Este documento discute as primeiras experiências de professores iniciantes em sua jornada de construção da profissão docente. Relata uma experiência de curso de extensão universitária que utilizou a metodologia (auto)biográfica para analisar como os professores participantes construíram sua identidade docente. Aponta que há poucas pesquisas sobre como os professores se inserem na profissão inicialmente e que os relatos dos participantes revelaram desafios em conciliar a teoria da formação com a prática nas escolas.
PRIMEIRAS EXPERIÊNCIAS NA CONSTRUÇÃO DA PROFISSÃO DOCENTE: (AUTO)BIOGRAFIA, MEMÓRIAS E RESSIGNIFICAÇÕES
1. Problemas sobre os professores principiantes em seus processos de inserção
profissional
INFORME DE EXPERIÊNCIA
PRIMEIRAS EXPERIÊNCIAS NA CONSTRUÇÃO DA PROFISSÃO DOCENTE:
(AUTO)BIOGRAFIA, MEMÓRIAS E RESSIGNIFICAÇÕES
SOKOLOVICZ, Natascha
natascha.sokolovicz@hotmail.com
Mestranda em Educação pela Universidade Federal do Paraná
HAGEMEYER, Regina Cely de Campos
regicely@terra.com.br
Prof.ª Dr.ª do Programa de Pós Graduação em Educação – Linha de Pesquisa Cultura,
Escola e Ensino da Universidade Federal do Paraná.
Palavras-chave: professores iniciantes - história de vida - (auto)biografização.
Este trabalho visa socializar a experiência do curso de Extensão Universitária Narrativas
(auto) biográficas - constituindo-se professor - desenvolvido no Setor de Educação da
Universidade Federal do Paraná (UFPR), no ano de 2013, o qual envolveu professores
do Ensino Fundamental II, do município de São José dos Pinhais na Região
Metropolitana de Curitiba. Pretende-se desta forma, proporcionar reflexões sobre os
relatos de práticas de professores iniciantes, trazendo elementos de análise sobre o
processo de construção da docência.
O interesse de pesquisa sobre os processos da constituição da profissão docente em sua
fase de apropriação inicial, ainda se mostram incipientes no campo da pesquisa da pós
graduação em educação no Brasil. Corrêa e Portella (2012) apontam, numa revisão de
trabalhos que tratam do tema, que entre os estudos brasileiros difundidos, emergem
questões voltadas a ações e atores que influenciam ou têm sido responsáveis pela
inserção de professores na função de ensinar. Dentre as questões identificadas, verifica-
se que os processos culturais presentes no âmbito escolar, oferecem elementos de
análise sobre as primeiras experiências de professores, considerando as formas de
organização do trabalho pedagógico, as formas de atuação das equipes pedagógicas, as
influências dos pares e as opções de gestão do trabalho escolar.
Observa-se que outros trabalhos acadêmicos, apontam para a necessidade de políticas
públicas e programas de formação docente voltados especificamente para a fase inicial
da profissão. Por outro lado, a formação inicial tem maior incidência de interesses de
pesquisa, com trabalhos que problematizam as fragilidades dos processos que na
formação não superaram o distanciamento entre os conteúdos dos cursos de graduação
e as necessidades reais das práticas de futuros profissionais docentes na sala de aula.
Somam-se a esses questionamentos, a responsabilização do próprio sujeito, o professor
iniciante, pela constituição da docência, como desenvolvimento constante durante sua
trajetória desde que esta se inicia.
2. Para caracterizar os processos da história vivida nas primeiras experiências na carreira
docente, recorreu-se à organização do referido curso de extensão, realizado com base na
metodologia (auto)biográfica. Esse curso justifica-se por ter oportunizado um
tempo/espaço para a reflexão crítica e teórica da profissão e prática docente através da
narrativa de vida, entendendo-a como indissociada do contexto e cotidiano da escola e
da sociedade. A opção pelo método de trabalho com (auto)biografias objetivou,
fundamentalmente, a obtenção de elementos de análise sobre o movimento de
ressignificação do papel do professor como agente construtor de sua profissão e como
tal, participante ativo de sua própria formação.
O referencial teórico, portanto, que fundamentou as atividades desenvolvidas decorre
das proposições sobre narrativas de vida e seus desdobramentos na formação docente,
considerando a pesquisa desses processos na educação escolar, sendo que a prática da
reflexão sobre as histórias de vida, mostrou ser um caminho viável à compreensão das
lógicas presentes e produzidas no espaço social da escola, levando a uma maior
compreensão dos processos de apropriação e reestruturação dessas lógicas na análise
da pesquisa realizada.
O planejamento e estudo do qual decorre o curso ora apresentado, foi realizado com
base em autores que contribuem com as concepções e metodologia de pesquisa sobre o
sujeito e sua constituição de vida, já utilizadas no Brasil nos últimos 30 anos. Também
buscou-se inspiração em trabalhos e grupos de pesquisa que se debruçam sobre o tema
de histórias de vida de professores e profissionais da educação, presentes nos textos de
autores como Nóvoa (1988,1992), Delory-Monberger (2003, 2012) e Josso (2004),
buscando compreender a construção do sujeito como “ser social singular” em seu
caminho profissional. A partir de leituras das produções desses autores, buscou-se
adaptar os processos da pesquisa-formação à realidade específica e às necessidades
dos professores envolvidos.
A intensão formativa incide sobre a necessidade contemporânea de dar voz ao professor,
propiciando atividades mediadoras para que as narrativas dos participantes pudessem
expressar as relações que estabelecem com os conhecimentos de sua área de ensino e
como constroem seus saberes ao desenvolver sua função e práticas.
Os momentos do curso foram organizados e planejados em sete encontros presenciais e
mais uma carga horária à distância, destinada ao processo da escrita (auto)biográfica em
si. A disposição proposta, que previu momento individuais e coletivos, procurou
possibilitar aos integrantes a análise da função que exercem, reconhecendo-se enquanto
agentes de sua prática, num processo de busca de autonomia e de reflexão sobre o
processo de construção de conhecimentos e saberes sobre e na profissão docente,
vinculados à sua trajetória de vida e formação profissional. Nesses relatos, emergiram
reflexões sobre os conflitos, as continuidades e as rupturas presentes na vida e na
profissão docente, revelando interlocuções possíveis e significativas entre teoria e
prática.
As experiências foram compartilhadas em espaços programados, a partir de diálogo, e
elementos para a reflexão, como texto sobre a construção da profissão docente, visando
evidenciar a relevância das primeiras práticas profissionais na constituição da docência,
bem como a explicitação do contexto educacional com o qual esses professores
iniciantes se defrontaram e/ou defrontam.
3. Para estabelecer as condições necessárias a um contexto da aprendizagem colaborativa
e processual, consensuou-se no próprio grupo, a necessidade de frequência integral.
Outro quesito relevante nas decisões tomadas, foi a convenção de responsabilidade,
nominada pelo grupo de respeito à construção e segurança coletiva. Esta convenção é
recomendada em práticas que envolvem o trabalho com grupos nas diversas áreas de
pesquisa. Foram elencadas as seguintes diretrizes: As relações estabelecidas no curso
são unicamente relações de trabalho; Cada um é responsável pelo uso que faz de suas
palavras; Cada um é responsável por seu engajamento no projeto numa intenção auto
formadora; Cada um é responsável por suas ações no grupo devendo administrar suas
emoções e a relação com o outro; A finalidade do trabalho é formação profissional e não
terapêutica; É imprescindível a descrição e sigilo sobre tudo que será contado e
apresentado nos momentos do curso. Acredita-se que este acordo mútuo foi expressivo
para a partilha das experiências num processo mais coerente e sempre relativos aos
significados e significantes do grupo.
Entre as primeiras ponderações, colocou-se a necessidade de aproximação do local do
curso ao local de trabalho dos participantes, tentando evitar o desgaste do deslocamento
dos professores de seu município de trabalho até o centro da cidade de Curitiba, local
onde se situa a Universidade. Para tanto, o curso foi realizado em uma escola estadual
do município já citado. Outras adaptações foram feitas a partir de necessidades dos
participantes e/ou obstáculos enfrentados no desenvolvimento do curso. Entre esses
obstáculos destaca-se a evasão inicial dos participantes. Num primeiro momento haviam
dezesseis inscritos para as quinze vagas ofertadas, e com a proximidade da data de
início, apenas doze professores confirmaram sua matricula e, efetivamente, oito destes
começaram a frequentar as atividades. Dentre esses, uma professora desistiu no meio do
processo, pela necessidade de assumir aulas no dia da semana em que eram realizadas
as atividades. Permaneceram no grupo, entretanto, participantes que demonstraram
efetivo engajamento ao processo formativo proposto.
O grupo participante desta formação é composto por sete professores que possuem entre
quatro e vinte e dois anos de trabalho efetivo no magistério. Contudo é substancial
destacar que desde o primeiro encontro foram evocadas memórias e percepções das
primeiras vivências como docentes, o que propiciou um direcionamento para a temática
do principiar da profissão e seus desdobramentos na constituição do professor.
O início das atividades se deu a partir da apresentação dos objetivos e procedimentos do
curso, da metodologia de trabalho, da contextualização da formação na profissão,
baseada em histórias de vida, além da construção das regras de desenvolvimento do
curso. O desenrolar do curso decorreu de uma atividade sensibilizadora que teve por
finalidade estimular a rememoração das experiências e a troca desses significados com
os pares.
Os encontros que seguiram tiveram como eixo norteador, a criação de uma linha do
tempo da composição da docência, estimulando a evocação de momentos e
acontecimentos relevantes. Faz-se necessário caracterizar que essa forma sequencial, a
partir de uma linha do tempo, não significa que a vida, em sua complexidade, seja
considerada como processo que se dá de forma linear. É justamente no emaranhado de
relações sociais e estruturais que a existência é elaborada. Sustenta-se, entretanto, a
utilização dessa linha de tempo, como atividade que se pauta na temporalidade, processo
no qual os sujeitos, no decorrer da vida, compreendem e estruturam suas experiências.
4. Delory-Momberger (2012) explica que “... as “histórias” que contamos sobre nós mesmos
e que, segundo alguns, nos dirigimos a outros, longe de nos jogar numa intimidade
inacessível, tem por efeito articular nosso espaço-tempo individual ao espaço-tempo
social.”(p.74).
Cada membro compartilhou com o grupo os fatos mais marcantes entre aqueles ali
evocados. Os participantes poderiam questionar aspectos subentendidos ou curiosidades
sobre os relatos ou, ainda, intervir sobre algum ponto comum ou divergente. Esse
movimento de questionamentos respondeu a uma premissa desse momento de
formação: conduzir essas exposições individuais em aprendizagens colaborativas. Como
atividade à distância, os professores deveriam escolher um desses episódios com o
intuito de transformá-lo em um texto escrito. Surgiu, então, a primeira experiência de
escrita narrativa e essa primeira aproximação com a (auto)biografização, também buscou
permitir o início do processo de “construcción de un yo por una memoria” (Bolivar, 2012,
p.46).
A segunda etapa da escrita de si, demandou abarcar todos os aspectos da história de
vida que, segundo a percepção particular de cada participante, repercutiu na constituição
da docência. A sequência desse trabalho, que passou por momentos coletivos, se dará
num processo individual de evocação das memórias significativas em seu
desenvolvimento pessoal e profissional. Considera-se que é a partir da narração que se
ressignifica o vivido, que se concede sentido às experiências e assim se constrói um
processo de formação profissional.
A atividade subsequente, propiciou a socialização das narrativas produzidas. Essa troca
buscou a inteligibilidade da narrativa num esforço de garantir uma linha condutora dessa
produção: a busca por exteriorizar a constituição da docência através do percurso
individual. Além de colaborar apontando questões ou dúvidas observadas, os
participantes também assumem o papel de escriba, a partir do relato do autor, num
processo de readaptação contínua. Essa atividade inscreve-se, segundo Delory-
Momberger (2006), numa perspectiva de coerência narrativa, assumindo que “O percurso
de apropriação de sua história, que é comum ao conjunto de práticas de histórias de vida,
passa aqui pela busca compreensiva do outro e o distanciamento de si mesmo.”(p. 367)
Esse percurso formativo revelou traços das experiências iniciais do e no tornar-se
professor, entre elas os desafios enfrentados tanto na apropriação da docência quanto da
cultura escolar.
O trabalho com a (auto)biografização permite ao narrador a expressão do que lhe foi
significativo em sua jornada, não se trata da personificação “pura” da realidade mas de
um olhar sobre essa realidade mostrando o vivido mas também a interpretação deste
vivido que passa por novas interpretações e sentidos a cada partilha do relato. O
intercruzamento das perspectivas dos professores, juntamente com as interpretações de
pesquisadores, teóricos e outros professores, contribui para a aproximação da
complexidade do real. Segundo Cunha (2012) as interpretações possíveis duma narrativa
de vida são inúmeras, tanto quanto o número de pessoas que as possam ler. Numa
(auto)biografia estão presentes o vivido e a interpretação do vivido, as emoções,
experiências, o desejo de compartilhar e de ser lembrado, “as imagens que se tem de si,
do outro e do que se fala” (p.109), a singularidade que permite entender a
heterogeneidade, o contexto sócio histórico e as regularidades na composição das
subjetividades.
5. Tendo como referência que a constituição da docência é um processo contínuo e que sua
iniciação está na multiplicidade de experiências e na relação destas com a formação
inicial busca-se, através do exposto oralmente1
por esses professores, promover
aproximações reflexivas com a teoria.
Mostra-se pertinente demonstrar a percepção dos professores sobre distância entre a
formação inicial e suas práticas cotidianas, observado nos depoimentos a seguir:
Professora F- ...e eu me sentia muito sufocada no início pelo choque da realidade
de quando a gente sai da faculdade, vê só o teórico... A gente entra despreparada
para a parte prática.
Professora I – Exatamente, você se depara com o aluno ali, você tem que
aprender na marra, não tem quem vai te ensinar a lidar com a aluno nesse
momento. Eu aprendi tudo ali na prática, sofrendo, quebrando a cabeça... No
primeiro ano (de prática) aprendi tudo aquilo que não aprendi na faculdade, hoje a
relação com os alunos é totalmente outra.
Professora V - Comecei a me apaixonar por geografia, mas achava que não tinha
competência para trabalhar geografia. Quando fui trabalhar na escola peguei
(aulas de) história e geografia, ... eu me debruçava em cima das apostilas. (O
conteúdo sobre) fuso horário, que eu não conseguia aprender nem na faculdade
,... tive que aprender de um dia para o outro para dar aula. E eu consegui.
Os depoimentos expuseram uma rigidez inicial, onde os professores, por inexperiência,
acabaram sendo menos maleáveis em sua prática em sala de aula como revelam os
exemplos:
Professora I: Eu já passei por algumas fases: Acreditava que aluno é aluno,
professor é professor. Eu não deixava isso acontecer (aproximação com os
alunos), ..., depois de um tempo tento ouvir mais os alunos, dar mais atenção,
conhecer cada um em sala, ... hoje já consigo, converso, dialogo com os alunos
...
Professor F: ...em 2008 (primeiras experiências na docência) eu era um ditador...
Essas falas se justapõem ao que vários autores nomeiam como de “período de
sobrevivência” ou ainda como o “choque do real”. No entanto, paralelamente a esse
processo, pôde-se observar na fala do grupo de professores, um período permeado por
motivações e descobertas.
Professor D: Ah, eu me vi aqui nessa fase da diversificação, porque está dizendo
ali que o professor mais animado, é, mais motivado, que participa, que veste a
camisa da escola, e eu, nesse momento eu sou assim, eu visto a camisa da
escola, eu participa, eu do opinião, do a cara pra bater...
Professora F: ... mas eu não consigo desligar, por exemplo eu estou passando
pela rua, vejo um outdoor ou uma frase e já vou anotar no celular ...porque acho
que aquela frase ... posso usar. Ou em qualquer lugar onde vou, vejo algo... legal
para os meus alunos e penso vou levar ... Eu ainda tenho, não, eu pretendo ficar
1
Nas análises propostas optou-se por considerar os relatos orais.
6. nessa fase de diversificação, não sei quanto tempo vai durar, espero que dure,
que eu consiga esse gás...
Professora I: ...desde o principio eu acho que vivi nessa fase da diversificação,
estou até hoje, as vezes eu até preparo “aquela” aula. (Depois percebo) não
quero isso, está muito monótono, vamos mudar e, pronto, eu consigo... Aquilo que
eu peguei na hora, aquela ideia momentânea, valeu muito mais a pena que tudo
aquilo que eu tinha preparado.
A concomitância desses aspectos já vem sendo observada em outras pesquisas
empíricas como afirma Hubermam (1995) o “período da descoberta”, muitas vezes, é o
que atenua e permite suportar o “período de sobrevivência”(p.38). Reconhecer a
especificidade desse momento e sua significância na constituição da docência permite o
repensar sobre a formação inicial, sobre o ingresso desses professores na carreira e,
também, sobre o acolhimento, feito pela escola, a esses principiantes. A ausência de um
olhar diferenciado a esse professor vem evidenciada na expressão da professora M:
Como, vamos supor, você vai para uma escola, te jogam, vai lá pra sala de aula,
não se reúnem, não fazem uma reunião.... Como é o professor ... já começa pela
recepção quando ele chega na escola.
Muitos futuros professores acabam assumindo aulas ainda nos primeiros anos de
licenciatura, através de contratos temporários, é revelado no depoimento do professor F,
que estando no segundo ano do curso de licenciatura em história, se inscreveu para o
Processo Seletivo Simplificado do Paraná:
... me ligam e perguntam: Quer dar aula de história?... Fui para a escola. Aquele
foi um dia inesquecível, primeiro porque o pedagogo olhou pra mim (e perguntou):
Você é professor? E então ele disse: Graças a Deus!!!!
Aí eu descobri alguns detalhes da profissão: que te dão as turmas “bucha”. Entrei
na quinta série ... e tive que” tocar o terror” porque os alunos tinham quatorze e
quinze anos e eu estava com dezenove. Eu tive que “fazer de conta” que eu era o
Professor. Fui muito autoritário, tirei gente de sala... No dia seguinte (disseram
com espanto): Ele voltou...
Toma-se dessa forma como pressuposto, que a constituição docente se dá justamente a
partir das vivências e na articulação entre teoria e prática, compreendendo a cultura da
escola como um “mundo social” com marcas, constituição de processos de linguagem,
ritos, normas e símbolos próprios (Forquin, 1993). Pode-se destacar, a partir das falas
dos professores, que esse processo de iniciação também evidencia um processo brutal,
no qual, sem apoio, o professor é “jogado” dentro de uma escola e de uma sala de aula.
Papi e Martins (2010) salientam que:
Os primeiros anos de exercício profissional são basilares para a configuração das
ações profissionais futuras e para a própria permanência na profissão. Podem
tornar-se um período mais fácil ou mais difícil, dependendo das condições
encontradas pelos professores no local de trabalho, das relações mais ou menos
7. favoráveis que estabelecem com outros colegas, bem como da formação que
vivenciam e do apoio que recebem nessa etapa do desenvolvimento
profissional.(p.43)
Além da negligência de gestores e equipe pedagógica há, ainda, as dificuldades de inter-
relação com professores mais experientes. Essa questão esteve presente nos relatos de
todos participantes do grupo revelada em frases como:
Professor D- A gente, mais novo aqui no estado, às vezes ... fica desmotivado
com esses professores mais velhos, que estão a mais tempo. A gente faz um
trabalho bacana, como por exemplo aulas de campo,... mas tem gente que critica
tanto que desmotiva. Essas pessoas mais velhas (dizem): “você é louco, não faça
isso”... ouvir crítica dos professores que estão a mais tempo aqui ... me deixa
chateado porque elas estão “cortando” nosso trabalho.
Professora MI-“...- os outros (professores) criticam pra te derrubar, não é a critica
que você faz no bom sentido, pra construir ... Eu tento fazer diferente, sim, e o
“toque” de uma pessoa que viu as coisas de fora é bem vindo. Mas muitos só
falam para mostrar o problema, o erro.
Nas narrativas, apareceram todavia, indícios de que que professores mais experientes,
equipe pedagógica e gestores auxiliaram a aprendizagem do tornar-se professor, e essa
interferência foi considerada positiva.
Professora V.- Fui para uma escola onde tinha uma diretora muito “certinha”, ela
fazia a gente estudar muito (por exemplo) o Currículo Básico do Paraná e uma
vez por mês, o grupo de professores de uma matéria, tinha que apresentar a sua
disciplina. Foi fantástico!
Perceber a importância dessas primeiras experiências para a constituição da docência e
entender que os processos culturais são criados, perpetuados e transmitidos através das
vivências cotidianas, num processo de incorporação contínua, desvelou a necessidade
de propiciar a esses docentes, um acompanhamento diferenciado ao iniciar o exercício
da função docente, tornando esse momento menos áspero. Segundo Cavaco (1995):
Se a escola se organizar para acolher novos docentes, abrindo caminhos para
que possam reflectir e ultrapassar de forma pertinente e ajustada as suas
dificuldades, se assumir coletivamente a responsabilidade do seu
encaminhamento através de projectos de formação profissional, talvez contribua
para inverter, por essa via, a actual tendência para a descrença generalizada que
se associa à desvalorização social da imagem do professor. (p.168)
O impacto com a realidade é o que permite, segundo Lima (2006), a mobilização de
saberes oriundos de várias situações vividas e a ressignificação desses conhecimentos
no enfrentamento da prática cotidiana. Esse processo de movimentação de saberes se
mostra possível e já vem acontecendo no cotidiano escolar. Podemos observá-lo na fala
da Professora F:
8. As dificuldades (nas primeiras experiências docentes) que acarretaram em quem
sou hoje....Tive que trabalhar com os sextos anos e toda dificuldade que eu passei
lá, hoje vejo como positivo. Foi um ano de dificuldades que fazem parte do
processo .
A experiência com a construção (auto)biográfica promoveu a compreensão de que a
iniciação da vida profissional constitui um momento privilegiado onde dilemas podem
compor “trampolins” para novas aprendizagens gerando um encadeamento de posturas
reflexivas que, por si só, constituem uma aprendizagem imprescindível a toda prática
docente. Todavia esse movimento exige, para além do desejo individual do professor por
uma boa ação educativa, o engajamento das instituições formadoras, das escolas e dos
profissionais da educação em concomitância com condições estruturais básicas de
trabalho. Este relato, em toda sua heterogeneidade, foi possível em virtude da
disponibilidade desses professores em repartir, além de suas histórias de vida, sua
“condição humana no mundo”. Diante desse desprendimento, impôs-se um “colocar-se
ao seu lado para olharmos juntos, correspondendo ao chamado que me faz o seu olhar
quando me olha, convidando-me a olhá-lo e dizer, junto com ele, de si.”(Timm, 2012, p.
168). Esse mesmo legado, deixa-se àqueles que se mobilizaram para ler este texto.
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