas.
A subjetividade social da escola e limitações
da política educacional
Antes de analisar as políticas públicas educa-
cionais relacionadas ao fenômeno da violência,
temos que considerar uma questão central que
modificou todo o contexto educacional brasileiro:
o direito de acesso ao ensino fundamental para
todas as crianças e adolescentes, prescrito na
Constituição de 1988. A inclusão desse direito
buscou provocar mudanças sociais para reduzir
as desigualdades socioeconômicas e incorporar
segmentos historicamente excluídos dos proces-
sos educacionais.
Se por um lado, essa política de inclusão per-
mitiu a ampliação do acesso à escola, por outro,
submeteu os sistemas de ensino a condições de
precarização no momento em que, em boa parte
dos sistemas, foram mantidos o mesmo número
de professores e as mesmas condições materiais,
comprometendo a qualidade da educação em
função das condições de seu financiamento.
O total de matrículas, de 1975 a 2002, cresceu
71,5%, passando de 19,5 milhões para 33 milhões
de estudantes5
.
Até a década de 1970, a escola pública aten-
dia a um pequeno número de alunos, os quais,
na sua maioria, provinham da classe média. As
novas exigências constitucionais de inclusão
escolar conduziram à construção de alternati-
vas para atender a um número bem maior de
crianças em idade escolar que se encontravam
fora da escola.
É nesse contexto de universalização do di­­
reito à educação que se situam as políticas
edu­­­cacionais atuais, a universalização trouxe
vantagens do ponto de vista da garantia do di-
reito à educação e, como consequência direta,
redução na qualidade do ensino público.
As políticas universais, por sua própria na-
tureza padronizadora, não favorecem ao aten-
dimento das especificidades de cada território
em que são instaladas. Por outro lado, o estudo
dos modelos para elaboração de política educa-
cional nos remete a questões político-ideológicas
como fundamento para a ação do Estado em
sua interven­ção na sociedade e na instituição
escolar em particular. A escola torna-se o fim de
uma longa e complexa cadeia de relações que
se inicia na formulação de leis, decretos, porta-
rias que, para serem concretizados, passam por
longos trâmites no âmbito federal, estadual ou
municipal até chegar de fato aos seus beneficiá-
rios finais: a comunidade escolar, especialmente,
os alunos da escola.
De um modo geral, a análise da dimensão
sub­­­jetiva da política pública educacional, como
instrumento de intervenção no espaço social da es-
cola, busca compreender a reação da co­mu­­­­­­­­nidade
escolar em relação aos objetivos pretendidos pela
política e suas possibilidades de gerar bem estar
no espaço concreto da escola, resolvendo os pro-
blemas vividos nessa comunidade em relação aos
seus desejos, expectativas e necessidades que
muitas vezes são explicitados e, em outras vezes,
permanecem ocultos ou não expressos clara­­­
mente por não serem facilmente identificáveis.
Assim, a política pública educacional tem
sido uma interferência causada por demandas
geralmente externas à realidade da comunidade
escolar. Dessa forma, sua imposição pode gerar
diferentes interpretações e reações da comu-
nidade e despertar movimentos favoráveis ou
desfavoráveis à sua institucionalização.
A produção subjetiva da violência nas escolas
Rev. Psicopedagogia 2012; 29(90): 320-9
325
Segundo Gonçalves6
, seriam várias as ra-
zões não facilmente identificáveis da dimensão
subjetiva desses movimentos e que precisa ser
compreendida na sua gênese, nos seus proces-
sos de constituição e nas suas possibilidades e
limites de transformação.
Gonçalves refere-se a uma compreensão per-
mitida pela metodologia do psicólogo soviético,
Lev Vygotsky que recorre “à categoria histori-
cidade, assim como às categorias do psiquismo
como chave para a compreensão da dimensão
subjetiva”6
.
Uma política educacional pode, na realidade
concreta da escola, perder seu significado origi-
nal se a comunidade produzir com relação a ela
sentidos subjetivos diferenciados que a façam
resistir a sua implantação. Assim, a subjetivida-
de produzida no espaço social da escola é um
sistema complexo, por ser constituída na inter-­
relação da subjetividade individual e social, ou
seja, “é impossível distinguir entre os processos
de ordem social, nos quais se produz a ação
individual e os processos psíquicos individuais
que são constituintes dessa ação”7
.
Nas tensões geradas pela intenção universa­
lizante, expressa pelos objetivos da política
pú­­­blica, em confronto com as necessidades
específicas da comunidade escolar, é que são
produzidos os sentidos subjetivos com relação
às ações governamentais previstas na política.
O esforço homogeneizador proposto na política
pública entra em desacordo com a subjetivida-
de social da escola, fazendo com que os efeitos
transformacionais esperados da política, muitas
vezes, se reduzam significativamente ou nem
sejam verdadeiramente alcançados.
A configuração subjetiva do espaço social da
escola não é indiferente às condições dos sujeitos
que convivem nesse espaço. Tanto pode ser pro-
pícia ao desenvolvimento humano criativo que
favoreça a convivência pacífica entre os mem-
bros da comunidade escolar, quanto pode refletir
os conflitos e dificuldades relacionais daqueles
que convivem na escola. As questões relativas à
discriminação e ao preconceito podem negar a
aceitação da diversidade e, com isso, criar uma
condição de conflito de valores e de crenças que
forjam fatores propícios para o desencadeamento
da violência simbólica e não-simbólica, redu-
zindo a possibilidade de convivência produtiva
entre professores, funcionários, gestores e pais
de alunos no espaço social da escola.
A polarização entre essas duas visões extre­
mas serve para ilustrar a importância do re-
conhecimento da complexidade sistêmica dos
diferentes espaços sociais que se interpenetram
na subjetividade social da escola, constituída
pela rede de relações estabelecidas na família,
no bairro, na igreja, no espaço profissional e em
outros espaços sociais de convivência. A cons-
tituição dos sentidos subjetivos com relação à
violência escolar, no contexto social da escola,
possui proximidade com o reconhecimento, ou
não, das potencialidades dos sujeitos e de suas
relações afetivas e simbólicas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
É na perspectiva do reconhecimento da
singularidade que a escola pode se constituir
como espaço favorável ao despertar de sujeitos
ativos, criativos e autônomos, responsáveis por
seu próprio percurso histórico de vida. A ação
educativa passa a ser uma ação em que se edu­­
ca junto ao outro e com o outro. Para isso, é
pre­­­ciso abandonar a escola como “fábrica do
processamento cognitivo de informações” para
dar lugar ao espaço de transformação de indi­
víduos despersonalizados em sujeitos capazes
de produzir novos sentidos de vida em relação a
si mesmos e em relação ao outro e, dessa forma,
exercer sua autonomia.
Esse tipo de ética da responsabilidade po-
deria ser o ponto de partida para outro tipo de
política pública, focada no desenvolvimento
humano, na humanização da escola como um
espaço de convivência e de respeito à singula-
ridade do outro. Somente dessa forma a escola
iria favorecer a produção de sentidos subjetivos
mobilizadores de múltiplas aprendizagens:
aprender a sentir, a fazer, a ser e a conviver. Seria
nessa perspectiva holística de integração entre
o pensar, sentir e agir que a escola iria educar o
Peres VLA & Martins LRR
Rev. Psicopedagogia 2012; 29(90): 320-9
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sujeito para superar a violência produzida por
uma sociedade que não respeita as diferenças e
provoca a fragilização das relações sociais.
O fato de trazermos para discussão a necessi­
da­­­­­­de que há de integrar cognição e emoção no­­­­­
desenvolvimento da qualidade do espaço escolar,
como espaço social de educação e de desen-
volvimento humano, seria o primeiro passo.
Com­­­preender a complexidade do fenômeno da
violência nas escolas viria a ser um avanço para
a elaboração de política educacional compatível
com uma educação que reconheça a singularida-
de dos seus alunos e a necessidade de reformar,
sobretudo, o pensamento dos professores8
.
É na relação com seus alunos que o professor
tem a oportunidade de se mostrar como ser hu-
mano verdadeiro. Não que o professor consiga
vencer todas as determinações do contexto em
que a escola está inserida, mas como o prota-
gonismo escolar depende muito do comparti-
lhamento entre os sujeitos que existe em cada
professor, o professor continua sendo quem
impulsiona os processos que dão sentido à es-
cola. Os professores em comunhão, associados
aos gestores e funcionários, podem transformar
o espaço social da escola em um espaço de aco-
lhimento ao outro, seja aluno, seja pai de aluno,
seja qualquer outro cidadão que busque a escola.
De outro lado, cabe não somente aos profes-
sores a constituição de uma escola “da comuni-
dade”, em que todos estariam preocupados com
o outro e todos mereceriam atenção e respeito.
Para isso é preciso reconhecer a escola como
o espaço de pertencimento de todos e não do
domínio de alguns, uma escola aberta à comu-
nidade e ao mundo. Sem dúvida, a escola pode
se constituir como espaço para a produção sub-
jetiva da violência, porém quando a comunidade
escolar rejeita essa produção é possível produzir
sentidos subjetivos que ajudem a desenvolver a
qualidade afetiva das relações e constituir uma
subjetividade social contrária à produção e re-
produção da violência.
A subjetividade social representa a “orga-
nização subjetiva dos diversos espaços sociais,
os quais formam um sistema configurado pela
multiplicidade de produções que, em uma de-
terminada sociedade, faz parte de maneira dife-
renciada e parcial dos distintos espaços sociais
nela coexistentes”9
.
González Rey viria então definir a subjetivi-
dade social como decorrente da implicação dos
sujeitos e de sua atuação no espaço vivencial
que simultaneamente os constitui, isto é, como
estando integrada à produção de sentidos sub-
jetivos do sujeito com relação a vários aspectos
de sua vida social. Assim, os sentidos subjetivos
produzidos por professores e alunos com rela-
ção a suas vivências viriam, simultaneamente,
re­­­­percutir nas suas ações e na organização do
espaço escolar, indicando que as produções
subjetivas do sujeito não estão separadas da
subjetividade social.
Podemos, então, pensar o espaço social da
escola como um espaço de múltiplas dimensões,
estruturado por meio de uma complexa rede de
práticas simbólicas e emocionais compartilhadas
por professores, alunos, funcionários, gestores e
pais de alunos3
. Nesse compartilhamento sim-
bólico-emocional, a expressão da subjetividade
individual e social no âmbito da escola ocorre
pela produção de múltiplos sentidos subjetivos
associados às condições humanas, sociais, cul-
turais, econômicas e políticas dos membros da
comunidade escolar. Todos os que participam
dessa comunidade são sujeitos que trazem para
o ambiente escolar todas as suas vivências histó-
rico-culturais que lhes constituíram na condição
de sujeito em outros momentos de sua vida.
Nas configurações de sentido subjetivo, úni-
cas de cada pessoa, é que se encontram pistas
para compreender a subjetividade social7
. Isso
significa que a realidade da escola vai além da
escola em si, pois incorpora contribuições de
outros espaços sociais vividos por aqueles que
se encontram inseridos na realidade escolar
concreta. Nessa linha de trabalho, fica claro que
o problema da produção subjetiva da violência
nas escolas resulta da integração de elementos
individuais e elementos que atravessam a so-
ciedade como um todo. Não há uma violência
escolar propriamente dita.
A produção subjetiva da violência nas escolas
Rev. Psicopedagogia 2012; 29(90): 320-9
327
A violência simbólica e não-simbólica mani-
festa-se na ação dos sujeitos que convivem no
espaço social da escola e que são constituídos e
constituem a realidade escolar.
Em qualquer circunstância, o compartilha-
mento de valores, ideias, sentimentos e crenças,
entre os sujeitos inseridos no contexto da escola,
passa por suas mediações subjetivas, por sua vez
envolvidas com significados e emoções expres-
sos na forma como se estruturam as relações na
sociedade como um todo.
Concordamos com Teles10
sobre o papel da co-
municação interativa na motivação do sujeito para
que aprenda e conheça e quanto ao fato da afeti-
vidade e cognição não serem aspectos separa­­­­dos
no processo de aprendizagem. Quando professor
e alunos têm uma relação afetiva, o processo de
construção de conhecimento acontece.
A política pública, como elemento de inter­
ferência na produção da violência, oferece pos-
sibilidades de ampliação da ação das escolas
no desenvolvimento da qualidade das relações
entre professor e alunos, especialmente por meio
de práticas interativas e do diálogo na sala de
aula. A escola que, por um lado pode ser espaço
de reprodução social de preconceitos, discrimi-
nações e de outros conflitos da sociedade, por
outro, também pode colaborar com a produção
de caminhos para convivência social e qualidade
de vida dos sujeitos.
Com o trabalho dos estagiários nas escolas
vimos que a diversidade não significa um empe-
cilho para o desenvolvimento do cenário da sala
de aula, mas a sua riqueza precisa ser respeitada
e valorizada por todos os educadores, o que nem
sempre acontece.
Nesse aspecto, o diálogo, como prática coti-
diana da sala de aula, pode facilitar que alunos e
professores reflitam sobre suas histórias e neces-
sidades, o que quase nunca acontece nas escolas
pesquisadas. Ao contrário, as escolas deveriam
atender à diversidade do processo de aprendi-
zagem e serem voltadas para o desenvolvimento
da imaginação criativa e da inventividade, ora
relegadas ao segundo plano, mantendo invisí-
veis as crianças e os adolescentes concretos.
A compreensão do fenômeno complexo da
violência e a busca por estratégias para a sua
superação encontram também nas políticas de
formação um primeiro passo, porém ainda li-
mitado e pontual. Francischini & Souza Neto11
apresentam um exemplo de resposta governa­­
mental à violência no espaço escolar com o Pro­­­
grama Escola que Protege1
*.
Considerando que os sentidos produzidos na
subjetividade social da escola e a emocionalidade
integrada aos processos simbólicos gerados nesse
espaço social são elementos da maior importância
para a produção de “novos” sentidos subjetivos
sobre as relações entre professores e alunos, as
ações realizadas pela própria comunidade escolar
são passíveis de gerar novos sentidos produtores
de novas emocionalidades, para que reinterpre­
tações simbólico-emocionais ocorram modifican-
do as configurações subjetivas existentes.
Apesar da relevância do Projeto Escola que
Protege para qualificação de profissionais da
educação na superação dos elementos que
participam da produção subjetiva da violência,
alertamos que tal política pública, em si, não fa-
vorece a produção de novos sentidos subjetivos,
uma vez que está centrada na transmissão de
“informações ou conhecimentos sobre os direitos
de crianças e adolescentes”.
O desenvolvimento de estratégias de aco-
lhimento ao outro, a responsabilização por esse
*O Projeto Escola que Protege pretende qualificar profissionais de educação por meio de formação nas modalidades à distância
e presencial, para uma atuação adequada, eficaz e responsável, no âmbito escolar, diante das situações de evidências ou
constatações de violências sofridas pelos educandos. A formação na temática da violência física, psicológica, negligência,
abandono, abuso sexual, exploração do trabalho infantil, exploração sexual comercial e tráfico para esses fins, em uma
perspectiva preventiva, faz-se imprescindível mediante a necessidade de oportunizar à comunidade escolar a sensibilização e
compreensão sobre o prejuízo dessas diversas formas de violência para o desenvolvimento integral de crianças e adolescentes,
bem como assegurar adequado encaminhamento e fluxo, no que concerne à Educação, de modo a garantir sigilo da identidade
do educador e da escola e preservar a privacidade da vítima. (Relatório Executivo do Projeto Escola que Protege).
Peres VLA & Martins LRR
Rev. Psicopedagogia 2012; 29(90): 320-9
328
“outro” para que se sinta socialmente valorizado
e reconhecido, como sujeito capaz de se aceitar
a si mesmo em suas diferenças, sem potenciali-
zar preconceitos e discriminações, é algo que é
construído socialmente no ambiente escolar por
meio das relações entre os sujeitos. Se o espaço
social da escola, como síntese do seu projeto
coletivo, transformar-se em um espaço gerador
de sentidos para a superação do preconceito e
da diferença e se mantiver atento às discrimina-
ções de todos os tipos, proporcionando a alunos,
funcionários, professores e gestores condições
de desenvolvimento humano integral, as possi-
bilidades de potencialização da violência podem
ser minimizadas.
A dimensão da subjetividade social da escola,
constituída na alegria, no bem-estar de alunos,
professores e funcionários, que fomenta o res-
peito ao outro, que cuida da disciplina como um
acordo de responsabilidade de todos por todos,
no qual o conhecimento seja fonte de desenvol-
vimento da autonomia e da criatividade, pode,
nessa proposta, ser geradora de condições para
eliminação da violência nas escolas. São os su-
jeitos historicamente situados em suas relações
concretas que estabelecem os significados e
sentidos para suas ações individuais e coletivas.
Sem dúvida, a escola é o lugar da produção
de subjetividades individuais e sociais que se
constituem mutuamente. Não há como separar o
individual do social no espaço escolar. A política
pública pode fomentar condições que favoreçam
a transformação social, porém a decisão de fazer
com que os objetivos da política se concretizem
depende de negociações complexas, nas quais
a mobilização da subjetividade dos atores estará
sempre muito presente.
Por enquanto, para as crianças e os adolescen-
tes das diferentes escolas pesquisadas ficam as
possibilidades de expressar suas necessidades e
motivações por meio da arte e do lúdico. Para os
estagiários, ficam as marcas da possibilidade de
definirem o humano a partir de sua própria com-
plexidade, sem se fecharem nas categorias apriori,
muitas vezes definidas pelo modelo biomédico de
ciência e assumidas, sem nenhuma crítica, pelas
próprias escolas, pela necessidade simplista de
se apegarem aos conhecimentos já dados8
.
Pensamos que a produção subjetiva, possi-
bilitada pelo exercício da imaginação criativa,
ajuda a superar as barreiras das condições ob-
jetivas, tais como o mau humor, a impaciência,
a falta de atenção e a indiferença, todas elas
não raramente expressas nas relações entre
pro­­­fessores e alunos tanto de escolas públicas
quan­­­to privadas1
.
Para ilustrar podemos citar as ações de nossos
estagiários que, por meio da arte, ajudaram crian-
ças e adolescentes a expressarem a realidade so-
cial das escolas, nas suas relações com a realidade
social mais ampla e, é claro, sempre mediadas
por suas emoções, muitas vezes contraditórias.
Afinal, todos nós podemos refletir sobre o
desafio que é ultrapassar o pensamento da cau-
salidade clássica e considerar a subjetividade
de alunos e professores, tanto na realização de
prá­­­­ticas pedagógicas que atendam à diversidade
da sala de aula quanto na busca de um modelo
de política educacional que permita produzirem
uma convivência pacífica e respeitosa entre eles.
A produção subjetiva da violência nas escolas
Rev. Psicopedagogia 2012; 29(90): 320-9
329
SUMMARY
The subjective production of school violence: direction indicator for
evaluation and development of educational policy
The authors make a reflection about the subjective production of school
violence, knowingly involved, recursively and contradictory, with social
subjectivity. Guided by Qualitative Epistemology analyze information
built into the Basic Training of pupils of school psychology of the Pontifícia
Universidade Católica de Goiás, and as a result have the indicator that
public policies, to be effective, need to respond to the unique needs of the
school and be inserted in an ethic of responsibility, that is, cause the respect
for differences and the active participation of the subjects in their learning
and development processes.
KEY WORDS: Public policy. Education. Violence. Subjectivity.
REFERÊNCIAS
	 1.	 González Rey FL. A re-examination of defi-
ning moments in Vygotsky’s work and their
implications for his continuing legacy. In:
Mind, Culture, and Activity; 2011;18(3):
257-75. Disponível em: http://lchc.ucsd.edu/
MCA/Mail/xmcamail.2011_07.dir/pdfE-
DxyyPG4hN.pdf
	 2.	 González Rey FL. La investigación cualita-
tiva em Psicología: rumbos y desafíos: São
Paulo: EDUC; 1999.
	 3.	 González Rey FL. Pesquisa qualitativa e sub-
jetividade. Os processos de construção da
informação. São Paulo: Thomson; 2005.
	 4.	 González Rey FL. O sujeito que aprende. In:
Tacca MC, ed. Aprendizagem e trabalho pe-
dagógico. São Paulo: Alínea; 2006.
	5.	 Oliveira RP. Da universalização do ensino
fundamental ao desafio da qualidade: uma
análise histórica. Educ Soc. 2007;28(100):
661-90.
	6.	 Gonçalves MGM. Psicologia, subjetividade
e políticas públicas. São Paulo: Cortez; 2010.
	 7.	 González Rey FL. O social na psicologia e a
psicologia social. 2004.
	 8.	 Morin E. A cabeça bem feita. Repensar a
reforma. Reformar o pensamento. Trad. Ja-
cobina E. 15ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand
Brasil; 2008.
	 9.	 González Rey FL. Psicoterapia, subjetividade
e pós-modernidade. Uma aproximação histó-
rico-cultural. São Paulo: Thomson; 2007.
	10.	 Teles AMO. A subjetividade social na escola.
Brasília: Paralelo 15; 1999.
	11.	 Francischini R, Souza Neto MO. Enfrenta-
mento à violência contra crianças e adoles-
centes: Projeto Escola que Protege. Rev Dep
Psicol. 2007;19(1):243-51.
Trabalho realizado na Pontifícia Universidade Católica
de Goiás, Goiânia, GO, Brasil.
Artigo recebido: 18/6/2012
Aprovado: 3/9/2012

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A produção subjetiva da violência nas escolas: indicador de sentido para avaliação e desenvolvimento de política educacional

  • 1. Peres VLA & Martins LRR Rev. Psicopedagogia 2012; 29(90): 320-9 320 ARTIGO ORIGINAL RESUMO – Os autores fazem uma reflexão sobre a produção subjetiva da violência nas escolas, sabidamente envolvida, de forma recursiva e contraditória, com a subjetividade social. Orientados pela Epistemologia Qualitativa analisam informações construídas no estágio básico de alunos de psicologia escolar da Pontifícia Universidade Católica de Goiás e, como resultado, apresentam o indicador de que as políticas públicas, para serem efetivas, precisam responder às necessidades singulares da escola e serem inseridas em uma ética da responsabilidade, isto é, provocarem o respeito às diferenças e a participação ativa dos sujeitos nos seus processos de aprendizagem e de desenvolvimento. UNITERMOS: Políticas públicas. Educação. Violência. Subjetividade. Correspondência Vannúzia Leal Andrade Peres Rua T 37, Quadra, 128, Lote 11B, Ed. Bragança, Apto. 1001 – Setor Bueno – Goiânia, GO, Brasil – CEP 74230-020 E-mail: vannuzia@terra.com.br Vannúzia Leal Andrade Peres – Professora da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO), Doutora em Psicologia e Pós-doutoranda em Educação pela Uni­­­versidade de Brasília (UnB), Brasília, DF, Brasil. Luiz Roberto Rodrigues Martins – Especialista em Políticas Públicas, trabalha no Ministério da Educação (DEAVE/SECADE) e faz Doutorado em Educação na Universidade de Brasília (UnB), Brasília, DF, Brasil. A produção subjetiva da violência nas escolas: indicador de sentido para avaliação e desenvolvimento de política educacional Vannúzia Leal Andrade Peres; Luiz Roberto Rodrigues Martins
  • 2. A produção subjetiva da violência nas escolas Rev. Psicopedagogia 2012; 29(90): 320-9 321 INTRODUÇÃO Já não é mais novidade que a violência nas escolas é um fenômeno mundial. Para isso é só observar as notícias veiculadas nos meios de comunicação de massa, especial- mente a televisão. O problema é que pouco se­­­­­­ sabe como essa violência é constituída na reali- dade social das diferentes escolas ou como estaria envolvida com as produções subjetivas de dife- rentes crianças, adolescentes e seus professores sobre essa realidade. Em uma abordagem complexa e subjetiva do psiquismo humano1 , o primeiro passo para a explicação dessa problemática é uma análise de como o sistema econômico, o sistema político-­ social e as ideologias vigentes estão sendo me- diados por professores e alunos no cotidiano da escola. Essa abordagem permite compreender que os fatos sociais, econômicos e culturais que constituem a realidade social da escola perpas- sam pela constituição dos processos psicológicos de professores e alunos, não de forma imediata, mas por meio de suas produções subjetivas, que incluem suas produções cognitivo-emocionais geradas e expressas no espaço escolar. Então, podemos perguntar: como o processo ensino/aprendizagem tem envolvido os profes- sores e seus alunos na produção subjetiva do espaço social da escola, que ao mesmo tempo é seu espaço social de constituição psicológica? A subjetividade integra dialeticamente o individual e o social, implicando, para isso, o sujeito com sua história e o espaço social que o constitui e que é por ele constituído em um processo recursivo2 . O que isso significa, senão que há uma dialé- tica entre o sujeito e seu espaço social, no qual, com sua ação, gera sua psique? Nesse aspecto é necessário refletir sobre a qualidade do diálogo e da relação dialética entre aqueles que atuam nas escolas, especialmente professores e alunos, e so- bre como esses processos podem estar comple­xa e subjetivamente envolvidos com a constituição e a expressão da violência entre eles. Ao articular emoções, processos simbólicos e significados, para a compreensão da orga- nização psicológica do sujeito1-3 desenvolve outro conceito, o de “sentido subjetivo” que nos permite ir mais além e fazermos, finalmente, a seguinte pergunta: que registros complexos das experiências de relação na escola poderiam estar envolvidos na constituição psicológica dos alunos e dos professores e na sua produção subjetiva da violência? Entretanto, a ênfase, ainda hoje, é nas funções­ cognitivas mediadas por signos supostamente internalizados, deixando-se de lado a expressão simbólico-emocional do sujeito, fruto de sua imaginação, de sua fantasia e de sua emoção, o que confere à psique um caráter gerativo e não reprodutivo1 . Em síntese, de acordo com esse autor1 pode- mos dizer que a ênfase no cognitivo, mediado por aspectos da vida objetiva, de forma direta e imediata, dificulta o desenvolvimento de um modelo teórico que explique como as emoções, os processos simbólicos e os significados estão articulados na organização psicológica do sujeito e na sua produção subjetiva de seus cenários sociais, dentre eles, seu cenário social escolar, violento, ou não. Afinal, podemos mesmo dizer que a falta desse modelo tem dificultado explicar como o cenário escolar, no qual o foco deveria ser a aprendizagem e o desenvolvimento do sujeito, é, ao contrário, palco de produção de violências, em níveis cada vez maiores. MÉTODO Orientados pela epistemologia qualitativa3 e com o intuito de construir indicador de sentido da produção da violência nas escolas, analisa- mos informações organizadas no decorrer da realização de uma disciplina da área de desen- volvimento humano, denominada “Estágio Bá- sico em Psicologia Escolar”, por nós ministrada em três semestres consecutivos na PUC-Goiás. A construção do indicador de sentido pos- sibilita compreender as relações da violência com o sistema escolar e seu envolvimento com as produções subjetivas de alunos e professores, por sua vez envolvidas com a cultura, o momento­
  • 3. Peres VLA & Martins LRR Rev. Psicopedagogia 2012; 29(90): 320-9 322 histórico e com as representações sociais do processo ensino/aprendizagem, presentes em suas expressões e conflitos relacionais no cená­ rio escolar. O método qualitativo, fundamentado na epis- temologia qualitativa para o estudo da subjetivi- dade, portanto da realidade complexa e sistêmi- ca do psiquismo humano, permite a construção e interpretação das informações e a abertura de novas zonas de sentido do fenômeno1,3 . Nesse caso, a construção das informações sobre a organização sistêmica e plurideter- minada, de escolas conveniadas com a PUC-­ Goiás, abrangeu a abordagem das relações in­­­ terpessoais,­da organização do cenário da sala de aula, das práticas pedagógicas e da diversidade dos processos de aprendizagem, dentre outros, envolvendo a comunicação com professores e alunos das diferentes escolas, inclusive de es- colas consideradas tradicionais, com disciplina rígida e conceitos ainda limitados de aprendi- zagem e desenvolvimento humano. Para isso foram feitas, em média, oito visitas consecutivas dos estagiários de psicologia a cada escola-campo, momentos esses de observações interativas seguidas de conversação com alunos e professores, esta última mediada por atividades como redação, desenhos, discussão de temas, análise de filmes, complementação de frases, con­­­­­­forme disponibilidade e interesse de ambos. Nesse processo, indo mais além, os estagiá- rios desenvolveram ações educativas compatí- veis com a proposta de uma psicologia escolar cujo foco é a aprendizagem e o desenvolvimento humano4 , levando em conta a diversidade desses processos em cada sujeito concreto. Assim vie- ram ajudar na criação de espaços de reflexão e de expressão criativa de alunos e professores no tocante às suas necessidades e motivações para o processo ensino/aprendizagem. A construção desse espaço de reflexão e expressão das necessidades de professores e alunos, especialmente de adolescentes consi- derados indisciplinados e incompetentes, teve como ponto de partida ou como “disparador”, diferentes instrumentos, por exemplo, a estória de Ruth Rocha, Quando a Escola é de Vidro, na qual a autora aborda a problemática da falta de liberdade de expressão criativa de alunos que são requisitados a seguir prescrições padroni- zadas. A metodologia consistiu em os alunos ouvirem a estória e se expressarem sobre ela de diferentes formas, o que possibilitou produzirem novos sentidos subjetivos de sua relação com os professores e a escola. Em outra oportunidade foram construídos espaços lúdicos, nos quais as crianças puderam expressar criativamente as suas visões da escola atual e imaginarem outra escola, a “escola dos sonhos”, ambas concretizadas por meio da ela- boração de cartazes temáticos, expostos para discussões abertas e dramatizações. RESULTADOS A análise construtivo-interpretativa das infor- mações permitiu reconhecermos a necessidade de articularmos dois grandes eixos temáticos envolvidos com a produção subjetiva da vio- lência nas escolas: a necessidade do sujeito de expressar sua singularidade na escola; e a subjetividade da escola e limitações da política educacional. A produção subjetiva da violência nas esco- las e a necessidade do sujeito de expressar sua singularidade Reconhecer o envolvimento da subjetividade no fenômeno da violência nas escolas afirma o caráter construtivo-interpretativo da produção do conhecimento e, portanto, da necessidade dos pesquisadores articularem os múltiplos aspectos sociais e psicológicos que compõem a constituição da realidade escolar3 . A nossa interpretação da violência expressa pelos sujeitos nas escolas não prescindiu, con- tudo, de outros referenciais que perpassaram e perpassam por nossas experiências e reflexões teóricas a respeito do tema, por exemplo, a forma como a nossa sociedade política o tem tratado ao longo do tempo. O fato é que a partir de nossa interpretação da produção subjetiva da violência nas escolas
  • 4. A produção subjetiva da violência nas escolas Rev. Psicopedagogia 2012; 29(90): 320-9 323 vislumbramos a possibilidade da abertura de uma nova “zona de ação” nessa realidade – a imple­­­­­­mentação de política educacional que via- bilize a expressão singular dos alunos, isto é, de seus pensamentos e emoções e, portanto, de sua diversidade no processo ensino/aprendizagem. No processo interpretativo das informações, pudemos inferir sobre elementos que estariam envolvendo a constituição do psiquismo social nas escolas, dentre eles a impossibilidade dos alunos expressarem sua singularidade, já que são muitas vezes rotulados e reprimidos por meio de práticas pedagógicas supostamente autoritárias e despersonalizantes. Em um primeiro momento, em ambas as realidades, a da escola pública e a da escola privada, o que chama a nossa atenção é a deman- da explicitamente manifesta por um psicólogo que se compatibilize com os rótulos, com as prescrições e, portanto, com a dificuldade das instituições de ensino romperem com a prática da medicalização da educação, hoje difundida em larga escala. Nesse cenário, a discussão sobre a produção subjetiva de alunos e professores, no processo ensino/aprendizagem, em cada escola concreta, não é sequer imaginada. Assim, torna-se difícil avançar na reflexão sobre os aspectos cognitivo-emocionais possi­ velmente envolvidos na produção da indiscipli­­­na e da chamada dificuldade de aprendizagem, tão presentes nas queixas das escolas e suposta­­­ mente envolvidas na produção subjetiva da violência entre alunos e professores. De forma indireta, entretanto, é visível como as práticas pedagógicas não têm permitido a diferentes crianças e adolescentes expressa- rem suas necessidades cognitivo/afetivas nas salas de aula e refletirem sobre emoções hostis produzidas e expressas por eles no dia-a-dia da vida da escola. A respeito disso, pôde-se supor que, enquanto alunos têm produzido um sentido subjetivo de que há um vazio na escola ou “o nada”, notada- mente com relação à expressão de suas necessi- dades e à constituição de vínculos afetivos com os professores, estes, por sua vez, têm produzido um sentido subjetivo de que os alunos são indis- ciplinados ou difíceis de controlar, não havendo como se envolverem afetivamente com eles no processo ensino-aprendizagem. Inferimos que, ao não compreender a diver- sidade implicada no processo de aprendizagem, os professores se percebem impossibilitados de transformar a realidade da escola, se transfor- mando. Já os alunos, embora declarem o desejo de aprender, contraditoriamente não conseguem gerar motivação para o estudo e, portanto, mo- tivação para participarem ativamente da cons- tituição da sala de aula como espaço de diálogo e de aprendizagem. Sem dúvida podemos supor que são esses alguns dos elementos de sentido envolvidos com a produção subjetiva da violência nas es­­­colas. Outros dariam maior visibilidade ao fenômeno, como o fato de que na escola dos sonhos, imaginada e fantasiada artisticamente pelas crianças, elas teriam o direito de brincar, dramatizar e criar. Então, não seriam esses os elementos que ajudariam essas crianças a gerar aspectos consti- tutivos de uma psique livre e criativa? A verdade é que, nas suas expressões criativas sobre essa escola dos sonhos, uma escola sem violência, as crianças expressam, imaginativamente, seu repúdio às representações da escola construídas para elas, cotidianamente apresentadas pela mídia e às quais elas próprias são violentamente expostas. Outro elemento dessa complexa produção subjetiva da violência são as emoções contradi- tórias dos adolescentes sobre a escola: uma ruim, anterior à vivência emocional de uma nova pro- dução subjetiva sobre ela; e a outra boa, provo- cada pela vivência emocional sobre a Escola de Vidro, ao se inspirarem nos alunos/personagens dessa escola, os quais romperam com a opressão que lhes era imposta e expressaram livremente seus interesses e necessidades. A partir daí podemos problematizar tanto sobre a qualidade do processo ensino/apren- dizagem nas nossas escolas quanto sobre sua
  • 5. Peres VLA & Martins LRR Rev. Psicopedagogia 2012; 29(90): 320-9 324 repercussão no desenvolvimento de seus alunos e da sociedade como um todo. Não será necessário construir um novo ca­­ minho para a educação? Quem sabe um ca- minho para a expressão de subjetividades e, con­­­­­­­­­sequentemente, para a realização de ações efetivas que legitimem diferentes processos de desenvolvimento humano no espaço escolar. O grande desafio será reconhecer que as esco­­­las necessitam de políticas públicas que levem em conta a subjetividade social implicada com a produção subjetiva da violência entre alunos e professores. Entretanto, ainda hoje, as políticas educa- cionais são elaboradas sem levarem em conta essa necessidade, apresentando limitações que precisam ser criticamente analisadas e proble- matizadas. A subjetividade social da escola e limitações da política educacional Antes de analisar as políticas públicas educa- cionais relacionadas ao fenômeno da violência, temos que considerar uma questão central que modificou todo o contexto educacional brasileiro: o direito de acesso ao ensino fundamental para todas as crianças e adolescentes, prescrito na Constituição de 1988. A inclusão desse direito buscou provocar mudanças sociais para reduzir as desigualdades socioeconômicas e incorporar segmentos historicamente excluídos dos proces- sos educacionais. Se por um lado, essa política de inclusão per- mitiu a ampliação do acesso à escola, por outro, submeteu os sistemas de ensino a condições de precarização no momento em que, em boa parte dos sistemas, foram mantidos o mesmo número de professores e as mesmas condições materiais, comprometendo a qualidade da educação em função das condições de seu financiamento. O total de matrículas, de 1975 a 2002, cresceu 71,5%, passando de 19,5 milhões para 33 milhões de estudantes5 . Até a década de 1970, a escola pública aten- dia a um pequeno número de alunos, os quais, na sua maioria, provinham da classe média. As novas exigências constitucionais de inclusão escolar conduziram à construção de alternati- vas para atender a um número bem maior de crianças em idade escolar que se encontravam fora da escola. É nesse contexto de universalização do di­­ reito à educação que se situam as políticas edu­­­cacionais atuais, a universalização trouxe vantagens do ponto de vista da garantia do di- reito à educação e, como consequência direta, redução na qualidade do ensino público. As políticas universais, por sua própria na- tureza padronizadora, não favorecem ao aten- dimento das especificidades de cada território em que são instaladas. Por outro lado, o estudo dos modelos para elaboração de política educa- cional nos remete a questões político-ideológicas como fundamento para a ação do Estado em sua interven­ção na sociedade e na instituição escolar em particular. A escola torna-se o fim de uma longa e complexa cadeia de relações que se inicia na formulação de leis, decretos, porta- rias que, para serem concretizados, passam por longos trâmites no âmbito federal, estadual ou municipal até chegar de fato aos seus beneficiá- rios finais: a comunidade escolar, especialmente, os alunos da escola. De um modo geral, a análise da dimensão sub­­­jetiva da política pública educacional, como instrumento de intervenção no espaço social da es- cola, busca compreender a reação da co­mu­­­­­­­­nidade escolar em relação aos objetivos pretendidos pela política e suas possibilidades de gerar bem estar no espaço concreto da escola, resolvendo os pro- blemas vividos nessa comunidade em relação aos seus desejos, expectativas e necessidades que muitas vezes são explicitados e, em outras vezes, permanecem ocultos ou não expressos clara­­­ mente por não serem facilmente identificáveis. Assim, a política pública educacional tem sido uma interferência causada por demandas geralmente externas à realidade da comunidade escolar. Dessa forma, sua imposição pode gerar diferentes interpretações e reações da comu- nidade e despertar movimentos favoráveis ou desfavoráveis à sua institucionalização.
  • 6. A produção subjetiva da violência nas escolas Rev. Psicopedagogia 2012; 29(90): 320-9 325 Segundo Gonçalves6 , seriam várias as ra- zões não facilmente identificáveis da dimensão subjetiva desses movimentos e que precisa ser compreendida na sua gênese, nos seus proces- sos de constituição e nas suas possibilidades e limites de transformação. Gonçalves refere-se a uma compreensão per- mitida pela metodologia do psicólogo soviético, Lev Vygotsky que recorre “à categoria histori- cidade, assim como às categorias do psiquismo como chave para a compreensão da dimensão subjetiva”6 . Uma política educacional pode, na realidade concreta da escola, perder seu significado origi- nal se a comunidade produzir com relação a ela sentidos subjetivos diferenciados que a façam resistir a sua implantação. Assim, a subjetivida- de produzida no espaço social da escola é um sistema complexo, por ser constituída na inter-­ relação da subjetividade individual e social, ou seja, “é impossível distinguir entre os processos de ordem social, nos quais se produz a ação individual e os processos psíquicos individuais que são constituintes dessa ação”7 . Nas tensões geradas pela intenção universa­ lizante, expressa pelos objetivos da política pú­­­blica, em confronto com as necessidades específicas da comunidade escolar, é que são produzidos os sentidos subjetivos com relação às ações governamentais previstas na política. O esforço homogeneizador proposto na política pública entra em desacordo com a subjetivida- de social da escola, fazendo com que os efeitos transformacionais esperados da política, muitas vezes, se reduzam significativamente ou nem sejam verdadeiramente alcançados. A configuração subjetiva do espaço social da escola não é indiferente às condições dos sujeitos que convivem nesse espaço. Tanto pode ser pro- pícia ao desenvolvimento humano criativo que favoreça a convivência pacífica entre os mem- bros da comunidade escolar, quanto pode refletir os conflitos e dificuldades relacionais daqueles que convivem na escola. As questões relativas à discriminação e ao preconceito podem negar a aceitação da diversidade e, com isso, criar uma condição de conflito de valores e de crenças que forjam fatores propícios para o desencadeamento da violência simbólica e não-simbólica, redu- zindo a possibilidade de convivência produtiva entre professores, funcionários, gestores e pais de alunos no espaço social da escola. A polarização entre essas duas visões extre­ mas serve para ilustrar a importância do re- conhecimento da complexidade sistêmica dos diferentes espaços sociais que se interpenetram na subjetividade social da escola, constituída pela rede de relações estabelecidas na família, no bairro, na igreja, no espaço profissional e em outros espaços sociais de convivência. A cons- tituição dos sentidos subjetivos com relação à violência escolar, no contexto social da escola, possui proximidade com o reconhecimento, ou não, das potencialidades dos sujeitos e de suas relações afetivas e simbólicas. CONSIDERAÇÕES FINAIS É na perspectiva do reconhecimento da singularidade que a escola pode se constituir como espaço favorável ao despertar de sujeitos ativos, criativos e autônomos, responsáveis por seu próprio percurso histórico de vida. A ação educativa passa a ser uma ação em que se edu­­ ca junto ao outro e com o outro. Para isso, é pre­­­ciso abandonar a escola como “fábrica do processamento cognitivo de informações” para dar lugar ao espaço de transformação de indi­ víduos despersonalizados em sujeitos capazes de produzir novos sentidos de vida em relação a si mesmos e em relação ao outro e, dessa forma, exercer sua autonomia. Esse tipo de ética da responsabilidade po- deria ser o ponto de partida para outro tipo de política pública, focada no desenvolvimento humano, na humanização da escola como um espaço de convivência e de respeito à singula- ridade do outro. Somente dessa forma a escola iria favorecer a produção de sentidos subjetivos mobilizadores de múltiplas aprendizagens: aprender a sentir, a fazer, a ser e a conviver. Seria nessa perspectiva holística de integração entre o pensar, sentir e agir que a escola iria educar o
  • 7. Peres VLA & Martins LRR Rev. Psicopedagogia 2012; 29(90): 320-9 326 sujeito para superar a violência produzida por uma sociedade que não respeita as diferenças e provoca a fragilização das relações sociais. O fato de trazermos para discussão a necessi­ da­­­­­­de que há de integrar cognição e emoção no­­­­­ desenvolvimento da qualidade do espaço escolar, como espaço social de educação e de desen- volvimento humano, seria o primeiro passo. Com­­­preender a complexidade do fenômeno da violência nas escolas viria a ser um avanço para a elaboração de política educacional compatível com uma educação que reconheça a singularida- de dos seus alunos e a necessidade de reformar, sobretudo, o pensamento dos professores8 . É na relação com seus alunos que o professor tem a oportunidade de se mostrar como ser hu- mano verdadeiro. Não que o professor consiga vencer todas as determinações do contexto em que a escola está inserida, mas como o prota- gonismo escolar depende muito do comparti- lhamento entre os sujeitos que existe em cada professor, o professor continua sendo quem impulsiona os processos que dão sentido à es- cola. Os professores em comunhão, associados aos gestores e funcionários, podem transformar o espaço social da escola em um espaço de aco- lhimento ao outro, seja aluno, seja pai de aluno, seja qualquer outro cidadão que busque a escola. De outro lado, cabe não somente aos profes- sores a constituição de uma escola “da comuni- dade”, em que todos estariam preocupados com o outro e todos mereceriam atenção e respeito. Para isso é preciso reconhecer a escola como o espaço de pertencimento de todos e não do domínio de alguns, uma escola aberta à comu- nidade e ao mundo. Sem dúvida, a escola pode se constituir como espaço para a produção sub- jetiva da violência, porém quando a comunidade escolar rejeita essa produção é possível produzir sentidos subjetivos que ajudem a desenvolver a qualidade afetiva das relações e constituir uma subjetividade social contrária à produção e re- produção da violência. A subjetividade social representa a “orga- nização subjetiva dos diversos espaços sociais, os quais formam um sistema configurado pela multiplicidade de produções que, em uma de- terminada sociedade, faz parte de maneira dife- renciada e parcial dos distintos espaços sociais nela coexistentes”9 . González Rey viria então definir a subjetivi- dade social como decorrente da implicação dos sujeitos e de sua atuação no espaço vivencial que simultaneamente os constitui, isto é, como estando integrada à produção de sentidos sub- jetivos do sujeito com relação a vários aspectos de sua vida social. Assim, os sentidos subjetivos produzidos por professores e alunos com rela- ção a suas vivências viriam, simultaneamente, re­­­­percutir nas suas ações e na organização do espaço escolar, indicando que as produções subjetivas do sujeito não estão separadas da subjetividade social. Podemos, então, pensar o espaço social da escola como um espaço de múltiplas dimensões, estruturado por meio de uma complexa rede de práticas simbólicas e emocionais compartilhadas por professores, alunos, funcionários, gestores e pais de alunos3 . Nesse compartilhamento sim- bólico-emocional, a expressão da subjetividade individual e social no âmbito da escola ocorre pela produção de múltiplos sentidos subjetivos associados às condições humanas, sociais, cul- turais, econômicas e políticas dos membros da comunidade escolar. Todos os que participam dessa comunidade são sujeitos que trazem para o ambiente escolar todas as suas vivências histó- rico-culturais que lhes constituíram na condição de sujeito em outros momentos de sua vida. Nas configurações de sentido subjetivo, úni- cas de cada pessoa, é que se encontram pistas para compreender a subjetividade social7 . Isso significa que a realidade da escola vai além da escola em si, pois incorpora contribuições de outros espaços sociais vividos por aqueles que se encontram inseridos na realidade escolar concreta. Nessa linha de trabalho, fica claro que o problema da produção subjetiva da violência nas escolas resulta da integração de elementos individuais e elementos que atravessam a so- ciedade como um todo. Não há uma violência escolar propriamente dita.
  • 8. A produção subjetiva da violência nas escolas Rev. Psicopedagogia 2012; 29(90): 320-9 327 A violência simbólica e não-simbólica mani- festa-se na ação dos sujeitos que convivem no espaço social da escola e que são constituídos e constituem a realidade escolar. Em qualquer circunstância, o compartilha- mento de valores, ideias, sentimentos e crenças, entre os sujeitos inseridos no contexto da escola, passa por suas mediações subjetivas, por sua vez envolvidas com significados e emoções expres- sos na forma como se estruturam as relações na sociedade como um todo. Concordamos com Teles10 sobre o papel da co- municação interativa na motivação do sujeito para que aprenda e conheça e quanto ao fato da afeti- vidade e cognição não serem aspectos separa­­­­dos no processo de aprendizagem. Quando professor e alunos têm uma relação afetiva, o processo de construção de conhecimento acontece. A política pública, como elemento de inter­ ferência na produção da violência, oferece pos- sibilidades de ampliação da ação das escolas no desenvolvimento da qualidade das relações entre professor e alunos, especialmente por meio de práticas interativas e do diálogo na sala de aula. A escola que, por um lado pode ser espaço de reprodução social de preconceitos, discrimi- nações e de outros conflitos da sociedade, por outro, também pode colaborar com a produção de caminhos para convivência social e qualidade de vida dos sujeitos. Com o trabalho dos estagiários nas escolas vimos que a diversidade não significa um empe- cilho para o desenvolvimento do cenário da sala de aula, mas a sua riqueza precisa ser respeitada e valorizada por todos os educadores, o que nem sempre acontece. Nesse aspecto, o diálogo, como prática coti- diana da sala de aula, pode facilitar que alunos e professores reflitam sobre suas histórias e neces- sidades, o que quase nunca acontece nas escolas pesquisadas. Ao contrário, as escolas deveriam atender à diversidade do processo de aprendi- zagem e serem voltadas para o desenvolvimento da imaginação criativa e da inventividade, ora relegadas ao segundo plano, mantendo invisí- veis as crianças e os adolescentes concretos. A compreensão do fenômeno complexo da violência e a busca por estratégias para a sua superação encontram também nas políticas de formação um primeiro passo, porém ainda li- mitado e pontual. Francischini & Souza Neto11 apresentam um exemplo de resposta governa­­ mental à violência no espaço escolar com o Pro­­­ grama Escola que Protege1 *. Considerando que os sentidos produzidos na subjetividade social da escola e a emocionalidade integrada aos processos simbólicos gerados nesse espaço social são elementos da maior importância para a produção de “novos” sentidos subjetivos sobre as relações entre professores e alunos, as ações realizadas pela própria comunidade escolar são passíveis de gerar novos sentidos produtores de novas emocionalidades, para que reinterpre­ tações simbólico-emocionais ocorram modifican- do as configurações subjetivas existentes. Apesar da relevância do Projeto Escola que Protege para qualificação de profissionais da educação na superação dos elementos que participam da produção subjetiva da violência, alertamos que tal política pública, em si, não fa- vorece a produção de novos sentidos subjetivos, uma vez que está centrada na transmissão de “informações ou conhecimentos sobre os direitos de crianças e adolescentes”. O desenvolvimento de estratégias de aco- lhimento ao outro, a responsabilização por esse *O Projeto Escola que Protege pretende qualificar profissionais de educação por meio de formação nas modalidades à distância e presencial, para uma atuação adequada, eficaz e responsável, no âmbito escolar, diante das situações de evidências ou constatações de violências sofridas pelos educandos. A formação na temática da violência física, psicológica, negligência, abandono, abuso sexual, exploração do trabalho infantil, exploração sexual comercial e tráfico para esses fins, em uma perspectiva preventiva, faz-se imprescindível mediante a necessidade de oportunizar à comunidade escolar a sensibilização e compreensão sobre o prejuízo dessas diversas formas de violência para o desenvolvimento integral de crianças e adolescentes, bem como assegurar adequado encaminhamento e fluxo, no que concerne à Educação, de modo a garantir sigilo da identidade do educador e da escola e preservar a privacidade da vítima. (Relatório Executivo do Projeto Escola que Protege).
  • 9. Peres VLA & Martins LRR Rev. Psicopedagogia 2012; 29(90): 320-9 328 “outro” para que se sinta socialmente valorizado e reconhecido, como sujeito capaz de se aceitar a si mesmo em suas diferenças, sem potenciali- zar preconceitos e discriminações, é algo que é construído socialmente no ambiente escolar por meio das relações entre os sujeitos. Se o espaço social da escola, como síntese do seu projeto coletivo, transformar-se em um espaço gerador de sentidos para a superação do preconceito e da diferença e se mantiver atento às discrimina- ções de todos os tipos, proporcionando a alunos, funcionários, professores e gestores condições de desenvolvimento humano integral, as possi- bilidades de potencialização da violência podem ser minimizadas. A dimensão da subjetividade social da escola, constituída na alegria, no bem-estar de alunos, professores e funcionários, que fomenta o res- peito ao outro, que cuida da disciplina como um acordo de responsabilidade de todos por todos, no qual o conhecimento seja fonte de desenvol- vimento da autonomia e da criatividade, pode, nessa proposta, ser geradora de condições para eliminação da violência nas escolas. São os su- jeitos historicamente situados em suas relações concretas que estabelecem os significados e sentidos para suas ações individuais e coletivas. Sem dúvida, a escola é o lugar da produção de subjetividades individuais e sociais que se constituem mutuamente. Não há como separar o individual do social no espaço escolar. A política pública pode fomentar condições que favoreçam a transformação social, porém a decisão de fazer com que os objetivos da política se concretizem depende de negociações complexas, nas quais a mobilização da subjetividade dos atores estará sempre muito presente. Por enquanto, para as crianças e os adolescen- tes das diferentes escolas pesquisadas ficam as possibilidades de expressar suas necessidades e motivações por meio da arte e do lúdico. Para os estagiários, ficam as marcas da possibilidade de definirem o humano a partir de sua própria com- plexidade, sem se fecharem nas categorias apriori, muitas vezes definidas pelo modelo biomédico de ciência e assumidas, sem nenhuma crítica, pelas próprias escolas, pela necessidade simplista de se apegarem aos conhecimentos já dados8 . Pensamos que a produção subjetiva, possi- bilitada pelo exercício da imaginação criativa, ajuda a superar as barreiras das condições ob- jetivas, tais como o mau humor, a impaciência, a falta de atenção e a indiferença, todas elas não raramente expressas nas relações entre pro­­­fessores e alunos tanto de escolas públicas quan­­­to privadas1 . Para ilustrar podemos citar as ações de nossos estagiários que, por meio da arte, ajudaram crian- ças e adolescentes a expressarem a realidade so- cial das escolas, nas suas relações com a realidade social mais ampla e, é claro, sempre mediadas por suas emoções, muitas vezes contraditórias. Afinal, todos nós podemos refletir sobre o desafio que é ultrapassar o pensamento da cau- salidade clássica e considerar a subjetividade de alunos e professores, tanto na realização de prá­­­­ticas pedagógicas que atendam à diversidade da sala de aula quanto na busca de um modelo de política educacional que permita produzirem uma convivência pacífica e respeitosa entre eles.
  • 10. A produção subjetiva da violência nas escolas Rev. Psicopedagogia 2012; 29(90): 320-9 329 SUMMARY The subjective production of school violence: direction indicator for evaluation and development of educational policy The authors make a reflection about the subjective production of school violence, knowingly involved, recursively and contradictory, with social subjectivity. Guided by Qualitative Epistemology analyze information built into the Basic Training of pupils of school psychology of the Pontifícia Universidade Católica de Goiás, and as a result have the indicator that public policies, to be effective, need to respond to the unique needs of the school and be inserted in an ethic of responsibility, that is, cause the respect for differences and the active participation of the subjects in their learning and development processes. KEY WORDS: Public policy. Education. Violence. Subjectivity. REFERÊNCIAS 1. González Rey FL. A re-examination of defi- ning moments in Vygotsky’s work and their implications for his continuing legacy. In: Mind, Culture, and Activity; 2011;18(3): 257-75. Disponível em: http://lchc.ucsd.edu/ MCA/Mail/xmcamail.2011_07.dir/pdfE- DxyyPG4hN.pdf 2. González Rey FL. La investigación cualita- tiva em Psicología: rumbos y desafíos: São Paulo: EDUC; 1999. 3. González Rey FL. Pesquisa qualitativa e sub- jetividade. Os processos de construção da informação. São Paulo: Thomson; 2005. 4. González Rey FL. O sujeito que aprende. In: Tacca MC, ed. Aprendizagem e trabalho pe- dagógico. São Paulo: Alínea; 2006. 5. Oliveira RP. Da universalização do ensino fundamental ao desafio da qualidade: uma análise histórica. Educ Soc. 2007;28(100): 661-90. 6. Gonçalves MGM. Psicologia, subjetividade e políticas públicas. São Paulo: Cortez; 2010. 7. González Rey FL. O social na psicologia e a psicologia social. 2004. 8. Morin E. A cabeça bem feita. Repensar a reforma. Reformar o pensamento. Trad. Ja- cobina E. 15ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil; 2008. 9. González Rey FL. Psicoterapia, subjetividade e pós-modernidade. Uma aproximação histó- rico-cultural. São Paulo: Thomson; 2007. 10. Teles AMO. A subjetividade social na escola. Brasília: Paralelo 15; 1999. 11. Francischini R, Souza Neto MO. Enfrenta- mento à violência contra crianças e adoles- centes: Projeto Escola que Protege. Rev Dep Psicol. 2007;19(1):243-51. Trabalho realizado na Pontifícia Universidade Católica de Goiás, Goiânia, GO, Brasil. Artigo recebido: 18/6/2012 Aprovado: 3/9/2012