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J. KRISHNAMURTI
a arte de
aprender
Cartas às Escolas
UNIVERSALISMO
Este é um diálogo entre nós, uma conversa entre dois amigos. Não é uma
palestra para instruir, informar ou guiá-lo. Vamos conversar juntos sobre muitas
coisas, certamente não para convencê-lo de coisa alguma, nem para informá-lo
de novas idéias, novos conceitos, conclusões, ideais. Vamos olhar para o mundo
inteiro assim como ele é, olhar para o que está acontecendo não somente nesta
parte do mundo, mas também no resto do mundo. Juntos. E o orador quer dizer
juntos mesmo. Você e ele vão observar, sem nenhum viés, sem nenhum
preconceito, o que está acontecendo globalmente.
Esta é uma conversa séria, não é algo intelectual, emocional ou devocional.
Assim, devemos exercitar nossos cérebros. Devemos ser céticos, ter dúvidas;
devemos questionar e não aceitar nada que alguém diz — incluindo todos os
gurus e os livros sagrados. Chegamos a uma crise no mundo. A crise não é
meramente econômica; é, antes de tudo, psicológica. Vivemos aqui na terra por
mais de um milhão de anos e, durante esse longo período de tempo, passamos
por todo tipo de catástrofe, todo tipo de guerra. Civilizações desapareceram;
assim como as culturas que moldaram o comportamento do ser humano.
Tivemos muitos grandes líderes, políticos e religiosos, com todas as peças que
eles pregaram nos seres humanos. E depois dessa enorme evolução do cérebro
humano, estamos onde sempre estivemos — um tanto primitivos, bárbaros,
cruéis e sempre nos preparando para a guerra. Cada nação está armazenando
armamentos. E nós, seres humanos, estamos presos na roda do tempo. Não
mudamos muito; ainda somos bárbaros, com todos os tipos de superstições e
crenças. No fim de tudo isso, onde estamos nós?
Por favor, estamos conversando sobre essas coisas juntos. Não é que o orador
esteja explicando tudo isso; é tão óbvio. Você e o orador estão juntos
examinando — muito cuidadosamente, diligentemente — o que nos tornamos, o
que nós somos. E perguntamos: O tempo nos transformará? O tempo, ou seja,
outros cinquenta mil ou um milhão de anos, transformará a mente humana, o
cérebro humano? Ou o tempo não tem nenhuma importância? Vamos conversar
sobre essas coisas.
Os seres humanos estão feridos psicologicamente. Os seres humanos por todo
o mundo estão tomados por grande sofrimento, dor, tristeza, solidão e
desespero. E o cérebro criou as coisas mais extraordinárias, ideológica,
tecnológica e religiosamente. O cérebro é extraordinariamente capaz. Mas essa
capacidade é muito limitada. Tecnologicamente estamos progredindo a uma
velocidade extraordinária. Mas psicologicamente, interiormente, somos muito
primitivos, bárbaros, cruéis, desmazelados, descuidados, e indiferentes ao que
está acontecendo. Somos indiferentes não somente à corrupção acontecendo
no meio ambiente, mas também à corrupção que acontece em nome da religião,
em nome da política, dos negócios e assim por diante. Corrupção não é somente
passar dinheiro por debaixo da mesa ou contrabandear mercadorias para dentro
do país. A corrupção começa onde existe interesse próprio. Onde existe
interesse próprio, essa é a origem da corrupção.
Estamos pensando juntos, ou você está meramente escutando o orador?
Estamos indo juntos como dois amigos, fazendo uma longa viagem — uma
viagem ao mundo global, uma viagem para dentro de nós mesmos: para dentro
do que somos, do que nos tornamos, e por que nos tornamos o que somos. E
precisamos fazer essa viagem juntos. Não é que o orador faz a viagem e mostra
a estrada e o caminho no mapa para você. Mas, sim, que estamos juntos, e o
orador quer dizer juntos mesmo. Pois ele não é um guru. Não se deve seguir
ninguém no mundo do pensamento, no mundo da psique. Já dependemos
demais dos outros para nos ajudar. E não estamos ajudando você. Vamos ser
muito claros neste ponto: o orador não está lhe ajudando, pois você tem tido
ajudantes em abundância. E não temos sido capazes de estar a sós, pensando
as coisas por nós mesmos; não temos sido capazes de olhar para o mundo e
para nosso relacionamento com o mundo, e ver se somos indivíduos mesmo ou
parte da humanidade. Não exercitamos nossos cérebros, que é
extraordinariamente capaz. Gastamos nossa energia, nossa capacidade, nosso
entendimento intelectual em uma direção apenas — a tecnológica. Mas nunca
entendemos o comportamento humano e por que somos como somos depois
desse longo período de evolução.
J. Krishnamurti
Sumário
INTRODUÇÃO
VOLUME I
Carta 1 — O ponto não é o que pensar, mas como pensar claramente
Carta 2 — A bondade só pode florescer em liberdade
Carta 3 — A escola é um lugar de lazer
Carta 4 — O medo destrói a sensibilidade
Carta 5 — Nós aceitamos a guerra como um meio de vida
Carta 6 — A ilusão de que somos seres humanos separados
Carta 7 — Cada ação, cada relacionamento é um movimento de aprender
Carta 8 — O sentimento de ser totalmente responsável pelas nossas ações
Carta 9 — A constante preocupação consigo mesmo é negligência
Carta 10 — Uma seriedade onde existe liberdade e felicidade
Carta 11 — Ideais corrompem a mente
Carta 12 — Educação é libertar a mente do eu
Carta 13 — Indulgência com as coisas que não têm sentido é desperdício de
energia
Carta 14 — Por que a humanidade dá tamanha importância ao pensamento?
Carta 15 — A inteligência não é acordada pelo desejo
Carta 16 — Conflito é indicação de resistência
Carta 17 — O bom não é o melhor
Carta 18 — A dimensão que o pensamento não alcança
Carta 19 — Quando você começa muito perto, então o mundo inteiro se abre
Carta 20 — O egoísmo é o problema essencial da nossa vida
Carta 21 — O florescimento da bondade é a liberação de toda nossa energia
Carta 22 — A mente pode se libertar da prisão que criou para si mesma?
Carta 23 — Existe uma maneira de viver sem nenhum conflito?
Carta 24 — A palavra nunca é a coisa
Carta 25 — A arte de aprender é ler o livro que você é
Carta 26 — A comparação é um dos muitos aspectos da violência
Carta 27 — Valores colocam uma pessoa contra a outra
Carta 28 — Quando o amor é tomado por prazer, o homem se separa da beleza
e do sagrado
Carta 29 — As diferenças ideológicas impedem a sobrevivência humana
Carta 30 — Toda ação que jorra do pensamento impede a cooperação
Carta 31 — Inteligência é a capacidade de perceber o todo
Carta 32 — Existe algum outro movimento que não seja do intelecto e do
pensamento?
Carta 33 — Uma boa sociedade não vem a existir através de qualquer ideal
Carta 34 — Qual seria o primeiro passo?
Carta 35 — O fazer é, talvez, a maior responsabilidade
Carta 36 — Cada um está agindo como um espelho para o outro
Carta 37 — Quando você é realmente, profundamente afetuoso, você está
aprendendo
VOLUME II
Carta 1 — Disciplina significa aprender
Carta 2 — Por que o homem aceita e tolera a desordem?
Carta 3 — A arte de pensar juntos
Carta 4 — Na atenção não há ponto de foco
Carta 5 — A questão real é a qualidade da nossa mente
Carta 6 — Não mudar o que é, mas compreender o que é
Carta 7 — Todas as coisas vivas estão envolvidas no som do silêncio
Carta 8 — Libertar a consciência da limitação
Carta 9 — A atmosfera da intenção
Carta 10 — É possível transmitir a qualidade da intenção?
Carta 11 — Na investigação, satisfação não é a meta
Carta 12 — O que é só pode morrer; não pode se tornar outra coisa
Carta 13 — Liberdade não é o oposto de escravidão
Carta 14 — O pensamento é o resultado do conhecimento e da ignorância
Carta 15 — Austeridade, humildade e inteligência
Carta 16 — O pensamento não é seu ou meu
Carta 17 — Se você fere a natureza você está ferindo a si mesmo
Carta 18 — Aprender traz igualdade entre os seres humanos
APÊNDICES
O propósito da Escola Oak Grove
Comece pelo outro lado
Como vocês educam meu filho?
O coração de cada Escola
Discurso de Ommen
Fontes
Nota
Introdução
Estas cartas não são para serem lidas casualmente quando se tem um pequeno
intervalo no meio de outras coisas, nem devem ser tratadas como
entretenimento.
Estas cartas são escritas seriamente e se você considerar a leitura delas, leia
com a intenção de estudar o que é dito como se você estudasse uma flor olhando
para ela muito cuidadosamente — suas pétalas, sua haste, suas cores, seu
perfume e sua beleza. Estas cartas devem ser estudadas da mesma maneira —
não lidas pela manhã e esquecidas durante o resto do dia.
Você deve dar tempo a isto, brincar com isto, questionar, investigar sem
aceitação, conviver com isto por algum tempo, assimilar como se fosse seu e
não do escritor.
J. Krishnamurti
VOLUME I
CARTA 1
O ponto não é o que pensar, mas
como pensar claramente
1º de setembro de 1978
Como eu gostaria de manter contato com todas as escolas da Índia, com a
escola Brockwood Park na Inglaterra e com a escola Oak Grove em Ojai,
Califórnia, me proponho a escrever e enviar para todas elas uma carta a cada
quinze dias, por quanto tempo for possível. É naturalmente difícil estar em
contato pessoal com todas elas, então eu gostaria muito de escrever essas
cartas e, assim, transmitir o que as escolas deveriam ser, transmitir para todas
as pessoas responsáveis por elas que essas escolas não existem apenas para
serem excelentes no plano acadêmico, mas muito mais do que isso. Essas
escolas existem para o cultivo do ser humano total. Esses centros de educação
devem necessariamente ajudar o estudante e o professor a florescer com
naturalidade. O florescimento é muito importante, do contrário a educação se
torna um mero processo mecânico, orientado para uma carreira, para algum tipo
de profissão. Carreira e profissão, na atual sociedade, são inevitáveis, mas se
colocarmos nossa ênfase nisso, então a liberdade para florescer murchará de
maneira gradativa. Temos colocado demasiada ênfase em exames e em
conseguir boas notas. Esse não é o principal propósito pelo qual essas escolas
foram fundadas, o que não quer dizer que, em nível acadêmico, os estudantes
serão inferiores. Pelo contrário, com o florescimento, tanto do professor como do
estudante, carreira e profissão tomarão o lugar certo.
A sociedade, a cultura na qual vivemos, nos encoraja e exige que os estudantes
sejam orientados através de trabalho e segurança física. Isso tem sido uma
constante pressão de todas as sociedades — primeiro a carreira, tudo o mais é
secundário. Isso quer dizer: dinheiro em primeiro lugar, depois a complexidade
de nossa vida diária. Estamos tentando reverter esse processo, porque o homem
não pode ser feliz apenas com dinheiro. Quando o dinheiro se torna o fator
dominante da vida, há um desequilíbrio em nossas atividades diárias. Portanto,
se me permitem, eu gostaria que todos os educadores seriamente entendessem
e vissem todo o significado disso. Se o educador entende a importância disso e,
na sua própria vida, der um lugar apropriado, então ele pode ajudar o estudante,
que é compelido pelos pais e pela sociedade a fazer da carreira o mais
importante. Portanto, eu gostaria, já nesta primeira carta, de enfatizar este ponto
e sustentar que haja sempre nessas escolas um modo de vida que cultive o ser
humano total.
Como a maior parte de nossa educação é aquisição de conhecimentos, isso nos
está fazendo mais e mais mecanizados, fazendo nossas mentes funcionarem
em estreitos canais, seja o conhecimento que estamos adquirindo filosófico,
científico, religioso, comercial ou tecnológico. Nosso modo de vida, tanto dentro
como fora de casa, e a nossa especialização em determinadas carreiras estão
fazendo nossas mentes mais e mais estreitas, limitadas e incompletas. Tudo isso
leva a um modo de vida mecânico, uma padronização mental e, assim,
gradativamente, o Estado — mesmo um Estado democrático — passa a ditar o
que devemos ser. A maioria das pessoas atentas é naturalmente consciente,
mas infelizmente elas parecem aceitar e conviver com isso. Assim, isso se tornou
um perigo para a liberdade.
Liberdade é um assunto muito complexo, e para compreender a sua
complexidade, é necessário o florescimento da mente. Cada um naturalmente
dará uma definição diferente para o florescimento humano, dependendo de sua
cultura, de sua assim chamada educação, experiência, superstição religiosa —
ou seja, dependendo do seu condicionamento. Aqui nós não estamos lidando
com opiniões ou preconceitos, mas principalmente com o entendimento não
verbal das consequências e implicações do florescimento da mente. Esse
florescimento é o cultivo e o total desabrochar de nossa mente, de nosso coração
e do nosso bem estar físico. Isto é, viver em completa harmonia na qual não há
oposição ou contradição entre os três. O florescimento da mente só pode
acontecer quando existe uma percepção clara, objetiva, impessoal, não
pressionada por nenhuma imposição. O ponto não é o que pensar, mas como
pensar claramente. Temos vivido séculos de propaganda a nos dizer o que
pensar. Nisso está a maior parte da nossa educação e não na investigação do
inteiro movimento do pensamento. Florescer implica liberdade. Como qualquer
plantinha precisa de liberdade para crescer.
Em cada carta nós trataremos deste assunto de diferentes formas ao longo deste
ano; trataremos do acordar do coração — que não tem a ver com ser
sentimental, romântico ou fantasioso, mas sim com a bondade que nasce da
afeição e do amor; e trataremos do cultivo do corpo, ou seja, a alimentação
correta, o exercício apropriado, o que irá trazer uma sensibilidade apurada.
Quando esses três estão em completa harmonia — ou seja, a mente, o coração
e o corpo —, então o florescer vem, naturalmente, sem esforço e com excelência.
Este é o nosso trabalho como educadores, nossa responsabilidade — e educar
é a maior das profissões na vida.
CARTA 2
A bondade só pode florescer
em liberdade
15 de setembro de 1978
A bondade só pode florescer em liberdade. Ela não pode florescer no solo da
persuasão de forma alguma, nem sob compulsão, e também não é resultado de
recompensa. Ela não se revela quando existe qualquer tipo de imitação ou
conformismo e, naturalmente, ela não pode existir onde há medo. A bondade
mostra a si mesma no comportamento, e esse comportamento é baseado na
sensibilidade. Essa bondade se expressa na ação. O total movimento do
pensamento não é bondade. O pensamento, que é muito complexo, precisa ser
compreendido e essa própria compreensão desperta o pensamento para sua
própria limitação.
A bondade não tem oposto. A maioria de nós considera a bondade como o
oposto do mal ou da maldade e, assim, durante toda a história, em qualquer
cultura, a bondade tem sido considerada a outra face daquilo que é brutal. Assim,
o homem tem sempre lutado contra o mal na ânsia de ser bom, mas a bondade
nunca pode vir a acontecer se existe alguma forma de violência e luta.
A bondade mostra a si mesma no comportamento, na ação e no relacionamento.
Geralmente nossa conduta diária é baseada ou em seguir determinados padrões
— o que é mecânico e, portanto, superficial — ou de acordo com motivos
cuidadosamente considerados, baseados em recompensa ou punição. Então o
nosso comportamento, consciente ou inconscientemente, é calculado. Isso não
é um bom comportamento. Quando a pessoa se dá conta disso, não só
intelectualmente ou a nível verbal, então a partir dessa total negação surge o
verdadeiro comportamento.
O bom comportamento é, em essência, a ausência do eu, do meu. Ele se mostra
pela gentileza, pela consideração para com os outros, em ceder sem perder a
integridade. Portanto, o comportamento se torna extraordinariamente
importante. Ele não é um assunto casual a ser desconsiderado ou um brinquedo
de uma mente sofisticada. Ele vem das profundezas do ser e é parte da vida
diária.
A bondade se mostra na ação. Nós temos que diferenciar entre ação e
comportamento. Provavelmente ambos são a mesma coisa, mas para clarear
eles precisam ser separados e examinados. Agir corretamente é uma das coisas
mais difíceis a fazer. É muito complexo e precisa ser examinado bem de perto,
sem impaciência e sem pular para alguma conclusão.
Na nossa vida diária a ação é um movimento continuo do passado, interrompido
de vez em quando por uma nova série de conclusões; essas conclusões então
se tornam o passado; e a pessoa age de acordo com esse passado. A pessoa
age de acordo com idéias preconcebidas ou ideais; assim, estamos sempre
agindo ou a partir de conhecimento acumulado, o que é passado, ou a partir de
um futuro idealista, uma utopia.
Aceitamos essa ação como normal. Será mesmo? Nós a questionamos depois
de ter acontecido, ou antes de agir, mas esse questionamento é baseado em
conclusões anteriores ou recompensas ou punições futuras. Se eu fizer isso, eu
irei obter aquilo, e assim por diante. Assim, estamos agora questionando toda a
idéia de ação que usualmente aceitamos.
A ação acontece depois de termos acumulado conhecimento ou experiência; ou
agimos e aprendemos com essa ação — agradável ou desagradável — e essa
aprendizagem de novo se torna acumulação de conhecimento. Assim, ambas as
ações são baseadas em conhecimento, elas não são diferentes. Conhecimento
é sempre do passado e, assim, nossas ações são sempre mecânicas.
Existe uma ação que não é mecânica, repetitiva, rotineira e, portanto, sem
arrependimento? É realmente importante para nós compreendermos isso — que
onde existe liberdade e o florescimento da bondade, a ação nunca pode ser
mecânica. Escrever é mecânico, aprender uma língua, guiar um carro é
mecânico; adquirir algum tipo de conhecimento técnico e agir de acordo com ele
é mecânico. Novamente, nessa atividade mecânica deve haver uma interrupção
e, nessa interrupção, uma nova conclusão se forma, que de novo se torna
mecânica. Devemos sempre ter em mente que a liberdade é essencial para a
beleza da bondade. Existe uma ação não mecânica, mas você tem que descobri-
la, pois ela não pode ser contada a você, você não pode ser instruído sobre ela,
você não pode aprender através de exemplos, porque então ela se torna
imitação e ajustamento. Então você perde a liberdade completamente e não
existe bondade.
Penso que, por agora isso é o bastante, mas nós iremos continuar na nossa
próxima carta com o florescimento da bondade no relacionamento.
CARTA 3
A escola é um lugar de lazer
1º de outubro de 1978
Devemos continuar, se me permitem, com o florescer da bondade em cada um
de nossos relacionamentos, seja no mais íntimo ou no mais superficial ou nas
questões comuns do dia-a-dia. O relacionamento com outro ser humano é uma
das coisas mais importantes na vida. A maioria de nós não é muito séria nos
relacionamentos, pois estamos interessados primeiramente em nós mesmos —
e interessados no outro quando nos é conveniente, satisfatório ou gratificante
sensualmente. Nós lidamos com o relacionamento à distância, por assim dizer,
e não como algo no qual estejamos totalmente envolvidos.
Quase nunca nos mostramos uns aos outros, pois não nos percebemos
inteiramente, e o que mostramos ao outro no relacionamento ou é
possessividade ou dominação ou subserviência. Existe o outro e eu — duas
entidades separadas sustentando uma divisão que dura até a morte. O outro
está preocupado consigo mesmo; assim, essa divisão se mantém por toda a
vida. É claro que a pessoa demonstra simpatia, afeição e apoio em várias
circunstâncias, mas esse processo separativo continua. E, a partir disso, surgem
incompatibilidades, afirmações de temperamentos e desejos e, assim, existe
medo e acomodação. Sexualmente pode haver um estar junto, mas essa
peculiar e quase estática relação do você e do eu é sustentada com as brigas,
as mágoas, os ciúmes e toda aquela luta. Tudo isso é geralmente considerado
um bom relacionamento.
Agora, pode a bondade florescer nisso tudo? No entanto, relacionamento é vida
e, sem alguma espécie de relacionamento, a pessoa não pode existir. O eremita,
o monge, por mais que possam se retirar do mundo, carregam o mundo consigo
mesmos. Eles podem negá-lo, podem se reprimir; podem torturar a si mesmos,
mas ainda permanecem em algum tipo de relação com o mundo, pois eles são
o resultado de milhares de anos de tradição, superstição e todo o conhecimento
que o homem acumulou por milênios. Assim, não existe escape de tudo isso.
Existe o relacionamento entre o educador e o estudante. O professor mantém,
sabendo ou não, esse senso de superioridade, e assim fica sempre em um
pedestal, fazendo o estudante se sentir inferior, aquele que tem que ser
ensinado. Nisso obviamente não há relacionamento. A partir daí surge medo da
parte do estudante, um senso de pressão e constrangimento e, portanto, o
estudante aprende, desde muito jovem, esse sentido de superioridade; ele é
levado a se sentir diminuído e, assim, por toda a vida, ou se torna o agressor ou
fica continuamente cedendo, subserviente.
Uma escola é um lugar de lazer, onde o educador e a pessoa a ser educada
estão ambos aprendendo. Esse é o fato central da escola: aprender. Não
queremos dizer com lazer o ter tempo para si mesmo, embora isso também seja
necessário; não significa pegar um livro e sentar debaixo de uma árvore ou no
próprio quarto, lendo casualmente. Não significa um estado plácido da mente;
certamente não quer dizer estar à toa ou usar o tempo para sonhar acordado.
Lazer significa uma mente que não está constantemente ocupada com alguma
coisa, com um problema, com algum divertimento, com algum prazer sensorial.
Lazer implica uma mente que tem tempo infinito para observar; observar o que
está acontecendo em volta de nós e o que está acontecendo dentro de nós; ter
lazer para escutar, para ver claramente. Lazer implica liberdade, que geralmente
é traduzida por fazer o que se deseja, que é o que os seres humanos estão
fazendo de qualquer maneira, causando muitos males, infelicidade e confusão.
Lazer implica uma mente quieta, nenhum motivo e, assim, nenhuma direção.
Isso é lazer e é somente nesse estado que a mente pode aprender, não somente
ciência, história, matemática, mas também aprender sobre si mesma; e a pessoa
pode aprender sobre si mesma no relacionamento.
Tudo isso pode ser ensinado nas nossas escolas? Ou é algo sobre o qual você
lê e memoriza ou esquece? Mas quando o professor e o aluno estão envolvidos
em realmente entender a importância do relacionamento, então eles estão
estabelecendo na escola um relacionamento apropriado entre eles. Isso é parte
da educação, mais importante que apenas ensinar os conteúdos acadêmicos.
O relacionamento requer uma grande dose de inteligência. Não pode ser
adquirido nos livros, nem pode ser ensinado. Não é o resultado de vasta
experiência acumulada. Conhecimento não é inteligência. A inteligência pode
usar o conhecimento. O conhecimento pode ser astuto, brilhante e utilitário, mas
isso não é inteligência. A inteligência vem fácil e naturalmente quando toda a
natureza e estrutura do relacionamento é vista. Por isso é que é importante ter
lazer — para que o homem ou a mulher, o professor ou o estudante possam
conversar tranquila e seriamente sobre o seu relacionamento, no qual suas
verdadeiras reações, suscetibilidades e barreiras são vistas, não imaginadas,
não distorcidas para agradar ao outro ou reprimidas para apaziguar o outro.
Certamente essa é a função de uma escola: ajudar o estudante a despertar sua
inteligência e aprender a grande importância do relacionamento correto.
CARTA 4
O medo destrói a sensibilidade
15 de outubro de 1978
Parece que a maioria das pessoas desperdiça uma grande quantidade de tempo
em discutir a clareza apenas verbalmente, e elas não parecem compreender a
profundidade e o conteúdo além da palavra. Na tentativa de buscar a clareza
verbal, muitas vezes tornam suas mentes mecânicas, suas vidas superficiais e
frequentemente contraditórias. Nessas cartas não estamos interessados na
compreensão verbal, mas nos fatos diários de nossas vidas. Esse é o fato central
de todas estas cartas; não a explicação verbal do fato, mas o fato mesmo.
Quando estamos preocupados com clareza verbal e, portanto, com a clareza das
idéias, nossa vida diária é conceitual e não factual. Todas as teorias, os
princípios, os ideais são conceituais. Conceitos podem ser desonestos,
hipócritas e ilusórios. A pessoa pode ter inúmeros conceitos ou ideais, mas eles
não têm nada a ver com os acontecimentos de nossa vida. As pessoas são
alimentadas pelos ideais: quanto mais fantasiosos eles são, mais são
considerados nobres. Mas, novamente, o entendimento dos eventos diários é,
de longe, mais importante que os ideais. Se a mente da pessoa está abarrotada
com conceitos, ideais, etc., o fato — o acontecimento presente — nunca pode
ser encarado. Os conceitos tornam-se bloqueios. Quando tudo isso está
claramente entendido — não um entendimento intelectual, conceitual —, a
grande importância de encarar um fato, o presente, o agora, torna-se o fator
central de nossa educação.
A política é um tipo de doença universal baseada em conceitos, e a religião é
romântica, uma emoção imaginária. Quando você observa o que está realmente
acontecendo, tudo isso é um indicativo de pensamento conceitual e uma fuga da
confusão, sofrimento e miséria da nossa vida diária.
A bondade não pode florescer no campo do medo. Nesse campo há muitas
variedades de medo: o medo imediato e o medo de muitos amanhãs. O medo
não é um conceito, mas a explicação do medo é conceitual e essas explicações
variam de um sábio para outro, ou de um intelectual para outro. A explicação não
é importante, mas sim o que é estar realmente diante do medo.
Em todas as nossas escolas, o educador e aqueles responsáveis pelos
estudantes, estejam na sala de aula, no campo de esportes ou nos seus quartos,
têm a responsabilidade de cuidar para que aquele medo, em qualquer forma,
não surja. O educador não deve despertar medo no estudante. Isso não é
conceitual, porque o educador por si mesmo compreende, não apenas
verbalmente, que qualquer forma de medo mutila e deforma a mente, destrói a
sensibilidade, retrai os sentidos. O medo é o fardo pesado que o homem tem
carregado sempre. A partir desse medo surgem várias espécies de superstição
— religiosa, científica e imaginária. A pessoa vive em um mundo de faz-de-conta,
e a essência do mundo conceitual nasce do medo.
Dissemos anteriormente que o homem não pode viver fora dos relacionamentos,
e relacionamento não é apenas na sua vida privada; se ele é um educador, tem
um relacionamento direto com o estudante. Se existe qualquer tipo de medo
nisso, então o professor não tem possibilidade de ajudar o estudante a estar livre
do professor. O estudante vem de um passado de medo, de autoridade, de todo
tipo de fantasias ou verdadeiras impressões e pressões. O educador também
tem suas próprias pressões, medos. Ele não será capaz de produzir a
compreensão da natureza do medo se ele mesmo não descobrir a raiz dos seus
próprios medos. Não é que ele deva primeiramente estar livre de seus próprios
medos a fim de ajudar o estudante a ser livre, mas que, no seu relacionamento
do dia-a-dia, em conversa, na classe, o professor mostre que ele mesmo está
com medo, assim como o estudante também, e assim, juntos, eles podem
explorar a total natureza e estrutura do medo. Deve ser apontado que isto não é
uma confissão da parte do professor. Ele está apenas expondo um fato sem
nenhuma ênfase emocional, pessoal. É como ter uma conversa entre bons
amigos. Isso requer uma certa honestidade e humildade. Humildade não é
servilismo. Humildade não é senso de derrotismo; a humildade não conhece a
arrogância nem o orgulho. Assim, o professor tem uma tremenda
responsabilidade, pois essa é a maior de todas as profissões. Ele está
produzindo uma nova geração no mundo, o que, novamente, é um fato e não um
conceito. Você pode fazer um conceito de um fato e, assim, ficar perdido em
conceitos, mas o fato sempre permanece. Estar diante do fato, do agora, do
medo é a mais alta função do educador — não produzir apenas excelência
acadêmica, mas, o que é de longe mais importante, a liberdade psicológica do
estudante e de si mesmo.
Quando a natureza da liberdade é entendida, então você elimina toda
competição, no campo de esportes, na sala de aula. É possível eliminar
totalmente as avaliações comparativas, tanto no campo acadêmico como no
ético? É possível ajudar o estudante à não pensar competitivamente no campo
acadêmico e, ainda assim, ter excelência nos estudos, em suas ações e em sua
vida diária? Por favor, tenham em mente que estamos interessados no
florescimento da bondade — que não tem possibilidade de florescer onde há
qualquer tipo de competitividade. Competição existe somente onde há
comparação, e comparação não produz excelência. Essas escolas existem
fundamentalmente para ajudar a ambos, o estudante e o professor, a
florescerem em bondade. Isso requer excelência no comportamento, na ação e
no relacionamento. Esta é a nossa intenção e o porquê dessas escolas terem
sido criadas; não para produzir meros carreiristas, mas sim para promover a
excelência do espírito.
Na nossa próxima carta continuaremos com a natureza do medo; não a palavra
medo, mas o medo mesmo, o fato real.
CARTA 5
Nós aceitamos a guerra como
um meio de vida
1º de novembro de 1978
O conhecimento não levará à inteligência. Acumulamos grande quantidade de
conhecimento sobre muitas coisas, mas agir inteligentemente a respeito do que
temos aprendido parece quase impossível. Escolas, faculdades e universidades
cultivam o conhecimento a respeito do nosso comportamento, do universo, da
ciência e de todo tipo de informação tecnológica. Raramente esses centros de
educação ajudam o ser humano a viver no dia-a-dia uma vida de excelência. Os
eruditos afirmam que os seres humanos só podem se desenvolver através da
vasta acumulação de informação e conhecimento. O ser humano tem passado
por milhares e milhares de guerras; tem acumulado uma grande quantidade de
conhecimento sobre como matar, mesmo que esse próprio conhecimento o
impeça de pôr um fim a todas as guerras. Aceitamos a guerra como um modo
de vida e aceitamos todas as brutalidades, violência e a matança como o curso
normal de nossa vida. Sabemos que não devemos matar os outros. Esse
conhecimento é totalmente irrelevante ao fato de matar. O conhecimento não
nos impede de matar os animais e a terra. O conhecimento não pode funcionar
através da inteligência, mas a inteligência pode funcionar com o conhecimento.
Saber é não saber e a compreensão desse fato — que o conhecimento nunca
pode resolver os nossos problemas — é inteligência.
A educação nas nossas escolas não é somente a aquisição de conhecimento,
mas, o que é muito mais importante, o acordar da inteligência que utilizará o
conhecimento. Nunca é o inverso. O acordar da inteligência é o que nos
interessa em todas essas escolas, e então a questão inevitável surge: como a
inteligência pode ser acordada? Qual é o sistema, o método, a prática? Essa
mesma questão implica que a pessoa está ainda funcionando no campo do
conhecimento. Perceber que essa é uma questão errada é o começo do
despertar da inteligência. A prática, o método, o sistema na nossa vida diária
acaba levando à rotina, a uma ação repetitiva e, portanto, a uma mente
mecânica. O contínuo movimento do conhecimento, mesmo que especializado,
coloca a mente em um trilho, em um modo de vida limitado. Aprender a observar
e compreender essa estrutura total do conhecimento é começar a acordar a
inteligência.
Nossas mentes vivem na tradição. O próprio significado dessa palavra —
transmitir como legado — nega a inteligência. É fácil e confortável seguir a
tradição, seja ela política, religiosa ou uma tradição inventada pela própria
pessoa. Então, não se tem que pensar ou questionar isso; é parte da tradição
aceitar e obedecer. Quanto mais antiga a cultura, mais a mente está presa no
passado, mais vive no passado. A quebra de uma tradição inevitavelmente será
seguida pela imposição de outra. A mente, que tem por trás de si muitos séculos
de uma tradição particular, recusa-se a abandonar o velho e aceita isso
unicamente quando há outra tradição igualmente gratificante e segura. A
tradição, em suas várias formas — da religiosa à acadêmica —, obrigatoriamente
nega a inteligência. A inteligência é infinita. O conhecimento, mesmo que vasto,
é finito como a tradição. Nas nossas escolas o mecanismo de formação de
hábitos da mente deve necessariamente ser observado e, nessa observação,
nasce o amadurecimento da inteligência.
Faz parte da tradição humana aceitar o medo. Vivemos com medo, tanto a
geração mais velha quanto a mais nova. A maioria de nós não se dá conta de
que vive no medo. Somente ficamos conscientes desse medo permanente
quando estamos passando por uma forma suave de crise ou estamos diante de
um incidente destrutivo. Ele está lá. Alguns estão conscientes dele, outros o
evitam.
A tradição diz: controle o medo, fuja dele, reprima-o, analise-o, aja sobre ele, ou
aceite-o. Por milênios temos vivido com o medo e, de alguma forma, arranjamos
um jeito de continuar com ele. Essa é a natureza da tradição — agir sobre o
medo ou escapar dele; ou sentimentalmente aceitá-lo e procurar um agente
externo para resolvê-lo. As religiões brotam desse medo, e a ânsia que compele
os políticos para o poder nasce a partir desse medo. Qualquer forma de
dominação sobre o outro é da natureza do medo. Quando um homem ou uma
mulher possui um ao outro, é o medo que está por trás — e esse medo destrói
qualquer forma de relacionamento.
É função do educador ajudar os estudantes a encarar esse medo, seja ele o
medo dos pais, do professor, ou do menino mais velho, ou o medo de estar
sozinho e o medo da natureza. Essa é a questão central para o entendimento da
natureza e estrutura do medo — encará-lo. Encarar o medo não através de uma
cortina de palavras, mas observar o próprio acontecer do medo sem qualquer
movimento para fugir dele. A fuga do fato é camuflar o fato. Nossa tradição,
nossa educação encoraja o controle, a aceitação ou a negação ou a
racionalização bem hábil. Como professor, você pode ajudar o estudante e,
assim, a você mesmo a encarar cada problema que surge na vida? No aprender,
não existe nem o professor nem quem é ensinado; só há aprender. Para
aprender sobre todo o movimento do medo, a pessoa deve necessariamente
abordá-lo com uma certa curiosidade que tem a sua vitalidade própria. Como
uma criança que é muito curiosa, nessa curiosidade há intensidade. É o caminho
da tradição conquistar o que não entendemos, subjugá-lo, esmagá-lo; ou adorá-
lo. A tradição é o conhecimento e o terminar do conhecimento é o nascer da
inteligência.
Agora, percebendo que não existe nem o professor nem o aluno, mas apenas o
ato de aprender da parte do adulto e do estudante, podemos, através da
percepção direta do que está acontecendo, aprender o que é esse medo e tudo
sobre ele? Você pode, se permitir que o medo conte a sua antiga história. Escute
isso atentamente sem interferência, pois o que lhe está sendo contado é a
história de seu próprio medo. Quando você escuta assim, descobrirá que esse
medo não está separado de você. Você é esse próprio medo, a reação própria
com uma palavra associada a ela. A palavra não é importante. A palavra é o
conhecimento, a tradição; mas o real, o agora que está acontecendo, é algo
totalmente novo. É a descoberta do novo no seu próprio medo. Estar diante do
medo sem nenhum movimento do pensamento é o terminar do medo. Não um
medo particular, mas é a própria raiz do medo que é desintegrada nessa
observação. Não há observador, só observação.
O medo é um assunto muito complexo, tão antigo como as colinas, tão antigo
quanto a humanidade e ele tem uma extraordinária história para contar. Mas
você deve saber a arte de escutá-lo, e existe uma grande beleza nesse escutar.
Existe somente o escutar; a história não existe.
CARTA 6
A ilusão de que somos seres
humanos separados
15 de novembro de 1978
A palavra responsabilidade deve ser entendida em todo o seu significado. Ela
vem de responder, não responder parcialmente, mas totalmente. A palavra
também implica uma referência ao passado, responder de acordo com o seu
background, que significa reagir segundo seu condicionamento. Como é
geralmente entendida, a responsabilidade é a ação vinda do condicionamento
humano da pessoa. A cultura, a sociedade na qual a pessoa vive, naturalmente
condiciona a mente, quer seja essa cultura local ou estrangeira. A partir desse
background a pessoa responde e essa resposta limita a nossa responsabilidade.
Se a pessoa nasce na Índia, Europa, América ou onde quer que seja, a sua
resposta será de acordo com a superstição religiosa — todas as religiões são
estruturas supersticiosas — ou de acordo com o nacionalismo ou com as teorias
científicas. Tudo isso, que é sempre limitado e finito, condiciona a resposta das
pessoas. E, portanto, há sempre contradição, conflito e o aparecimento da
confusão. Isto é inevitável e produz divisão entre os seres humanos. A divisão,
em qualquer forma, deve necessariamente produzir não somente conflito e
violência, mas, por fim, a guerra.
Se a pessoa compreende o real significado da palavra responsabilidade e o que
acontece no mundo de hoje, ela vê que essa responsabilidade tem se tornado
irresponsável. Na compreensão do que é irresponsabilidade, nós começamos a
compreender o que é responsabilidade. Responsabilidade é pelo todo, como a
palavra implica, não para cada um, não para com a sua família, não para com
alguns conceitos ou crenças, mas pelo todo da humanidade.
Nossas várias culturas têm enfatizado a separatividade, chamada
individualismo, que tem resultado em cada um fazendo o que deseja ou estando
comprometido com seu próprio talento particular e pequeno, por mais vantajoso
que esse talento possa ser para a sociedade. Isso não significa o que os
totalitários querem que se acredite, que somente o Estado e as autoridades que
o representam sejam importantes, e não os seres humanos. O Estado é um
conceito, mas um ser humano, mesmo que viva nele, não é um conceito. O medo
é uma realidade, não um conceito.
Psicologicamente, um ser humano é a humanidade toda. Ele não só a
representa, como é o todo da espécie humana. Ele é, essencialmente, a psique
inteira da humanidade. Sobre essa realidade várias culturas têm imposto a ilusão
de que cada ser humano é diferente. Nessa ilusão a humanidade tem estado
presa por séculos, e essa ilusão tem se tornado uma realidade. Se a pessoa
observar intimamente toda a estrutura psicológica de si mesma, ela irá descobrir
que, do jeito que ela sofre, toda a humanidade sofre em diversos graus. Se você
está sozinho, a humanidade toda conhece essa solidão. A agonia, o ciúme, a
inveja e o medo são conhecidos por todos. Portanto, psicologicamente, um ser
humano é como o outro. Pode haver diferenças físicas, biológicas. Um é alto ou
baixo e assim por diante, mas, basicamente, um ser humano é o representante
de toda a humanidade. Portanto, psicologicamente, você é o mundo; você é
responsável por toda a humanidade, não por você como um ser humano
separado, que é uma ilusão psicológica. Como representante de toda a raça
humana, sua resposta é total, não é parcial. Portanto, a responsabilidade tem
um significado totalmente diferente. Nós temos que aprender a arte dessa
responsabilidade. Se compreendermos o significado completo de que nós
psicologicamente somos o mundo, então a responsabilidade se torna um
poderoso amor. Então nós iremos cuidar da criança, não apenas na idade tenra,
mas cuidar que ela compreenda o significado da responsabilidade por toda a sua
vida. Essa arte inclui o comportamento, as nossas maneiras de pensar e a
importância da ação correta. Nessas nossas escolas a responsabilidade para
com a terra, a natureza e para com os outros é parte da nossa educação — não
meramente a ênfase nos assuntos acadêmicos, ainda que eles sejam
necessários.
Então podemos perguntar o que o professor está ensinando e o que o aluno está
recebendo e, mais amplamente, perguntar o que é aprender. Qual é a função do
educador? É meramente ensinar álgebra ou física, ou é despertar no estudante
— e, portanto, nele mesmo — este enorme senso de responsabilidade? Podem
os dois estar juntos? Ou seja, os assuntos acadêmicos que ajudarão numa
carreira e essa responsabilidade por toda a humanidade e a vida. Ou eles devem
ser mantidos separados? Se eles estão separados, então haverá contradição na
sua vida; o estudante se tornará um hipócrita e, inconsciente ou
deliberadamente, manterá sua vida em dois compartimentos definidos. A
humanidade vive nessa divisão. Em casa a pessoa é de um jeito, e na fábrica ou
no escritório assume uma face diferente. Nós temos perguntado se os dois
podem se mover juntos. É possível? Quando uma questão desse tipo é colocada,
a pessoa deve investigar as implicações dessa questão, e não se é ou não
possível. Portanto, é da maior importância como você aborda essa questão. Se
você a aborda a partir do seu background limitado — e todo condicionamento é
limitado — então será uma compreensão parcial das implicações de tudo isto.
Você deve necessariamente se aproximar dessa questão de forma nova. Então
você descobrirá a futilidade da própria questão porque, assim que você a aborda
de forma nova, você verá que esses dois se encontram, como dois córregos
formando um rio formidável, que é a sua vida, sua vida diária de total
responsabilidade.
É isso o que você está ensinando, dando-se conta que o professor tem a maior
de todas as profissões? Essas não são meras palavras, mas uma sólida
realidade, que não pode ser desprezada. Se você não sente a verdade disso,
então você realmente deve ter outra profissão. Então, você viverá nas ilusões
que a humanidade tem criado para si mesma.
Portanto, nós podemos indagar novamente: o que você está ensinando e o que
o aluno está aprendendo? Você está criando essa peculiar atmosfera na qual o
real aprendizado acontece? Se você entendeu a imensidão da responsabilidade
e a sua beleza, então você é totalmente responsável pelo estudante — o que ele
usa, o que ele come, a sua maneira de falar e assim por diante.
Dessa questão surge outra: o que é aprender? A maioria de nós provavelmente
nunca faz essa pergunta ou, se a faz, responde a partir da tradição, que é
conhecimento acumulado, um conhecimento que funciona com ou sem
habilidade para ganhar a nossa vida diária. Isso é o que temos ensinado, é para
isso que existem todas as escolas comuns, as universidades, etc. O
conhecimento predomina, o que é um dos nossos maiores condicionamentos e,
portanto, o cérebro nunca está livre do conhecido. É sempre uma adição ao que
já é conhecido e, assim, o cérebro nunca é livre para descobrir um modo de vida
que pode não estar baseado de modo algum no conhecido. O conhecido dirige-
se para uma trilha larga ou estreita e a pessoa fica nessa trilha pensando que há
segurança nela. Essa segurança é destruída por esse próprio conhecimento
limitado. Esse tem sido o modo de vida humano até agora.
Assim, há um modo de aprender que não põe a vida dentro de uma rotina, de
um canal estreito? Então, o que é aprender? Devemos ser muito claros sobre as
vias do conhecimento: primeiro adquirir conhecimento e depois atuar a partir
desse conhecimento (tecnológico e psicológico), ou agir e, dessa ação, adquirir
conhecimento? Ambas são aquisições de conhecimento. O conhecimento é
sempre passado. Há um jeito de agir sem o peso enorme do conhecimento
acumulado do homem? Há. Não é aprender como nós o temos conhecido; é pura
observação — observação que não é contínua e que então se torna memória,
mas observação de momento a momento. O observador é a essência do
conhecimento e impõe ao que ele observa o que tem adquirido através da
experiência e das várias formas de reações sensoriais. O observador está
sempre manipulando aquilo que ele observa, e o que ele observa é sempre
reduzido ao conhecimento. Então, ele está sempre preso na velha tradição de
hábitos.
Assim, aprender é observação pura — não somente de coisas exteriores a nós
mesmos, mas também do que está acontecendo dentro; observar sem o
observador.
CARTA 7
Cada ação, cada relacionamento é
um movimento de aprender
1º de dezembro de 1978
Todo movimento da vida é aprender. Nunca há um tempo no qual não exista o
aprender. Toda ação é um movimento de aprender e todo relacionamento é
aprender. A acumulação de conhecimento, que é chamada aprender e com a
qual estamos tão acostumados, é necessária até um certo ponto, mas essa
limitação nos impede de compreendermos a nós mesmos. O conhecimento é
mensurável — mais ou menos conhecimento —, mas no aprender não existe
medida. Isso é realmente muito importante de compreender, especialmente se é
para você perceber o total significado de uma vida religiosa. O conhecimento é
memória e se você tem observado o real, o agora não é memória. Na observação
não há lugar para a memória. O real é o que está de fato acontecendo. O instante
seguinte já é mensurável e esse é o caminho da memória.
Para observar o movimento de um inseto é preciso atenção — isso se você está
interessado em observar o inseto, ou seja lá o que for que lhe interesse.
Novamente, essa atenção não é mensurável. É responsabilidade do educador
entender toda a natureza e estrutura da memória, observar essa limitação e
ajudar o estudante a ver isso. Aprendemos dos livros ou de um professor que
tem muita informação sobre determinado assunto, e nossos cérebros ficam
preenchidos com essa informação. Essa informação é sobre as coisas, sobre a
natureza, sobre tudo que está fora de nós. Quando queremos aprender sobre
nós mesmos, voltamo-nos para os livros que falam disso. Assim, esse processo
continua interminavelmente, e nos tornamos gradualmente seres humanos de
segunda mão. Esse é um fato que se observa por todo o mundo, e essa é a
nossa educação moderna.
O ato de aprender, como assinalamos, é um ato de observação pura e essa
observação não está contida dentro da limitação da memória. Aprendemos a
ganhar a vida, mas nunca vivemos. A capacidade de ganhar a vida toma a maior
parte de nossa vida; dificilmente temos tempo para outras coisas. Encontramos
tempo para falar de futilidades, para nos divertir, para jogar, mas isso tudo não
é viver. Existe um campo — que é o viver real — totalmente negligenciado.
Para aprender a arte de viver devemos ter lazer. A palavra lazer é muito mal
compreendida, como dissemos na nossa terceira carta. Geralmente significa não
estar ocupado com as coisas que temos que fazer — como ganhar a vida, ir ao
escritório, ir à fábrica, etc., e somente quando isso acaba é que há lazer. Durante
o lazer — isso que é chamado de lazer — você quer se divertir, relaxar, quer
fazer as coisas de que realmente gosta ou que exigem sua capacidade máxima.
O seu ganhar a vida — seja lá o que você faça — está em oposição ao que é
tido como lazer. Assim, há sempre esforço, tensão, e a fuga dessa tensão é o
lazer, que é quando você não está sob pressão. Durante esse lazer você pega
um jornal, abre um romance, conversa, joga, etc. Esse é o fato real. Isso é o que
está acontecendo em todo lugar. Ganhar a vida é a negação do viver.
Assim, chegamos à questão: o que é lazer? Lazer, como é entendido, é uma
pausa na pressão de ganhar a subsistência. A pressão de ganhar a vida ou
qualquer pressão que nos é imposta geralmente consideramos como sendo
ausência de lazer, mas existe uma pressão muito maior em nós, consciente ou
inconsciente, que é o desejo — entraremos nisso depois.
A escola é um lugar de lazer. É somente quando você tem lazer que você pode
aprender. Ou seja, aprender só pode acontecer quando não há qualquer tipo de
pressão. Quando você é confrontado com um perigo ou uma cobra, há um tipo
de aprender a partir da pressão do próprio fato do perigo. O aprender sob essa
pressão é o cultivo da memória que lhe ajudará a reconhecer um perigo futuro,
e então se torna uma resposta mecânica.
Lazer implica uma mente que não está ocupada. Só assim existe um estado de
aprender. A escola é um lugar de aprender e não apenas um lugar de acumular
conhecimento. É realmente importante entender isso. Como dissemos, o
conhecimento é necessário e tem seu próprio — e limitado — lugar na vida.
Infelizmente essa limitação tem devorado toda a nossa vida e não temos espaço
para aprender. Estamos tão ocupados com nossa subsistência que isso tira toda
a energia do mecanismo do pensamento, de tal forma que no fim do dia estamos
exaustos e precisamos ser estimulados. Nós nos recuperamos dessa exaustão
através do entretenimento — religioso ou outro qualquer. Essa é a vida dos seres
humanos. Os seres humanos criaram uma sociedade que exige todo o seu
tempo, toda a sua energia, toda a sua vida. Não existe lazer para aprender e
assim a vida se torna mecânica, quase sem sentido. Assim devemos ser bem
claros em relação ao entendimento da palavra lazer — um tempo, um período,
quando a mente não está ocupada com o que quer que seja. É um tempo de
observação. É só uma mente desocupada que pode observar. Uma observação
livre é o movimento de aprender. Isso liberta a mente de ser mecânica.
Assim, será que o professor, o educador, pode ajudar o aluno a entender tudo
que implica a questão de ganhar a vida e toda pressão por trás disso? O
aprender que ajuda você a adquirir um trabalho com todo o medo, a apreensão
do amanhã, a ansiedade que ele provoca. Porque o próprio professor
compreendeu a natureza do lazer e da observação pura — de modo que ganhar
a vida não se torne uma tortura, um grande esforço por toda a vida — ele pode
ajudar o aluno a ter uma mente que não seja mecânica? É responsabilidade total
do professor cultivar o florescimento da bondade numa atmosfera de lazer. Por
essa razão as escolas existem. É responsabilidade do professor criar uma nova
geração para mudar a estrutura social de modo que ganhar a vida deixe de ser
a preocupação exclusiva. Então, ensinar se torna um ato sagrado.
CARTA 8
O sentimento de ser totalmente
responsável pelas nossas ações
15 de dezembro de 1978
Em uma das cartas anteriores falamos que a responsabilidade total é amor. Essa
responsabilidade não é por uma nação particular ou por um determinado grupo,
uma comunidade ou por uma divindade particular, ou por alguma forma de
programa político, ou por seu próprio guru, mas por toda humanidade. Isso
precisa ser compreendido e sentido profundamente; essa é a responsabilidade
do educador. Quase todos nós nos sentimos responsáveis pelas nossas
famílias, crianças e assim por diante, mas não temos o sentimento de estarmos
totalmente interessados e comprometidos com o ambiente ao redor de nós, com
a natureza, ou totalmente responsáveis pelas nossas próprias ações. Esse
cuidado absoluto é amor. Sem esse amor não pode haver nenhuma mudança
na sociedade. Os idealistas, ainda que possam amar seus ideais ou seus
conceitos, não têm produzido uma sociedade radicalmente diferente. Os
revolucionários, os terroristas não têm, de forma alguma, mudado
fundamentalmente o padrão da nossa sociedade. Os revolucionários fisicamente
violentos têm falado sobre liberdade para todos os seres humanos, formando
uma nova sociedade, mas todos os jargões e slogans têm torturado ainda mais
o espírito e a existência. Eles têm distorcido as palavras para ajustá-las ao seu
próprio ponto de vista limitado. Nenhuma forma de violência tem mudado a
sociedade no seu sentido mais fundamental. Grandes governantes, através da
autoridade de uns poucos, têm produzido algum tipo de ordem na sociedade.
Mesmo os totalitários têm superficialmente estabelecido uma aparência de
ordem através da violência e da tortura. Nós não estamos falando sobre esse
tipo de ordem na sociedade.
Estamos dizendo definitivamente e o mais enfaticamente possível que é
somente a total responsabilidade por toda humanidade — que é amor — que
pode transformar profundamente o estado atual da sociedade. Qualquer que
seja o sistema existente nas várias partes do mundo, ele é corrupto, degenerado
e completamente imoral. Você tem apenas que olhar ao seu redor para ver esse
fato. Milhões e milhões são gastos com armamentos por todo o mundo e todos
os políticos falam de paz enquanto preparam a guerra. As religiões têm
declarado repetidamente a santidade da paz, mas elas mesmas têm incentivado
guerras e formas sutis de violência e tortura. Existem inumeráveis divisões e
seitas com seus sacerdotes, rituais e todo esse disparate que continua em nome
de Deus e da religião. Onde há divisão necessariamente há desordem, briga,
conflito — quer seja religioso, político ou econômico. Nossa sociedade moderna
é baseada na avidez, na inveja e no poder. Quando você considera isso tudo
como realmente é — esse comercialismo esmagador —, percebe que tudo isso
indica degeneração e imoralidade básica. Mudar radicalmente o padrão da
nossa vida, que é a base de toda sociedade, é a responsabilidade do educador.
Nós estamos destruindo a terra e todas as coisas que estão nela estão sendo
destruídas para nossa gratificação.
A educação não e meramente o ensino de várias matérias acadêmicas, mas o
cultivo da total responsabilidade no estudante. Não nos damos conta, como
educadores, que estamos formando uma nova geração. A maioria das escolas
está somente Interessada em transmitir conhecimento. Não estão, de jeito
nenhum, interessadas na transformação do homem e de sua vida diária, e você
— o educador nas nossas escolas — precisa ter esse profundo interesse e o
zelo por essa responsabilidade total.
Então, de que maneira você pode ajudar o estudante a sentir essa qualidade de
amor com toda a sua excelência? Se você não sente isso profundamente em si
mesmo, é sem sentido falar sobre responsabilidade. Como um educador, você
pode sentir a verdade disso?
Ver a verdade disso produzirá naturalmente esse amor e a total
responsabilidade. Você tem que ponderar sobre isso, observar isso diariamente
na sua vida, nas suas relações com sua esposa, seus amigos, seus alunos. E
no seu relacionamento com os estudantes você falará sobre isso a partir do seu
coração — não buscando meramente a clareza verbal. O sentimento por essa
realidade é o maior presente que o homem pode ter e, uma vez que ele esteja
vivo, você descobrirá a palavra apropriada, a ação certa e o comportamento
correto. Quando você leva em conta o estudante, verá que ele vem a você
totalmente despreparado para tudo isso. Ele vem a você assustado, nervoso,
ansioso para agradar ou na defensiva; vem condicionado por seus pais e pela
sociedade na qual ele tem vivido os seus poucos anos. Você tem que ver esse
passado dele; você tem que estar interessado no que ele realmente é, e não
impor sobre ele suas opiniões próprias, julgamentos e conclusões. Ao considerar
o que ele é se revelará o que você é; portanto, você descobrirá que o estudante
é você.
Agora, será que você, ensinando matemática, física etc. — matérias que o aluno
deve saber por ser o jeito de ganhar a subsistência —, pode transmitir ao aluno
que ele é responsável pelo todo da humanidade? Ainda que ele possa estar
trabalhando por sua própria carreira, seu próprio modo de vida, isso não fará sua
mente estreita. Ele verá o perigo da especialização com todas suas limitações e
sua peculiar brutalidade. Você tem que ajudá-lo a ver tudo isso. O florescimento
da bondade não se encontra em saber matemática e biologia ou em passar nos
exames e ter uma carreira bem sucedida. Ele existe fora disso e, quando existe
esse florescimento, a carreira e as outras atividades necessárias são tocadas
por sua beleza. Agora, nós colocamos a ênfase na pessoa e desconsideramos
inteiramente o florescimento. Nas nossas escolas estamos tentando juntar esses
dois aspectos, não artificialmente, não como um princípio ou padrão que vocês
estão seguindo, mas porque vocês estão vendo a verdade absoluta de que esses
aspectos devem fluir juntos para a regeneração do homem.
Você pode fazer isso? — não porque você concorda em fazê-lo após conversar
sobre isso e chegar a alguma conclusão, mas sim por ver com o olhar interior a
extraordinária gravidade da questão; ver por você mesmo. Então o que você fala
terá significado. Então você se torna um centro de luz não aceso pelo outro.
Como você é a totalidade da humanidade — o que é uma realidade, não uma
afirmação verbal —, você é completamente responsável pelo futuro do homem.
Por favor, não considere isso como um dever. Se você o faz, esse dever é um
monte de palavras sem nenhuma realidade. É uma ilusão. Essa
responsabilidade tem sua própria alegria, seu próprio humor, seu próprio
movimento sem o peso do pensamento.
CARTA 9
A constante preocupação consigo
mesmo é negligência
1º de janeiro de 1979
Parece que, como estamos interessados em educação, há dois fatores que
precisamos ter em mente o tempo todo. Um é a diligência e o outro é a
negligência. A maioria das religiões tem falado sobre a atividade da mente, para
ser controlada, moldada pela vontade de Deus ou por algum agente externo; e
a devoção a alguma divindade, feita pela mão ou pela mente, necessita de uma
peculiar qualidade de atenção na qual a emoção, o sentimento e a imaginação
romântica estão envolvidos. Essa é a atividade da mente que é o pensamento.
A palavra diligência implica cuidado, vigilância, observação e um profundo senso
de liberdade. A devoção a um objeto, a uma pessoa ou a um princípio nega essa
liberdade. Diligência é a atenção que produz naturalmente cuidado infinito,
interesse e o frescor da afeição. Tudo isso exige grande sensibilidade. Nós
somos sensíveis aos nossos próprios desejos ou às nossas feridas psicológicas,
ou somos sensíveis a uma pessoa particular, vendo seus desejos e respondendo
rapidamente às suas necessidades; mas esse tipo de sensibilidade é muito
limitada e dificilmente pode ser chamada de sensibilidade. A qualidade de
sensibilidade que estamos falando acontece naturalmente quando há a
responsabilidade total que é amor. A diligência tem essa qualidade.
A negligência é indiferença, preguiça; indiferença para com o organismo físico,
para com o estado psicológico e indiferença para com os outros. Na indiferença
existe insensibilidade. Nesse estágio a mente se torna preguiçosa, a atividade
do pensamento se retarda, a rapidez da percepção é negada e a sensibilidade é
uma coisa que fica incompreensível. A maioria de nós é às vezes diligente, mas
muito mais frequentemente negligente. As duas não são opostas realmente. Se
o fossem, a diligência ainda seria parte da negligência e, portanto, não seria
verdadeiramente diligência.
A maioria das pessoas é diligente em relação aos seus próprios interesses
pessoais, quer esse interesse pessoal seja identificado com a família, com um
grupo particular, uma seita ou nação. Nesse interesse próprio existe o germe da
negligência, embora haja uma constante preocupação consigo mesmo. Essa
preocupação é limitada e, portanto, ela é negligência. Essa preocupação é
energia contida dentro de limites estreitos. A diligência é a libertação da
ocupação pessoal e traz uma abundância de energia. Quando a pessoa
compreende a natureza da negligência, a diligência passa a existir sem qualquer
esforço. Quando isso é inteiramente compreendido — não apenas a definição
verbal da negligência e da diligência —, então a mais alta excelência em nosso
pensamento, ação e comportamento se manifestará. Mas, infelizmente, nunca
exigimos de nós mesmos a mais alta qualidade de pensamento, ação e
comportamento. Nós quase nunca desafiamos a nós mesmos e se
eventualmente o fazemos, temos várias desculpas para não responder
inteiramente. Isso indica uma indolência da mente, uma fraca atividade do
pensamento, não é mesmo? O corpo pode estar preguiçoso, mas nunca a mente
com sua rapidez de pensamento e sutileza. A preguiça do corpo pode ser
facilmente entendida. Essa preguiça pode existir porque a pessoa está
trabalhando excessivamente ou por causa de indulgência excessiva ou tem feito
esporte muito puxado. Assim, o corpo requer repouso, o que pode ser
considerado preguiça, embora não o seja. A mente vigilante, estando alerta,
sensível, sabe quando o organismo precisa de repouso e cuidado.
Nas nossas escolas é importante entender que a qualidade de energia que é
diligência requer o tipo de comida adequada, o tipo de exercício adequado e
sono suficiente. O hábito, a rotina é o inimigo da diligência — o hábito do
pensamento, da ação, da conduta. O pensamento em si mesmo cria seu próprio
padrão e vive dentro dele. Quando esse padrão é desafiado, ou ele é
desconsiderado ou o pensamento cria um outro padrão de segurança. Esse é o
movimento do pensamento — de um padrão a outro, de uma conclusão, uma
crença a outra. Essa é a própria negligência do pensamento. A mente que é
diligente não tem hábito, não há padrão de resposta. É um movimento sem fim,
nunca se enredando nos hábitos, nunca se prendendo a conclusões. O
movimento tem grande profundidade e volume quando não há o limite produzido
pela negligência do pensamento.
Como nós estamos agora interessados em educação, de que maneira pode o
professor transmitir essa diligência com sua sensibilidade, com seu cuidado
abundante no qual a preguiça de espírito não tem lugar? É claro que está
entendido que o educador está interessado nessa questão e vê a importância da
diligência ao longo dos dias de sua vida. Se ele está interessado, então como
ele começará a cultivar essa flor da diligência? Ele está profundamente
interessado no estudante? Ele realmente toma a total responsabilidade por
essas pessoas jovens que estão em seu encargo? Ou ele está lá meramente
para ganhar sua subsistência, preso na miséria do ter pouco? Como nós
apontamos nas cartas anteriores, ensinar é a mais alta capacidade do homem.
Você está lá e você tem os estudantes diante de você. Você é indiferente? Será
que os seus problemas pessoais, em casa, estão desperdiçando a sua energia?
Carregar problemas psicológicos de um dia para o outro é um desperdício total
de tempo e energia, indicando negligência. Uma mente diligente encara o
problema assim que ele surge, observa a natureza dele e o resolve
imediatamente. Arrastar um problema psicológico não resolve o problema. É um
desperdício de energia e do espírito. Quando você soluciona o problema assim
que ele surge, então irá descobrir que não existe problema realmente.
Assim devemos voltar à questão: como um educador nessas ou em qualquer
outra escola, você pode cultivar essa diligência? É somente nisso que o
florescimento da bondade passa a existir. É sua responsabilidade total e
irrevogável — e nela está esse amor que naturalmente vai encontrar um jeito de
ajudar o estudante.
CARTA 10
Uma seriedade onde existe
liberdade e felicidade
15 de janeiro de 1979
É importante que o professor se sinta seguro nessas escolas tanto do ponto de
vista econômico quanto psicológico. Alguns professores podem estar dispostos
a ensinar sem muita preocupação com sua posição econômica; eles podem ter
vindo pelos ensinamentos e por razões psicológicas, mas cada professor deveria
se sentir seguro no sentido de se sentir em casa, de se sentir cuidado, sem
preocupações financeiras. Se o próprio professor não se sente seguro e,
portanto, não se sente livre para dar atenção ao estudante e à sua segurança,
ele não será capaz de ser totalmente responsável. Se o professor, em si mesmo,
não está feliz, sua atenção ficará dividida e ele será incapaz de exercitar toda
sua capacidade.
Assim, torna-se importante que escolhamos os professores corretos, convidando
cada um deles para passar algum tempo em nossas escolas, para descobrir se
ele ou ela pode alegremente se juntar ao que está sendo feito. Isso deve ser
mútuo. Então o professor, estando feliz, seguro, sentindo que está em casa,
pode criar no estudante essa qualidade de segurança, esse sentimento que a
escola é o seu lar.
Sentir-se em casa implica que não há sentimento de medo, que ele está
protegido fisicamente, sendo cuidado, que está livre, não é? A proteção, mesmo
que o estudante possa ter objeção à idéia de ser protegido, resguardado, não
significa que ele está encerrado em uma prisão, confinado e observado
criticamente. A liberdade, obviamente, não significa fazer o que se quer, e é
igualmente óbvio que não se pode nunca fazer totalmente o que se quer. A
tentativa de fazer o que se quer — a chamada liberdade individual, que é
escolher um curso de ação de acordo com o próprio desejo — trouxe confusão
social e econômica no mundo. A reação a essa confusão e o totalitarismo.
A liberdade é um negócio muito complexo. Devemos abordá-la com atenção
total, pois a liberdade não é o oposto da servidão, ou um escape das
circunstâncias em que estamos presos. Não é liberdade de algo ou evitar o
constrangimento. A liberdade não tem oposto; ela existe por si mesma. O próprio
entendimento da natureza da liberdade é o despertar da inteligência. Não é um
ajustamento ao que é, mas o entendimento do que é e, assim, ir além dele. Se
o professor não entender a natureza da liberdade, ele apenas irá impor aos
estudantes os seus preconceitos, suas limitações, suas conclusões. Dessa
forma, o estudante naturalmente irá resistir ou aceitar através do medo,
tornando-se um ser humano convencional, seja tímido ou agressivo. É somente
no entendimento dessa liberdade de viver — não a idéia dela ou a aceitação
verbal dela, que se torna um slogan — que a mente é livre para aprender.
Uma escola, afinal de contas, é um lugar onde o estudante está basicamente
feliz, não está intimidado, ameaçado pelos exames, não está compelido a agir
de acordo com um padrão, um sistema. É um lugar onde a arte de aprender está
sendo ensinada. Se o estudante não é feliz, ele é incapaz de aprender essa arte.
Memorizar, gravar informação é considerado aprendizado. Isso produz uma
mente que é limitada e, portanto, pesadamente condicionada. A arte de aprender
é dar o lugar apropriado à informação, agir com toda habilidade de acordo com
o que foi aprendido, mas, ao mesmo tempo, é não ficar psicologicamente
amarrado pelas limitações do conhecimento e imagens e símbolos que o
pensamento cria. Arte quer dizer colocar tudo em seu lugar apropriado, não de
acordo com algum ideal. Entender o mecanismo dos ideais é aprender a arte da
observação. Um conceito formado pelo pensamento, tanto no futuro quanto de
acordo com o passado, é um ideal — uma idéia projetada ou uma lembrança. É
um jogo de sombras, é fazer uma abstração da realidade. Essa abstração é um
evitar o que está acontecendo agora. Esse escape do fato é infelicidade.
Agora, como professores, podemos ajudar o estudante a ser feliz no sentido
real? Podemos ajudá-lo a se interessar pelo que está realmente acontecendo?
Isso é atenção. O estudante está sendo atento ao observar uma folha que treme
ao sol. Nesse momento, forçá-lo de volta ao livro é desencorajar a atenção;
enquanto ajudá-lo a observar completamente aquela folha o faz ficar desperto,
consciente da profundidade da atenção, na qual não existe distração. Da mesma
forma, porque ele acabou de ver o que implica atenção, ele será capaz de voltar
ao livro ou a seja lá o que esteja sendo ensinado. Nessa atenção não existe
compulsão, nem ajustamento. É a liberdade na qual existe observação total.
Pode o próprio professor ter essa qualidade de atenção? Só assim ele pode
ajudar outra pessoa.
A maioria de nós luta contra as distrações. Não existem distrações. Suponha que
você está sonhando acordado ou que a sua mente está vagando; isso é o que
na realidade está acontecendo. Observe isso. Essa observação é atenção.
Assim, não existe distração.
Isso pode ser ensinado aos estudantes, essa arte pode ser aprendida? Você é
totalmente responsável pelo estudante, você deve criar essa atmosfera de
aprendizagem, uma seriedade na qual existe um senso de liberdade e felicidade.
CARTA 11
Ideais corrompem a mente
1º de fevereiro de 1979
Como já apontamos inúmeras vezes nessas cartas, as escolas existem
principalmente para produzir uma profunda transformação nos seres humanos.
O educador é inteiramente responsável por isso. A menos que o professor
perceba esse fator central, ele estará apenas instruindo o estudante a se tornar
um homem de negócios, um engenheiro, um advogado ou um político. Existem
tantos desses que parecem ser incapazes de transformar tanto a si mesmos
quanto a sociedade em que vivem. Talvez, na atual estrutura da sociedade,
advogados e homens de negócios possam ser necessários, mas quando essas
escolas surgiram, a intenção era — e continua sendo — transformar o homem
profundamente. Os professores nessas escolas deveriam realmente entender
isso, não intelectualmente, não como uma idéia, mas porque eles vêem, com o
seu ser inteiro, toda a implicação disso. Estamos interessados no
desenvolvimento total do ser humano, não apenas na acumulação de
conhecimento.
Idéias e ideais são uma coisa, e o fato, o acontecimento real, outra coisa. Os
dois nunca podem ocorrer juntos. Os ideais têm sido impostos sobre os fatos e
distorcem o que está acontecendo para ajustar ao que deveria ser, o ideal. A
utopia é uma conclusão tirada do que está acontecendo e sacrifica o que é real
para ajustar ao que tem sido idealizado. Esse tem sido o processo por milênios
e cada estudante e todos os intelectuais deleitam-se em idealizações. Evitar o
que é, é o início da corrupção da mente. Essa corrupção impregna todas as
religiões, a política e a educação, todos os relacionamentos humanos. O
entendimento desse processo de evitação e ir além dele é o nosso interesse.
Os ideais corrompem a mente: eles nascem de idéias, julgamentos e esperança.
Idéias são abstrações do que é, e qualquer idéia ou conclusão sobre o que está
realmente acontecendo distorce o que esta acontecendo, e assim a corrupção
acontece. Os ideais tiram a atenção do fato, do que é, e assim direcionam a
atenção para o fantasioso. Esse movimento de afastamento do fato leva aos
símbolos, imagens, que então assumem uma importância que nos absorvem
totalmente. Esse movimento para longe do fato é a corrupção da mente. Os
seres humanos são indulgentes com esse movimento nas conversas, em seus
relacionamentos, em quase tudo que eles fazem. O fato é instantaneamente
traduzido em uma idéia ou uma conclusão que então dita as nossas reações.
Quando algo é visto, o pensamento imediatamente faz uma cópia e ela se torna
o real. Você vê um cachorro e o pensamento torna isso em seja lá que imagem
você possa ter sobre cachorros, e assim você nunca vê o cachorro.
Isso pode ser ensinado aos estudantes: a permanecerem com o fato, com o que
realmente está acontecendo na hora, seja psicologicamente, seja
externamente? O conhecimento não é o fato; é a respeito do fato, e isso tem o
seu lugar próprio, mas o conhecimento impede a percepção do que realmente é;
então a corrupção acontece.
É realmente muito importante entender isso. Ideais são considerados nobres,
são exaltados, de grande e importante significado, e o que está realmente
acontecendo é considerado algo meramente sensorial, mundano e de menor
valor. As escolas por todo mundo têm algum propósito elevado, algum ideal;
assim elas estão educando os estudantes em corrupção.
O que corrompe a mente? Estamos usando a palavra mente englobando os
sentidos, a capacidade de sentir, e o cérebro que armazena todas as memórias
e experiências como conhecimento. Esse movimento total é a mente. O
consciente, tanto quanto o inconsciente, é a chamada superconsciência — a
totalidade disso é a mente. Estamos perguntando quais são os fatores, as
sementes da corrupção em tudo isso? Dissemos que ideais corrompem. O
conhecimento também corrompe a mente. O conhecimento, particular ou
generalizado, é o movimento do passado, e quando o passado obscurece o
presente, a corrupção acontece. O conhecimento, projetado no futuro e
direcionado ao que esta acontecendo agora, é corrupção. Estamos usando a
palavra corrupção querendo dizer isso que está fragmentado; dividido, aquilo
que não é tomado como um todo. O fato nunca pode ser fragmentado; o fato
nunca pode ser limitado pelo conhecimento. A completude do fato abre a porta
ao infinito. A completude não pode ser dividida; não é contraditória em si mesma;
não pode dividir a si mesma. Completude, totalidade, é movimento infinito.
Imitação, ajustamento, é um dos grandes fatores de corrupção da mente; o
exemplo, o herói, o salvador, o guru, é o fator mais destrutivo da corrupção.
Seguir, obedecer, ajustar nega a liberdade. A liberdade está desde o início, não
no fim. Não é ajustar-se, imitar, aceitar primeiro e depois encontrar a liberdade.
Esse é o espírito do totalitarismo, seja do guru ou do sacerdote. Essa é a
crueldade, a dureza do ditador, da autoridade, do guru ou do sacerdote mais
elevado.
Assim, autoridade é corrupção. Autoridade é a fragmentação da integridade, do
todo, do que é completo — a autoridade de um professor em uma escola, a
autoridade de um propósito, de um ideal, daquele que diz “Eu sei”, a autoridade
de uma instituição. A pressão da autoridade em qualquer forma é o fator
deformante da corrupção. Autoridade basicamente nega liberdade. É função de
um verdadeiro professor instruir, apontar, informar, sem a corruptora influência
da autoridade. A autoridade da comparação destrói. Quando um estudante é
comparado com outro, ambos estão sendo feridos. Viver sem comparação é ter
integridade.
Você, professor, fará isso?
CARTA 12
Educação é libertar a mente do eu
15 de fevereiro de 1979
Parece que os seres humanos têm uma grande quantidade de energia. Eles já
estiveram na lua, já escalaram os picos mais altos da terra, eles têm uma energia
prodigiosa para a guerra, para fazer os instrumentos de guerra, uma grande
energia para os avanços tecnológicos, para acumular o vasto conhecimento que
o ser humano tem reunido, para trabalhar todo dia, energia para construir
pirâmides e para explorar o átomo. Quando se considera tudo isso é
impressionante perceber a energia que o homem tem despendido. Essa energia
foi colocada na investigação de coisas externas, mas o homem tem dado muito
pouca importância para a investigação de toda estrutura psicológica de si
mesmo. É preciso energia, tanto externamente quanto internamente, para agir
ou para estar totalmente silencioso.
A ação e a não-ação requerem grande energia. Nós temos usado a energia
positivamente em guerras, em escrever livros, em operações cirúrgicas e para
trabalhar dentro do mar. A não-ação requer muito mais ação que a chamada
ação positiva. A ação positiva é controlar, apoiar, escapar. A não-ação é a
atenção total da observação. Nessa observação aquilo que está sendo
observado sofre uma transformação. Essa observação silenciosa exige não
apenas energia física, mas também uma profunda energia psicológica. Nós
estamos acostumados à primeira dessas duas, e esse condicionamento limita a
nossa energia. Em uma observação completa, silenciosa, que é não-ação, não
existe gasto de energia, e assim a energia é ilimitada.
A não-ação não é o oposto da ação. Ir trabalhar diariamente, ano após ano por
tanto tempo, que pode ser necessário do jeito que as coisas estão, limita, mas
não trabalhar não significa que você vai ter energia ilimitada. A própria indolência
da mente é um desperdício de energia, assim como a preguiça do corpo. Nossa
educação, em qualquer campo, restringe essa energia. Nosso modo de viver,
que é uma luta constante para tornar-se algo, ou não, é dissipação da energia.
A energia é fora do tempo e não é para ser medida. Mas nossas ações são
mensuráveis e assim reduzimos essa energia ilimitada ao estreito círculo do eu.
E a tendo confinado, então buscamos o imensurável. Essa busca é parte da ação
positiva e, portanto, é um desperdício da energia psicológica. Assim existe um
movimento sem fim dentro dos arquivos do eu.
Em educação o que nos interessa é libertar a mente do eu. Como dissemos em
inúmeras ocasiões nessas cartas, é nossa função fazer surgir uma nova geração
livre dessa energia limitada — que é chamada o eu. Deve ser mais uma vez
repetido que essas escolas existem para fazer surgir isso,
Na nossa carta anterior, falamos sobre a corrupção da mente. A raiz dessa
corrupção é o eu. O eu é a imagem, a representação, o mundo que é passado
de geração em geração, e a pessoa tem de lutar contra esse peso da tradição
do eu. Isso é o fato — não as consequências desse fato ou como o fato chegou
a existir— o que é bem fácil de explicar; mas observar o fato com todas as suas
reações, sem motivo que o distorça, é ação negativa. Isso então transforma o
fato. É importante entender isso bem profundamente; não agir sobre o fato, mas
observar o que é.
Todo ser humano está ferido tanto psicológica quanto fisicamente. É fácil lidar
com a dor física, mas a dor psicológica permanece escondida. A consequência
dessa ferida psicológica é construir um muro em volta de si mesmo, resistir a
outras dores e assim se tornar amedrontado ou se retirar no isolamento. A ferida
foi causada pela imagem do eu com sua energia limitada. Porque a imagem é
limitada, ela pode ser ferida. Aquilo que não é mensurável nunca pode sofrer
dano, nunca pode ser corrompido. Qualquer coisa que é limitada pode ser ferida,
mas aquilo que é inteiro está além do alcance do pensamento.
Pode o educador ajudar o estudante a nunca ser ferido psicologicamente, não
apenas enquanto ele faz parte da escola, mas durante toda a sua vida? Se o
educador vê o grande dano que vem dessa ferida, então como vai educar o
estudante? O que realmente vai fazer para cuidar que o estudante nunca seja
ferido ao longo da sua vida? O estudante vem para a escola já tendo sido ferido.
Provavelmente não se dá conta dessa ferida. O professor, ao observar suas
reações, seus medos e agressividade, vai descobrir o dano que foi feito. Assim
o professor tem dois problemas: libertar o estudante de seus danos passados e
prevenir futuras feridas. É esse o seu interesse? Ou você apenas lê esta carta,
entende intelectualmente — o que não é entendimento de forma alguma — e
assim não está interessado no estudante? Mas se você está interessado, como
deveria estar, o que vai fazer com esse fato — que ele está ferido e que você
tem que, a qualquer custo, prevenir feridas futuras? Como você aborda esse
problema? Qual é o estado da sua mente quando encara esse problema? É
também o seu problema, não é só do estudante. Você está ferido como também
o estudante está ferido. Assim, os dois estão envolvidos. Não é um problema
unilateral; você está tão envolvido quanto o estudante. Esse envolvimento é o
fator central com que você tem de se defrontar, observar. Apenas ter o desejo
de ser livre das suas feridas passadas e esperar nunca mais ser ferido de novo
é um desperdício de energia. A atenção completa, a observação desse fato não
apenas vai contar a história dessa ferida, mas essa própria atenção dissipa,
limpa a ferida.
Assim a atenção é essa vasta energia que nunca pode ser ferida ou corrompida.
Por favor, não aceite o que está sendo dito nestas cartas. Aceitação é destruição
da verdade. Teste isso — não em uma data futura, mas teste enquanto lê essa
carta. Quando você testa isso, não casualmente, mas com todo o seu coração,
com todo o seu ser, então vai descobrir por si mesmo a verdade da questão. E
somente então será capaz de ajudar o estudante a limpar o passado e ter uma
mente que é incapaz de ser ferida.
CARTA 13
Indulgência com as coisas que não
têm sentido é desperdício de
energia
1º de março de 1979
Essas cartas são escritas com um espírito amigável. Elas não pretendem
sobrepor-se ao seu modo de pensar ou persuadi-lo a ajustar-se ao modo que o
escritor pensa ou sente. Elas não são propaganda. Elas são realmente um
diálogo entre você e o escritor, dois amigos conversando juntos dos seus
problemas, e em uma boa amizade não existe nunca qualquer senso de
competição ou dominação. Você também deve ter observado o estado do mundo
e da nossa sociedade, e que deve haver uma transformação radical no jeito com
que os seres humanos vivem, na sua relação uns com os outros, na relação com
o mundo como um todo; uma transformação em toda e qualquer maneira
possível. Estamos falando um com o outro, estamos ambos profundamente
interessados não somente em nossas próprias personalidades, mas também nos
estudantes pelos quais vocês são inteiramente responsáveis. O professor é a
pessoa mais importante na escola, pois o futuro bem-estar da humanidade
depende dele. Essa não é uma mera afirmação verbal. É um fato absoluto e
irrevogável. Apenas quando o próprio educador sentir a dignidade e o respeito
implícitos no seu trabalho, ele irá perceber que ensinar é o mais alto chamado,
maior que aquele do político, maior que o dos príncipes do mundo. Cada uma
dessas palavras o escritor diz a sério, e assim, por favor, não as coloque de lado
como se fosse um exagero ou uma tentativa de fazer vocês sentirem uma
importância falsa. Vocês e os estudantes devem florescer juntos em bondade.
Estivemos apontando a corrupção ou os fatores degenerativos da mente. Como
a sociedade está se desintegrando, essas escolas precisam ser centros para a
regeneração da mente. Não do pensamento. O pensamento nunca pode ser
regenerado, pois o pensamento é sempre limitado, mas a regeneração da
totalidade da mente é possível. Essa possibilidade não é conceitual, mas real
quando se examina profundamente o processo de degeneração. Nas cartas
anteriores exploramos alguns deles.
Agora temos de investigar também a natureza destrutiva da tradição, do hábito
e dos processos repetitivos de pensamento. Seguir, aceitando a tradição, parece
dar uma certa segurança à própria vida, tanto à vida exterior quanto à interior. A
busca por segurança, de todas as maneiras possíveis, tem sido o motivo, a força
motriz da maior parte das nossas ações. A exigência de segurança psicológica
se sobrepõe à segurança física, e assim torna a segurança física incerta. Essa
segurança psicológica é a base da tradição, transmitida de uma geração à outra
através das palavras, através de rituais, crenças — sejam religiosas, políticas ou
sociológicas. Nós raramente questionamos a norma aceita, mas quando o
fazemos, invariavelmente caímos na armadilha de um novo padrão. Esse tem
sido o nosso modo de viver: rejeitar um e aceitar o outro. O novo é mais atraente
e o velho é deixado para a geração passada. Mas as duas gerações estão presas
em padrões, em sistemas, e esse é o movimento da tradição. A própria palavra
tradição implica ajustamento, seja tradição moderna ou antiga. Não existe boa
ou má tradição: existe apenas tradição, a vã repetição de rituais em todas as
igrejas, templos e mesquitas. Eles são totalmente sem sentido, mas a emoção,
o sentimento, o romantismo, a imaginação emprestam-lhes cor e ilusão. Essa é
a natureza da superstição e cada sacerdote no mundo encoraja isso. Esse
processo de se abandonar às coisas que não têm sentido ou investir em coisas
sem significado é um desperdício de energia que degenera a mente. Temos de
estar profundamente atentos a esses fatos e essa própria atenção dissolve todas
as ilusões.
Também existe o hábito. Não há bons ou maus hábitos — somente hábitos.
Hábito implica uma ação repetitiva que surge de não se estar atento. A pessoa
cai no hábito deliberadamente ou é persuadida pela propaganda; ou, estando
com medo, cai nos reflexos autoprotetores. Dá-se o mesmo com o prazer. Seguir
uma rotina, por mais efetiva ou necessária que seja na vida quotidiana, pode
levar, e geralmente o faz, a um modo de vida mecânico. A pessoa faz a mesma
coisa à mesma hora todo dia sem que isso se torne um hábito quando existe
uma atenção ao que está sendo feito. A atenção dissipa o hábito. É somente
quando não existe atenção que os hábitos são formados. Você pode se levantar
à mesma hora toda manhã e você sabe por que está levantando. Essa atenção
pode parecer, para uma outra pessoa, um hábito, bom ou ruim, mas realmente
para aquele que está atento, desperto, não existe hábito de forma alguma. Nós
caímos nas rotinas ou hábitos psicológicos porque pensamos que é o modo de
viver mais cômodo, e quando você observa de perto, mesmo nos hábitos
formados no relacionamento — pessoal ou outro — existe uma certa qualidade
de indolência, falta de cuidado e desconsideração. Tudo isso dá uma falsa
sensação de intimidade, segurança e facilmente se cai na crueldade. Existe todo
tipo de perigo no hábito: o hábito de fumar, a ação repetitiva, o emprego de
palavras, pensamentos ou comportamento. Isso torna a mente totalmente
insensível, e o processo degenerativo é encontrar alguma forma de segurança
ilusória como uma nação, uma crença ou um ideal e se agarrar a isso. Todos
esses fatores são muito destrutivos para a segurança real. Vivemos em um
mundo de faz-de-conta que se tornou uma realidade. Pode-se questionar essa
ilusão tornando-se um revolucionário ou aderir à permissividade. Ambos são
fatores de degeneração.
Afinal de contas, o cérebro com suas capacidades extraordinárias vem sendo
condicionado de geração em geração a aceitar essa segurança falaciosa, que
agora se tornou um hábito profundamente arraigado. Para quebrar esse hábito
nós passamos por várias formas de tortura, múltiplos escapes, ou nos atiramos
em alguma utopia idealista, e assim por diante. É problema do educador
investigar o condicionamento; e sua capacidade criativa se encontra em
observar bem de perto esse seu condicionamento profundamente enraizado,
bem como o do estudante. É um processo mútuo: não que você investiga o seu
condicionamento primeiro e então informa o outro das suas descobertas, mas
exploram juntos e descobrem a verdade da questão. Isso exige uma certa
qualidade de paciência; não a paciência do tempo, mas a perseverança e o
cuidado diligente da responsabilidade total.
CARTA 14
Por que a humanidade dá tamanha
importância ao pensamento?
15 de março de 1979
Tornamo-nos demasiadamente espertos. Nosso cérebro vem sendo treinado
para se tornar muito brilhante verbalmente, intelectualmente. Ele está abarrotado
com uma grande quantidade de informação e usamos isso para uma carreira
lucrativa. Uma pessoa esperta, intelectual, é enaltecida, distinguida. Essas
pessoas parecem usurpar todos os lugares importantes no mundo: elas têm
poder, posição, prestígio. Mas sua esperteza, no final, acaba por atraiçoá-las.
Em seus corações elas nunca sabem o que é o amor, ou uma caridade profunda
e generosidade, pois estão fechadas na sua vaidade e arrogância. Isso se tornou
o padrão de todas as escolas de “alto nível”. Um menino ou menina que são
aceitos na escola convencional ficam presos na civilização moderna e estão
perdidos para toda a beleza da vida.
Quando você caminha pelos bosques cheios de sombras, com a luz salpicada,
e de repente se abre uma clareira, um espaço aberto, um campo verde rodeado
por árvores majestosas ou um riacho borbulhante, você se pergunta por que o
homem perdeu seu relacionamento com a natureza e a beleza da terra, com a
folha que cai e com o galho quebrado. Se você perdeu o contato com a natureza,
então inevitavelmente irá perder o relacionamento com outra pessoa. A natureza
não é apenas as flores, o adorável gramado ou as águas que correm no seu
pequeno jardim, mas toda a terra com tudo o que está nela. Achamos que a
natureza existe para o nosso uso, para a nossa conveniência, e assim perdemos
a comunhão com a terra. Essa sensibilidade à folha que cai e à árvore alta numa
colina é bem mais importante que passar em todos os exames e ter uma carreira
brilhante. Essas coisas não são o todo da vida. A vida é como um vasto rio com
um grande volume de água sem começo nem fim. Nós tiramos um balde de água
dessa rápida correnteza e essa água confinada se torna a nossa vida. Esse é
nosso condicionamento e nosso inesgotável sofrimento.
O movimento do pensamento não é a beleza. O pensamento pode criar o que
parece ser belo — a pintura, a estátua de mármore ou um adorável poema —
mas isso não é beleza. Beleza é suprema sensibilidade, não no sentido das
próprias dores e ansiedades, mas abraçando toda a existência do homem. Existe
beleza somente quando a corrente do eu secou completamente. Quando o eu
não está, a beleza existe. Com o abandono do eu vem a paixão da beleza.
Estivemos conversando juntos nestas cartas sobre a degeneração da mente.
Assinalamos, para o seu exame e investigação, algumas formas dessa
deterioração. Uma das suas atividades básicas é o pensamento. O pensamento
é um fragmentar da totalidade da mente. O todo contém a parte, mas a parte
nunca pode ser aquilo que é completo. O pensamento é a parte mais ativa da
nossa vida. O sentimento vai com o pensamento. Essencialmente eles são um,
embora tenhamos a tendência de separá-los. E, tendo separado, damos grande
importância ao sentimento, ao romantismo e à devoção, mas o pensamento,
como a corrente de um colar, tece a si mesmo através de tudo isso, escondido,
vivo, controlando e moldando. Ele está sempre lá, embora gostemos de pensar
que as nossas emoções profundas são essencialmente diferentes dele. Nisso se
encontra uma grande ilusão, um engano que é altamente considerado e que leva
à desonestidade.
Como dissemos, o pensamento é a realidade de nossa vida diária. Todos os
chamados livros sagrados são produto do pensamento. Eles podem ser
venerados como uma revelação, mas eles são essencialmente pensamento. O
pensamento criou a turbina e os grandes templos da terra, o foguete e a
inimizade no homem. O pensamento tem sido responsável pelas guerras, pela
linguagem que a pessoa usa e pela imagem feita pela mão ou pela mente. O
pensamento domina o relacionamento. O pensamento descreveu o que é o
amor, o paraíso e a dor da miséria. O homem adora o pensamento, admira suas
sutilezas, sua astúcia, sua violência, sua crueldade por uma causa. O
pensamento trouxe grandes avanços na tecnologia e com isso a capacidade de
destruição. Essa tem sido a história do pensamento, repetida através dos
séculos.
Por que a humanidade tem dado essa importância extraordinária para o
pensamento? Será porque é a única coisa que temos, ainda que ele seja ativado
através dos sentidos? Será porque o pensamento tem sido capaz de dominar a
natureza, dominar o meio ambiente, porque tem trazido alguma segurança
física? Será porque ele é o maior instrumento através do qual o homem opera,
vive e se beneficia? Será que é porque o pensamento criou os deuses, os
salvadores, a superconsciência, esquecendo a ansiedade, o medo, o sofrimento,
a inveja, a culpa? Será porque ele mantém as pessoas juntas como uma nação,
como um grupo, como uma seita? Será porque ele traz esperança para uma vida
sombria? Será porque ele dá uma abertura para escaparmos do nosso dia-a-dia
aborrecido e tedioso? Será porque, não sabendo o que será do futuro, ele
oferece a segurança do passado, com sua arrogância, com sua insistência na
experiência? Será porque no conhecimento existe estabilidade, a evitação do
medo na certeza do conhecido? Será porque o próprio pensamento se colocou
em uma posição invulnerável, resistindo ao desconhecido? Será porque o amor
é incontável, sem medidas, enquanto o pensamento é mensurável e resiste ao
imutável movimento do amor?
Nós nunca questionamos a própria natureza do pensamento. Aceitamos o
pensamento como inevitável, como nossos olhos e pernas. Nunca investigamos
a profundidade mesma do pensamento: e porque nunca o questionamos, ele
assumiu a predominância. Ele é o tirano da nossa vida e os tiranos raramente
são desafiados.
Assim, como educadores, vamos expor isso à luz clara da observação. A luz da
observação não somente dissipa a ilusão instantaneamente, como a claridade
da sua luminosidade revela o menor detalhe daquilo que está sendo observado.
Como dissemos, observação não é a partir de um ponto fixo, de uma crença, de
um preconceito ou de uma conclusão. Opinião é algo bastante medíocre e assim,
também, é a experiência. O homem cheio de experiência é uma pessoa
perigosa, pois ele está enredado na prisão do seu próprio conhecimento.
Assim, você pode observar com clareza extraordinária todo o movimento do
pensamento? Essa luz é liberdade — não significa que você apreendeu isso e o
emprega para sua própria conveniência e benefício. A própria observação do
pensamento é a observação do seu ser inteiro, e esse próprio ser é construído
pelo pensamento. Como o pensamento é finito, limitado, assim é você.
CARTA 15
A inteligência não é acordada
pelo desejo
1º de abril de 1979
Vamos ainda tratar da totalidade da mente. A mente inclui os sentidos, as
emoções instáveis, a capacidade do cérebro e o pensamento sempre inquieto.
Tudo isso é a mente, incluindo os vários atributos da consciência. Quando o todo
da mente está em operação, ela não tem fronteira, tem grande energia e ação
sem sombra de arrependimento e promessa de recompensa. Essa qualidade da
mente, essa totalidade é inteligência. Será que essa inteligência pode ser
transmitida ao estudante e pode-se ajudar a ele, ou a ela, a rapidamente
perceber seu significado? Certamente é responsabilidade do educador produzir
isso.
A capacidade do pensamento é moldada e controlada pelo desejo e assim ela
fica reduzida. Essa capacidade é limitada pelo movimento do desejo: o desejo é
a essência da sensação. A ambição limita a capacidade do cérebro, que é o
pensamento. Essa capacidade é restringida pelas exigências sociais e
econômicas, pelos motivos ou pela própria experiência da pessoa. Ela é limitada
por um ideal, pelas sanções das várias crenças religiosas, pelo medo sem fim.
O medo não está separado do prazer.
O desejo — a essência da sensação — é moldado pelo meio ambiente, pela
tradição, pelas nossas próprias inclinações e temperamento. E essa capacidade
ou ação, que exige energia total, é condicionada de acordo com nosso conforto
e prazer. O desejo é um fator premente em nossa vida, que não é para ser
suprimido, evitado, adulado ou justificado, mas compreendido. Esse
entendimento só pode surgir através da investigação do desejo e da observação
de seus movimentos. Conhecendo o imperioso fogo do desejo, a maior parte das
proibições religiosas e sectárias fizeram do desejo algo que deve ser reprimido,
controlado ou subjugado — entregue em sacrifício, por assim dizer, a uma
divindade ou princípio. Os inumeráveis votos que as pessoas fizeram para negar
totalmente o desejo de forma alguma o aniquilaram. Ele está lá.
Assim, devemos abordá-lo de forma diferente, tendo em mente que a inteligência
não é despertada pelo desejo. O desejo de ir à lua produz um conhecimento
técnico enorme, mas esse conhecimento é inteligência limitada. O conhecimento
é sempre especializado e, portanto, incompleto, enquanto nós estamos falando
da inteligência que é o movimento da totalidade da mente. É nessa inteligência
que estamos interessados — e despertá-la tanto no educador quanto no
estudante.
Como dissemos anteriormente, a capacidade é limitada pelo desejo. O desejo é
sensação, a sensação de uma nova experiência, de novas formas de excitação,
a sensação de escalar os picos mais altos da terra, a sensação de poder, de
status. Tudo isso limita a energia do cérebro. O desejo dá ilusão de segurança,
e o cérebro, que precisa de segurança, encoraja e sustenta toda forma de
desejo. Assim, se não entendermos o lugar do desejo, ele leva a mente a se
degenerar. É realmente importante entender isso.
O pensamento é o movimento do desejo. A curiosidade para descobrir é
impulsionada pelo desejo de maiores sensações e a ilusória certeza de
segurança. A curiosidade produziu uma quantidade enorme de conhecimento
que tem a sua importância na nossa vida diária. A curiosidade tem significado na
observação.
O pensamento pode ser o fator central de degeneração da mente, ao passo que
o insight abre a porta para a totalidade da ação. Iremos entrar no significado
completo do insight na próxima carta, mas por agora devemos considerar se o
pensamento é um fator destrutivo à totalidade da mente. Nós afirmamos que ele
é. Não aceite isso até que você o tenha examinado de forma completa e livre.
O que queremos dizer com totalidade da mente é a capacidade infinita e seu
vazio total no qual existe uma energia imensurável. O pensamento, sendo
limitado por sua própria natureza, impõe sua estreiteza ao todo, e assim o
pensamento fica sempre em primeiro plano. O pensamento é limitado porque é
o resultado da memória e do conhecimento acumulado através da experiência.
O conhecimento é o passado e o que foi é sempre limitado. A lembrança pode
projetar um futuro. Esse futuro está amarrado ao passado, assim o pensamento
é sempre limitado. O pensamento é medida — o mais e o menos, o maior e o
menor. Essa medida é o movimento do tempo. Eu fui, eu serei. Assim, quando o
pensamento predomina, por mais sutil, astuto e vital que seja, ele perverte a
totalidade; e, no entanto, temos dado ao pensamento a maior importância.
Se me permite perguntar, após ter lido esta carta, você percebe o significado da
natureza do pensamento e da totalidade da mente? E se compreendeu, pode
transmitir isso ao estudante pelo qual você tem inteira responsabilidade? Essa é
uma questão difícil. Se você não tem luz, não pode ajudar outra pessoa a tê-la.
Você pode explicar muito claramente ou defini-la em palavras bem escolhidas,
mas isso não terá a paixão da verdade.
Jiddu Krishnamurti - A Arte de Aprender.pdf
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  • 1. J. KRISHNAMURTI a arte de aprender Cartas às Escolas UNIVERSALISMO
  • 2. Este é um diálogo entre nós, uma conversa entre dois amigos. Não é uma palestra para instruir, informar ou guiá-lo. Vamos conversar juntos sobre muitas coisas, certamente não para convencê-lo de coisa alguma, nem para informá-lo de novas idéias, novos conceitos, conclusões, ideais. Vamos olhar para o mundo inteiro assim como ele é, olhar para o que está acontecendo não somente nesta parte do mundo, mas também no resto do mundo. Juntos. E o orador quer dizer juntos mesmo. Você e ele vão observar, sem nenhum viés, sem nenhum preconceito, o que está acontecendo globalmente. Esta é uma conversa séria, não é algo intelectual, emocional ou devocional. Assim, devemos exercitar nossos cérebros. Devemos ser céticos, ter dúvidas; devemos questionar e não aceitar nada que alguém diz — incluindo todos os gurus e os livros sagrados. Chegamos a uma crise no mundo. A crise não é meramente econômica; é, antes de tudo, psicológica. Vivemos aqui na terra por mais de um milhão de anos e, durante esse longo período de tempo, passamos por todo tipo de catástrofe, todo tipo de guerra. Civilizações desapareceram; assim como as culturas que moldaram o comportamento do ser humano. Tivemos muitos grandes líderes, políticos e religiosos, com todas as peças que eles pregaram nos seres humanos. E depois dessa enorme evolução do cérebro humano, estamos onde sempre estivemos — um tanto primitivos, bárbaros, cruéis e sempre nos preparando para a guerra. Cada nação está armazenando armamentos. E nós, seres humanos, estamos presos na roda do tempo. Não mudamos muito; ainda somos bárbaros, com todos os tipos de superstições e crenças. No fim de tudo isso, onde estamos nós? Por favor, estamos conversando sobre essas coisas juntos. Não é que o orador esteja explicando tudo isso; é tão óbvio. Você e o orador estão juntos examinando — muito cuidadosamente, diligentemente — o que nos tornamos, o que nós somos. E perguntamos: O tempo nos transformará? O tempo, ou seja, outros cinquenta mil ou um milhão de anos, transformará a mente humana, o cérebro humano? Ou o tempo não tem nenhuma importância? Vamos conversar sobre essas coisas. Os seres humanos estão feridos psicologicamente. Os seres humanos por todo o mundo estão tomados por grande sofrimento, dor, tristeza, solidão e desespero. E o cérebro criou as coisas mais extraordinárias, ideológica, tecnológica e religiosamente. O cérebro é extraordinariamente capaz. Mas essa capacidade é muito limitada. Tecnologicamente estamos progredindo a uma velocidade extraordinária. Mas psicologicamente, interiormente, somos muito primitivos, bárbaros, cruéis, desmazelados, descuidados, e indiferentes ao que está acontecendo. Somos indiferentes não somente à corrupção acontecendo no meio ambiente, mas também à corrupção que acontece em nome da religião,
  • 3. em nome da política, dos negócios e assim por diante. Corrupção não é somente passar dinheiro por debaixo da mesa ou contrabandear mercadorias para dentro do país. A corrupção começa onde existe interesse próprio. Onde existe interesse próprio, essa é a origem da corrupção. Estamos pensando juntos, ou você está meramente escutando o orador? Estamos indo juntos como dois amigos, fazendo uma longa viagem — uma viagem ao mundo global, uma viagem para dentro de nós mesmos: para dentro do que somos, do que nos tornamos, e por que nos tornamos o que somos. E precisamos fazer essa viagem juntos. Não é que o orador faz a viagem e mostra a estrada e o caminho no mapa para você. Mas, sim, que estamos juntos, e o orador quer dizer juntos mesmo. Pois ele não é um guru. Não se deve seguir ninguém no mundo do pensamento, no mundo da psique. Já dependemos demais dos outros para nos ajudar. E não estamos ajudando você. Vamos ser muito claros neste ponto: o orador não está lhe ajudando, pois você tem tido ajudantes em abundância. E não temos sido capazes de estar a sós, pensando as coisas por nós mesmos; não temos sido capazes de olhar para o mundo e para nosso relacionamento com o mundo, e ver se somos indivíduos mesmo ou parte da humanidade. Não exercitamos nossos cérebros, que é extraordinariamente capaz. Gastamos nossa energia, nossa capacidade, nosso entendimento intelectual em uma direção apenas — a tecnológica. Mas nunca entendemos o comportamento humano e por que somos como somos depois desse longo período de evolução. J. Krishnamurti
  • 4. Sumário INTRODUÇÃO VOLUME I Carta 1 — O ponto não é o que pensar, mas como pensar claramente Carta 2 — A bondade só pode florescer em liberdade Carta 3 — A escola é um lugar de lazer Carta 4 — O medo destrói a sensibilidade Carta 5 — Nós aceitamos a guerra como um meio de vida Carta 6 — A ilusão de que somos seres humanos separados Carta 7 — Cada ação, cada relacionamento é um movimento de aprender Carta 8 — O sentimento de ser totalmente responsável pelas nossas ações Carta 9 — A constante preocupação consigo mesmo é negligência Carta 10 — Uma seriedade onde existe liberdade e felicidade Carta 11 — Ideais corrompem a mente Carta 12 — Educação é libertar a mente do eu Carta 13 — Indulgência com as coisas que não têm sentido é desperdício de energia Carta 14 — Por que a humanidade dá tamanha importância ao pensamento? Carta 15 — A inteligência não é acordada pelo desejo Carta 16 — Conflito é indicação de resistência Carta 17 — O bom não é o melhor Carta 18 — A dimensão que o pensamento não alcança Carta 19 — Quando você começa muito perto, então o mundo inteiro se abre
  • 5. Carta 20 — O egoísmo é o problema essencial da nossa vida Carta 21 — O florescimento da bondade é a liberação de toda nossa energia Carta 22 — A mente pode se libertar da prisão que criou para si mesma? Carta 23 — Existe uma maneira de viver sem nenhum conflito? Carta 24 — A palavra nunca é a coisa Carta 25 — A arte de aprender é ler o livro que você é Carta 26 — A comparação é um dos muitos aspectos da violência Carta 27 — Valores colocam uma pessoa contra a outra Carta 28 — Quando o amor é tomado por prazer, o homem se separa da beleza e do sagrado Carta 29 — As diferenças ideológicas impedem a sobrevivência humana Carta 30 — Toda ação que jorra do pensamento impede a cooperação Carta 31 — Inteligência é a capacidade de perceber o todo Carta 32 — Existe algum outro movimento que não seja do intelecto e do pensamento? Carta 33 — Uma boa sociedade não vem a existir através de qualquer ideal Carta 34 — Qual seria o primeiro passo? Carta 35 — O fazer é, talvez, a maior responsabilidade Carta 36 — Cada um está agindo como um espelho para o outro Carta 37 — Quando você é realmente, profundamente afetuoso, você está aprendendo VOLUME II Carta 1 — Disciplina significa aprender Carta 2 — Por que o homem aceita e tolera a desordem? Carta 3 — A arte de pensar juntos Carta 4 — Na atenção não há ponto de foco Carta 5 — A questão real é a qualidade da nossa mente
  • 6. Carta 6 — Não mudar o que é, mas compreender o que é Carta 7 — Todas as coisas vivas estão envolvidas no som do silêncio Carta 8 — Libertar a consciência da limitação Carta 9 — A atmosfera da intenção Carta 10 — É possível transmitir a qualidade da intenção? Carta 11 — Na investigação, satisfação não é a meta Carta 12 — O que é só pode morrer; não pode se tornar outra coisa Carta 13 — Liberdade não é o oposto de escravidão Carta 14 — O pensamento é o resultado do conhecimento e da ignorância Carta 15 — Austeridade, humildade e inteligência Carta 16 — O pensamento não é seu ou meu Carta 17 — Se você fere a natureza você está ferindo a si mesmo Carta 18 — Aprender traz igualdade entre os seres humanos APÊNDICES O propósito da Escola Oak Grove Comece pelo outro lado Como vocês educam meu filho? O coração de cada Escola Discurso de Ommen Fontes Nota
  • 7. Introdução Estas cartas não são para serem lidas casualmente quando se tem um pequeno intervalo no meio de outras coisas, nem devem ser tratadas como entretenimento. Estas cartas são escritas seriamente e se você considerar a leitura delas, leia com a intenção de estudar o que é dito como se você estudasse uma flor olhando para ela muito cuidadosamente — suas pétalas, sua haste, suas cores, seu perfume e sua beleza. Estas cartas devem ser estudadas da mesma maneira — não lidas pela manhã e esquecidas durante o resto do dia. Você deve dar tempo a isto, brincar com isto, questionar, investigar sem aceitação, conviver com isto por algum tempo, assimilar como se fosse seu e não do escritor. J. Krishnamurti
  • 9. CARTA 1 O ponto não é o que pensar, mas como pensar claramente 1º de setembro de 1978 Como eu gostaria de manter contato com todas as escolas da Índia, com a escola Brockwood Park na Inglaterra e com a escola Oak Grove em Ojai, Califórnia, me proponho a escrever e enviar para todas elas uma carta a cada quinze dias, por quanto tempo for possível. É naturalmente difícil estar em contato pessoal com todas elas, então eu gostaria muito de escrever essas cartas e, assim, transmitir o que as escolas deveriam ser, transmitir para todas as pessoas responsáveis por elas que essas escolas não existem apenas para serem excelentes no plano acadêmico, mas muito mais do que isso. Essas escolas existem para o cultivo do ser humano total. Esses centros de educação devem necessariamente ajudar o estudante e o professor a florescer com naturalidade. O florescimento é muito importante, do contrário a educação se torna um mero processo mecânico, orientado para uma carreira, para algum tipo de profissão. Carreira e profissão, na atual sociedade, são inevitáveis, mas se colocarmos nossa ênfase nisso, então a liberdade para florescer murchará de maneira gradativa. Temos colocado demasiada ênfase em exames e em conseguir boas notas. Esse não é o principal propósito pelo qual essas escolas foram fundadas, o que não quer dizer que, em nível acadêmico, os estudantes serão inferiores. Pelo contrário, com o florescimento, tanto do professor como do estudante, carreira e profissão tomarão o lugar certo. A sociedade, a cultura na qual vivemos, nos encoraja e exige que os estudantes sejam orientados através de trabalho e segurança física. Isso tem sido uma constante pressão de todas as sociedades — primeiro a carreira, tudo o mais é secundário. Isso quer dizer: dinheiro em primeiro lugar, depois a complexidade de nossa vida diária. Estamos tentando reverter esse processo, porque o homem não pode ser feliz apenas com dinheiro. Quando o dinheiro se torna o fator dominante da vida, há um desequilíbrio em nossas atividades diárias. Portanto, se me permitem, eu gostaria que todos os educadores seriamente entendessem e vissem todo o significado disso. Se o educador entende a importância disso e, na sua própria vida, der um lugar apropriado, então ele pode ajudar o estudante,
  • 10. que é compelido pelos pais e pela sociedade a fazer da carreira o mais importante. Portanto, eu gostaria, já nesta primeira carta, de enfatizar este ponto e sustentar que haja sempre nessas escolas um modo de vida que cultive o ser humano total. Como a maior parte de nossa educação é aquisição de conhecimentos, isso nos está fazendo mais e mais mecanizados, fazendo nossas mentes funcionarem em estreitos canais, seja o conhecimento que estamos adquirindo filosófico, científico, religioso, comercial ou tecnológico. Nosso modo de vida, tanto dentro como fora de casa, e a nossa especialização em determinadas carreiras estão fazendo nossas mentes mais e mais estreitas, limitadas e incompletas. Tudo isso leva a um modo de vida mecânico, uma padronização mental e, assim, gradativamente, o Estado — mesmo um Estado democrático — passa a ditar o que devemos ser. A maioria das pessoas atentas é naturalmente consciente, mas infelizmente elas parecem aceitar e conviver com isso. Assim, isso se tornou um perigo para a liberdade. Liberdade é um assunto muito complexo, e para compreender a sua complexidade, é necessário o florescimento da mente. Cada um naturalmente dará uma definição diferente para o florescimento humano, dependendo de sua cultura, de sua assim chamada educação, experiência, superstição religiosa — ou seja, dependendo do seu condicionamento. Aqui nós não estamos lidando com opiniões ou preconceitos, mas principalmente com o entendimento não verbal das consequências e implicações do florescimento da mente. Esse florescimento é o cultivo e o total desabrochar de nossa mente, de nosso coração e do nosso bem estar físico. Isto é, viver em completa harmonia na qual não há oposição ou contradição entre os três. O florescimento da mente só pode acontecer quando existe uma percepção clara, objetiva, impessoal, não pressionada por nenhuma imposição. O ponto não é o que pensar, mas como pensar claramente. Temos vivido séculos de propaganda a nos dizer o que pensar. Nisso está a maior parte da nossa educação e não na investigação do inteiro movimento do pensamento. Florescer implica liberdade. Como qualquer plantinha precisa de liberdade para crescer. Em cada carta nós trataremos deste assunto de diferentes formas ao longo deste ano; trataremos do acordar do coração — que não tem a ver com ser sentimental, romântico ou fantasioso, mas sim com a bondade que nasce da afeição e do amor; e trataremos do cultivo do corpo, ou seja, a alimentação correta, o exercício apropriado, o que irá trazer uma sensibilidade apurada. Quando esses três estão em completa harmonia — ou seja, a mente, o coração e o corpo —, então o florescer vem, naturalmente, sem esforço e com excelência. Este é o nosso trabalho como educadores, nossa responsabilidade — e educar é a maior das profissões na vida.
  • 11. CARTA 2 A bondade só pode florescer em liberdade 15 de setembro de 1978 A bondade só pode florescer em liberdade. Ela não pode florescer no solo da persuasão de forma alguma, nem sob compulsão, e também não é resultado de recompensa. Ela não se revela quando existe qualquer tipo de imitação ou conformismo e, naturalmente, ela não pode existir onde há medo. A bondade mostra a si mesma no comportamento, e esse comportamento é baseado na sensibilidade. Essa bondade se expressa na ação. O total movimento do pensamento não é bondade. O pensamento, que é muito complexo, precisa ser compreendido e essa própria compreensão desperta o pensamento para sua própria limitação. A bondade não tem oposto. A maioria de nós considera a bondade como o oposto do mal ou da maldade e, assim, durante toda a história, em qualquer cultura, a bondade tem sido considerada a outra face daquilo que é brutal. Assim, o homem tem sempre lutado contra o mal na ânsia de ser bom, mas a bondade nunca pode vir a acontecer se existe alguma forma de violência e luta. A bondade mostra a si mesma no comportamento, na ação e no relacionamento. Geralmente nossa conduta diária é baseada ou em seguir determinados padrões — o que é mecânico e, portanto, superficial — ou de acordo com motivos cuidadosamente considerados, baseados em recompensa ou punição. Então o nosso comportamento, consciente ou inconscientemente, é calculado. Isso não é um bom comportamento. Quando a pessoa se dá conta disso, não só intelectualmente ou a nível verbal, então a partir dessa total negação surge o verdadeiro comportamento. O bom comportamento é, em essência, a ausência do eu, do meu. Ele se mostra pela gentileza, pela consideração para com os outros, em ceder sem perder a integridade. Portanto, o comportamento se torna extraordinariamente importante. Ele não é um assunto casual a ser desconsiderado ou um brinquedo de uma mente sofisticada. Ele vem das profundezas do ser e é parte da vida diária.
  • 12. A bondade se mostra na ação. Nós temos que diferenciar entre ação e comportamento. Provavelmente ambos são a mesma coisa, mas para clarear eles precisam ser separados e examinados. Agir corretamente é uma das coisas mais difíceis a fazer. É muito complexo e precisa ser examinado bem de perto, sem impaciência e sem pular para alguma conclusão. Na nossa vida diária a ação é um movimento continuo do passado, interrompido de vez em quando por uma nova série de conclusões; essas conclusões então se tornam o passado; e a pessoa age de acordo com esse passado. A pessoa age de acordo com idéias preconcebidas ou ideais; assim, estamos sempre agindo ou a partir de conhecimento acumulado, o que é passado, ou a partir de um futuro idealista, uma utopia. Aceitamos essa ação como normal. Será mesmo? Nós a questionamos depois de ter acontecido, ou antes de agir, mas esse questionamento é baseado em conclusões anteriores ou recompensas ou punições futuras. Se eu fizer isso, eu irei obter aquilo, e assim por diante. Assim, estamos agora questionando toda a idéia de ação que usualmente aceitamos. A ação acontece depois de termos acumulado conhecimento ou experiência; ou agimos e aprendemos com essa ação — agradável ou desagradável — e essa aprendizagem de novo se torna acumulação de conhecimento. Assim, ambas as ações são baseadas em conhecimento, elas não são diferentes. Conhecimento é sempre do passado e, assim, nossas ações são sempre mecânicas. Existe uma ação que não é mecânica, repetitiva, rotineira e, portanto, sem arrependimento? É realmente importante para nós compreendermos isso — que onde existe liberdade e o florescimento da bondade, a ação nunca pode ser mecânica. Escrever é mecânico, aprender uma língua, guiar um carro é mecânico; adquirir algum tipo de conhecimento técnico e agir de acordo com ele é mecânico. Novamente, nessa atividade mecânica deve haver uma interrupção e, nessa interrupção, uma nova conclusão se forma, que de novo se torna mecânica. Devemos sempre ter em mente que a liberdade é essencial para a beleza da bondade. Existe uma ação não mecânica, mas você tem que descobri- la, pois ela não pode ser contada a você, você não pode ser instruído sobre ela, você não pode aprender através de exemplos, porque então ela se torna imitação e ajustamento. Então você perde a liberdade completamente e não existe bondade. Penso que, por agora isso é o bastante, mas nós iremos continuar na nossa próxima carta com o florescimento da bondade no relacionamento.
  • 13. CARTA 3 A escola é um lugar de lazer 1º de outubro de 1978 Devemos continuar, se me permitem, com o florescer da bondade em cada um de nossos relacionamentos, seja no mais íntimo ou no mais superficial ou nas questões comuns do dia-a-dia. O relacionamento com outro ser humano é uma das coisas mais importantes na vida. A maioria de nós não é muito séria nos relacionamentos, pois estamos interessados primeiramente em nós mesmos — e interessados no outro quando nos é conveniente, satisfatório ou gratificante sensualmente. Nós lidamos com o relacionamento à distância, por assim dizer, e não como algo no qual estejamos totalmente envolvidos. Quase nunca nos mostramos uns aos outros, pois não nos percebemos inteiramente, e o que mostramos ao outro no relacionamento ou é possessividade ou dominação ou subserviência. Existe o outro e eu — duas entidades separadas sustentando uma divisão que dura até a morte. O outro está preocupado consigo mesmo; assim, essa divisão se mantém por toda a vida. É claro que a pessoa demonstra simpatia, afeição e apoio em várias circunstâncias, mas esse processo separativo continua. E, a partir disso, surgem incompatibilidades, afirmações de temperamentos e desejos e, assim, existe medo e acomodação. Sexualmente pode haver um estar junto, mas essa peculiar e quase estática relação do você e do eu é sustentada com as brigas, as mágoas, os ciúmes e toda aquela luta. Tudo isso é geralmente considerado um bom relacionamento. Agora, pode a bondade florescer nisso tudo? No entanto, relacionamento é vida e, sem alguma espécie de relacionamento, a pessoa não pode existir. O eremita, o monge, por mais que possam se retirar do mundo, carregam o mundo consigo mesmos. Eles podem negá-lo, podem se reprimir; podem torturar a si mesmos, mas ainda permanecem em algum tipo de relação com o mundo, pois eles são o resultado de milhares de anos de tradição, superstição e todo o conhecimento que o homem acumulou por milênios. Assim, não existe escape de tudo isso. Existe o relacionamento entre o educador e o estudante. O professor mantém, sabendo ou não, esse senso de superioridade, e assim fica sempre em um pedestal, fazendo o estudante se sentir inferior, aquele que tem que ser
  • 14. ensinado. Nisso obviamente não há relacionamento. A partir daí surge medo da parte do estudante, um senso de pressão e constrangimento e, portanto, o estudante aprende, desde muito jovem, esse sentido de superioridade; ele é levado a se sentir diminuído e, assim, por toda a vida, ou se torna o agressor ou fica continuamente cedendo, subserviente. Uma escola é um lugar de lazer, onde o educador e a pessoa a ser educada estão ambos aprendendo. Esse é o fato central da escola: aprender. Não queremos dizer com lazer o ter tempo para si mesmo, embora isso também seja necessário; não significa pegar um livro e sentar debaixo de uma árvore ou no próprio quarto, lendo casualmente. Não significa um estado plácido da mente; certamente não quer dizer estar à toa ou usar o tempo para sonhar acordado. Lazer significa uma mente que não está constantemente ocupada com alguma coisa, com um problema, com algum divertimento, com algum prazer sensorial. Lazer implica uma mente que tem tempo infinito para observar; observar o que está acontecendo em volta de nós e o que está acontecendo dentro de nós; ter lazer para escutar, para ver claramente. Lazer implica liberdade, que geralmente é traduzida por fazer o que se deseja, que é o que os seres humanos estão fazendo de qualquer maneira, causando muitos males, infelicidade e confusão. Lazer implica uma mente quieta, nenhum motivo e, assim, nenhuma direção. Isso é lazer e é somente nesse estado que a mente pode aprender, não somente ciência, história, matemática, mas também aprender sobre si mesma; e a pessoa pode aprender sobre si mesma no relacionamento. Tudo isso pode ser ensinado nas nossas escolas? Ou é algo sobre o qual você lê e memoriza ou esquece? Mas quando o professor e o aluno estão envolvidos em realmente entender a importância do relacionamento, então eles estão estabelecendo na escola um relacionamento apropriado entre eles. Isso é parte da educação, mais importante que apenas ensinar os conteúdos acadêmicos. O relacionamento requer uma grande dose de inteligência. Não pode ser adquirido nos livros, nem pode ser ensinado. Não é o resultado de vasta experiência acumulada. Conhecimento não é inteligência. A inteligência pode usar o conhecimento. O conhecimento pode ser astuto, brilhante e utilitário, mas isso não é inteligência. A inteligência vem fácil e naturalmente quando toda a natureza e estrutura do relacionamento é vista. Por isso é que é importante ter lazer — para que o homem ou a mulher, o professor ou o estudante possam conversar tranquila e seriamente sobre o seu relacionamento, no qual suas verdadeiras reações, suscetibilidades e barreiras são vistas, não imaginadas, não distorcidas para agradar ao outro ou reprimidas para apaziguar o outro. Certamente essa é a função de uma escola: ajudar o estudante a despertar sua inteligência e aprender a grande importância do relacionamento correto.
  • 15. CARTA 4 O medo destrói a sensibilidade 15 de outubro de 1978 Parece que a maioria das pessoas desperdiça uma grande quantidade de tempo em discutir a clareza apenas verbalmente, e elas não parecem compreender a profundidade e o conteúdo além da palavra. Na tentativa de buscar a clareza verbal, muitas vezes tornam suas mentes mecânicas, suas vidas superficiais e frequentemente contraditórias. Nessas cartas não estamos interessados na compreensão verbal, mas nos fatos diários de nossas vidas. Esse é o fato central de todas estas cartas; não a explicação verbal do fato, mas o fato mesmo. Quando estamos preocupados com clareza verbal e, portanto, com a clareza das idéias, nossa vida diária é conceitual e não factual. Todas as teorias, os princípios, os ideais são conceituais. Conceitos podem ser desonestos, hipócritas e ilusórios. A pessoa pode ter inúmeros conceitos ou ideais, mas eles não têm nada a ver com os acontecimentos de nossa vida. As pessoas são alimentadas pelos ideais: quanto mais fantasiosos eles são, mais são considerados nobres. Mas, novamente, o entendimento dos eventos diários é, de longe, mais importante que os ideais. Se a mente da pessoa está abarrotada com conceitos, ideais, etc., o fato — o acontecimento presente — nunca pode ser encarado. Os conceitos tornam-se bloqueios. Quando tudo isso está claramente entendido — não um entendimento intelectual, conceitual —, a grande importância de encarar um fato, o presente, o agora, torna-se o fator central de nossa educação. A política é um tipo de doença universal baseada em conceitos, e a religião é romântica, uma emoção imaginária. Quando você observa o que está realmente acontecendo, tudo isso é um indicativo de pensamento conceitual e uma fuga da confusão, sofrimento e miséria da nossa vida diária. A bondade não pode florescer no campo do medo. Nesse campo há muitas variedades de medo: o medo imediato e o medo de muitos amanhãs. O medo não é um conceito, mas a explicação do medo é conceitual e essas explicações variam de um sábio para outro, ou de um intelectual para outro. A explicação não é importante, mas sim o que é estar realmente diante do medo.
  • 16. Em todas as nossas escolas, o educador e aqueles responsáveis pelos estudantes, estejam na sala de aula, no campo de esportes ou nos seus quartos, têm a responsabilidade de cuidar para que aquele medo, em qualquer forma, não surja. O educador não deve despertar medo no estudante. Isso não é conceitual, porque o educador por si mesmo compreende, não apenas verbalmente, que qualquer forma de medo mutila e deforma a mente, destrói a sensibilidade, retrai os sentidos. O medo é o fardo pesado que o homem tem carregado sempre. A partir desse medo surgem várias espécies de superstição — religiosa, científica e imaginária. A pessoa vive em um mundo de faz-de-conta, e a essência do mundo conceitual nasce do medo. Dissemos anteriormente que o homem não pode viver fora dos relacionamentos, e relacionamento não é apenas na sua vida privada; se ele é um educador, tem um relacionamento direto com o estudante. Se existe qualquer tipo de medo nisso, então o professor não tem possibilidade de ajudar o estudante a estar livre do professor. O estudante vem de um passado de medo, de autoridade, de todo tipo de fantasias ou verdadeiras impressões e pressões. O educador também tem suas próprias pressões, medos. Ele não será capaz de produzir a compreensão da natureza do medo se ele mesmo não descobrir a raiz dos seus próprios medos. Não é que ele deva primeiramente estar livre de seus próprios medos a fim de ajudar o estudante a ser livre, mas que, no seu relacionamento do dia-a-dia, em conversa, na classe, o professor mostre que ele mesmo está com medo, assim como o estudante também, e assim, juntos, eles podem explorar a total natureza e estrutura do medo. Deve ser apontado que isto não é uma confissão da parte do professor. Ele está apenas expondo um fato sem nenhuma ênfase emocional, pessoal. É como ter uma conversa entre bons amigos. Isso requer uma certa honestidade e humildade. Humildade não é servilismo. Humildade não é senso de derrotismo; a humildade não conhece a arrogância nem o orgulho. Assim, o professor tem uma tremenda responsabilidade, pois essa é a maior de todas as profissões. Ele está produzindo uma nova geração no mundo, o que, novamente, é um fato e não um conceito. Você pode fazer um conceito de um fato e, assim, ficar perdido em conceitos, mas o fato sempre permanece. Estar diante do fato, do agora, do medo é a mais alta função do educador — não produzir apenas excelência acadêmica, mas, o que é de longe mais importante, a liberdade psicológica do estudante e de si mesmo. Quando a natureza da liberdade é entendida, então você elimina toda competição, no campo de esportes, na sala de aula. É possível eliminar totalmente as avaliações comparativas, tanto no campo acadêmico como no ético? É possível ajudar o estudante à não pensar competitivamente no campo acadêmico e, ainda assim, ter excelência nos estudos, em suas ações e em sua vida diária? Por favor, tenham em mente que estamos interessados no florescimento da bondade — que não tem possibilidade de florescer onde há
  • 17. qualquer tipo de competitividade. Competição existe somente onde há comparação, e comparação não produz excelência. Essas escolas existem fundamentalmente para ajudar a ambos, o estudante e o professor, a florescerem em bondade. Isso requer excelência no comportamento, na ação e no relacionamento. Esta é a nossa intenção e o porquê dessas escolas terem sido criadas; não para produzir meros carreiristas, mas sim para promover a excelência do espírito. Na nossa próxima carta continuaremos com a natureza do medo; não a palavra medo, mas o medo mesmo, o fato real.
  • 18. CARTA 5 Nós aceitamos a guerra como um meio de vida 1º de novembro de 1978 O conhecimento não levará à inteligência. Acumulamos grande quantidade de conhecimento sobre muitas coisas, mas agir inteligentemente a respeito do que temos aprendido parece quase impossível. Escolas, faculdades e universidades cultivam o conhecimento a respeito do nosso comportamento, do universo, da ciência e de todo tipo de informação tecnológica. Raramente esses centros de educação ajudam o ser humano a viver no dia-a-dia uma vida de excelência. Os eruditos afirmam que os seres humanos só podem se desenvolver através da vasta acumulação de informação e conhecimento. O ser humano tem passado por milhares e milhares de guerras; tem acumulado uma grande quantidade de conhecimento sobre como matar, mesmo que esse próprio conhecimento o impeça de pôr um fim a todas as guerras. Aceitamos a guerra como um modo de vida e aceitamos todas as brutalidades, violência e a matança como o curso normal de nossa vida. Sabemos que não devemos matar os outros. Esse conhecimento é totalmente irrelevante ao fato de matar. O conhecimento não nos impede de matar os animais e a terra. O conhecimento não pode funcionar através da inteligência, mas a inteligência pode funcionar com o conhecimento. Saber é não saber e a compreensão desse fato — que o conhecimento nunca pode resolver os nossos problemas — é inteligência. A educação nas nossas escolas não é somente a aquisição de conhecimento, mas, o que é muito mais importante, o acordar da inteligência que utilizará o conhecimento. Nunca é o inverso. O acordar da inteligência é o que nos interessa em todas essas escolas, e então a questão inevitável surge: como a inteligência pode ser acordada? Qual é o sistema, o método, a prática? Essa mesma questão implica que a pessoa está ainda funcionando no campo do conhecimento. Perceber que essa é uma questão errada é o começo do despertar da inteligência. A prática, o método, o sistema na nossa vida diária acaba levando à rotina, a uma ação repetitiva e, portanto, a uma mente mecânica. O contínuo movimento do conhecimento, mesmo que especializado, coloca a mente em um trilho, em um modo de vida limitado. Aprender a observar
  • 19. e compreender essa estrutura total do conhecimento é começar a acordar a inteligência. Nossas mentes vivem na tradição. O próprio significado dessa palavra — transmitir como legado — nega a inteligência. É fácil e confortável seguir a tradição, seja ela política, religiosa ou uma tradição inventada pela própria pessoa. Então, não se tem que pensar ou questionar isso; é parte da tradição aceitar e obedecer. Quanto mais antiga a cultura, mais a mente está presa no passado, mais vive no passado. A quebra de uma tradição inevitavelmente será seguida pela imposição de outra. A mente, que tem por trás de si muitos séculos de uma tradição particular, recusa-se a abandonar o velho e aceita isso unicamente quando há outra tradição igualmente gratificante e segura. A tradição, em suas várias formas — da religiosa à acadêmica —, obrigatoriamente nega a inteligência. A inteligência é infinita. O conhecimento, mesmo que vasto, é finito como a tradição. Nas nossas escolas o mecanismo de formação de hábitos da mente deve necessariamente ser observado e, nessa observação, nasce o amadurecimento da inteligência. Faz parte da tradição humana aceitar o medo. Vivemos com medo, tanto a geração mais velha quanto a mais nova. A maioria de nós não se dá conta de que vive no medo. Somente ficamos conscientes desse medo permanente quando estamos passando por uma forma suave de crise ou estamos diante de um incidente destrutivo. Ele está lá. Alguns estão conscientes dele, outros o evitam. A tradição diz: controle o medo, fuja dele, reprima-o, analise-o, aja sobre ele, ou aceite-o. Por milênios temos vivido com o medo e, de alguma forma, arranjamos um jeito de continuar com ele. Essa é a natureza da tradição — agir sobre o medo ou escapar dele; ou sentimentalmente aceitá-lo e procurar um agente externo para resolvê-lo. As religiões brotam desse medo, e a ânsia que compele os políticos para o poder nasce a partir desse medo. Qualquer forma de dominação sobre o outro é da natureza do medo. Quando um homem ou uma mulher possui um ao outro, é o medo que está por trás — e esse medo destrói qualquer forma de relacionamento. É função do educador ajudar os estudantes a encarar esse medo, seja ele o medo dos pais, do professor, ou do menino mais velho, ou o medo de estar sozinho e o medo da natureza. Essa é a questão central para o entendimento da natureza e estrutura do medo — encará-lo. Encarar o medo não através de uma cortina de palavras, mas observar o próprio acontecer do medo sem qualquer movimento para fugir dele. A fuga do fato é camuflar o fato. Nossa tradição, nossa educação encoraja o controle, a aceitação ou a negação ou a racionalização bem hábil. Como professor, você pode ajudar o estudante e, assim, a você mesmo a encarar cada problema que surge na vida? No aprender, não existe nem o professor nem quem é ensinado; só há aprender. Para
  • 20. aprender sobre todo o movimento do medo, a pessoa deve necessariamente abordá-lo com uma certa curiosidade que tem a sua vitalidade própria. Como uma criança que é muito curiosa, nessa curiosidade há intensidade. É o caminho da tradição conquistar o que não entendemos, subjugá-lo, esmagá-lo; ou adorá- lo. A tradição é o conhecimento e o terminar do conhecimento é o nascer da inteligência. Agora, percebendo que não existe nem o professor nem o aluno, mas apenas o ato de aprender da parte do adulto e do estudante, podemos, através da percepção direta do que está acontecendo, aprender o que é esse medo e tudo sobre ele? Você pode, se permitir que o medo conte a sua antiga história. Escute isso atentamente sem interferência, pois o que lhe está sendo contado é a história de seu próprio medo. Quando você escuta assim, descobrirá que esse medo não está separado de você. Você é esse próprio medo, a reação própria com uma palavra associada a ela. A palavra não é importante. A palavra é o conhecimento, a tradição; mas o real, o agora que está acontecendo, é algo totalmente novo. É a descoberta do novo no seu próprio medo. Estar diante do medo sem nenhum movimento do pensamento é o terminar do medo. Não um medo particular, mas é a própria raiz do medo que é desintegrada nessa observação. Não há observador, só observação. O medo é um assunto muito complexo, tão antigo como as colinas, tão antigo quanto a humanidade e ele tem uma extraordinária história para contar. Mas você deve saber a arte de escutá-lo, e existe uma grande beleza nesse escutar. Existe somente o escutar; a história não existe.
  • 21. CARTA 6 A ilusão de que somos seres humanos separados 15 de novembro de 1978 A palavra responsabilidade deve ser entendida em todo o seu significado. Ela vem de responder, não responder parcialmente, mas totalmente. A palavra também implica uma referência ao passado, responder de acordo com o seu background, que significa reagir segundo seu condicionamento. Como é geralmente entendida, a responsabilidade é a ação vinda do condicionamento humano da pessoa. A cultura, a sociedade na qual a pessoa vive, naturalmente condiciona a mente, quer seja essa cultura local ou estrangeira. A partir desse background a pessoa responde e essa resposta limita a nossa responsabilidade. Se a pessoa nasce na Índia, Europa, América ou onde quer que seja, a sua resposta será de acordo com a superstição religiosa — todas as religiões são estruturas supersticiosas — ou de acordo com o nacionalismo ou com as teorias científicas. Tudo isso, que é sempre limitado e finito, condiciona a resposta das pessoas. E, portanto, há sempre contradição, conflito e o aparecimento da confusão. Isto é inevitável e produz divisão entre os seres humanos. A divisão, em qualquer forma, deve necessariamente produzir não somente conflito e violência, mas, por fim, a guerra. Se a pessoa compreende o real significado da palavra responsabilidade e o que acontece no mundo de hoje, ela vê que essa responsabilidade tem se tornado irresponsável. Na compreensão do que é irresponsabilidade, nós começamos a compreender o que é responsabilidade. Responsabilidade é pelo todo, como a palavra implica, não para cada um, não para com a sua família, não para com alguns conceitos ou crenças, mas pelo todo da humanidade. Nossas várias culturas têm enfatizado a separatividade, chamada individualismo, que tem resultado em cada um fazendo o que deseja ou estando comprometido com seu próprio talento particular e pequeno, por mais vantajoso que esse talento possa ser para a sociedade. Isso não significa o que os totalitários querem que se acredite, que somente o Estado e as autoridades que o representam sejam importantes, e não os seres humanos. O Estado é um
  • 22. conceito, mas um ser humano, mesmo que viva nele, não é um conceito. O medo é uma realidade, não um conceito. Psicologicamente, um ser humano é a humanidade toda. Ele não só a representa, como é o todo da espécie humana. Ele é, essencialmente, a psique inteira da humanidade. Sobre essa realidade várias culturas têm imposto a ilusão de que cada ser humano é diferente. Nessa ilusão a humanidade tem estado presa por séculos, e essa ilusão tem se tornado uma realidade. Se a pessoa observar intimamente toda a estrutura psicológica de si mesma, ela irá descobrir que, do jeito que ela sofre, toda a humanidade sofre em diversos graus. Se você está sozinho, a humanidade toda conhece essa solidão. A agonia, o ciúme, a inveja e o medo são conhecidos por todos. Portanto, psicologicamente, um ser humano é como o outro. Pode haver diferenças físicas, biológicas. Um é alto ou baixo e assim por diante, mas, basicamente, um ser humano é o representante de toda a humanidade. Portanto, psicologicamente, você é o mundo; você é responsável por toda a humanidade, não por você como um ser humano separado, que é uma ilusão psicológica. Como representante de toda a raça humana, sua resposta é total, não é parcial. Portanto, a responsabilidade tem um significado totalmente diferente. Nós temos que aprender a arte dessa responsabilidade. Se compreendermos o significado completo de que nós psicologicamente somos o mundo, então a responsabilidade se torna um poderoso amor. Então nós iremos cuidar da criança, não apenas na idade tenra, mas cuidar que ela compreenda o significado da responsabilidade por toda a sua vida. Essa arte inclui o comportamento, as nossas maneiras de pensar e a importância da ação correta. Nessas nossas escolas a responsabilidade para com a terra, a natureza e para com os outros é parte da nossa educação — não meramente a ênfase nos assuntos acadêmicos, ainda que eles sejam necessários. Então podemos perguntar o que o professor está ensinando e o que o aluno está recebendo e, mais amplamente, perguntar o que é aprender. Qual é a função do educador? É meramente ensinar álgebra ou física, ou é despertar no estudante — e, portanto, nele mesmo — este enorme senso de responsabilidade? Podem os dois estar juntos? Ou seja, os assuntos acadêmicos que ajudarão numa carreira e essa responsabilidade por toda a humanidade e a vida. Ou eles devem ser mantidos separados? Se eles estão separados, então haverá contradição na sua vida; o estudante se tornará um hipócrita e, inconsciente ou deliberadamente, manterá sua vida em dois compartimentos definidos. A humanidade vive nessa divisão. Em casa a pessoa é de um jeito, e na fábrica ou no escritório assume uma face diferente. Nós temos perguntado se os dois podem se mover juntos. É possível? Quando uma questão desse tipo é colocada, a pessoa deve investigar as implicações dessa questão, e não se é ou não possível. Portanto, é da maior importância como você aborda essa questão. Se você a aborda a partir do seu background limitado — e todo condicionamento é
  • 23. limitado — então será uma compreensão parcial das implicações de tudo isto. Você deve necessariamente se aproximar dessa questão de forma nova. Então você descobrirá a futilidade da própria questão porque, assim que você a aborda de forma nova, você verá que esses dois se encontram, como dois córregos formando um rio formidável, que é a sua vida, sua vida diária de total responsabilidade. É isso o que você está ensinando, dando-se conta que o professor tem a maior de todas as profissões? Essas não são meras palavras, mas uma sólida realidade, que não pode ser desprezada. Se você não sente a verdade disso, então você realmente deve ter outra profissão. Então, você viverá nas ilusões que a humanidade tem criado para si mesma. Portanto, nós podemos indagar novamente: o que você está ensinando e o que o aluno está aprendendo? Você está criando essa peculiar atmosfera na qual o real aprendizado acontece? Se você entendeu a imensidão da responsabilidade e a sua beleza, então você é totalmente responsável pelo estudante — o que ele usa, o que ele come, a sua maneira de falar e assim por diante. Dessa questão surge outra: o que é aprender? A maioria de nós provavelmente nunca faz essa pergunta ou, se a faz, responde a partir da tradição, que é conhecimento acumulado, um conhecimento que funciona com ou sem habilidade para ganhar a nossa vida diária. Isso é o que temos ensinado, é para isso que existem todas as escolas comuns, as universidades, etc. O conhecimento predomina, o que é um dos nossos maiores condicionamentos e, portanto, o cérebro nunca está livre do conhecido. É sempre uma adição ao que já é conhecido e, assim, o cérebro nunca é livre para descobrir um modo de vida que pode não estar baseado de modo algum no conhecido. O conhecido dirige- se para uma trilha larga ou estreita e a pessoa fica nessa trilha pensando que há segurança nela. Essa segurança é destruída por esse próprio conhecimento limitado. Esse tem sido o modo de vida humano até agora. Assim, há um modo de aprender que não põe a vida dentro de uma rotina, de um canal estreito? Então, o que é aprender? Devemos ser muito claros sobre as vias do conhecimento: primeiro adquirir conhecimento e depois atuar a partir desse conhecimento (tecnológico e psicológico), ou agir e, dessa ação, adquirir conhecimento? Ambas são aquisições de conhecimento. O conhecimento é sempre passado. Há um jeito de agir sem o peso enorme do conhecimento acumulado do homem? Há. Não é aprender como nós o temos conhecido; é pura observação — observação que não é contínua e que então se torna memória, mas observação de momento a momento. O observador é a essência do conhecimento e impõe ao que ele observa o que tem adquirido através da experiência e das várias formas de reações sensoriais. O observador está sempre manipulando aquilo que ele observa, e o que ele observa é sempre
  • 24. reduzido ao conhecimento. Então, ele está sempre preso na velha tradição de hábitos. Assim, aprender é observação pura — não somente de coisas exteriores a nós mesmos, mas também do que está acontecendo dentro; observar sem o observador.
  • 25. CARTA 7 Cada ação, cada relacionamento é um movimento de aprender 1º de dezembro de 1978 Todo movimento da vida é aprender. Nunca há um tempo no qual não exista o aprender. Toda ação é um movimento de aprender e todo relacionamento é aprender. A acumulação de conhecimento, que é chamada aprender e com a qual estamos tão acostumados, é necessária até um certo ponto, mas essa limitação nos impede de compreendermos a nós mesmos. O conhecimento é mensurável — mais ou menos conhecimento —, mas no aprender não existe medida. Isso é realmente muito importante de compreender, especialmente se é para você perceber o total significado de uma vida religiosa. O conhecimento é memória e se você tem observado o real, o agora não é memória. Na observação não há lugar para a memória. O real é o que está de fato acontecendo. O instante seguinte já é mensurável e esse é o caminho da memória. Para observar o movimento de um inseto é preciso atenção — isso se você está interessado em observar o inseto, ou seja lá o que for que lhe interesse. Novamente, essa atenção não é mensurável. É responsabilidade do educador entender toda a natureza e estrutura da memória, observar essa limitação e ajudar o estudante a ver isso. Aprendemos dos livros ou de um professor que tem muita informação sobre determinado assunto, e nossos cérebros ficam preenchidos com essa informação. Essa informação é sobre as coisas, sobre a natureza, sobre tudo que está fora de nós. Quando queremos aprender sobre nós mesmos, voltamo-nos para os livros que falam disso. Assim, esse processo continua interminavelmente, e nos tornamos gradualmente seres humanos de segunda mão. Esse é um fato que se observa por todo o mundo, e essa é a nossa educação moderna. O ato de aprender, como assinalamos, é um ato de observação pura e essa observação não está contida dentro da limitação da memória. Aprendemos a ganhar a vida, mas nunca vivemos. A capacidade de ganhar a vida toma a maior parte de nossa vida; dificilmente temos tempo para outras coisas. Encontramos tempo para falar de futilidades, para nos divertir, para jogar, mas isso tudo não é viver. Existe um campo — que é o viver real — totalmente negligenciado.
  • 26. Para aprender a arte de viver devemos ter lazer. A palavra lazer é muito mal compreendida, como dissemos na nossa terceira carta. Geralmente significa não estar ocupado com as coisas que temos que fazer — como ganhar a vida, ir ao escritório, ir à fábrica, etc., e somente quando isso acaba é que há lazer. Durante o lazer — isso que é chamado de lazer — você quer se divertir, relaxar, quer fazer as coisas de que realmente gosta ou que exigem sua capacidade máxima. O seu ganhar a vida — seja lá o que você faça — está em oposição ao que é tido como lazer. Assim, há sempre esforço, tensão, e a fuga dessa tensão é o lazer, que é quando você não está sob pressão. Durante esse lazer você pega um jornal, abre um romance, conversa, joga, etc. Esse é o fato real. Isso é o que está acontecendo em todo lugar. Ganhar a vida é a negação do viver. Assim, chegamos à questão: o que é lazer? Lazer, como é entendido, é uma pausa na pressão de ganhar a subsistência. A pressão de ganhar a vida ou qualquer pressão que nos é imposta geralmente consideramos como sendo ausência de lazer, mas existe uma pressão muito maior em nós, consciente ou inconsciente, que é o desejo — entraremos nisso depois. A escola é um lugar de lazer. É somente quando você tem lazer que você pode aprender. Ou seja, aprender só pode acontecer quando não há qualquer tipo de pressão. Quando você é confrontado com um perigo ou uma cobra, há um tipo de aprender a partir da pressão do próprio fato do perigo. O aprender sob essa pressão é o cultivo da memória que lhe ajudará a reconhecer um perigo futuro, e então se torna uma resposta mecânica. Lazer implica uma mente que não está ocupada. Só assim existe um estado de aprender. A escola é um lugar de aprender e não apenas um lugar de acumular conhecimento. É realmente importante entender isso. Como dissemos, o conhecimento é necessário e tem seu próprio — e limitado — lugar na vida. Infelizmente essa limitação tem devorado toda a nossa vida e não temos espaço para aprender. Estamos tão ocupados com nossa subsistência que isso tira toda a energia do mecanismo do pensamento, de tal forma que no fim do dia estamos exaustos e precisamos ser estimulados. Nós nos recuperamos dessa exaustão através do entretenimento — religioso ou outro qualquer. Essa é a vida dos seres humanos. Os seres humanos criaram uma sociedade que exige todo o seu tempo, toda a sua energia, toda a sua vida. Não existe lazer para aprender e assim a vida se torna mecânica, quase sem sentido. Assim devemos ser bem claros em relação ao entendimento da palavra lazer — um tempo, um período, quando a mente não está ocupada com o que quer que seja. É um tempo de observação. É só uma mente desocupada que pode observar. Uma observação livre é o movimento de aprender. Isso liberta a mente de ser mecânica. Assim, será que o professor, o educador, pode ajudar o aluno a entender tudo que implica a questão de ganhar a vida e toda pressão por trás disso? O aprender que ajuda você a adquirir um trabalho com todo o medo, a apreensão
  • 27. do amanhã, a ansiedade que ele provoca. Porque o próprio professor compreendeu a natureza do lazer e da observação pura — de modo que ganhar a vida não se torne uma tortura, um grande esforço por toda a vida — ele pode ajudar o aluno a ter uma mente que não seja mecânica? É responsabilidade total do professor cultivar o florescimento da bondade numa atmosfera de lazer. Por essa razão as escolas existem. É responsabilidade do professor criar uma nova geração para mudar a estrutura social de modo que ganhar a vida deixe de ser a preocupação exclusiva. Então, ensinar se torna um ato sagrado.
  • 28. CARTA 8 O sentimento de ser totalmente responsável pelas nossas ações 15 de dezembro de 1978 Em uma das cartas anteriores falamos que a responsabilidade total é amor. Essa responsabilidade não é por uma nação particular ou por um determinado grupo, uma comunidade ou por uma divindade particular, ou por alguma forma de programa político, ou por seu próprio guru, mas por toda humanidade. Isso precisa ser compreendido e sentido profundamente; essa é a responsabilidade do educador. Quase todos nós nos sentimos responsáveis pelas nossas famílias, crianças e assim por diante, mas não temos o sentimento de estarmos totalmente interessados e comprometidos com o ambiente ao redor de nós, com a natureza, ou totalmente responsáveis pelas nossas próprias ações. Esse cuidado absoluto é amor. Sem esse amor não pode haver nenhuma mudança na sociedade. Os idealistas, ainda que possam amar seus ideais ou seus conceitos, não têm produzido uma sociedade radicalmente diferente. Os revolucionários, os terroristas não têm, de forma alguma, mudado fundamentalmente o padrão da nossa sociedade. Os revolucionários fisicamente violentos têm falado sobre liberdade para todos os seres humanos, formando uma nova sociedade, mas todos os jargões e slogans têm torturado ainda mais o espírito e a existência. Eles têm distorcido as palavras para ajustá-las ao seu próprio ponto de vista limitado. Nenhuma forma de violência tem mudado a sociedade no seu sentido mais fundamental. Grandes governantes, através da autoridade de uns poucos, têm produzido algum tipo de ordem na sociedade. Mesmo os totalitários têm superficialmente estabelecido uma aparência de ordem através da violência e da tortura. Nós não estamos falando sobre esse tipo de ordem na sociedade. Estamos dizendo definitivamente e o mais enfaticamente possível que é somente a total responsabilidade por toda humanidade — que é amor — que pode transformar profundamente o estado atual da sociedade. Qualquer que seja o sistema existente nas várias partes do mundo, ele é corrupto, degenerado e completamente imoral. Você tem apenas que olhar ao seu redor para ver esse fato. Milhões e milhões são gastos com armamentos por todo o mundo e todos
  • 29. os políticos falam de paz enquanto preparam a guerra. As religiões têm declarado repetidamente a santidade da paz, mas elas mesmas têm incentivado guerras e formas sutis de violência e tortura. Existem inumeráveis divisões e seitas com seus sacerdotes, rituais e todo esse disparate que continua em nome de Deus e da religião. Onde há divisão necessariamente há desordem, briga, conflito — quer seja religioso, político ou econômico. Nossa sociedade moderna é baseada na avidez, na inveja e no poder. Quando você considera isso tudo como realmente é — esse comercialismo esmagador —, percebe que tudo isso indica degeneração e imoralidade básica. Mudar radicalmente o padrão da nossa vida, que é a base de toda sociedade, é a responsabilidade do educador. Nós estamos destruindo a terra e todas as coisas que estão nela estão sendo destruídas para nossa gratificação. A educação não e meramente o ensino de várias matérias acadêmicas, mas o cultivo da total responsabilidade no estudante. Não nos damos conta, como educadores, que estamos formando uma nova geração. A maioria das escolas está somente Interessada em transmitir conhecimento. Não estão, de jeito nenhum, interessadas na transformação do homem e de sua vida diária, e você — o educador nas nossas escolas — precisa ter esse profundo interesse e o zelo por essa responsabilidade total. Então, de que maneira você pode ajudar o estudante a sentir essa qualidade de amor com toda a sua excelência? Se você não sente isso profundamente em si mesmo, é sem sentido falar sobre responsabilidade. Como um educador, você pode sentir a verdade disso? Ver a verdade disso produzirá naturalmente esse amor e a total responsabilidade. Você tem que ponderar sobre isso, observar isso diariamente na sua vida, nas suas relações com sua esposa, seus amigos, seus alunos. E no seu relacionamento com os estudantes você falará sobre isso a partir do seu coração — não buscando meramente a clareza verbal. O sentimento por essa realidade é o maior presente que o homem pode ter e, uma vez que ele esteja vivo, você descobrirá a palavra apropriada, a ação certa e o comportamento correto. Quando você leva em conta o estudante, verá que ele vem a você totalmente despreparado para tudo isso. Ele vem a você assustado, nervoso, ansioso para agradar ou na defensiva; vem condicionado por seus pais e pela sociedade na qual ele tem vivido os seus poucos anos. Você tem que ver esse passado dele; você tem que estar interessado no que ele realmente é, e não impor sobre ele suas opiniões próprias, julgamentos e conclusões. Ao considerar o que ele é se revelará o que você é; portanto, você descobrirá que o estudante é você. Agora, será que você, ensinando matemática, física etc. — matérias que o aluno deve saber por ser o jeito de ganhar a subsistência —, pode transmitir ao aluno que ele é responsável pelo todo da humanidade? Ainda que ele possa estar
  • 30. trabalhando por sua própria carreira, seu próprio modo de vida, isso não fará sua mente estreita. Ele verá o perigo da especialização com todas suas limitações e sua peculiar brutalidade. Você tem que ajudá-lo a ver tudo isso. O florescimento da bondade não se encontra em saber matemática e biologia ou em passar nos exames e ter uma carreira bem sucedida. Ele existe fora disso e, quando existe esse florescimento, a carreira e as outras atividades necessárias são tocadas por sua beleza. Agora, nós colocamos a ênfase na pessoa e desconsideramos inteiramente o florescimento. Nas nossas escolas estamos tentando juntar esses dois aspectos, não artificialmente, não como um princípio ou padrão que vocês estão seguindo, mas porque vocês estão vendo a verdade absoluta de que esses aspectos devem fluir juntos para a regeneração do homem. Você pode fazer isso? — não porque você concorda em fazê-lo após conversar sobre isso e chegar a alguma conclusão, mas sim por ver com o olhar interior a extraordinária gravidade da questão; ver por você mesmo. Então o que você fala terá significado. Então você se torna um centro de luz não aceso pelo outro. Como você é a totalidade da humanidade — o que é uma realidade, não uma afirmação verbal —, você é completamente responsável pelo futuro do homem. Por favor, não considere isso como um dever. Se você o faz, esse dever é um monte de palavras sem nenhuma realidade. É uma ilusão. Essa responsabilidade tem sua própria alegria, seu próprio humor, seu próprio movimento sem o peso do pensamento.
  • 31. CARTA 9 A constante preocupação consigo mesmo é negligência 1º de janeiro de 1979 Parece que, como estamos interessados em educação, há dois fatores que precisamos ter em mente o tempo todo. Um é a diligência e o outro é a negligência. A maioria das religiões tem falado sobre a atividade da mente, para ser controlada, moldada pela vontade de Deus ou por algum agente externo; e a devoção a alguma divindade, feita pela mão ou pela mente, necessita de uma peculiar qualidade de atenção na qual a emoção, o sentimento e a imaginação romântica estão envolvidos. Essa é a atividade da mente que é o pensamento. A palavra diligência implica cuidado, vigilância, observação e um profundo senso de liberdade. A devoção a um objeto, a uma pessoa ou a um princípio nega essa liberdade. Diligência é a atenção que produz naturalmente cuidado infinito, interesse e o frescor da afeição. Tudo isso exige grande sensibilidade. Nós somos sensíveis aos nossos próprios desejos ou às nossas feridas psicológicas, ou somos sensíveis a uma pessoa particular, vendo seus desejos e respondendo rapidamente às suas necessidades; mas esse tipo de sensibilidade é muito limitada e dificilmente pode ser chamada de sensibilidade. A qualidade de sensibilidade que estamos falando acontece naturalmente quando há a responsabilidade total que é amor. A diligência tem essa qualidade. A negligência é indiferença, preguiça; indiferença para com o organismo físico, para com o estado psicológico e indiferença para com os outros. Na indiferença existe insensibilidade. Nesse estágio a mente se torna preguiçosa, a atividade do pensamento se retarda, a rapidez da percepção é negada e a sensibilidade é uma coisa que fica incompreensível. A maioria de nós é às vezes diligente, mas muito mais frequentemente negligente. As duas não são opostas realmente. Se o fossem, a diligência ainda seria parte da negligência e, portanto, não seria verdadeiramente diligência. A maioria das pessoas é diligente em relação aos seus próprios interesses pessoais, quer esse interesse pessoal seja identificado com a família, com um grupo particular, uma seita ou nação. Nesse interesse próprio existe o germe da negligência, embora haja uma constante preocupação consigo mesmo. Essa
  • 32. preocupação é limitada e, portanto, ela é negligência. Essa preocupação é energia contida dentro de limites estreitos. A diligência é a libertação da ocupação pessoal e traz uma abundância de energia. Quando a pessoa compreende a natureza da negligência, a diligência passa a existir sem qualquer esforço. Quando isso é inteiramente compreendido — não apenas a definição verbal da negligência e da diligência —, então a mais alta excelência em nosso pensamento, ação e comportamento se manifestará. Mas, infelizmente, nunca exigimos de nós mesmos a mais alta qualidade de pensamento, ação e comportamento. Nós quase nunca desafiamos a nós mesmos e se eventualmente o fazemos, temos várias desculpas para não responder inteiramente. Isso indica uma indolência da mente, uma fraca atividade do pensamento, não é mesmo? O corpo pode estar preguiçoso, mas nunca a mente com sua rapidez de pensamento e sutileza. A preguiça do corpo pode ser facilmente entendida. Essa preguiça pode existir porque a pessoa está trabalhando excessivamente ou por causa de indulgência excessiva ou tem feito esporte muito puxado. Assim, o corpo requer repouso, o que pode ser considerado preguiça, embora não o seja. A mente vigilante, estando alerta, sensível, sabe quando o organismo precisa de repouso e cuidado. Nas nossas escolas é importante entender que a qualidade de energia que é diligência requer o tipo de comida adequada, o tipo de exercício adequado e sono suficiente. O hábito, a rotina é o inimigo da diligência — o hábito do pensamento, da ação, da conduta. O pensamento em si mesmo cria seu próprio padrão e vive dentro dele. Quando esse padrão é desafiado, ou ele é desconsiderado ou o pensamento cria um outro padrão de segurança. Esse é o movimento do pensamento — de um padrão a outro, de uma conclusão, uma crença a outra. Essa é a própria negligência do pensamento. A mente que é diligente não tem hábito, não há padrão de resposta. É um movimento sem fim, nunca se enredando nos hábitos, nunca se prendendo a conclusões. O movimento tem grande profundidade e volume quando não há o limite produzido pela negligência do pensamento. Como nós estamos agora interessados em educação, de que maneira pode o professor transmitir essa diligência com sua sensibilidade, com seu cuidado abundante no qual a preguiça de espírito não tem lugar? É claro que está entendido que o educador está interessado nessa questão e vê a importância da diligência ao longo dos dias de sua vida. Se ele está interessado, então como ele começará a cultivar essa flor da diligência? Ele está profundamente interessado no estudante? Ele realmente toma a total responsabilidade por essas pessoas jovens que estão em seu encargo? Ou ele está lá meramente para ganhar sua subsistência, preso na miséria do ter pouco? Como nós apontamos nas cartas anteriores, ensinar é a mais alta capacidade do homem. Você está lá e você tem os estudantes diante de você. Você é indiferente? Será que os seus problemas pessoais, em casa, estão desperdiçando a sua energia?
  • 33. Carregar problemas psicológicos de um dia para o outro é um desperdício total de tempo e energia, indicando negligência. Uma mente diligente encara o problema assim que ele surge, observa a natureza dele e o resolve imediatamente. Arrastar um problema psicológico não resolve o problema. É um desperdício de energia e do espírito. Quando você soluciona o problema assim que ele surge, então irá descobrir que não existe problema realmente. Assim devemos voltar à questão: como um educador nessas ou em qualquer outra escola, você pode cultivar essa diligência? É somente nisso que o florescimento da bondade passa a existir. É sua responsabilidade total e irrevogável — e nela está esse amor que naturalmente vai encontrar um jeito de ajudar o estudante.
  • 34. CARTA 10 Uma seriedade onde existe liberdade e felicidade 15 de janeiro de 1979 É importante que o professor se sinta seguro nessas escolas tanto do ponto de vista econômico quanto psicológico. Alguns professores podem estar dispostos a ensinar sem muita preocupação com sua posição econômica; eles podem ter vindo pelos ensinamentos e por razões psicológicas, mas cada professor deveria se sentir seguro no sentido de se sentir em casa, de se sentir cuidado, sem preocupações financeiras. Se o próprio professor não se sente seguro e, portanto, não se sente livre para dar atenção ao estudante e à sua segurança, ele não será capaz de ser totalmente responsável. Se o professor, em si mesmo, não está feliz, sua atenção ficará dividida e ele será incapaz de exercitar toda sua capacidade. Assim, torna-se importante que escolhamos os professores corretos, convidando cada um deles para passar algum tempo em nossas escolas, para descobrir se ele ou ela pode alegremente se juntar ao que está sendo feito. Isso deve ser mútuo. Então o professor, estando feliz, seguro, sentindo que está em casa, pode criar no estudante essa qualidade de segurança, esse sentimento que a escola é o seu lar. Sentir-se em casa implica que não há sentimento de medo, que ele está protegido fisicamente, sendo cuidado, que está livre, não é? A proteção, mesmo que o estudante possa ter objeção à idéia de ser protegido, resguardado, não significa que ele está encerrado em uma prisão, confinado e observado criticamente. A liberdade, obviamente, não significa fazer o que se quer, e é igualmente óbvio que não se pode nunca fazer totalmente o que se quer. A tentativa de fazer o que se quer — a chamada liberdade individual, que é escolher um curso de ação de acordo com o próprio desejo — trouxe confusão social e econômica no mundo. A reação a essa confusão e o totalitarismo. A liberdade é um negócio muito complexo. Devemos abordá-la com atenção total, pois a liberdade não é o oposto da servidão, ou um escape das circunstâncias em que estamos presos. Não é liberdade de algo ou evitar o
  • 35. constrangimento. A liberdade não tem oposto; ela existe por si mesma. O próprio entendimento da natureza da liberdade é o despertar da inteligência. Não é um ajustamento ao que é, mas o entendimento do que é e, assim, ir além dele. Se o professor não entender a natureza da liberdade, ele apenas irá impor aos estudantes os seus preconceitos, suas limitações, suas conclusões. Dessa forma, o estudante naturalmente irá resistir ou aceitar através do medo, tornando-se um ser humano convencional, seja tímido ou agressivo. É somente no entendimento dessa liberdade de viver — não a idéia dela ou a aceitação verbal dela, que se torna um slogan — que a mente é livre para aprender. Uma escola, afinal de contas, é um lugar onde o estudante está basicamente feliz, não está intimidado, ameaçado pelos exames, não está compelido a agir de acordo com um padrão, um sistema. É um lugar onde a arte de aprender está sendo ensinada. Se o estudante não é feliz, ele é incapaz de aprender essa arte. Memorizar, gravar informação é considerado aprendizado. Isso produz uma mente que é limitada e, portanto, pesadamente condicionada. A arte de aprender é dar o lugar apropriado à informação, agir com toda habilidade de acordo com o que foi aprendido, mas, ao mesmo tempo, é não ficar psicologicamente amarrado pelas limitações do conhecimento e imagens e símbolos que o pensamento cria. Arte quer dizer colocar tudo em seu lugar apropriado, não de acordo com algum ideal. Entender o mecanismo dos ideais é aprender a arte da observação. Um conceito formado pelo pensamento, tanto no futuro quanto de acordo com o passado, é um ideal — uma idéia projetada ou uma lembrança. É um jogo de sombras, é fazer uma abstração da realidade. Essa abstração é um evitar o que está acontecendo agora. Esse escape do fato é infelicidade. Agora, como professores, podemos ajudar o estudante a ser feliz no sentido real? Podemos ajudá-lo a se interessar pelo que está realmente acontecendo? Isso é atenção. O estudante está sendo atento ao observar uma folha que treme ao sol. Nesse momento, forçá-lo de volta ao livro é desencorajar a atenção; enquanto ajudá-lo a observar completamente aquela folha o faz ficar desperto, consciente da profundidade da atenção, na qual não existe distração. Da mesma forma, porque ele acabou de ver o que implica atenção, ele será capaz de voltar ao livro ou a seja lá o que esteja sendo ensinado. Nessa atenção não existe compulsão, nem ajustamento. É a liberdade na qual existe observação total. Pode o próprio professor ter essa qualidade de atenção? Só assim ele pode ajudar outra pessoa. A maioria de nós luta contra as distrações. Não existem distrações. Suponha que você está sonhando acordado ou que a sua mente está vagando; isso é o que na realidade está acontecendo. Observe isso. Essa observação é atenção. Assim, não existe distração.
  • 36. Isso pode ser ensinado aos estudantes, essa arte pode ser aprendida? Você é totalmente responsável pelo estudante, você deve criar essa atmosfera de aprendizagem, uma seriedade na qual existe um senso de liberdade e felicidade.
  • 37. CARTA 11 Ideais corrompem a mente 1º de fevereiro de 1979 Como já apontamos inúmeras vezes nessas cartas, as escolas existem principalmente para produzir uma profunda transformação nos seres humanos. O educador é inteiramente responsável por isso. A menos que o professor perceba esse fator central, ele estará apenas instruindo o estudante a se tornar um homem de negócios, um engenheiro, um advogado ou um político. Existem tantos desses que parecem ser incapazes de transformar tanto a si mesmos quanto a sociedade em que vivem. Talvez, na atual estrutura da sociedade, advogados e homens de negócios possam ser necessários, mas quando essas escolas surgiram, a intenção era — e continua sendo — transformar o homem profundamente. Os professores nessas escolas deveriam realmente entender isso, não intelectualmente, não como uma idéia, mas porque eles vêem, com o seu ser inteiro, toda a implicação disso. Estamos interessados no desenvolvimento total do ser humano, não apenas na acumulação de conhecimento. Idéias e ideais são uma coisa, e o fato, o acontecimento real, outra coisa. Os dois nunca podem ocorrer juntos. Os ideais têm sido impostos sobre os fatos e distorcem o que está acontecendo para ajustar ao que deveria ser, o ideal. A utopia é uma conclusão tirada do que está acontecendo e sacrifica o que é real para ajustar ao que tem sido idealizado. Esse tem sido o processo por milênios e cada estudante e todos os intelectuais deleitam-se em idealizações. Evitar o que é, é o início da corrupção da mente. Essa corrupção impregna todas as religiões, a política e a educação, todos os relacionamentos humanos. O entendimento desse processo de evitação e ir além dele é o nosso interesse. Os ideais corrompem a mente: eles nascem de idéias, julgamentos e esperança. Idéias são abstrações do que é, e qualquer idéia ou conclusão sobre o que está realmente acontecendo distorce o que esta acontecendo, e assim a corrupção acontece. Os ideais tiram a atenção do fato, do que é, e assim direcionam a atenção para o fantasioso. Esse movimento de afastamento do fato leva aos símbolos, imagens, que então assumem uma importância que nos absorvem totalmente. Esse movimento para longe do fato é a corrupção da mente. Os seres humanos são indulgentes com esse movimento nas conversas, em seus
  • 38. relacionamentos, em quase tudo que eles fazem. O fato é instantaneamente traduzido em uma idéia ou uma conclusão que então dita as nossas reações. Quando algo é visto, o pensamento imediatamente faz uma cópia e ela se torna o real. Você vê um cachorro e o pensamento torna isso em seja lá que imagem você possa ter sobre cachorros, e assim você nunca vê o cachorro. Isso pode ser ensinado aos estudantes: a permanecerem com o fato, com o que realmente está acontecendo na hora, seja psicologicamente, seja externamente? O conhecimento não é o fato; é a respeito do fato, e isso tem o seu lugar próprio, mas o conhecimento impede a percepção do que realmente é; então a corrupção acontece. É realmente muito importante entender isso. Ideais são considerados nobres, são exaltados, de grande e importante significado, e o que está realmente acontecendo é considerado algo meramente sensorial, mundano e de menor valor. As escolas por todo mundo têm algum propósito elevado, algum ideal; assim elas estão educando os estudantes em corrupção. O que corrompe a mente? Estamos usando a palavra mente englobando os sentidos, a capacidade de sentir, e o cérebro que armazena todas as memórias e experiências como conhecimento. Esse movimento total é a mente. O consciente, tanto quanto o inconsciente, é a chamada superconsciência — a totalidade disso é a mente. Estamos perguntando quais são os fatores, as sementes da corrupção em tudo isso? Dissemos que ideais corrompem. O conhecimento também corrompe a mente. O conhecimento, particular ou generalizado, é o movimento do passado, e quando o passado obscurece o presente, a corrupção acontece. O conhecimento, projetado no futuro e direcionado ao que esta acontecendo agora, é corrupção. Estamos usando a palavra corrupção querendo dizer isso que está fragmentado; dividido, aquilo que não é tomado como um todo. O fato nunca pode ser fragmentado; o fato nunca pode ser limitado pelo conhecimento. A completude do fato abre a porta ao infinito. A completude não pode ser dividida; não é contraditória em si mesma; não pode dividir a si mesma. Completude, totalidade, é movimento infinito. Imitação, ajustamento, é um dos grandes fatores de corrupção da mente; o exemplo, o herói, o salvador, o guru, é o fator mais destrutivo da corrupção. Seguir, obedecer, ajustar nega a liberdade. A liberdade está desde o início, não no fim. Não é ajustar-se, imitar, aceitar primeiro e depois encontrar a liberdade. Esse é o espírito do totalitarismo, seja do guru ou do sacerdote. Essa é a crueldade, a dureza do ditador, da autoridade, do guru ou do sacerdote mais elevado. Assim, autoridade é corrupção. Autoridade é a fragmentação da integridade, do todo, do que é completo — a autoridade de um professor em uma escola, a autoridade de um propósito, de um ideal, daquele que diz “Eu sei”, a autoridade de uma instituição. A pressão da autoridade em qualquer forma é o fator
  • 39. deformante da corrupção. Autoridade basicamente nega liberdade. É função de um verdadeiro professor instruir, apontar, informar, sem a corruptora influência da autoridade. A autoridade da comparação destrói. Quando um estudante é comparado com outro, ambos estão sendo feridos. Viver sem comparação é ter integridade. Você, professor, fará isso?
  • 40. CARTA 12 Educação é libertar a mente do eu 15 de fevereiro de 1979 Parece que os seres humanos têm uma grande quantidade de energia. Eles já estiveram na lua, já escalaram os picos mais altos da terra, eles têm uma energia prodigiosa para a guerra, para fazer os instrumentos de guerra, uma grande energia para os avanços tecnológicos, para acumular o vasto conhecimento que o ser humano tem reunido, para trabalhar todo dia, energia para construir pirâmides e para explorar o átomo. Quando se considera tudo isso é impressionante perceber a energia que o homem tem despendido. Essa energia foi colocada na investigação de coisas externas, mas o homem tem dado muito pouca importância para a investigação de toda estrutura psicológica de si mesmo. É preciso energia, tanto externamente quanto internamente, para agir ou para estar totalmente silencioso. A ação e a não-ação requerem grande energia. Nós temos usado a energia positivamente em guerras, em escrever livros, em operações cirúrgicas e para trabalhar dentro do mar. A não-ação requer muito mais ação que a chamada ação positiva. A ação positiva é controlar, apoiar, escapar. A não-ação é a atenção total da observação. Nessa observação aquilo que está sendo observado sofre uma transformação. Essa observação silenciosa exige não apenas energia física, mas também uma profunda energia psicológica. Nós estamos acostumados à primeira dessas duas, e esse condicionamento limita a nossa energia. Em uma observação completa, silenciosa, que é não-ação, não existe gasto de energia, e assim a energia é ilimitada. A não-ação não é o oposto da ação. Ir trabalhar diariamente, ano após ano por tanto tempo, que pode ser necessário do jeito que as coisas estão, limita, mas não trabalhar não significa que você vai ter energia ilimitada. A própria indolência da mente é um desperdício de energia, assim como a preguiça do corpo. Nossa educação, em qualquer campo, restringe essa energia. Nosso modo de viver, que é uma luta constante para tornar-se algo, ou não, é dissipação da energia. A energia é fora do tempo e não é para ser medida. Mas nossas ações são mensuráveis e assim reduzimos essa energia ilimitada ao estreito círculo do eu. E a tendo confinado, então buscamos o imensurável. Essa busca é parte da ação
  • 41. positiva e, portanto, é um desperdício da energia psicológica. Assim existe um movimento sem fim dentro dos arquivos do eu. Em educação o que nos interessa é libertar a mente do eu. Como dissemos em inúmeras ocasiões nessas cartas, é nossa função fazer surgir uma nova geração livre dessa energia limitada — que é chamada o eu. Deve ser mais uma vez repetido que essas escolas existem para fazer surgir isso, Na nossa carta anterior, falamos sobre a corrupção da mente. A raiz dessa corrupção é o eu. O eu é a imagem, a representação, o mundo que é passado de geração em geração, e a pessoa tem de lutar contra esse peso da tradição do eu. Isso é o fato — não as consequências desse fato ou como o fato chegou a existir— o que é bem fácil de explicar; mas observar o fato com todas as suas reações, sem motivo que o distorça, é ação negativa. Isso então transforma o fato. É importante entender isso bem profundamente; não agir sobre o fato, mas observar o que é. Todo ser humano está ferido tanto psicológica quanto fisicamente. É fácil lidar com a dor física, mas a dor psicológica permanece escondida. A consequência dessa ferida psicológica é construir um muro em volta de si mesmo, resistir a outras dores e assim se tornar amedrontado ou se retirar no isolamento. A ferida foi causada pela imagem do eu com sua energia limitada. Porque a imagem é limitada, ela pode ser ferida. Aquilo que não é mensurável nunca pode sofrer dano, nunca pode ser corrompido. Qualquer coisa que é limitada pode ser ferida, mas aquilo que é inteiro está além do alcance do pensamento. Pode o educador ajudar o estudante a nunca ser ferido psicologicamente, não apenas enquanto ele faz parte da escola, mas durante toda a sua vida? Se o educador vê o grande dano que vem dessa ferida, então como vai educar o estudante? O que realmente vai fazer para cuidar que o estudante nunca seja ferido ao longo da sua vida? O estudante vem para a escola já tendo sido ferido. Provavelmente não se dá conta dessa ferida. O professor, ao observar suas reações, seus medos e agressividade, vai descobrir o dano que foi feito. Assim o professor tem dois problemas: libertar o estudante de seus danos passados e prevenir futuras feridas. É esse o seu interesse? Ou você apenas lê esta carta, entende intelectualmente — o que não é entendimento de forma alguma — e assim não está interessado no estudante? Mas se você está interessado, como deveria estar, o que vai fazer com esse fato — que ele está ferido e que você tem que, a qualquer custo, prevenir feridas futuras? Como você aborda esse problema? Qual é o estado da sua mente quando encara esse problema? É também o seu problema, não é só do estudante. Você está ferido como também o estudante está ferido. Assim, os dois estão envolvidos. Não é um problema unilateral; você está tão envolvido quanto o estudante. Esse envolvimento é o fator central com que você tem de se defrontar, observar. Apenas ter o desejo de ser livre das suas feridas passadas e esperar nunca mais ser ferido de novo
  • 42. é um desperdício de energia. A atenção completa, a observação desse fato não apenas vai contar a história dessa ferida, mas essa própria atenção dissipa, limpa a ferida. Assim a atenção é essa vasta energia que nunca pode ser ferida ou corrompida. Por favor, não aceite o que está sendo dito nestas cartas. Aceitação é destruição da verdade. Teste isso — não em uma data futura, mas teste enquanto lê essa carta. Quando você testa isso, não casualmente, mas com todo o seu coração, com todo o seu ser, então vai descobrir por si mesmo a verdade da questão. E somente então será capaz de ajudar o estudante a limpar o passado e ter uma mente que é incapaz de ser ferida.
  • 43. CARTA 13 Indulgência com as coisas que não têm sentido é desperdício de energia 1º de março de 1979 Essas cartas são escritas com um espírito amigável. Elas não pretendem sobrepor-se ao seu modo de pensar ou persuadi-lo a ajustar-se ao modo que o escritor pensa ou sente. Elas não são propaganda. Elas são realmente um diálogo entre você e o escritor, dois amigos conversando juntos dos seus problemas, e em uma boa amizade não existe nunca qualquer senso de competição ou dominação. Você também deve ter observado o estado do mundo e da nossa sociedade, e que deve haver uma transformação radical no jeito com que os seres humanos vivem, na sua relação uns com os outros, na relação com o mundo como um todo; uma transformação em toda e qualquer maneira possível. Estamos falando um com o outro, estamos ambos profundamente interessados não somente em nossas próprias personalidades, mas também nos estudantes pelos quais vocês são inteiramente responsáveis. O professor é a pessoa mais importante na escola, pois o futuro bem-estar da humanidade depende dele. Essa não é uma mera afirmação verbal. É um fato absoluto e irrevogável. Apenas quando o próprio educador sentir a dignidade e o respeito implícitos no seu trabalho, ele irá perceber que ensinar é o mais alto chamado, maior que aquele do político, maior que o dos príncipes do mundo. Cada uma dessas palavras o escritor diz a sério, e assim, por favor, não as coloque de lado como se fosse um exagero ou uma tentativa de fazer vocês sentirem uma importância falsa. Vocês e os estudantes devem florescer juntos em bondade. Estivemos apontando a corrupção ou os fatores degenerativos da mente. Como a sociedade está se desintegrando, essas escolas precisam ser centros para a regeneração da mente. Não do pensamento. O pensamento nunca pode ser regenerado, pois o pensamento é sempre limitado, mas a regeneração da totalidade da mente é possível. Essa possibilidade não é conceitual, mas real quando se examina profundamente o processo de degeneração. Nas cartas anteriores exploramos alguns deles.
  • 44. Agora temos de investigar também a natureza destrutiva da tradição, do hábito e dos processos repetitivos de pensamento. Seguir, aceitando a tradição, parece dar uma certa segurança à própria vida, tanto à vida exterior quanto à interior. A busca por segurança, de todas as maneiras possíveis, tem sido o motivo, a força motriz da maior parte das nossas ações. A exigência de segurança psicológica se sobrepõe à segurança física, e assim torna a segurança física incerta. Essa segurança psicológica é a base da tradição, transmitida de uma geração à outra através das palavras, através de rituais, crenças — sejam religiosas, políticas ou sociológicas. Nós raramente questionamos a norma aceita, mas quando o fazemos, invariavelmente caímos na armadilha de um novo padrão. Esse tem sido o nosso modo de viver: rejeitar um e aceitar o outro. O novo é mais atraente e o velho é deixado para a geração passada. Mas as duas gerações estão presas em padrões, em sistemas, e esse é o movimento da tradição. A própria palavra tradição implica ajustamento, seja tradição moderna ou antiga. Não existe boa ou má tradição: existe apenas tradição, a vã repetição de rituais em todas as igrejas, templos e mesquitas. Eles são totalmente sem sentido, mas a emoção, o sentimento, o romantismo, a imaginação emprestam-lhes cor e ilusão. Essa é a natureza da superstição e cada sacerdote no mundo encoraja isso. Esse processo de se abandonar às coisas que não têm sentido ou investir em coisas sem significado é um desperdício de energia que degenera a mente. Temos de estar profundamente atentos a esses fatos e essa própria atenção dissolve todas as ilusões. Também existe o hábito. Não há bons ou maus hábitos — somente hábitos. Hábito implica uma ação repetitiva que surge de não se estar atento. A pessoa cai no hábito deliberadamente ou é persuadida pela propaganda; ou, estando com medo, cai nos reflexos autoprotetores. Dá-se o mesmo com o prazer. Seguir uma rotina, por mais efetiva ou necessária que seja na vida quotidiana, pode levar, e geralmente o faz, a um modo de vida mecânico. A pessoa faz a mesma coisa à mesma hora todo dia sem que isso se torne um hábito quando existe uma atenção ao que está sendo feito. A atenção dissipa o hábito. É somente quando não existe atenção que os hábitos são formados. Você pode se levantar à mesma hora toda manhã e você sabe por que está levantando. Essa atenção pode parecer, para uma outra pessoa, um hábito, bom ou ruim, mas realmente para aquele que está atento, desperto, não existe hábito de forma alguma. Nós caímos nas rotinas ou hábitos psicológicos porque pensamos que é o modo de viver mais cômodo, e quando você observa de perto, mesmo nos hábitos formados no relacionamento — pessoal ou outro — existe uma certa qualidade de indolência, falta de cuidado e desconsideração. Tudo isso dá uma falsa sensação de intimidade, segurança e facilmente se cai na crueldade. Existe todo tipo de perigo no hábito: o hábito de fumar, a ação repetitiva, o emprego de palavras, pensamentos ou comportamento. Isso torna a mente totalmente insensível, e o processo degenerativo é encontrar alguma forma de segurança ilusória como uma nação, uma crença ou um ideal e se agarrar a isso. Todos
  • 45. esses fatores são muito destrutivos para a segurança real. Vivemos em um mundo de faz-de-conta que se tornou uma realidade. Pode-se questionar essa ilusão tornando-se um revolucionário ou aderir à permissividade. Ambos são fatores de degeneração. Afinal de contas, o cérebro com suas capacidades extraordinárias vem sendo condicionado de geração em geração a aceitar essa segurança falaciosa, que agora se tornou um hábito profundamente arraigado. Para quebrar esse hábito nós passamos por várias formas de tortura, múltiplos escapes, ou nos atiramos em alguma utopia idealista, e assim por diante. É problema do educador investigar o condicionamento; e sua capacidade criativa se encontra em observar bem de perto esse seu condicionamento profundamente enraizado, bem como o do estudante. É um processo mútuo: não que você investiga o seu condicionamento primeiro e então informa o outro das suas descobertas, mas exploram juntos e descobrem a verdade da questão. Isso exige uma certa qualidade de paciência; não a paciência do tempo, mas a perseverança e o cuidado diligente da responsabilidade total.
  • 46. CARTA 14 Por que a humanidade dá tamanha importância ao pensamento? 15 de março de 1979 Tornamo-nos demasiadamente espertos. Nosso cérebro vem sendo treinado para se tornar muito brilhante verbalmente, intelectualmente. Ele está abarrotado com uma grande quantidade de informação e usamos isso para uma carreira lucrativa. Uma pessoa esperta, intelectual, é enaltecida, distinguida. Essas pessoas parecem usurpar todos os lugares importantes no mundo: elas têm poder, posição, prestígio. Mas sua esperteza, no final, acaba por atraiçoá-las. Em seus corações elas nunca sabem o que é o amor, ou uma caridade profunda e generosidade, pois estão fechadas na sua vaidade e arrogância. Isso se tornou o padrão de todas as escolas de “alto nível”. Um menino ou menina que são aceitos na escola convencional ficam presos na civilização moderna e estão perdidos para toda a beleza da vida. Quando você caminha pelos bosques cheios de sombras, com a luz salpicada, e de repente se abre uma clareira, um espaço aberto, um campo verde rodeado por árvores majestosas ou um riacho borbulhante, você se pergunta por que o homem perdeu seu relacionamento com a natureza e a beleza da terra, com a folha que cai e com o galho quebrado. Se você perdeu o contato com a natureza, então inevitavelmente irá perder o relacionamento com outra pessoa. A natureza não é apenas as flores, o adorável gramado ou as águas que correm no seu pequeno jardim, mas toda a terra com tudo o que está nela. Achamos que a natureza existe para o nosso uso, para a nossa conveniência, e assim perdemos a comunhão com a terra. Essa sensibilidade à folha que cai e à árvore alta numa colina é bem mais importante que passar em todos os exames e ter uma carreira brilhante. Essas coisas não são o todo da vida. A vida é como um vasto rio com um grande volume de água sem começo nem fim. Nós tiramos um balde de água dessa rápida correnteza e essa água confinada se torna a nossa vida. Esse é nosso condicionamento e nosso inesgotável sofrimento. O movimento do pensamento não é a beleza. O pensamento pode criar o que parece ser belo — a pintura, a estátua de mármore ou um adorável poema — mas isso não é beleza. Beleza é suprema sensibilidade, não no sentido das
  • 47. próprias dores e ansiedades, mas abraçando toda a existência do homem. Existe beleza somente quando a corrente do eu secou completamente. Quando o eu não está, a beleza existe. Com o abandono do eu vem a paixão da beleza. Estivemos conversando juntos nestas cartas sobre a degeneração da mente. Assinalamos, para o seu exame e investigação, algumas formas dessa deterioração. Uma das suas atividades básicas é o pensamento. O pensamento é um fragmentar da totalidade da mente. O todo contém a parte, mas a parte nunca pode ser aquilo que é completo. O pensamento é a parte mais ativa da nossa vida. O sentimento vai com o pensamento. Essencialmente eles são um, embora tenhamos a tendência de separá-los. E, tendo separado, damos grande importância ao sentimento, ao romantismo e à devoção, mas o pensamento, como a corrente de um colar, tece a si mesmo através de tudo isso, escondido, vivo, controlando e moldando. Ele está sempre lá, embora gostemos de pensar que as nossas emoções profundas são essencialmente diferentes dele. Nisso se encontra uma grande ilusão, um engano que é altamente considerado e que leva à desonestidade. Como dissemos, o pensamento é a realidade de nossa vida diária. Todos os chamados livros sagrados são produto do pensamento. Eles podem ser venerados como uma revelação, mas eles são essencialmente pensamento. O pensamento criou a turbina e os grandes templos da terra, o foguete e a inimizade no homem. O pensamento tem sido responsável pelas guerras, pela linguagem que a pessoa usa e pela imagem feita pela mão ou pela mente. O pensamento domina o relacionamento. O pensamento descreveu o que é o amor, o paraíso e a dor da miséria. O homem adora o pensamento, admira suas sutilezas, sua astúcia, sua violência, sua crueldade por uma causa. O pensamento trouxe grandes avanços na tecnologia e com isso a capacidade de destruição. Essa tem sido a história do pensamento, repetida através dos séculos. Por que a humanidade tem dado essa importância extraordinária para o pensamento? Será porque é a única coisa que temos, ainda que ele seja ativado através dos sentidos? Será porque o pensamento tem sido capaz de dominar a natureza, dominar o meio ambiente, porque tem trazido alguma segurança física? Será porque ele é o maior instrumento através do qual o homem opera, vive e se beneficia? Será que é porque o pensamento criou os deuses, os salvadores, a superconsciência, esquecendo a ansiedade, o medo, o sofrimento, a inveja, a culpa? Será porque ele mantém as pessoas juntas como uma nação, como um grupo, como uma seita? Será porque ele traz esperança para uma vida sombria? Será porque ele dá uma abertura para escaparmos do nosso dia-a-dia aborrecido e tedioso? Será porque, não sabendo o que será do futuro, ele oferece a segurança do passado, com sua arrogância, com sua insistência na experiência? Será porque no conhecimento existe estabilidade, a evitação do medo na certeza do conhecido? Será porque o próprio pensamento se colocou
  • 48. em uma posição invulnerável, resistindo ao desconhecido? Será porque o amor é incontável, sem medidas, enquanto o pensamento é mensurável e resiste ao imutável movimento do amor? Nós nunca questionamos a própria natureza do pensamento. Aceitamos o pensamento como inevitável, como nossos olhos e pernas. Nunca investigamos a profundidade mesma do pensamento: e porque nunca o questionamos, ele assumiu a predominância. Ele é o tirano da nossa vida e os tiranos raramente são desafiados. Assim, como educadores, vamos expor isso à luz clara da observação. A luz da observação não somente dissipa a ilusão instantaneamente, como a claridade da sua luminosidade revela o menor detalhe daquilo que está sendo observado. Como dissemos, observação não é a partir de um ponto fixo, de uma crença, de um preconceito ou de uma conclusão. Opinião é algo bastante medíocre e assim, também, é a experiência. O homem cheio de experiência é uma pessoa perigosa, pois ele está enredado na prisão do seu próprio conhecimento. Assim, você pode observar com clareza extraordinária todo o movimento do pensamento? Essa luz é liberdade — não significa que você apreendeu isso e o emprega para sua própria conveniência e benefício. A própria observação do pensamento é a observação do seu ser inteiro, e esse próprio ser é construído pelo pensamento. Como o pensamento é finito, limitado, assim é você.
  • 49. CARTA 15 A inteligência não é acordada pelo desejo 1º de abril de 1979 Vamos ainda tratar da totalidade da mente. A mente inclui os sentidos, as emoções instáveis, a capacidade do cérebro e o pensamento sempre inquieto. Tudo isso é a mente, incluindo os vários atributos da consciência. Quando o todo da mente está em operação, ela não tem fronteira, tem grande energia e ação sem sombra de arrependimento e promessa de recompensa. Essa qualidade da mente, essa totalidade é inteligência. Será que essa inteligência pode ser transmitida ao estudante e pode-se ajudar a ele, ou a ela, a rapidamente perceber seu significado? Certamente é responsabilidade do educador produzir isso. A capacidade do pensamento é moldada e controlada pelo desejo e assim ela fica reduzida. Essa capacidade é limitada pelo movimento do desejo: o desejo é a essência da sensação. A ambição limita a capacidade do cérebro, que é o pensamento. Essa capacidade é restringida pelas exigências sociais e econômicas, pelos motivos ou pela própria experiência da pessoa. Ela é limitada por um ideal, pelas sanções das várias crenças religiosas, pelo medo sem fim. O medo não está separado do prazer. O desejo — a essência da sensação — é moldado pelo meio ambiente, pela tradição, pelas nossas próprias inclinações e temperamento. E essa capacidade ou ação, que exige energia total, é condicionada de acordo com nosso conforto e prazer. O desejo é um fator premente em nossa vida, que não é para ser suprimido, evitado, adulado ou justificado, mas compreendido. Esse entendimento só pode surgir através da investigação do desejo e da observação de seus movimentos. Conhecendo o imperioso fogo do desejo, a maior parte das proibições religiosas e sectárias fizeram do desejo algo que deve ser reprimido, controlado ou subjugado — entregue em sacrifício, por assim dizer, a uma divindade ou princípio. Os inumeráveis votos que as pessoas fizeram para negar totalmente o desejo de forma alguma o aniquilaram. Ele está lá.
  • 50. Assim, devemos abordá-lo de forma diferente, tendo em mente que a inteligência não é despertada pelo desejo. O desejo de ir à lua produz um conhecimento técnico enorme, mas esse conhecimento é inteligência limitada. O conhecimento é sempre especializado e, portanto, incompleto, enquanto nós estamos falando da inteligência que é o movimento da totalidade da mente. É nessa inteligência que estamos interessados — e despertá-la tanto no educador quanto no estudante. Como dissemos anteriormente, a capacidade é limitada pelo desejo. O desejo é sensação, a sensação de uma nova experiência, de novas formas de excitação, a sensação de escalar os picos mais altos da terra, a sensação de poder, de status. Tudo isso limita a energia do cérebro. O desejo dá ilusão de segurança, e o cérebro, que precisa de segurança, encoraja e sustenta toda forma de desejo. Assim, se não entendermos o lugar do desejo, ele leva a mente a se degenerar. É realmente importante entender isso. O pensamento é o movimento do desejo. A curiosidade para descobrir é impulsionada pelo desejo de maiores sensações e a ilusória certeza de segurança. A curiosidade produziu uma quantidade enorme de conhecimento que tem a sua importância na nossa vida diária. A curiosidade tem significado na observação. O pensamento pode ser o fator central de degeneração da mente, ao passo que o insight abre a porta para a totalidade da ação. Iremos entrar no significado completo do insight na próxima carta, mas por agora devemos considerar se o pensamento é um fator destrutivo à totalidade da mente. Nós afirmamos que ele é. Não aceite isso até que você o tenha examinado de forma completa e livre. O que queremos dizer com totalidade da mente é a capacidade infinita e seu vazio total no qual existe uma energia imensurável. O pensamento, sendo limitado por sua própria natureza, impõe sua estreiteza ao todo, e assim o pensamento fica sempre em primeiro plano. O pensamento é limitado porque é o resultado da memória e do conhecimento acumulado através da experiência. O conhecimento é o passado e o que foi é sempre limitado. A lembrança pode projetar um futuro. Esse futuro está amarrado ao passado, assim o pensamento é sempre limitado. O pensamento é medida — o mais e o menos, o maior e o menor. Essa medida é o movimento do tempo. Eu fui, eu serei. Assim, quando o pensamento predomina, por mais sutil, astuto e vital que seja, ele perverte a totalidade; e, no entanto, temos dado ao pensamento a maior importância. Se me permite perguntar, após ter lido esta carta, você percebe o significado da natureza do pensamento e da totalidade da mente? E se compreendeu, pode transmitir isso ao estudante pelo qual você tem inteira responsabilidade? Essa é uma questão difícil. Se você não tem luz, não pode ajudar outra pessoa a tê-la. Você pode explicar muito claramente ou defini-la em palavras bem escolhidas, mas isso não terá a paixão da verdade.