O professor Carlos Eduardo Gonçalves critica as escolhas do governo em termos de estímulos à economia, afirmando que trouxeram mais inflação sem crescimento. Ele avalia que o Brasil enfrenta uma insuficiência de oferta e corre risco de perder grau de investimento se não mudar de direção. Concessões podem aumentar a oferta, mas é preciso confiança que só virá com mudança de governo.
1. 04/12/2013 às 00h00
"Governo tem feito escolhas erradas"
Por Flavia Lima | De São Paulo
Carlos Eduardo Gonçalves, da FEA-USP: "Corremos risco de rebaixamento"
Os dados do PIB do terceiro trimestre reafirmam que a
experiência heterodoxa não deu certo, afirma Carlos Eduardo
Gonçalves, professor da Faculdade de Economia da USP. Na
avaliação do professor, os números sinalizam que as escolhas que
o governo vem fazendo em termos de estímulos à atividade têm
dado errado e compõem um quadro típico de insuficiência de
oferta, formado por núcleos de inflação pressionados e piora do
déficit externo.
Nesse cenário, nem mesmo as concessões - na direção correta, segundo ele - têm poder para recompor
a credibilidade do governo e reverter o pessimismo do empresariado. A seguir, o principais trechos da
entrevista:
Valor: Como o sr. avalia o PIB do terceiro trimestre?
Carlos Eduardo Gonçalves: Os dados do trimestre sinalizam que as escolhas que o governo vem
fazendo têm sido erradas em termos de estímulos à atividade. A estratégia começou a se montar no
pós-crise. Lá, a presidente Dilma pisou no acelerador acreditando que o crescimento viria com impulso
de demanda. O BC baixou o juro mais do que deveria e o governo forçou uma depreciação do câmbio
em 2012. Ambos trouxeram mais inflação, mas não mais crescimento.
Valor: O nosso problema ainda é no campo da oferta?
Gonçalves: A gente tem um quadro típico de insuficiência de oferta, quando se vê duas coisas
acontecendo ao mesmo tempo: núcleos de inflação subindo e déficit externo abrindo, as transações
correntes piorando. O governo estimula a demanda, mas não tem capacidade doméstica para suprir a
demanda, e aí importa. Os dois pontos dão sinal inequívoco de que a oferta está andando devagar.
Valor: Mas no acumulado de quatro trimestres, o crescimento aumentou e a taxa de investimento
também, não?
Gonçalves: A alta dos investimentos no primeiro semestre foi puxada por estímulos tributários e
creditícios. Se empresto dinheiro a zero em termos reais, a empresa toma, mesmo se vai ter retorno de
1%. Mas será que isso é bom para o país? Mas não foi sempre assim. No começo do governo Dilma, as
políticas implementadas para segurar a inflação e o crescimento do crédito público foram corretas.
Quando começaram a vencer a guerra, o crescimento não veio de imediato e acabaram forçando o
fiscal, o câmbio etc. Quando se aperta todos os estímulos de demanda da economia, ela vai um pouco,
mas não é uma política sustentável. Nos quatro anos de Dilma, considerando crescimento de 2,2% em
2013 e de 2% em 2014, fecharemos com média abaixo de 2%, e inflação média na casa de 6%.
Valor: E as concessões?
Gonçalves: Estão na direção correta e podem aumentar a oferta potencial. Mas o governo danificou
muito a credibilidade e para investir é preciso confiança. Curiosamente, a agenda de concessões não
está conseguindo reverter o pessimismo dos empresários. São eles que estão pessimistas e não só o
professor da USP. Trabalhos acadêmicos apontam que entre 15% e 20% da diferença do nosso PIB per
capita com relação a países como Coreia vem de diferença de infraestrutura.
Valor: E o que fazer?
Gonçalves: Não vamos reverter isso sem mudança de direção abrupta. O setor privado acha que o
governo não gosta muito de mercados. Para reverter isso é preciso mudar o curso da política