O documento discute a importância do planejamento no ensino da alfabetização e da língua portuguesa. Aborda quatro eixos do planejamento: leitura, produção de texto escrito, oralidade e análise linguística. Também discute a organização do planejamento anual e da rotina escolar para contemplar esses diferentes eixos de forma equilibrada ao longo do ano letivo.
1. Pacto Nacional pela
Alfabetização na Idade Certa
Orientadora de Estudos: Juliana M. A. Vieira
Unidade 2 - Planejamento e Rotina
Ano 1- Planejamento Escolar: Alfabetização e Ensino Da Língua
Portuguesa
Por que planejar o ensino?
Precisamos planejar para fazermos escolhas coerentes, organizar nossas
rotinas, ter nossos objetivos delimitados, saber aonde queremos chegar e o
que precisamos ensinar aos nossos alunos. Para tanto, é necessário termos
uma visão do processo mais amplo de aprendizado que será desenvolvido
durante todo o ano letivo, mas também do processo micro, revelado por meio
de um planejamento mais pontual, marcado por intervalos de tempo.
Para planejar o processo de alfabetização e ensino/aprendizagem da Língua
Portuguesa tomamos quatro eixos direcionadores: leitura, produção de texto
escrito, oralidade e análise linguística, incluindo a apropriação do Sistema de
Escrita Alfabética - SEA.
A leitura
A leitura envolve a aprendizagem de diferentes habilidades, tais como:
(i) o domínio da mecânica que implica na transformação dos signos escritos em
informações,
(ii) a compreensão das informações explícitas e implícitas do texto lido e
(iii) a construção de sentidos. As referidas habilidades inter-relacionam-se e
não podem ser pensadas hierarquicamente.
Quanto maior for a experiência de ouvir e ler textos, mais elaborada será a
produção de sentidos por parte do leitor. No processo inicial de apropriação do
Sistema de Escrita Alfabética, cabe ao professor ser o mediador da turma,
auxiliando os alunos na elaboração de objetivos e expectativas de leitura, na
criação de hipóteses antes e durante o ato de ler, correlacionando os
conhecimentos prévios dos aprendizes com aqueles que se pode reconhecer
no texto, sejam explícitos ou implícitos.
Em nosso dia a dia, utilizamos a leitura com diferentes objetivos (lemos para
obter informações sobre um assunto específico, para localizarmos uma rua,
para seguirmos prescrições médicas, para nos distrairmos), os quais
direcionam nossas atitudes diante do texto. São essas estratégias, práticas
sociais que vivenciamos em nossas ações de leitores competentes, que devem
ser tomadas como base para o ensino e o trabalho na sala de aula com a
leitura, diminuindo cada vez mais as atividades artificiais e proporcionando,
com mais intensidade, atividades próximas às práticas sociais de letramento.
2. A produção de textos
Entendemos que o texto a ser escrito pelas crianças pode ser longo ou curto,
conhecido ou não. A letra de uma cantiga, uma quadrinha, um poema, um
provérbio, um dito popular, uma história, um bilhete, um cartaz, um aviso são
alguns exemplos de textos a serem escritos em sala de aula. A escolha do que
a criança irá escrever irá depender da situação comunicativa proposta pelo
professor.
Partindo desta concepção, defendemos a ideia de que a criança pode e deve
escrever espontaneamente desde as primeiras semanas de aula. É necessário,
entretanto, que o docente compreenda que copiar não é sinônimo de escrever,
embora seja uma habilidade necessária a ser desenvolvida durante a
alfabetização.
O papel do professor de revisor do texto para que possa ser exibido em mural é
importante porque, interagindo neste tipo de situação, a criança pode aprender
que existe uma convenção social que dita as regras da escrita, as quais serão
aprendidas no decorrer dos anos.
A produção de textos, na escola, pode se dar de diferentes formas:
coletivamente, por meio de um escriba que geralmente é o professor; em
dupla; ou individualmente. Quando o professor atua como escriba, ensina às
crianças as diferenças entre linguagem oral e escrita, a organização das ideias,
a importância de sempre revisar o que foi produzido, a desenvolverem suas
próprias estratégias de registro e a se assumirem como autores. O trabalho em
dupla é um recurso metodológico interessante porque permite às crianças
interagirem, trocarem informações e resolverem conflitos, o que favorece a
participação mais efetiva. Ao produzirem o texto, as crianças confrontam suas
hipóteses, negociam a escrita e auxiliam umas às outras em suas reflexões,
tanto a respeito do sistema de escrita, quanto à organização do texto.
Tal tipo de atividade é, sem dúvida, muito importante, no entanto, para que as
crianças aprendam a escrever textos é preciso variar as situações de produção
quanto às dimensões da escrita a serem contempladas:
(i) registro de um texto que se sabe de cor;
(ii) a reescrita de textos, em que as crianças sabem o conteúdo do texto, mas
precisam recuperá-lo e escrever de outro modo, pensando em “como dizer”;
(iii) escrita autoral de textos, em que os estudantes precisam definir o que vão
dizer e como vão dizer.
A oralidade
Ser competente em diferentes situações discursivas orais engloba, em primeira
instância, saber adequar sua linguagem ao contexto ou ao evento em que
estamos inseridos. Demanda, também, saber as regras de convivência e de
comportamento segundo as quais os espaços sociais estão organizados e,
ainda, saber monitorar a fala e a escuta em situações formais.
O trabalho com a linguagem oral também deve ser planejado e organizado
assim como os demais eixos do ensino e aprendizagem do Ciclo de
Alfabetização
(e outros, ao longo da escolaridade). O professor precisa levar em conta os
usos que fazemos da oralidade na sociedade, promovendo atividades
sistemáticas que envolvam os gêneros orais como, por exemplo, apresentação
de trabalhos, participação em entrevistas, contação de histórias.
3. O alargamento das práticas de oralidade significa o direito de apreensão de um
instrumento necessário não só para a vida escolar, mas também para a vida
em sociedade. Esta é uma formação que visa o exercício da cidadania.
A análise linguística - apropriação do Sistema de Escrita Alfabética
A apropriação do sistema de escrita está diretamente relacionada com a
capacidade de se pensar sobre a língua. O processo de análise linguística nos
anos iniciais precisa estar voltado para as reflexões acerca da língua e de seu
funcionamento e é necessário que seja desenvolvido concomitantemente com
a apropriação dos usos e funções sociais dos gêneros textuais, da leitura, da
produção de textos e da linguagem oral.
Os conhecimentos envolvidos no eixo de apropriação do Sistema de Escrita
Alfabética vão desde a capacidade da criança de reproduzir seu nome próprio,
mesmo antes de poder escrever outras palavras, diferenciar os tipos de letras e
outros recursos gráficos, até aspectos relativos ao domínio das
correspondências entre letras ou grupos de letras e fonemas. Assim, a criança
precisa conhecer todas as letras do alfabeto, seus respectivos nomes e
diferentes formas de grafá-las; perceber as relações que existem entre som-
letra, por meio do desenvolvimento da consciência fonológica. E, por fim,
precisa aprender sobre a ortografia.
Na prática, a apropriação do sistema alfabético pode se dar por meio de jogos,
atividades lúdicas, atividades de composição e decomposição de palavras,
favorecendo a reflexão acerca de segmentos linguísticos menores, como as
sílabas e os fonemas.
Todo o trabalho com a alfabetização na perspectiva do letramento está pautado
na busca da realização de atividades que levem em consideração os usos
sociais da língua escrita, não somente os escolares, mas também os relativos a
outras esferas sociais. Como bem destaca Kleiman (2005, p.33):
As práticas de letramento fora da escola têm objetivos sociais relevantes
para os participantes da situação. As práticas de letramento escolares
visam ao desenvolvimento de habilidades e competências no aluno e isso
pode, ou não, ser relevante para o estudante. Essa diferença afeta a
relação com a língua escrita e é uma das razões pelas quais a língua
escrita é uma das barreiras mais difíceis de serem transpostas por
pessoas que vêm de comunidades em que a escrita é pouco ou nada
usada.
Importância da organização de planos anuais
Como planejar o que vou ensinar durante um ano inteiro se nem conheço
minha turma ainda? Por que elaborar um plano anual se todo dia eu faço um
roteiro para as minhas aulas? Questões como essas podem vir à mente
quando pensamos na organização do plano anual. Fazer uma avaliação
diagnóstica no início do ano é fundamental.
Conhecer a turma com a qual vamos trabalhar é essencial para delimitarmos
nossos objetivos, e termos um ponto de partida (leia-se um plano anual) que
sirva de referência para nosso trabalho é imprescindível.
Ao organizarmos planos anuais, visualizamos aspectos mais amplos do
trabalho de alfabetização e letramento e tomamos decisões gerais
concernentes ao processo ensino/aprendizagem como, por exemplo, decidir os
critérios a serem usados para escolher textos a serem utilizados; selecionar
4. quais gêneros textuais usar e com que frequência; definir quando nossos
alunos vão começar a produzir textos – se antes de saberem escrever
convencionalmente ou só depois de terem memorizado um conjunto de
palavras; decidir que tipo de atividade será utilizada para desenvolver a
linguagem oral; eleger qual unidade linguística será o ponto de partida para
ensinarmos o sistema de escrita e com base em qual contexto.
Como podemos ver, o plano anual, além de organizar os conhecimentos a
serem desenvolvidos durante um ano letivo, revela nossas escolhas com
relação ao que vamos ensinar aos nossos alunos, antes mesmo de conhecê-
los. Destaque-se, entretanto, que além de se ter como foco os direitos de
aprendizagem e as experiências acumuladas, a ênfase a ser dada a cada tipo
de atividade será dirigida pelo resultado da avaliação diagnóstica e pelo que foi
decidido (pela escola, pela Secretaria de Educação, e pela professora) sobre o
que será ensinado naquele ano, tanto em relação aos eixos de ensino do
componente curricular Língua Portuguesa, quanto no que se refere às outras
áreas de conhecimento.
Ano 2- A Organização do Planejamento e da Rotina no Ciclo De
Alfabetização na Perspectiva do Letramento
Por meio do planejamento o professor pode organizar, didática e
pedagogicamente, o trabalho a ser desenvolvido e o tempo a ser destinado
para cada ação.
Segundo Libâneo (1994), o planejamento é um processo de racionalização,
organização e coordenação da ação docente, articulando a atividade escolar e
a problemática do contexto social. Esses planos de ação podem se configurar
como educacional, escolar, curricular e de ensino.
Para cada um deles existem conteúdos procedimentais, atitudinais e
conceituais, bem como ações e estratégias específicas para a sua efetivação.
Cabe a cada escola elaborar um plano escolar sobre a organização, o
funcionamento e a proposta pedagógica da instituição. Nesse contexto, a
proposta curricular deve orientar quanto às experiências de aprendizagem a
serem oferecidas à criança na escola. Com base nos planos elencados, o
coletivo de professores deve elaborar um planejamento de ensino para o ciclo
de alfabetização que vise à definição das ações concretas para as situações do
trabalho pedagógico, com o objetivo de possibilitar a apropriação e a
consolidação da alfabetização.
A rotina escolar, nessa dimensão, passa a ser um momento de escolhas e
decisões didáticas e pedagógicas baseadas na reflexão sobre como agir e
sobre as suas possibilidades. Para planejar é importante ter consciência dos
direitos de aprendizagem no ciclo de alfabetização, estabelecendo uma
progressão no ensino que proporciona a progressão nas aprendizagens a cada
ano.
Ou seja, é necessário organizar nossa ação em relação a: Quais nossas
prioridades no ensino a cada ano? O que as crianças já sabem? O que
esperamos que os alunos aprendam?
Como planejamos os eixos do ensino do componente curricular Língua
Portuguesa e como os distribuímos ao longo da semana? Em quais critérios
nos baseamos para fazer a escolha da frequência de cada um deles? Como
buscamos explorá-los?
5. Em relação à presença dos eixos do componente curricular Língua Portuguesa,
nas dezenove obras aprovadas no PNLD 2010, a análise das coleções
evidenciou alguns avanços e limites em relação a cada eixo de ensino:
• Leitura: crescente exploração da diversidade textual (circulação, gênero,
tamanho, autores), presença de textos curtos, exploração das estratégias de
leitura, do vocabulário e do contexto de produção;
• Produção de textos: exploração do contexto de produção, destinatários e
objetivos específicos de cada gênero a ser trabalhado e pouca ênfase em
atividades de planejamento e revisão dos textos;
• Oralidade: menor avanço quanto à exploração do gênero e suas
características, presença de atividades que exploram cantorias e conversas;
• Análise linguística: crescente exploração de várias habilidades que
possibilitam o domínio efetivo da escrita alfabética.
A rotina de sala de aula deve contemplar os vários eixos como objetos de
ensino, pois é primordial diversificar as atividades para melhor atender aos
alunos em todos os anos do ciclo de alfabetização. Sendo assim, discutiremos
alguns objetivos e estratégias que podem orientar o planejamento nos eixos da
análise linguística, leitura, produção de textos escritos e oralidade.
No eixo da análise linguística, é preciso considerar as atividades voltadas para
o que queremos ensinar sobre o Sistema de Escrita Alfabética (como se
organiza esse sistema), considerando quais conhecimentos foram construídos
pelos estudantes e como eles se apropriam desses conhecimentos.
Ao atingir a hipótese alfabética é preciso que a criança reflita sobre a norma
ortográfica, compreendendo as regularidades e memorizando as
irregularidades ortográficas, a fim de escrever convencionalmente as palavras
(MORAIS, 1999). Para isso, deve-se planejar as atividades de reflexão sobre
as dificuldades ortográficas despertando-as para o princípio gerativo
subjacente à escrita das palavras, ou seja, para o princípio de que quando
conhecemos uma regra podemos aplicá-la a todas as palavras cuja escrita
dependa dessa regra. Por exemplo, a regra de que o som /k/ antes de A, O e U
pode ser representado por C ou K e antes de E e I, por QU ou K, quando
aprendida, pode ser aplicada em muitas palavras.
A preocupação do professor não deve ser com a memorização das regras, mas
com a compreensão.
O eixo da leitura tem, dentre outras, a finalidade de proporcionar às crianças a
capacidade de ler para: aprender a fazer algo, aprender assuntos do seu
interesse, informar-se sobre algum tema e ter prazer na leitura. Para o
planejamento dessas atividades concebemos a leitura como uma relação
dialética entre interlocutores, que pressupõe a interação entre texto e leitor e
não um simples ato mecânico de decifração de signos gráficos. O ensino da
compreensão de texto é, portanto, um processo em espiral no qual o leitor
realiza um trabalho ativo de construção do sentido do texto pela ativação de
diferentes esquemas. No segundo ano, espera-se que a criança já possua
domínio da apropriação do sistema de escrita e alguma fluência mínima de
leitura para que desenvolva autonomia na compreensão dos textos. após a
atividade de leitura, ocorram conversas sobre o texto lido. As autoras propõem
que sejam explorados alguns tipos de perguntas durante esta atividade:
Perguntas antes da leitura
Antecipar sentidos do texto;
6. Ativar conhecimentos prévios;
Estabelecer finalidades para a leitura
Perguntas durante e/ou depois da leitura
Localizar informação explícita de um texto;
Elaborar inferências;
Estabelecer relações lógicas entre partes do texto;
Identificar tema ou apreender o sentido geral do texto;
Interpretar frases e expressões;
Distinguir ponto de vista do “autor” de opiniões do leitor;
Estabelecer relações de intertextualidade;
Explorar vocabulário e recursos coesivos;
Explorar características do gênero textual;
Explorar recursos estéticos e expressivos do texto;
Explorar imagens como elemento constitutivo das possibilidades de sentido;
Explorar dialetos e registros;
Identificar ideia central a partir do texto;
Emitir opinião sobre o texto;
Responder aos textos (extrapolação).
Levantar e confirmar hipóteses (previsões sobre o texto).
Nessas situações de leitura é importante considerar o papel do professor como
um modelo de ações, atitudes e expressões Qual é meu objetivo ao escolher
este texto para esta turma?
• O que espero de meus alunos com a leitura deste texto?
• Qual seria um bom texto para desenvolver determinada habilidade de leitura
que meus alunos ainda não dominam bem?
• Qual é o lugar deste texto no conjunto dos textos a serem lidos ao longo do
bimestre, do semestre ou do ano?
• Qual a relação deste texto com o projeto pedagógico da escola, ou com meu
próprio projeto para esta turma?
• Minhas escolhas levam em consideração os interesses de meus alunos?
• Quais foram as dificuldades encontradas por meus alunos para a
compreensão do texto lido?
• Se eu planejei alguma atividade para desenvolver a partir do texto lido, essa
atividade contribuiu para a melhor compreensão do texto?
Quanto ao eixo da produção de textos, consideramos que, ao entrarmos no
mundo da escrita, operamos com a língua de modo diferente, fazendo-a objeto
de atenção e manipulação. Portanto, quando o acesso à escrita é autônomo
possibilita uma maior consciência acerca das unidades linguísticas e uma
maior reflexão sobre as formas textuais, autorizando o aluno a decidir sobre as
maneiras de organizar o conteúdo textual. Nesse sentido, a apropriação do
Sistema de Escrita Alfabética possibilita maior autonomia na reflexão sobre a
organização textual e sobre o próprio conteúdo.
Leal e Albuquerque (2005) apontam alguns tipos de situações de uso da escrita
na alfabetização:
Em relação ao planejamento das atividades voltadas para o eixo da produção
de textos, é importante que estas busquem contemplar as reflexões acerca do
contexto de produção. O contexto de produção, tal como propõem vários
autores, determina não apenas o que dizemos sobre o “mundo”, mas também a
forma que escolhemos para “dizer”. É necessário na escrita de um texto que se
tenha não somente “o que escrever”, mas também “para que” e “para quem”
7. escrever; ou seja, quem escreve um texto elabora representações sobre a
situação de interação, sobre os interlocutores e sobre as representações do
interlocutor.
Por fim, em relação ao eixo da oralidade, não é certo afirmar que a fala é
informal e a escrita formal. Ambas têm graus de formalidade variáveis de
acordo com as situações comunicativas, pois os usos da língua são situados,
sociais e históricos, e possuem certo grau de implícito e envolvimento.
Portanto, a fala e a escrita são atividades discursivas e essa relação entre fala
e escrita se dá em forma de um contínuo, sendo as duas ações planejadas.
Reiteramos, portanto, que todas as formas de organização do trabalho de sala
de aula favorecem múltiplas aprendizagens desde que tenham sido elaborados
planos de ação.
Nesse sentido, é importante adotarmos quadros de rotinas considerando os
objetivos didáticos, os diversos tipos de organização do trabalho, as
características do grupo e as formas de interação. No próximo texto, estaremos
aprofundando as discussões sobre possibilidades de organização da rotina em
turmas de alfabetização.
Ano 3- Planejamento e Organização da Rotina na Alfabetização
“O currículo é construído na prática diária de professores e, portanto, nem
sempre reflete exatamente o que os documentos oficiais orientam, mas
também não pode ser entendido como decisão de cada um”. Isto é:
Do ponto de vista de sua realização, o currículo escolar pode assumir a
forma do concebido e do vivido. No âmbito do currículo concebido, temos o
currículo formal. [...] No âmbito do currículo vivido é que efetivamente se
manifesta, ou não, a concretização do concebido. O currículo praticado
envolve as relações entre poder, cultura e escolarização, representando,
mesmo que de forma nem sempre explícita, o jogo de interações e/ou as
relações presentes no cotidiano escolar (CARVALHO, 2008, p. 96-97).
A prática docente, na realidade, resulta das concepções acerca do que se deve
ensinar, que se baseia tanto em documentos curriculares, quanto dos textos de
estudo, participação em situações de formação, quanto das próprias
experiências vivenciadas pelo professor; dos conhecimentos sobre os
conteúdos escolares; dos resultados da avaliação acerca do que os estudantes
sabem; das concepções sobre quais são as melhores estratégias de ensino,
dentre outras.
Acreditamos que, quanto mais consciência o professor tiver acerca dos
princípios que regem sua prática, maior autonomia terá no processo de
planejamento e realização da ação didática.
Em um estudo sobre os princípios didáticos que regiam as práticas de duas
professoras do quinto ano do Ensino Fundamental de escolas municipais de
ensino de Recife e Jaboatão dos Guararapes, Lima (2011) identificou princípios
fundamentais que levaram a autora a considerar que as professoras analisadas
tinham uma dinâmica centrada em uma perspectiva sociointeracionista de
ensino. Por meio das análises de relatórios de aula, elaborados com base nas
anotações, gravações e filmagens, a autora identificou dez princípios
subjacentes à maior parte das aulas das professoras:
8. (1) ensino reflexivo – as professoras estimulavam as crianças a refletir sobre
os conhecimentos, evitando situações em que os conhecimentos eram
simplesmente transmitidos por elas;
(2) ensino centrado na problematização – as professoras planejavam
atividades em que as crianças eram desafiadas a resolver problemas diversos;
havia desafios que motivavam as crianças a querer aprender;
(3) ensino centrado na interação em pares – as professoras priorizavam
situações em que a aprendizagem se dava por meio da interação em grandes
grupos, em pequenos grupos, em duplas; as atividades individuais sempre
culminavam em momentos de socialização e discussão;
(4) ensino centrado na explicitação verbal – as crianças eram estimuladas a
falar sobre o que pensavam, a responder perguntas; elas não tinham medo de
errar porque sabiam que podiam dizer o que pensavam sem passar por
constrangimentos; entendiam que todos estavam aprendendo;
(5) favorecimento da argumentação – as crianças eram estimuladas a expor e
justificar suas opiniões; os diferentes pontos de vista na sala de aula eram
confrontados; as professoras valorizavam as posturas de respeito, mas com
explicitação das diferentes possibilidades de pensar sobre os conhecimentos;
(6) sistematização dos saberes – as professoras realizavam atividades de
sistematização dos conhecimentos ensinados; havia momentos de sínteses em
relação aos conhecimentos acumulados, seja por meio de exposições breves,
seja por meio de registro coletivo das aprendizagens realizadas;
(7) valorização dos conhecimentos dos alunos – as docentes frequentemente
realizavam atividades para saber o que as crianças pensavam sobre os
conteúdos que estavam sendo ensinados; utilizavam tais conhecimentos para
planejar as atividades e como ponto de partida nos momentos de resolução de
problemas; as professoras estimulavam as crianças a expor seus
conhecimentos, valorizando o que elas diziam; investiam também no aumento
da autoestima das crianças;
(8) incentivo à participação dos alunos – as professoras se dirigiam às crianças
quando percebiam que elas estavam apáticas, sobretudo as crianças mais
tímidas ou que não tinham iniciativa de participação nas atividades;
(9) diversificação de estratégias didáticas – as professoras realizavam vários
tipos de atividades para contemplar um determinado conteúdo; elas
diversificavam tanto os recursos didáticos quanto as atividades;
(10) ensino centrado na progressão – as docentes contemplavam um mesmo
conteúdo em aulas diferentes, aumentando o grau de dificuldade.
Enfim, esse estudo mostra que quando as aulas são bem planejadas, os
estudantes se envolvem mais. No entanto, é interessante observar que alguns
desses princípios dizem respeito não necessariamente ao tipo de atividade
planejada, e sim às posturas, aos modos de mediação, à capacidade de
explicar e dialogar com as crianças. Desse modo, a melhoria da prática
pedagógica envolve, por um lado, a ampliação contínua dos conhecimentos,
mas também o desenvolvimento de modos de interagir com os alunos.
AS ROTINAS DA ESCOLA E DA SALA DE AULA: REFERÊNCIAS PARA A
ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO DO PROFESSOR ALFABETIZADOR
9. O que é rotina?
Ela é um mal ou um bem necessário?
Por que tantas vezes ela é temida, criticada e/ou desejada?
Rotina em sentido negativo = realização diária de atividades repetitivas,
cansativas, que fazemos sem refletir, sem saber o que, como e para que a
fazemos.
Nas décadas de 1960/70, as escolas adotavam modelos baseados na
psicologia comportamentalista e no tecnicismo para organizar a rotina da sala
de aula. O dia a dia da sala de aula era transformado em uma sucessão de
atividades repetitivas guiadas, no geral, por manuais que garantiam a absorção
máxima do que era proposto.
Na década de 1980, houve a difusão das teorias construtivistas e sócio-
interacionista de ensino aprendizagem, porém por meio de uma interpretação
equivocada da teoria construtivista, passou-se a criticar tudo o que se
relacionava com planejamento e organização do trabalho pedagógico com a
justificativa de que era “tradicional”, velho e ultrapassado. Nessa perspectiva o
professor não precisaria se programar para realizar as atividades, pois estas
iriam surgir na própria prática cotidiana.
Rotina num sentido positivo = concordamos, portanto, com Leal (2004. p.02)
quando a autora defende a importância do planejamento para a vida escolar ao
afirmar que, as rotinas escolares asseguram que alguns “procedimentos”
básicos sejam “acordados” entre professor e alunos e que os mesmos já se
disponibilizem dentro do espaço temporal e espacial para as tarefas
pedagógicas.
Como desenvolver práticas de alfabetização em tal perspectiva e no que elas
efetivamente se diferenciam das outras?
A construção de uma rotina escolar que contemple os diferentes eixos de
ensino da língua, por meio de um planejamento elaborado com base na
realidade de cada aluno e da escola, pode favorecer a realização de atividades
que ajudem a promover a autonomia e a criatividade dos alunos no mundo da
leitura e da escrita.
Uma Rotina deve possuir:
• ATIVIDADES PERMANENTES
• SEQUÊNCIAS DIDÁTICAS
• PROJETOS DIDÁTICOS
• JOGOS (POR EXEMPLO, AQUELES ENVIADOS PELO MEC)
11. ANOS 1960/70
HERANÇA DO POSITIVISMO
ROTINAS REPETITIVAS E
CANSATIVAS
ANOS 1980
CONSTRUTIVISMO =
INTERPRETAÇÃO
EQUIVOCADA
IMPROVISOS
CONSTRUTIVISMO E
SÓCIO-INTERACIONISTA
PROCEDIMENTOS
INTENCIONALMENTE
PLANEJADOS
CONHECIMENTO DAS
PRÁTICAS
SOCIAIS/CULTURAIS DOS
SUJEITOS ENVOLVIDOS
REFLEXÃO DA PRÁTICA
PEDAGÓGICA
ROTINAS
PLANEJADAS E
ORGANIZADAS
CRIANÇAS APRENDEM A
PREVER O QUE FARÁ
NA ESCOLA E A
ORGANIZAR-SE
PROFESSOR DISTRIBUI
MELHOR AS ATIVIDADES
FACILITANDO O
PLANEJAMENTO DIÁRIO
12. ROTINAS DE ALFABETIZAÇÃO NA PERSPECTIVA DO LETRAMENTO: A
ORGANIZAÇÃO DO PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM
Como organizar propostas de ensino que contribuam, efetivamente, para a
apropriação da alfabetização na perspectiva do letramento?
TEMPO
PEDAGÓGICO
REFLETIR
O QUE ENSINAR
POR QUE ENSINAR
QUE TEMPO PRECISA
PARA ENSINAR
13. ATIVIDADES
PERMANENTES
SEQUÊNCIA
DIDÁTICA
PROJETO
DIDÁTICO
JOGOS
São as que acontecem ao longo
de um determinado período de
tempo na rotina e são
importantes para o
desenvolvimento de conceitos,
procedimentos e atitudes.
PERIODICIDADE: semanal,
quinzenal, diária.
- as atividades se repetem de
forma sistemática e previsível.
Atividades planejadas de forma
sequenciada, de modo que a
ordem interfere na sua
realização: as respostas dos
alunos a uma atividade
direcionam e são mobilizadas
na atividade seguinte.
São situações didáticas
articuladas em torno de um
conhecimento específico.
Possuem uma sequência
crescente de desafios e não
tem um produto final.
PERIODICIDADE: variável
Obs.: Podem ocorrer também
atividades ocasionais.
As ações propostas têm relação
entre si e fazem sentido em
função do produto final.
Pressupõe um problema a ser
resolvido. Articulam-se em
função de uma finalidade e de
um produto final compartilhado.
Contextualizam as atividades.
Podem ser interdisciplinares.
PERIODICIDADE: depende dos
objetivos propostos.
- um projeto pode ser de dias
ou meses.
Na alfabetização como
atividades diárias que
proporcionam reflexão sobre
o Sistema de Escrita
Alfabética, contemplando
diferentes unidades
linguísticas.
14. A organização dos diferentes tipos de atividades depende das aprendizagens
esperadas para a turma e devem ser distribuídas de forma equilibrada e
progressiva na rotina semanal, bem como estas devem contemplar ações
como reflexão, sistematização e consolidação dos direitos de aprendizagem.
ROTINA NA ALFABETIZAÇÃO: INTEGRANDO DIFERENTES
COMPONENTES CURRICULARES
É fundamental, não perder de vista que diferentes dimensões do ensino são
interligadas, mas há especificidades a serem contempladas.
No componente Língua Portuguesa, os direitos de aprendizagem são
organizados em quatro eixos centrais:
1. Leitura.
2. Produção de textos escritos.
3. Linguagem oral.
4. Análise linguística.
No eixo da leitura, três dimensões interligadas precisam ser enfatizadas:
• Sociodiscursiva – propósitos para os quais os textos foram escritos.
• Estratégias de leitura – saber antecipar sentidos, elaborar inferências,
estabelecer relações entre partes do texto, entre outras estratégias.
• Conhecimentos linguísticos – englobam o funcionamento do sistema
alfabético, o domínio da correspondência entre letras e algumas convenções
ortográficas e pontuação e paragrafação.
No eixo da produção de textos escritos também podem ser destacadas três
dimensões:
• Sociodiscursiva – propósitos e destinatários para os quais os textos estão
sendo escritos.
• Estratégias de produção de textos - planejamento global dos textos,
planejamento em processo, revisão, avaliação e revisão posterior do texto.
• Conhecimentos linguísticos – conhecimentos sobre o sistema alfabético e
convenções ortográficas, coesão textual, pontuação paragrafação e
concordância.
No eixo da linguagem oral quatro eixos podem ser contemplados:
• Valorização dos textos de tradição oral
• Oralização dos textos escritos – recitais de poesias, obras teatrais, leitura de
contos em saraus, dentre outros.
• Relação entre fala e escrita – ex: receitas culinárias e instruções de jogos
socializadas por meio da oralidade e da escrita.
• Produção e compreensão de gêneros orais – situações em que é preciso
participar de interações falando e ouvindo com atenção, ex: notícias
radiofônicas, debates e exposições orais em público.
Por fim, no que se refere a analise linguística, as dimensões são:
• Caracterização e reflexão sobre os gêneros e suportes textuais: reflexões
sobre onde circulam os gêneros em foco, com que finalidade, para quais tipos
de destinatários.
• Reflexão sobre o uso de recursos linguísticos para constituição de efeitos
de sentido em textos orais e escritos: convenções gramaticais, o texto é
objeto de análise quanto às pistas linguísticas dadas para sua compreensão.
15. • Domínio do sistema alfabético e da norma ortográfica – conhecimentos
necessários para que o texto seja legível, por atender aos princípios de
funcionamento da escrita alfabética e às convenções da ortografia.
•
OS GÊNEROS TEXTUAIS COMO OBJETOS DE ENSINO E COMO
INSTRUMENTOS DE INTERAÇÃO
Toda sociedade detém um conjunto de gêneros que são usados para os
diversos fins, por diferentes grupos sociais, e a familiaridade com tais gêneros
facilita a apreensão das intenções comunicativas, pois cria expectativas sobre
o que será lido e facilita o processo de produção.
Atividades Permanentes
Elas devem envolver os eixos da alfabetização:
(i) Leitura;
(ii) Produção de Textos;
(iii) Análise linguística;
(iv) Oralidade.
Exemplos de Atividades Permanentes:
Produção de Textos Escritos (individualmente, coletivo, em duplas):
• Produção de textos de gêneros variados (bilhete, convite, regras, lista
com nomes de colegas etc);
• Reescrita;
• Texto oral com destino escrito (entrevista).
Leitura:
• Leitura realizada pelo professor (deleite, preferencialmente com textos
literários);
• Leitura realizada pelos alunos (silenciosa, compartilhada de gêneros
diversos);
• Leitura na biblioteca (A Hora do Conto).
Análise linguística:
• Atividades para compreender as diferenças entre escrita e outras formas
gráficas (outros sistemas de representação)
• Atividades para conhecer o alfabeto;
• Atividades para reconhecer unidades fonológicas como sílabas, rimas
terminações de palavras;
• Atividades para dominar as relações entre grafemas e fonemas
(regularidades e irregularidades ortográficas).
Oralidade:
• Jornal falado;
• Seminários;
• Reconto de textos;
• Assembleia;
16. • Debates sobre temas estudados.
No que se refere as atividades de: Sequência Didática; Projeto Didático
e Jogos, estas serão abordadas nas próximas Unidades.