Luís Gonzaga Nunes move ação de indenização por danos morais e materiais decorrentes de doença ocupacional contra a Viação Planeta Ltda. A sentença do juízo de origem reconheceu a coisa julgada com base em acordo judicial anterior. O Tribunal Regional do Trabalho da 10a Região deu provimento ao recurso ordinário para afastar a coisa julgada, uma vez que a doença foi constatada após o acordo, configurando demanda distinta.
A aplicação da teoria da perda de uma chance na justiça do trabalho
Acórdão do TRT-10
1. PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA DO TRABALHO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO
PROCESSO n.º 0000965-94.2016.5.10.0104 - RECURSO ORDINÁRIO (1009)
RELATOR : DESEMBARGADOR DORIVAL BORGES
RECORRENTE : LUIS GONZAGA NUNES
ADVOGADA : JESILENE RODRIGUES DE LIMA MARTINS - OAB: DF0044544
RECORRIDO : VIACAO PLANETA LTDA
ADVOGADO : MARCUS RUPERTO SOUZA DAS CHAGAS - OAB: DF0012538
EMENTA
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS
DECORRENTES DE DOENÇA OCUPACIONAL. ACORDO
JUDICIAL HOMOLOGADO EM AÇÃO TRABALHISTA
ANTERIOR. COISA JULGADA. EFEITOS. Extraindo-se dos autos
que a doença ocupacional não estava caracterizada à época da primeira
reclamação trabalhista, tendo sido constatada somente após a despedida do
empregado é evidente a ausência de igualdade entre as circunstâncias
fático-jurídicas expostas nas ações, não sendo, portanto, o caso de se
declarar a coisa julgada.
RELATÓRIO
A Exma. Juíza do Trabalho , naELAINE MARY ROSSI DE OLIVEIRA
Titularidade da MM. 4ª Vara do Trabalho de Taguatinga-DF, por intermédio da sentença de Id. 737dfe6,
acolheu a coisa julgada na reclamação trabalhista movida por em desfavor deLUÍS GONZAGA NUNES
., extinguindo o processo, sem resolução de mérito.VIAÇÃO PLANETA LTDA
Recorre da decisão o reclamante, interpondo o recurso ordinário de Id.
e301b25.
A reclamada apresentou contrarrazões (Id. 49ccd1f).
Dispensado o recolhimento das custas processuais.
Dispensada a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, na
forma regimental.
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2. V O T O
ADMISSIBILIDADE
Preenchidos os requisitos objetivos e subjetivos de admissibilidade,
conheço do recurso ordinário e das respectivas contrarrazões.
MÉRITO
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS
DECORRENTES DE DOENÇA OCUPACIONAL. ACORDO JUDICIAL HOMOLOGADO EM
AÇÃO TRABALHISTA ANTERIOR. COISA JULGADA. EFEITOS.
O recorrente insurge-se contra o reconhecimento da coisa julgada e
extinção do processo, aduzindo serem distintos os objetos das reclamações trabalhistas.
A sentença recorrida está assim fundamentada:
"Nos termos do art. 337, §4º, do novo Código de Processo Civil, 'há coisa julgada
quando se repete ação que já foi decidida por decisão transitada em julgado'.
Não obstante a hipótese ora em apreço não se tratar especificamente de repetição de
ação/pedidos, imperioso reconhecer que a manifestação de vontade produzida pelo autor
na reclamação trabalhista que tramitou na 5ª Vara do Trabalho de Taguatinga prejudica a
análise de mérito nesta ação.
Ao entabular acordo com a ora reclamada - empresa para a qual trabalhou por mais de
vinte anos - nos autos da RT nº 0000877-87.2015.5.10.0105, o autor ficou ciente de que
naquela oportunidade estava dando quitação por todas as parcelas vindicadas naquela
ação, assim como também dava quitação pelo extinto contrato de trabalho, o que permite
afirmar que ele, autor, considerava encerrado aquele contrato e que nada mais exigiria em
relação a ele, inclusive na esfera judicial.
No meu sentir, isso também inclui os danos morais e materiais decorrentes de eventual
acidente de trabalho havido no curso da relação de emprego.
Ainda que o autor tenha condições de definir cronologicamente quando o evento danoso
ocorreu; e entender que os pedidos formulado nesta ação não estejam prejudicados pela
coisa julgada firmada na RT nº 0000877-87.2015.5.10.0105, ressalto que as afirmações
feitas em sua réplica contradizem totalmente os termos da exordial.
Ora, se o reclamante entende que teve sua audição comprometida pelo excesso de ruídos
a que era submetido na prestação regular de serviços para a reclamada; e que em face
dessa exposição constante ao agente danoso 'som', por tantos anos, sofreu acidente de
trabalho, nos termos legais, não há que se falar de fato novo.
Muito pelo contrário, o que se pode concluir é que o reclamante tinha plena consciência
de que estava com sua audição prejudicada ao tempo em que formalizou acordo judicial
com a reclamada, na ação que tramitou perante a 5ª Vara do Trabalho de Taguatinga/DF.
Ao formalizar o acordo dando quitação ampla e irrestrita ao contrato de trabalho como
um todo, concluo que o obreiro fez uma manifestação expressa de que não iria mais
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3. demandar a reclamada em Juízo, vindicando parcelas alusivas ao contrato que se
encerrou, incluídas aí parcelas de caráter extrapatrimoniais - ou seja, indenizações por
danos morais e materiais decorrentes do vínculo de emprego.
(...).
Portanto, acolho a preliminar de coisa julgada, e declaro extinto o processo, sem
resolução de mérito, nos termos do art. 485, V, do CPC.
Prejudicada a análise dos demais pleitos." (Id. 737dfe6 - págs. 3/5).
Discute-se nos presentes autos se o acordo homologado no processo nº
0000877-87.2015.5.10.0105, que tramitou perante a 5ª Vara do Trabalho de Taguatinga, no qual o
empregado deu plena, geral e irrevogável quitação do objeto da demanda e do extinto contrato de
trabalho, para nada mais reclamar a qualquer título, alcança também o pedido de indenização por danos
morais e materiais decorrentes de doença ocupacional.
No caso em testilha, percebe-se que o autor não tinha certeza de que estava
perdendo a audição quando da extinção do contrato de trabalho, em 6/12/2013, ou da celebração do
acordo homologado no processo nº 877/2015, ocorrido em 21/9/2015.
A doença foi comprovada e o reclamante teve ciência inequívoca dela
apenas em 4/7/2016, nascendo aí a pretensão indenizatória.
Assim, não é possível inferir que está compreendida na quitação
fomentada pelo acordo homologado a indenização por danos morais e materiais decorrentes de doença
ocupacional constatada somente após a extinção do contrato de trabalho.
A transação deve ser interpretada restritivamente, nos termos do art. 843
do CC.
A fim de corroborar o acima exposto, traz-se à colação o entendimento do
Exmo. Juiz Substituto, Wagson Lindolfo José Filho, do TRT da 14ª Região, nestes termos:
"Em relação ao alcance de acordo trabalhista homologado que confere quitação geral do
extinto contrato de trabalho, há certa cizânia doutrinária e jurisprudencial sobre o assunto.
Uma primeira corrente, capitaneada pelo entendimento contido na OJ 132 da SDI-2 e pela
disposição do art. 584, inc. III, do CPC, ante a existência da situação jurídica da coisa
julgada, obtempera que a quitação geral em acordo homologado judicialmente em
reclamação trabalhista, sem qualquer ressalva, atinge todas as parcelas relativas ao
contrato de emprego extinto, inclusive pedido de indenização por danos morais e
materiais decorrentes de doença profissional constatada posteriormente.
Por outro lado, uma segunda corrente, calcada nos princípios na dignidade da pessoa
humana e nos valores sociais do trabalho, propugna que o acordo trabalhista não abarca
pretensões ressarcitórias constatadas posteriormente, uma vez que não é dado ao
empregado renunciar direitos indisponíveis que dizem respeito à matérias de ordem
pública afetas à saúde e segurança no trabalho.
O acerto, salvo melhor juízo, parece estar com a segunda corrente esposada. Ora, a
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4. eficácia liberatória geral de acordo trabalhista deve ser vista com certa parcimônia,
mormente no que diz respeito às pretensões reparatórias advindas de doença ocupacional.
Devido ao seu caráter insidioso e de segregação latente, a doença ocupacional muitas das
vezes se manifesta em momento posterior à terminação do vínculo contratual ou da
entabulação de acordo, tanto é verdade que a prescrição destas pretensões reparatórias
conta-se a partir da ciência inequívoca da incapacidade laboral pela vítima, consoante
entendimento contido na súmula 230 do STF e súmula 278 do STJ.
Assim, por meio de interpretação teleológica e prospectiva, o acordo que confere quitação
quanto aos direitos decorrentes do extinto contrato de trabalho não abarcaria o pedido de
indenização decorrente de doença ocupacional verificada em momento posterior.
Outrossim, a responsabilidade civil de reparação de danos é de natureza extracontratual
(aquiliana) e, ainda que permeie o contrato de trabalho, seu real supedâneo estende-se
para além do pacto trabalhista, fincando suas raízes na Teoria Geral do Direito e
legislação civil comum. Se o direito de reparação de danos não tem natureza contratual e
sim extracontratual (dever geral de cautela), a quitação geral do contrato de trabalho não
o alcança e sobre ele não produz nenhum efeito."
(http://www.magistradotrabalhista.com.br/2014/04/transacao-judicial-quitacao-geral.html).
Extraindo-se dos autos que a doença ocupacional não estava caracterizada
à época da primeira reclamação trabalhista, tendo sido constatada somente após a despedida do
empregado é evidente a ausência de igualdade entre as circunstâncias fático-jurídicas expostas nas ações,
não sendo, portanto, o caso de se declarar a coisa julgada.
Por fim, ainda que esteja consignado que "o(a) reclamante dá geral e
plena quitação pelo objeto da inicial e extinto contrato de trabalho, ficando estipulada multa de 100%
", tal fato não pode inviabilizar o direito do reclamante de ver apreciada a suaem caso de inadimplência
demanda, notadamente quando relacionada a outros direitos trabalhistas.
Data vênia ao entendimento da i. Magistrada sentenciante, compreendo
que não há como conferir amplitude ao acordo homologado judicialmente.
Nesse cenário, dou provimento ao recurso para afastar a coisa julgada e
determinar o envio dos autos ao juízo de origem para que prossiga no feito como entender de direito.
Recurso provido.
CONCLUSÃO
Em face do exposto, conheço do recurso ordinário e, no mérito, dou-lhe
provimento para afastar a coisa julgada e determinar o envio dos autos ao juízo de origem para que
prossiga no feito como entender de direito, tudo nos termos da fundamentação.
ACÓRDÃO
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5. Por tais fundamentos,
ACORDAM os Desembargadores da Primeira Turma do Tribunal
Regional do Trabalho da 10ª Região, em sessão realizada na data e nos termos da respectiva certidão de
julgamento, aprovar o relatório, conhecer do recurso ordinário e, no mérito, dar-lhe provimento para
afastar a coisa julgada e determinar o envio dos autos ao juízo de origem para que prossiga no feito
, nos termos do voto do Desembargador Relator. Ementa aprovada.como entender de direito
ACORDAM os Desembargadores da Primeira Turma do Tribunal
Regional do Trabalho da 10ª Região, por unanimidade, aprovar o relatório, conhecer do recurso ordinário
e, no mérito, dar-lhe provimento para afastar a coisa julgada e determinar o envio dos autos ao juízo de
, nos termos do voto do Desembargadororigem para que prossiga no feito como entender de direito
Relator e com ressalvas da Desª Elaine Vasconcelos. Ementa aprovada.
Participaram deste julgamento os Desembargadores Grijalbo Coutinho,
com a presença dos Desembargadores Elaine Vasconcelos e Dorival Borges de Souza Neto
Ausentes, em gozo de férias, os Desembargadores Flávia Falcão e André
Damasceno.
Pelo MPT o(a) Dr(a). Soraya Tabet Souto Maior.
Brasília, 25 de janeiro de 2017 (4ª feira).
DORIVAL BORGES
Desembargador Relator
DECLARAÇÃO DE VOTO
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