1. Ficha Informativa FREI LUÍS DE SOUSA_1/7
Ficha Informativa
FREI LUÍS DE SOUSA DE ALMEIDA GARRETT
Texto dramático (comédias e tragédias):
texto com o objetivo de ser dramatizado, representado (visto e ouvido);
é constituído por dois textos paralelos (um com indicações para o encenador e outro com a
ação propriamente dita);
pressupõe um cenário (mobiliário, decoração), uma iluminação, um guarda-roupa, uma
representação e os espectadores.
No teatro clássico, as cenas dividiam-se em atos. O Frei de Luís de Sousa é constituído por três
atos e cada ato divide-se em cenas (Ato I: 12 cenas; Ato II: 15 cenas e Ato III: 12 cenas).
CONTEXTO HISTÓRICO
Existem várias referências que nos permitem localizar a obra no seu contexto histórico:
a situação criada pela Batalha de Alcácer Quibir (ocorrida em África, no dia 4 de agosto de
1578, na qual o exército português, comandado pelo rei D. Sebastião, foi destroçado pelos
Mouros. Ficaram mortos ou prisioneiros milhares de portugueses) que assume um papel
determinante no futuro das personagens;
a situação vivida na época de luta contra o domínio filipino. Relembre-se que Portugal esteve
sob domínio castelhano entre 1580 e 1640;
a peça decorre em 1599.
O ESPAÇO NO FREI LUÍS DE SOUSA
ESPAÇO FÍSICO
I Ato: Palácio de D.Manuel de Sousa Coutinho
Predomina luxo, riqueza, elegância, bom gosto e
grande variedade
ESPAÇO SOCIAL
Ambiente aristocrata português tradicional
Vive-se num ambiente harmonioso, de conforto e bem-estar
(Com grandes janelas voltadas para o Rio Tejo)
ESPAÇO PSICOLÓGICO
Tal ambiente remete para a felicidade vivida pelas personagens
No ato I, a ação desenrola-se numa sala do palácio de Manuel de Sousa Coutinho, onde
predomina a elegância e o luxo. O aspeto colorido do espaço simboliza a alegria e a felicidade das
personagens.
2. Ficha Informativa FREI LUÍS DE SOUSA_2/7
As janelas permitem a união entre o interior e o exterior e a visualização de um plano de toda
a cidade de Lisboa. Esta amplitude está relacionada com o observar do espaço e com a liberdade das
personagens, evidenciando a sua autonomia que será progressivamente negada com a evolução dos
acontecimentos.
ESPAÇO FÍSICO
II Ato: Palácio de D. João de Portugal
(Após D. Manuel ter incendiado o seu
palácio)
Predominam retratos de família
(lembram a todo o momento o
passado que D. Madalena quer
esquecer, estando com receio que
esse passado volte a qualquer
momento)
ESPAÇO SOCIAL
Ambiente aristocrata português tradicional.
Vive-se num ambiente antigo, pesado, melancólico
ESPAÇO PSICOLÓGICO
Tal ambiente remete para a melancolia, a tristeza, a ausência de felicidade por parte das
personagens.
No ato II, as personagens encontram-se num salão do palácio de D. João de Portugal,
caracterizado por uma decoração melancólica e pesada e pela presença dos retratos de D. João,
Camões e D. Sebastião. Todos eles remetem para um passado distinto que volta a surgir no presente.
Os reposteiros cobrem as portas que dão acesso ao interior e ao exterior, significando a clausura das
personagens abandonadas à sua ansiedade e ao seu sofrimento. Este espaço já permite observar o
local onde decorrerá «a morte social» para o mundo de Manuel de Sousa Coutinho e Madalena e a
morte física de Maria: capela de Nossa Senhora da Piedade.
ESPAÇO FíSICO
III Ato: Caves do Palácio de D. João de Portugal e Igreja de S. Paulo
Não há ornamentação
3. Ficha Informativa FREI LUÍS DE SOUSA_3/7
Indiciando a tragédia que se avizinha, visto que D. Madalena e D. Manuel de Sousa Coutinho vão
desprender-se de todos os seus bens materiais e do mundo, vão seguir a vida religiosa. Como
alternativa ao escândalo social, o casal "morre" para o mundo, entrando na vida religiosa por força
das circunstâncias.
No ato III, as personagens encontram-se na parte baixa do palácio de D. João de Portugal, que
comunica com a capela de Nossa Senhora da Piedade. Está localizada no nível inferior, o que
simboliza uma descida, pressupõe uma passagem para outro estado da existência humana. O casal
morre para o mundo para renascer sob outra identidade.
Conclui-se que o espaço físico retrata o espaço psicológico e social em que as personagens se
movimentam. O espaço psicológico surge como tradutor dos sentimentos e pensamentos dos
personagens, é constituído essencialmente a partir dos monólogos e sonhos de Madalena. O espaço
torna-se cada vez mais sombrio e restrito à medida que os atos se vão sucedendo.
O TEMPO NO FREI DE LUÍS DE SOUSA
TEMPO CRONOLÓGICO
6ª feira sábado domingo segunda terça quarta quinta sexta
28 de
julho
29 30 31
1 de
agosto
2 3
4 de
agosto
Começa o I Ato II Ato / III Ato
Final da tarde de tarde / alta noite (4h30)
Simbologia do n.º 3: número associado à perfeição por exprimir a totalidade. O tempo
é triplo: passado, presente e futuro. A peça tem três atos.
Simbologia do n.º 7: corresponde aos sete dias da semana, aos sete planetas, aos sete
graus da perfeição. A peça decorre em sete dias.
TEMPO SIMBÓLICO
A peça inicia-se e termina à sexta-feira, dia simbólico (aziago). O dia
sexta-feira possui um valor simbólico, dado que nele coincidem vários
acontecimentos na vida dos personagens:
casamento de Madalena com D. João de Portugal;
Madalena vê Manuel pela primeira vez e apaixona-se por ele, apesar
de estar casada com D. João de Portugal;
desaparecimento de D. João na Batalha de Alcácer Quibir (4 de agosto
4. Ficha Informativa FREI LUÍS DE SOUSA_4/7
de 1578); desaparece também o rei D. Sebastião;
Manuel de Sousa Coutinho incendeia a sua casa, o que origina a
mudança para o palácio de D. João, que aparece na figura do Romeiro.
É de destacar também a simbologia do número sete e dos seus múltiplos:
Madalena procura o primeiro marido durante 7 anos;
o casamento de Madalena e Manuel dura 14 anos;
D. João de Portugal regressa após 21 anos de cativeiro.
O número 7 corresponde ao número de dias que constituem uma semana, ligando-se
à conclusão de um ciclo e ao início de outro. Assim, sete relaciona-se com o final da vida
do casal e, consequentemente, com a sua tragédia pessoal.
TEMPO PSICOLÓGICO
À medida que o tempo passa as personagens vão-se tornando cada vez mais frágeis e
os seus receios aumentam. O seu sofrimento torna-se cada vez maior e mais intenso perante o
futuro. A coincidência entre o tempo dramático e o tempo psicológico é conseguido através das
palavras de Madalena que retém o seu terror pela sexta-feira, enfatizado pelo advérbio de
predicado com valor de tempo "hoje". Esta indicação surge como prenúncio da desgraça, da
fatalidade e da solidão.
CARACTERÍSTICAS DAS PERSONAGENS
D. MADALENA DE VILHENA:
no início da obra, D. Madalena está a ler o episódio de Inês de Castro de Os Lusíadas.
Ela compara-se à desafortunada Inês, cujos amores por D. Pedro tiveram um desfecho
trágico;
Madalena pressente o que lhe vai acontecer e nunca viveu em plena felicidade;
vive um profundo conflito íntimo, visto que não tem a certeza da morte do seu
primeiro marido;
mulher insegura, triste, angustiada, receosa do passado, vive constantemente
inquieta;
casou por amor com D. Manuel de Sousa Coutinho, mas o regresso do primeiro
marido impossibilita a sua união e acaba por seguir a vida religiosa.
D. MANUEL DE SOUSA COUTINHO:
homem decidido, corajoso, honrado, enérgico, patriota, bom marido, bom pai;
um nobre cuja razão domina os sentimentos;
num ato de coragem e de patriotismo incendeia o seu próprio palácio para impedir
que os espanhóis o ocupem;
casou por amor com D. Madalena, mas com o regresso do Romeiro é obrigado a
tomar o hábito para salvar a honra.
5. Ficha Informativa FREI LUÍS DE SOUSA_5/7
D. MARIA DE NORONHA:
precoce do ponto de vista físico e psicológico;
revela uma estranha sensibilidade;
possui os encantos característicos da alma infantil, pois é bondosa, pura, meiga,
imaginativa;
manifesta atributos típicos de um adulto, uma vez que é inteligente, intuitiva, lúcida e
culta (leu Camões, leu Bernardim Ribeiro);
é obcecada pelo rei D. Sebastião e vai ser o regresso de alguém que acompanhou D.
Sebastião na Batalha de Alcácer Quibir que vai destruir a sua vida, o que constitui uma
ironia do destino;
é doente, tem tuberculose: de facto, ela vê e ouve a grandes distâncias, o que
constitui um terrível sinal naqueles anos e com aquela compleição física;
a emoção leva-a à morte.
TELMO PAIS (representa a ave agoirenta do teatro clássico):
fiel servidor de D. João de Portugal e, mais tarde, de D. Maria;
mantinha a fidelidade a D. João e, de certa forma, criticava a precipitação de Madalena
e, no fundo, pensava que o seu amo poderia ainda estar vivo;
tem agoiros (previsão de coisas negativas) e pressentimentos que assustavam D.
Madalena;
é o conselheiro e o confidente de D. Maria e Madalena, dado que participa em diálogos
com estas duas personagens;
o facto de D. João estar vivo provoca um conflito em Telmo, na medida em que fica
dividido entre o amor que tem a D. João de Portugal e o amor que sente por Maria;
na ausência de D. João, educa e cria D. Maria como sua filha, honrando sempre a
memória do seu amo. No entanto, quando D. João volta, constata que o seu amor por
Maria é mais forte.
Frei Jorge:
irmão de Manuel de Sousa Coutinho;
representa o conselheiro, o confidente (nas horas de angústia), amigo de qualquer um
dos intervenientes;
vai ter um papel importante na identificação do Romeiro que na sua presença indicará o
quadro de D. João de Portugal.
D. JOÃO DE PORTUGAL (o Romeiro):
apresenta-se como um peregrino, mas é o próprio D. João de Portugal;
era um nobre valente, corajoso, honrado, patriota de grandes qualidades;
foi para a Batalha de Alcácer Quibir lutar pela defesa da fé cristã;
o seu nome aparece associado ao Apóstolo S. João que difundiu a vida de Cristo;
é alguém que estando ausente, está sempre presente;
simboliza o destino triste e melancólico;
21 anos após a Batalha de Alcácer Quibir.;e após vinte anos em cativeiro, estava
cansado, velho, sem forças, com umas barbas brancas e completamente irreconhecível
(nem a mulher o reconheceu).
AS DUAS PERSPETIVAS DA RESPOSTA «NINGUÉM» DADA PELO ROMEIRO A FREI JORGE:
«Jorge: Romeiro, romeiro, quem és tu?
Romeiro (apontando com o bordão para o retrato de D. João de Portugal): - Ninguém!»
6. Ficha Informativa FREI LUÍS DE SOUSA_6/7
D. JOÃO DE PORTUGAL diz que não é ninguém, dado que perdeu:
a família, a posição social, a riqueza e a juventude. Perdeu tudo o que tinha antes de
partir para a Batalha de Alcácer Quibir, uma vez que esteve em Jerusalém, na Palestina,
num cativeiro.
por outro lado, é alguém que vai destruir o casamento e a vida social de D. Manuel e D.
Madalena (tornando o casamento ilegítimo), vai tornar ilegítima Maria e separar,
inevitavelmente, D. Manuel, D. Madalena e D. Maria. É alguém que aparece 21 anos
depois, quando tudo estava alterado e todos o julgavam morto.
O CONFLITO ENTRE O PASSADO E O PRESENTE
O Frei Luís de Sousa exprime o conflito entre o passado e o presente. Com efeito, o
passado parece ser de tal modo recordado que faz com que D. Madalena se sinta
constantemente insegura, receosa, amedrontada e não viva o presente tranquilamente e com
segurança. D. Madalena não consegue libertar-se do passado, sente remorsos pelo que
aconteceu há anos atrás e vive permanentemente infeliz, temendo que o passado destrua o
presente. O passado impede D. Madalena de viver o presente serenamente, sem tormentos,
sem pressentimentos. De facto, a vida passada condiciona profundamente a vida presente, de
tal modo que o passado destrói completamente a vida presente e futura de D. Madalena, D.
Manuel e D. Maria.
O TEMA DA MORTE
D. Madalena e D. Manuel de Sousa Coutinho desprendem-se dos bens materiais e
seguem a vida de clausura, seguem a vida religiosa, o que constitui a morte para a vida social.
Devido à extrema emoção que sente perante os trágicos acontecimentos D. Maria
morre (morte física). É de notar que D. Maria sofria de tuberculose, surgindo indicações de
alguns sintomas ao longo da peça.
DISCURSO E LINGUAGEM
Almeida Garrett utiliza, ao longo da obra, o monólogo, o diálogo e o aparte. Utiliza
uma linguagem culta, adaptada às situações:
linguagem emotiva e apelativa, quando as personagens manifestam uma vontade
profunda;
linguagem reticente e profunda na voz de D. Madalena e Telmo Pais;
linguagem pesada e densa no final trágico da obra.
ESTILO DE ALMEIDA GARRETT
Usa frases exclamativas, expressando sentimentos profundos;
Uso de reticências, próprio da linguagem enigmática;
Utiliza figuras de estilo: comparação, metáfora, hipérbole …
CLASSIFICAÇÃO DA OBRA
O tema é nacional, é o Sebastianismo e o desejo do regresso do rei D. Sebastião. O
7. Ficha Informativa FREI LUÍS DE SOUSA_7/7
tema e a linguagem são românticos, por conseguinte a obra pode ser considerada um drama
romântico, uma vez que está escrita em prosa e não em verso, tal como determinava a
tragédia clássica. Trata-se de uma tragédia no que diz respeito ao conteúdo e à ação. Não obedece à
estrutura formal da tragédia, dado que não respeita as unidades de tempo e lugar.
OBJETIVO DA OBRA
Segundo a opinião de alguns críticos, esta obra, na intenção do autor, pretende ser uma
purificação moral e, segundo a opinião de outros críticos, tinha uma intenção política.