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Sergio Henrique
Eugenia institucionalizada no Brasil
Sergio Henrique
Publicado em 04/2014. Elaborado em 04/2014.
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Este artigo tem como análise o comportamento do brasileiro diante das dif erenças sociais causadas por
políticas eugênicas que ainda se perpetuam no inconsciente coletivo dos brasileiros.
No período de 1917 a 1936, a eugenia no Brasil produziu mobilização da intelectualidade de f orma que
novas diretrizes educacionais moldassem comportamentos. O boletim de eugenia, periódico dirigido pelo
médico Renato Ferraz Kehl, contribuiu muito para a “novidade científ ica". Tanto o boletim como as
Constituições de 1930 e 1937 f omentaram propostas para a educação relacionada aos ideais eugênicos,
tais como o estímulo à educação [eugênica] para higiene social, a obrigatoriedade, na Constituição de
1937, da educação f ísica, em todos os níveis de ensino, como medida para se alcançar a estética ideal
[eugenia].
A concentração populacional e a estrutura econômica e social embutida no sistema capitalista trouxeram
inúmeros problemas sociais, tais como insalubridade, doenças epidêmicas, péssimas condições de
trabalho e moradia, aumentando ainda mais as discriminações advindas com a f ormação das distintas
classes sociais (Alves, 2001).
Segundo Teixeira (1976), o sistema educacional mantida em razoável f uncionamento até 1930, consistia de
um ensino primário gratuito, mas de oportunidade reduzida, o ensino secundário pago, para servir de
estrangulamento a qualquer desejo de ascensão social, e o ensino superior gratuito de caráter
extremamente inef iciente. Assim, a concepção do sistema escolar brasileiro, entre os anos de 1920 a 1930,
era selecionador e não f ormulador. Diante desta arquitetura, que se visava manter privilégios de camadas
sociais e econômicas mais elevadas, pode-se dizer que a educação servia para a elite brasileira, tanto que
os pais abastados mandavam seus f ilhos estudarem f ora do Brasil (Azevedo, 2005). O sistema de ensino
então impedia a mobilidade social, de f orma a manter certos indivíduos dentro de seu status social.
A Constituição Federa de 1934, pela primeira vez na história brasileira, garantia à educação para todos os
brasileiros. No artigo 150, alínea a, o Plano Nacional de Educação era competência da União, porém a
educação correspondia também à f ixação do Estado Novo, com traços ditatoriais. Na Era Vargas, o
sistema educacional tinha a f inalidade de manipular os subalternos, pois a classe trabalhadora passava a
um ter acesso à escola, mas o tipo de of erta não deveria possibilitar a mobilidade social (Silva e Silva viva,
2006).
Para boa parte dos eugenistas, o f oco eram os jovens em idade escolar despertando neles o
compromisso com os ideais eugênicos, principalmente instruindo os jovens a não realizar matrimônio entre
raças e classes sociais dif erentes, bem como gerar f ilho, entre casais considerados sadios,
eugenicamente, de f orma que contribuísse para a f ormação de uma elite nacional perf eita. O processo de
eugenia no Brasil teve seus pilares construídos graças à Constituição de 1934:
Artigo 138, “a União, os Estados e aos Municípios, nos termos das respectivas leis caberia: a) estimular a
educação eugênica”.
Através dessa alínea, os eugenistas visavam conscientizar os jovens e adultos de f orma que o matrimônio
entre pessoas de uma mesma classe social e étnica deveriam ser à base do aperf eiçoamento da estrutura
social brasileira.
2. É de f ácil constatação, que os ideais de eugenia, e seus def ensores, não encontraram dif iculdades para
incutir suas convicções ideológicas; graças ao dispositivo Constitucional, o pensamento de exclusão
social para melhoria da saúde f ísica e psíquica do povo brasileiro f oi possível.
O Brasil sempre apresentou dif erenças abissais entre as camadas sociais, de f orma que a mobilidade
social estava restrita às classes sociais mais elevadas. Pode-se dizer que a educação voltada para
dif erenciações sociais e étnicas, por longas gerações, possibilitou a criação no inconsciente coletivo, de
que nordestino e negro não tivessem capacidades para acompanhar o desenvolvimento que se esperava
das mentalidades eugênicas.
Essa mentalidade inf luenciou pais, que por sua vez, passou a inf luenciar os f ilhos, de maneira que as
crianças conceituadas como geneticamente propensas (superiores geneticamente) a harmonia social
passassem a discriminar crianças, e até adultos, que tivessem traços caracterizadores de arruaceiros,
pessoas propensas à criminalidade. De certa f orma tais pessoas que se caracterizavam como propensas à
criminalidade eram principalmente da raça negra, o que se explica a segregação, velada, aos negros, para
os morros, de maneira que estes não tivessem contato contínuo com as pessoas consideradas “sangue
bom" - o termo f oi usado por Francis Galton para conceituar pessoas geneticamente propensas à
civilidade, enquanto "sangue ruim" seria indivíduo propenso, geneticamente, a criminalidade.
Não podemos esquecer que a eugenia f oi criada no período em que a Europa apresentava gravíssimos
problemas de higiene, desemprego e problemas sanitários, esse período f oi durante o século XIX, na
Inglaterra, o berço do darwinismo social e da eugenia. Na era vitoriana da Inglaterra, meados do século XIX,
o surgimento e desenvolvimento das indústrias f avoreceu a migração de grande número de pessoas, que
saíam do campo deslumbradas com a potencialidade de trabalho que as cidades poderiam of ertar. Esse
f luxo intenso f ez com que grande parte dos trabalhadores trabalhasse e vivesse sob condições
deploráveis na cidade que cresceu desordenadamente.
Através desses acontecimentos é que despertou interesse dos higienistas, para curar os doentes e evitar
degeneração da população. A burguesia por sua vez, queria se dif erenciar do proletariado, de f orma a
alienar a multidão e dif erenciar-se dela. Não é à toa que teorias f ormuladas por Thomas Malthus,
JeanBaptite de Lamarck e Charles Darwin serviram de base para ideologias de melhoria da qualidade de
vida das pessoas, principalmente através do darwinismo social e, posteriormente, a eugenia. Segundo
postulados eugenistas, a degeneração das virtudes humanas se devia ao cruzamento genético
(miscigenação), ou seja, a f alta de cuidado reprodutivo de pessoas entre várias etnias acabava gerando
indivíduos degenerados, de f orma que somente através da reprodução controlada garantiria o caráter
genético saudável, o que proporcionaria a limpeza das mazelas humanas.
Através desse conceito, muitos cientistas, que def endiam a ideia da reprodução controlada, encorajavam,
com habilidosas persuasões, casamentos entre pessoas com características desejáveis - eugenia positiva
– e desestimulando a reprodução entre os doentes e incapacitados - eugenia negativa. Não podemos
esquecer que esse movimento europeu desencadeou várias políticas segregacionistas mundialmente, de
f orma que as políticas, como nos EUA, por exemplo, e também na Áf rica, não permitissem que os negros
não se misturarem-se com os brancos. Chegava-se ao absurdo de criar duas entradas, distintas, para os
negros e para os brancos.
Pode não parecer, mas tais conceitos ainda são muito visíveis na nossa sociedade brasileira, em pleno
século XXI. As políticas sociais do Governo Federal, que começaram na década de 1990, não vêm
agradando principalmente a elite brasileira, e a antiga classe social C - atualmente existe a nova classe
social média.
O Governo Federal vem colocando em prática a segunda dimensão dos direitos humanos, que é o dever de
f azer, este dever se encontra expresso no artigo 6º da Constituição Federal de 1988. Não se trata como
muitos pensam de f avoritismo as classes sociais esquecidas e subjugadas por séculos. O tratamento que
se dá é o tratamento de tratar desiguais nas medidas de suas desigualdades, de f orma material, pois se
f osse de f orma f ormal, não haveria possibilidade de mobilidade social, perpetuando, assim, as
3. desigualdades sociais no Brasil, que ainda é muito presente.
As f avelas cariocas, por exemplo, representavam construções simbólicas que def inem cidadãos, os
detentores de qualidades negativas, que passam a ser um entrave, obstáculo ao desenvolvimento social
do Brasil.
Por décadas, as f avelas cariocas, por exemplo, passaram a ser o simbolismo de indivíduos não
capacitados para desenvolver o país servindo apenas como f orça braçal. É muito f ácil verif icar essa
premissa, f orça braçal, pois os moradores das f avelas, antes da Constituição Federal 1988, não
conseguiam ascender na mobilidade social e econômica. Somente com a aplicação da segunda dimensão
dos direitos humanos f oi possível que os moradores das f avelas pudessem sair de suas condições
restritivas a qualidade vida, para possibilidades de ascensão social e econômica. Por exemplo, as cotas
nas universidades representam a aplicação da segunda dimensão dos direitos humanos, e os preceitos
contidos no artigo 6º da Constituição Federal de 1988.
Apesar de muitos considerarem que o assistencialismo governamental representa uma maneira de
conseguir eleitores, mesmo que seja somente com essa característica, é que as camadas sociais
reprimidas secularmente puderam ter certa qualidade de vida e possibilidade de ascensão na mobilidade
social e econômica. Também não podemos esquecer que as políticas de intervenção do Estado nos
morros cariocas, para combater os narcotraf icantes, somam-se e concretiza a segunda dimensão dos
direitos humanos, pois não basta dar oportunidades se essas camadas sociais consideradas, até então,
“degeneradas" não possuíssem mecanismos f avoráveis possibilitando o alcançar das oportunidades, dos
direitos constitucionais, se o Estado f osse um mero f acilitador sem dar condições reais de progressão
socioeconômica.
O que vemos no Brasil atual é a luta entre classes, o que também se vê é o conceito ideológico de
décadas construído no inconsciente coletivo, de geração a geração, de f orma que a luta pela
sobrevivência, somada ao narcisismo, não permite, até certo limite, a mobilidade social das classes sociais
“degeneradas”. É f ácil observar em redes sociais a f rase "Eu estudei na universidade f ederal, e não em
particular ". Essa f rase conceitua a prevalência da ideologia eugênica e darwiniana social, de que somente
os capacitados (geneticamente) conseguem ingressar nas universidades f ederais. Já aos indivíduos que
ingressam nas universidades particulares há uma simbologia de que tais pessoas são incapacitadas
intelectualmente (geneticamente), pois se f ossem capacitadas ingressariam numa universidade f ederal.
Essa f orma de pensar mostra que o darwinismo social e a eugenia ainda são muito arraigados na
inconsciente coletivo brasileiro. O que é mais espantoso é ver que esses conceitos estão presentes na
mentalidade dos jovens em pleno século XXI. As cotas nas universidades para os negros são
f errenhamente combatidas pelas pessoas que possuem o darwinismo social em suas concepções de vida,
ou seja, as cotas raciais representam f acilitador às pessoas incapacitadas, geneticamente, o que torna o
desenvolvimento social brasileiro [f uturo] duvidoso.
Nas concepções dos darwinistas sociais, as cotas para os negros nas universidades prejudicariam tanto o
desenvolvimento econômico como social, além disto, a miscigenação resultaria [perpetuaria] na má
qualidade de vida dos brasileiros, como criminalidades diversas. Se o conceito de darwinismo social f or
uma mentira, não se veria justiceiros a quererem manter a “ordem social” através de linchamentos. A justiça
pelas próprias mãos se justif ica, na visão dos justiceiros, se torna legítima pela má atuação do Estado na
(in) segurança pública - o que f oi muito usado na década de 1980, no Rio de Janeiro, na Baixada, com
atuações de justiceiros contratados por comerciantes para dar cabo aos assaltantes. Assim, o Estado é
insuf icientemente capaz de dar proteção aos cidadãos contra ações de marginais, àqueles resta o se
def ender pelo direito natural à vida. O problema f ica grave, pois da inef iciência do Estado, darwinistas
sociais encontram brechas para descarregarem suas investidas preconceituosas contra os “degenerados”.
Das ações constantes se f omenta conceitos darwinistas otimizando no inconsciente coletivo, de cada
cidadão, que certos indivíduos não podem viver em sociedade. Deste modo, não importa as causas que
geraram os comportamentos violentos e criminosos, mas apenas o chancelamento de que as
características étnicas já demonstram a tendência ao crime.
4. Toda criminalidade tem um início, que poderá se desenvolver ao longo da vida do indivíduo. Grande parte
dos criminosos tiveram passados traumáticos, sejam por estupro, conf litos f amiliares chegando ao
abandono e expulsão do lar, f acilidade em adquirir drogas (lícita ou ilícita), principalmente no seio f amiliar,
ou no habitat. Os psicólogos dizem que no meio f amiliar se desenvolvem complexos diversos nos f ilhos,
que se não corrigidos podem desencadear sérios problemas de comportamento na prole. Alf red Adler, o pai
do termo “complexo de inf erioridade” dizia que toda criança nasce com o complexo, e que a educação
f amiliar e social poderão abrandar ou aumentar este complexo. Muito totalitarismo torna as crianças
apáticas e revoltadas descarregando suas f rustrações e descontentamentos contra a própria sociedade
(imago). Quando a criança é mimada pelos pais, a criança passa a subjugar as demais pessoas. Crianças
menosprezadas pelos pais podem desenvolver comportamentos perniciosos a elas mesmas como
masoquismo. Enf im, cada qual desenvolve um comportamento. Eis a importância da educação equilibrada
onde não se menospreza a prole, mas também não a trata com mimos em excessos sendo o equilíbrio
entre os dois, o norte.
Se nos primórdios do darwinismo social e da eugenia procurava-se uma melhoria humana quanto aos
problemas de higiene e criminalidade, com o passar dos séculos se acentuou o complexo de narcisismo. As
dif erenciações sociais no Brasil alimenta o complexo narcisista, onde roupas de grif e, moradias em bairros
nobres e os tipos de empregos e prof issões que atuam, proporcionam dif erenciações capazes de
simbolizar pessoas capacitadas das não capacitadas. Dessa f orma, as pessoas se acham muito melhores
do que de f ato são, ou seja, a autovalorização é o mecanismo de def esa diante do complexo de
inf erioridade. As desigualdades de renda na sociedade cria um mecanismo psíquico e emocional de
superioridade e inf erioridade diante da sobrevivência. Os indivíduos que possuem bom padrão
socioeconômico acham que os desiguais são absolutamente invejosos, ao passo que a os indivíduos que
não conseguem ascender socioeconomicamente, pelas condições sociais e políticas que não f avorecendo
a ascensão social, acham que a elite é soberba, em ambos os casos há um hiato entre ambos gerando
egoísmo, indif erença, ódio e até perseguições nas redes sociais.
Como mudar?
Somente com educação universalista onde não há mais conceitos de “superioridade” e “inf erioridade”, de
“melhor” ou “pior”. Não bastam somente ações governamentais, mas atuações dentro das próprias
f amílias. Com o tempo, conceitos eugenistas e de darwiniano social vão se diluindo e sumindo na
sociedade brasileira. Certo é que as políticas de Estado devem criar mecanismos de ascensão
socioeconômica, mas equânime a todos. As cotas nas universidades são necessárias, no momento, mas o
primordial, que deve ser o pilar da uma sociedade justa, é a estruturação da educação, de f orma que todos
tenham as mesmas condições para, então, agirem igualmente. Também é certo que o Estado deverá tratar
os desiguais de f orma material, como portadores de necessidades especiais, o que não há qualquer
privilégio nisso.
O que se vê atualmente no Brasil, desde a violência aos negros, aos gays, às mulheres, e toda f orma de
barbaridade justif icada, vem a materializar conceitos seculares de eugenia e darwinismo social. Educação
universalista, sem preconceitos de qualquer ordem, seja social, política e religiosa, para que as f uturas
gerações possam viver num Brasil humanizado (artigo 3° da Constituição Federal de 1988).
Outro gravíssimo problema que perpetua o conceito darwiniano social existente diz respeito aos
programas e comerciais televisivos. Mulheres são submetidas a vários momentos constrangedores, de
f orma que a imagem da mulher continue sendo de mero desejo sexual dos homens, em outros momentos
ref orça conceitos preconceituosos e machistas de que a mulher não tem cérebro (inteligência). Em outros
momentos, publicidades chancelam a mulher como libertina. Piadas quanto à morf ologia também são
exploradas e acentuadas sem se importar com o emocional de quem sof re tais piadas.
Assuntos relacionados
Sociologia
Direito Constitucional
5. Autor
Educador, escritor. Artigos publicados nos sites: JusBrasil
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democratico-de-direito). Criador de Direitos do Consumidor em autoescolas
(http://www.transitoescola.net/2012/03/nocoes-de-direito-do-consumidor.html)
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