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João Guimarães Rosa

  "Quando escrevo, repito o que já vivi antes.
   E para estas duas vidas, um léxico só não é
                   suficiente.
Em outras palavras, gostaria de ser um crocodilo
 vivendo no rio São Francisco. Gostaria de ser
   um crocodilo porque amo os grandes rios,
pois são profundos como a alma de um homem.
    Na superfície são muito vivazes e claros,
 mas nas profundezas são tranqüilos e escuros
        como o sofrimento dos homens.“
João Guimarães Rosa nasceu em
  Cordisburgo (MG) a 27 de junho de
1908 e era o primeiro dos seis filhos de
 D. Francisca (Chiquitinha) Guimarães
Rosa e de Florduardo Pinto Rosa, mais
conhecido por "seu Fulô" comerciante,
    juiz-de-paz, caçador de onças e
          contador de estórias.
Em 1967, João Guimarães Rosa seria indicado para o prêmio Nobel de
Literatura. A indicação, iniciativa dos seus editores alemães, franceses e
italianos, foi barrada pela morte do escritor. A obra do brasileiro havia
alcançado esferas talvez até hoje desconhecidas. Quando morreu tinha 59
anos. Tinha-se dedicado à medicina, à diplomacia, e, fundamentalmente
às suas crenças, descritas em sua obra literária. Fenômeno da literatura
brasileira,Rosa começou a publicar aos 38 anos. O autor, com seus
experimentoslingüísticos, sua técnica, seu mundo ficcional, renovou o
romance brasileiro, concedendo-lhe caminhos até então inéditos. Sua
obra se impôs não apenas no Brasil, mas alcançou o mundo.
BIBLIOGRAFIA:
          - Magma (1936), poemas. Não chegou a publicá-los.
   - Sagarana (1946), contos e novelas regionalistas. Livro de estréia.
                    - Com o vaqueiro Mariano (1947)
- Corpo de Baile (1956), novelas. (Atualmente publicado em três partes:

                         - Manuelzão e Miguilim,
                     - No Urubuquaquá, no Pinhém e
                            - Noites do sertão.)
               - Grande Sertão: Veredas (1956), romance.
                   - Primeiras estórias (1962), contos.
              - Tutaméia:Terceiras estórias (1967), contos.
            - Estas estórias (1969), contos. Obra póstuma.
             - Ave, palavra (1970) diversos. Obra póstuma.
Campos Gerais-Manuelzão e Miguilim
    A obra de ficção mais conhecida de Guimarães Rosa consta de contos, novelas e um romance
  monumental, publicado em 1956, que é Grandes Sertão: Veredas - livro que desconcertou a crítica.
   Entre os livros de contos, destaca-se Sagarana, seu livro de estréia, publicado em 1946, que foi
  recebido como "uma das mais importantes obras aparecidas no Brasil contemporâneo"; Primeiras
Estórias (1962); Tutaméia (Terceiras estórias), de 1967; e o livro póstumo Estas estórias (1969). Corpo
  de Baile contém várias novelas e, a partir de 1964, foi desdobrado em três volumes: "Manuelzão e
      Miguilim", "No Urubuquáquá, no Pinhém", e "Noites do Sertão". As duas primeiras, também
 conhecidas como "Uma estória de amor" e "Campo Geral". Como observa Beth Brait, em "Literatura
    Comentada", da Abril Editora, "Campo Geral é uma narrativa profundamente lírica que traduz a
habilidade de Guimarães Rosa para recriar o mundo captado pela perspectiva de uma criança." Pode-
      se dizer que Campo Geral é uma espécie de biografia, em que muitos críticos vêem traços
  autobiográficos do autor. O tema do livro é a infância - a infância de um menino da roça, com usas
  descobertas da vida. Como sempre, tudo vem trabalhado com o inconfundível estilo de Guimarães
 Rosa numa linguagem estonteante nos seus recursos expressivos. Quanto a "Uma estória de amor",
 que focaliza a outra ponta da vida, de forma igualmente lírica, relata-se, ao mesmo tempo que se vai
 reconstituindo a vida do vaqueiro sessentão Manuelzão, a festa de consagração de uma capela que
 ele faz construir na fazenda que administra. Toda a narrativa desenvolve-se na véspera de sair uma
 boiada, o tema boi serve de ligação entre as cenas, reaparecendo aqui e ali, dominante, ora como o
     próprio animal, ora como vaqueiro ou instrumento de trabalho (contracapa). As duas novelas
 complementam-se como histórias de um começo e de um fim de vida. Enquanto a do menino é uma
   constante e por vezes dolorosa descoberta do mundo, a do vaqueiro sessentão é um relembrar
 também por vezes doloroso do que foi a sua vida, em que as recordações se misturam com os fatos
         do presente, como se aquela festa fosse a própria súmula de seus dias (contracapa).
PERSONAGENS

  Além de Miguilim, protagonista da estória., o qual se revela um menino
sensível, delicado e inteligente ao longo da narrativa, o universo da novela
       "Campo Geral" é composto de várias outras personagens:

   1) A família de Miguilim é constituída do pai (Nhô Berno), meio seco
   autoritário; a mãe (Nhanina), que "era linda e tinha cabelos pretos e
 compridos"; os irmãos Tomezinho e Dito; as irmãs Chica e Drelina; a avó
                            Izidra; e o tio Terêz.

  2) Fazendo parte da família, como empregadas da casa, destacam-se a
 preta Mãitina, Rosa Maria e Pretinha. Ligados à família, mas com alguma
   independência, destacam-se aqui também, os vaqueiros Salúz e Jé.

3) Ainda no universo da família, podemos inserir aqui os cachorros (sempre
    individualizados com um nome próprio), o gato Sossõe e o papagaio
                             Papaco-o-Paco.

  4) Entre os conhecidos e amigos, destacam-se o alegre e simpático seu
  Luisaltino, que veio morar com a família e ajudava o Pai no roçado. Para
finalizar, é importante observar que, ao contrário da cidade grande onde as
 pessoas praticamente são anônimas, no mundo roseano tudo e todos têm
                 um nome que os caracteriza e individualiza.
ESTILO DE ÉPOCA

 A originalidade da linguagem de Guimarães Rosa, a sua inventividade e criatividade
   configuram bem o estilo de época (pós)-modernista. Essa preocupação em fazer
diferente, saindo do convencional, é, sem dúvida, uma das grandes característica do
  estilo de época contemporâneo. É o próprio Guimarães quem fala: "Disso resultam
 meus livros, escritos em um idioma próprio, meu, e pode-se deduzir daí que não me
submeto à tirania da gramática e dos dicionários dos outros". Outra coisa que marca
       bem o estilo de época na obra é a capacidade revelada pelo escritor (pós)-
    modernista para refletir sobre problemas universais, partindo de uma realidade
 regional. É o que diz a contracapa de "Literatura Comentada": "Nele , quanto mais -
aparentemente - particularizado o tema, mais universal ele é. Quanto mais simplórios
 seus personagens, mais ricas sua personalidades. Assim, rudes sertanejos refletem
de forma peculiar e extremamente sutil os grandes dramas metafísicos e existenciais
da humanidade". É isto que se vê em Guimarães Rosa e outro grandes escritores na
nossa Literatura: há sempre uma dimensão universal no aparentemente regional. "O
     sertão que vem de Guimarães Rosa não se restringe aos limites geográficos
 brasileiros, ainda que dele extrais a sua matéria-prima. O sertão aparece como uma
   forma de aprendizado sobre a vida, sobre a existência, não apenas do sertanejo,
        mas do homem". Como dizia o próprio Guimarães: "o sertão é o mundo".
Análise da obra
   Narrativa profundamente lírica, pertencente à obra Manuelzão e
  Miguilim, Campo Geral traduz a habilidade de Guimarães Rosa para
recriar o mundo captado pela perspectiva de uma criança. Se a infância
aparece com freqüência nos textos roseanos, sempre ligada à magia de
  um mundo em que a sensibilidade, a emoção e o poder das palavras
    compõem um universo próximo ao dos poetas e dos loucos, em
Miguilim, nome com que passou a ser conhecida a novela, essa temática
    encontra um de seus momentos mais brilhantes e comoventes.

É uma espécie de biografia de infância - que alguns críticos afirmam ter
   muito de autobiográfico -, centrada em Miguilim, um menino que
  morava com sua família no Mutum, um remoto lugarejo no sertão.
Foco narrativo
 Narrado em terceira pessoa, narrador onisciente. Apesar de ser escrita em terceira
pessoa, a história é filtrada unicamente pelo ponto de vista de Miguilim e, por essa
razão, o mundo infantil é organizado a partir das vivências de um menino sensível,
delicado, inteligente, empenhado em compreender as pessoas e as coisas. As outras
personagens - a mãe, o pai, os irmãos, o tio, a avó e todos que vivem e passam pelo
 Mutum - aparecem misturadas às emoções e às reflexões do personagem central.


                              Temática
 Os temas fundamentais são a infância, o amor e a amizade, a violência e a fé. A
  criança é revelada como a criatura em que a hipocrisia e a maldade ainda não
 deitaram raízes profundas, embora algumas delas já possam apresentar no seu
desenvolvimento essas características negativas. Exemplo disso pode ser visto em
 Patori e Liovaldo. O par Miguilim / Dito pode ser visto como duas faces de uma
mesma moeda, opostos e complementares, pois Miguilim é o que precisa aprender
para saber, enquanto Dito sabe de modo imediato sem saber como. Dito é sábio e
 Miguilim é o aprendiz. Nesse sentido, a morte de Dito pode ser vista como uma
    necessidade existencial para levar Miguilim a crescer, a tornar-se maduro,
                                  independente.
Enredo de Campo Geral

Miguilim, garoto sensível da região de Minas Gerais, começamos a vê-lo aos oito anos,
com uma menção aos seus sete anos, quando esteve mergulhado numa preocupação
em respeito ao local de sua residência, o Mutum (essa palavra constitui um
palíndromo, ou seja, pode tanto ser lida da direita para a esquerda com da esquerda
para a direita, sem alterar-se. E o mais interessante é que sua grafia, MUTUM, acaba
concretizando o próprio local, já que este ficava junto a um covão (U), entre morro e
morro (M e M). Durante uma viagem para ser crismado, ouvira alguém falar que aquele
era um lugar muito bonito. Tão feliz fica com a novidade que se torna ansioso em
contá-la para a mãe, Nhãnina, crendo que assim faria com que ela deixasse de ser triste
por morar ali.

Seu jeito estabanado, no entanto, faz com que corra desesperado em direção da mãe,
passando direto pelo pai, Nhô Bero, irritando-o. É a primeira informação que o leitor
recebe de que existe na narrativa uma transfiguração do complexo de Édipo, já que
Miguilim tem uma forte identificação afetiva com a mãe e problemas graves de
relacionamento com o pai, a ponto de, mais para frente, os dois se estranharem como
se fossem inimigos.
Há também outras pessoas com quem o protagonista mantém relação. Podem ser
citados os irmãos Chica, Drelina e Tomezinho, os dois últimos de gênio difícil, até
maligno. A Rosa, que trabalha em sua casa e com quem tem uma tranqüila relação,
muitas vezes acompanhando-o em seus sentimentos e fantasias. Vó Izidra, na
realidade tia-avó por parte de mãe dele. Era uma mulher dotada de uma moral
extremamente rígida, baseada num catolicismo um tanto tradicional, apegado a
santos e rezas. É a religiosidade oficial, bem diferente de Mãitina, velhíssima
remanescente da escravidão, já sem juízo e com fama de feiticeira. Seu misticismo é
muito mais primitivo, pois que baseado em magia (compare essas duas idosas. Ambas
estão vinculadas ao misticismo, à religiosidade. A ligação com o aspecto oculto de
nossa existência está até simbolizada no cômodo em que cada uma fica: ambos são
escuros e isolados. Além disso, gostam de Miguilim. A diferença é que Vó Izidra é mais
enrustida. Há também diferenças na qualidade da religiosidade de cada uma. Mãitina
é mais primitiva enquanto a outra segue um padrão mais oficial).

Mas duas personagens são as mais importantes no círculo de relacionamento de
Miguilim. A primeira é o seu irmão Dito, que, apesar de mais novo, é mais sábio, na
medida em que está mais preparado para o lado prático da vida. Torna-se a âncora do
protagonista, já que este é extremamente aluado. Por isso é constantemente
consultado pelo personagem principal.
A outra figura importante é o Tio Terêz (dentro da elaboração poética de sua prosa,
Guimarães estabelece uma ortografia própria, muitas vezes afastando-se do padrão
gramatical. É o caso do “Terêz”, já que oxítonas terminadas em “z” não devem ser
acentuadas). Irmão de Béro, é o amigo grande de Miguilim (há quem extrapole na
interpretação e enxergue na relação entre Miguilim e Terêz, tendo também em vista o
caso entre este e Nina, além dos conflitos entre o protagonista e seu pai, a
possibilidade de que o menino seria filho não de Béro, mas de Terêz. Mas é um
aspecto que de forma alguma deve ser colocado em uma prova, pois que baseado em
suspeitas muito leves). E sabemos, pelo olhar lacunoso de uma criança, que mantém
uma relação no mínimo perigosa com Nina. Intuímos isso pela briga que há entre pai
e mãe em que esta quase apanha; só não sofreu porque Miguilim se interpôs no meio
do casal, acabando por sofrer a fúria de Béro no lugar da mãe. Comenta-se a todo
instante que o tio não ia poder mais aparecer no Mutum. Além disso, surge uma
tempestade terrível, que é atribuída por Vó Izidra como castigo infligido às ações
pecaminosas que andavam grassando.

O temporal se vai, Tio Terêz some e o Mutum mergulha numa tranqüilidade
momentânea. É quando Miguilim põe na mente a idéia obsessiva de que iria morrer
em dez dias. Passa a desenvolver um apego pela vida durante o decorrer desse período
e principalmente após ele, ao descobrir que sobrevivera a ele.
Nhô Bero, pouco depois, faz com que Miguilim lhe leve o almoço. É uma maneira que
entende de arranjar utilidade para o garoto, que realiza sua tarefa com orgulho. No
entanto, em uma das viagens, é surpreendido por Tio Terêz, que lhe entrega uma carta
para ser entregue à Nina e diz que estaria esperando resposta no dia seguinte. Começa
então um dilema na mente do menino. Adora o tio e, portanto, deve fazer o que este
lhe pediu. No entanto, mesmo não tendo consciência do que acontecia, intui que o
que era pedido era errado. Depois de muito tempo de conflito interior, decide não
entregar a missiva, confessando, entre choros, ao tio, que facilmente entende. É um
grande passo no crescimento da personagem.

Introduzido por outra tempestade, chega mais um período de crise. É, como diz o
narrador, o momento em que virou o tempo do ruim. Começa com o assassinato de
Patori, garoto imbuído de malignidade e que maltratava muito Miguilim. Seguem-se
outros fatos. O cachorro Julim foi mortalmente ferido por um tamanduá. Tomezinho
sofre com a picada de um marimbondo. O touro Rio Negro machuca Miguilim, que
acaba descontando a raiva em Dito. Luisaltino surge e começa a se engraçar com Nina
(a mãe de Miguilim parece revelar um caráter no mínimo leviano, volúvel. Pode-se
desconfiar de um certo determinismo, na medida em que sua personalidade seria um
reflexo das atividades exercidas pela mãe dela, que fora prostituta). O ponto crítico
ocorre quando Dito vai espiar o ninho de uma coruja. A ave acaba dizendo o nome
dele, o que é visto por Miguilim como mau agouro (note que, para angústia de
Miguilim, o papagaio não conseguia falar o nome de Dito, ao contrário da coruja.
Drama temporário. No final, muito tempo depois, consegue-o).
Tudo é preparação de clima para o grande desastre. Durante a perseguição que as
crianças fazem a um mico que havia escapado, Dito acaba tendo o pé cortado por
um caco que estava no terreiro. O machucado piora, colocando o menino de cama.
Coincidência ou não, é época dos festejos de Natal, Vó Izidra até se dedicando a
montar seu famoso presépio.

Dito não resiste ao mal que lhe acometeu, vindo por falecer. É uma experiência
extremamente dolorosa para Miguilim, mas que pode ser vista como um passo
importante no seu amadurecimento. Se antes o protagonista era guiado pelo
irmão, nos momentos de convalescença deste o jogo começa a se inverter. É
Miguilim que conta ao acamado o que está ocorrendo no mundo ao redor deles.
Passa a ser, pois, os olhos fraternos. Com a morte, a personagem principal passa
um longo período curtindo a dor, o sofrimento, até que assume um movimento
com que de introjeção do falecido, já que antes de tomar uma
decisão sempre se pergunta o que seu irmão faria. Ao assumir a mesma atitude que
presume ser de Dito, praticamente absorve-o em seu ser.
Tanto essa evolução é verdade que Miguilim agüenta firme o sufoco a que seu pai o
submete, fazendo-o trabalhar no roçado, debaixo de um sol desumano. Mas o mais
importante é lembrar da sua participação no conflito que houve entre Liovaldo e
Grivo.

Grivo era um rapaz muito pobre, a ponto de os animais de criação, como galinhas,
morarem na mesma casa dele. Certa vez aparecera no Mutum com dois patos para
serem vendidos, parca fonte de sustento para si e para mãe. No entanto, Liovaldo,
irmão de Miguilim que morava na cidade e que estava de visita, dominado por um
espírito maléfico, começa a maltratar e até a machucar o pobre. Miguilim acha
injusto e toma partido, batendo no agressor. Seu pai fica indignado pelo fato de o
menino não respeitar o sangue familiar e, incoerentemente, dá uma surra nele que
chega a espancamento. O protagonista, no entanto, não se sente mal, pelo contrário,
tem raiva, pois sabe que está certo e que o pai está imensamente errado. Por isso
pensa em vingança, imaginando até a morte do pai. É quando ri, em meio a surra, o
que faz todos, até o agressor, pensarem que o menino endoidara, talvez até com os
golpes.
O conflito instaura a conquista, por Miguilim, de espaço e até respeito no ambiente
familiar. Após três dias que passa na casa de um vaqueiro, para protegê-lo da fúria do
pai, retorna, mas não se mostra submisso. Como provocação, Béro quebra os
brinquedos e gaiolas do filho. Este solta os passarinhos que tinha presos e quebra os
brinquedos que sobraram. É um sinal de que havia crescido e que, portanto, não
precisava mais daquelas diversões.

Delimitadas as fronteiras, Miguilim pouco depois cai doente e de forma tão grave que
alterna momentos de inconsciência a de consciência (a doença e os mergulhos de
desligamento que provoca podem ser entendidos como um momento de incubação,
como se Miguilim, dentro de um casulo, estivesse em uma fase no final da qual se
transformaria em outra pessoa). Nos instantes em que vem à tona percebe picotes de
realidade, mas que nos faz entender vários acontecimentos. O primeiro é o desespero
do pai, que se sente injustiçado pela providência divina, que parecia querer tomar mais
um filho dele (Béro é, portanto, uma personagem complexa, pois, ao mesmo tempo em
que maltrata seu filho, demonstra amor por ele. Sua agressividade pode ser fruto de
uma vida de dificuldades financeiras, pois não é dono de suas próprias terras, cuidando
do que era alheio. Nas entrelinhas fica o traçado de um caráter rico psicologicamente).
Tenta ao máximo fazer suas vontades. Em vários outros despertares Miguilim toma
conhecimento que Béro havia matado Luisaltino, provavelmente por causa de
Nhãnina. Por ter caminhado pelas trilhas da criminalidade, acaba por se suicidar.
Quando começa a melhorar, o protagonista toma conhecimento de que Tio Terêz
tinha voltado e ia passar a morar no Mutum. Era a união, finalmente, dele com Nina.
Por causa disso, Vó Izidra parte de lá, indignada.

No final, a chegada de um certo Dr. José Lourenço traz uma revelação surpreendente.
É essa figura nova que descobre que Miguilim era míope. Ao emprestar ao menino
seus óculos, permite à criança uma descoberta. Seu velho mundinho acaba ganhando
uma visão completamente nova, mais nítida. É a simbologia do crescimento, o que
constitui um ritual de passagem. Enxergar mais nitidamente o mundo significa entrar
para a fase adulta, sair da infância.

Na companhia de tão importante mudança, Miguilim parte para a cidade. Sua
viagem, somada à simbologia dos óculos, pode significar a entrada em um novo
universo. Miguilim pode tanto ter abandonado a visão primitiva, pré-lógica, que o
caracterizara, como continuar, em meio ao universo adulto, preservando seu lado
infantil. É, pois, um final aberto, a permitir mais de interpretação.
A NOVELA COMO ESPÉCIE LITERÁRIA

  Como espécie literária, a novela não se distingue do romance, evidentemente, pelo
critério quantitativo, mas pelo essencial e estrutural. Tradicionalmente, a novela é uma
         modalidade literária que se caracteriza pela linearidade dos caracteres e
        acontecimentos, pela sucessividade episódica e pelo gosto das peripécias.
 Contrariamente ao romance, a novela não tem a complexidade dessa espécie literária,
 pois não se detém na análise minuciosa e detalhada dos fatos e personagens. A novela
 condensa os elementos do romance: os diálogos são rápidos e a narrativa é direta, sem
muitas divagações. Nesse sentido, muita coisa que chamamos de romance não passa de
 novela. Naturalmente a novela moderna, como tudo que é moderno, evoluiu e não se
   sujeita a regras preestabelecidas. Tal como o conto, parodiando Mário de Andrade,
"sempre será novela aquilo que seu autor batizou com o nome de novela". Como autor
    (pós)-modernista, Guimarães Rosa procurou ser original, imprimindo, em suas
    criações literárias, a sua marca pessoal, o seu estilo inconfundível. Suas novelas,
    contudo, apesar das inovações, sempre apresentam aquela essência básica dessa
  modalidade literária, que é o apego a uma fabulação contínua como um rio, de caso-
                                        puxa-caso.
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  • 1. João Guimarães Rosa "Quando escrevo, repito o que já vivi antes. E para estas duas vidas, um léxico só não é suficiente. Em outras palavras, gostaria de ser um crocodilo vivendo no rio São Francisco. Gostaria de ser um crocodilo porque amo os grandes rios, pois são profundos como a alma de um homem. Na superfície são muito vivazes e claros, mas nas profundezas são tranqüilos e escuros como o sofrimento dos homens.“
  • 2. João Guimarães Rosa nasceu em Cordisburgo (MG) a 27 de junho de 1908 e era o primeiro dos seis filhos de D. Francisca (Chiquitinha) Guimarães Rosa e de Florduardo Pinto Rosa, mais conhecido por "seu Fulô" comerciante, juiz-de-paz, caçador de onças e contador de estórias.
  • 3. Em 1967, João Guimarães Rosa seria indicado para o prêmio Nobel de Literatura. A indicação, iniciativa dos seus editores alemães, franceses e italianos, foi barrada pela morte do escritor. A obra do brasileiro havia alcançado esferas talvez até hoje desconhecidas. Quando morreu tinha 59 anos. Tinha-se dedicado à medicina, à diplomacia, e, fundamentalmente às suas crenças, descritas em sua obra literária. Fenômeno da literatura brasileira,Rosa começou a publicar aos 38 anos. O autor, com seus experimentoslingüísticos, sua técnica, seu mundo ficcional, renovou o romance brasileiro, concedendo-lhe caminhos até então inéditos. Sua obra se impôs não apenas no Brasil, mas alcançou o mundo.
  • 4. BIBLIOGRAFIA: - Magma (1936), poemas. Não chegou a publicá-los. - Sagarana (1946), contos e novelas regionalistas. Livro de estréia. - Com o vaqueiro Mariano (1947) - Corpo de Baile (1956), novelas. (Atualmente publicado em três partes: - Manuelzão e Miguilim, - No Urubuquaquá, no Pinhém e - Noites do sertão.) - Grande Sertão: Veredas (1956), romance. - Primeiras estórias (1962), contos. - Tutaméia:Terceiras estórias (1967), contos. - Estas estórias (1969), contos. Obra póstuma. - Ave, palavra (1970) diversos. Obra póstuma.
  • 5. Campos Gerais-Manuelzão e Miguilim A obra de ficção mais conhecida de Guimarães Rosa consta de contos, novelas e um romance monumental, publicado em 1956, que é Grandes Sertão: Veredas - livro que desconcertou a crítica. Entre os livros de contos, destaca-se Sagarana, seu livro de estréia, publicado em 1946, que foi recebido como "uma das mais importantes obras aparecidas no Brasil contemporâneo"; Primeiras Estórias (1962); Tutaméia (Terceiras estórias), de 1967; e o livro póstumo Estas estórias (1969). Corpo de Baile contém várias novelas e, a partir de 1964, foi desdobrado em três volumes: "Manuelzão e Miguilim", "No Urubuquáquá, no Pinhém", e "Noites do Sertão". As duas primeiras, também conhecidas como "Uma estória de amor" e "Campo Geral". Como observa Beth Brait, em "Literatura Comentada", da Abril Editora, "Campo Geral é uma narrativa profundamente lírica que traduz a habilidade de Guimarães Rosa para recriar o mundo captado pela perspectiva de uma criança." Pode- se dizer que Campo Geral é uma espécie de biografia, em que muitos críticos vêem traços autobiográficos do autor. O tema do livro é a infância - a infância de um menino da roça, com usas descobertas da vida. Como sempre, tudo vem trabalhado com o inconfundível estilo de Guimarães Rosa numa linguagem estonteante nos seus recursos expressivos. Quanto a "Uma estória de amor", que focaliza a outra ponta da vida, de forma igualmente lírica, relata-se, ao mesmo tempo que se vai reconstituindo a vida do vaqueiro sessentão Manuelzão, a festa de consagração de uma capela que ele faz construir na fazenda que administra. Toda a narrativa desenvolve-se na véspera de sair uma boiada, o tema boi serve de ligação entre as cenas, reaparecendo aqui e ali, dominante, ora como o próprio animal, ora como vaqueiro ou instrumento de trabalho (contracapa). As duas novelas complementam-se como histórias de um começo e de um fim de vida. Enquanto a do menino é uma constante e por vezes dolorosa descoberta do mundo, a do vaqueiro sessentão é um relembrar também por vezes doloroso do que foi a sua vida, em que as recordações se misturam com os fatos do presente, como se aquela festa fosse a própria súmula de seus dias (contracapa).
  • 6. PERSONAGENS Além de Miguilim, protagonista da estória., o qual se revela um menino sensível, delicado e inteligente ao longo da narrativa, o universo da novela "Campo Geral" é composto de várias outras personagens: 1) A família de Miguilim é constituída do pai (Nhô Berno), meio seco autoritário; a mãe (Nhanina), que "era linda e tinha cabelos pretos e compridos"; os irmãos Tomezinho e Dito; as irmãs Chica e Drelina; a avó Izidra; e o tio Terêz. 2) Fazendo parte da família, como empregadas da casa, destacam-se a preta Mãitina, Rosa Maria e Pretinha. Ligados à família, mas com alguma independência, destacam-se aqui também, os vaqueiros Salúz e Jé. 3) Ainda no universo da família, podemos inserir aqui os cachorros (sempre individualizados com um nome próprio), o gato Sossõe e o papagaio Papaco-o-Paco. 4) Entre os conhecidos e amigos, destacam-se o alegre e simpático seu Luisaltino, que veio morar com a família e ajudava o Pai no roçado. Para finalizar, é importante observar que, ao contrário da cidade grande onde as pessoas praticamente são anônimas, no mundo roseano tudo e todos têm um nome que os caracteriza e individualiza.
  • 7. ESTILO DE ÉPOCA A originalidade da linguagem de Guimarães Rosa, a sua inventividade e criatividade configuram bem o estilo de época (pós)-modernista. Essa preocupação em fazer diferente, saindo do convencional, é, sem dúvida, uma das grandes característica do estilo de época contemporâneo. É o próprio Guimarães quem fala: "Disso resultam meus livros, escritos em um idioma próprio, meu, e pode-se deduzir daí que não me submeto à tirania da gramática e dos dicionários dos outros". Outra coisa que marca bem o estilo de época na obra é a capacidade revelada pelo escritor (pós)- modernista para refletir sobre problemas universais, partindo de uma realidade regional. É o que diz a contracapa de "Literatura Comentada": "Nele , quanto mais - aparentemente - particularizado o tema, mais universal ele é. Quanto mais simplórios seus personagens, mais ricas sua personalidades. Assim, rudes sertanejos refletem de forma peculiar e extremamente sutil os grandes dramas metafísicos e existenciais da humanidade". É isto que se vê em Guimarães Rosa e outro grandes escritores na nossa Literatura: há sempre uma dimensão universal no aparentemente regional. "O sertão que vem de Guimarães Rosa não se restringe aos limites geográficos brasileiros, ainda que dele extrais a sua matéria-prima. O sertão aparece como uma forma de aprendizado sobre a vida, sobre a existência, não apenas do sertanejo, mas do homem". Como dizia o próprio Guimarães: "o sertão é o mundo".
  • 8. Análise da obra Narrativa profundamente lírica, pertencente à obra Manuelzão e Miguilim, Campo Geral traduz a habilidade de Guimarães Rosa para recriar o mundo captado pela perspectiva de uma criança. Se a infância aparece com freqüência nos textos roseanos, sempre ligada à magia de um mundo em que a sensibilidade, a emoção e o poder das palavras compõem um universo próximo ao dos poetas e dos loucos, em Miguilim, nome com que passou a ser conhecida a novela, essa temática encontra um de seus momentos mais brilhantes e comoventes. É uma espécie de biografia de infância - que alguns críticos afirmam ter muito de autobiográfico -, centrada em Miguilim, um menino que morava com sua família no Mutum, um remoto lugarejo no sertão.
  • 9. Foco narrativo Narrado em terceira pessoa, narrador onisciente. Apesar de ser escrita em terceira pessoa, a história é filtrada unicamente pelo ponto de vista de Miguilim e, por essa razão, o mundo infantil é organizado a partir das vivências de um menino sensível, delicado, inteligente, empenhado em compreender as pessoas e as coisas. As outras personagens - a mãe, o pai, os irmãos, o tio, a avó e todos que vivem e passam pelo Mutum - aparecem misturadas às emoções e às reflexões do personagem central. Temática Os temas fundamentais são a infância, o amor e a amizade, a violência e a fé. A criança é revelada como a criatura em que a hipocrisia e a maldade ainda não deitaram raízes profundas, embora algumas delas já possam apresentar no seu desenvolvimento essas características negativas. Exemplo disso pode ser visto em Patori e Liovaldo. O par Miguilim / Dito pode ser visto como duas faces de uma mesma moeda, opostos e complementares, pois Miguilim é o que precisa aprender para saber, enquanto Dito sabe de modo imediato sem saber como. Dito é sábio e Miguilim é o aprendiz. Nesse sentido, a morte de Dito pode ser vista como uma necessidade existencial para levar Miguilim a crescer, a tornar-se maduro, independente.
  • 10. Enredo de Campo Geral Miguilim, garoto sensível da região de Minas Gerais, começamos a vê-lo aos oito anos, com uma menção aos seus sete anos, quando esteve mergulhado numa preocupação em respeito ao local de sua residência, o Mutum (essa palavra constitui um palíndromo, ou seja, pode tanto ser lida da direita para a esquerda com da esquerda para a direita, sem alterar-se. E o mais interessante é que sua grafia, MUTUM, acaba concretizando o próprio local, já que este ficava junto a um covão (U), entre morro e morro (M e M). Durante uma viagem para ser crismado, ouvira alguém falar que aquele era um lugar muito bonito. Tão feliz fica com a novidade que se torna ansioso em contá-la para a mãe, Nhãnina, crendo que assim faria com que ela deixasse de ser triste por morar ali. Seu jeito estabanado, no entanto, faz com que corra desesperado em direção da mãe, passando direto pelo pai, Nhô Bero, irritando-o. É a primeira informação que o leitor recebe de que existe na narrativa uma transfiguração do complexo de Édipo, já que Miguilim tem uma forte identificação afetiva com a mãe e problemas graves de relacionamento com o pai, a ponto de, mais para frente, os dois se estranharem como se fossem inimigos.
  • 11. Há também outras pessoas com quem o protagonista mantém relação. Podem ser citados os irmãos Chica, Drelina e Tomezinho, os dois últimos de gênio difícil, até maligno. A Rosa, que trabalha em sua casa e com quem tem uma tranqüila relação, muitas vezes acompanhando-o em seus sentimentos e fantasias. Vó Izidra, na realidade tia-avó por parte de mãe dele. Era uma mulher dotada de uma moral extremamente rígida, baseada num catolicismo um tanto tradicional, apegado a santos e rezas. É a religiosidade oficial, bem diferente de Mãitina, velhíssima remanescente da escravidão, já sem juízo e com fama de feiticeira. Seu misticismo é muito mais primitivo, pois que baseado em magia (compare essas duas idosas. Ambas estão vinculadas ao misticismo, à religiosidade. A ligação com o aspecto oculto de nossa existência está até simbolizada no cômodo em que cada uma fica: ambos são escuros e isolados. Além disso, gostam de Miguilim. A diferença é que Vó Izidra é mais enrustida. Há também diferenças na qualidade da religiosidade de cada uma. Mãitina é mais primitiva enquanto a outra segue um padrão mais oficial). Mas duas personagens são as mais importantes no círculo de relacionamento de Miguilim. A primeira é o seu irmão Dito, que, apesar de mais novo, é mais sábio, na medida em que está mais preparado para o lado prático da vida. Torna-se a âncora do protagonista, já que este é extremamente aluado. Por isso é constantemente consultado pelo personagem principal.
  • 12. A outra figura importante é o Tio Terêz (dentro da elaboração poética de sua prosa, Guimarães estabelece uma ortografia própria, muitas vezes afastando-se do padrão gramatical. É o caso do “Terêz”, já que oxítonas terminadas em “z” não devem ser acentuadas). Irmão de Béro, é o amigo grande de Miguilim (há quem extrapole na interpretação e enxergue na relação entre Miguilim e Terêz, tendo também em vista o caso entre este e Nina, além dos conflitos entre o protagonista e seu pai, a possibilidade de que o menino seria filho não de Béro, mas de Terêz. Mas é um aspecto que de forma alguma deve ser colocado em uma prova, pois que baseado em suspeitas muito leves). E sabemos, pelo olhar lacunoso de uma criança, que mantém uma relação no mínimo perigosa com Nina. Intuímos isso pela briga que há entre pai e mãe em que esta quase apanha; só não sofreu porque Miguilim se interpôs no meio do casal, acabando por sofrer a fúria de Béro no lugar da mãe. Comenta-se a todo instante que o tio não ia poder mais aparecer no Mutum. Além disso, surge uma tempestade terrível, que é atribuída por Vó Izidra como castigo infligido às ações pecaminosas que andavam grassando. O temporal se vai, Tio Terêz some e o Mutum mergulha numa tranqüilidade momentânea. É quando Miguilim põe na mente a idéia obsessiva de que iria morrer em dez dias. Passa a desenvolver um apego pela vida durante o decorrer desse período e principalmente após ele, ao descobrir que sobrevivera a ele.
  • 13. Nhô Bero, pouco depois, faz com que Miguilim lhe leve o almoço. É uma maneira que entende de arranjar utilidade para o garoto, que realiza sua tarefa com orgulho. No entanto, em uma das viagens, é surpreendido por Tio Terêz, que lhe entrega uma carta para ser entregue à Nina e diz que estaria esperando resposta no dia seguinte. Começa então um dilema na mente do menino. Adora o tio e, portanto, deve fazer o que este lhe pediu. No entanto, mesmo não tendo consciência do que acontecia, intui que o que era pedido era errado. Depois de muito tempo de conflito interior, decide não entregar a missiva, confessando, entre choros, ao tio, que facilmente entende. É um grande passo no crescimento da personagem. Introduzido por outra tempestade, chega mais um período de crise. É, como diz o narrador, o momento em que virou o tempo do ruim. Começa com o assassinato de Patori, garoto imbuído de malignidade e que maltratava muito Miguilim. Seguem-se outros fatos. O cachorro Julim foi mortalmente ferido por um tamanduá. Tomezinho sofre com a picada de um marimbondo. O touro Rio Negro machuca Miguilim, que acaba descontando a raiva em Dito. Luisaltino surge e começa a se engraçar com Nina (a mãe de Miguilim parece revelar um caráter no mínimo leviano, volúvel. Pode-se desconfiar de um certo determinismo, na medida em que sua personalidade seria um reflexo das atividades exercidas pela mãe dela, que fora prostituta). O ponto crítico ocorre quando Dito vai espiar o ninho de uma coruja. A ave acaba dizendo o nome dele, o que é visto por Miguilim como mau agouro (note que, para angústia de Miguilim, o papagaio não conseguia falar o nome de Dito, ao contrário da coruja. Drama temporário. No final, muito tempo depois, consegue-o).
  • 14. Tudo é preparação de clima para o grande desastre. Durante a perseguição que as crianças fazem a um mico que havia escapado, Dito acaba tendo o pé cortado por um caco que estava no terreiro. O machucado piora, colocando o menino de cama. Coincidência ou não, é época dos festejos de Natal, Vó Izidra até se dedicando a montar seu famoso presépio. Dito não resiste ao mal que lhe acometeu, vindo por falecer. É uma experiência extremamente dolorosa para Miguilim, mas que pode ser vista como um passo importante no seu amadurecimento. Se antes o protagonista era guiado pelo irmão, nos momentos de convalescença deste o jogo começa a se inverter. É Miguilim que conta ao acamado o que está ocorrendo no mundo ao redor deles. Passa a ser, pois, os olhos fraternos. Com a morte, a personagem principal passa um longo período curtindo a dor, o sofrimento, até que assume um movimento com que de introjeção do falecido, já que antes de tomar uma decisão sempre se pergunta o que seu irmão faria. Ao assumir a mesma atitude que presume ser de Dito, praticamente absorve-o em seu ser.
  • 15. Tanto essa evolução é verdade que Miguilim agüenta firme o sufoco a que seu pai o submete, fazendo-o trabalhar no roçado, debaixo de um sol desumano. Mas o mais importante é lembrar da sua participação no conflito que houve entre Liovaldo e Grivo. Grivo era um rapaz muito pobre, a ponto de os animais de criação, como galinhas, morarem na mesma casa dele. Certa vez aparecera no Mutum com dois patos para serem vendidos, parca fonte de sustento para si e para mãe. No entanto, Liovaldo, irmão de Miguilim que morava na cidade e que estava de visita, dominado por um espírito maléfico, começa a maltratar e até a machucar o pobre. Miguilim acha injusto e toma partido, batendo no agressor. Seu pai fica indignado pelo fato de o menino não respeitar o sangue familiar e, incoerentemente, dá uma surra nele que chega a espancamento. O protagonista, no entanto, não se sente mal, pelo contrário, tem raiva, pois sabe que está certo e que o pai está imensamente errado. Por isso pensa em vingança, imaginando até a morte do pai. É quando ri, em meio a surra, o que faz todos, até o agressor, pensarem que o menino endoidara, talvez até com os golpes.
  • 16. O conflito instaura a conquista, por Miguilim, de espaço e até respeito no ambiente familiar. Após três dias que passa na casa de um vaqueiro, para protegê-lo da fúria do pai, retorna, mas não se mostra submisso. Como provocação, Béro quebra os brinquedos e gaiolas do filho. Este solta os passarinhos que tinha presos e quebra os brinquedos que sobraram. É um sinal de que havia crescido e que, portanto, não precisava mais daquelas diversões. Delimitadas as fronteiras, Miguilim pouco depois cai doente e de forma tão grave que alterna momentos de inconsciência a de consciência (a doença e os mergulhos de desligamento que provoca podem ser entendidos como um momento de incubação, como se Miguilim, dentro de um casulo, estivesse em uma fase no final da qual se transformaria em outra pessoa). Nos instantes em que vem à tona percebe picotes de realidade, mas que nos faz entender vários acontecimentos. O primeiro é o desespero do pai, que se sente injustiçado pela providência divina, que parecia querer tomar mais um filho dele (Béro é, portanto, uma personagem complexa, pois, ao mesmo tempo em que maltrata seu filho, demonstra amor por ele. Sua agressividade pode ser fruto de uma vida de dificuldades financeiras, pois não é dono de suas próprias terras, cuidando do que era alheio. Nas entrelinhas fica o traçado de um caráter rico psicologicamente). Tenta ao máximo fazer suas vontades. Em vários outros despertares Miguilim toma conhecimento que Béro havia matado Luisaltino, provavelmente por causa de Nhãnina. Por ter caminhado pelas trilhas da criminalidade, acaba por se suicidar.
  • 17. Quando começa a melhorar, o protagonista toma conhecimento de que Tio Terêz tinha voltado e ia passar a morar no Mutum. Era a união, finalmente, dele com Nina. Por causa disso, Vó Izidra parte de lá, indignada. No final, a chegada de um certo Dr. José Lourenço traz uma revelação surpreendente. É essa figura nova que descobre que Miguilim era míope. Ao emprestar ao menino seus óculos, permite à criança uma descoberta. Seu velho mundinho acaba ganhando uma visão completamente nova, mais nítida. É a simbologia do crescimento, o que constitui um ritual de passagem. Enxergar mais nitidamente o mundo significa entrar para a fase adulta, sair da infância. Na companhia de tão importante mudança, Miguilim parte para a cidade. Sua viagem, somada à simbologia dos óculos, pode significar a entrada em um novo universo. Miguilim pode tanto ter abandonado a visão primitiva, pré-lógica, que o caracterizara, como continuar, em meio ao universo adulto, preservando seu lado infantil. É, pois, um final aberto, a permitir mais de interpretação.
  • 18. A NOVELA COMO ESPÉCIE LITERÁRIA Como espécie literária, a novela não se distingue do romance, evidentemente, pelo critério quantitativo, mas pelo essencial e estrutural. Tradicionalmente, a novela é uma modalidade literária que se caracteriza pela linearidade dos caracteres e acontecimentos, pela sucessividade episódica e pelo gosto das peripécias. Contrariamente ao romance, a novela não tem a complexidade dessa espécie literária, pois não se detém na análise minuciosa e detalhada dos fatos e personagens. A novela condensa os elementos do romance: os diálogos são rápidos e a narrativa é direta, sem muitas divagações. Nesse sentido, muita coisa que chamamos de romance não passa de novela. Naturalmente a novela moderna, como tudo que é moderno, evoluiu e não se sujeita a regras preestabelecidas. Tal como o conto, parodiando Mário de Andrade, "sempre será novela aquilo que seu autor batizou com o nome de novela". Como autor (pós)-modernista, Guimarães Rosa procurou ser original, imprimindo, em suas criações literárias, a sua marca pessoal, o seu estilo inconfundível. Suas novelas, contudo, apesar das inovações, sempre apresentam aquela essência básica dessa modalidade literária, que é o apego a uma fabulação contínua como um rio, de caso- puxa-caso.