2. Tempo - Ato I
“É
no fim de tarde” (didascália inicial)
“Tem
treze anos feitos… Vivemos seguros,
em paz e felizes… há catorze anos… A
que se apega esta vossa credulidade de
sete… e hoje mais catorze… vinte e um
anos?” (Madalena, Ato I, cena II)
“…
vivemos em paz e felizes há… 14
anos. Temos esta filha…” (Madalena, Ato
I, cena II)
3. Tempo – Ato II
“…Há
oito dias que aqui estamos nesta
casa…” (Maria, Ato II, cena I)
“Sexta
feira!” (Madalena, Ato II, cena V)
“…
É um dia fatal para mim: faz hoje
anos … que casei a primeira vez, faz
anos que se perdeu el-rei D. Sebastião,
e faz anos também que… vi pela
primeira vez a Manuel de Sousa …“
(Madalena, Ato II, cena X)
4. Tempo – Ato III
“É
alta noite.” (didascália inicial)
“…
São cinco horas, pelo alvor da
manhã…” (Jorge, Ato III, cena I)
5. Tempo Histórico representado:
21 anos após o desaparecimento de D. João de
Portugal que é dado como morto na Batalha de
Alcácer-Quibir – o regresso do Romeiro
Tempo
Histórico: fins do século XVI - 1599
Um país em crise: a perda de independência
tensão social e política
Perda
de identidade – o mito sebástico:
Romeiro não tem lugar no presente: “Ninguém!”
O esquecimento
a crise de identidade
6. Tempo de relativa felicidade: 21 anos após a
Batalha de Alcácer-Quibir – o 2º casamento
Maria de N.
Manuel de
S. C.
D. João de
Portugal – o
passado
Madalena
de V.
Telmo – o
sebastianista
7. Tempo Psicológico:
Os
medos de Madalena de Vilhena que vão
aumentando:
A fragilidade da filha Maria
O fantasma do passado: o desaparecimento do
marido cuja morte nunca foi comprovada
O ambiente de tensão devido à crise política em
Portugal, sob dominação de Espanha – opressão e
traição no poder
8. Espaço
Almada
Ato I
Sala Luxuosa e arejada
Ato II
Salão Antigo e melancólico
(sala dos retratos)
Ato III
Pate Baixa do palácio
com acesso à Igreja
9. Frei Luís de Sousa: estrutura da ação
Ato I
• Exposição do conflito – pathos e
suspense
• A felicidade presente atormentada
pelos acontecimentos do passado
Ato II
• Progressão dramática – clímax e
anagnórise
• O terror do adultério e o destino fatal,
encarnado em D. João de Portugal
Ato III
• O desenlace melodramático:
• morte de Maria como uma espécie de
expiação
• Duplo suicídio – a morte para a vida
10. Indícios de tragédia
Leitura dos versos de
Camões – fim trágico
dos amores de Inês de
Castro
O tempo
A idade de Maria –
13 anos
A felicidade aparente
e prenúncio de
desgraça
Sexta feira – dia
aziago
Na crença popular,
13 é o número do
azar
11. A crença no regresso
de D. João de
Portugal
Projeção do mito
sebástico
3 – a criação, o círculo
perfeito, a perfeição
Números 7,
13, 14, 21
7 – o fim de um ciclo
3x7= a fatalidade
perfeita
12. O retrato que ardeu
de Manuel de
Sousa Coutinho
O regresso ao Palácio
que fora de D. João
de Portugal
- Prognóstico fatal de
outra perda maior
- Destruição, pelo fogo,
da imagem, da paixão,
da família
- O prenúncio de
desgraça
- As recordações do
passado e os retratos
- O indício de um
possível regresso
13. Elementos desencadeadores da
catástrofe final:
O
surgimento do Romeiro e a decisão de Manuel
de Sousa Coutinho e de Madalena de Vilhena de
conversão à vida religiosa
O
reconhecimento de D. João por Maria, que se
enche de vergonha ao perceber que é filha
bastarda
A
fragilidade de Maria omnipresente na peça, que
sofre de febres e hemorragias e que conduz à sua
morte
14. As Personagens
Madalena
de Vilhena: sempre em sobressalto,
não consegue usufruir a felicidade do presente,
porque vive atormentada pelo passado; a
leitura do episódio de Inês de Castro poderá
refletir o seu estado de alma, uma mulher
apaixonada, mas cujo amor é dificultado por
acontecimentos do passado. Esta leitura poderá
também ser um presságio de tragédia. Ao longo
de toda a ação, Madalena é a personagem
que vive num desassossego constante,
propensa
a
acreditar
em
superstições,
nomeadamente na “sexta feira dia aziago”. A
destruição do seu amor conjugal e a morte de
Maria levam-na ao desespero e à conversão à
vida religiosa.
15. Manuel
de Sousa Coutinho – Personagem que se
enquadra no ideal clássico de homem de virtudes,
Manuel de S. C. é um nobre cavaleiro de Malta,
que se destaca pelo amor à família e pela sua
fidelidade aos valores patrióticos. Por amor casa
com Madalena de Vilhena e por amor ateia fogo
ao seu próprio palácio, para não sofrer a afronta
do convívio na sua casa com os governadores ao
serviço de Castela. Ao longo da ação é uma
personagem que vive em luta por um Portugal
independente. Transforma-se numa personagem
romântica, quando vive o abatimento perante o
regresso do passado, na figura de D. João de
Portugal e devido à doença e morte de Maria, o
que o leva a optar pela vida monástica.
16. No
Ato III o equilíbrio clássico desta
personagem dá lugar uma sensibilidade
romântica, que sofre devido ao regresso de D.
João de Portugal e à doença da filha,
vergando-se perante um destino castigador.
Perante a desonra do adultério, aos olhos da
sociedade, a razão leva-o a desejar a morte da
filha e o amor impele-o a suplicar
desesperadamente pela sua vida, o que põe
em destaque uma personalidade romântica,
que tem dificuldade em obedecer à razão.
Perante a fatalidade, encontra na Divina
Providência a forma de se reconciliar com o
mundo, convertendo-se à vida monástica.
17. Telmo
Pais – Aio fiel de D. João de Portugal,
continuou a servir a família, mesmo depois de
Madalena ter voltado a casar com Manuel de S.
C. Mantém uma relação com Madalena e Maria
de Noronha privilegiada e fomenta a crença de
que D. João de Portugal regressará. Para
Madalena, Telmo é uma espécie de confidente e
desempenha o papel de educador de Maria,
ensinando-lhe os valores clássicos do patriotismo
através do ensino da História e da Literatura,
evocando e exaltando figuras históricas
representativas dos valores de patriotismo e do
sebastianismo, como o rei D. Sebastião e
Camões. É uma personagem modelada, uma
vez que evolui ao longo dos acontecimentos.
18. Como
aio fiel do seu maior amigo D. João de
Portugal, sofreu como nenhuma outra personagem
o seu desaparecimento e alimentou a crença de
que este haveria de regressar, transformando-o
numa espécie de altar que se entranharia na sua
alma. Porém, Maria, pelas artes mágicas de
criança, havia de lhe conquistar o coração. No
final, perante o regresso de D. João de Portugal,
Telmo vive o drama de ter de optar pela defesa de
Maria, desejando, que D. João continuasse morto e
é Telmo que vai espalhar que D. João é um
impostor. Esta viragem na personalidade de Telmo é
também uma vitória do presente sobre o passado.
Entre o dilema de duas escolhas, Telmo escolheu o
presente ao escolher Maria. Esta opção é a causa
da sua perda de identidade.
19. Maria
de Noronha – Personagem idealizada, é
uma menina com uma grande sensibilidade, e
tem por Telmo uma grande admiração, pois
vive o encantamento pelos valores patrióticos e
sebastianistas que lhe são transmitidos pelo aio.
De apenas 13 anos, apresenta uma “viveza de
espírito” e uma curiosidade pelo saber Histórico
que acentuam os tormentos de Madalena.
Protótipo da mulher-anjo, Maria é demasiado
angélica para ser verdadeira. Na sua
personalidade combinam-se traços de criança
e de adulto, o que contribui para a sua
idealização. Sensível, culta, perspicaz e
ingénua, tem ainda uma intuição apurada,
prevendo acontecimentos.
20. D.
João de Portugal, o Romeiro – Fidalgo da mais
alta aristocracia, representa o passado familiar e
Histórico e é, nas palavras de Telmo, o “espelho
de cavalaria e gentileza”, o seu “nobre e santo
amo”, aquele em quem Telmo projeta toda a sua
saudade e a sua crença nos valores patrióticos.
D. João de Portugal representa o passado heroico
que deu lugar ao vazio do presente. É recordado
com respeito por Madalena, todavia a ideia de
que ele esteja vivo é o que a atormenta, uma vez
que o seu regresso seria a destruição da sua
felicidade conjugal e lançaria Maria na ignomínia
da desonra. No seu regresso, exprime a amargura
de se ver esquecido, mas mantém a dignidade e
o alto caráter de nobreza, ao pedir a Telmo que
espalhe a notícia de que ele era um impostor.
22. A tragédia segundo
Aristóteles
Segundo
Aristóteles, a tragédia consistia na
imitação de uma ação de carácter elevado, em
linguagem ornamentada, não por narrativa, mas
mediante actores, e que, suscitando o terror e a
piedade, tem por efeito a purificação dessas
emoções (catarse).
23. Características da tragédia:
Texto em verso
Estruturado em 5 atos
Número reduzido de personagens de alta estirpe
Respeito pela lei das três unidades - tempo,
espaço e ação
Presença de um coro, como voz da consciência
Estrutura
tripartida:
exposição
(pathos)
–
progressão temática (clímax e anagnórise) –
desenlace (catástrofe)
Inspiração no público de sentimentos de terror e
de piedade – a compaixão
24. Elementos da tragédia grega:
Hybris - Sentimento que conduz os heróis da tragédia à
violação da ordem estabelecida através de uma
acção ou comportamento que se assume como um
desafio aos poderes instituídos (leis dos deuses, leis da
cidade, leis da família, leis da natureza).
Pathos - Sofrimento, progressivo, do(s) protagonista(s),
imposto pelo Destino (Anankê) e executado pelas
Parcas (Cloto, que presidia ao nascimento e sustinha o
fuso na mão; Láquesis, que fiava os dias da vida e os
seus acontecimentos; Átropos, a mais velha das três
irmãs, que, com a sua tesoura fatal, cortava o fio da
vida), como consequência da sua ousadia.
25. Elementos da tragédia
grega
Ananké
(fatum) – É o destino que se
abate sobre as personagens como
uma força implacável e inelutável,
que preside às Parcas (Cloto,
Láquesis, Átropos), superior aos
deuses, aos quais não é permitido
desobedecer.
26. Elementos da tragédia grega
Peripécia
– Segundo Aristóteles, "Peripécia é a
mutação dos sucessos no contrário". Assim,
poderemos
considerar
um
acontecimento
imprevisível que altera o normal rumo dos
acontecimentos da acção dramática, ao contrário
do que a situação até então poderia fazer esperar.
27. Elementos da tragédia grega
Anagnórise
ou reconhecimento - Segundo
Aristóteles, "o reconhecimento é a passagem do
ignorar ao conhecer, que se faz para a amizade
ou inimizade das personagens que estão
destinadas para a dita ou a desdita." Aristóteles
acrescenta: "A mais bela de todas as formas de
reconhecimento é a que se dá juntamente com
a peripécia, como, por exemplo, no Édipo." O
reconhecimento pode ser a constatação de
acontecimentos acidentais, trágicos, mas, quase
sempre, se traduz na identificação de uma nova
personagem, como acontece com a figura do
Romeiro no Frei Luís de Sousa.
28. Elementos da tragédia grega
Catástrofe
- Desenlace trágico, que deve ser
indiciado desde o início, uma vez que resulta do
conflito entre a hybris (desafio da personagem) e
a anankê (destino), conflito que se desenvolve
num crescendo de sofrimento (pathos) até ao
clímax (ponto culminante). Segundo Aristóteles, a
catástrofe " é uma acção perniciosa e dolorosa,
como o são as mortes em cena, as dores
veementes, os ferimentos e mais casos
semelhantes."
29. Elementos da tragédia grega
Katharsis
(Catarse) - Purificação das emoções
e paixões (idênticas às das personagens),
efeito que se pretende da tragédia, através do
terror (phobos) e da piedade (eleos) que deve
provocar nos espectadores. No final, pretendese que o público viva a compaixão, perante o
drama e a fatalidade das personagens.
30. O Drama romântico
Conceito de drama para os românticos:
Texto para teatro que procura ultrapassar a
distinção clássica entre tragédia e comédia,
conjugando aspetos carcterísticos de ambos
(em termos de personagens e tipos de ação),
conciliando o grotesco e o sublime. Prescinde
do verso e adota a linguagem do quotidiano.
Privilegia a matéria histórica, de caráter
nacional, evocando os temas do romantismo,
nomeadamente os do sonho, da evasão, da
liberdade individual e a espiritualidade de
fundo cristão, o conflito entre o público e o
privado, o social e o indivíduo.
31. A opinião de Garrett sobre a sua
obra:
“Contento-me para a minha obra
com o título modesto de drama; só
peço que a não julguem pelas leis
que regem, ou devem reger, essa
composição de forma e índole nova;
porque a minha, se na forma
desmerece da categoria, pela
índole há-de ficar pertencendo
sempre ao antigo género trágico.”
Memória ao Conservatório Real de Almeida Garrett
32. Frei Luís de Sousa: Tragédia ou drama?
ELEMENTOS TRÁGICOS
A
catástrofe é o desenlace esperado: conversão à
vida monástica de Madalena de V. e de Manuel de
S. C. e morte de Maria
-
Os acontecimentos sucedem-se em cadeia –
unidade de ação: incêndio, mudança de palácio,
regresso do Romeiro, destruição da família
-
A presença de presságios através das falas de
Telmo, de Madalena e de outros elementos
simbólicos como a leitura do episódio de Inês de
Castro, os sonhos de Maria, o incêndio do retrato de
Manuel de Sousa Coutinho, a sala dos retratos,
33. Telmo
e Frei Jorge prefiguram o coro da tragédia
grega, pois comentam os acontecimentos e
apelam frequentemente à consciência de
Madalena de Vilhena
Madalena,
casando sem ter a certeza do seu
estado livre, e Manuel de Sousa, incendiando o
palácio, desafiam as prepotências divinas e
humanas (a hybris);
Uma
fatalidade ( a desonra de uma família,
equivalente à morte moral), que o assistente
vislumbra
logo
na
primeira
cena,
cai
gradualmente (climax) sobre Madalena, atingindo
todas as restantes personagens (pathos);
34. Contra
essa fatalidade os protagonistas não podem
lutar (se pudessem e assim conseguissem mudar o
rumo dos acontecimentos, a peça seria um drama);
limitam-se a aguardar, impotentes e cheios de
ansiedade, o desfecho que se afigura cada vez
mais pavoroso (ananké=destino);
-
A elevação moral e social das personagens
Há
um reconhecimento: identificação do Romeiro
(a anagnorisis);
Há
mudança
brusca
dos
acontecimentos
(peripécia) que precipitam a ação para o
desenlace trágico
35. A
verosimilhança é perfeita: a história do prosador
Manuel de Sousa Coutinho
O
conflito aumenta progressivamente, provocando
um sofrimento cada vez mais atroz
A
unidade de ação é superiormente conseguida
A
catástrofe é o desenlace trágico esperado
Tempo
e espaço obedecem à técnica de
afunilamento: a peça não respeita a duração das
24 horas, mas há concentração de tempo, no
desenrolar da ação e se há mudança de cenário, o
espaço mantém-se em Almada
36. ELEMENTOS ROMÂNTICOS
-
Não respeita a duração de 24 horas
-
A inspiração num tema nacional e o desenlace
melodramático
-
O herói romântico que desafia as leis
estabelecidas e que vive o abatimento e a dor de
consciência perante a tragédia – Manuel de Sousa
Coutinho
-
A moral cristã e social a dominar os destinos das
personagens – a sociedade VS o indivíduo
37.
Condensação de tempo é evidente e torna-se num
fator trágico
O
afunilamento de tempo – 21 anos, 14 anos, 7
anos, de tarde, 8 dias depois à noite, altas horas da
madrugada
O
simbolismo do tempo: 6ª feira fatal (1º casamento
de Madalena, visão de D. Manuel pela 1ª vez, morte
de D. Sebastião e desaparecimento de D. João de
Portugal na Batalha de Alcácer Quibir, 21 anos
depois, regresso de D. João de Portugal
As
visões, os sonhos e o idealismo patriótico de
Maria;
38. Em conclusão:
Frei Luís de Sousa:
Na
No
forma - Um drama romântico
conteúdo – um drama nacional de caráter
trágico: o sofrimento, a conversão e a morte
como:
∙ expiação do pecado
∙ a perspetiva de fim de um tempo de
opressão política e social (o devir
histórico)