A Unilever desenvolveu um programa chamado Sortimento Ideal para recomendar quais produtos cada supermercado deve exibir com base no espaço disponível e perfil dos clientes. Isso levou a aumentos de vendas de até 100% em categorias como desodorantes e xampus. O sistema é benéfico mesmo para pequenas lojas e deve ser constantemente revisado para acompanhar lançamentos e mudanças de comportamento.
Conferência SC 24 | Estratégias de precificação para múltiplos canais de venda
Sortimento Ideal Unilever
1. 19 Estratégia Supermercado moderno • julho 2011
Por Fernando Salles | salles@lund.com.br
Sortimento ideal
Unilever define mix de
80 mil pontos de venda
C
om nove lojas em São Paulo, a
desde 2008 a fabricante indica quais rede de supermercados D’Avó
produtos são recomendados para o mix percebeu há pouco mais de
dois anos que precisava revi-
de cada perfil de loja, considerando sar os planogramas de expo-
espaço físico e comportamento dos sição de algumas categorias
de produtos. “Tínhamos um
clientes. Saiba como funciona e conheça monte de itens e as lojas estavam uma bagunça”, re-
as vantagens de dividir essa conhece Flávio Rocha de Avó, diretor comercial. “Era
preciso ajustar o mix e garantir maior visibilidade aos
responsabilidade com a indústria. itens mais importantes”, completa. O trabalho já tinha
começado no momento em que, por uma feliz coinci-
dência, a equipe da Unilever chegou com uma propos-
ta para implementar um projeto novo, que prometia
levar a cada loja o sortimento que melhor
atende às necessidades do público.
Um dos primeiros traba-
lhos realizados no D’Avó
com o apoio da indús-
tria teve como alvo os
desodorantes. A rede
comprava tantos SKUs
da categoria que nem
todos cabiam na gôndo-
la: era preciso fazer um ro-
dízio de itens na exposição!
“Com isso, não conseguíamos
fidelizar a clientela, pois muitos
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Sortimento ideal
redução de 15% no mix de desodorantes do D’Avó A história do D’Avó é uma das
experiências bem-sucedidas de um
levou a uma alta de 100% nas vendas da categoria projeto desenvolvido pela Unilever
em meados de 2008, após executi-
consumidores não substituíam o vos de diversas áreas se reunirem para traçar estraté-
produto que faltava, e acabavam gias para os próximos cinco anos. Dois dos assuntos
comprando em outra loja”, lem- das reuniões foram a evolução do varejo e as pos-
bra o diretor comercial do D’Avó. síveis formas de a empresa atender melhor diferen-
Sob orientação da Unilever, o mix tes canais de venda. As discussões foram o primeiro
da categoria diminuiu 15%. “Com passo para a empresa definir uma segmentação mais
menos itens, dobramos as vendas”, profunda de cada tipo de loja.
comemora o diretor comercial. Surgia então o Sortimento Ideal, na época um
programa, hoje parte integrante das estratégias da
companhia e realidade em 80 mil dos 400 mil pontos
de venda atendidos pela Unilever no Brasil. A ideia
É comum o varejo
consiste em oferecer aos varejistas um sortimento
perder espaço nas adequado às características e ao perfil do público de
gôndolas com cada loja. Isso com um nível de especificação mais
profundo do que o do gerenciamento por categorias,
itens de baixo giro. trabalho que a empresa realiza há mais tempo.
A adequação do
sortimento minimiza o Ajustes no mix
Menos pode ser mais
problema.”
Para chegar a essa segmentação aprofundada, a
AlexAndre mirAndA,
unilever fabricante deixou de lado classificações genéricas
como “hipermercado” e “supermercado” para divi-
dir o varejo em 17 subcanais, entre os quais lojas
grandes de baixa renda, lojas pequenas de alta ren-
da, entre outros. A lógica do sistema é reconhecer
algo que muitas indústrias não admitem: nem todo
o portfólio de produtos tem oportunidade de ven-
das em absolutamente todas as lojas.
“Olhamos cada subcanal a partir da ótica do
shopper”, resume Alexandre Miranda, diretor de
trade marketing da empresa. Com esse olhar mais
apurado, a Unilever observou que é muito comum
o varejo perder espaço de gôndola com itens de
baixo giro, ao mesmo tempo que SKUs importantes
ficam de fora ou são subaproveitados. Exatamente
como ocorreu no supermercado D’Avó.
joão De freitAs
Desde o início da implantação do Sortimento
Ideal, a Unilever vem adequando o mix do varejo
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Sortimento ideal
Considerando apenas os sabores líderes de venda,
o aumento verificado foi ainda maior: 50%.
CuidAdos Com o CAbelo
exposição agradável e fundamentada
Exemplo parecido aconteceu com os shampoos e
pós-shampoos da marca Dove. Do portfólio de 60
joão De freitAs
itens, pelo menos metade das vendas ficava concen-
trada em 14 SKUs. Na aplicação do Sortimento Ide-
al, esses itens principais ganharam mais espaço nas
Produtos para cabelo: exposição gôndolas. Em cinco meses, as lojas que aderiram
conforme a árvore de decisão facilita ao
público encontrar o que procura venderam, em média, 15% mais. A marca Dove, es-
pecificamente, registrou aumento de 23%. Além do
aperfeiçoamento, o resultado foi influenciado pelo
em um movimento que consi- relançamento da linha, que contou com o auxílio
dera o espaço físico disponível, de uma intensa campanha de mídia.
o perfil do shopper, a árvore de Para a rede D’Avó, os ganhos na seção de cuida-
decisão de compra e as vendas dos com o cabelo foram além da marca Dove. Do
por canal. Mais do que isso, o trabalho em parceria com a Unilever resultou não
acompanhamento próximo de só um sortimento ajustado, mas uma gôndola que
cada subcanal influenciou al- hoje reflete a árvore de decisão do shopper. Flá-
terações no próprio portfólio vio Rocha de Avó explica que antes a organização
da empresa: eram 950 itens fa- partia do tipo de produto, como shampoo, condi-
bricados no início do processo, cionador e creme para tratamento. O problema é
número que caiu para que a escolha de compra não é feita dessa forma.
14 itens de dove 760 SKUs no final do A solução foi agrupar as diferentes subcategorias
ano passado. dentro de cada tipo de tratamento. Na área des-
respondiam por É o caso da catego- tinada a cabelos oleosos, por exemplo, estão os
50% do mercado. ria de bebida à base de shampoos, condicionadores e cremes destinados
eles ganharam soja. O portfólio tinha a esse tipo de cabelo. Só depois aparecem os itens
expandido tanto, que para cabelo seco e assim por diante. “A organi-
espaço e a marca sacrificava a expo- zação anterior era confusa para o consumidor e
cresceu 23%. sição dos itens mais também para o repositor. A mudança tornou mais
importantes. Até que fácil a reposição e, com os blocos de cores bem
a empresa parou para analisar definidos, o visual do setor ficou mais agradável”,
um levantamento interno e per- afirma o diretor comercial.
cebeu que apenas cinco sabores
representavam 60% das vendas: Projeto-Piloto:
laranja, uva, pêssego, abacaxi e Alternativa para testar a fórmula
maçã. Após cortar alguns itens
excedentes, as vendas da empre- Esses bons resultados diminuem a resistência por
sa na categoria cresceram 40%. parte do varejo a um sistema pelo qual a indústria
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Sortimento ideal
sugere o que a loja deve comprar, pro- bém à melhora na experiência de compra do
cesso bem diferente do habitual. Por shopper”, comenta Adilson Corrêa, gerente co-
essa razão, uma estratégia da Unilever mercial do supermercado Muffato.
para evitar que os supermercados tor- Na rede paranaense, o Sortimento Ideal foi
çam o nariz para a ideia é realizar pro- realizado em bebida à base de soja, shampoos,
jetos-piloto. Foi a partir de um desses condicionadores, desodorantes e também em
testes que o Sortimento Ideal chegou algumas categorias do setor de limpeza, sem-
no ano passado ao Super Muffato, pre com aumento de vendas superior a 6%. En-
maior rede do autosserviço paranaen- tre os resultados, houve ainda diminuição de
se. “Temos um ótimo relacionamento ruptura nos SKUs com mais volume de vendas,
profissional com a Unilever e aceita- o que elevou o giro. Outro ganho relatado tem
mos fazer esses ajustes de sortimento relação com o estoque. “Passamos a ter um sor-
em algumas categorias de produtos, timento mais adequado e, como consequência,
visando sempre à redução da ruptura, o valor do estoque mais ajustado, melhorando
ao aumento da lucratividade e tam- assim nosso fluxo de caixa”, afirma Adilson.
o esforço da indústria para contribuir na definição do sortimento no varejo tem a
ver com a segmentação de compras do consumidor em vários canais
Uma resistência inicial do varejo é encarada
com naturalidade. Aliás, a Unilever enfrentou
esse problema até internamente, já que nem to-
dos os vendedores entendiam que era possível
vender mais apesar da retirada de alguns itens
do portfólio disponível a cada cliente. Foi preci-
so treinar a equipe para levar adiante o novo sis-
tema. Hoje, além das metas de venda, a remune-
ração variável dos vendedores depende também
da implantação do Sortimento Ideal
Para Ari Kertesz, sócio da consultoria in-
ternacional McKinsey, o trabalho realizado
por fabricantes para chegar ao sortimento
mais adequado a cada perfil de loja está ali-
nhado com as mudanças no comportamento
de compra, intensificadas nos últimos anos.
joão De freitAs
Ele lembra que, cada vez mais, o consumidor
segmenta a compra a partir de intenções dife-
rentes. Ou seja, busca em locais dis-
sortimento ideal tintos diferentes produtos. Segundo
privilegia exposição dos Kertesz, definir um sortimento sem
principais sabores de
Ades, responsáveis por considerar as preferências do públi-
60% das vendas co significa ter na gôndola itens de
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Sortimento ideal
evitar erros desse tipo. Uma vez
implantado, porém, o problema
não está resolvido por completo. É
importante fazer revisões e ajustar
o processo constantemente. Uma
das ocasiões em que isso deve ser
feito é no momento em que a in-
dústria parceira apresenta um lan-
çamento. Segundo Kertesz, o pro-
cesso ideal seria o varejo destinar
uma parte da gôndola à exposição
As
de inovações, entre outras razões
joão De freit
indisponível porque a presença nos pontos de
para duas lojas venda incentiva a experimenta-
do Futurama, os
potinhos de ção. Como na prática a maioria
caldo Knorr giro baixo ocupando o lugar da- das empresas do setor não consegue fazer isso, o
eram solicitados
queles que venderiam bastante consultor explica que o processo natural deve ser
pelos clientes, o
que motivou a se lá estivessem. a inclusão da novidade em substituição a um item
unilever a rever retirado do mix. Em alguns casos, no entanto, a
o programa para
a rede nAs lojAs PequenAs, escolha pode ser simplesmente descartar a novi-
Mais benefícios para o melhor mix dade. “Quanto mais SKUs, mais complexo é o sor-
timento. E nem tudo vende”, ressalta.
Segundo o sócio da McKinsey, o Mesmo quando não há novidades, as revisões
sistema é válido para todo o vare- precisam ser feitas. “O ideal é rever o processo a
jo, porém ainda mais importante cada três meses ou, no máximo, seis”, afirma o sócio
nos pequenos e médios. “Para o da McKinsey. Na rede Futurama, nove lojas em São
de menor porte, cada erro gera Paulo, foi preciso rever uma das definições do pro-
um impacto bem maior. Se uma grama da Unilever. Gabriel Habka Pedroso, super-
loja tem espaço para cinco sabo- visor comercial, lembra que, na recomendação da
indústria, duas lojas não se en-
Com a indústria sugerindo o mix, a briga por preço nas quadravam no perfil de público
negociações dará lugar a discussões mais estratégicas dos potinhos de caldo Knorr,
lançados com comerciais na
res de suco e expõe dois que não TV em que eram indicados pelo chef Alex Atala.
vendem bem, quase metade da Os consumidores das duas unidades, a maioria da
gôndola fica ociosa”, lembra. Em classe C, passaram a reclamar da ausência do pro-
sua experiência profissional, Ker- duto. “Tentávamos pedir, mas o vendedor sequer
tesz afirma já ter trabalhado com tinha o item cadastrado no Palmtop”, lembra. Se-
varejistas que compravam 400 gundo Pedroso, ao ouvir a reclamação, a primeira
SKUs de segmentos em que pode- orientação da Unilever foi para a rede repassar par-
riam ter, no máximo, 130. te do produto destinado a outras lojas para as duas
Um bom trabalho em con- unidades que não recebiam diretamente, o que não
junto com a indústria tende a era a solução ideal. “Dois ou três meses depois, eles
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Sortimento ideal
revisaram a estratégia e passamos diFerentes FormAtos
a comprar direto para todas as Parceria garante clusterização
nossas lojas”, afirma o supervisor
comercial da rede Futurama. Para Kertesz, da McKinsey, outra vantagem desse
Apesar do problema inicial, tipo de experiência é assegurar diferenciação no
Pedroso avalia como positiva mix das redes que atuam com diversos formatos
a parceria com a Unilever. De de loja. O trabalho com o sortimento recomenda-
acordo com ele, hoje as lojas do do pode ser feito, inclusive, por meio de distribui-
Futurama aproveitam melhor dores, desde que sejam bem treinados para atuar
o espaço de exposição, contam nesse sistema. Nas negociações, a tendência é que a
com comunicação visual que velha briga por preço dê lugar a discussões mais es-
ajuda na organização das gôn- tratégicas. Também pode significar o fim da prática
dolas, além de promotores da da indústria de, no final do mês, empurrar produ-
Unilever que oferecem apoio até tos em promoção para fechar metas, deixando nos
por volta das 17 horas. “Sem o estoques do varejo verdadeiros “micos”.
trabalho conjunto, dificilmente Apesar dos benefícios relatados, o sistema não
conseguiríamos todo esse su- é unanimidade no varejo. Com a condição de não
porte”, afirma o executivo. ter seu nome revelado, o diretor comercial de uma
rede atendida pela Unilever afir-
em projetos como o sortimento compartilhado com o mou não ser simpático à ideia de
fabricante, o ideal é testar o modelo por um período o fabricante apontar o que deve
ser adquirido. “Entendo essa
postura mais como uma imposição”, afirma. “Na
EntEnda o sistEma da UnilEvEr
versão aerossol do desodorante Axe, a Unilever nos
Como funCiona dá poucas opções de fragrância, enquanto as far-
A Unilever sugere os produtos de seu portfólio mais mácias contam com diversas variantes. Quero que
indicados para integrar o sortimento de cada loja. A
definição considera fatores como perfil do shopper, espaço
meu cliente tenha opção de escolha”, completa.
físico da loja e árvore de decisão da categoria. Cabe a você avaliar se o sistema se aplica à sua
loja. Vale dizer que a sugestão de mix pela indústria
onde foi implantado
começa a se tornar mais comum. Segundo varejis-
O sistema já é realidade em 80 mil pontos de venda,
divididos em 17 subcanais de acordo com suas características
tas e consultores, a prática já é adotada por outras
companhias, como Procter & Gamble e Colgate-
Vantagens para o Varejo Palmolive. Quando esses ou outros fornecedores
Melhor aproveitamento do espaço de exposição, aumento
sugerirem a implantação no seu supermercado, a
de giro, diminuição da ruptura e do estoque parado estão
entre os principais benefícios do sistema para os super e melhor saída pode ser testar os resultados por um
hipermercados. Outra vantagem é a possibilidade de tornar determinado período. Dessa forma, você terá cer-
as discussões com a indústria mais estratégicas. teza se o modelo deve ser aceito, ajustado ou mes-
mo descartado, dependendo das dificuldades. Sm
prinCipais desafios
A implantação depende de uma mudança de cultura na
área comercial das empresas, já que o fabricante deixa de Mai s i nforM ações:
figurar no lado oposto da batalha comercial para se tornar D’avó: www.davo.com.br
um parceiro. O processo também exige revisões constantes, futurama: www.superfuturama.com.br
McKinsey: (11) 5189-1400
a cada três meses ou, no máximo, seis. super Muffato: www.supermuffato.com.br
Unilever: www.unilever.com.br