A diretora descreve a clientela da escola rural como formada por trabalhadores rurais comprometidos com a aprendizagem dos filhos e com suas raízes no campo. A comunidade participa ativamente da escola através de festas, doações e colaborações. A cultura local, como as festas juninas e a religião, estão presentes na escola, que busca respeitar todas as crenças e promover a inclusão social.
2. • Cargo: Diretora de Escola Rural
• Idade: 52 anos
• Formação: Pedagogia e Letras
• Instituição de formação: UNORP - SP
3. 1- Como você caracteriza a clientela da sua escola?
Temos uma clientela formada por trabalhadores rurais, visto que a escola
também é rural, tanto pais quanto alunos de quinta a oitava se dedicam ao
trabalho em fazendas como donos ou peões. As famílias são
comprometidas com a escola, com a aprendizagem dos filhos e todos
cultivam muito suas raízes, que é trabalhar na terra, valorizar o campo.
4. 2 – Quais os movimentos sociais que existem no entorno da escola?
Os movimentos sociais em torno da escola são bem visíveis, a escola
possui um consultório dentário, com um profissional atendendo três vezes
na semana que presta seus trabalhos não apenas para a escola, como
também para a comunidade. Um movimento social muito forte são as
festas juninas, as festas de Reis, onde a comunidade toda se reúne e
tudo é dividido, todos colaboram na preparação das festas. A escola
também promoveu um movimento que abraçou toda a comunidade que
foi a recuperação da vegetação na beira de um córrego. Alunos,
professores e pais fizeram plantio de árvores e cuidaram para que
crescessem, recuperando o movimento do córrego e evitando o
assoreamento.
5. 3 – De que maneira a comunidade escolar participa do cotidiano da
escola?
A comunidade participa ativamente, comparecendo em reuniões de pais
bimestrais, participando e colaborando com as festas organizadas pela
escola. Temos mães que participam do coral da escola tanto colaborando
nos ensaios, como doando toda a vestimenta para os cantores. Elas
também participam fazendo os quitutes, bolos, biscoitos, doces e
variedades, feitos nas fazendas e que podem ser comercializados na
escola gerando renda para a mesma. São muito presentes em visitar a
escola mesmo sem data pré-determinada, tanto para saber do rendimento
dos filhos, como apenas para fazer uma visita social na escola. Participam
de todas as decisões mais sérias em relação às decisões que a escola
precisa tomar. Desde o início deixamos claro que a comunidade tem o
dever e o direito de estar dentro da escola; podem reclamar, criticar e
elogiar, apresentar sugestões e a grande maioria sempre atendeu a esse
chamado, são “os pais dentro da escola”, participando, colaborando, dando
sugestões, avaliando. Sempre achei isso muito importante.
6. 4 – Quais os elementos das culturas da comunidade penetram no
interior da escola?
As festas da escola, festas essas que acontecem pelo menos duas vezes
ao ano, apenas para diversão ou para arrecadar fundos, são festas
sertanejas, pois a cultura do sertanejo é bem forte na comunidade. As
festas juninas adquirem também uma força maior, pois, por ser uma festa
bem típica de zonas rurais, os pais são bem presentes, e não somente as
danças das quadrilhas fazem parte da festa, temos também as danças do
cotidiano deles, como a catira, o forró e o baião. Em nossas feiras de
ciências ou mesmo culturais são resgatadas a importância do campo e aí
é que a participação da comunidade rural acontece, com doações de
pratos típicos, utensílios usados em fazendas (maquinários,
suprimentos...). Como a tecnologia ainda não é tão forte como na cidade,
os mais velhos vem a escola contar “causos do campo”, das famílias mais
antigas, como era o meio de comunicação. O folclore é comemorado e
estudado nas salas de aula, para que continuem mantendo e preservando
suas origens.
7. 5 – Como a escola lida com as diversas crenças religiosas?
As crenças religiosas são respeitadas, temos aula de religião, mas
quando assumi a escola discuti muito esse tema, que as aulas deveriam
ter outro nome, como por exemplo , aula de Valores, mas não é fácil
mudar o sistema. Portanto, rezamos o Pai nosso na entrada, que é uma
oração universal, mas discutimos em todos os conteúdos todas as
crenças, estudamos todas as crenças e deixamos claro que todas tem
sua importância e sua verdade. Na escola tínhamos alunos católicos,
evangélicos e sempre valorizamos todo tipo de demonstração religiosa.
Nosso coral , por exemplo, cantava músicas MPB, Gospel, Católicas.
Tudo foi discutido de forma que os alunos e pais entendessem que
todas as religiões tem sua importância e devem ser respeitadas. Nas
aulas de religião, o nome do conteúdo não conseguimos mudar,
independia de nós, porém o conteúdo, a forma passada, esse sim foi
reorganizado, Valores, ética, respeito eram os temas abordados dentre
outros.
8. 6 – Quais as práticas da escola que demonstram seu caráter
democrático?
O aceitar as religiões diferentes como citados na resposta anterior, a
opinião dos pais em avaliações, feiras culturais, a Associação de pais e
mestres era bem ativa dentro da escola. Sempre tivemos após cada
festa, reuniões com os pais para a prestação de contas, quanto
tínhamos arrecadado e pedíamos a opinião dentre as nossas
necessidades o que deveríamos adquirir em primeiro lugar, isso era feito
em forma de votação. Planejamentos, livros para serem lidos pelos
alunos, atividades levadas pela pedagoga, pela diretora e professores,
tudo era debatido entre os educadores. Sempre tivemos nossa linha
pedagógica, nosso objetivo claro para com nossos alunos, porém
sempre defendemos que quando todos da escola participam das
decisões, votam na melhor maneira para se fazer, ficamos todos
responsáveis tanto pelo sucesso como pelo fracasso.
9. 7 – Quais as práticas escolares que demonstram o compromisso da escola com
a inclusão social (etnia, PNE, dentre outras)?
Sempre tivemos um trabalho social, por exemplo, notar que o aluno demonstra muito
interesse em chegar a hora do lanche, isso foi notado por uma servente sobre uma de
nossas alunas. Fomos a casa dela e nos deparamos com uma situação terrível, eles
tinha acabado de vir da cidade para a zona rural, sem salário, estavam sem o que
comer, sem gás para usar o fogão. Fizemos uma campanha na escola, sem citar o
nome da aluna para não constrangê-la diante dos colegas. Arrecadamos alimentos e
material de limpeza para dois meses, e fizemos uma vaquinha para comprar o gás.
Sempre estamos atentos aos nossos alunos, doando material, visitando os lares para
ver a necessidade. Fazemos campanha também para arrecadar alimentos para
associações. Trabalhamos a inclusão social, através de histórias, filmes, palestras.
Sempre nos preocupamos que todos os alunos aprendessem o respeito uns com os
outros e respeito às diferenças. Nossas práticas eram diárias, dentro de cada
conteúdo, nas reuniões de pais, rodas de conversas com os alunos. Sempre
deixamos claro que somos iguais, independente da raça, do credo ou da situação
financeira, e para isso fazíamos brincadeiras, jogos, tínhamos sessão de cinema,
literatura, e em toda ação que fazíamos tínhamos o cuidado de colocar os alunos para
participarem, pois se aprende através da ação.
10. 8 - Quais os critérios que a escola utiliza para a enturmação dos alunos
do 1º ano?
Nossa enturmação, se é que podemos usar esse termo era feita de maneira a
ter uma sala heterogênea. Não tínhamos uma sala mais forte e outra mais
fraca, não é esse o pedagógico que acreditamos. Existe uma sala de primeiro
ano em que todos trabalham juntos. O que fizemos de forma diferente, e isso
foi em todas as turmas, foi tirar as fileiras, nada de aluno olhando para a nuca
do colega. Transformamos a disposição da sala em círculo, em conjuntos de
quatro colegas sentando juntos, e aí sim, colocávamos os que mais se
sobressaia junto com aqueles que tinham mais dificuldades, e
desenvolvíamos o trabalho de forma que o aluno mais desenvolvido
intelectualmente ajudasse o que sentia mais dificuldades de assimilação dos
conteúdos, pois sempre acreditamos que o aluno entende bem melhor a
linguagem do seu igual. Isso não anulava o papel do professor, que era
sempre o mediador das tarefas e dos trabalhos propostos. Acreditamos que
toda sala deve ser heterogênea, pois ninguém é igual a ninguém, cada um
tem seu tempo para aprender, porém acreditamos que é justamente nessa
diferença, nessa troca, que a aprendizagem acontece.
11. Nota: Nos meus anos de direção, foi sempre deste modo que me
posicionei. Todos, professores, serventes, zeladoras, pedagogas,
sempre falávamos a mesma língua. Fui uma diretora muito
democrática, pois amo o pedagógico e sendo diretora pude colocar em
prática o jeito que sempre acreditei. Tivemos dificuldades? Sim.
Tivemos professores que se posicionavam contrários as mudanças?
Mas em quatro anos de direção, posso te dizer que o trabalho foi feito
aos poucos, ganhando a simpatia de cada professor através de
reuniões, discussões e principalmente, tentativas, erros e acertos, até
que todos comprassem a idéia. Tivemos que refazer alguns caminhos,
mudar estratégias, lógico que sim, é assim que uma escola funciona.
Nada foi as mil maravilhas, mas posso garantir que tudo que foi feito e
da forma que foi trabalhado, o efeito foi positivo.
12. Universidade: UEMG – Universidade do Estado de Minas Gerais
Curso: Pedagogia
Polo : Frutal
Discente: Cleonice Gonçalves Lima
Tutor: Fabiano Camillozi