O documento discute o conceito de autodesenvolvimento, definido como um processo contínuo no qual o indivíduo é responsável por gerenciar seu próprio desenvolvimento através da reflexão, conhecimento de si mesmo e das condições ao seu redor. A educação deve facilitar esse processo, enquanto a organização deve criar condições que estimulem o autodesenvolvimento em vez de tutelá-lo.
1. AUTODESENVOLVIMENTO: Algumas Idéias
José Gilson Farias Cavalcanti
Comentar o tema autodesenvolvimento é uma tarefa mais complexa do que parece à
primeira vista. Envolve uma compreensão do seu significado, uma concepção do ser
humano, a realidade que o cerca, o processo educativo e seus componentes.
O Dicionário do Aurélio compreende o termo “desenvolver” entre outros significados
como fazer crescer ou medrar; fazer que progrida, aumente, melhore, se adiante; tirar do
invólucro, desenrolar, dar origem, gerar, produzir. De acordo com esses significados
concluímos que desenvolver é uma ação que implica em tirar do invólucro (des-envolver)
o que se tem a desenvolver e fazê-lo crescer, progredir, dando origem a um estado
diferente (desenvolvido). Obviamente, só se pode desenvolver o que existe para ser
desenvolvido.
A aplicação desse conceito de desenvolvimento para o homem requer, ainda que
rapidamente, uma reflexão sobre o ser humano, tarefa muito mais complexa e que traz, na
sua essência, uma impossibilidade de esgotar a reflexão.
Sob um ponto de vista, concebemos a pessoa humana como uma unidade bio-psico-
social-espiritual que tende a se desenvolver nessas dimensões a depender de condições
que podem facilitar ou dificultar esse processo de desenvolvimento. Para o psicólogo
americano Carl Rogers, existe uma tendência à atualização do organismo que, segundo
ele, ultrapassa a acepção médica não ficando restrito, portanto, aos aspectos físicos,
funcionais e corporais. Organismo é o conjunto dos aspectos físicos, psíquicos e
espirituais. A saúde física está condicionada por sentimentos, pensamentos, emoções
tanto quanto pela nutrição, pelo exercício e por outros fatores físicos. Para o organismo,
existe uma influência mútua desses aspectos, verificados, hoje em dia, pela medicina
psicossomática.
O desenvolvimento humano comporta, assim, a atualização das potencialidades do
organismo. E esse processo é contínuo (vivemos aprendendo, acrescentando algo novo)
porque o homem é um eterno vir-a-ser. Nesse processo de desenvolvimento a educação
aparece como uma das formas ou um dos recursos muito importantes. A educação
consiste, a nosso ver, num processo permanente de atualização organísmica do homem,
onde ele é o sujeito do seu processo, porque tem a consciência do ser inacabado que é.
Aqui, começam a emergir duas idéias fundamentais do autodesenvolvimento: o indivíduo
é o gerente do seu processo de desenvolvimento e esse processo é permanente.
2. Enquanto gerente do seu processo de desenvolvimento permanente, há necessidade de a
pessoa conhecer suas potencialidades, interesse, necessidades, habilidades, a realidade em
que está inserido, seus desejos de realização, etc. Esse é um primeiro passo para descobrir
o que é, representa, pois, a “tirada do invólucro” para depois, desenvolver o que existe
para ser desenvolvido.
Esse conhecimento se dá através da reflexão sobre si, o que implica na sua relação com o
mundo. Esta reflexão, que faz parte do processo educativo e, portanto, do
desenvolvimento, é que vai facilitar a tomada de consciência do que é, do que quer e do
que pode ser. A pessoa, e somente ela, pode decidir e ser a maior responsável pelo seu
desenvolvimento. A educação objetiva facilitar essas descobertas e suprir meios para o
desenvolvimento. Precisa, pois, enquanto sistema forma, levar em consideração a
natureza do homem para cumprir o papel facilitador do desenvolvimento de suas
potencialidades, tornado-o mais criativo e transformador da realidade.
Enquanto sistema formal, a educação tem se centrado na infância e na adolescência, nos
processos peculiares do homem nessas fases, extrapolando o conhecimento adquirido à
sua fase adulta.
Há algum tempo, no entanto, os educadores começaram a verificar que os princípios da
educação da criança e do adolescente são diferentes daqueles aplicados ao adulto. E isso
se deve em muito à pedagogia institucional, através dos programas de formação,
treinamento e aperfeiçoamento dos seus recursos humanos.
A educação de adultos se reveste de características próprias. As relações tradicionais
professor-aluno mudam radicalmente; ninguém detém o conhecimento verdadeiro e
absoluto. O que existe é a troca de experiências e a facilitação da aprendizagem de
conteúdos profissionais e culturais estruturados, centrada na realidade de cada pessoa e
nas suas motivações específicas. O professor se transforma num facilitador da
aprendizagem e o grupo assume a responsabilidade das investigações, dos estudos e da
solução para os problemas. São ressaltados a autonomia, o autocontrole e o
desenvolvimento.
3. A prática da educação de adultos tem observado, entre outros, os seguintes princípios:
1. Somente ocorre aprendizado quando há uma forte motivação para tal (os adultos
devem querer aprender).
2. O aprendizado se exerce sobre o que representa aplicação imediata ou o que pode
trazer alguma vantagem (os adultos aprendem o que necessitam aprender).
3. Após 01 (um) ano o adulto esquece 50% do que aprendeu passivamente. Após
02(dois) anos, 83% (os adultos aprendem fazendo).
4. O adulto prefere fazer deduções, baseado em problema e chegar, assim, às regras e
conceitos (os adultos aprendem quando confrontam suas experiências).
5. As experiências prévias afetam a aceitação, ou não, da aprendizagem pelo adulto (os
adultos aprendem quando confrontam suas experiências)
6. Os ambientes por demais estruturados e disciplinadores tendem a inibir a
aprendizagem (os adultos aprendem melhor em ambiente informal)
7. O adulto procura na aprendizagem uma relação de orientação e não de competitividade
(os adultos aprendem quando a avaliação é auto-centrada).
8. A variedade de métodos e processos de ensino ajudam a aprendizagem, quando
aplicados adequadamente (os adultos aprendem quando se variam os métodos de
ensino).
O autodesenvolvimento significa o reconhecimento de que o ser humano, na medida em
que as condições em que ele interage não sejam impeditivas, tende a se desenvolver com
seus próprios esforços, caminhando para a maturidade, não necessitando de tutela, mas de
facilitadores de seu processo.
A criação de condições propícias ao autodesenvolvimento dentro das organizações é uma
forma extremamente positiva pra a humanização da ação coletiva. Há, portanto, um papel
muito importante da organização na facilitação e não na tutela do desenvolvimento das
pessoas. Se a organização não é tutora, ela é um agente de estimulação desse
desenvolvimento.