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VISÕES	DA	INFÂNCIA:	
uma	leitura	de	Campo	geral,	de	Guimarães	Rosa	
O	AUTOR	
João	Guimarães	Rosa	nasceu	em	1908,	na	pequena	cidade	de	Cordisburgo,	interior	
de	 Minas	 Gerais.	 Nunca	 mais	 o	 sertão	 de	 Minas	 abandonaria	 sua	 vida.	 Mesmo	
quando	distante	dele,	o	escritor	povoaria	sua	literatura	desse	ambiente	de	que	se	
impregnou	desde	a	infância.	Ali	mesmo	iniciou-se	nas	letras.	
Com	dez	anos,	mudou-se	com	o	avô	para	Belo	Horizonte,	onde	fez	o	ginásio.	Em	
1925,	 ingressou	 na	 Faculdade	 de	 Medicina,	 de	 onde	 saiu	 cinco	 anos	 depois,	 para	
exercer	a	profissão	no	interior	de	Minas	Gerais.	Travou	contato	ali	com	muitas	das	
histórias	e	dos	personagens	que	mais	tarde	habitariam	suas	narrativas.	Durante	a	
Revolução	 Constitucionalista	 de	 1932,	 serviu	 voluntariamente	 na	 Força	 Pública	 na	
capital	mineira.		
O	interesse	pelo	estudo	de	línguas	estrangeiras	levou-o	a	prestar	concurso	para	o	
Itamarati,	iniciando	a	carreira	diplomática	em	1934.	
Serviu	em	Hamburgo	em	1938	e	estava	em	Baden-Baden,	na	Alemanha,	em	1942,	
quando	o	Brasil	rompeu	relações	com	aquele	país.	Ficou	preso	na	Embaixada	com	
outros	membros	do	corpo	diplomático	brasileiro,	tendo	sido	trocado	por	diplomatas	
alemães,	voltando	para	o	Brasil	em	1944.		
Foi	 nomeado	 chefe	 de	 gabinete	 de	 um	 ministério	 em	 1946,	 mesmo	 ano	 em	 que	
publica,	depois	de	sucessivas	recomposições,	seu	livro	de	contos	Sagarana.	Rosa	já	
aparecera	 outras	 vezes	 antes	 pela	 imprensa	 nacional,	 com	 alguns	 contos	 que,	 no	
entanto,	ainda	não	faziam	prever	o	extraordinário	manipulador	das	palavras	em	que	
ele	se	transformaria.		
Continuou	 a	 carreira	 diplomática,	 e	 voltou	 a	 residir	 no	 Brasil	 a	 partir	 de	 1951,	
quando	 foi	 novamente	 nomeado	 chefe	 de	 gabinete	 ministerial.	 No	 ano	 seguinte,	
viaja	pelo	interior	de	Minas	Gerais	com	um	grupo	de	vaqueiros,	entre	os	quais	estava	
Manuel	Nerde,	o	Manuelzão	que	Rosa	imortalizaria	em	uma	de	suas	novelas,	e	que	
lhe	presentearia	com	muitas	outras	histórias	sertanejas.	
Essas	 histórias	 apareceriam	 em	 obras	 seguidas,	 publicadas	 enquanto	 o	 autor	
prosseguia	nos	serviços	diplomáticos,	mas	em	território	nacional.	Em	1963	foi	eleito	
para	a	Academia	Brasileira	de	Letras.	Mas	adiou	a	cerimônia	de	entrada	por	quatro	
anos.	Em	novembro	de	1967,	três	dias	depois	de	tomar	posse	na	cadeira	acadêmica,	
morreu	de	enfarte	
O	ENREDO	
Em	 Campo	 geral,	 como	 nas	 demais	 histórias	 criadas	 por	 João	 Guimarães	 Rosa,	
prevalece	o	tema	da	travessia,	a	viagem	real	e/ou	metafórica,	e	do	aprendizado	por	
ela	 proporcionado.	 Neste	 caso	 específico,	 trata-se	 da	 travessia	 da	 infância	 para	 a	
maturidade,	através	da	dor	de	crescer,	de	aprender	as	coisas	do	mundo.	
Miguilim,	 garoto	 sensível	 da	 região	 de	 Minas	 Gerais,	 começamos	 a	 vê-lo	 aos	 oito	
anos,	 com	 uma	 menção	 aos	 seus	 sete	 anos,	 quando	 esteve	 mergulhado	 numa	
preocupação	 em	 respeito	 ao	 local	 de	 sua	 residência,	 o	 Mutum	 –	 essa	 palavra
constitui	um	palíndromo,	ou	seja,	pode	tanto	ser	lida	da	direita	para	a	esquerda	com	
da	esquerda	para	a	direita,	sem	alterar-se.	E	o	mais	interessante	é	que	sua	grafia,	
MUTUM,	acaba	concretizando	o	próprio	local,	já	que	este	ficava	junto	a	um	covão	
(U),	entre	morro	e	morro	(M	e	M).	
Durante	uma	viagem	para	ser	crismado,	ouvira	alguém	falar	que	aquele	era	um	lugar	
muito	bonito.	Tão	feliz	fica	com	a	novidade	que	se	torna	ansioso	em	contá-la	para	a	
mãe,	Nhãnina,	crendo	que	assim	faria	com	que	ela	deixasse	de	ser	triste	por	morar	
ali.	
Seu	 jeito	 estabanado,	 no	 entanto,	 faz	 com	 que	 corra	 desesperado	 em	 direção	 da	
mãe,	passando	direto	pelo	pai,	Nhô	Bero,	irritando-o.	É	a	primeira	informação	que	o	
leitor	recebe	de	que	existe	na	narrativa	uma	transfiguração	do	complexo	de	Édipo,	já	
que	Miguilim	tem	uma	forte	identificação	afetiva	com	a	mãe	e	problemas	graves	de	
relacionamento	 com	 o	 pai,	 a	 ponto	 de,	 mais	 para	 frente,	 os	 dois	 se	 estranharem	
como	se	fossem	inimigos.	
Há	também	outras	pessoas	com	quem	o	protagonista	mantém	relação.	Podem	ser	
citados	os	irmãos	Chica,	Drelina	e	Tomezinho,	os	dois	últimos	de	gênio	difícil,	até	
maligno.	A	Rosa,	que	trabalha	em	sua	casa	e	com	quem	tem	uma	tranqüila	relação,	
muitas	 vezes	 acompanhando-o	 em	 seus	 sentimentos	 e	 fantasias.	 Vó	 Izidra,	 na	
realidade	 tia-avó	 por	 parte	 de	 mãe	 dele.	 Era	 uma	 mulher	 dotada	 de	 uma	 moral	
extremamente	 rígida,	 baseada	 num	 catolicismo	 um	 tanto	 tradicional,	 apegado	 a	
santos	 e	 rezas.	 É	 a	 religiosidade	 oficial,	 bem	 diferente	 de	 Mãitina,	 velhíssima	
remanescente	da	escravidão,	já	sem	juízo	e	com	fama	de	feiticeira.	Seu	misticismo	é	
muito	 mais	 primitivo,	 pois	 que	 baseado	 em	 magia	 (compare	 essas	 duas	 idosas.	
Ambas	 estão	 vinculadas	 ao	 misticismo,	 à	 religiosidade.	 A	 ligação	 com	 o	 aspecto	
oculto	de	nossa	existência	está	até	simbolizada	no	cômodo	em	que	cada	uma	fica:	
ambos	são	escuros	e	isolados.	Além	disso,	gostam	de	Miguilim.	A	diferença	é	que	Vó	
Izidra	é	mais	enrustida.	Há	também	diferenças	na	qualidade	da	religiosidade	de	cada	
uma.	Mãitina	é	mais	primitiva	enquanto	a	outra	segue	um	padrão	mais	oficial).	
Mas	 duas	 personagens	 são	 as	 mais	 importantes	 no	 círculo	 de	 relacionamento	 de	
Miguilim.	A	primeira	é	o	seu	irmão	Dito,	que,	apesar	de	mais	novo,	é	mais	sábio,	na	
medida	em	que	está	mais	preparado	para	o	lado	prático	da	vida.	Torna-se	a	âncora	
do	 protagonista,	 já	 que	 este	 é	 extremamente	 aluado.	 Por	 isso	 é	 constantemente	
consultado	pelo	personagem	principal.	
A	outra	figura	importante	é	o	Tio	Terêz	(dentro	da	elaboração	poética	de	sua	prosa,	
Guimarães	estabelece	uma	ortografia	própria,	muitas	vezes	afastando-se	do	padrão	
gramatical.	É	o	caso	do	“Terêz”,	já	que	oxítonas	terminadas	em	“z”	não	devem	ser	
acentuadas).	Irmão	de	Béro,	é	o	amigo	grande	de	Miguilim	(há	quem	extrapole	na	
interpretação	e	enxergue	na	relação	entre	Miguilim	e	Terêz,	tendo	também	em	vista	
o	 caso	 entre	 este	 e	 Nina,	 além	 dos	 conflitos	 entre	 o	 protagonista	 e	 seu	 pai,	 a	
possibilidade	 de	 que	 o	 menino	 seria	 filho	 não	 de	 Béro,	 mas	 de	 Terêz.	 Mas	 é	 um	
aspecto	que	de	forma	alguma	deve	ser	colocado	em	uma	prova,	pois	que	baseado	
em	 suspeitas	 muito	 leves).	 E	 sabemos,	 pelo	 olhar	 lacunoso	 de	 uma	 criança,	 que	
mantém	uma	relação	no	mínimo	perigosa	com	Nina.	Intuímos	isso	pela	briga	que	há	
entre	 pai	 e	 mãe	 em	 que	 esta	 quase	 apanha;	 só	 não	 sofreu	 porque	 Miguilim	 se	
interpôs	no	meio	do	casal,	acabando	por	sofrer	a	fúria	de	Béro	no	lugar	da	mãe.
Comenta-se	a	todo	instante	que	o	tio	não	ia	poder	mais	aparecer	no	Mutum.	Além	
disso,	 surge	 uma	 tempestade	 terrível,	 que	 é	 atribuída	 por	 Vó	 Izidra	 como	 castigo	
infligido	às	ações	pecaminosas	que	andavam	grassando.	
O	 temporal	 se	 vai,	 Tio	 Terêz	 some	 e	 o	 Mutum	 mergulha	 numa	 tranqüilidade	
momentânea.	É	quando	Miguilim	põe	na	mente	a	idéia	obsessiva	de	que	iria	morrer	
em	 dez	 dias.	 Passa	 a	 desenvolver	 um	 apego	 pela	 vida	 durante	 o	 decorrer	 desse	
período	e	principalmente	após	ele,	ao	descobrir	que	sobrevivera	a	ele.	
Nhô	Bero,	pouco	depois,	faz	com	que	Miguilim	lhe	leve	o	almoço.	É	uma	maneira	
que	entende	de	arranjar	utilidade	para	o	garoto,	que	realiza	sua	tarefa	com	orgulho.	
No	entanto,	em	uma	das	viagens,	é	surpreendido	por	Tio	Terêz,	que	lhe	entrega	uma	
carta	para	ser	entregue	à	Nina	e	diz	que	estaria	esperando	resposta	no	dia	seguinte.	
Começa	então	um	dilema	na	mente	do	menino.	Adora	o	tio	e,	portanto,	deve	fazer	o	
que	este	lhe	pediu.	No	entanto,	mesmo	não	tendo	consciência	do	que	acontecia,	
intui	que	o	que	era	pedido	era	errado.	Depois	de	muito	tempo	de	conflito	interior,	
decide	 não	 entregar	 a	 missiva,	 confessando,	 entre	 choros,	 ao	 tio,	 que	 facilmente	
entende.	É	um	grande	passo	no	crescimento	da	personagem.	
Introduzido	por	outra	tempestade,	chega	mais	um	período	de	crise.	É,	como	diz	o	
narrador,	o	momento	em	que	virou	o	tempo	do	ruim.	Começa	com	o	assassinato	de	
Patori,	garoto	imbuído	de	malignidade	e	que	maltratava	muito	Miguilim.	Seguem-se	
outros	fatos.	O	cachorro	Julim	foi	mortalmente	ferido	por	um	tamanduá.	Tomezinho	
sofre	com	a	picada	de	um	marimbondo.	O	touro	Rio	Negro	machuca	Miguilim,	que	
acaba	descontando	a	raiva	em	Dito.	Luisaltino	surge	e	começa	a	se	engraçar	com	
Nina	 (a	 mãe	 de	 Miguilim	 parece	 revelar	 um	 caráter	 no	 mínimo	 leviano,	 volúvel.	
Pode-se	desconfiar	de	um	certo	determinismo,	na	medida	em	que	sua	personalidade	
seria	 um	 reflexo	 das	 atividades	 exercidas	 pela	 mãe	 dela,	 que	 fora	 prostituta).	 O	
ponto	 crítico	 ocorre	 quando	 Dito	 vai	 espiar	 o	 ninho	 de	 uma	 coruja.	 A	 ave	 acaba	
dizendo	o	nome	dele,	o	que	é	visto	por	Miguilim	como	mau	agouro	(note	que,	para	
angústia	de	Miguilim,	o	papagaio	não	conseguia	falar	o	nome	de	Dito,	ao	contrário	
da	coruja.	Drama	temporário.	No	final,	muito	tempo	depois,	consegue-o).	
Tudo	é	preparação	de	clima	para	o	grande	desastre.	Durante	a	perseguição	que	as	
crianças	fazem	a	um	mico	que	havia	escapado,	Dito	acaba	tendo	o	pé	cortado	por	
um	caco	que	estava	no	terreiro.	O	machucado	piora,	colocando	o	menino	de	cama.	
Coincidência	 ou	 não,	 é	 época	 dos	 festejos	 de	 Natal,	 Vó	 Izidra	 até	 se	 dedicando	 a	
montar	seu	famoso	presépio.	
Dito	 não	 resiste	 ao	 mal	 que	 lhe	 acometeu,	 vindo	 por	 falecer.	 É	 uma	 experiência	
extremamente	 dolorosa	 para	 Miguilim,	 mas	 que	 pode	 ser	 vista	 como	 um	 passo	
importante	no	seu	amadurecimento.	Se	antes	o	protagonista	era	guiado	pelo	irmão,	
nos	momentos	de	convalescença	deste	o	jogo	começa	a	se	inverter.	É	Miguilim	que	
conta	ao	acamado	o	que	está	ocorrendo	no	mundo	ao	redor	deles.	Passa	a	ser,	pois,	
os	olhos	fraternos.	Com	a	morte,	a	personagem	principal	passa	um	longo	período	
curtindo	a	dor,	o	sofrimento,	até	que	assume	um	movimento	com	que	de	introjeção	
do	falecido,	já	que	antes	de	tomar	uma	decisão	sempre	se	pergunta	o	que	seu	irmão	
faria.	Ao	assumir	a	mesma	atitude	que	presume	ser	de	Dito,	praticamente	absorve-o	
em	seu	ser.	
Tanto	essa	evolução	é	verdade	que	Miguilim	agüenta	firme	o	sufoco	a	que	seu	pai	o
submete,	fazendo-o	trabalhar	no	roçado,	debaixo	de	um	sol	desumano.	Mas	o	mais	
importante	 é	 lembrar	 da	 sua	 participação	 no	 conflito	 que	 houve	 entre	 Liovaldo	 e	
Grivo.	
Grivo	era	um	rapaz	muito	pobre,	a	ponto	de	os	animais	de	criação,	como	galinhas,	
morarem	na	mesma	casa	dele.	Certa	vez	aparecera	no	Mutum	com	dois	patos	para	
serem	vendidos,	parca	fonte	de	sustento	para	si	e	para	mãe.	No	entanto,	Liovaldo,	
irmão	de	Miguilim	que	morava	na	cidade	e	que	estava	de	visita,	dominado	por	um	
espírito	 maléfico,	 começa	 a	 maltratar	 e	 até	 a	 machucar	 o	 pobre.	 Miguilim	 acha	
injusto	e	toma	partido,	batendo	no	agressor.	Seu	pai	fica	indignado	pelo	fato	de	o	
menino	não	respeitar	o	sangue	familiar	e,	incoerentemente,	dá	uma	surra	nele	que	
chega	 a	 espancamento.	 O	 protagonista,	 no	 entanto,	 não	 se	 sente	 mal,	 pelo	
contrário,	tem	raiva,	pois	sabe	que	está	certo	e	que	o	pai	está	imensamente	errado.	
Por	isso	pensa	em	vingança,	imaginando	até	a	morte	do	pai.	É	quando	ri,	em	meio	a	
surra,	o	que	faz	todos,	até	o	agressor,	pensarem	que	o	menino	endoidara,	talvez	até	
com	os	golpes.	
O	conflito	instaura	a	conquista,	por	Miguilim,	de	espaço	e	até	respeito	no	ambiente	
familiar.	Após	três	dias	que	passa	na	casa	de	um	vaqueiro,	para	protegê-lo	da	fúria	
do	 pai,	 retorna,	 mas	 não	 se	 mostra	 submisso.	 Como	 provocação,	 Béro	 quebra	 os	
brinquedos	e	gaiolas	do	filho.	Este	solta	os	passarinhos	que	tinha	presos	e	quebra	os	
brinquedos	que	sobraram.	É	um	sinal	de	que	havia	crescido	e	que,	portanto,	não	
precisava	mais	daquelas	diversões.	
Delimitadas	as	fronteiras,	Miguilim	pouco	depois	cai	doente	e	de	forma	tão	grave	
que	alterna	momentos	de	inconsciência	a	de	consciência	(a	doença	e	os	mergulhos	
de	 desligamento	 que	 provoca	 podem	 ser	 entendidos	 como	 um	 momento	 de	
incubação,	como	se	Miguilim,	dentro	de	um	casulo,	estivesse	em	uma	fase	no	final	
da	 qual	 se	 transformaria	 em	 outra	 pessoa).	 Nos	 instantes	 em	 que	 vem	 à	 tona	
percebe	picotes	de	realidade,	mas	que	nos	faz	entender	vários	acontecimentos.	O	
primeiro	é	o	desespero	do	pai,	que	se	sente	injustiçado	pela	providência	divina,	que	
parecia	 querer	 tomar	 mais	 um	 filho	 dele	 (Béro	 é,	 portanto,	 uma	 personagem	
complexa,	pois,	ao	mesmo	tempo	em	que	maltrata	seu	filho,	demonstra	amor	por	
ele.	Sua	agressividade	pode	ser	fruto	de	uma	vida	de	dificuldades	financeiras,	pois	
não	é	dono	de	suas	próprias	terras,	cuidando	do	que	era	alheio.	Nas	entrelinhas	fica	
o	 traçado	 de	 um	 caráter	 rico	 psicologicamente).	 Tenta	 ao	 máximo	 fazer	 suas	
vontades.	 Em	 vários	 outros	 despertares	 Miguilim	 toma	 conhecimento	 que	 Béro	
havia	matado	Luisaltino,	provavelmente	por	causa	de	Nhãnina.	Por	ter	caminhado	
pelas	trilhas	da	criminalidade,	acaba	por	se	suicidar.	
Quando	começa	a	melhorar,	o	protagonista	toma	conhecimento	de	que	Tio	Terêz	
tinha	voltado	e	ia	passar	a	morar	no	Mutum.	Era	a	união,	finalmente,	dele	com	Nina.	
Por	causa	disso,	Vó	Izidra	parte	de	lá,	indignada.	
No	 final,	 a	 chegada	 de	 um	 certo	 Dr.	 José	 Lourenço	 traz	 uma	 revelação	
surpreendente.	 É	 essa	 figura	 nova	 que	 descobre	 que	 Miguilim	 era	 míope.	 Ao	
emprestar	 ao	 menino	 seus	 óculos,	 permite	 à	 criança	 uma	 descoberta.	 Seu	 velho	
mundinho	 acaba	 ganhando	 uma	 visão	 completamente	 nova,	 mais	 nítida.	 É	 a	
simbologia	do	crescimento,	o	que	constitui	um	ritual	de	passagem.	Enxergar	mais	
nitidamente	o	mundo	significa	entrar	para	a	fase	adulta,	sair	da	infância.
Na	 companhia	 de	 tão	 importante	 mudança,	 Miguilim	 parte	 para	 a	 cidade.	 Sua	
viagem,	 somada	 à	 simbologia	 dos	 óculos,	 pode	 significar	 a	 entrada	 em	 um	 novo	
universo.	Miguilim	pode	tanto	ter	abandonado	a	visão	primitiva,	pré-lógica,	que	o	
caracterizara,	como	continuar,	em	meio	ao	universo	adulto,	preservando	seu	lado	
infantil.	É,	pois,	um	final	aberto,	a	permitir	mais	de	interpretação.	
NARRADOR	
Campo	Geral	foi	publicado	inicialmente	em	1956,	como	uma	das	histórias	de	Corpo	
de	Baile.	Em	1960,	esta	obra	desdobrou-se	em	três	volumes:	Manuelzão	e	Miguilim,	
No	 Urubuquaquá,	 no	 Pinhém	 e	 Noites	 do	 Sertão,	 passando	 Campo	 Geral	 a	
pertencer	ao	primeiro	deles,	Manuelzão	e	Miguilim.	
Com	foco	narrativo	em	terceira	pessoa,	Campo	Geral	caracteriza-se	por	um	narrador	
que	não	participa	diretamente	dos	acontecimentos	narrados,	o	que	o	coloca	como	
testemunha	daquilo	que	conta.	Não	se	trata,	entretanto,	de	uma	testemunha	que	
apenas	 observa	 os	 fatos:	 o	 narrador	 desvenda	 a	 interioridade	 dos	 personagens,	
assumindo	uma	onisciência	não-absoluta	(o	saber	tudo	sobre	eles),	mas	provocada	
pela	adesão,	pela	cumplicidade	com	o	protagonista	da	história,	um	menino	de	oito	
anos,	Miguilim.	
Para	 penetrar	 o	 imaginário	 do	 menino,	 para	 acompanhá-lo	 psicologicamente	 em	
suas	descobertas,	uma	das	técnicas	utilizadas	no	texto	é	o	discurso	indireto	livre,	que	
indelimita	 as	 fronteiras	 entre	 a	 voz	 do	 narrador	 e	 o	 fluxo	 de	 consciência	 do	
personagem,	tornando	indelimitadas,	ao	mesmo	tempo,	as	fronteiras	entre	fantasia	
e	 realidade	 –	 uma	 vez	 que	 adere	 ao	 universo	 alógico,	 encantado,	 da	 criança,	 um	
certo	 Miguilim,	 (que)	 morava	 com	 sua	 mãe,	 seu	 pai	 e	 seus	 irmãos,	 longe,	 longe	
daqui,	muito	depois	da	Vereda-do-Frango-d'Água	e	de	outras	veredas,	sem	nome	ou	
pouco	conhecidas,	no	Mutum.	
Trata-se	então	de	um	texto	que	privilegia	a	ótica	infantil,	repleta	de	lirismo	e	magia,	
ambientada	 num	 universo	 revelado	 no	 que	 tem	 de	 mítico	 e	 poético:	 o	 sertão.	 A	
história	de	Miguilim	nos	mostra	certos	detalhes	sutis	a	respeito	da	descoberta	da	
vida	nos	pequenos	fatos,	na	significação	lúdica	dos	brinquedos,	na	humanização	dos	
seres	da	natureza.	Ao	mesmo	tempo,	temas	como	a	crueldade	do	mundo	"adulto",	o	
medo	da	morte	e	a	religiosidade,	vão	sendo	desvendados,	sempre	na	perspectiva	do	
menino,	cuja	travessia	acompanhamos,	ao	longo	da	história.	
Veja	um	exemplo	da	proximidade	entre	o	narrador	e	Miguilim,	num	pequeno	trecho	
de	Campo	Geral:	
Mas,	 para	 o	 sentir	 de	 Miguilim,	 mais	 primeiro	 havia	 a	 Pingo-de-Ouro,	
uma	cachorra	bondosa	e	pertencida	de	ninguém,	mas	que	gostava	mais	
era	dele	mesmo.	Quando	ele	se	escondia	no	fundo	da	horta,	para	brincar	
sozinho,	ela	aparecia,	sem	atrapalhar,	sem	latir,	ficava	perto,	parece	que	
compreendia.	Estava	toda	sempre	magra,	doente	da	saúde,	diziam	que	ia	
ficando	cega.	Mas	teve	cachorrinhos.	Todos	morreram,	menos	um,	que	
era	tão	lindo	(...).	
LINGUAGEM	
A	 adesão	 do	 narrador	 ao	 universo	 mágico	 dos	 personagens,	 a	 humanização	 de
bichos,	 de	 plantas,	 de	 elementos	 da	 natureza,	 a	 presença	 de	 metalinguagem,	 a	
utilização	 de	 recursos	 da	 oralidade	 –	 como	 rimas	 e	 onomatopéias	 –	 a	 fusão	 da	
linguagem	 popular	 regionalista	 com	 a	 linguagem	 culta,	 os	 neologismos,	 os	
arcaísmos,	 o	 ritmo,	 dentre	 outros	 elementos,	 dão	 grande	 beleza,	 grande	
poeticidade,	ao	texto	lido.	
Na	 opinião	 de	 Antônio	 Cândido,	 Guimarães	 Rosa,	 ao	 reinventar	 o	 mundo,	
reinventando	a	linguagem	que	o	expressa,	cria	um	universo	autônomo	"composto	de	
realidades	expressionais	que	se	articulam	com	harmonia,	superando	por	milagre	o	
poderoso	lastro	de	realidade	tenazmente	observada,	que	é	a	sua	plataforma".	
Vamos	exemplificar	alguns	aspectos	da	linguagem	de	Campo	Geral,	transcrevendo	
passagens	significativas	para	a	sua	compreensão:	
.	a	atmosfera	de	sonho	e	afetividade,	na	recriação	do	universo	infantil,	animizando	
seres	da	natureza	e	explorando	a	expressividade	dos	diminutivos.	
Depois,	a	gente	cavocava	para	tirar	minhocas,	dar	para	as	perdizinhas.	
Mas	 o	 mico-estrela	 pegou	 as	 três,	 matou,	 foi	 uma	 pena,	 ele	 abriu	 as	
barriguinhas	delas.	Miguilim	não	contou	ao	Dito,	por	não	entristecer.	–	
"As	 perdizinhas	 estão	 assustadinhas,	 estão	 crescendo	 por	 demais...	
Amanhã	é	o	dia	de	Natal,	Dito!"	–	"Escuta,	Miguilim,	uma	coisa	você	me	
perdoa?	Eu	tive	inveja	de	você,	porque	o	Papaco-o-Paco	fala	Miguilim	me	
dá	um	beijim...	e	não	aprendeu	a	falar	meu	nome...	
.	 a	 intensidade	 emotiva	 dos	 sentimentos	 de	 criança,	 numa	 experiência	 com	 o	
sagrado,	que	vai	evocando	o	cotidiano	da	família	pela	visão	e	pela	lembrança	do	
menino	doente,	em	situação	de	expectativa	e	medo	da	morte:	
Agora	 era	 o	 dia	 derradeiro.	 Hoje,	 ele	 devia	 de	 morrer	 ou	 não	 morrer.	
Nem	ia	levantar	da	cama.	De	manhã,	ele	já	chuviscara	um	chorozinho,	o	
travesseiro	estava	molhado.	Morria,	ninguém	não	sentia	que	não	tinha	
mais	 o	 Miguilim.	 Morria,	 como	 arteirice	 de	 menino	 mau?	 –	 "Dito,	
pergunta	à	Rosa	se	de	noite	um	pássaro	riu	em	cima	do	paiol,	em	cima	
da	casa?"	O	dia	era	grande,	será	que	ele	ia	agüentar	de	ficar	o	tempo	
todo	 deitado?	 –	 "Miguilim,	 Mãe	 está	 chamando	 todos!	 É	 p'ra	 catar	
piolho..."	Miguilim	não	ia,	não	queria	se	levantar	da	cama.	–	"Que	é	que	
está	sentindo,	Miguilim?	Está	doente,	então	tem	de	tomar	purgante..."	A	
mãe	já	estaria	lá,	passando	o	pente-fino	na	cabeça	dos	outros,	botava	
óleo	 de	 babosa	 nos	 cabelos	 de	 Drelina	 e	 da	 Chica,	 suas	 duas	 muito	
irmãzinhas,	delas	gostava	tanto.	Tomezinho	chorava,	ninguém	não	podia	
com	Tomezinho.	–	"Miguilim	está	mesmo	doente?	Que	é	agora	que	ele	
tem?"	Era	Vovó	Isidra,	moendo	pó	em	seu	fornilho,	que	era	o	moinho-
de-mão,	de	pedra-sabão,	com	o	pião	no	meio,	mexia	com	o	moente,	que	
era	um	pau	cheiroso	de	sassafrás.	Miguilim	agora	em	tudo	queria	reparar	
demais,	lembrado.	
.	 a	 fusão	 entre	 poesia	 e	 prosa,	 numa	 narrativa	 atravessada	 por	 ritmos	 e	
sonoridades	poéticas:	
Lua	era	o	lugar	mais	distanciado	que	havia,	claro	impossível	de	tudo.
Mas	o	buriti	era	tão	exato	de	bonito.	
O	 ruim	 tem	 raiva	 do	 bom	 e	 do	 ruim.	 O	 bom	 tem	 pena	 do	 ruim	 e	 do	
bom...	Assim	está	certo.	
O	 mole	 judiado	 vai	 ficando	 forte,	 mas	 muito	 mais	 forte!	 Trastempo,	 o	
bruto	vai	ficando	mole,	mole...	
Só	 a	 Rosa	 parecia	 capaz	 de	 compreender	 no	 meio	 do	 sentir,	 mas	 um	
sentimento	 sabido	 e	 um	 compreendido	 adivinhado.	 Porque	 o	 miguilim	
queria	era	algum	sinal	do	Dito	morto	ainda	no	Dito	vivo,	ou	do	Dito	vivo	
mesmo	no	Dito	morto.	
PERSONAGENS	
A	propósito	de	Primeiras	 Estórias,	também	de	João	Guimarães	Rosa,	Alfredo	Bosi	
discute	sobre	o	fascínio	do	alógico,	presente	em	seu	trabalho.	"São	contos	povoados	
de	crianças,	loucos	e	seres	rústicos	que	cedem	ao	encanto	de	uma	iluminação	junto	
à	 qual	 os	 conflitos	 perdem	 todo	 o	 relevo	 e	 todo	 o	 sentido"	 (História	 Concisa	 da	
Literatura	Brasileira).	
Tanto	o	protagonista	de	Campo	Geral	–	Miguilim	–	quanto	o	Dito,	os	outros	irmãos,	
a	vó	Isidra,	o	vaqueiro	Salúz,	o	tio	Terêz,	a	mãe	Nhanina,	a	cachorrinha	Pingo-de-
Ouro,	 o	 papagaio	 e	 grande	 parte	 dos	 demais	 personagens,	 incluindo	 bichos	 e	
paisagem,	são	atravessados	pelo	fascínio	do	alógico.	
Por	 constituírem	 "seres	 em	 disponibilidade"	 –	 nas	 palavras	 de	 Walnice	 Nogueira	
Galvão	–	isto	é,	por	estarem	à	margem	do	processo	produtivo,	os	personagens	de	
Guimarães	Rosa,	como	ocorre	com	Miguilim,	em	Campo	Geral,	cedem	"ao	encanto	
de	uma	iluminação"	que	transcende	os	conflitos	que	vivenciam.	
Esta	iluminação	vem	primeiro	da	magia	do	mundo	que	povoam,	mas	vem	também	
do	acaso,	que	revela	a	miopia	de	Miguilim,	e	também	metaforicamente	lhe	permite	
crescer,	superar	o	universo	infantil.	
Participantes	 desta	 iluminação	 que	 transforma	 a	 existência	 de	 Miguilim,	 os	
personagens	podem	ser	pensados	como	forças	simbólicas	que	agem	em	sua	mente,	
ao	longo	deste	percurso,	já	que	os	conhecemos	pela	ótica	do	menino.	Vó	Isidra,	por	
exemplo,	 está	 ligada	 à	 religiosidade	 ancestral,	 com	 todas	 as	 imagens	 de	 morte	 e	
temor	ao	desconhecido	que	evoca.	Dito	revela,	ao	mesmo	tempo,	a	fragilidade,	a	
pureza	da	criança	e	o	poder	de	sua	sabedoria	instintiva,	hieroglífica.	
O	 pai	 –	a	força	bruta	e	selvagem	que	se	autodestrói	–,	e	a	 mãe	 –	a	beleza	fraca,	
passiva,	insatisfeita	–	estão	claramente	presentes	na	travessia	de	Miguilim,	que	se	
debate	entre	estes	valores	antagônicos	procurando	entender	o	bem	e	o	mal,	perde	a	
ingenuidade	(o	que	é	deflagrado	pela	morte	do	Dito),	recupera	o	afeto	que	provou	
ser	 verdadeiro	 (com	 a	 volta	 do	 tio	 Terêz)	 e,	 finalmente,	 transforma-se	 em	
personagem	e	testemunha	do	bem	vencendo	o	mal	(o	casamento	da	mãe	com	o	tio	
Terêz),	dos	fracos	se	fortalecendo	(a	cura	da	miopia	e	a	oportunidade	de	estudar).	
Simultaneamente	–	e	aí	nos	parece	estar	a	beleza	maior	desta	história	–	é	ambígua	a	
iluminação	de	Miguilim:	embora	parta	para	uma	nova	vida,	não	pode	abandonar	o	
sonho	 de	 pureza	 representado	 pelo	 Dito,	 a	 fragilidade	 representada	 pela	 mãe,	 o	
medo	da	força	bruta	representada	pelo	pai...	Assim,	ele	leva	dentro	de	si	o	mistério	e
os	símbolos	mágicos	de	seu	universo,	símbolos	com	os	quais	poderá	dialogar	para	
sempre,	como	acontece	aos	homens	em	relação	à	sua	infância.	
Entre	a	maldade	de	Liovaldo	e	a	pureza	do	Dito,	entre	a	fragilidade	da	mãe	e	a	força	
bruta	do	pai,	numa	palavra,	entre	o	bem	e	o	mal	este	menino	cresceu	até	se	deslocar	
para	outro	lugar.	Se	lá	abandonará	ou	não	o	Mutum	e/ou	os	valores	de	sua	infância,	
se	preservará	a	pureza	do	universo	onde	estão	suas	raízes,	não	ficamos	sabendo.	
Mas	podemos	pressentir,	atentando	para	o	sentido	profundo	do	reino	mitopoético	
criado	por	Guimarães	Rosa:	
O	 sertão	 é	 sem	 lugar.	 O	 senhor	 empurra	 para	 trás,	 mas,	 de	 repente,	 ele	 volta	 a	
rodear	o	senhor	dos	lados.	Sertão	é	quando	menos	se	espera.	Sertão	–	se	diz	–	o	
senhor	querendo	procurar	nunca	não	encontra.	De	repente,	por	si,	quando	a	gente	
não	espera,	o	sertão	vem.	Viver	é	muito	perigoso...	O	diabo	não	há!	É	o	que	digo,	se	
for...	Existe	é	homem	humano.	Travessia	(Grande	sertão:	veredas).
QUESTÕES	ABERTAS	SOBRE	CAMPO	GERAL	
01)	Embora	conheça	com	profundidade	os	personagens	da	história	que	conta	sem	
participar	dela,	o	narrador	de	Campo	Geral	escolhe	a	ótica	de	um	personagem	para	
narrar.	Que	personagem	é	este	e	como	percebemos	a	identificação	que	há	entre	ele	
o	narrador?	
02)	 (UNICAMP)	 No	 processo	 de	 crescimento	 de	 Miguilim,	 protagonista	 de	 Campo	
Geral,	de	João	Guimarães	Rosa,	há	vários	episódios	significativos.	Escolha	um	deles	e	
mostre	o	seu	sentido	no	contexto	geral	da	obra.	
03)	(UNICAMP)	Em	que	aspectos,	em	Campo	Geral,	de	Guimarães	Rosa,	a	trajetória	
de	Dito	e	de	Miguilim	ora	se	afastam,	ora	se	aproximam	uma	da	outra?	
04)	 (UNICAMP)	 Em	 Campo	 Geral,	 de	 João	 Guimarães	 Rosa,	 um	 certo	 Miguilim	
morava	com	sua	mãe,	seu	pai	e	seus	irmãos,	longe,	longe	daqui,	muito	depois	da	
Vereda-do-Frango-d'Água	e	de	outras	veredas	sem	nome	ou	pouco	conhecidas,	em	
ponto	remoto,	no	Mutum.	No	final	da	narrativa,	depois	de	tudo	o	que	ocorre	com	a	
personagem,	Miguilim	prepara-se	para	uma	viagem	decisiva	na	sua	vida.	Leia	com	
atenção	o	trecho	transcrito	acima,	que	indica	características	importantes	do	espaço	
em	que	a	personagem	vivia,	e	aponte	diferenças	entre	este	espaço	e	o	espaço	para	
onde	Miguilim	se	dirige	com	o	doutor	José	Lourenço.
RESPOSTAS	DAS	QUESTÕES	ABERTAS	SOBRE	CAMPO	GERAL	
01.	O	personagem	através	de	cuja	ótica	o	narrador	conta	a	história	de	Campo	Geral	
é	o	menino	Miguilim,	como	podemos	perceber	pela	pureza	e	ingenuidade,	pela	visão	
ao	mesmo	tempo	mágica	e	primitiva,	predominante	ao	longo	da	obra.	
02.	 No	 final	 da	 narrativa,	 o	 Dr.	 Lourenço	 empresta	 os	 óculos	 a	 Miguilim.	 Assim	 o	
garoto	percebe	que	não	enxergava	direito.	Essa	deficiência	visual,	percebemos	no	
fim,	 também	 era	 a	 causa	 da	 interiorização	 de	 Miguilim,	 que	 vivia	 dentro	 de	 um	
mundo	de	imaginação	infantil,	de	onde	é	tirado	brutalmente	pelos	sofrimentos	que	
a	vida	lhe	traz.	
03.	Dito	é	o	irmão	mais	próximo	de	Miguilim.	Ambos	seguem	a	mesma	trajetória	na	
convivência	 infantil,	 nas	 brincadeiras,	 nos	 segredos,	 nas	 conversas	 de	 dormir,	
destacando-se	a	proteção	de	Dito	a	Miguilim.	Há	uma	diferença,	entretanto:	Dito	é	
mais	intuitivo,	mais	religioso	e	mais	sábio	na	relação	com	os	adultos	(com	o	pai,	por	
exemplo)	 que	 Miguilim.	 Eles	 se	 afastam	 definitivamente	 quando	 Dito	 morre.	 A	
caminhada	de	Miguilim	em	direção	à	maturidade	não	é	acompanhada	pelo	irmão,	
que	se	transforma	assim	em	símbolo	de	pureza	e	de	sabedoria	para	Miguilim.	
04.	 O	 espaço	 de	 Mutum	 (o	 sertão,	 a	 zona	 rural)	 é	 isolado,	 apartado	 do	 mundo.	
Metaforicamente	 pode	 ser	 entendido	 como	 o	 mundo	 interno	 da	 infância,	 que	 se	
perde	com	o	crescimento.	Miguilim	vai	para	a	cidade	(espaço	urbano),	que	por	sua	
vez	pode	significar	a	maturidade.	
Enquanto	o	espaço	do	Mutum	é	primitivo,	mágico,	cheio	de	lendas	e	neste	conto	
associado	à	infância,	no	espaço	urbano,	para	onde	vai	Miguilim,	há	a	possibilidade	
de	crescer	intelectualmente,	de	amadurecer.
QUESTÕES	FECHADAS	SOBRE	CAMPO	GERAL	
01)	 Assinale	 a	 alternativa	 INCORRETA,	 referente	 à	 novela	 “Campo	 geral”,	 de	
Guimarães	Rosa:	
a)	A	personagem	Dito	apresenta	uma	serenidade	e	uma	sabedoria	extraordinárias	
para	a	sua	meninice.	
b)	Nhanina,	a	mãe	de	Miguilim,	tem	um	comportamento	sexual	e	afetivo	submisso	e	
inexpressivo.	
c)	 Miguilim	 encena	 uma	 história	 de	 amadurecimento	 e	 aprendizado,	 na	 qual	
descobre	o	sentido	da	morte.	
d)	 Os	 animais	 da	 história	 têm	 nome	 e	 relacionam-se	 simbolicamente	 aos	 seres	
humanos	com	quem	convivem.	
02)	 Marque	 a	 alternativa	 que	 apresenta	 personagens	 ligadas	 à	 religiosidade	 na	
novela	rosiana	“Campo	Geral”:	
a)	Drelina	e	Tomé	Cássio	
b)	Vovó	Izidra	e	Mãitina	
c)	Miguilim	e	Dito	
d)	Nhanina	e	Luizaltino	
03)	Assinale	a	opção	que	apresente	um	comentário	INCORRETO	acerca	da	novela	
“Campo	geral”,	de	Guimarães	Rosa:	
a)	Grande	relevância	do	espaço	físico.	
b)	Narrador	onisciente	neutro.	
c)	Presença	do	tempo	cronológico.	
d)	Uso	do	discurso	indireto	livre.	
04)	Todas	as	temáticas	abaixo	estão	presentes	em”Campo	geral”,	EXCETO:	
a)	morte	
b)	aprendizagem	
c)	urbanização	
d)	religiosidade	
05)	Qual	personagem	NÃO	foi	devidamente	caracterizada:	
a)	Miguilim:	tem	o	cabelo	preto	como	o	do	mãe,	parece-se	mais	com	ela.	Dotado	de	
grande	 sensibilidade,	 Miguilim	 demonstra	 ter	 alma	 de	 poeta.	 Parte	 de	 suas	
dificuldade	revela-se	mais	tarde	como	causada	por	uma	irritação	visual.	
b)	 Tomezinho:	 irmão	 mais	 velho	 de	 Miguilim,	 mas	 não	 morava	 com	 a	 família	 no	
Mutum.	
c)	Nhanina:	mãe	de	Miguilim,	era	muito	bonita,	não	gostava	do	Mutum,	sentia	muita	
tristeza	em	ter	que	viver	ali.	Não	dava	muita	importância	para	a	fidelidade	conjugal	
pois	traiu	o	marido	com	o	próprio	irmão	e	depois	com	Luisaltino.	
d)	 Nhô	 Bero	 (Bernardo	 Caz):	 pai	 de	 Miguilim,	 homem	 rude	 que	 parece	 ter	
implicância	com	Miguilim,	mas	de	quem	gosta,	embora	não	saiba	expressar	isso	com	
facilidade.	
06)	 (UNIMONTES)	 Assinale	 a	 alternativa	 INCORRETA,	 referente	 à	 novela	 "Campo	
geral".
a)	A	personagem	Dito	apresenta	uma	serenidade	e	uma	sabedoria	extraordinárias	
para	a	sua	meninice.	
b)	Francisca,	mãe	de	Miguilim,	tem	um	comportamento	sexual	e	afetivo	submisso	e	
inexpressivo.	
c)	 Miguilim	 encena	 uma	 história	 de	 amadurecimento	 e	 aprendizado,	 na	 qual	
descobre	o	sentido	da	morte.	
d)	 Os	 animais	 da	 história	 têm	 nome	 e	 relacionam-se	 simbolicamente	 aos	 seres	
humanos	com	quem	convivem.	
06)	 (PUC-Campinas)	 Einstein	 suspeitava,	 desde	 menino,	 que	 devia	 haver	 algo	
escondido	nas	profundezas	das	coisas.	Essa	sensação	precoce,	na	infância,	de	que	há	
uma	 dimensão	 oculta	 da	 vida,	 de	 que	 há	 uma	 sabedoria	 profunda	 em	 cada	
experiência	vivida	está	personificada	na	personagem	Dito,	da	novela	“Campo	geral”,	
de	Guimarães	Rosa.	A	respeito	de	Dito	se	lê:	
a)	Quando	[...]	falou,	aquilo	devagar	podia	parecer	justo,	[...]	sabia	tanta	coisa	tirada	
de	idéia,	Miguilim	se	espantava.	
b)	 [...]	 caminhava	 para	 a	 cozinha,	 devagaroso,	 cabeçudo,	 ele	 tinha	 sempre	 a	 cara	
fechada,	era	todo	grosso.	
c)	Com	a	colher	de	pau	mexia	a	goiabada,	horas	completas,	resmungava,	o	resmungo	
passava	da	linguagem	de	gente	para	aquela	linguagem	(...),	que	pouco	fazia.	
d)	 Diante	 do	 pai,	 que	 se	 irava	 feito	 um	 fero,	 não	 pôde	 falar	 nada,	 [...]	 tremia	 e	
soluçava;	e	correu	para	a	mãe,	que	estava	ajoelhada	encostada	na	mesa,	as	mãos	
tapando	o	rosto.	
e)	O	senhor	tinha	retirado	dele	os	óculos,	e	[...]	ainda	apontava,	falava,	contava	tudo	
como	era,	como	tinha	visto.	
07)	Só	NÃO	se	pode	afirmar,	sobre	o	conto	“Campo	geral”,	de	Guimarães	Rosa:	
a)	 Apresenta	 elevado	 nível	 de	 elaboração	 lingüística,	 o	 que	 se	 constata	 por	
intermédio	 da	 alteração	 da	 sintaxe	 tradicional,	 pelo	 intenso	 uso	 de	 figuras	 de	
linguagem	e	pelo	uso	poético	da	linguagem.	
b)	Problematiza	o	fato	de	que	a	infância	é	uma	época	de	aprendizagens,	tanto	de	
coisas	boas,	como	de	coisas	ruins.	
c)	Apresenta	um	narrador	de	terceira	pessoa,	que	narra	como	se	estivesse	ao	lado	
do	protagonista,	Miguilim,	uma	criança	de	oito	anos,	o	que	confere	ao	seu	relato	um	
aspecto	lírico,	inaugural,	poético.	
d)	Apresenta	um	retrato	idealizado	da	infância,	baseado	na	vida	do	autor,	Guimarães	
Rosa.	
08)	Qual	dentre	as	personagens	abaixo	representa	a	sabedoria	infantil	em	“Campo	
geral”,	de	Guimarães	Rosa:	
a)	Tomezinho	
b)	Miguilim	
c)	Dito	
d)	Liovaldo
GABARITO	DAS	QUESTÕES	FECHADAS	SOBRE	CAMPO	GERAL	
	
01)	B	
02)	B	
03)	A	
04)	C	
05)	B	
06)	A	
07)	D	
08)	C

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A viagem da infância de Miguilim

  • 1. VISÕES DA INFÂNCIA: uma leitura de Campo geral, de Guimarães Rosa O AUTOR João Guimarães Rosa nasceu em 1908, na pequena cidade de Cordisburgo, interior de Minas Gerais. Nunca mais o sertão de Minas abandonaria sua vida. Mesmo quando distante dele, o escritor povoaria sua literatura desse ambiente de que se impregnou desde a infância. Ali mesmo iniciou-se nas letras. Com dez anos, mudou-se com o avô para Belo Horizonte, onde fez o ginásio. Em 1925, ingressou na Faculdade de Medicina, de onde saiu cinco anos depois, para exercer a profissão no interior de Minas Gerais. Travou contato ali com muitas das histórias e dos personagens que mais tarde habitariam suas narrativas. Durante a Revolução Constitucionalista de 1932, serviu voluntariamente na Força Pública na capital mineira. O interesse pelo estudo de línguas estrangeiras levou-o a prestar concurso para o Itamarati, iniciando a carreira diplomática em 1934. Serviu em Hamburgo em 1938 e estava em Baden-Baden, na Alemanha, em 1942, quando o Brasil rompeu relações com aquele país. Ficou preso na Embaixada com outros membros do corpo diplomático brasileiro, tendo sido trocado por diplomatas alemães, voltando para o Brasil em 1944. Foi nomeado chefe de gabinete de um ministério em 1946, mesmo ano em que publica, depois de sucessivas recomposições, seu livro de contos Sagarana. Rosa já aparecera outras vezes antes pela imprensa nacional, com alguns contos que, no entanto, ainda não faziam prever o extraordinário manipulador das palavras em que ele se transformaria. Continuou a carreira diplomática, e voltou a residir no Brasil a partir de 1951, quando foi novamente nomeado chefe de gabinete ministerial. No ano seguinte, viaja pelo interior de Minas Gerais com um grupo de vaqueiros, entre os quais estava Manuel Nerde, o Manuelzão que Rosa imortalizaria em uma de suas novelas, e que lhe presentearia com muitas outras histórias sertanejas. Essas histórias apareceriam em obras seguidas, publicadas enquanto o autor prosseguia nos serviços diplomáticos, mas em território nacional. Em 1963 foi eleito para a Academia Brasileira de Letras. Mas adiou a cerimônia de entrada por quatro anos. Em novembro de 1967, três dias depois de tomar posse na cadeira acadêmica, morreu de enfarte O ENREDO Em Campo geral, como nas demais histórias criadas por João Guimarães Rosa, prevalece o tema da travessia, a viagem real e/ou metafórica, e do aprendizado por ela proporcionado. Neste caso específico, trata-se da travessia da infância para a maturidade, através da dor de crescer, de aprender as coisas do mundo. Miguilim, garoto sensível da região de Minas Gerais, começamos a vê-lo aos oito anos, com uma menção aos seus sete anos, quando esteve mergulhado numa preocupação em respeito ao local de sua residência, o Mutum – essa palavra
  • 2. constitui um palíndromo, ou seja, pode tanto ser lida da direita para a esquerda com da esquerda para a direita, sem alterar-se. E o mais interessante é que sua grafia, MUTUM, acaba concretizando o próprio local, já que este ficava junto a um covão (U), entre morro e morro (M e M). Durante uma viagem para ser crismado, ouvira alguém falar que aquele era um lugar muito bonito. Tão feliz fica com a novidade que se torna ansioso em contá-la para a mãe, Nhãnina, crendo que assim faria com que ela deixasse de ser triste por morar ali. Seu jeito estabanado, no entanto, faz com que corra desesperado em direção da mãe, passando direto pelo pai, Nhô Bero, irritando-o. É a primeira informação que o leitor recebe de que existe na narrativa uma transfiguração do complexo de Édipo, já que Miguilim tem uma forte identificação afetiva com a mãe e problemas graves de relacionamento com o pai, a ponto de, mais para frente, os dois se estranharem como se fossem inimigos. Há também outras pessoas com quem o protagonista mantém relação. Podem ser citados os irmãos Chica, Drelina e Tomezinho, os dois últimos de gênio difícil, até maligno. A Rosa, que trabalha em sua casa e com quem tem uma tranqüila relação, muitas vezes acompanhando-o em seus sentimentos e fantasias. Vó Izidra, na realidade tia-avó por parte de mãe dele. Era uma mulher dotada de uma moral extremamente rígida, baseada num catolicismo um tanto tradicional, apegado a santos e rezas. É a religiosidade oficial, bem diferente de Mãitina, velhíssima remanescente da escravidão, já sem juízo e com fama de feiticeira. Seu misticismo é muito mais primitivo, pois que baseado em magia (compare essas duas idosas. Ambas estão vinculadas ao misticismo, à religiosidade. A ligação com o aspecto oculto de nossa existência está até simbolizada no cômodo em que cada uma fica: ambos são escuros e isolados. Além disso, gostam de Miguilim. A diferença é que Vó Izidra é mais enrustida. Há também diferenças na qualidade da religiosidade de cada uma. Mãitina é mais primitiva enquanto a outra segue um padrão mais oficial). Mas duas personagens são as mais importantes no círculo de relacionamento de Miguilim. A primeira é o seu irmão Dito, que, apesar de mais novo, é mais sábio, na medida em que está mais preparado para o lado prático da vida. Torna-se a âncora do protagonista, já que este é extremamente aluado. Por isso é constantemente consultado pelo personagem principal. A outra figura importante é o Tio Terêz (dentro da elaboração poética de sua prosa, Guimarães estabelece uma ortografia própria, muitas vezes afastando-se do padrão gramatical. É o caso do “Terêz”, já que oxítonas terminadas em “z” não devem ser acentuadas). Irmão de Béro, é o amigo grande de Miguilim (há quem extrapole na interpretação e enxergue na relação entre Miguilim e Terêz, tendo também em vista o caso entre este e Nina, além dos conflitos entre o protagonista e seu pai, a possibilidade de que o menino seria filho não de Béro, mas de Terêz. Mas é um aspecto que de forma alguma deve ser colocado em uma prova, pois que baseado em suspeitas muito leves). E sabemos, pelo olhar lacunoso de uma criança, que mantém uma relação no mínimo perigosa com Nina. Intuímos isso pela briga que há entre pai e mãe em que esta quase apanha; só não sofreu porque Miguilim se interpôs no meio do casal, acabando por sofrer a fúria de Béro no lugar da mãe.
  • 3. Comenta-se a todo instante que o tio não ia poder mais aparecer no Mutum. Além disso, surge uma tempestade terrível, que é atribuída por Vó Izidra como castigo infligido às ações pecaminosas que andavam grassando. O temporal se vai, Tio Terêz some e o Mutum mergulha numa tranqüilidade momentânea. É quando Miguilim põe na mente a idéia obsessiva de que iria morrer em dez dias. Passa a desenvolver um apego pela vida durante o decorrer desse período e principalmente após ele, ao descobrir que sobrevivera a ele. Nhô Bero, pouco depois, faz com que Miguilim lhe leve o almoço. É uma maneira que entende de arranjar utilidade para o garoto, que realiza sua tarefa com orgulho. No entanto, em uma das viagens, é surpreendido por Tio Terêz, que lhe entrega uma carta para ser entregue à Nina e diz que estaria esperando resposta no dia seguinte. Começa então um dilema na mente do menino. Adora o tio e, portanto, deve fazer o que este lhe pediu. No entanto, mesmo não tendo consciência do que acontecia, intui que o que era pedido era errado. Depois de muito tempo de conflito interior, decide não entregar a missiva, confessando, entre choros, ao tio, que facilmente entende. É um grande passo no crescimento da personagem. Introduzido por outra tempestade, chega mais um período de crise. É, como diz o narrador, o momento em que virou o tempo do ruim. Começa com o assassinato de Patori, garoto imbuído de malignidade e que maltratava muito Miguilim. Seguem-se outros fatos. O cachorro Julim foi mortalmente ferido por um tamanduá. Tomezinho sofre com a picada de um marimbondo. O touro Rio Negro machuca Miguilim, que acaba descontando a raiva em Dito. Luisaltino surge e começa a se engraçar com Nina (a mãe de Miguilim parece revelar um caráter no mínimo leviano, volúvel. Pode-se desconfiar de um certo determinismo, na medida em que sua personalidade seria um reflexo das atividades exercidas pela mãe dela, que fora prostituta). O ponto crítico ocorre quando Dito vai espiar o ninho de uma coruja. A ave acaba dizendo o nome dele, o que é visto por Miguilim como mau agouro (note que, para angústia de Miguilim, o papagaio não conseguia falar o nome de Dito, ao contrário da coruja. Drama temporário. No final, muito tempo depois, consegue-o). Tudo é preparação de clima para o grande desastre. Durante a perseguição que as crianças fazem a um mico que havia escapado, Dito acaba tendo o pé cortado por um caco que estava no terreiro. O machucado piora, colocando o menino de cama. Coincidência ou não, é época dos festejos de Natal, Vó Izidra até se dedicando a montar seu famoso presépio. Dito não resiste ao mal que lhe acometeu, vindo por falecer. É uma experiência extremamente dolorosa para Miguilim, mas que pode ser vista como um passo importante no seu amadurecimento. Se antes o protagonista era guiado pelo irmão, nos momentos de convalescença deste o jogo começa a se inverter. É Miguilim que conta ao acamado o que está ocorrendo no mundo ao redor deles. Passa a ser, pois, os olhos fraternos. Com a morte, a personagem principal passa um longo período curtindo a dor, o sofrimento, até que assume um movimento com que de introjeção do falecido, já que antes de tomar uma decisão sempre se pergunta o que seu irmão faria. Ao assumir a mesma atitude que presume ser de Dito, praticamente absorve-o em seu ser. Tanto essa evolução é verdade que Miguilim agüenta firme o sufoco a que seu pai o
  • 4. submete, fazendo-o trabalhar no roçado, debaixo de um sol desumano. Mas o mais importante é lembrar da sua participação no conflito que houve entre Liovaldo e Grivo. Grivo era um rapaz muito pobre, a ponto de os animais de criação, como galinhas, morarem na mesma casa dele. Certa vez aparecera no Mutum com dois patos para serem vendidos, parca fonte de sustento para si e para mãe. No entanto, Liovaldo, irmão de Miguilim que morava na cidade e que estava de visita, dominado por um espírito maléfico, começa a maltratar e até a machucar o pobre. Miguilim acha injusto e toma partido, batendo no agressor. Seu pai fica indignado pelo fato de o menino não respeitar o sangue familiar e, incoerentemente, dá uma surra nele que chega a espancamento. O protagonista, no entanto, não se sente mal, pelo contrário, tem raiva, pois sabe que está certo e que o pai está imensamente errado. Por isso pensa em vingança, imaginando até a morte do pai. É quando ri, em meio a surra, o que faz todos, até o agressor, pensarem que o menino endoidara, talvez até com os golpes. O conflito instaura a conquista, por Miguilim, de espaço e até respeito no ambiente familiar. Após três dias que passa na casa de um vaqueiro, para protegê-lo da fúria do pai, retorna, mas não se mostra submisso. Como provocação, Béro quebra os brinquedos e gaiolas do filho. Este solta os passarinhos que tinha presos e quebra os brinquedos que sobraram. É um sinal de que havia crescido e que, portanto, não precisava mais daquelas diversões. Delimitadas as fronteiras, Miguilim pouco depois cai doente e de forma tão grave que alterna momentos de inconsciência a de consciência (a doença e os mergulhos de desligamento que provoca podem ser entendidos como um momento de incubação, como se Miguilim, dentro de um casulo, estivesse em uma fase no final da qual se transformaria em outra pessoa). Nos instantes em que vem à tona percebe picotes de realidade, mas que nos faz entender vários acontecimentos. O primeiro é o desespero do pai, que se sente injustiçado pela providência divina, que parecia querer tomar mais um filho dele (Béro é, portanto, uma personagem complexa, pois, ao mesmo tempo em que maltrata seu filho, demonstra amor por ele. Sua agressividade pode ser fruto de uma vida de dificuldades financeiras, pois não é dono de suas próprias terras, cuidando do que era alheio. Nas entrelinhas fica o traçado de um caráter rico psicologicamente). Tenta ao máximo fazer suas vontades. Em vários outros despertares Miguilim toma conhecimento que Béro havia matado Luisaltino, provavelmente por causa de Nhãnina. Por ter caminhado pelas trilhas da criminalidade, acaba por se suicidar. Quando começa a melhorar, o protagonista toma conhecimento de que Tio Terêz tinha voltado e ia passar a morar no Mutum. Era a união, finalmente, dele com Nina. Por causa disso, Vó Izidra parte de lá, indignada. No final, a chegada de um certo Dr. José Lourenço traz uma revelação surpreendente. É essa figura nova que descobre que Miguilim era míope. Ao emprestar ao menino seus óculos, permite à criança uma descoberta. Seu velho mundinho acaba ganhando uma visão completamente nova, mais nítida. É a simbologia do crescimento, o que constitui um ritual de passagem. Enxergar mais nitidamente o mundo significa entrar para a fase adulta, sair da infância.
  • 5. Na companhia de tão importante mudança, Miguilim parte para a cidade. Sua viagem, somada à simbologia dos óculos, pode significar a entrada em um novo universo. Miguilim pode tanto ter abandonado a visão primitiva, pré-lógica, que o caracterizara, como continuar, em meio ao universo adulto, preservando seu lado infantil. É, pois, um final aberto, a permitir mais de interpretação. NARRADOR Campo Geral foi publicado inicialmente em 1956, como uma das histórias de Corpo de Baile. Em 1960, esta obra desdobrou-se em três volumes: Manuelzão e Miguilim, No Urubuquaquá, no Pinhém e Noites do Sertão, passando Campo Geral a pertencer ao primeiro deles, Manuelzão e Miguilim. Com foco narrativo em terceira pessoa, Campo Geral caracteriza-se por um narrador que não participa diretamente dos acontecimentos narrados, o que o coloca como testemunha daquilo que conta. Não se trata, entretanto, de uma testemunha que apenas observa os fatos: o narrador desvenda a interioridade dos personagens, assumindo uma onisciência não-absoluta (o saber tudo sobre eles), mas provocada pela adesão, pela cumplicidade com o protagonista da história, um menino de oito anos, Miguilim. Para penetrar o imaginário do menino, para acompanhá-lo psicologicamente em suas descobertas, uma das técnicas utilizadas no texto é o discurso indireto livre, que indelimita as fronteiras entre a voz do narrador e o fluxo de consciência do personagem, tornando indelimitadas, ao mesmo tempo, as fronteiras entre fantasia e realidade – uma vez que adere ao universo alógico, encantado, da criança, um certo Miguilim, (que) morava com sua mãe, seu pai e seus irmãos, longe, longe daqui, muito depois da Vereda-do-Frango-d'Água e de outras veredas, sem nome ou pouco conhecidas, no Mutum. Trata-se então de um texto que privilegia a ótica infantil, repleta de lirismo e magia, ambientada num universo revelado no que tem de mítico e poético: o sertão. A história de Miguilim nos mostra certos detalhes sutis a respeito da descoberta da vida nos pequenos fatos, na significação lúdica dos brinquedos, na humanização dos seres da natureza. Ao mesmo tempo, temas como a crueldade do mundo "adulto", o medo da morte e a religiosidade, vão sendo desvendados, sempre na perspectiva do menino, cuja travessia acompanhamos, ao longo da história. Veja um exemplo da proximidade entre o narrador e Miguilim, num pequeno trecho de Campo Geral: Mas, para o sentir de Miguilim, mais primeiro havia a Pingo-de-Ouro, uma cachorra bondosa e pertencida de ninguém, mas que gostava mais era dele mesmo. Quando ele se escondia no fundo da horta, para brincar sozinho, ela aparecia, sem atrapalhar, sem latir, ficava perto, parece que compreendia. Estava toda sempre magra, doente da saúde, diziam que ia ficando cega. Mas teve cachorrinhos. Todos morreram, menos um, que era tão lindo (...). LINGUAGEM A adesão do narrador ao universo mágico dos personagens, a humanização de
  • 6. bichos, de plantas, de elementos da natureza, a presença de metalinguagem, a utilização de recursos da oralidade – como rimas e onomatopéias – a fusão da linguagem popular regionalista com a linguagem culta, os neologismos, os arcaísmos, o ritmo, dentre outros elementos, dão grande beleza, grande poeticidade, ao texto lido. Na opinião de Antônio Cândido, Guimarães Rosa, ao reinventar o mundo, reinventando a linguagem que o expressa, cria um universo autônomo "composto de realidades expressionais que se articulam com harmonia, superando por milagre o poderoso lastro de realidade tenazmente observada, que é a sua plataforma". Vamos exemplificar alguns aspectos da linguagem de Campo Geral, transcrevendo passagens significativas para a sua compreensão: . a atmosfera de sonho e afetividade, na recriação do universo infantil, animizando seres da natureza e explorando a expressividade dos diminutivos. Depois, a gente cavocava para tirar minhocas, dar para as perdizinhas. Mas o mico-estrela pegou as três, matou, foi uma pena, ele abriu as barriguinhas delas. Miguilim não contou ao Dito, por não entristecer. – "As perdizinhas estão assustadinhas, estão crescendo por demais... Amanhã é o dia de Natal, Dito!" – "Escuta, Miguilim, uma coisa você me perdoa? Eu tive inveja de você, porque o Papaco-o-Paco fala Miguilim me dá um beijim... e não aprendeu a falar meu nome... . a intensidade emotiva dos sentimentos de criança, numa experiência com o sagrado, que vai evocando o cotidiano da família pela visão e pela lembrança do menino doente, em situação de expectativa e medo da morte: Agora era o dia derradeiro. Hoje, ele devia de morrer ou não morrer. Nem ia levantar da cama. De manhã, ele já chuviscara um chorozinho, o travesseiro estava molhado. Morria, ninguém não sentia que não tinha mais o Miguilim. Morria, como arteirice de menino mau? – "Dito, pergunta à Rosa se de noite um pássaro riu em cima do paiol, em cima da casa?" O dia era grande, será que ele ia agüentar de ficar o tempo todo deitado? – "Miguilim, Mãe está chamando todos! É p'ra catar piolho..." Miguilim não ia, não queria se levantar da cama. – "Que é que está sentindo, Miguilim? Está doente, então tem de tomar purgante..." A mãe já estaria lá, passando o pente-fino na cabeça dos outros, botava óleo de babosa nos cabelos de Drelina e da Chica, suas duas muito irmãzinhas, delas gostava tanto. Tomezinho chorava, ninguém não podia com Tomezinho. – "Miguilim está mesmo doente? Que é agora que ele tem?" Era Vovó Isidra, moendo pó em seu fornilho, que era o moinho- de-mão, de pedra-sabão, com o pião no meio, mexia com o moente, que era um pau cheiroso de sassafrás. Miguilim agora em tudo queria reparar demais, lembrado. . a fusão entre poesia e prosa, numa narrativa atravessada por ritmos e sonoridades poéticas: Lua era o lugar mais distanciado que havia, claro impossível de tudo.
  • 7. Mas o buriti era tão exato de bonito. O ruim tem raiva do bom e do ruim. O bom tem pena do ruim e do bom... Assim está certo. O mole judiado vai ficando forte, mas muito mais forte! Trastempo, o bruto vai ficando mole, mole... Só a Rosa parecia capaz de compreender no meio do sentir, mas um sentimento sabido e um compreendido adivinhado. Porque o miguilim queria era algum sinal do Dito morto ainda no Dito vivo, ou do Dito vivo mesmo no Dito morto. PERSONAGENS A propósito de Primeiras Estórias, também de João Guimarães Rosa, Alfredo Bosi discute sobre o fascínio do alógico, presente em seu trabalho. "São contos povoados de crianças, loucos e seres rústicos que cedem ao encanto de uma iluminação junto à qual os conflitos perdem todo o relevo e todo o sentido" (História Concisa da Literatura Brasileira). Tanto o protagonista de Campo Geral – Miguilim – quanto o Dito, os outros irmãos, a vó Isidra, o vaqueiro Salúz, o tio Terêz, a mãe Nhanina, a cachorrinha Pingo-de- Ouro, o papagaio e grande parte dos demais personagens, incluindo bichos e paisagem, são atravessados pelo fascínio do alógico. Por constituírem "seres em disponibilidade" – nas palavras de Walnice Nogueira Galvão – isto é, por estarem à margem do processo produtivo, os personagens de Guimarães Rosa, como ocorre com Miguilim, em Campo Geral, cedem "ao encanto de uma iluminação" que transcende os conflitos que vivenciam. Esta iluminação vem primeiro da magia do mundo que povoam, mas vem também do acaso, que revela a miopia de Miguilim, e também metaforicamente lhe permite crescer, superar o universo infantil. Participantes desta iluminação que transforma a existência de Miguilim, os personagens podem ser pensados como forças simbólicas que agem em sua mente, ao longo deste percurso, já que os conhecemos pela ótica do menino. Vó Isidra, por exemplo, está ligada à religiosidade ancestral, com todas as imagens de morte e temor ao desconhecido que evoca. Dito revela, ao mesmo tempo, a fragilidade, a pureza da criança e o poder de sua sabedoria instintiva, hieroglífica. O pai – a força bruta e selvagem que se autodestrói –, e a mãe – a beleza fraca, passiva, insatisfeita – estão claramente presentes na travessia de Miguilim, que se debate entre estes valores antagônicos procurando entender o bem e o mal, perde a ingenuidade (o que é deflagrado pela morte do Dito), recupera o afeto que provou ser verdadeiro (com a volta do tio Terêz) e, finalmente, transforma-se em personagem e testemunha do bem vencendo o mal (o casamento da mãe com o tio Terêz), dos fracos se fortalecendo (a cura da miopia e a oportunidade de estudar). Simultaneamente – e aí nos parece estar a beleza maior desta história – é ambígua a iluminação de Miguilim: embora parta para uma nova vida, não pode abandonar o sonho de pureza representado pelo Dito, a fragilidade representada pela mãe, o medo da força bruta representada pelo pai... Assim, ele leva dentro de si o mistério e
  • 8. os símbolos mágicos de seu universo, símbolos com os quais poderá dialogar para sempre, como acontece aos homens em relação à sua infância. Entre a maldade de Liovaldo e a pureza do Dito, entre a fragilidade da mãe e a força bruta do pai, numa palavra, entre o bem e o mal este menino cresceu até se deslocar para outro lugar. Se lá abandonará ou não o Mutum e/ou os valores de sua infância, se preservará a pureza do universo onde estão suas raízes, não ficamos sabendo. Mas podemos pressentir, atentando para o sentido profundo do reino mitopoético criado por Guimarães Rosa: O sertão é sem lugar. O senhor empurra para trás, mas, de repente, ele volta a rodear o senhor dos lados. Sertão é quando menos se espera. Sertão – se diz – o senhor querendo procurar nunca não encontra. De repente, por si, quando a gente não espera, o sertão vem. Viver é muito perigoso... O diabo não há! É o que digo, se for... Existe é homem humano. Travessia (Grande sertão: veredas).
  • 9. QUESTÕES ABERTAS SOBRE CAMPO GERAL 01) Embora conheça com profundidade os personagens da história que conta sem participar dela, o narrador de Campo Geral escolhe a ótica de um personagem para narrar. Que personagem é este e como percebemos a identificação que há entre ele o narrador? 02) (UNICAMP) No processo de crescimento de Miguilim, protagonista de Campo Geral, de João Guimarães Rosa, há vários episódios significativos. Escolha um deles e mostre o seu sentido no contexto geral da obra. 03) (UNICAMP) Em que aspectos, em Campo Geral, de Guimarães Rosa, a trajetória de Dito e de Miguilim ora se afastam, ora se aproximam uma da outra? 04) (UNICAMP) Em Campo Geral, de João Guimarães Rosa, um certo Miguilim morava com sua mãe, seu pai e seus irmãos, longe, longe daqui, muito depois da Vereda-do-Frango-d'Água e de outras veredas sem nome ou pouco conhecidas, em ponto remoto, no Mutum. No final da narrativa, depois de tudo o que ocorre com a personagem, Miguilim prepara-se para uma viagem decisiva na sua vida. Leia com atenção o trecho transcrito acima, que indica características importantes do espaço em que a personagem vivia, e aponte diferenças entre este espaço e o espaço para onde Miguilim se dirige com o doutor José Lourenço.
  • 10. RESPOSTAS DAS QUESTÕES ABERTAS SOBRE CAMPO GERAL 01. O personagem através de cuja ótica o narrador conta a história de Campo Geral é o menino Miguilim, como podemos perceber pela pureza e ingenuidade, pela visão ao mesmo tempo mágica e primitiva, predominante ao longo da obra. 02. No final da narrativa, o Dr. Lourenço empresta os óculos a Miguilim. Assim o garoto percebe que não enxergava direito. Essa deficiência visual, percebemos no fim, também era a causa da interiorização de Miguilim, que vivia dentro de um mundo de imaginação infantil, de onde é tirado brutalmente pelos sofrimentos que a vida lhe traz. 03. Dito é o irmão mais próximo de Miguilim. Ambos seguem a mesma trajetória na convivência infantil, nas brincadeiras, nos segredos, nas conversas de dormir, destacando-se a proteção de Dito a Miguilim. Há uma diferença, entretanto: Dito é mais intuitivo, mais religioso e mais sábio na relação com os adultos (com o pai, por exemplo) que Miguilim. Eles se afastam definitivamente quando Dito morre. A caminhada de Miguilim em direção à maturidade não é acompanhada pelo irmão, que se transforma assim em símbolo de pureza e de sabedoria para Miguilim. 04. O espaço de Mutum (o sertão, a zona rural) é isolado, apartado do mundo. Metaforicamente pode ser entendido como o mundo interno da infância, que se perde com o crescimento. Miguilim vai para a cidade (espaço urbano), que por sua vez pode significar a maturidade. Enquanto o espaço do Mutum é primitivo, mágico, cheio de lendas e neste conto associado à infância, no espaço urbano, para onde vai Miguilim, há a possibilidade de crescer intelectualmente, de amadurecer.
  • 11. QUESTÕES FECHADAS SOBRE CAMPO GERAL 01) Assinale a alternativa INCORRETA, referente à novela “Campo geral”, de Guimarães Rosa: a) A personagem Dito apresenta uma serenidade e uma sabedoria extraordinárias para a sua meninice. b) Nhanina, a mãe de Miguilim, tem um comportamento sexual e afetivo submisso e inexpressivo. c) Miguilim encena uma história de amadurecimento e aprendizado, na qual descobre o sentido da morte. d) Os animais da história têm nome e relacionam-se simbolicamente aos seres humanos com quem convivem. 02) Marque a alternativa que apresenta personagens ligadas à religiosidade na novela rosiana “Campo Geral”: a) Drelina e Tomé Cássio b) Vovó Izidra e Mãitina c) Miguilim e Dito d) Nhanina e Luizaltino 03) Assinale a opção que apresente um comentário INCORRETO acerca da novela “Campo geral”, de Guimarães Rosa: a) Grande relevância do espaço físico. b) Narrador onisciente neutro. c) Presença do tempo cronológico. d) Uso do discurso indireto livre. 04) Todas as temáticas abaixo estão presentes em”Campo geral”, EXCETO: a) morte b) aprendizagem c) urbanização d) religiosidade 05) Qual personagem NÃO foi devidamente caracterizada: a) Miguilim: tem o cabelo preto como o do mãe, parece-se mais com ela. Dotado de grande sensibilidade, Miguilim demonstra ter alma de poeta. Parte de suas dificuldade revela-se mais tarde como causada por uma irritação visual. b) Tomezinho: irmão mais velho de Miguilim, mas não morava com a família no Mutum. c) Nhanina: mãe de Miguilim, era muito bonita, não gostava do Mutum, sentia muita tristeza em ter que viver ali. Não dava muita importância para a fidelidade conjugal pois traiu o marido com o próprio irmão e depois com Luisaltino. d) Nhô Bero (Bernardo Caz): pai de Miguilim, homem rude que parece ter implicância com Miguilim, mas de quem gosta, embora não saiba expressar isso com facilidade. 06) (UNIMONTES) Assinale a alternativa INCORRETA, referente à novela "Campo geral".
  • 12. a) A personagem Dito apresenta uma serenidade e uma sabedoria extraordinárias para a sua meninice. b) Francisca, mãe de Miguilim, tem um comportamento sexual e afetivo submisso e inexpressivo. c) Miguilim encena uma história de amadurecimento e aprendizado, na qual descobre o sentido da morte. d) Os animais da história têm nome e relacionam-se simbolicamente aos seres humanos com quem convivem. 06) (PUC-Campinas) Einstein suspeitava, desde menino, que devia haver algo escondido nas profundezas das coisas. Essa sensação precoce, na infância, de que há uma dimensão oculta da vida, de que há uma sabedoria profunda em cada experiência vivida está personificada na personagem Dito, da novela “Campo geral”, de Guimarães Rosa. A respeito de Dito se lê: a) Quando [...] falou, aquilo devagar podia parecer justo, [...] sabia tanta coisa tirada de idéia, Miguilim se espantava. b) [...] caminhava para a cozinha, devagaroso, cabeçudo, ele tinha sempre a cara fechada, era todo grosso. c) Com a colher de pau mexia a goiabada, horas completas, resmungava, o resmungo passava da linguagem de gente para aquela linguagem (...), que pouco fazia. d) Diante do pai, que se irava feito um fero, não pôde falar nada, [...] tremia e soluçava; e correu para a mãe, que estava ajoelhada encostada na mesa, as mãos tapando o rosto. e) O senhor tinha retirado dele os óculos, e [...] ainda apontava, falava, contava tudo como era, como tinha visto. 07) Só NÃO se pode afirmar, sobre o conto “Campo geral”, de Guimarães Rosa: a) Apresenta elevado nível de elaboração lingüística, o que se constata por intermédio da alteração da sintaxe tradicional, pelo intenso uso de figuras de linguagem e pelo uso poético da linguagem. b) Problematiza o fato de que a infância é uma época de aprendizagens, tanto de coisas boas, como de coisas ruins. c) Apresenta um narrador de terceira pessoa, que narra como se estivesse ao lado do protagonista, Miguilim, uma criança de oito anos, o que confere ao seu relato um aspecto lírico, inaugural, poético. d) Apresenta um retrato idealizado da infância, baseado na vida do autor, Guimarães Rosa. 08) Qual dentre as personagens abaixo representa a sabedoria infantil em “Campo geral”, de Guimarães Rosa: a) Tomezinho b) Miguilim c) Dito d) Liovaldo