Este estudo investiga o impacto da formação inicial de professores no seu desempenho como professores iniciantes. Entrevistou-se 6 professores iniciantes para compreender suas perspectivas sobre os aspectos positivos e desafios da formação inicial e início de carreira. Os resultados identificaram os pontos fortes e limitações percebidos na formação inicial e sua relação com a preparação para a profissão.
A FORMAÇÃO INICIAL PREPARA PARA A INICIAÇÃO À PRÁTICA DOCENTE?
1. V CONGRESO INTERNACIONAL SOBRE EL PROFESORADO PRINCIPIANTE Y LA
INDUCCIÓN ALADOCENCIA
Problemas de Professores Principiantes
INFORME DE INVESTIGACIÓN
A FORMAÇÃO INICIAL PREPARA PARA A INICIAÇÃO À PRÁTICA
DOCENTE?
Pelarigo, Ana 1 ; Pereira, Conceição 2
ana.pelarigo@gmail.com 1; clanca@eselx.ipl.pt 2
Centro Helen Keller, Lisboa 1; Instituto Politécnico de Lisboa – Escola Superior de
Educação de Lisboa 2. PORTUGAL
Resumo
A investigação insere-se no âmbito da formação de professores e pretende compreender
e descrever o impacto da preparação recebida na formação inicial no desempenho da
prática docente dos professores principiantes.
Neste estudo participaram 6 professores que iniciaram a sua atividade profissional no ano
letivo 2015/2016. A investigação insere-se no paradigma interpretativo recorrendo, por
essa razão, a uma metodologia de natureza qualitativa. A técnica de recolha de dados
utilizada foi a entrevista semiestruturada, tendo os dados sido analisados com recurso à
análise de conteúdo, através do software NVIVO 11.
Os resultados obtidos permitem-nos identificar os aspetos positivos e os
constrangimentos percecionados pelos docentes sobre a formação inicial, bem como a
relação entre os mesmos e a sua preparação para o desempenho da profissão, no início
da sua inserção na carreira. Foi ainda possível identificar outros aspetos que se
configuraram de dificuldade não relacionados com o objeto de estudo.
Palavras-chave: Formação Inicial de Professores – Inserção Profissional - Professores
Principiantes - Desenvolvimento Profissional Docente.
1. Contextualização do estudo
A iniciação da atividade profissional docente é um processo complexo e desafiante
longamente estudado a nível nacional e internacional e consensualmente caracterizado
como árduo e solitário. Com efeito, os professores terminam a sua formação inicial e são
integrados no mercado de trabalho, na maioria das vezes, sem qualquer apoio ou
supervisão. Neste contexto, importa questionar em que medida os futuros professores se
sentem preparados para esta nova realidade, quais as dificuldades com que se
confrontam e de que modo as ultrapassam?
Com este propósito, e para enquadrar concetualmente o estudo, pareceu-nos adequado
revisitar aspetos que consideramos pertinentes relacionados com a natureza da formação
inicial de professores no contexto atual. Esta opção conduz-nos igualmente à abordagem
de aspetos relacionados com o desenvolvimento profissional docente, bem como a uma
2. V CONGRESO INTERNACIONAL SOBRE EL PROFESORADO PRINCIPIANTE Y LA
INDUCCIÓN ALADOCENCIA
síntese sobre a regulamentação dos processos de indução na carreira docente em
Portugal, o que nos permite compreender melhor esta etapa do percurso profissional dos
professores principiantes no nosso país.
1.1. Formação Inicial de professores: Perspetivas atuais
A Educação é, consensualmente aceite, como um dos pilares de qualquer civilização
cabendo-lhe as difíceis, mas gratificantes, tarefas de acolher diferentes culturas,
acompanhar o desenvolvimento tecnológico, promover práticas que conduzam à
autonomia, à responsabilidade, à colaboração, ao respeito e à inclusão, sem nunca
perder de vista o desenvolvimento integral dos indivíduos, nomeadamente o
conhecimento científico.
Neste contexto a formação inicial de professores assume um papel de especial
relevância. Nos últimos anos vários estudos apontam para a importância de repensarmos
a formação inicial de professores, conferindo-lhe uma valência mais participativa,
reflexiva e investigativa. Partindo da premissa que a sociedade está em contínua
transformação e que os desafios se sucedem compreende-se que a formação inicial de
professores não pode ter um caráter estanque, ou seja, não se pode assumir que o que
se aprende na formação inicial seja suficiente e adequado para os cerca de 35 anos de
profissão que se seguem. O tempo da escola “transmissora de conhecimentos” já deveria
estar ultrapassado, para dar lugar, agora, a um novo tempo caracterizado pela implicação
do estudante no processo de aprendizagem, onde estas se revelassem significativas,
ativas, em contextos de cooperação e participação, com especial destaque para os
procedimentos de investigação no contexto da prática fundamentada, tal como se
percebe pela análise dos currículos dos ciclos de estudo, resultantes do Processo de
Bolonha.
Na perspetiva de Roldão (2007, p.45), o “processo de formação entende-se como um
processo epistémico e praxiológico permanente (…)” porque, por um lado se trata da
aquisição constante de conhecimentos científicos próprios da atividade profissional e, por
outro, porque esses mesmos conhecimentos são feitos no dia-a-dia a partir da reflexão
na e pela prática, ou seja, em função da realidade, do contexto, da situação…
O Processo de Bolonha vem comprovar que estas preocupações não são exclusivas de
um ou dois países mas sim transversais a um conjunto de nações que se unem pela
vontade de melhorar as práticas de ensino e pela necessidade de criar modelos que
viabilizem a comparação formação superior, fomentando parcerias.
1.2. Indução Profissional: do legislado às práticas de supervisão
Embora seja incontestável o papel das escolas de formação inicial, é indispensável que
os jovens professores continuem a ser acompanhados no início das suas carreiras. É de
toda a importância que possam ser orientados nos primeiros passos da construção do
saber in situ.
É neste sentido que surgem os defensores das parcerias entre as escolas de formação
inicial e as escolas de acolhimento para que seja exequível articular a formação inicial, a
indução e a formação ao longo da vida (Roldão, 2007).
Os processos de indução na carreira são relativamente bem estruturados em algumas
profissões e quase que intuitivos noutras. Na carreira médica, por exemplo, os
profissionais, para além dos longos períodos de estágio, são muito acompanhados na
entrada na profissão sendo esse acompanhamento extremamente explícito e estruturado.
Noutras atividades profissionais, mesmo não havendo tanto acompanhamento como no
exemplo anterior, acaba por haver alguma supervisão. Um ator não tem propriamente um
sistema de indução profissional definido, no entanto, o seu trabalho está dependente de
outros atores, sonoplastas, diretores/ encenadores que, necessariamente desenvolvem
as suas funções baseando-se em relações de interdependência. Até a administração
3. V CONGRESO INTERNACIONAL SOBRE EL PROFESORADO PRINCIPIANTE Y LA
INDUCCIÓN ALADOCENCIA
pública está a apostar – há já alguns anos – nos chamados open spaces que preveem
uma maior interação e partilha entre colaboradores de um mesmo serviço.
Corroborando esta perspetiva, Canário considera que “o problema da formação de
professores se resolve, em larga medida, através da intervenção direta no modo de
funcionamento das escolas, onde se encontram os mais importantes formadores, ou seja,
os professores mais experientes” (2007, pp.141). Este cenário parece-nos, não só
auspicioso para os neófitos como igualmente motivador e enriquecedor para os
professores mais experientes uma vez que viabiliza a reflexão, a partilha e,
simultaneamente, confere-lhes um reconhecimento profissional tantas vezes
negligenciado.
Em Portugal, existem algumas evidências da preocupação por parte da administração
central relativamente ao processo de indução profissional, contudo, há ainda alguma falta
de clareza na distinção entre período de indução e período probatório. Este último prevê
a indução mas resulta numa avaliação final, ou seja, acaba por se refletir numa
perspetiva mais avaliativa do que formativa.
Ainda assim, há algumas referências a este período nos Decretos-Lei n.º344/89 (artigo
26 no ponto 2) e no n.º 139-A/90 (preâmbulo). É ainda referido no artigo 27º do Decreto
Regulamentar n.º 2/2008, no Despacho n.º 21666/2009 e no artigo n.º 31 do Estatuto da
Carreira Docente (Decreto-Lei n.º15/2007), com alterações no mais recente Decreto-Lei
n.º 41/2012, de 21 de fevereiro. Apesar de contemplado no Estatuto da Carreira Docente
(Decreto-Lei n.º 15/2007), só foi regulamentado através da publicação do Despacho n.º
21666/2009, de setembro de 2009, em que se estabelece que o período probatório tem a
duração mínima de um ano escolar que corresponde ao primeiro ano de exercício efetivo
de funções de professor. Este período promove o apoio ao desenvolvimento profissional
dos docentes e a sua integração e participação na escola. É ainda objetivo do período
probatório a verificação da capacidade de adequação do docente ao perfil de
desempenho profissional exigível, desempenho esse que é definido pelo Decreto-Lei n.º
240/2001 de 30 de agosto. Ainda segundo o Despacho n.º 21666/09, o professor que se
encontra no período probatório é acompanhado e apoiado no plano didático, científico e
pedagógico por um professor titular, denominado por professor mentor, que detenha
formação nas áreas de Organização Educacional e Desenvolvimento Curricular,
Supervisão Pedagógica ou Formação de Formadores.
Este período de indução, embora se encontre legislado e regulamentado, em Portugal
não encontra tradução na prática dos professores principiantes. Estes dispositivos de
acompanhamento estão longe de ser uma realidade. Os professores mentores acabam,
muitas vezes, por não ter disponibilidade e até motivação para acompanhar os novos
docentes e, por outro lado, a cultura de escola acaba por não favorecer estas medidas
que, naturalmente, requerem disponibilidade, acompanhamento e colaboração.
1.3. Desenvolvimento Profissional Docente
A utilização do termo desenvolvimento profissional, no campo da educação, é
relativamente recente. Até aos anos 70, a formação inicial era considerada suficiente
para o desempenho da profissão. Atualmente, consideramos que a formação inicial deve
ser encarada como a primeira fase de um longo e diferenciado processo de
desenvolvimento profissional.
A formação clássica do professor (que inclui não só a formação inicial, mas também a
contínua) necessita de ser transformada e concebida na perspetiva de desenvolvimento
profissional, na medida em que as constantes mudanças da sociedade atual e as
responsabilidades que são exigidas às escolas, no que respeita a atuação dos docentes,
têm de ser, necessariamente, consideradas.
A associação entre formação e desenvolvimento profissional é evidente. A este respeito,
Imbernón (citado por Martins, 2011, p. 22) afirma que “a formação é um elemento
4. V CONGRESO INTERNACIONAL SOBRE EL PROFESORADO PRINCIPIANTE Y LA
INDUCCIÓN ALADOCENCIA
importante do desenvolvimento profissional, mas não é o único e talvez não o decisivo”.
Deste modo, o aparecimento do conceito de desenvolvimento profissional resulta do
reconhecimento da necessidade de formação ao longo da vida. Este conceito pressupõe
que, ao longo da carreira do professor, este sente necessidade de aprofundar os seus
conhecimentos, criando contextos e recursos para um investimento pessoal, registando-
se uma evolução e continuidade a que a profissão docente obriga e que coloca o
professor como protagonista do seu próprio desenvolvimento profissional. Todo este
processo dá-se de forma gradual: o docente vai adquirindo confiança e vai ganhando
novas perspetivas. Vai igualmente expandindo os seus conhecimentos, descobrindo
novos métodos e adquirindo novos papéis, num processo que o inclui a si próprio e ao
meio que o rodeia.
Referimo-nos a um processo complexo em que o professor, no contexto escolar, tem
oportunidades para melhorar as suas práticas, individualmente ou em colaboração com
os colegas, investigadores educacionais e formadores. Neste sentido, encaramos o
professor de uma forma holística, pois este deve ser considerado como pessoa, no
contexto da escola e como meio de desenvolvimento curricular, interveniente no processo
de ensino-aprendizagem.
Deste modo, o desenvolvimento profissional inclui a aprendizagem pessoal a partir da
experiência, muitas vezes sem qualquer tipo de orientação, através da qual a maioria dos
docentes aprende a sobreviver, a desenvolver competências e a crescer
profissionalmente nas salas de aula e nas escolas. As oportunidades informais de
desenvolvimento profissional vividas na escola (decorrentes da experiência) e as mais
formais oportunidades de aprendizagem (através do treino, workshops, formação
contínua) são bastante relevantes no contexto do desenvolvimento profissional (Day,
2001, p. 18).
O desenvolvimento profissional pressupõe assim um processo de mudança nas crenças
e perceções dos docentes relativamente ao modo como olham para os seus alunos e o
ensino. Consideramos que os docentes alteram as suas mentalidades quando
compreendem que as mudanças introduzidas nas suas práticas conduzem a resultados
positivos no que respeita as aprendizagens dos alunos.
2. Objetivos do estudo
O presente estudo visa compreender e descrever o impacto da preparação recebida na
formação inicial, no desempenho da prática docente dos professores principiantes.
Constituem-se como questões do estudo: 1) Quais os aspetos positivos e os
constrangimentos das experiências vividas na formação inicial? 2) Quais os aspetos
facilitadores e os constrangimentos percecionados pelos professores principiantes no
início da carreira? 3) Qual a relação entre os aspetos mais positivos e os
constrangimentos identificados na formação inicial e experiências de inserção
profissional?
Em conformidade com as questões do estudo, foram definidos os seguintes objetivos
específicos:
I. Caracterizar as perspetivas dos professores principiantes face às experiências da
formação inicial e preparação para a docência (aspetos positivos, constrangimentos,
outros).
II. Caracterizar as experiências de inserção profissional (aspetos positivos e
constrangimentos).
III. Identificar relações entre os aspetos positivos e constrangimentos percecionados na
formação inicial e o desempenho docente dos professores principiantes.
5. V CONGRESO INTERNACIONAL SOBRE EL PROFESORADO PRINCIPIANTE Y LA
INDUCCIÓN ALADOCENCIA
3. Opções Metodológicas
3.1. Natureza do estudo
Do ponto de vista metodológico, a pesquisa inscreve-se no paradigma qualitativo
interpretativo, com recurso particular a abordagens narrativo-biográficas. O recurso à
metodologia qualitativa privilegia a compreensão dos comportamentos a partir das
representações dos professores participantes. A abordagem qualitativa requer assim que
“os investigadores desenvolvam empatia para com as pessoas que fazem parte do
estudo e que façam esforços concertados para compreender vários pontos de vista”
(Bogdan e Biklen, 1994, p.287).
3.2. Técnicas de recolha e tratamento de dados
Como técnica de recolha de dados foi utilizada a entrevista semiestruturada. É esta
técnica a que melhor se adequa ao objeto de estudo (Quivy e Campenhoud, 2008), na
medida em que, após um guião inicial, elaborado pelo entrevistador, o entrevistado, como
referem Marconi e Lakatos (1990), tem a liberdade para desenvolver cada situação em
qualquer direção que considere adequada.
O recurso à entrevista semiestruturada teve por objetivo permitir aos entrevistados
explorarem, de forma flexível e aprofundada, os seus relatos, e dar-lhes, deste modo,
oportunidade de verbalizarem aspetos relativos às suas experiências profissionais
enquanto professores principiantes.
O guião elaborado com base no referencial teórico, particularmente nos dados dos
estudos sobre o tema, foi em seguida submetido a apreciação de dois professores peritos
na matéria, seguido da sua aplicação a 3 professores principiantes que não fazem parte
dos professores estudados. Este procedimento teve como objetivo a validação do guião
da entrevista e o treino do investigador.
Depois de realizadas, as entrevistas foram transcritas e validadas, via e-mail, pelos
entrevistados.
A análise de conteúdo das entrevistas foi feita com recurso ao software NVIVO 11.
3.3 Participantes do estudo
Participaram neste estudo 6 professores com idades compreendidas entre os 24 e 28
anos, que iniciaram a sua atividade docente no início do presente ano letivo (2015/ 2016),
tendo terminado no ano letivo transato o mestrado em ensino do 1.º e 2.º ciclo do ensino
básico, na Escola Superior de Educação de Lisboa.
Estes 6 professores foram escolhidos, de acordo com os seguintes critérios:
Ter terminado o mestrado em Ensino do 1.º e 2.º ciclo do ensino básico, na Escola
Superior de Educação de Lisboa, no ano letivo 2014/ 2015
Encontrar-se colocado no 1.º ou no 2.º ciclo do ensino básico (a trabalhar com
alunos dos 6 aos 12 anos de idade), no ano letivo de 2015-2016.
4. Apresentação de resultados
4.1. Perspetivas dos participantes face às experiências da formação inicial e
preparação para a docência
Ser professor é cada vez mais uma profissão desafiante e que envolve múltiplas
competências que, segundo Estrela, implicam necessariamente algumas condições,
tempo e maturidade, “por isso, é no período de formação inicial que elas devem começar
a ser adquiridas e exercitadas, assim como reavaliadas e desenvolvidas ao longo da
formação contínua” (2002, p.111).
6. V CONGRESO INTERNACIONAL SOBRE EL PROFESORADO PRINCIPIANTE Y LA
INDUCCIÓN ALADOCENCIA
Os resultados do estudo permitem considerar que, de uma forma geral, a formação inicial
prepara bem os professores para o exercício da prática profissional, quer a nível teórico,
quer prático.
A este respeito a análise dos dados permitiu destacar áreas de formação que se
revelaram essenciais, designadamente as experiências formativas no âmbito da
Pedagogia, Psicologia e Didáticas específicas, com particular destaque para a didática da
matemática e do português.
Os professores principiantes participantes no estudo consideram ter sido nestas
disciplinas que encontraram as bases para uma preparação consistente, que lhes
permitiu um desempenho profissional com segurança e qualidade nas respostas às
necessidades dos alunos no contexto da prática profissional.
Não obstante, encontraram alguns constrangimentos na preparação em algumas áreas,
designadamente no âmbito das Ciências da Natureza e Artes. Dois dos participantes
consideram que as mesmas são importantes e bastante úteis, contudo, são da opinião
que se lhes dedica demasiado tempo e que as mesmas são abordadas de acordo com
lógicas demasiado teóricas com insuficiente ligação à prática.
Este excesso da componente teórica, bem como os modos de avaliação (trabalhos de
grupo e individuais) conduzem muitas vezes, a um excessivo volume de trabalho, difícil
de gerir. Esta dificuldade conduz igualmente a dificuldades de apropriação de
conhecimentos essenciais no contexto destas áreas de formação.
Não obstante, os procedimentos de avaliação contínua praticados na maior parte das
Unidades Curriculares é considerado pelos participantes do estudo como um aspeto
bastante positivo e facilitador das aprendizagens e do seu sucesso educativo.
Outro aspeto destacado como facilitador das aprendizagens é a relação e disponibilidade
manifesta pelos docentes do Ciclo de Estudos no apoio ao trabalho dos estudantes nos
momentos formais de orientação tutorial ou sempre que necessário.
Esta disponibilidade e qualidade da relação entre docentes e estudantes facilitam a
colocação de dúvidas sem receios e a aprendizagem. Esta relação de proximidade, bem
como os pedidos de ajuda, transcendem a formação inicial, havendo quem tenha
recorrido aos professores da formação inicial nos primeiros tempos de inserção na
profissão para partilhar angústias, receios ou para pedir algum apoio de natureza mais
especializada.
A qualidade das relações interpessoais são igualmente recorrentes entre estudantes, e
perduram para além do tempo, sendo frequentes as relações de amizade e a
continuidade da colaboração e partilha depois de terminada a formação inicial.
As experiências vividas no contexto da Prática de Ensino Supervisionada (estágio)
assumem, para todos, um papel fundamental em todo o percurso formativo. Os
resultados do estudo permitem considerar que estes são os momentos pelos quais todos
anseiam e são objeto do seu maior investimento pessoal. São eles que “permitem a
articulação teoria/ prática, focalizam a (des)construção do que é ser-se professor e
proporcionam a investigação de situações de aprendizagem in situ” (Mesquita, 2015,
p.32). De uma maneira geral, todos os participantes consideram muito positivas todas as
experiências relacionadas com esta dimensão considerando-os bem estruturados,
diversificados e com períodos temporais adequados.
Como aspeto mais negativo, identifica-se, por unanimidade, o sentimento de falta de
preparação em questões de natureza burocrática ou administrativa. O conhecimento e
interpretação dos normativos legais vigentes, o preenchimento de documentação
específica ou até mesmo a real noção dos documentos estruturantes da escola, são
algumas das fragilidades mencionadas por estes professores principiantes. A este
respeito sugerem ainda a necessidade de preparação na gestão de reuniões de pais.
Do mesmo modo, os professores principiantes que se encontram a trabalhar com turmas
do 1º ano de escolaridade (6/7 anos de idade) referem alguma insegurança relativamente
7. V CONGRESO INTERNACIONAL SOBRE EL PROFESORADO PRINCIPIANTE Y LA
INDUCCIÓN ALADOCENCIA
às suas competências para abordar a iniciação à leitura e à escrita, considerando que a
preparação da formação inicial se revelou insuficiente neste domínio, para assumir com
segurança esta tarefa.
4.2. Experiências de inserção profissional
4.2.1. Aspetos positivos
Após a conclusão da formação inicial, os professores principiantes em Portugal, veem-se
confrontados com dificuldades de inserção no mercado de trabalho, devido à inexistência
de vagas no ensino público. Esta situação determina que apenas uma pequena minoria
destes professores consegue a tão desejada colocação em instituições de ensino
particular.
A possibilidade de contratação surgiu, em alguns dos casos estudados, ainda antes de
terminada a formação inicial o que reduziu, em muito, as suas ansiedades e
preocupações prévias à entrada na profissão.
A relação entre colegas e órgãos de administração escolar é também um aspeto muito
positivo em alguns dos casos. Os professores principiantes sentem-se mais confiantes e
acompanhados quando têm algum grau de proximidade com um ou mais elementos da
instituição de trabalho sendo, regra geral, a esses que recorrem com maior frequência
para pedir apoio ou partilhar dificuldades. Nos casos em que coordenação e/ ou direção
das Instituições Escolares se mostram disponíveis e revelam confiança nas capacidades
dos novos professores, os mesmos sentem-se mais acompanhados e seguros no
desempenho das suas funções docentes.
Quando assim não é, ou seja, quando dentro da Instituição não há uma relação de
proximidade e disponibilidade por parte dos seus pares ou dos órgãos de gestão
intermédia, alguns professores recorrem a antigos colegas da formação inicial, com quem
estabeleceram vínculos no passado, ou até mesmo a antigos professores.
4.2.2. Constrangimentos
A maior dificuldade revelada por quase todos os participantes no estudo prende-se com o
trabalho burocrático nas escolas. Segundo os resultados apresentados pelo Relatório
TALIS 2013, os professores portugueses dedicam em média 34% do seu tempo (de
cerca de 45h semanais) a tarefas não relacionadas com a aprendizagem dos seus
alunos, mas sim na organização burocrática e outras tarefas de gestão: reuniões,
encarregados de educação, atividades extracurriculares, etc.. Estes resultados vão ao
encontro do que é relatado pelos participantes do estudo que consideram as tarefas
burocráticas as mais complexas. Estes profissionais sentem que além de estas não
serem competências muito trabalhadas durante a formação inicial, os professores mais
experientes nem sempre se apercebem da dificuldade que os principiantes manifestam
na sua realização, não lhes prestando por essa razão um auxílio tão espontâneo como
em outras situações relacionadas com a prática com os alunos.
A relação com os pais e encarregados de educação revela-se, do mesmo modo, um
aspeto de difícil gestão e que, regra geral, causa alguma fragilidade a estes novos
professores. Com efeito, os professores principiantes revelam receios e fragilidades na
relação com os pais, decorrente da sua inexperiência e da convicção de que podem ser
considerados menos capazes devido à sua idade ou ausência de experiência
profissional.
Por outro lado, a análise dos dados permite igualmente identificar dificuldades
relacionadas com a gestão dos tempos curriculares e a gestão de conflitos dos alunos.
O assumir a autoridade docente configura-se, por vezes, também uma dificuldade.
Alguns professores destacam o facto de lhes serem atribuídas funções (como a vigilância
e animação de recreios ou o apoio individualizado a alunos) que, de certa forma,
contribuem para a construção de uma relação professor-aluno de maior proximidade e
8. V CONGRESO INTERNACIONAL SOBRE EL PROFESORADO PRINCIPIANTE Y LA
INDUCCIÓN ALADOCENCIA
em contextos mais descontraídos o que não favorece, segundo eles, o reconhecimento
da autoridade desejada.
Outra das dificuldades identificadas relaciona-se com o equilíbrio que deve ser feito entre
a planificação do trabalho a desenvolver com os alunos e as intervenções e motivações
dos mesmos. Esta dicotomia coloca ao professor principiante dilemas e alguma
ansiedade, pelo facto de não se sentir seguro nas opções a tomar: se valorizar mais o
cumprimento do programa ou os interesses dos discentes e como dosear as duas
premissas.
A imagem que a comunidade escolar vai criando a seu respeito é também um aspeto que
se configura de extrema importância. Em todos os casos estudados, identifica-se sempre
pelo menos um setor da comunidade que representa entraves ao conforto dos docentes.
Alguns dos entrevistados sentem-se muito bem na Instituição mas desconfortáveis com
os pais; outros já estabeleceram uma boa relação com as famílias mas consideram que a
direção e/ ou coordenação da Instituição não os conhece; outros ainda, sentem uma
ausência de relação com os colegas que determina algum desconforto.
4.3. Relações entre os problemas percecionados na formação inicial e o desempenho
docente
Tal como referido anteriormente, os participantes consideram a sua formação inicial de
forma muito positiva, valorizando as diferentes dimensões da mesma. Ainda assim, “faliu
a ideia de que uma formação inicial sólida (…) é suficiente para assegurar o bom
desempenho durante todo o percurso profissional.” (Alarcão e Canha, 2013, p.50)
Através da análise das narrativas é possível afirmar que os aspetos mais referidos como
menos positivos durante a formação inicial determinam a emergência de dificuldades
aquando do desempenho profissional nos primeiros tempos de inserção nos contextos de
trabalho.
A este respeito destaca-se, entre outros, a realização de tarefas de natureza burocrática,
tais como o preenchimento de documentação variada, a interpretação da legislação, etc.
As dificuldades no contexto da relação com os pais e na preparação e condução de
reuniões com os mesmos, são igualmente problemas identificados como lacunares na
preparação da formação inicial e que, no entender dos participantes, determinam agora,
essa ausência de competência sobre os assuntos a tratar e os modos de abordagem.
No que respeita ao trabalho com os alunos, as maiores dificuldades emergem da
ausência de competências para a abordagem dos processos de iniciação à leitura e
escrita e na identificação de estratégias mais adequadas na resolução de conflitos com e
entre os alunos. Estes foram também temas identificados como sendo insuficientemente
abordados na formação inicial.
Não obstante, para além das dificuldades apresentadas identificaram-se outras
consideradas próprias da fase de incompetência transitória que atravessam,
consequência da sua situação de professores principiantes.
Alguns docentes consideram-se bem preparados, com a convicção de que a formação
inicial não pode preparar para toda a vida profissional, acrescentando que a formação
deverá ocorrer de forma contínua, ao longo de toda a vida. Por outro lado, outros
participantes atribuem à formação inicial a responsabilidade integral de todas as
“lacunas” e dificuldades que percecionam neste momento particular de inserção na
profissão.
Considerações Finais
A formação inicial tem implicações reais no desempenho profissional dos professores
principiantes e a sua influência revelou-se bastante positiva e significativa. Todos se
consideram bem preparados em termos globais para o trabalho com os alunos, muito
embora tenham identificado algumas dificuldades relacionadas com constrangimentos no
9. V CONGRESO INTERNACIONAL SOBRE EL PROFESORADO PRINCIPIANTE Y LA
INDUCCIÓN ALADOCENCIA
percurso de formação inicial. Destes destacam-se a insuficiente preparação para a
iniciação à leitura e à escrita e para assumir tarefas de natureza organizativa e
burocrática.
O facto de tentarem ultrapassar as dificuldades que se lhes vão colocando recorrendo a
colegas da faculdade, colegas de trabalho e até a antigos professores é revelador da
existência de pré-requisitos para vivências profissionais colaborativas e assentes no
desenvolvimento profissional docente.
Todos os entrevistados abordam a necessidade de trabalho em colaboração com os seus
pares, explicitando que foi dessa forma que ultrapassaram algumas das suas principais
dificuldades. Esta perspetiva vem ao encontro do que é defendido para a educação há
várias décadas. Com efeito, já em 1996, o relatório da Unesco referia que “o confronto
através do diálogo e da troca de argumentos (como) um dos instrumentos indispensáveis
à educação do século XXI” (p. 97), considerando o “trabalho em equipa (como)
indispensável (…) para melhorar a qualidade da educação e adaptá-la melhor às
características particulares das aulas e dos diferentes grupos de alunos” (p. 166).
Não obstante, relativamente à legislação produzida em Portugal sobre a inserção
profissional, todos os entrevistados consideram que as escolas não dispõem de uma
estrutura de supervisão/ acompanhamento formal aos professores principiantes.
Contudo, em 3 dos contextos estudados evidenciam-se algumas práticas de
acompanhamento aos novos professores, quer por parte do coordenador pedagógico da
instituição, quer por parte dos próprios colegas.
Nestes casos há ainda docentes de referência que não só se mostram disponíveis, como
procuram os novos professores oferecendo-lhes, em articulação com os coordenadores
das instituições, oportunidades de partilha de materiais e experiências. As próprias
vivências que se criam fora do contexto escolar enfatizam a boa relação estabelecida
criando laços de afetividade e conforto.
Por oposição, numa das situações estudadas, a tentativa de supervisão do professor
caracteriza-se por processos de pressão e atitudes mais inspetivas de controlo do que
formativas.
Referências
Alarcão, I. & Canha, B. (2013). Supervisão e Colaboração. Uma relação para o
desenvolvimento. Porto: Porto Editora.
Bogdan, R. & Biklen, S. (1994). Investigação Qualitativa em Educação. Porto: Porto
Editora.
Canário, R. (2007). Formação e Desenvolvimento Profissional dos Professores
(conferência). In Desenvolvimento profissional de professores para a qualidade e
para a equidade da aprendizagem ao longo da Vida (conferência). Lisboa.
Coutinho, C. P. (2014). Metodologia de Investigação em Ciências Sociais e
Humanas: Teoria e Prática. Coimbra: Almedina.
Day, C. (2001). Desenvolvimento Profissional de Professores. Os desafios da
aprendizagem permanente. Porto: Porto Editora.
Esteve, J. M. (1995). Mudanças sociais e função docente. In A. Nóvoa (Org.),
Profissão Professor. Porto: Porto Editora.
Estrela, A., & Estrela, M.T. (1977). Perspetivas Atuais sobre a Formação de
Professores. Lisboa: Editorial Estampa.
Estrela, M. T. (2002). Relação Pedagógica, disciplina e indisciplina na sala de aula.
Coleção Ciências da Educação. Porto: Porto Editora.
Flores, M. A. (1999). (Des)Ilusões e paradoxos: A entrada na carreira na perspetiva
dos professores neófitos. In Revista Portuguesa de Educação, 12(1), pp. 171-204.
Minho: Universidade do Minho.
10. V CONGRESO INTERNACIONAL SOBRE EL PROFESORADO PRINCIPIANTE Y LA
INDUCCIÓN ALADOCENCIA
Formosinho, J., Machado J. & Mesquita, E. (2015). Formação, trabalho e
aprendizagem. Tradição e inovação nas práticas docentes. Lisboa: Edições Sílabo.
Marconi, M. A. & Lakatos, E. M. (1990). Técnicas de pesquisa (2ªed). São Paulo:
Edições Atlas.
Martins, M. (2011). O Desenvolvimento Profissional de Professores do 1º Ciclo do
Ensino Básico: Contributo na Participação num Programa de Formação Contínua em
Matemática. Lisboa. Instituto de Educação: Universidade de Lisboa.
Nóvoa, A. (1995). O passado e o presente dos professores. In Profissão Professor
(Org.) 2ª ed. Porto: Porto Editora.
Nóvoa, A. (2007). O regresso dos professores. In Desenvolvimento profissional de
professores para a qualidade e para a equidade da aprendizagem ao longo da vida
(conferência). Lisboa.
OCDE (2014). TALIS 2013 Results: An International Perspective on Teaching and
Learning. OCDE Publishing.
Quivy, R. & Campenhoudt, L. (2008). Manual de Investigação em Ciências Sociais –
Trajectos (5.ª ed.). Lisboa: Gradiva.
Roldão, M. C. (2007). Formação de professores baseada na investigação e na
prática reflexiva. In Desenvolvimento profissional de professores para a qualidade e
para a equidade da aprendizagem ao longo da vida (conferência). Lisboa.
UNESCO (1996). Educação um tesouro a descobrir: Relatório para a UNESCO da
Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI.
Wenger, E. (2011). Comunidades de Práctica: Aprendizaje, significado e identidad.
Barcelona: Paidós.
Legislação consultada
Decreto-Lei n.º 344/89 de 11 de outubro – (Estabelece o ordenamento jurídico da
formação dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e
Secundário).
Decreto-Lei n.º139-A/90 de 28 de abril – (Aprova o Estatuto dos Educadores de
Infância e dos Professores do Ensino Básico).
Decreto-Lei n.º 240/2001 de 30 de agosto – (Define o perfil geral de desempenho dos
Educadores de Infância e do Professor dos Ensinos Básico e Secundário).
Decreto-Lei n.º15/2007, art.º 31 de 19 de janeiro – (Altera o Estatuto da Carreira dos
Educadores de Infância e Professores do Ensino Básico e Secundário).
Decreto Regulamentar n.º2/2008 de 10 de janeiro - (Dispõe, no seu Artigo 27.º, o
regime de avaliação do docente em Período Probatório).
Despacho n.º 21666/2009 de 28 de setembro – (Regulamenta o Período Probatório).
Decreto-Lei n.º 41/2012 de 21 de fevereiro - (Altera o Estatuto da Carreira dos
Educadores de Infância e Professores do Ensino Básico e Secundário).