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OSHO
Morte
a maior das
ilusões
UNIVERSALISMO
Sumário
PARTE I
A ÚNICA CERTEZA NA VIDA É A MORTE
“Pare a roda!”
Sacrificar o hoje por um amanhã fictício
Uma porta para o divino
O mito da mortalidade
PARTE II
OS SALVADORES SÃO A SUA MORTE
Pseudo-religiões: medo da morte e da vida
O Oriente tem o fermento, o Ocidente a massa
A raiz de todos os medos
Uma fácil exploração
A vida não deve ser mitificada
PARTE III
OBSERVE E VOCÊ SABERÁ
Por que apegar-se? Simplesmente cante!
A vida é a carícia preliminar, a morte é orgástica
PARTE IV
VIAJANDO PARA O CENTRO DO SEU SER
Meditação: o caminho além
Conheça a morte sem morrer
O centro do ciclone
Uma ancestral chave de ouro
A consciência impecável traz grande alegria
O bardo tibetano
O príncipe transcendente
A beleza sem a fera
PARTE V
DESFRUTE TOTALMENTE!
UMA VISTA DOS PICOS ENSOLARADOS
Da escuridão para a luz
A realidade que não morre
Indague até o fim
Uma olhadela no ontem
Fique acordado durante o filme
O direito de morrer
A celebração não sabe nada sobre a morte
Aprenda a arte enquanto ainda há tempo
Acorde e cante
QUANDO alguém morre — quem quer que seja que você conheceu, amou e
com quem viveu, alguém que se tornou parte do seu ser, alguma coisa morre
em você também. Naturalmente, você sentirá falta da pessoa e experimentará
um vazio. Isso é natural. Mas esse mesmo vácuo pode ser convertido em porta.
E a morte é uma porta...
A morte é o único fenômeno existente que não foi corrompido pelo homem. Em
contrapartida, o homem corrompeu tudo, poluiu tudo. Somente a morte ainda
permanece virgem, não corrompida, intocada pelas mãos do homem. O homem
continua perdido em relação ao que fazer com a morte. Ele não a pode
compreender, não pode fazer dela uma ciência: eis por que a morte ainda não
foi corrompida, e atualmente apenas ela foi preservada da corrupção. É a única
coisa que permanece incorrupta no mundo.
Durante séculos nos tem sido ensinado que a morte é contrária à vida, que a
morte é inimiga da vida, que a morte é o fim da vida. Naturalmente, ficamos
assustados e não podemos relaxar, não podemos estar num let-go*. E se você
não pode estar num let-go em relação à morte, permanecerá tenso em sua vida,
porque a morte não é separada da vida.
* Let-go significa relaxar, deixar acontecer, deixar rolar.
Se você não aceita a morte, permanece incompleto, fica pela metade,
desequilibrado. Quando você aceita a morte, também se torna equilibrado.
Então, tudo é aceito: o dia e a noite. o verão e o inverno — ambas, a luz e a
escuridão. Quando as polaridades da vida são aceitas, você ganha equilíbrio.
Torna-se tranquilo, torna-se inteiro.
PARTE I
A ÚNICA CERTEZA
NA VIDA É A MORTE
“Pare a roda!”
O pai da minha mãe adoeceu subitamente. Não era hora de ele morrer. Não
tinha mais do que cinquenta anos, ou até menos: talvez tivesse menos idade do
que tenho agora. Minha avó tinha exatamente cinquenta anos: encontrava-se no
ápice da sua juventude e beleza.
Eu lhe perguntei: “Ele está morto. Você o amava. Porque não está chorando?”
Ela disse: “Por sua causa. Eu não quero chorar diante de uma criança (que
mulher era ela!) e não quero consolá-lo. Se eu começar a chorar, então,
naturalmente, você vai chorar: dai, quem vai consolar quem?”
Eu preciso descrever aquela situação. Nós estávamos num carro de boi, indo da
cidade do meu avô para a de meu pai, porque lá se encontrava o único hospital
da região. Meu avô estava gravemente enfermo. Não apenas doente, mas
inconsciente também, quase em coma. Além de meu avô, ela e eu éramos as
únicas pessoas que estavam no carro. Posso compreender a compaixão dela
por mim. Sequer chorava pela morte do seu amado marido, apenas por minha
causa: apenas eu a acompanhava, e não haveria ninguém mais para me
consolar.
Eu lhe disse: “Não se preocupe. Se você pode conter as lágrimas, eu também
posso”. Você pode ou não acreditar, mas uma criança de sete anos não
derramou uma lágrima. Até minha avó ficou perplexa e disse: “Você não está
chorando?”
Respondi: “Não quero consolar você”.
Era um grupo especial o que estava naquele carro de boi. Bhoora o dirigia. Ele
sabia que o seu patrão estava morto. Mesmo assim não se atrevia a olhar para
dentro do carro, porque ele era apenas um empregado e não cabia a ele interferir
em assuntos privados. Foi isso o que ele me disse: “A morte é um assunto
privado: como eu podia olhar? Ouvi tudo do banco de direção. Queria chorar, eu
o amava muitíssimo. Sinto-me como um órfão, mas eu não podia olhar para trás,
para dentro do carro, caso contrário ele jamais me perdoaria”.
Éramos um grupo singular, e Nana1 estava no meu colo. Eu era uma criança de
sete anos de idade convivendo com a morte, não por apenas alguns segundos,
mas ininterruptamente por vinte e quatro horas. Não havia estrada e era difícil
chegar à cidade de meu pai. A marcha era muito lenta. Nós ficamos com o corpo
morto durante vinte e quatro horas... Meu avô morreu lentamente, pouco a
pouco. Pude sentir a morte tomando conta dele e pude verificar o grande silêncio
dela.
1. Nana significa vovó.
Eu também era afortunado por minha Nani2 estar presente. Sem ela eu talvez
teria perdido a ocasião de perceber a beleza da morte, porque o amor e a morte
são tão semelhantes, talvez a mesma coisa. Ela me amava, jorrava seu amor
sobre mim, enquanto a morte estava lá, acontecendo lentamente.
2. Significa vovó.
O carro de boi... Ainda posso ouvir o seu som — o crepitar provocado pelo
movimento das rodas sobre as pedras, Bhoora gritando continuamente para os
bois, o som do chicote fustigando-os... ainda posso ouvir tudo. Está tão
profundamente enraizado em minha experiência que, acho, nem minha morte
pode apagar. Mesmo quando eu estiver morrendo, poderei ouvir novamente o
som daquele carro de boi.
Eu tinha ouvido falar sobre a morte de outras pessoas, mas apenas ouvido falar.
Não tinha visto, e, mesmo que tivesse visto, não significaria nada para mim.
Quando alguém que você ama morre, só então pode realmente encontrar-se
com a morte. Deixe-me sublinhar isto: a morte só pode ser encontrada na morte
de um ser amado.
Quando o amor, somado à morte, envolve você, há uma transformação, uma
imensa mutação, como se um novo ser estivesse nascendo. Você nunca mais
será o mesmo. Mas as pessoas não amam, e porque elas não amam, não podem
ter a experiência da morte do mesmo modo que eu a tive. Sem amor, a morte
não lhe dá as chaves da existência. Com amor, ela lhe dá a chave de tudo o que
existe.
Minha primeira experiência com a morte não foi um simples encontro. Foi
complexa de muitas maneiras. O homem que eu amava estava morrendo. Eu o
conhecera como meu pai. Ele me fizera crescer em absoluta liberdade: nenhuma
inibição, nenhuma proibição e nenhum mandamento. Ele nunca me disse: “Não
faça isso”, ou “Não faça aquilo”. Somente agora eu posso perceber a grandeza
daquele homem.
Eu amei o homem porque ele amou minha liberdade. Eu só posso amar se a
minha liberdade for respeitada. Se eu tiver de barganhar e obter amor pagando
com minha liberdade, esse amor não é para mim. Então ele é para mortais de
menor envergadura, não é para aqueles que conhecem.
“Meu Deus, esta vida que você me deu, eu lha devolvo com meus
agradecimentos.” Estas foram as últimas palavras de meu avô, embora ele
nunca tenha acreditado em Deus e não fosse um hindu.
Antes de ele morrer, entre outras coisas, dizia repetidamente: “Pare a roda...”.
Meu avô estava morrendo e nos pedia para pararmos a roda — que absurdo!
Como eu poderia parar a roda? Ele tinha de chegar ao hospital, e sem a roda
nós ficaríamos perdidos na floresta.
Meu avô disse: “Pare a roda. Rajah, você não está me ouvindo? Se eu posso
ouvir a risada da sua avó, você deve ser capaz de me ouvir”.
Eu lhe disse: “Não se preocupe com a risada. Eu conheço vovó. Ela não está
rindo do que você está dizendo, é uma coisa entre nós dois, uma piada que eu
contei a ela”.
Ele disse: “Tudo bem. Se é uma piada que você contou a ela, está perfeitamente
certo que ela ria. Mas e sobre o chakra, a roda?”
Agora sei ao que se referia, mas naquele tempo eu não estava absolutamente
familiarizado com tal terminologia. A roda representa toda a obsessão indiana
com a roda-da-vida-e-da-morte. Por milhares de anos, milhões de pessoas
estiveram fazendo somente uma coisa: tentando parar a roda. Ele não estava
falando sobre as rodas do carro de boi — esta era muito fácil de se parar; na
verdade, difícil era mantê-la em movimento.
Eu não poderia entender, naquele momento, por que meu Nana estava tão
insistente. Talvez o carro de boi — porque não havia estrada — estivesse
fazendo barulho demais. Tudo estava chacoalhando, e ele estava em agonia.
Era natural que quisesse parar a roda. Mas minha avó ria. Agora sei porque ela
ria. Sabia que estava se referindo à obsessão indiana com a vida e a morte,
simbolicamente chamada de a roda-da-vida-e-da-morte — e, abreviadamente,
de a roda, que gira sem parar...
É por isso que meu avô estava dizendo: “Pare a roda”. Se eu tivesse podido
parar a roda, eu a teria parado, não apenas para ele, mas para todas as pessoas
do mundo. Eu não apenas a teria parado, eu a teria destruído para sempre, de
modo que ninguém pudesse jamais girá-la outra vez. Mas isto não está nas
minhas mãos.
Mas por que essa obsessão? Eu me tornei consciente de muitas coisas no
momento de sua morte... aquilo determinou toda a minha vida.
Perguntei-lhe ao ouvido: “Nana, você tem alguma coisa para me dizer antes de
ir embora? Alguma palavra final? Ou você quer me dar alguma coisa para eu me
lembrar de você para sempre?”
Ele tirou seu anel e o colocou na minha mão. Aquele anel fora sempre um
mistério. Em toda a sua vida ele não permitira a ninguém olhar o que havia nele,
embora costumasse olhar dentro do anel repetidamente. Aquele anel tinha uma
pequena abertura de vidro, em ambos os lados, pelas quais se podia olhar. Em
cima havia um diamante e em cada um dos lados havia uma abertura. Ele não
permitia a ninguém ver o que ele costumava olhar através da abertura. Dentro
havia uma estátua de Mahavira, o tirthankara jaina — uma imagem realmente
linda, e muito pequena. Devia ser de Mahavira, e aquelas duas aberturas eram
lentes de aumento. Elas o aumentavam e a imagem parecia realmente imensa.
Com lágrimas nos olhos ele disse: “Não tenho mais nada para lhe dar porque
tudo que tenho será tomado de você também, exatamente como foi tomado de
mim. Eu só posso lhe dar meu amor por aquele que conheceu a si mesmo”.
Embora eu não tenha guardado o anel, satisfiz seu desejo. Eu conheci “aquele”,
e o conheci em mim mesmo. Num anel, que importância tem? Mas o pobre velho,
ele amava seu mestre Mahavira e deu este amor para mim. Respeito o amor
dele pelo seu mestre e por mim. As últimas palavras saídas de seus lábios foram:
“Não se preocupe porque eu não estou morrendo”.
Todos nós esperamos para ver se ele ia dizer alguma coisa mais, mas isso foi
tudo. Seus olhos se fecharam e ele não existia mais.
Minha Nani estava segurando a minha mão, e eu estava completamente
aturdido, não sabendo o que estava acontecendo. A cabeça do meu avô estava
no meu colo. Coloquei minhas mãos sobre o seu peito e lenta, lentamente, a
respiração desapareceu. Quando senti que não havia mais respiração, eu disse
à minha avó: “Sinto muito, Nani, mas parece que ele não está mais respirando”.
Ela disse: “Está tudo perfeitamente bem, não precisa ficar preocupado. Ele viveu
bastante: não há nenhuma necessidade de pedir que viva mais”. E acrescentou:
“Lembre-se — porque esses são os momentos que não devem ser esquecidos
— nunca peça mais. O que é, é o bastante”.
Ainda me lembro daquele silêncio. O carro de boi estava passando através do
leito de um rio. Recordo-me de cada detalhe com exatidão. Eu nada falei porque
não queria perturbar minha avó. Ela não dizia uma palavra. Alguns momentos
se passaram, então eu fiquei um pouco preocupado com ela e disse: “Diga
alguma coisa: não fique tão quieta, é insuportável”.
Podem acreditar, ela cantou uma canção! Foi assim que eu aprendi que a morte
tem de ser celebrada. Ela cantou a mesma canção que havia cantado quando
sentiu amor pelo meu avô pela primeira vez.
A separação tem a sua própria beleza, da mesma forma que o encontro. A
separação tem a sua própria poesia: tem-se apenas de aprender a sua
linguagem, e tem-se de viver na profundidade dela. Então da própria tristeza
surge uma nova espécie de alegria. Parece quase impossível, mas acontece, eu
a conheci.
Glimpses of a Golden Childhood — Excertos, 1981
Sacrificar o hoje
por um amanhã
fictício
Desde o dia em que meu avô materno morreu, a morte se tornou uma
companheira constante para mim. Naquele dia, eu também morri, porque uma
coisa ficou clara: viva você sete ou setenta anos ele estava com setenta anos
—, que importa? Você tem de morrer.
Um homem tão bom, um homem encantador, simplesmente morreu. Que
significado teve sua vida? Esta se tornou uma pergunta torturante para mim. O
que ele alcançou? Por setenta anos viveu a vida de um homem bom: mas com
que objetivo? Simplesmente acabou... Nem mesmo um traço foi deixado para
trás. A morte dele me tornou tremendamente sério.
Eu já era sério antes mesmo de sua morte. Por volta dos quatro anos eu comecei
a pensar sobre problemas que as pessoas, de algum modo, preferem ir adiando.
Eu não acredito em adiamento. Comecei a fazer perguntas ao meu avô materno,
e ele dizia: “Essas perguntas! Você tem a vida inteira pela frente, não há pressa...
e você é tão novo”.
Eu disse: “Tenho visto meninos morrerem no vilarejo; eles não fizeram essas
perguntas, morreram sem encontrar a resposta. Você pode me garantir que eu
não morrerei amanhã ou depois? Pode me garantir que eu só morrerei depois
de ter encontrado a resposta?”
Ele respondeu: “Não posso garantir, porque nem a morte nem a vida estão nas
minhas mãos”.
“Então — repliquei — você não deveria me sugerir adiamento. Quero a resposta
agora. Se você sabe, então me diga que sabe e dê-me a resposta. Se você não
sabe, então não se sinta embaraçado por reconhecer a sua ignorância.”
Ele percebeu logo que eu não aceitava alternativas. Ou dava uma resposta, o
que não era fácil, pois eu forçava entrar em detalhes, levando a aprofundar o
assunto, ou tinha de admitir que ignorava o assunto. Ele começou a reconhecer
que não sabia.
Eu falava: “Você está muito velho, logo morrerá. O que você fez durante toda a
sua vida? No momento da sua morte você terá apenas ignorância em suas mãos
e nada mais. E estas são questões vitais — eu não estou lhe perguntando
alguma coisa fútil.
Você vai ao templo. Eu lhe pergunto: por que vai ao templo? Encontrou alguma
coisa no templo? Tem ido lá a vida inteira e tenta me persuadir a ir com você”. O
templo havia sido feito por ele. Um dia ele admitiu a verdade: “Porque eu fiz o
templo. Se nem eu mesmo for lá, então quem irá? Mas diante de você,
reconheço que é uma futilidade. Fui lá durante toda a minha vida e não ganhei
nada com isso”.
Daí eu lhe disse: “Tente outra coisa. Não morra com a pergunta, morra com a
resposta”. Mas ele morreu com a pergunta.
A última vez que ele falou comigo, quase dez horas antes de morrer, abriu os
olhos e disse: “Você estava certo: adiar não é correto. Estou morrendo e levo
comigo todas as questões. Lembre-se, tudo o que eu sugeri a você estava
errado. Você estava certo, não adie. Se surge uma pergunta, tente encontrar a
resposta o mais rapidamente possível”.
The Rajneesh Bible, vol. III — 21 de janeiro de 1985, noite
Uma porta
para o divino
Vipassana era uma sannyasin cheia de alegria e muito animada que vivia dentro
do ashram. Ela era uma musicista e uma cantora arrebatada.
Subitamente ela ficou doente e foi um choque para todos saber que ela tinha um
tumor cerebral, cuja extração era impossível.
Quando alguém morre — quem quer que seja que você conheceu, amou e com
quem viveu, alguém que se tornou parte do seu ser — alguma coisa morre em
você também. Naturalmente, você sentirá falta da pessoa e experimentará um
vazio. Isso é natural. Mas esse mesmo vácuo pode ser convertido em porta. E a
morte é uma porta para Deus. A morte é o único fenômeno existente que não foi
corrompido pelo homem. Em contrapartida, o homem corrompeu tudo, poluiu
tudo. Somente a morte ainda permanece virgem, não corrompida, intocada pelas
mãos do homem. O homem gostaria de corrompê-la também, mas ele não pode
capturá-la, não pode possuí-la. Ela é muito esquiva — permanece desconhecida.
E o homem continua perdido em relação ao que fazer com a morte. Ele não a
pode compreender, não pode fazer dela uma ciência: eis por que a morte ainda
não foi corrompida. Atualmente a morte é a única coisa que permanece
incorrupta no mundo.
Use bem os momentos em que você se depara com a morte. Quando,
subitamente, você tomar consciência da morte, toda a sua vida parece sem
sentido. Ela é sem sentido. A morte revela uma verdade. Quando, subitamente,
você se encontra com a morte, a própria terra dissolve-se sob seus pés. Então
você se conscientiza de que a morte de uma determinada pessoa também
implica a sua morte. Toda morte é a morte de todo mundo.
Vipassana aceitou a morte. Esta é uma das coisas mais difíceis de se fazer. Isto
só é possível se você estiver em profunda meditação, de outro modo não —
porque a mente toda, toda a mente humana, foi treinada para se posicionar
contra a morte. Durante séculos nos tem sido ensinado que a morte é contrária
à vida, que a morte é inimiga da vida, que a morte é o fim da vida. Naturalmente.
ficamos assustados e não podemos relaxar, não podemos estar num let-go.
E se você não pode estar num let-go em relação à morte, permanecerá tenso
em sua vida, porque a morte não é separada da vida. Ela não é o fim da vida,
antes, ao contrário, é o próprio rescendum, é o próprio clímax. E se você tem
medo do clímax, naturalmente não será capaz — não será capaz de modo algum
— de relaxar na vida também, porque a morte será sentida como se estivesse
escondida em todo lugar na vida. Você ficará amedrontado.
As pessoas que têm medo da morte não conseguem relaxar no sono, porque o
sono é também uma morte muito breve que acontece todos os dias. As pessoas
que têm medo da morte temem também o amor, porque o amor é uma morte. As
pessoas que têm medo da morte receiam quaisquer experiências orgásticas,
porque em cada orgasmo o ego morre. Aquele que tem medo da morte terá
medo de tudo. Perderá tudo.
Vipassana relaxou. Morreu como eu queria que ela morresse — num profundo
let-go. Ela aceitou a morte. Estava livre de qualquer conflito: não estava lutando.
Este é o critério para se aceitar a morte: conhecer algo dentro de si
tremendamente lindo que ultrapassa a própria morte. Só é possível relaxar em
relação à morte quando se experimenta algo que não morre.
Se você aceita a morte, incompleto, fica pela metade, desequilibrado. Quando
você aceita a morte, também se torna equilibrado. Então, tudo é aceito: o dia e
a noite, o verão e o inverno — ambas, a luz e a escuridão. Quando as polaridades
da vida são aceitas, você ganha equilíbrio. Torna-se tranquilo, torna-se inteiro.
E se você pensa em termos de totalidade, então a morte tem de ser considerada.
A vida é linda, a morte é tão linda quanto a vida. A vida tem as suas bênçãos.
Há muitas flores na vida, mas há muitas flores na morte também.
Tudo o que Deus dá você tem de receber com profunda gratidão — mesmo a
morte: só então você se torna religioso: uma aceitação e reconhecimento por
tudo: uma aceitação incondicional de tudo. A morte é um dos dons mais
sagrados: não foi corrompida pelo homem, permanece virgem.
Nothing to Loose but Your Head — 12 de março de 1976, noite
O mito da
mortalidade
Quando você morre, é um capítulo da vida — que as pessoas pensam tratar-se
da vida inteira — que está terminando. É apenas um dos infinitos capítulos de
um livro. Um capítulo termina, mas o livro não está terminado. Vira-se a página
e começa um novo capítulo.
Quando uma pessoa está morrendo, começa a visualizar sua próxima vida. É
um fato conhecido, porque acontece antes que o capítulo termine. De vez em
quando uma pessoa volta de seu ponto final. Por exemplo, quando está se
afogando e de algum modo é salva. Está quase em coma; a água tem de ser
expelida, faz-se respiração artificial, e de algum modo ela é salva. Estava
exatamente na margem, prestes a fechar o capítulo. Pessoas que tiveram tais
experiências relataram fatos interessantes. Um deles é o de que no último
momento, quando elas sentiram que estavam morrendo, que tudo estava
acabado, viram num flash toda a trajetória de sua vida, desde o nascimento até
aquele instante. Em uma fração de segundo elas viram tudo que lhes acontecera,
coisas das quais se lembravam e, também, aquelas das quais elas não tinham
se lembrado nunca, muitas coisas que nem tinham notado, das quais não tinham
consciência, mas que faziam parte de sua memória. Todo o filme da memória
passa muito rapidamente, num flash — e tem de ser em fração de segundo,
porque o homem está morrendo, não há tempo, não dispõe de três horas para
ver o filme inteiro.
E mesmo que você veja o filme inteiro, não pode relatar toda a história da vida
de um homem, com pequenos, mínimos detalhes. Mas tudo passa diante dele
— este é um fenômeno singular e muito significativo. Antes de acabar o capítulo,
ele se recorda de todas as suas experiências, desejos não satisfeitos,
expectativas, desapontamentos, frustrações, sofrimentos, alegrias, tudo.
O homem que está morrendo tem de ver tudo isso antes de seguir adiante, para
reajustar tudo, porque o corpo está indo embora: a mente não vai continuar com
ele, o cérebro não vai permanecer com ele. Mas o desejo liberado dessa mente
vai se apegar à sua alma, e esse desejo decidirá sua vida futura. O que quer que
tenha permanecido sem ser realizado o levará a mover-se na direção do alvo.
Desse modo, o que você faz no momento de sua morte determina como vai ser
o seu nascimento. A maioria das pessoas morre apegada. Elas não querem
morrer e pode-se compreender por que isso ocorre. Somente no momento da
morte realmente reconhecem o fato de que não viveram. A vida passou
simplesmente como um sonho, e a morte chegou. Agora não há mais tempo para
viver — a morte está batendo na porta. E quando havia tempo para viver, você
esteve fazendo mil e uma coisas tolas, perdendo o seu tempo ao invés de vivê-
lo.
Observe as pessoas no momento de sua morte. Seu sofrimento não consiste na
morte. A morte não traz nenhuma dor, é absolutamente indolor. É realmente
prazerosa: é exatamente como um sono profundo. Você acha que o sono
profundo é algo doloroso? Mas elas não estão se incomodando com a morte,
com o sono profundo, com o prazer; elas estão preocupadas com o conhecido
que está escorregando das suas mãos. O medo significa somente uma coisa:
perder o conhecido e entrar no desconhecido. A coragem é exatamente o oposto
do medo. O medo da morte é, certamente, o maior medo e o maior destruidor da
coragem.
Assim, posso sugerir apenas uma coisa. Agora você não pode voltar à sua morte
passada, mas pode começar a fazer uma coisa: esteja sempre pronto para
mover-se do conhecido para o desconhecido, em qualquer coisa, em qualquer
experiência. Mergulhe-se em algo que seja novo... sua própria novidade, seu
próprio frescor são tão fascinantes. Aí há coragem. Buscar o novo é melhor,
mesmo que o desconhecido acabe sendo pior do que o conhecido — esta não é
a questão.
Dizem que tudo que é velho não é ouro.* Eu digo: mesmo que tudo o que for
velho seja ouro, esqueça-o. Escolha o novo seja ouro ou não, não importa.
* Em inglês: “All that is old is not gold”.
Comece com um exercício simples: lembre-se sempre que tiver de fazer uma
escolha: prefira o arriscado, o perigoso, o inseguro, e você não se sentirá
perdido. Só assim a morte também poderá se tornar uma experiência
tremendamente reveladora.
A coragem virá até você. Comece com uma fórmula simples: nunca deixe de
enfrentar o desconhecido. Escolha sempre o incógnito e vá de cabeça. Mesmo
que você sofra, vale a pena — sempre vale. Você sempre sairá da nova
experiência mais crescido, mais maduro, mais inteligente.
The Rajneesh Bible, vol. IV — 21 de janeiro de 1985, noite
Beyond Enlightenment — 5 de outubro de 1986
PARTE II
OS SALVADORES
SÃO A SUA MORTE
Pseudo-religiões:
medo da morte
e da vida
Amado Bhagwan,
Nas outras religiões, quase nunca se fala da morte quando ela é mencionada, o
tom é grave e amedrontado. Na Sua religião, fala-se da morte livremente e com
felicidade. Isso é significativo?
Certamente, isso é uma das coisas mais significativas. Determina se uma religião
é autêntica ou falsa.
As pseudo-religiões não sabem nada sobre a morte.
Na verdade elas nada sabem nem mesmo sobre a vida, daí o medo, medo de
ambas. Não é possível ter medo somente da morte, porque a morte não é
separada da vida, a morte é parte da vida. Não é o final da vida, é um incidente
na vida; a vida continua. A morte acontece muitas vezes, milhões de vezes; é
um mero incidente. Mas as pseudo-religiões têm medo de ambas.
As pseudo-religiões também têm medo de viver.
Vocês devem compreender isso primeiro; somente então poderão compreender
por que elas têm medo da morte. Todas elas são favoráveis à renúncia da vida.
São todas baseadas numa atitude antivida: algo está errado na vida, a vida
nasceu do pecado original, não está certo que você esteja vivendo. Adão e Eva
foram punidos porque quiseram viver, quiseram saber, quiseram compreender,
explorar, inquirir — este é o pecado original deles. Vocês são herdeiros de Adão
e Eva. Nasceram em pecado.
O que Adão e Eva fizeram, as religiões têm tentado desfazer, a fim de que você
possa ser aceito por Deus novamente, ser bem-vindo ao céu. As religiões têm
medo da vida, têm medo de saber — mas vida e saber não estão separados.
As pseudo-religiões também ensinam a ter medo da vida — elas não têm apenas
medo da morte. Não falam sobre a morte; acham que é indelicado falar sobre tal
assunto. Se você estiver sentado à mesa do jantar, a etiqueta recomenda que
não fale sobre morte. À mesa de jantar, nem pensar! Mesmo num sepultamento,
quando as pessoas estão juntas para prestar suas últimas homenagens, elas
não falam sobre a morte.
Viva tão intensamente quanto possível, e o próprio sabor da vida lhe dará a
chave da compreensão de que a morte não precisa ser temida. Uma vez que
você chegue a conhecer a sua vida, seu fogo, saberá que não há nenhuma
morte.
Esta vida, que é possível conhecer quando se vive intensamente, é eterna.
O sentimento da própria eternidade surge simultaneamente com a experiência
da vida: à medida que você vive. Quanto mais profunda e intensamente você
viver, mais rapidamente sentirá que não há nenhuma morte.
Na minha religião a morte é celebrada porque não há morte alguma. É somente
uma entrada em outra vida.
Estamos celebrando o nascimento — as pessoas pensam que estamos
celebrando a morte — porque não há morte como tal. Nada morre, somente as
formas mudam. A vida transmigra de uma forma para outra. A morte deveria
consistir num momento de celebração para todos os que se relacionavam com
a pessoa, pois ela está morrendo apenas aparentemente. Do nosso lado parece
que ela está morrendo: do outro lado ela está nascendo.
The Rajneesh Bible. vol. III — 10 de janeiro de 1985, noite
O Oriente
tem o fermento,
o Ocidente
tem a massa
Você está condicionado à idéia de que há apenas uma vida. A crença cristã, a
judaica, a maometana — todas enraizadas na concepção judaica de que só há
uma vida — legaram ao Ocidente a tremenda loucura pela velocidade. Tudo tem
de ser feito com tal pressa que você não pode desfrutar o ato de fazer, e não
pode fazê-lo em sua inteira perfeição. Você faz de qualquer jeito e corre para
uma outra atividade.
O homem ocidental tem vivido sob o domínio de uma concepção muito errada.
Ela tem criado tanta tensão nas pessoas que elas nunca conseguem estar à
vontade em lugar algum: estão sempre indo e sempre preocupadas por não
saberem quando o fim vai chegar. Antes do fim, elas querem fazer tudo. Mas o
resultado é exatamente o oposto: não podem nem ao menos dar um jeito de
fazer algumas coisas graciosamente, com beleza e perfeição.
A vida dessas pessoas está tão ensombreada pela morte que não conseguem
viver alegremente. Tudo que traz alegria parece-lhes ser uma perda de tempo.
Não podem simplesmente se sentar em silêncio por uma hora, porque suas
mentes lhes dirão: “Por que está perdendo uma hora? Você podia ter feito isto,
você podia ter feito aquilo”.
É por causa dessa concepção de uma só vida que a idéia de meditação nunca
surgiu no Ocidente. A meditação supõe uma mente muito relaxada, sem
nenhuma pressa, sem nenhuma preocupação, sem nenhum lugar aonde ir...
disposta apenas a desfrutar momento a momento, seja o que for que venha.
No Oriente, a meditação estava fadada a ser descoberta justamente por causa
da crença da eternidade da vida — você pode relaxar. Pode relaxar sem nenhum
medo, pode se alegrar e tocar a sua flauta, pode dançar e cantar a sua canção,
pode desfrutar o nascer e pôr-do-sol. Pode desfrutar sua vida inteira. Não apenas
isto, mas pode até mesmo desfrutar a morte, porque a morte é também uma
grande experiência, talvez a maior experiência da vida. É um crescendo.
Na concepção ocidental, a morte é o fim da vida. Na concepção oriental, a morte
é apenas um lindo incidente no longo processo da vida: haverá muitas, muitas
mortes. Cada morte é um clímax da sua vida, antes de uma nova vida começar
— uma outra forma, um outro rótulo, uma outra consciência. Você não está se
acabando, está apenas mudando de casa.
Estou me lembrando de Mulla Nasruddin. Um ladrão entrou em sua casa. Mulla
parecia dormir, mas na verdade apenas mantinha os olhos fechados,
entreabrindo-os e olhando o que o ladrão estava fazendo. Ele não admitia a
interferência no trabalho alheio. O ladrão não estava interferindo no seu sono,
por que ele deveria interferir na profissão do outro? Deixou-o exercê-la.
O ladrão estava um pouco preocupado; aquele homem parecia esquisito.
Enquanto ele estava carregando tudo da casa, às vezes alguma coisa caía das
suas mãos e fazia barulho, mas Mulla permanecia completamente adormecido.
Começou a suspeitar de que esse tipo de sono só é possível a um homem
acordado: “Que homem esquisito! Ele não diz nada; estou esvaziando toda a sua
casa!” Todos os móveis retirados, todas as almofadas retiradas, tudo que estava
na casa havia sido retirado. E quando o ladrão estava reunindo tudo, amarrando
para levar para casa, subitamente pressentiu: “Alguém está me seguindo”. Olhou
para trás e viu o mesmo homem que estava dormindo. O ladrão disse: “Por que
está me seguindo?”
Mulla respondeu: “Não, não estou seguindo você; nós estamos nos mudando de
casa. Você apanhou tudo. Agora o que vou fazer nesta casa? Então, estou indo
também”.
Esta tranquilidade é própria do oriental; até em relação à morte o Oriente acredita
que se está apenas mudando de casa.
O ladrão estava preocupado; ele disse: “Perdoe-me, tome as suas coisas”.
Mulla respondeu: “Não, não há necessidade. Já estava pensando comigo
mesmo em me mudar de casa; ela está quase em ruínas. Não se pode ter uma
casa pior do que esta, e de qualquer modo eu sou um homem muito preguiçoso.
Preciso de alguém para cuidar de mim, e, já que você levou tudo, por que me
deixar sozinho?”
O ladrão foi ficando com medo... ele roubara durante toda a sua vida e nunca
havia encontrado um homem como aquele. Disse então: “Você pode pegar as
suas coisas”.
Mulla replicou: “Não, não vai haver nenhuma mudança de planos. Você terá de
levar as coisas, caso contrário eu o denunciarei à polícia. Estou me comportando
como um cavalheiro, não o estou chamando de ladrão, apenas o considero um
homem que está me ajudando a mudar de casa”.
Não há pressa. A idéia de uma vida curta é perigosa. É por isso que, apesar de
o Oriente ser muito pobre, lá não há desespero não há angústia. O Ocidente é
rico, mas a riqueza não acrescentou nada à sua espiritualidade ou ao seu
crescimento; ao contrário, o Ocidente é muito tenso. Ele deveria ser mais
relaxado, pois tem todos os confortos da vida.
Mas o problema básico é que no fundo o Ocidental sabe que a vida é muito curta;
que estamos esperando numa fila, e a cada momento estamos chegando mais
perto da morte. Desde que nascemos, começamos a jornada em direção ao
cemitério. A cada momento a vida está sendo cortada — tornando-se mais e
mais curta. Isto cria tensão, angústia, ansiedade. Todos os confortos, todos os
luxos, todas as riquezas se tornam sem significado, porque ninguém pode levá-
las. Cada qual terá de enfrentar a morte sozinho.
O Oriente é mais tranquilo. Primeiro, não dá à morte nenhuma importância —
ela é apenas uma mudança de forma. Segundo, por ser tranquilo, torna-se
consciente das riquezas interiores, que seguirão com a pessoa mesmo para
além da vida. A morte não pode tomá-las.
A morte pode arrebatar tudo o que está do lado de fora, e se você não
desenvolveu seu ser interior, naturalmente sentirá medo de não poder salvar
nada da morte; ela levará tudo o que você tem. Mas se você desenvolveu seu
ser interior, se você encontrou paz, bênção, silêncio, alegria — que não são
dependentes de nada exterior —, se você cultivou o jardim do seu ser e viu as
flores da sua própria consciência, a questão do medo da morte não surge
absolutamente.
Novamente lhe digo, lembre-se somente de uma coisa: você é um ser imortal.
Neste momento, essa afirmação pode não fazer parte de sua experiência
pessoal; você pode aceitá-la como uma hipótese — não como uma crença —,
uma hipótese para ser experimentada.
Eu jamais desejo que alguém aceite qualquer coisa vinda de mim como uma
crença, mas somente como uma hipótese. Pelo fato de eu saber a verdade, não
preciso impingir a crença e a fé sobre você. Sabendo a verdade eu posso lhe
dizer: “É apenas para experimentar, uma hipótese temporária”, porque eu estou
absolutamente certo de que, se você experimentar, a sua hipótese se
transformará em seu próprio conhecimento — não numa crença, não numa fé,
mas numa certeza. E somente as certezas podem salvá-lo. Crenças são barcos
feitos de papel.
Não se deve acreditar que se possa atravessar o oceano da existência num
barco feito de papel. Você precisa de uma certeza... não de uma crença, mas de
uma verdade verificada por você mesmo. Não a verdade de outra pessoa, mas
a sua própria. Então é uma alegria entrar no desconhecido, no oceano
inexplorado: é um excitamento e um êxtase tremendo.
The Golden Future — 27 de abril de 1987, noite
A raiz de todos
os medos
Amado Bhagwan,
O que é medo?
Há medos e medos: não estou falando sobre eles. Estou falando sobre o medo
mais fundamental — todos os outros medos são ecos remotos do medo básico
— e este é o medo da morte. A vida está rodeada pela morte. Você vê todos os
dias alguém morrendo, algo morrendo: algo que estava vivo há pouco, agora
está morto.
Cada morte recorda-lhe a própria morte.
É impossível esquecer-se da própria morte: a todo momento há uma lembrança.
Assim, a primeira coisa a ser compreendida é que a única possibilidade de se
livrar do medo é se livrar da morte. E você pode livrar-se da morte, porque a
morte é apenas uma idéia, não uma realidade.
Você tem visto apenas outras pessoas morrendo: alguma vez você se viu
morrendo? E quando você vê outra pessoa morrendo, você está do lado de fora,
não é um participante da experiência. A experiência está acontecendo dentro da
pessoa.
Tudo o que você sabe é que ela não está mais respirando, que o corpo dela
tornou-se frio, que seu coração não está mais batendo. Mas você pensa que
todas essas coisas reunidas são equivalentes à vida? A vida é apenas
respiração? A vida é apenas a batida cardíaca, o sangue circulando e mantendo
o corpo quente? Se isto é vida, o jogo não vale a pena. Se somente a minha
respiração é a minha vida, qual é o objetivo de continuar respirando?
A vida deve ser alguma coisa a mais. Para ter qualquer valor, a vida deve ter
algo da eternidade: deve ser algo além da morte. E você pode conhecer isso
porque ela existe dentro de você. A vida existe dentro de você — a morte é
somente uma experiência dos outros, observada de fora. É simplesmente como
o amor. Você pode compreender o amor por olhar uma pessoa sendo amorosa
com alguém? O que você verá? Eles estão abraçando um ao outro, mas abraçar
é amor? Você pode vê-los segurando a mão um do outro, mas segurar as mãos
é amor? Do lado de fora, o que mais você pode descobrir sobre o amor?
Qualquer coisa que você descubra será absolutamente fútil. Essas são
expressões do amor, mas não o amor em si. O amor é algo que se conhece
somente quando se está amando.
Um dos maiores poetas da Índia, Rabindranath Tagore, ficava muito
embaraçado com um velho que era amigo de seu avô. O velho costumava ir à
casa do avô frequentemente porque ele morava nas vizinhanças, e nunca saía
sem criar constrangimento para Rabindranath. Ele sempre batia na porta e
perguntava: “Como vai a sua poesia? Você realmente conhece Deus? Conhece
realmente o amor? Diga-me, você sabe de todas essas coisas das quais você
fala em sua poesia? Ou você é hábil no uso das palavras? Qualquer idiota pode
falar do amor, de Deus, da alma. Eu não vejo nos seus olhos que você tenha
experienciado alguma coisa”.
E Rabindranath não podia responder-lhe. Na verdade, ele estava certo. Se o
velho o encontrasse na rua, ele o segurava, perguntando: “E sobre o seu Deus?
Você o encontrou ou ainda está escrevendo poesias sobre ele? Lembre-se, falar
sobre Deus não é conhecer Deus”.
Ele era uma pessoa muito embaraçosa. Em reuniões de poetas, onde
Rabindranath era muitíssimo respeitado — recebera o Prêmio Nobel —, aquele
velho, fatalmente, estaria lá. No palco, diante de todos os poetas e adoradores
de Rabindranath, ele o segurava pelo colarinho e dizia: “Ainda não aconteceu.
Por que você está enganando esses idiotas? Eles são idiotas menores, você é
um grande idiota; eles não são conhecidos fora da região, você é conhecido em
todo o mundo — mas isso não significa que você conhece Deus”.
Rabindranath escreveu no seu diário: “Eu era muito hostilizado por ele, e ele
tinha olhos tão penetrantes que era impossível dizer-lhe uma mentira. Sua
presença era tão marcante que ou você tinha de dizer a verdade ou tinha de
permanecer calado”.
Mas um dia aconteceu... Rabindranath tinha ido a um passeio matinal. Havia
chovido à noite: era de manhã bem cedo, e o Sol estava surgindo. No oceano,
estava tudo dourado, ao lado da rua, a água tinha se juntado em pequenas
poças. Naquelas pequenas poças o Sol também estava surgindo com a mesma
glória, com a mesma cor, com a mesma alegria... E apenas esta experiência —
porque na existência não há nada superior nem nada inferior, tudo é um todo —
subitamente alguma coisa disparou dentro dele. Pela primeira na vida ele foi à
casa do velho, bateu na porta, olhou nos olhos do velho e disse: “Agora, o que
você diz?”
Ele respondeu: “Agora não há nada a dizer. Aconteceu. Eu o abençoo”.
A experiência da sua imortalidade, da sua eternidade, da sua totalidade, da sua
unidade com a existência é sempre possível. É necessário apenas alguma
experiência instigante.
Assim, a primeira coisa é livrar-se da morte. Todos os outros medos
desaparecerão. Você não tem de trabalhar sobre cada um dos seus medos; de
outro modo levaria vidas e ainda assim você não poderia se livrar deles.
O medo é natural, porque a morte é conhecida por todos; ela existe à sua volta.
A culpa não é natural; é criada pelas religiões. Elas fizeram todos homens
culpados — culpados de mil e uma coisas, tão carregados de culpa que eles não
podem dançar, não podem se alegrar com coisa alguma. A culpa envenena tudo.
Todas as religiões conspiravam contra seres humanos inocentes para fazê-los
sentir-se culpados, porque sem torná-los culpados eles não podem ser
transformados em escravos. E escravos são necessários. Pelo desejo de poder
de algumas pessoas, milhões de pessoas precisam ser escravizadas. Para que
algumas pessoas se tornem Alexandre, o Grande, milhões têm de ser reduzidos
a condição subumana.
Mas todas essas coisas são simplesmente condicionamentos da mente, os quais
você pode apagar tão facilmente quanto se estivessem escritos nas areias da
praia. Não tenha medo só porque você aceitou esses escritos como sagrados,
aceitou-os como vindos de fontes muito respeitáveis, dos grandes fundadores
das religiões. Não tem importância. Só uma coisa importa: que a sua mente deve
ser completamente limpa, completamente vazia e silenciosa.
Não há necessidade de Moisés, de Jesus ou de Buda morar dentro de você.
Você precisa de um espaço totalmente silencioso, limpo. E somente esse espaço
pode levá-lo, não a mim, mas a você mesmo, à sua própria existência.
As religiões do mundo provocaram tantas doenças no homem que elas são
incontáveis. Uma das doenças é a de ter tornado todos os homens ambiciosos
por recompensas — se não neste mundo, ao menos no outro.
Elas tornaram o homem muito ganancioso e, ao mesmo tempo, todas elas estão
falando contra a ganância. E toda a religião deles está baseada na ganância...
As religiões fizeram tanto mal que não podem ser perdoadas. Elas tiraram toda
a dignidade do homem — sua alegria de almejar, de amar, seu prazer em
esperar, sua confiança de que a primavera virá. Elas tiraram tudo de você. Você
será recompensado somente se fizer certos rituais que não têm nenhuma
relação, nenhuma relevância.
Uma religião simples e inocente teria mudado toda a terra. Mas os dirigentes
religiosos não poderiam permitir uma religião pura, inocente e infantil, com olhos
maravilhados, com alegria, não se importando com idéias estúpidas de céu e
inferno, mas vivendo cada momento com grande amor.
E esperando por mais — não apenas desejando, mas esperando, merecendo,
criando mais e mais espaço, mais silêncio, a fim de que primavera venha. E não
somente com algumas flores, mas com muitas flores...
Um dos místicos sufi tem um pequeno poema sobre esse tema: “Eu esperei
muito a primavera — ela veio. E veio tão abundantemente, com tantas flores,
que não sobrou nenhum lugar onde eu pudesse fazer um ninho para mim”.
A vida dá abundantemente; você tem apenas de ser um recipiente
Quero que você se preserve totalmente da corrupção e da poluição de todas as
religiões. Tenha uma mente silenciosa, cheia de amor, esperando que algo mais
aconteça.
A vida é tamanha que nós continuamos a explorá-la, mas não podemos. O
mistério está além do tempo.
The Golden Future — 17 de maio de 1987, noite
Uma fácil
exploração
A religião tem alguma validade somente devido à morte. Se não houvesse morte,
ninguém teria se incomodado com a religião, absolutamente. Não é a vida que o
inspira a ser religioso, não — é a morte. A morte o faz procurar algo que
permanecerá apesar da morte.
Imagine um mundo onde a morte não exista, onde ninguém morra. A questão:
“O que acontece depois da morte?” não terá significado, a questão de céu e
inferno não terá significado. E quando você é eterno, o que Deus pode ser mais
do que você? Agora ele é a vida eterna, e você um fenômeno momentâneo, uma
bolha de sabão; num momento você partirá — daí o medo. E o medo cria a
busca. Você quer saber o que é essa morte, e você quer saber se alguma coisa
permanece depois dela ou não. Aqueles que dizem nada restar depois da morte
não são religiosos. Eles não vão a nenhum templo, não vão a nenhuma igreja,
não têm nenhuma escritura sagrada.
Denomino pseudo-religiões todas as existentes até agora. Elas somente
aparentam ser religiosas, mas não são, porque não têm coragem suficiente para
ser totais, são somente uma parte.
O medo da morte criou as pseudo-religiões. Agora, pela primeira vez, o mundo
está chegando perto de uma morte global. Até agora existia apenas a morte
individual; a sociedade continuava, o mundo continuava. Sim, as pessoas
chegavam e iam embora — os velhos desapareciam, criancinhas nasciam —,
mas a continuidade estava presente, a vida esteve sempre presente. Sim, a vida
individual tinha sido um problema, mas só o indivíduo estava preocupado com
isso.
O padre era capaz de explorar o indivíduo muito facilmente. Ele é tão fraco e tão
pequeno, tão limitado, e sabe que vai morrer — ele tem de buscar a ajuda do
padre para achar algo em que se agarrar que seja imortal, eterno, que o levará
para além da morte. E o padre prometeu isso. Mas nunca foi um problema com
o qual toda a sociedade se defrontasse.
The Rajneesh Bible — 20 de janeiro de 1985, noite
A vida não deve
ser mitificada
A menos que o Ocidente mude sua concepção de que há somente uma vida,
esta hipocrisia, este apegar-se e este medo não podem ser mudados. Na
verdade, uma vida não é tudo: você viveu muitas vezes e viverá muitas vezes
mais. Então, viva cada momento tão totalmente quanto possível; não há pressa
para saltar para um outro momento. O tempo não é dinheiro, o tempo é
inexaurível; está disponível tanto para o pobre como para o rico. O rico não é
mais rico no que diz respeito a tempo, e o pobre não é mais pobre.
A vida é uma encarnação eterna.
O que aparece na superfície está muito profundamente enraizado nas religiões
do Ocidente. Elas são muito miseráveis em dar somente setenta anos. Se você
calcular, irá perceber que quase um terço da sua vida estará perdido no sono,
um terço da sua vida terá sido perdido arranjando alimentos, roupas, moradia. O
pouco que sobra tem de se dispendido em educação, jogos de futebol, cinemas,
disputas estúpidas, lutas. Se você puder salvar, no período de setenta anos, sete
minuto para si mesmo, eu o classificarei como um sábio.
Mas é difícil salvar até mesmo sete minutos em toda a sua vida; assim, como
você pode encontrar a si mesmo? Como você pode conhecer o mistério do seu
ser, da sua vida? Como você pode compreender que a morte não é um fim?
Como você perdeu a experiência da própria vida, você vai perder a grande
experiência da morte também; de outro modo, não há nada para se temer na
morte. É um lindo sono, um sono sem sonho, um sono que é necessário para
que você se mova para um outro corpo, silenciosa e pacificamente. É um
fenômeno cirúrgico, é quase como anestesia. A morte é uma amiga, não uma
inimiga. Uma vez que você encare a morte como uma amiga e comece a viver a
vida sem qualquer medo de que ela seja apenas a mínima extensão de tempo
de setenta anos — se a sua perspectiva se abre para a eternidade da sua vida
—, então tudo se acalmará; então não haverá necessidade de ser veloz.
Em todas as coisas, as pessoas estão simplesmente correndo. Tenho visto
pessoas apanhando suas pastas, colocando coisas dentro delas, beijando suas
mulheres — não vendo nem se elas são as suas mulheres ou as de outros — e
dizendo “até logo” para seus filhos. Esta não é a maneira de viver! E aonde você
vai chegar com essa pressa?
O Ocidente não tem nenhuma tradição de misticismo, é extrovertido: olha para
fora, há tanto o que ver. Mas os ocidentais não estão conscientes de que por
dentro não há somente o esqueleto; há algo mais dentro do esqueleto — a sua
consciência. Ao fechar os olhos, você não encontrará o seu esqueleto; você
encontrará a própria fonte de sua vida.
O Ocidente precisa de uma profunda familiarização com a sua própria fonte de
vida — então não haverá pressa. A pessoa se alegrará quando a vida trouxer
juventude, a pessoa se alegrará quando a vida trouxer a idade avançada, a
pessoa se alegrará quando a vida trouxer a morte. Então você simplesmente
saberá como desfrutar de todas as coisas pelas quais passa, como transformá-
las em celebração.
Eu chamo de religião autêntica a arte de transformar todas as coisas numa
celebração, numa canção, numa dança.
The Golden Future — 19 de maio de 1987, noite
PARTE III
OBSERVE E
VOCÊ SABERÁ
Por que apegar-se?
Simplesmente cante!
Todo adorador, em todo templo, em toda sinagoga, em toda igreja, está
humilhando a si mesmo e humilhando deus dentro de si. O deus interior não
precisa de nenhum outro deus para ser adorado. Tudo que é necessário é o
despertar da consciência, a consciência do próprio ser.
No momento em que se torna consciente de si mesmo, o ser não é mais um
mortal, ele se torna um imortal. Ele sempre foi um imortal, mas devido a seus
equívocos, ele degradou-se em ser mortal, em alguém que vai morrer. Embora
a vida dentro de você e a consciência dentro de você sejam eternas e imortais,
ainda assim você continua tendo medo da morte — porque você vê alguém
morrer todo dia, e a morte de todo mundo lembra-o da sua própria morte.
O poeta canta: “Nunca pergunte por quem os sinos tocam: os tocam por ti...”
Ele tem alguma verdade para transmitir a você. Toda morte é simbólica. Ela
mostra que você está postado na mesma fila, e a fila está ficando cada vez mais
curta. Todo dia você está chegando cada vez mais perto da morte. Na verdade,
o dia em que você nasceu não foi o dia do seu nascimento; foi o dia em que você
começou a morrer. E desde então, você está morrendo a cada dia. Em todo
aniversário, sua morte ficou um ano mais perto.
É um fato absolutamente certo que as pessoas morrem, os animais morrem, as
árvores morrem, os pássaros morrem. Como você pode fugir do fato de que você
vai morrer também — talvez amanhã, talvez depois de amanhã? É somente uma
questão de tempo...
Contudo, aqueles que estão conscientes de seu ser sabem que ninguém morre.
A morte é uma ilusão.
Você viu pessoas morrerem; alguma vez você se viu morrendo? E quando você
vê alguém morrendo, você está realmente vendo alguém morrer? Tudo o que
você está vendo e tudo o que a ciência médica pode ver é que o homem parou
de respirar, que sua pulsação cessou, que seu coração não bate mais; declara-
se que ele está morto.
Há alguns dias, um homem da região de Caxemira, ocupada pelo Paquistão,
pela terceira vez enganou seus amigos, seus colegas, sua família. Aos cento e
trinta e cinco anos de idade, ele morreu pela terceira vez. O pessoal desconfiado
porque, por duas vezes, ele havia aplicado o truque. Diagnosticado pelos
médicos como morto, atestado como morto, ele acordou, abriu os olhos e
começou a rir. Assim, quando ele morreu pela terceira vez, as pessoas
mantiveram-se muito cautelosas. Os médicos foram muito cautelosos, mas tudo
concorria para se ter certeza de sua morte; não havia dúvida.
Disseram: “Talvez, anteriormente, ele possa ter enganado, mas desta vez
certamente está morto. No que diz respeito ao que a ciência médica possa saber,
ele preenche todos os requisitos de um homem morto”. E no momento em que
o atestado foi assinado por três médicos, o homem abriu os olhos, começou a rir
e disse: “Ouçam, da próxima vez, eu vou realmente morrer. Eu simplesmente
achei que uma vez mais...”.
Nessa região de Caxemira, ocupada pelo Paquistão, encontram-se as pessoas
mais idosas da Índia e do Paquistão. Cento e vinte anos é muito comum, normal.
Cento e cinquenta você pode encontrar; não é tão normal, contudo há centenas
de pessoas que passaram dos cento e cinquenta. E há alguns casos raros em
que pessoas alcançaram cento e oitenta anos de idade e ainda são jovens; ainda
estão trabalhando em seus campos.
Esse homem foi interrogado por jornais, por jornalistas de todo o mundo, porque
ele é um homem raro; por três vezes foi tido como morto e por três vezes
desafiou todo o conhecimento médico, toda a ciência médica. Perguntaram-lhe:
“O que você esteve fazendo? O que aconteceu?”
Ele respondeu: “Nada, porque eu não sou o meu corpo, eu sei disso; e eu não
sou a minha respiração, eu sei disso; e eu não sou o meu coração, eu sei disso.
Estou além deles todos, eu simplesmente deslizo para dentro do além. O
coração pára de bater, o pulso pára de bater, e vocês são todos enganados.
Então, eu deslizo, novamente, de volta para o corpo, o sangue começa a correr
novamente, o pulso começa a trabalhar novamente e o coração começa a bater
novamente”.
Trata-se de um homem simples, um fazendeiro. Ele não é um iogue; ele nunca
praticou nada. Mas quando ele era apenas uma criança bem pequena, com sete
ou oito anos de idade, entrou em contato com um místico sufi que lhe disse ser
a morte uma ilusão. E ele era tão inocente que aceitou isso.
O místico sufi lhe disse: “Há um modo muito simples de você deslizar para fora
de seu corpo. Apenas observe-o pelo lado de dentro; observe o corpo e
subitamente haverá mais e mais distância entre você e o seu corpo. Logo o corpo
estará a quilômetros de distância. Observe amente, e o mesmo acontecerá com
ela.
Você simplesmente permanece um observador e se tornará capaz de deslizar
para fora de seu corpo, para fora de sua mente, para fora de toda a sua
personalidade. É está dentro do seu controle voltar. Porque você deslizou para
fora... você sabe o caminho e então saberá voltar. E o caminho é este:
observando, você deslizou para fora. Então pare de observar. Identifique-se com
o corpo. Diga: Eu sou o corpo, eu sou a mente, eu sou a batida do coração.
Imediatamente a distância desaparecerá. Você chegará mais perto e logo
deslizará para dentro do corpo.
Ao identificar-se com o corpo, você se torna o corpo. Então você é um mortal.
Então há medo da morte. Ao deixar de identificar-se com seu corpo, você é
apenas um observador, você é apenas uma pura consciência, uma não-mente.
E não há morte, não há doença, não há velhice. No que diz respeito ao seu
testemunhar, ele é eterno e está sempre fresco e jovem, permanece o mesmo.
A religião autêntica não o ensina a adorar. A religião autêntica ensina-o a
descobrir sua imortalidade, a descobrir o deus dentro de você.
Todos vão passar através dos portões da morte algum dia. Se você puder
lembrar-se de que você é apenas pura consciência — não o corpo, não a mente,
não o coração, não o seu dinheiro, não o seu prestígio, não o seu poder, não a
sua casa, mas apenas consciência — então você pode passar através da
barreira da morte sem arranhar-se. Então a morte não pode fazer nem mesmo
um arranhão em você.
Um grande rei chamado Yayati chegou aos cem anos de idade... ele havia vivido
estupendamente bem, desfrutado de tudo o que a vida pôde lhe oferecer.
A Morte veio e disse a Yayati: “Esteja pronto. É sua hora, e eu vim buscá-lo”.
Yayati olhou para a Morte, e embora fosse um grande guerreiro e tivesse vencido
muitas guerras, começou a tremer. Ele disse: “Mas é cedo demais”.
A Morte respondeu: “Cedo demais?! Você viveu cem anos. Até os seus filhos se
tornaram velhos. Seu filho mais velho está com oitenta anos. O que mais você
quer?”
Yayati tinha cem filhos porque ele tinha cem esposas. Ele perguntou à Morte:
“Você pode me fazer um favor? Eu sei que você tem de levar alguém. Se eu
puder persuadir um dos meus filhos, você pode me deixar aqui por mais cem
anos e levar um deles?”
A Morte respondeu-lhe: “Está bem, desde que alguém esteja pronto para ir. Mas
eu não acredito nisso. Se você não está pronto, e você é o pai, viveu mais e
desfrutou de tudo, por que seu filho deveria estar pronto?”
Yayati chamou os cem filhos. O mais velho permaneceu silencioso. Houve um
silêncio, ninguém dizia nada. Somente o filho mais jovem, que tinha apenas
dezesseis anos, levantou-se e disse: “Eu estou pronto”. Até a Morte sentiu pena
dele e disse ao jovem: “Talvez você seja inocente demais. Você não está vendo
os seus noventa e nove irmãos absolutamente silenciosos? Um tem oitenta,
outro setenta e cinco, outro setenta e oito, outro setenta, outro sessenta — eles
viveram, mas ainda querem viver. E você não viveu, absolutamente. Até eu sinto
tristeza de levá-lo. Pense de novo”.
O rapaz disse: “Não, é justamente esta situação que me dá certeza. Não sinta
tristeza ou pena: estou indo com absoluta consciência. Se meu pai, com cem
anos, não está satisfeito, qual é o objetivo de permanecer aqui? Como poderei
ficar satisfeito? Nenhum dos meus noventa e nove irmãos está satisfeito. Então
por que perder tempo? Pelo menos posso fazer este favor ao meu pai. Na sua
velhice, deixe-o desfrutar mais cem anos. Mas eu quero parar. Como ninguém
está satisfeito, posso entender uma coisa claramente — mesmo que eu viva cem
anos, também não ficarei satisfeito. Então não importa se vou hoje ou depois de
noventa anos. Leve-me”.
A Morte levou o rapaz. E depois de cem anos ela voltou, e Yayati estava na
mesma situação. Ele disse: “Estes cem anos passaram tão depressa. Todos os
meus filhos velhos morreram, mas eu tenho outros tantos. Posso dar-lhe algum
filho. Tenha misericórdia de mim”.
E continuou assim, diz a história, por mil anos. Dez vezes a Morte veio, e nove
vezes ela levou algum filho e Yayati vivia mais cem anos. Na décima vez, Yayati
disse: “Embora eu ainda esteja tão insatisfeito como estava quando você veio
pela primeira vez, agora, embora sem querer, e relutando, eu irei, porque eu não
poderei continuar pedindo favores. É demais. E uma coisa tornou-se certa para
mim, de que se mil anos não puderam me ajudar a estar contente, então nem
mesmo dez mil anos o farão”.
É o apego. Você pode ir vivendo, mas assim que a idéia da morte o atinge,
começará a tremer. Se você não está apegado a nada, a morte pode vir neste
exato momento e você estará em atitude de boas-vindas. Estará absolutamente
pronto para ir. Diante de um tal homem, a morte é derrotada. A morte somente
é derrotada por aqueles que estão prontos para morrer a qualquer momento,
sem nenhuma relutância. Eles se tornam imortais, eles se tornam budas. Livrar-
se do apego é livrar-se da morte. Livrar-se do apego é livrar-se da roda do
nascimento e da morte. Livrar-se do apego o faz capaz de entrar na luz do
universo e tornar-se um com ela. E esta é a bênção maior, o êxtase supremo,
além do qual nada mais existe. Você chegou em casa.
Commentaries on the Teachings of the Messenger of Zen
from India to China: Bodhidharma — 7 de junho de 1987, noite
A vida é carícia
preliminar,
a morte é
orgástica
Amado Bhagwan,
O que acontecerá à consciência humana quando as pessoas do mundo
subitamente perceberem que estão no meio de uma praga incontrolável e
devastadora, que matará a maior parte das pessoas que elas conhecem?
Depende de cada pessoa. Para aquele que é absolutamente consciente, nada
acontecerá: ele aceitará, exatamente como aceita tudo o mais. Não haverá
nenhuma luta, nenhuma ansiedade.
Como ele consegue aceitar a própria morte, pode aceitar a morte do seu planeta
também. E esta aceitação não é de modo nenhum uma espécie de desamparo.
Ao contrário, é simplesmente a percepção da natureza das coisas — que tudo
nasce, vive e tem de morrer.
Este planeta não estava aqui há cinco bilhões de anos: então ele nasceu. Talvez
ele já tenha vivido toda a sua vida. E, de qualquer modo, mesmo que a mente
humana dê um jeito de acabar com as dificuldades criadas pelos políticos, o
planeta não poderá viver muito tempo porque o sol está morrendo. Em alguns
milhões de anos ele terá exaurido toda a sua energia, e quando o sol morrer,
este planeta não poderá permanece vivo. Toda a nossa energia de vida vem do
Sol.
O homem de consciência perfeita simplesmente aceitará isto como um
fenômeno natural. Agora mesmo, as folhas estão caindo das árvores; na outra
noite, o vento estava soprando forte e as folhas estavam caindo como chuva.
Mas o que você pode fazer? Esta é a lei da existência. Tudo vem numa forma e
desaparece na ausência dessa forma. Assim, para o homem que está acordado,
não haverá nenhuma mudança em sua consciência. Para o homem não-
acordado, haverá reações diferentes.
Contaram-me que um homem estava morrendo: ele era muito velho, já tinha
vivido sua vida; não havia nenhuma necessidade de se preocupar com a morte.
Estava escurecendo e o sol tinha se posto. O homem abriu os olhos e perguntou
à mulher, que estava sentada ao seu lado direito: “Onde está meu filho mais
velho?”
A mulher lhe disse: “Ele está sentado à minha frente do outro lado da cama. Não
se preocupe com ele; não se preocupe com essas coisas neste momento.
Relaxe e ore”.
Mas o homem replicou: “E onde está meu segundo filho?”
A mulher respondeu: “Ele está sentado ao lado do seu filho mais velho”. E o
velho homem, que estava quase às portas da morte, começou a se levantar.
A mulher disse: “O que você está fazendo?”
Ele respondeu: “Estou procurando meu terceiro filho”.
E a mulher e os filhos todos sentiram o quanto ele os amava. O terceiro filho
estava sentado a seus pés.
Ele falou: “Estou aqui, papai. Relaxe, nós estamos todos aqui”.
Ele disse: “Vocês estão todos aqui e querem que eu relaxe? Quem está tomando
conta da loja?”
Na hora da morte ele ainda estava preocupado com a loja.
É muito difícil predizer como as diferentes mentes inconscientes das pessoas
vão reagir. Toda a vida delas estará refletida em suas reações, isto é certo. Mas
a vida de cada um se moveu através de caminhos diferentes, experiências
diferentes, e o ponto culminante vai ser diferente.
A morte traz à superfície a personalidade essencial.
Um outro velho estava morrendo — era um homem muito rico. Toda a sua família
estava reunida. O filho mais velho disse: “O que deveremos fazer quando ele
morrer? Teremos de alugar um carro para levá-lo ao cemitério”.
O filho mais novo acrescentou: “Ele sempre desejou um Rolls Royce. Em vida
ele não pôde sentar-se em um, mas pelo menos, morto, ele pode desfrutar um
passeio — um passeio de mão-única, naturalmente — para o cemitério”.
Mas o filho mais velho replicou: “Você é jovem demais e não entende que os
mortos não desfrutam nada. Não importa à pessoa morta se é um Rolls Royce,
ou só um Ford. Um Ford bastará”.
O segundo filho disse: “Por que vocês estão tão extravagantes? De qualquer
modo, um corpo morto somente tem de ser carregado. Conheço uma pessoa
que tem um caminhão — será mais confortável e mais barato também”.
O terceiro filho disse: “Não posso tolerar todo esse absurdo. Qual é a
necessidade de se preocuparem com Rolls Royce ou Ford ou caminhões? Ele
vai se casar? Ele vai morrer. Vamos pô-lo fora da casa onde nós pomos todo o
nosso lixo. O caminhão municipal o recolherá, sem absolutamente nenhuma
despesa”.
Neste momento o velho abriu os olhos e disse: “Onde estão meus sapatos?”
Perguntaram-lhe: “O que o senhor vai fazer com os seus sapatos? Descanse”.
Mas ele insistiu: “Quero meus sapatos”.
O filho mais velho disse: “Ele é um teimoso. Talvez queira morrer com os sapatos
nos pés. Deixe-o pegar os sapatos”.
E o velho, enquanto calçava os sapatos, disse: “Não precisam se preocupar com
as despesas. Eu ainda tenho um resto de vida. Vou caminhar até o cemitério.
Vejo-os lá! Morrerei exatamente na sepultura. Aborrece-me que vocês sejam tão
extravagantes. Em vida eu apenas sonhei com um Rolls Royce, ou com outro
carro bonito. Sonhar não é dispendioso, a gente pode sonhar com qualquer
coisa”.
E, diz-se, o velho andou até o cemitério, os filhos e os parentes seguiram-no, e
ele morreu exatamente junto à sepultura — para economizar dinheiro.
O último pensamento de um moribundo é decorrente de toda a sua vida, de toda
a sua filosofia, de toda sua religião. É uma tremenda exposição.
Um dos seguidores de J. Krishnamurti — um ancião muito respeitado na Índia
— costumava vir a mim porque o seu filho era Procurador Geral de Madhya
Radesh, e o Fórum de M.P. fica em Jabalpur. Ele costumava vir visitar o filho, e
sempre ia ver-me se eu estivesse na cidade. O velho tinha sido seguidor de
Krishnamurti por quase cinquenta anos. Ele abandonara todos os rituais, todas
as escrituras; ele estava absolutamente convencido, lógica e intelectualmente,
de que Krishnamurti estava certo. Eu costumava dizer-lhe: “Você deve lembrar-
se: convicção intelectual, convicção lógica ou racional é muito superficial. Na
hora da crise ela desaparece, evapora”.
Mas ele costumava dizer: “Cinquenta anos! Não pode ser superficial”.
Um dia seu filho veio a mim e disse-me: “Meu pai está morrendo e eu não pude
pensar em mais ninguém que ele gostaria de ter perto de si. Ele o ama tanto.
Então venha comigo: trouxe o carro, não há muito tempo”.
Assim, eu fui com ele. Quando atravessei a porta do quarto de seu pai, muito
silenciosamente seus lábios estavam se movendo. Entrei, também muito
silenciosamente, porque eu queria ouvir o que ele estava repetindo. Estava
dizendo: “Ram, Ram, Ram”, o nome hindu de Deus. E durante cinquenta anos
ele afirmara que não havia Deus.
Eu o sacudi. Ele abriu os olhos e falou: “Não me perturbe. Esta não é hora de
argumentação”.
Disse-lhe: “Não vou arguir, mas só perguntar: o que aconteceu com aqueles
cinquenta anos? De onde vem essa repetição do nome de Deus? Você insistia
que não havia nenhum Deus”.
Ele replicou: “Isso estava bem naquele tempo, mas agora que estou morrendo
— e o médico disse que eu não sobrevivo mais do que meia hora — não me
perturbe. Deixe-me repetir o nome de Deus. De qualquer modo, quem sabe? Ele
pode existir. Se não há nenhum Deus, não há nenhum mal em repetir o seu
nome. Mas se há um Deus, e você não morre repetindo o seu nome, aí você está
na lista negra. E eu não quero ir para o inferno, sofri o bastante aqui nesta terra”.
Falei: “Isto era o que eu estava lhe dizendo, que convicção intelectual não serve
para nada”.
Ele não morreu; sobreviveu. Depois de três ou quatro dias, fui vê-lo. Estava
sentado no jardim, e eu lhe disse: “E sobre aquela noite?”
Respondeu-me: “Esqueça-se de tudo aquilo. Foi apenas um momento de
fraqueza; o medo da morte me fez começar a repetir o nome de Deus, embora
não haja nenhum Deus”.
Disse-lhe: “Isto significa que você precisa de outra experiência de morte? Este
foi o seu primeiro ataque do coração; você sobreviveu — o segundo virá logo.
No máximo você pode sobreviver ao segundo, mas ao terceiro você não será
capaz de sobreviver. E lembre-se do que você está me dizendo”.
Ele respondeu-me: “Esqueça-se disso tudo. Estou absolutamente certo de que
não há nenhum Deus”.
Disse-lhe: “Apenas deixe a morte começar a aproximar-se de você e,
imediatamente, as suas convicções superficiais, intelectuais, desaparecerão.
Essa idéia de que não há nenhum Deus não é propriamente sua, é emprestada.
Não é de sua própria exploração; não é seu próprio insight; não faz parte da sua
consciência, mas somente parte da sua mente”.
As pessoas se comportarão diferentemente.
Você está perguntando: “O que acontecerá à consciência humana quando as
pessoas do mundo, subitamente, perceberem que estão no meio de uma praga
incontrolável e devastadora que matará a maior parte das pessoas que elas
conhecem?”
Alguns pontos, certamente, podem ser afirmados. Quando todo o mundo está
morrendo, todos os seus relacionamentos — sua mãe, seu pai, sua namorada,
sua esposa, seu marido, seu namorado, seus filhos — não significam nada.
Quando todo o mundo está a ponto de desaparecer na morte, num buraco negro,
os relacionamentos que você criou na vida não podem permanecer intactos. Na
verdade, por trás dos nossos relacionamentos, permanecemos estranhos.
Isso nos faz sentir medo, então nunca o encaramos. Por outro lado, mesmo
quando você está na multidão, você está sozinho; mesmo que o seu nome seja
conhecido pelas pessoas, isso faz alguma diferença? Você ainda é um estranho.
E isso pode ser constatado: marido e mulher podem viver trinta, quarenta,
cinquenta anos juntos, mas quanto mais eles vivem juntos, mais eles se tornam
conscientes de que são estranhos.
Antes de se casarem eles tiveram a ilusão de que talvez tivessem sido feitos um
para o outro, mas, assim que a lua-de-mel acaba, esta ilusão desaparece. E a
cada dia eles se tornam mais e mais distantes — fingindo que tudo está muito
bem, que está tudo certo. Mas lá no fundo eles sabem que a estranheza deles é
intocável.
O mundo todo está cheio de estranhos. E se ele for desaparecer no próximo
momento, se for anunciado em todas as rádios e em todas as televisões,
subitamente, você se veria em sua completa nudez — sozinho.
Uma criança pequena foi ao zoológico com o pai e ficaram observando um leão
muito feroz em sua jaula — ele andava de um lado para o outro. O garoto ficou
com muito medo; não tinha mais do que nove anos. Pediu ao pai: “Pai, se este
leão sair e acontecer alguma coisa a você, por favor, diga-me o número do
ônibus que eu tenho de tomar para chegar em casa”.
Em tal situação, ele está fazendo uma pergunta muito relevante. Ele não
consegue conceber que se acontecer alguma coisa ao pai, pode ocorrer o
mesmo com ele. Mas caso consiga sobreviver, ele precisará saber o número do
ônibus. O pai ficou chocado com o fato de o filho não estar absolutamente
preocupado com ele.
A proximidade da morte derruba todas as máscaras, subitamente o torna
consciente de que você é só e de que todos os seus relacionamentos foram um
engano, meios de você se esquecer da sua solidão; meios de criar uma família
na qual você sentisse que não estava sozinho.
Mas a morte expõe a realidade, infalivelmente. E isto se refere a mortes
pequenas: se todo mundo for morrer, todos os seus relacionamentos
desaparecerão antes disso. Você morrerá sozinho, como um estranho que não
tem nenhum nome, nenhuma fama, nenhuma respeitabilidade, nenhum poder —
completamente desamparado. Mas, neste desamparo, as pessoas ainda se
comportarão diferentemente.
Um velho ia ter um encontro com uma mulher, jovem. Então ele foi ao médico,
que lhe prescreveu um afrodisíaco para aumentar e prolongar a sua libido. Ele
marcou o encontro num dos melhores restaurantes da cidade. Quando eles
pediram a sopa, ele levou a parceira até o toalete, e então chamou o garçom à
parte: “Coloque estas pílulas na minha sopa, exatamente antes de trazê-la da
cozinha”. A jovem dama voltou, mas quando, depois de quinze minutos, a sopa
não havia sido servida, o velho chamou o garçom: “Onde está a nossa sopa?”,
reclamou.
“Estará aqui em alguns minutos — replicou o garçom — tão logo o talharim
abaixe novamente.” No momento da morte, o assunto mais importante, nas
mentes das pessoas que não são conscientes, vai ser o sexo — porque o sexo
e a morte são dois lados da mesma moeda.
Quando todo mundo estiver morrendo, a maioria das pessoas inconscientes, que
viveram reprimindo a própria sexualidade, pensará somente em sexo. Elas não
podem pensar em nada mais; todos os seus interesses, distrações e religiões
desaparecerão — o mundo está acabando, talvez elas possam fazer amor mais
uma vez, antes de a morte destruir tudo. Viveram reprimindo a libido, a
necessidade sexual, durante toda a vida — de acordo com o parecer dos padres,
de acordo com a imposição da sociedade e da cultura — e agora percebem que
nada disso tem importância. Tudo vai desaparecer; eles não precisam de
nenhuma respeitabilidade, não se importam com religião.
Mas tudo dependerá, diferentemente, dos indivíduos, de como eles viveram. Se
viveram uma vida desinibida, natural, dando-se totalmente a cada momento,
então talvez eles simplesmente observarão — vai ser a maior tragédia, o maior
drama no mundo. Não farão nada, mas se sentarão silenciosamente e
observarão. Mas nenhuma lei geral pode ser estabelecida do que as pessoas
farão.
Somente sobre as pessoas iluminadas pode ser dito com absoluta garantia de
que não haverá, absolutamente, nenhuma diferença. Elas sabem que esta é a
natureza das coisas. Esta é toda a abordagem de Gautama Buda — a filosofia
da natureza das coisas — de que há um tempo em que o outono vem, e as folhas
têm de deixar a árvore. Quando chega a primavera, aparecem as flores. O
Ocidente não tem esse modo de pensar. Segundo o pensamento oriental, não é
apenas uma criação, mas toda a criação vai para dentro de uma de-criação
exatamente como todo homem, depois de um dia inteiro de trabalho, vai dormir
à noite. Esta é uma visão muito potente. Cada criação, depois de um tempo —
eles até falavam de um tempo exato, quanto tempo demora para uma criação
terminar —, vai para uma de-criação. Ela também precisa de um repouso. Assim,
para uma pessoa iluminada, isso não é nada incomum: é parte da própria
existência. Como o dia termina, a noite terminará também — e novamente a
criação acorda.
Os físicos modernos estão chegando mais perto dessa concepção. Primeiro eles
descobriram buracos negros: que no espaço há estranhos buracos negros, e se
qualquer planeta ou qualquer sol chegar perto do buraco negro, ele é puxado
para dentro e simplesmente desaparece. Mas a ciência compreende o equilíbrio
da natureza: assim, agora, eles estão dizendo que deve haver os buracos
brancos. Talvez o buraco negro seja um dos lados da porta, e o buraco branco
seja o outro lado da porta. Talvez, de um lado, um planeta ou uma estrela vai
para dentro do buraco negro e desaparece de nós, e do outro lado, do buraco
branco, nasça uma estrela nova.
Todo dia novas estrelas nascem e velhas estrelas morrem: a vida e a morte
fazem um círculo contínuo. Se a vida é o dia, a morte é a noite — esta não se
opõe àquele; é apenas um tempo para repouso, sono, um tempo para se
rejuvenescer.
O homem que atingiu a compreensão não será perturbado por isso. Mas as
pessoas inconscientes simplesmente vão ter um choque e começarão a fazer
coisas que nunca fizeram. Elas estiveram se controlando e agora não há
nenhuma razão para se controlar, não há nenhuma necessidade.
Se o fato for conhecido antecipadamente — o que não é muito provável porque,
com as armas nucleares, vai levar somente dez minutos para a terra
desaparecer: daí não haverá muita possibilidade de que você seja informado
antecipadamente: “Esteja pronto!” Haverá apenas o choque de ouvir nas rádios
ou nas televisões que dentro de dez minutos o mundo vai acabar; você vai ficar
simplesmente gelado, paralisado, o choque será muito grande e fora do comum.
Talvez a maioria das pessoas morra com o choque, não com as armas
nucleares. O simples fato de ouvir que dentro de dez minutos todo mundo vai
morrer será o bastante, o choque destruirá a frágil existência delas. Assim sendo,
só é possível levantar uma hipótese de como as pessoas se comportarão.
Somente para os iluminados — eu posso dizer com absoluta garantia, com a
minha própria autoridade — não haverá nenhuma diferença. Se eles estiverem
tomando chá, continuarão a tomar chá; suas mãos nem mesmo tremerão. Se
estiverem tomando banho, continuarão a tomar banho. Não se chocarão; nem
ficarão paralisados, nem ficarão histéricos. Nem se satisfarão nas coisas que
estiveram reprimindo, porque um iluminado não tem nenhuma repressão em seu
ser; ele conhece sempre uma única palavra para dizer à natureza — “Sim”.
Dirão “sim” ao desaparecimento da terra, à suprema morte — eles não
conhecem a palavra “não”. Não vai haver nenhuma resistência da parte deles; e
eles serão os únicos que morrerão conscientemente. E aquele que morre
conscientemente entra no fluxo eterno da vida; não morre.
Aqueles que morrem inconscientemente nascerão em algum outro planeta, em
algum outro útero — porque a vida não pode ser destruída, mesmo por armas
nucleares. Elas podem destruir somente as casas nas quais a vida existe.
The Hidden Splendor — 18 de março de 1987, manhã
PARTE IV
VIAJANDO PARA O
CENTRO DO SEU SER
Meditação:
o caminho além
Amado Bhagwan,
Sinto uma forte conexão entre a morte e a meditação — uma fascinação e um
medo. Quando me sento com Você, é de alguma forma seguro fechar meus
olhos e meditar; quando estou sozinho, é assustador. Por favor, comente.
Não há somente uma forte conexão entre a meditação e a morte, mas elas são
quase a mesma coisa — simplesmente duas maneiras de olhar para a mesma
experiência. A morte separa-o do seu corpo, da sua mente, de tudo aquilo que
não é você. Mas separa-o contra a sua vontade. Você está resistindo, não quer
ser separado; você não está desejando, não está em estado de let-go.
A meditação também separa do seu ser e realidade tudo que não é você — mas
não existe resistência; esta é a única diferença. Ao invés de resistência, há uma
tremenda boa vontade, um desejo, um sentimento apaixonado de boas-vindas.
Você a quer; você a deseja desde as profundezas de seu coração.
A experiência é a mesma — a separação entre o falso e o real — mas, devido à
sua resistência, na morte, você se torna inconsciente, entra em coma. Você se
apega demais na morte; não a permite acontecer, fecha todas as portas, todas
as janelas. Sua ânsia pela vida chega ao ápice. A própria idéia de morrer
assusta-o desde as raízes.
Mas a morte é um fenômeno natural, e absolutamente necessário também —
tem de acontecer. Se as folhas não se tornarem amarelas e não caírem, as
folhas novas, o fresco e o jovem, não virão. Se a pessoa continua vivendo no
corpo velho, não poderá se mover para uma casa melhor, mais fresca, mais
nova, com maiores possibilidades de um novo começo. Talvez não tome o
mesmo curso que percorreu na vida passada, perdendo-se num deserto. Pode
penetrar em um novo céu de consciência.
Cada morte é um fim e um começo.
Não preste muita atenção ao fim. É o fim para um velho, roto, miserável estilo de
vida, e é uma grande oportunidade para se começar uma vida nova, sem
cometer os velhos equívocos. É o começo de uma aventura. Mas, porque você
se apega à vida e não quer deixa-la — e ela tem de acontecer pela própria
natureza das coisas —, você cai na inconsciência.
Quase todo mundo, exceto aqueles poucos que se tornaram iluminados, morrem
inconscientemente; portanto, eles não sabem o que a morte é, não conhecem
seu novo começo, a nova madrugada.
A meditação é sua própria investigação.
Você está procurando saber exatamente do que você se constitui: o que é falso
em você e o que é real em você. É uma estupenda jornada do falso para o real,
do mortal para o imortal, da escuridão para a luz. Mas quando você chega ao
ponto de ver a separação da mente e do corpo, e a você mesmo simplesmente
como uma testemunha, a experiência é a mesma da morte. Você não está
morrendo... um homem que meditou morrerá alegremente porque ele sabe que
não há morte; a morte estava no seu apego à vida.
Você diz: “Sinto uma forte conexão entre a morte e a meditação...” E há. Nas
escrituras ancestrais desta terra, até o mestre é definido como a morte, porque
toda a sua função, todo o seu trabalho é ensinar a meditação. Em outras
palavras, ele ensina a morrer sem morrer — a passar pela experiência da morte,
surpreso de que ainda esteja vivo; a morte foi como uma nuvem que passou,
sem sequer arranhá-lo. Daí, a fascinação e o medo. Fascinação por saber que
a misteriosa experiência pela qual todos têm de passar já aconteceu muitas
vezes, mas não se tem consciência dela. E medo de que talvez a morte seja
somente um fim, não um outro começo.
Aconteceu, no princípio deste século, que o rei de Varanasi estava para ser
operado. A operação era grande, mas o rei era muito teimoso e não queria tomar
qualquer espécie de anestesia. Ele disse: “Podem fazer a operação, mas eu
quero vê-la acontecer; não quero estar inconsciente”.
Os médicos estavam perplexos. É contra a prática médica — uma tão grande
operação seria muito dolorosa; o homem poderia morrer de tanta dor. A cirurgia
requer que se esteja inconsciente.
Talvez a ciência cirúrgica tenha aprendido a arte da anestesia a partir da
experiência da morte, porque a morte é a maior cirurgia. Ela o separa do seu
corpo, da sua mente e do seu coração, com o que você esteve identificado por
setenta, oitenta anos. Eles quase se tornaram o seu ser real. A separação vai
ser muito dolorosa, e há um limite para a dor.
Você já percebeu? — não há nenhuma dor insuportável. A expressão “dor
insuportável” existe somente na linguagem — toda dor é suportável. No
momento em que ela se torna insuportável, você fica inconsciente. Sua
consciência é uma das maneiras de suportá-la.
Se Varanasi tivesse sido um homem comum, os médicos não o teriam ouvido —
mas ele era um rei e um rei muito bem conhecido, conhecido por todo o país
como um grande sábio. Ele persuadiu os cirurgiões: “Não se preocupem, nada
vai acontecer comigo. Dêem-me apenas cinco minutos antes de começarem a
operação, a fim de que eu possa me colocar em estado meditativo. Quando
atingir o estado de meditação, já estarei bem longe do corpo. Então vocês podem
cortar o meu corpo em pedaços; eu serei apenas uma testemunha, e uma
testemunha distante, como se a cirurgia estivesse acontecendo com outra
pessoa”.
O momento era muito crítico; a operação tinha de ser feita imediatamente. Caso
contrário, poderia causar a morte. Havia somente duas alternativas: ou operar e
permitir ao paciente permanecer consciente, ou não operar, mas seguir a velha
rotina da ciência. Mas neste caso, a morte era certa. No primeiro caso, havia
uma chance de que, talvez, aquele homem pudesse se arranjar, e ele era tão
insistente. Não encontrando nenhum modo de persuadi-lo, tiveram de operar.
Esta foi a primeira operação feita sem anestesia, em estado de meditação. O rei
simplesmente fechou os olhos, ficou silencioso. Até os cirurgiões sentiram algo
mudando à volta do rei — a vibração, a presença; a face dele tornou-se relaxada
como a de um bebezinho recém-nascido, e depois de cinco minutos eles
começaram a operação. A cirurgia levou duas horas, e eles estavam tremendo
de medo; na verdade, eles não estavam certos de que o rei sobreviveria — o
choque poderia ser demasiado. Mas quando a operação terminou, o rei
perguntou-lhes: “Posso abrir meus olhos agora?”
Isto foi discutido na esfera médica do mundo inteiro como um caso muito
estranho. Os cirurgiões perguntaram-lhe o que ele fez.
Ele respondeu: “Não fiz nada. Meditar é a minha própria vida. Momento a
momento estou vivendo em silêncio. Pedi aqueles cinco minutos porque vocês
iam fazer uma operação tão perigosa que eu tinha de estar absolutamente
assentado em meu ser, sem nenhuma hesitação. Então vocês poderiam fazer
qualquer coisa porque não o estariam fazendo em mim. Eu sou consciência —
e vocês não podem operar a consciência, podem operar somente o corpo”.
Você diz: “Quando me sento com você, é de alguma forma seguro”. Não há
realmente nenhuma diferença se você se senta comigo ou se senta sozinho —
é apenas uma segurança da mente: sabendo que o mestre está presente, pensa-
se que não há nenhum mal em dar o salto. Se alguma coisa der errado, alguém
está presente para cuidar disso.
Em meditação, nada dá errado — nunca. Sem meditação, tudo dá errado.
Nada dá certo sem meditação; toda a sua vida dá errado. Você vive somente de
esperança, mas suas esperanças nunca são preenchidas. Sua vida é uma longa,
longa tragédia. E a razão é sua inconsciência, seu estado não-meditativo.
A meditação se parece com a morte, e a experiência é exatamente a mesma.
Mas a atitude e o acesso a elas são diferentes, e a diferença é tão vasta que se
pode dizer que a meditação é vida e a morte é apenas um sonho.
Mas esta é a função de uma escola de mistérios, onde muitas pessoas estão
meditando, onde um mestre está presente. Você se sente seguro, não está
sozinho. Se alguma coisa der errado, a ajuda estará disponível imediatamente.
Mas nada dá errado.
Assim, medite enquanto você está sentado perto de mim, e medite quando
estiver só. A meditação é a única coisa com garantia absoluta de que nada dá
errado. Ela somente revela a sua existência a você mesmo — como pode alguma
coisa dar errado? E você não está fazendo nada; você está realmente parando
de fazer tudo. Está parando de pensar, de sentir, de fazer — está pondo um
ponto final em todas as suas ações. Somente a consciência permanece, porque
ela não é ação sua, é você.
Uma vez que você conseguiu provar do seu ser, todos os medos desaparecem,
e a vida se torna uma dimensão totalmente nova — não mais mundana, não
mais comum. Pela primeira vez você vê a sacralidade e a divindade não apenas
de si mesmo, mas de tudo o que existe. Tudo se torna misterioso, e viver neste
mistério é a única maneira de viver em felicidade suprema; viver neste mistério
é viver sob a bênção que se derrama sobre você como chuva. Cada momento
traz, mais e mais, bênçãos mais penetrantes e mais profundas para você — não
que você as mereça, mas porque a vida as dá a partir de sua abundância; ela
está carregada, compartilha com quem é receptivo.
Mas não procure identificar a idéia da meditação com a morte, porque a morte
não tem boas associações em sua mente. Isto o impedirá de experienciar a
consciência — “É como a morte”. De fato, é uma morte comum, não é uma morte
verdadeira. A morte comum não é uma morte verdadeira, porque você será,
novamente, ligado a uma outra estrutura, a um outro corpo, A pessoa que medita
morre em grande estilo; nunca mais fica aprisionada em um corpo.
Um italiano perdeu um dia de trabalho e o contramestre quis uma explicação.
— Onde você esteve? — perguntou.
— Foi a minha mulher. Ela deu à luz um “wheelbarrow” (carrinho de mão).
— Se você não tem nada melhor para dizer — disse o contramestre — vou
despedi-lo.
— Acho que não falei direito — disse o italiano. — Minha mulher, ela está numa
cama tendo um carrinho de empurrar.
— É isto, cara esperto — gritou o contramestre — você está despedido.
O italiano foi para casa e perguntou à mulher:
— Ei, o que aconteceu de errado ontem?
— Eu lhe disse, tive um “miscarriage” (carrinho de mão ou... aborto.)
— Eu sabia, tinha alguma coisa com rodas nele.
As incompreensões se acumulam sobre você. Algumas podem ser imensamente
danosas. Manter meditação e morte identificadas em sua mente é um dos
maiores malefícios que você pode fazer a si mesmo. Embora você não esteja
errado, suas associações com o significado de morte são tais que elas o
impedirão de entrar em meditação.
Esta é uma das razões pelas quais quero tornar a morte mais e mais associada
à celebração, em vez de associá-la ao luto, mais e mais associada com uma
mudança, um novo começo, em vez de identifica-la com um ponto final, com um
fim. Quero mudar a associação, o que limpará o caminho para o estado
meditativo.
E se você está se sentindo, aqui, comigo, silencioso e meditativo — ainda vivo,
mais vivo do que nunca — então não há nenhuma necessidade de ter medo.
Tente isto em situações diferentes, e você sempre encontrará uma fonte de
grande cura, uma fonte de grande bem-estar, uma fonte de grande sabedoria,
uma fonte de grande insight na vida e nos seus mistérios.
The Golden Future — 18 de maio de 1987, manhã
Conheça a morte
sem morrer
Amado Bhagwan,
Por que o medo da morte tem sido uma companhia constante por toda a minha
vida e qual é o significado disso para mim?
A meditação e a morte são experiências muito similares. Na morte o seu ego
desaparece; somente o seu ser puro permanece. O mesmo acontece na
meditação: o desaparecimento do ego e a presença somente do puro estado de
ser, de seu ser. A semelhança é tão profunda que da mesma maneira que as
pessoas têm medo da morte, têm também medo da meditação. Por outro lado,
se você não tem medo da meditação, não terá medo da morte tampouco.
A meditação prepara você para a morte.
Toda a nossa educação é orientada somente para a vida. É apenas uma
educação pela metade, e a outra metade — que é muito mais importante, que
vem como um clímax da vida — é completamente descurada por todos os
sistemas de educação que existiram anteriormente ou que existem agora.
A meditação prepara você para a outra metade; ela o ajuda a conhecer a morte
sem morrer. E, uma vez que você compreenda a morte sem morrer, o medo da
morte desaparecerá para sempre. Mesmo quando a morte vier, você ficará
observando-a silenciosamente, sabendo perfeitamente que ela não pode causar
nem mesmo um pequeno arranhão em seu ser. Ela vai levar o seu corpo, a sua
mente, mas não você.
Você pertence à vida imortal.
The Hidden Splendor — 23 de marco de 1987, noite
O centro do
ciclone
A meditação é toda a ciência de extrair mais e mais consciência das trevas. A
única maneira de chegar a isso é ser tão consciente quanto possível, vinte e
quatro horas por dia. Sentando-se, sente conscientemente, não como um robô;
andando, ande conscientemente, alerta a cada movimento; ouvindo, ouça mais
e mais conscientemente, de tal modo que cada palavra chegue a você em sua
pureza cristalina, em sua exatidão. Enquanto ouvir, permaneça silencioso, de tal
modo que a sua consciência não seja encoberta por pensamentos.
Neste exato momento, se você está silencioso e consciente, você pode ouvir
pequenos insetos cantando suas canções nas árvores. A escuridão não é vazia,
a noite tem a sua própria canção, mas se você está cheio de pensamentos, então
você não pode ouvir os insetos. Esse é apenas um exemplo.
Se você se torna mais e mais silencioso, você pode começar a ouvir as próprias
batidas do seu coração, pode começar a ouvir o fluxo do seu próprio sangue
porque o sangue está continuamente fluindo através de todo o seu corpo. Se
você está consciente e silencioso, mais e mais claridade, criatividade,
inteligência serão descobertas.
Um dos maiores filósofos do Ocidente, C.E.M. Joad, estava morrendo, e um
amigo, que era discípulo de George Gurdjieff, veio vê-lo. Joad perguntou ao
amigo: “O que você continua fazendo com esse cara esquisito. George Gurdjieff?
Por que você está perdendo o seu tempo? E não somente você, eu ouvi dizer
que muitas pessoas estão perdendo o tempo delas”.
O amigo riu. Disse: “É estranho que aquelas poucas pessoas que estão com
Gurdjieff pensem que todo o mundo está perdendo seu tempo, e você está
pensando que nós estamos perdendo o nosso tempo”.
Joad disse: “Não tenho muito tempo para viver: de outro modo eu poderia ir e
comparar”.
O amigo respondeu: “Mesmo que você tenha somente alguns segundos mais
para viver, isso pode ser feito aqui, agora”.
Joad concordou.
O homem disse: “Feche seus olhos e apenas olhe para dentro, e então abra os
seus olhos e diga-me o que encontrou”.
Joad fechou os olhos, abriu-os em seguida e disse: “Há escuridão e nada mais”.
O amigo riu e disse: “Não é hora de rir, porque você está quase morrendo, mas
eu vim na hora certa. Você disse que viu somente escuridão por dentro?”
Joad respondeu: “Naturalmente”.
E o homem replicou: “Você é um filósofo tão notável, escreveu livros tão lindos.
Não pode ver o que é importante, que há duas coisas — você e a escuridão? De
outro modo, quem viu a escuridão? A escuridão não pode ver a si mesma — isso
é certo — e a escuridão não pode relatar que há somente escuridão”.
Joad considerou o fato e disse: “Meu Deus, talvez as pessoas que estão com
Gurdjieff não estejam perdendo seu tempo. É verdade, eu vi a escuridão”.
O amigo falou: “Todo o nosso esforço é fazer este eu, a testemunha, mais forte
e mais cristalizado, e transformar a escuridão em luz. Ambas as coisas
acontecem simultaneamente. À medida que a testemunha se torna mais e mais
centrada, a escuridão se torna cada vez menor. Quando a testemunha chega ao
apogeu de seu florescimento, que é o lótus da consciência, toda a escuridão
desaparece”.
Estar na escuridão é estar vivendo no mínimo. E estar repleto de luz é viver no
máximo.
The Razor’s Edge — 2 de março de 1987, noite
Uma ancestral
chave de ouro
Existem centenas de métodos de meditação, mas talvez a vipassana tenha um
status singular, exatamente do mesmo modo como houve milhares de místicos,
mas Gautama Buda tem uma singularidade própria. Por muitas razões ele é
incomparável, e fez mais pela humanidade do que qualquer outro. Em muitos
sentidos sua busca pela verdade foi mais sincera, mais autêntica do que a de
qualquer outro.
Esta foi a meditação através da qual Gautama Buda tornou-se iluminado. A
própria palavra “vipassana”, em páli, a língua na qual Gautama Buda falava... O
significado — o significado literal — da palavra é olhar, e o significado metafórico
é observar, testemunhar.
Gautama Buda escolheu uma meditação que pode ser chamada de meditação
essencial. Todas as outras meditações são formas diferentes de testemunhar,
mas testemunhar está presente em toda espécie de meditação como uma parte
essencial: não pode ser evitada. Buda anulou tudo o mais e ficou somente com
a parte essencial — testemunhar.
Há três etapas no testemunhar. Buda é um pensador muito cientifico. Começa
com o corpo, porque este é o mais fácil para se testemunhar. É fácil testemunhar
minhas mãos se movendo, minha mão sendo levantada. Posso testemunhar a
mim mesmo andando na rua, posso testemunhar cada passo à medida que
ando. Posso testemunhar quando estou comendo meu alimento. Assim, o
primeiro passo na vipassana é testemunhar as ações do corpo, que é o passo
mais simples. Qualquer método científico sempre começará pelo mais simples.
Enquanto testemunhar o corpo, você ficará surpreso com as novas experiências.
Quando você move as suas mãos testemunhando, observando, em estado de
alerta, de consciência, você sentirá uma certa graça e um certo silêncio na mão.
Você pode fazer o movimento sem testemunhar — ele será mais rápido, mas
perderá a graciosidade.
Buda costumava andar tão vagarosamente que, muitas vezes, perguntavam-lhe
por que andava tão lentamente. Ele dizia: “Faz parte da minha meditação: andar
sempre como se estivesse andando no inverno, num rio gelado...
vagarosamente, alerta — porque o rio está muito gelado; consciente porque a
corrente está muito forte; testemunhando cada um dos passos, porque se pode
escorregar nas pedras do rio”.
O método permanece o mesmo, somente o objeto muda com cada passo. O
segundo passo é observar a mente. Agora você se move para dentro de um
mundo mais sutil: observa seus pensamentos. Se você foi capaz e bem-sucedido
ao testemunhar o seu corpo, não vai haver nenhuma dificuldade.
Os pensamentos são ondas sutis, ondas eletrônicas, ondas de rádio, mas são
tão materiais quanto seu corpo. Não são visíveis, como o ar não é visível, mas o
ar é tão material quanto as pedras; os seus pensamentos são igualmente
materiais, mas invisíveis.
Este é o segundo passo, o passo do meio. Você está se movendo na direção da
invisibilidade, mas ainda é material — observe seus pensamentos. A única
condição é: não julgue. Não julgue porque, no momento em que começar a
julgar, se esquecerá de observar.
Não há nenhum antagonismo com o julgar. A razão pela qual ele é proibido é
que o tempo que você passa julgando: “Este é um bom pensamento”, não
consegue testemunhar. Quando começa a pensar, você se envolve. Você não
pode permanecer alheio, ficar de pé ao lado da estrada e apenas olhar o tráfego.
Não se torne um participante, nem para valorizar, avaliar, condenar; nenhuma
atitude deve ser tomada sobre o que está passando pela sua mente.
Você deve olhar seus pensamentos como se observasse nuvens passando no
céu. Você não emite julgamentos sobre elas: “Esta nuvem negra é muito ruim,
esta nuvem branca parece um sábio”. Nuvens são nuvens, nem são más nem
são boas. Assim são os pensamentos — uma onda de curta duração passando
através da sua mente.
Observe sem qualquer julgamento e você terá uma surpresa maior. A medida
que seu observar se torna firme, os pensamentos virão cada vez menos. A
proporção é exatamente a mesma: se você estiver cinquenta por cento no seu
testemunhar, então cinquenta por cento dos seus pensamentos desaparecerão.
Se você estiver sessenta por cento no seu testemunhar, então somente quarenta
por cento de pensamentos estarão presentes. Quando você for noventa e nove
por cento uma pura testemunha, somente de vez em quando haverá um
pensamento solitário, um por cento, passando pela estrada; desse modo o
tráfego se foi. Aquele tráfego da hora do rush não existe mais.
Quando você está cem por cento sem julgar, sendo simplesmente uma
testemunha, significa que se tornou apenas um espelho, porque um espelho
nunca faz julgamentos. Uma mulher feia se olha nele — o espelho não emite
nenhum julgamento. Uma linda mulher se olha nele — para o espelho, não faz
nenhuma diferença. Ninguém se olha nele — o espelho está tão puro quanto se
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  • 2. Sumário PARTE I A ÚNICA CERTEZA NA VIDA É A MORTE “Pare a roda!” Sacrificar o hoje por um amanhã fictício Uma porta para o divino O mito da mortalidade PARTE II OS SALVADORES SÃO A SUA MORTE Pseudo-religiões: medo da morte e da vida O Oriente tem o fermento, o Ocidente a massa A raiz de todos os medos Uma fácil exploração A vida não deve ser mitificada PARTE III OBSERVE E VOCÊ SABERÁ Por que apegar-se? Simplesmente cante! A vida é a carícia preliminar, a morte é orgástica PARTE IV VIAJANDO PARA O CENTRO DO SEU SER Meditação: o caminho além Conheça a morte sem morrer O centro do ciclone
  • 3. Uma ancestral chave de ouro A consciência impecável traz grande alegria O bardo tibetano O príncipe transcendente A beleza sem a fera PARTE V DESFRUTE TOTALMENTE! UMA VISTA DOS PICOS ENSOLARADOS Da escuridão para a luz A realidade que não morre Indague até o fim Uma olhadela no ontem Fique acordado durante o filme O direito de morrer A celebração não sabe nada sobre a morte Aprenda a arte enquanto ainda há tempo Acorde e cante
  • 4. QUANDO alguém morre — quem quer que seja que você conheceu, amou e com quem viveu, alguém que se tornou parte do seu ser, alguma coisa morre em você também. Naturalmente, você sentirá falta da pessoa e experimentará um vazio. Isso é natural. Mas esse mesmo vácuo pode ser convertido em porta. E a morte é uma porta... A morte é o único fenômeno existente que não foi corrompido pelo homem. Em contrapartida, o homem corrompeu tudo, poluiu tudo. Somente a morte ainda permanece virgem, não corrompida, intocada pelas mãos do homem. O homem continua perdido em relação ao que fazer com a morte. Ele não a pode compreender, não pode fazer dela uma ciência: eis por que a morte ainda não foi corrompida, e atualmente apenas ela foi preservada da corrupção. É a única coisa que permanece incorrupta no mundo. Durante séculos nos tem sido ensinado que a morte é contrária à vida, que a morte é inimiga da vida, que a morte é o fim da vida. Naturalmente, ficamos assustados e não podemos relaxar, não podemos estar num let-go*. E se você não pode estar num let-go em relação à morte, permanecerá tenso em sua vida, porque a morte não é separada da vida. * Let-go significa relaxar, deixar acontecer, deixar rolar. Se você não aceita a morte, permanece incompleto, fica pela metade, desequilibrado. Quando você aceita a morte, também se torna equilibrado. Então, tudo é aceito: o dia e a noite. o verão e o inverno — ambas, a luz e a escuridão. Quando as polaridades da vida são aceitas, você ganha equilíbrio. Torna-se tranquilo, torna-se inteiro.
  • 5. PARTE I A ÚNICA CERTEZA NA VIDA É A MORTE
  • 6. “Pare a roda!” O pai da minha mãe adoeceu subitamente. Não era hora de ele morrer. Não tinha mais do que cinquenta anos, ou até menos: talvez tivesse menos idade do que tenho agora. Minha avó tinha exatamente cinquenta anos: encontrava-se no ápice da sua juventude e beleza. Eu lhe perguntei: “Ele está morto. Você o amava. Porque não está chorando?” Ela disse: “Por sua causa. Eu não quero chorar diante de uma criança (que mulher era ela!) e não quero consolá-lo. Se eu começar a chorar, então, naturalmente, você vai chorar: dai, quem vai consolar quem?” Eu preciso descrever aquela situação. Nós estávamos num carro de boi, indo da cidade do meu avô para a de meu pai, porque lá se encontrava o único hospital da região. Meu avô estava gravemente enfermo. Não apenas doente, mas inconsciente também, quase em coma. Além de meu avô, ela e eu éramos as únicas pessoas que estavam no carro. Posso compreender a compaixão dela por mim. Sequer chorava pela morte do seu amado marido, apenas por minha causa: apenas eu a acompanhava, e não haveria ninguém mais para me consolar. Eu lhe disse: “Não se preocupe. Se você pode conter as lágrimas, eu também posso”. Você pode ou não acreditar, mas uma criança de sete anos não derramou uma lágrima. Até minha avó ficou perplexa e disse: “Você não está chorando?” Respondi: “Não quero consolar você”. Era um grupo especial o que estava naquele carro de boi. Bhoora o dirigia. Ele sabia que o seu patrão estava morto. Mesmo assim não se atrevia a olhar para dentro do carro, porque ele era apenas um empregado e não cabia a ele interferir em assuntos privados. Foi isso o que ele me disse: “A morte é um assunto privado: como eu podia olhar? Ouvi tudo do banco de direção. Queria chorar, eu o amava muitíssimo. Sinto-me como um órfão, mas eu não podia olhar para trás, para dentro do carro, caso contrário ele jamais me perdoaria”. Éramos um grupo singular, e Nana1 estava no meu colo. Eu era uma criança de sete anos de idade convivendo com a morte, não por apenas alguns segundos, mas ininterruptamente por vinte e quatro horas. Não havia estrada e era difícil chegar à cidade de meu pai. A marcha era muito lenta. Nós ficamos com o corpo
  • 7. morto durante vinte e quatro horas... Meu avô morreu lentamente, pouco a pouco. Pude sentir a morte tomando conta dele e pude verificar o grande silêncio dela. 1. Nana significa vovó. Eu também era afortunado por minha Nani2 estar presente. Sem ela eu talvez teria perdido a ocasião de perceber a beleza da morte, porque o amor e a morte são tão semelhantes, talvez a mesma coisa. Ela me amava, jorrava seu amor sobre mim, enquanto a morte estava lá, acontecendo lentamente. 2. Significa vovó. O carro de boi... Ainda posso ouvir o seu som — o crepitar provocado pelo movimento das rodas sobre as pedras, Bhoora gritando continuamente para os bois, o som do chicote fustigando-os... ainda posso ouvir tudo. Está tão profundamente enraizado em minha experiência que, acho, nem minha morte pode apagar. Mesmo quando eu estiver morrendo, poderei ouvir novamente o som daquele carro de boi. Eu tinha ouvido falar sobre a morte de outras pessoas, mas apenas ouvido falar. Não tinha visto, e, mesmo que tivesse visto, não significaria nada para mim. Quando alguém que você ama morre, só então pode realmente encontrar-se com a morte. Deixe-me sublinhar isto: a morte só pode ser encontrada na morte de um ser amado. Quando o amor, somado à morte, envolve você, há uma transformação, uma imensa mutação, como se um novo ser estivesse nascendo. Você nunca mais será o mesmo. Mas as pessoas não amam, e porque elas não amam, não podem ter a experiência da morte do mesmo modo que eu a tive. Sem amor, a morte não lhe dá as chaves da existência. Com amor, ela lhe dá a chave de tudo o que existe. Minha primeira experiência com a morte não foi um simples encontro. Foi complexa de muitas maneiras. O homem que eu amava estava morrendo. Eu o conhecera como meu pai. Ele me fizera crescer em absoluta liberdade: nenhuma inibição, nenhuma proibição e nenhum mandamento. Ele nunca me disse: “Não faça isso”, ou “Não faça aquilo”. Somente agora eu posso perceber a grandeza daquele homem. Eu amei o homem porque ele amou minha liberdade. Eu só posso amar se a minha liberdade for respeitada. Se eu tiver de barganhar e obter amor pagando com minha liberdade, esse amor não é para mim. Então ele é para mortais de menor envergadura, não é para aqueles que conhecem.
  • 8. “Meu Deus, esta vida que você me deu, eu lha devolvo com meus agradecimentos.” Estas foram as últimas palavras de meu avô, embora ele nunca tenha acreditado em Deus e não fosse um hindu. Antes de ele morrer, entre outras coisas, dizia repetidamente: “Pare a roda...”. Meu avô estava morrendo e nos pedia para pararmos a roda — que absurdo! Como eu poderia parar a roda? Ele tinha de chegar ao hospital, e sem a roda nós ficaríamos perdidos na floresta. Meu avô disse: “Pare a roda. Rajah, você não está me ouvindo? Se eu posso ouvir a risada da sua avó, você deve ser capaz de me ouvir”. Eu lhe disse: “Não se preocupe com a risada. Eu conheço vovó. Ela não está rindo do que você está dizendo, é uma coisa entre nós dois, uma piada que eu contei a ela”. Ele disse: “Tudo bem. Se é uma piada que você contou a ela, está perfeitamente certo que ela ria. Mas e sobre o chakra, a roda?” Agora sei ao que se referia, mas naquele tempo eu não estava absolutamente familiarizado com tal terminologia. A roda representa toda a obsessão indiana com a roda-da-vida-e-da-morte. Por milhares de anos, milhões de pessoas estiveram fazendo somente uma coisa: tentando parar a roda. Ele não estava falando sobre as rodas do carro de boi — esta era muito fácil de se parar; na verdade, difícil era mantê-la em movimento. Eu não poderia entender, naquele momento, por que meu Nana estava tão insistente. Talvez o carro de boi — porque não havia estrada — estivesse fazendo barulho demais. Tudo estava chacoalhando, e ele estava em agonia. Era natural que quisesse parar a roda. Mas minha avó ria. Agora sei porque ela ria. Sabia que estava se referindo à obsessão indiana com a vida e a morte, simbolicamente chamada de a roda-da-vida-e-da-morte — e, abreviadamente, de a roda, que gira sem parar... É por isso que meu avô estava dizendo: “Pare a roda”. Se eu tivesse podido parar a roda, eu a teria parado, não apenas para ele, mas para todas as pessoas do mundo. Eu não apenas a teria parado, eu a teria destruído para sempre, de modo que ninguém pudesse jamais girá-la outra vez. Mas isto não está nas minhas mãos. Mas por que essa obsessão? Eu me tornei consciente de muitas coisas no momento de sua morte... aquilo determinou toda a minha vida. Perguntei-lhe ao ouvido: “Nana, você tem alguma coisa para me dizer antes de ir embora? Alguma palavra final? Ou você quer me dar alguma coisa para eu me lembrar de você para sempre?”
  • 9. Ele tirou seu anel e o colocou na minha mão. Aquele anel fora sempre um mistério. Em toda a sua vida ele não permitira a ninguém olhar o que havia nele, embora costumasse olhar dentro do anel repetidamente. Aquele anel tinha uma pequena abertura de vidro, em ambos os lados, pelas quais se podia olhar. Em cima havia um diamante e em cada um dos lados havia uma abertura. Ele não permitia a ninguém ver o que ele costumava olhar através da abertura. Dentro havia uma estátua de Mahavira, o tirthankara jaina — uma imagem realmente linda, e muito pequena. Devia ser de Mahavira, e aquelas duas aberturas eram lentes de aumento. Elas o aumentavam e a imagem parecia realmente imensa. Com lágrimas nos olhos ele disse: “Não tenho mais nada para lhe dar porque tudo que tenho será tomado de você também, exatamente como foi tomado de mim. Eu só posso lhe dar meu amor por aquele que conheceu a si mesmo”. Embora eu não tenha guardado o anel, satisfiz seu desejo. Eu conheci “aquele”, e o conheci em mim mesmo. Num anel, que importância tem? Mas o pobre velho, ele amava seu mestre Mahavira e deu este amor para mim. Respeito o amor dele pelo seu mestre e por mim. As últimas palavras saídas de seus lábios foram: “Não se preocupe porque eu não estou morrendo”. Todos nós esperamos para ver se ele ia dizer alguma coisa mais, mas isso foi tudo. Seus olhos se fecharam e ele não existia mais. Minha Nani estava segurando a minha mão, e eu estava completamente aturdido, não sabendo o que estava acontecendo. A cabeça do meu avô estava no meu colo. Coloquei minhas mãos sobre o seu peito e lenta, lentamente, a respiração desapareceu. Quando senti que não havia mais respiração, eu disse à minha avó: “Sinto muito, Nani, mas parece que ele não está mais respirando”. Ela disse: “Está tudo perfeitamente bem, não precisa ficar preocupado. Ele viveu bastante: não há nenhuma necessidade de pedir que viva mais”. E acrescentou: “Lembre-se — porque esses são os momentos que não devem ser esquecidos — nunca peça mais. O que é, é o bastante”. Ainda me lembro daquele silêncio. O carro de boi estava passando através do leito de um rio. Recordo-me de cada detalhe com exatidão. Eu nada falei porque não queria perturbar minha avó. Ela não dizia uma palavra. Alguns momentos se passaram, então eu fiquei um pouco preocupado com ela e disse: “Diga alguma coisa: não fique tão quieta, é insuportável”. Podem acreditar, ela cantou uma canção! Foi assim que eu aprendi que a morte tem de ser celebrada. Ela cantou a mesma canção que havia cantado quando sentiu amor pelo meu avô pela primeira vez. A separação tem a sua própria beleza, da mesma forma que o encontro. A separação tem a sua própria poesia: tem-se apenas de aprender a sua linguagem, e tem-se de viver na profundidade dela. Então da própria tristeza
  • 10. surge uma nova espécie de alegria. Parece quase impossível, mas acontece, eu a conheci. Glimpses of a Golden Childhood — Excertos, 1981
  • 11. Sacrificar o hoje por um amanhã fictício Desde o dia em que meu avô materno morreu, a morte se tornou uma companheira constante para mim. Naquele dia, eu também morri, porque uma coisa ficou clara: viva você sete ou setenta anos ele estava com setenta anos —, que importa? Você tem de morrer. Um homem tão bom, um homem encantador, simplesmente morreu. Que significado teve sua vida? Esta se tornou uma pergunta torturante para mim. O que ele alcançou? Por setenta anos viveu a vida de um homem bom: mas com que objetivo? Simplesmente acabou... Nem mesmo um traço foi deixado para trás. A morte dele me tornou tremendamente sério. Eu já era sério antes mesmo de sua morte. Por volta dos quatro anos eu comecei a pensar sobre problemas que as pessoas, de algum modo, preferem ir adiando. Eu não acredito em adiamento. Comecei a fazer perguntas ao meu avô materno, e ele dizia: “Essas perguntas! Você tem a vida inteira pela frente, não há pressa... e você é tão novo”. Eu disse: “Tenho visto meninos morrerem no vilarejo; eles não fizeram essas perguntas, morreram sem encontrar a resposta. Você pode me garantir que eu não morrerei amanhã ou depois? Pode me garantir que eu só morrerei depois de ter encontrado a resposta?” Ele respondeu: “Não posso garantir, porque nem a morte nem a vida estão nas minhas mãos”. “Então — repliquei — você não deveria me sugerir adiamento. Quero a resposta agora. Se você sabe, então me diga que sabe e dê-me a resposta. Se você não sabe, então não se sinta embaraçado por reconhecer a sua ignorância.” Ele percebeu logo que eu não aceitava alternativas. Ou dava uma resposta, o que não era fácil, pois eu forçava entrar em detalhes, levando a aprofundar o assunto, ou tinha de admitir que ignorava o assunto. Ele começou a reconhecer que não sabia.
  • 12. Eu falava: “Você está muito velho, logo morrerá. O que você fez durante toda a sua vida? No momento da sua morte você terá apenas ignorância em suas mãos e nada mais. E estas são questões vitais — eu não estou lhe perguntando alguma coisa fútil. Você vai ao templo. Eu lhe pergunto: por que vai ao templo? Encontrou alguma coisa no templo? Tem ido lá a vida inteira e tenta me persuadir a ir com você”. O templo havia sido feito por ele. Um dia ele admitiu a verdade: “Porque eu fiz o templo. Se nem eu mesmo for lá, então quem irá? Mas diante de você, reconheço que é uma futilidade. Fui lá durante toda a minha vida e não ganhei nada com isso”. Daí eu lhe disse: “Tente outra coisa. Não morra com a pergunta, morra com a resposta”. Mas ele morreu com a pergunta. A última vez que ele falou comigo, quase dez horas antes de morrer, abriu os olhos e disse: “Você estava certo: adiar não é correto. Estou morrendo e levo comigo todas as questões. Lembre-se, tudo o que eu sugeri a você estava errado. Você estava certo, não adie. Se surge uma pergunta, tente encontrar a resposta o mais rapidamente possível”. The Rajneesh Bible, vol. III — 21 de janeiro de 1985, noite
  • 13. Uma porta para o divino Vipassana era uma sannyasin cheia de alegria e muito animada que vivia dentro do ashram. Ela era uma musicista e uma cantora arrebatada. Subitamente ela ficou doente e foi um choque para todos saber que ela tinha um tumor cerebral, cuja extração era impossível. Quando alguém morre — quem quer que seja que você conheceu, amou e com quem viveu, alguém que se tornou parte do seu ser — alguma coisa morre em você também. Naturalmente, você sentirá falta da pessoa e experimentará um vazio. Isso é natural. Mas esse mesmo vácuo pode ser convertido em porta. E a morte é uma porta para Deus. A morte é o único fenômeno existente que não foi corrompido pelo homem. Em contrapartida, o homem corrompeu tudo, poluiu tudo. Somente a morte ainda permanece virgem, não corrompida, intocada pelas mãos do homem. O homem gostaria de corrompê-la também, mas ele não pode capturá-la, não pode possuí-la. Ela é muito esquiva — permanece desconhecida. E o homem continua perdido em relação ao que fazer com a morte. Ele não a pode compreender, não pode fazer dela uma ciência: eis por que a morte ainda não foi corrompida. Atualmente a morte é a única coisa que permanece incorrupta no mundo. Use bem os momentos em que você se depara com a morte. Quando, subitamente, você tomar consciência da morte, toda a sua vida parece sem sentido. Ela é sem sentido. A morte revela uma verdade. Quando, subitamente, você se encontra com a morte, a própria terra dissolve-se sob seus pés. Então você se conscientiza de que a morte de uma determinada pessoa também implica a sua morte. Toda morte é a morte de todo mundo. Vipassana aceitou a morte. Esta é uma das coisas mais difíceis de se fazer. Isto só é possível se você estiver em profunda meditação, de outro modo não — porque a mente toda, toda a mente humana, foi treinada para se posicionar contra a morte. Durante séculos nos tem sido ensinado que a morte é contrária à vida, que a morte é inimiga da vida, que a morte é o fim da vida. Naturalmente. ficamos assustados e não podemos relaxar, não podemos estar num let-go. E se você não pode estar num let-go em relação à morte, permanecerá tenso em sua vida, porque a morte não é separada da vida. Ela não é o fim da vida,
  • 14. antes, ao contrário, é o próprio rescendum, é o próprio clímax. E se você tem medo do clímax, naturalmente não será capaz — não será capaz de modo algum — de relaxar na vida também, porque a morte será sentida como se estivesse escondida em todo lugar na vida. Você ficará amedrontado. As pessoas que têm medo da morte não conseguem relaxar no sono, porque o sono é também uma morte muito breve que acontece todos os dias. As pessoas que têm medo da morte temem também o amor, porque o amor é uma morte. As pessoas que têm medo da morte receiam quaisquer experiências orgásticas, porque em cada orgasmo o ego morre. Aquele que tem medo da morte terá medo de tudo. Perderá tudo. Vipassana relaxou. Morreu como eu queria que ela morresse — num profundo let-go. Ela aceitou a morte. Estava livre de qualquer conflito: não estava lutando. Este é o critério para se aceitar a morte: conhecer algo dentro de si tremendamente lindo que ultrapassa a própria morte. Só é possível relaxar em relação à morte quando se experimenta algo que não morre. Se você aceita a morte, incompleto, fica pela metade, desequilibrado. Quando você aceita a morte, também se torna equilibrado. Então, tudo é aceito: o dia e a noite, o verão e o inverno — ambas, a luz e a escuridão. Quando as polaridades da vida são aceitas, você ganha equilíbrio. Torna-se tranquilo, torna-se inteiro. E se você pensa em termos de totalidade, então a morte tem de ser considerada. A vida é linda, a morte é tão linda quanto a vida. A vida tem as suas bênçãos. Há muitas flores na vida, mas há muitas flores na morte também. Tudo o que Deus dá você tem de receber com profunda gratidão — mesmo a morte: só então você se torna religioso: uma aceitação e reconhecimento por tudo: uma aceitação incondicional de tudo. A morte é um dos dons mais sagrados: não foi corrompida pelo homem, permanece virgem. Nothing to Loose but Your Head — 12 de março de 1976, noite
  • 15. O mito da mortalidade Quando você morre, é um capítulo da vida — que as pessoas pensam tratar-se da vida inteira — que está terminando. É apenas um dos infinitos capítulos de um livro. Um capítulo termina, mas o livro não está terminado. Vira-se a página e começa um novo capítulo. Quando uma pessoa está morrendo, começa a visualizar sua próxima vida. É um fato conhecido, porque acontece antes que o capítulo termine. De vez em quando uma pessoa volta de seu ponto final. Por exemplo, quando está se afogando e de algum modo é salva. Está quase em coma; a água tem de ser expelida, faz-se respiração artificial, e de algum modo ela é salva. Estava exatamente na margem, prestes a fechar o capítulo. Pessoas que tiveram tais experiências relataram fatos interessantes. Um deles é o de que no último momento, quando elas sentiram que estavam morrendo, que tudo estava acabado, viram num flash toda a trajetória de sua vida, desde o nascimento até aquele instante. Em uma fração de segundo elas viram tudo que lhes acontecera, coisas das quais se lembravam e, também, aquelas das quais elas não tinham se lembrado nunca, muitas coisas que nem tinham notado, das quais não tinham consciência, mas que faziam parte de sua memória. Todo o filme da memória passa muito rapidamente, num flash — e tem de ser em fração de segundo, porque o homem está morrendo, não há tempo, não dispõe de três horas para ver o filme inteiro. E mesmo que você veja o filme inteiro, não pode relatar toda a história da vida de um homem, com pequenos, mínimos detalhes. Mas tudo passa diante dele — este é um fenômeno singular e muito significativo. Antes de acabar o capítulo, ele se recorda de todas as suas experiências, desejos não satisfeitos, expectativas, desapontamentos, frustrações, sofrimentos, alegrias, tudo. O homem que está morrendo tem de ver tudo isso antes de seguir adiante, para reajustar tudo, porque o corpo está indo embora: a mente não vai continuar com ele, o cérebro não vai permanecer com ele. Mas o desejo liberado dessa mente vai se apegar à sua alma, e esse desejo decidirá sua vida futura. O que quer que tenha permanecido sem ser realizado o levará a mover-se na direção do alvo.
  • 16. Desse modo, o que você faz no momento de sua morte determina como vai ser o seu nascimento. A maioria das pessoas morre apegada. Elas não querem morrer e pode-se compreender por que isso ocorre. Somente no momento da morte realmente reconhecem o fato de que não viveram. A vida passou simplesmente como um sonho, e a morte chegou. Agora não há mais tempo para viver — a morte está batendo na porta. E quando havia tempo para viver, você esteve fazendo mil e uma coisas tolas, perdendo o seu tempo ao invés de vivê- lo. Observe as pessoas no momento de sua morte. Seu sofrimento não consiste na morte. A morte não traz nenhuma dor, é absolutamente indolor. É realmente prazerosa: é exatamente como um sono profundo. Você acha que o sono profundo é algo doloroso? Mas elas não estão se incomodando com a morte, com o sono profundo, com o prazer; elas estão preocupadas com o conhecido que está escorregando das suas mãos. O medo significa somente uma coisa: perder o conhecido e entrar no desconhecido. A coragem é exatamente o oposto do medo. O medo da morte é, certamente, o maior medo e o maior destruidor da coragem. Assim, posso sugerir apenas uma coisa. Agora você não pode voltar à sua morte passada, mas pode começar a fazer uma coisa: esteja sempre pronto para mover-se do conhecido para o desconhecido, em qualquer coisa, em qualquer experiência. Mergulhe-se em algo que seja novo... sua própria novidade, seu próprio frescor são tão fascinantes. Aí há coragem. Buscar o novo é melhor, mesmo que o desconhecido acabe sendo pior do que o conhecido — esta não é a questão. Dizem que tudo que é velho não é ouro.* Eu digo: mesmo que tudo o que for velho seja ouro, esqueça-o. Escolha o novo seja ouro ou não, não importa. * Em inglês: “All that is old is not gold”. Comece com um exercício simples: lembre-se sempre que tiver de fazer uma escolha: prefira o arriscado, o perigoso, o inseguro, e você não se sentirá perdido. Só assim a morte também poderá se tornar uma experiência tremendamente reveladora. A coragem virá até você. Comece com uma fórmula simples: nunca deixe de enfrentar o desconhecido. Escolha sempre o incógnito e vá de cabeça. Mesmo que você sofra, vale a pena — sempre vale. Você sempre sairá da nova experiência mais crescido, mais maduro, mais inteligente. The Rajneesh Bible, vol. IV — 21 de janeiro de 1985, noite Beyond Enlightenment — 5 de outubro de 1986
  • 18. Pseudo-religiões: medo da morte e da vida Amado Bhagwan, Nas outras religiões, quase nunca se fala da morte quando ela é mencionada, o tom é grave e amedrontado. Na Sua religião, fala-se da morte livremente e com felicidade. Isso é significativo? Certamente, isso é uma das coisas mais significativas. Determina se uma religião é autêntica ou falsa. As pseudo-religiões não sabem nada sobre a morte. Na verdade elas nada sabem nem mesmo sobre a vida, daí o medo, medo de ambas. Não é possível ter medo somente da morte, porque a morte não é separada da vida, a morte é parte da vida. Não é o final da vida, é um incidente na vida; a vida continua. A morte acontece muitas vezes, milhões de vezes; é um mero incidente. Mas as pseudo-religiões têm medo de ambas. As pseudo-religiões também têm medo de viver. Vocês devem compreender isso primeiro; somente então poderão compreender por que elas têm medo da morte. Todas elas são favoráveis à renúncia da vida. São todas baseadas numa atitude antivida: algo está errado na vida, a vida nasceu do pecado original, não está certo que você esteja vivendo. Adão e Eva foram punidos porque quiseram viver, quiseram saber, quiseram compreender, explorar, inquirir — este é o pecado original deles. Vocês são herdeiros de Adão e Eva. Nasceram em pecado. O que Adão e Eva fizeram, as religiões têm tentado desfazer, a fim de que você possa ser aceito por Deus novamente, ser bem-vindo ao céu. As religiões têm medo da vida, têm medo de saber — mas vida e saber não estão separados. As pseudo-religiões também ensinam a ter medo da vida — elas não têm apenas medo da morte. Não falam sobre a morte; acham que é indelicado falar sobre tal assunto. Se você estiver sentado à mesa do jantar, a etiqueta recomenda que não fale sobre morte. À mesa de jantar, nem pensar! Mesmo num sepultamento,
  • 19. quando as pessoas estão juntas para prestar suas últimas homenagens, elas não falam sobre a morte. Viva tão intensamente quanto possível, e o próprio sabor da vida lhe dará a chave da compreensão de que a morte não precisa ser temida. Uma vez que você chegue a conhecer a sua vida, seu fogo, saberá que não há nenhuma morte. Esta vida, que é possível conhecer quando se vive intensamente, é eterna. O sentimento da própria eternidade surge simultaneamente com a experiência da vida: à medida que você vive. Quanto mais profunda e intensamente você viver, mais rapidamente sentirá que não há nenhuma morte. Na minha religião a morte é celebrada porque não há morte alguma. É somente uma entrada em outra vida. Estamos celebrando o nascimento — as pessoas pensam que estamos celebrando a morte — porque não há morte como tal. Nada morre, somente as formas mudam. A vida transmigra de uma forma para outra. A morte deveria consistir num momento de celebração para todos os que se relacionavam com a pessoa, pois ela está morrendo apenas aparentemente. Do nosso lado parece que ela está morrendo: do outro lado ela está nascendo. The Rajneesh Bible. vol. III — 10 de janeiro de 1985, noite
  • 20. O Oriente tem o fermento, o Ocidente tem a massa Você está condicionado à idéia de que há apenas uma vida. A crença cristã, a judaica, a maometana — todas enraizadas na concepção judaica de que só há uma vida — legaram ao Ocidente a tremenda loucura pela velocidade. Tudo tem de ser feito com tal pressa que você não pode desfrutar o ato de fazer, e não pode fazê-lo em sua inteira perfeição. Você faz de qualquer jeito e corre para uma outra atividade. O homem ocidental tem vivido sob o domínio de uma concepção muito errada. Ela tem criado tanta tensão nas pessoas que elas nunca conseguem estar à vontade em lugar algum: estão sempre indo e sempre preocupadas por não saberem quando o fim vai chegar. Antes do fim, elas querem fazer tudo. Mas o resultado é exatamente o oposto: não podem nem ao menos dar um jeito de fazer algumas coisas graciosamente, com beleza e perfeição. A vida dessas pessoas está tão ensombreada pela morte que não conseguem viver alegremente. Tudo que traz alegria parece-lhes ser uma perda de tempo. Não podem simplesmente se sentar em silêncio por uma hora, porque suas mentes lhes dirão: “Por que está perdendo uma hora? Você podia ter feito isto, você podia ter feito aquilo”. É por causa dessa concepção de uma só vida que a idéia de meditação nunca surgiu no Ocidente. A meditação supõe uma mente muito relaxada, sem nenhuma pressa, sem nenhuma preocupação, sem nenhum lugar aonde ir... disposta apenas a desfrutar momento a momento, seja o que for que venha. No Oriente, a meditação estava fadada a ser descoberta justamente por causa da crença da eternidade da vida — você pode relaxar. Pode relaxar sem nenhum medo, pode se alegrar e tocar a sua flauta, pode dançar e cantar a sua canção, pode desfrutar o nascer e pôr-do-sol. Pode desfrutar sua vida inteira. Não apenas isto, mas pode até mesmo desfrutar a morte, porque a morte é também uma grande experiência, talvez a maior experiência da vida. É um crescendo.
  • 21. Na concepção ocidental, a morte é o fim da vida. Na concepção oriental, a morte é apenas um lindo incidente no longo processo da vida: haverá muitas, muitas mortes. Cada morte é um clímax da sua vida, antes de uma nova vida começar — uma outra forma, um outro rótulo, uma outra consciência. Você não está se acabando, está apenas mudando de casa. Estou me lembrando de Mulla Nasruddin. Um ladrão entrou em sua casa. Mulla parecia dormir, mas na verdade apenas mantinha os olhos fechados, entreabrindo-os e olhando o que o ladrão estava fazendo. Ele não admitia a interferência no trabalho alheio. O ladrão não estava interferindo no seu sono, por que ele deveria interferir na profissão do outro? Deixou-o exercê-la. O ladrão estava um pouco preocupado; aquele homem parecia esquisito. Enquanto ele estava carregando tudo da casa, às vezes alguma coisa caía das suas mãos e fazia barulho, mas Mulla permanecia completamente adormecido. Começou a suspeitar de que esse tipo de sono só é possível a um homem acordado: “Que homem esquisito! Ele não diz nada; estou esvaziando toda a sua casa!” Todos os móveis retirados, todas as almofadas retiradas, tudo que estava na casa havia sido retirado. E quando o ladrão estava reunindo tudo, amarrando para levar para casa, subitamente pressentiu: “Alguém está me seguindo”. Olhou para trás e viu o mesmo homem que estava dormindo. O ladrão disse: “Por que está me seguindo?” Mulla respondeu: “Não, não estou seguindo você; nós estamos nos mudando de casa. Você apanhou tudo. Agora o que vou fazer nesta casa? Então, estou indo também”. Esta tranquilidade é própria do oriental; até em relação à morte o Oriente acredita que se está apenas mudando de casa. O ladrão estava preocupado; ele disse: “Perdoe-me, tome as suas coisas”. Mulla respondeu: “Não, não há necessidade. Já estava pensando comigo mesmo em me mudar de casa; ela está quase em ruínas. Não se pode ter uma casa pior do que esta, e de qualquer modo eu sou um homem muito preguiçoso. Preciso de alguém para cuidar de mim, e, já que você levou tudo, por que me deixar sozinho?” O ladrão foi ficando com medo... ele roubara durante toda a sua vida e nunca havia encontrado um homem como aquele. Disse então: “Você pode pegar as suas coisas”. Mulla replicou: “Não, não vai haver nenhuma mudança de planos. Você terá de levar as coisas, caso contrário eu o denunciarei à polícia. Estou me comportando como um cavalheiro, não o estou chamando de ladrão, apenas o considero um homem que está me ajudando a mudar de casa”.
  • 22. Não há pressa. A idéia de uma vida curta é perigosa. É por isso que, apesar de o Oriente ser muito pobre, lá não há desespero não há angústia. O Ocidente é rico, mas a riqueza não acrescentou nada à sua espiritualidade ou ao seu crescimento; ao contrário, o Ocidente é muito tenso. Ele deveria ser mais relaxado, pois tem todos os confortos da vida. Mas o problema básico é que no fundo o Ocidental sabe que a vida é muito curta; que estamos esperando numa fila, e a cada momento estamos chegando mais perto da morte. Desde que nascemos, começamos a jornada em direção ao cemitério. A cada momento a vida está sendo cortada — tornando-se mais e mais curta. Isto cria tensão, angústia, ansiedade. Todos os confortos, todos os luxos, todas as riquezas se tornam sem significado, porque ninguém pode levá- las. Cada qual terá de enfrentar a morte sozinho. O Oriente é mais tranquilo. Primeiro, não dá à morte nenhuma importância — ela é apenas uma mudança de forma. Segundo, por ser tranquilo, torna-se consciente das riquezas interiores, que seguirão com a pessoa mesmo para além da vida. A morte não pode tomá-las. A morte pode arrebatar tudo o que está do lado de fora, e se você não desenvolveu seu ser interior, naturalmente sentirá medo de não poder salvar nada da morte; ela levará tudo o que você tem. Mas se você desenvolveu seu ser interior, se você encontrou paz, bênção, silêncio, alegria — que não são dependentes de nada exterior —, se você cultivou o jardim do seu ser e viu as flores da sua própria consciência, a questão do medo da morte não surge absolutamente. Novamente lhe digo, lembre-se somente de uma coisa: você é um ser imortal. Neste momento, essa afirmação pode não fazer parte de sua experiência pessoal; você pode aceitá-la como uma hipótese — não como uma crença —, uma hipótese para ser experimentada. Eu jamais desejo que alguém aceite qualquer coisa vinda de mim como uma crença, mas somente como uma hipótese. Pelo fato de eu saber a verdade, não preciso impingir a crença e a fé sobre você. Sabendo a verdade eu posso lhe dizer: “É apenas para experimentar, uma hipótese temporária”, porque eu estou absolutamente certo de que, se você experimentar, a sua hipótese se transformará em seu próprio conhecimento — não numa crença, não numa fé, mas numa certeza. E somente as certezas podem salvá-lo. Crenças são barcos feitos de papel. Não se deve acreditar que se possa atravessar o oceano da existência num barco feito de papel. Você precisa de uma certeza... não de uma crença, mas de uma verdade verificada por você mesmo. Não a verdade de outra pessoa, mas a sua própria. Então é uma alegria entrar no desconhecido, no oceano inexplorado: é um excitamento e um êxtase tremendo.
  • 23. The Golden Future — 27 de abril de 1987, noite
  • 24. A raiz de todos os medos Amado Bhagwan, O que é medo? Há medos e medos: não estou falando sobre eles. Estou falando sobre o medo mais fundamental — todos os outros medos são ecos remotos do medo básico — e este é o medo da morte. A vida está rodeada pela morte. Você vê todos os dias alguém morrendo, algo morrendo: algo que estava vivo há pouco, agora está morto. Cada morte recorda-lhe a própria morte. É impossível esquecer-se da própria morte: a todo momento há uma lembrança. Assim, a primeira coisa a ser compreendida é que a única possibilidade de se livrar do medo é se livrar da morte. E você pode livrar-se da morte, porque a morte é apenas uma idéia, não uma realidade. Você tem visto apenas outras pessoas morrendo: alguma vez você se viu morrendo? E quando você vê outra pessoa morrendo, você está do lado de fora, não é um participante da experiência. A experiência está acontecendo dentro da pessoa. Tudo o que você sabe é que ela não está mais respirando, que o corpo dela tornou-se frio, que seu coração não está mais batendo. Mas você pensa que todas essas coisas reunidas são equivalentes à vida? A vida é apenas respiração? A vida é apenas a batida cardíaca, o sangue circulando e mantendo o corpo quente? Se isto é vida, o jogo não vale a pena. Se somente a minha respiração é a minha vida, qual é o objetivo de continuar respirando? A vida deve ser alguma coisa a mais. Para ter qualquer valor, a vida deve ter algo da eternidade: deve ser algo além da morte. E você pode conhecer isso porque ela existe dentro de você. A vida existe dentro de você — a morte é somente uma experiência dos outros, observada de fora. É simplesmente como o amor. Você pode compreender o amor por olhar uma pessoa sendo amorosa com alguém? O que você verá? Eles estão abraçando um ao outro, mas abraçar é amor? Você pode vê-los segurando a mão um do outro, mas segurar as mãos
  • 25. é amor? Do lado de fora, o que mais você pode descobrir sobre o amor? Qualquer coisa que você descubra será absolutamente fútil. Essas são expressões do amor, mas não o amor em si. O amor é algo que se conhece somente quando se está amando. Um dos maiores poetas da Índia, Rabindranath Tagore, ficava muito embaraçado com um velho que era amigo de seu avô. O velho costumava ir à casa do avô frequentemente porque ele morava nas vizinhanças, e nunca saía sem criar constrangimento para Rabindranath. Ele sempre batia na porta e perguntava: “Como vai a sua poesia? Você realmente conhece Deus? Conhece realmente o amor? Diga-me, você sabe de todas essas coisas das quais você fala em sua poesia? Ou você é hábil no uso das palavras? Qualquer idiota pode falar do amor, de Deus, da alma. Eu não vejo nos seus olhos que você tenha experienciado alguma coisa”. E Rabindranath não podia responder-lhe. Na verdade, ele estava certo. Se o velho o encontrasse na rua, ele o segurava, perguntando: “E sobre o seu Deus? Você o encontrou ou ainda está escrevendo poesias sobre ele? Lembre-se, falar sobre Deus não é conhecer Deus”. Ele era uma pessoa muito embaraçosa. Em reuniões de poetas, onde Rabindranath era muitíssimo respeitado — recebera o Prêmio Nobel —, aquele velho, fatalmente, estaria lá. No palco, diante de todos os poetas e adoradores de Rabindranath, ele o segurava pelo colarinho e dizia: “Ainda não aconteceu. Por que você está enganando esses idiotas? Eles são idiotas menores, você é um grande idiota; eles não são conhecidos fora da região, você é conhecido em todo o mundo — mas isso não significa que você conhece Deus”. Rabindranath escreveu no seu diário: “Eu era muito hostilizado por ele, e ele tinha olhos tão penetrantes que era impossível dizer-lhe uma mentira. Sua presença era tão marcante que ou você tinha de dizer a verdade ou tinha de permanecer calado”. Mas um dia aconteceu... Rabindranath tinha ido a um passeio matinal. Havia chovido à noite: era de manhã bem cedo, e o Sol estava surgindo. No oceano, estava tudo dourado, ao lado da rua, a água tinha se juntado em pequenas poças. Naquelas pequenas poças o Sol também estava surgindo com a mesma glória, com a mesma cor, com a mesma alegria... E apenas esta experiência — porque na existência não há nada superior nem nada inferior, tudo é um todo — subitamente alguma coisa disparou dentro dele. Pela primeira na vida ele foi à casa do velho, bateu na porta, olhou nos olhos do velho e disse: “Agora, o que você diz?” Ele respondeu: “Agora não há nada a dizer. Aconteceu. Eu o abençoo”.
  • 26. A experiência da sua imortalidade, da sua eternidade, da sua totalidade, da sua unidade com a existência é sempre possível. É necessário apenas alguma experiência instigante. Assim, a primeira coisa é livrar-se da morte. Todos os outros medos desaparecerão. Você não tem de trabalhar sobre cada um dos seus medos; de outro modo levaria vidas e ainda assim você não poderia se livrar deles. O medo é natural, porque a morte é conhecida por todos; ela existe à sua volta. A culpa não é natural; é criada pelas religiões. Elas fizeram todos homens culpados — culpados de mil e uma coisas, tão carregados de culpa que eles não podem dançar, não podem se alegrar com coisa alguma. A culpa envenena tudo. Todas as religiões conspiravam contra seres humanos inocentes para fazê-los sentir-se culpados, porque sem torná-los culpados eles não podem ser transformados em escravos. E escravos são necessários. Pelo desejo de poder de algumas pessoas, milhões de pessoas precisam ser escravizadas. Para que algumas pessoas se tornem Alexandre, o Grande, milhões têm de ser reduzidos a condição subumana. Mas todas essas coisas são simplesmente condicionamentos da mente, os quais você pode apagar tão facilmente quanto se estivessem escritos nas areias da praia. Não tenha medo só porque você aceitou esses escritos como sagrados, aceitou-os como vindos de fontes muito respeitáveis, dos grandes fundadores das religiões. Não tem importância. Só uma coisa importa: que a sua mente deve ser completamente limpa, completamente vazia e silenciosa. Não há necessidade de Moisés, de Jesus ou de Buda morar dentro de você. Você precisa de um espaço totalmente silencioso, limpo. E somente esse espaço pode levá-lo, não a mim, mas a você mesmo, à sua própria existência. As religiões do mundo provocaram tantas doenças no homem que elas são incontáveis. Uma das doenças é a de ter tornado todos os homens ambiciosos por recompensas — se não neste mundo, ao menos no outro. Elas tornaram o homem muito ganancioso e, ao mesmo tempo, todas elas estão falando contra a ganância. E toda a religião deles está baseada na ganância... As religiões fizeram tanto mal que não podem ser perdoadas. Elas tiraram toda a dignidade do homem — sua alegria de almejar, de amar, seu prazer em esperar, sua confiança de que a primavera virá. Elas tiraram tudo de você. Você será recompensado somente se fizer certos rituais que não têm nenhuma relação, nenhuma relevância. Uma religião simples e inocente teria mudado toda a terra. Mas os dirigentes religiosos não poderiam permitir uma religião pura, inocente e infantil, com olhos
  • 27. maravilhados, com alegria, não se importando com idéias estúpidas de céu e inferno, mas vivendo cada momento com grande amor. E esperando por mais — não apenas desejando, mas esperando, merecendo, criando mais e mais espaço, mais silêncio, a fim de que primavera venha. E não somente com algumas flores, mas com muitas flores... Um dos místicos sufi tem um pequeno poema sobre esse tema: “Eu esperei muito a primavera — ela veio. E veio tão abundantemente, com tantas flores, que não sobrou nenhum lugar onde eu pudesse fazer um ninho para mim”. A vida dá abundantemente; você tem apenas de ser um recipiente Quero que você se preserve totalmente da corrupção e da poluição de todas as religiões. Tenha uma mente silenciosa, cheia de amor, esperando que algo mais aconteça. A vida é tamanha que nós continuamos a explorá-la, mas não podemos. O mistério está além do tempo. The Golden Future — 17 de maio de 1987, noite
  • 28. Uma fácil exploração A religião tem alguma validade somente devido à morte. Se não houvesse morte, ninguém teria se incomodado com a religião, absolutamente. Não é a vida que o inspira a ser religioso, não — é a morte. A morte o faz procurar algo que permanecerá apesar da morte. Imagine um mundo onde a morte não exista, onde ninguém morra. A questão: “O que acontece depois da morte?” não terá significado, a questão de céu e inferno não terá significado. E quando você é eterno, o que Deus pode ser mais do que você? Agora ele é a vida eterna, e você um fenômeno momentâneo, uma bolha de sabão; num momento você partirá — daí o medo. E o medo cria a busca. Você quer saber o que é essa morte, e você quer saber se alguma coisa permanece depois dela ou não. Aqueles que dizem nada restar depois da morte não são religiosos. Eles não vão a nenhum templo, não vão a nenhuma igreja, não têm nenhuma escritura sagrada. Denomino pseudo-religiões todas as existentes até agora. Elas somente aparentam ser religiosas, mas não são, porque não têm coragem suficiente para ser totais, são somente uma parte. O medo da morte criou as pseudo-religiões. Agora, pela primeira vez, o mundo está chegando perto de uma morte global. Até agora existia apenas a morte individual; a sociedade continuava, o mundo continuava. Sim, as pessoas chegavam e iam embora — os velhos desapareciam, criancinhas nasciam —, mas a continuidade estava presente, a vida esteve sempre presente. Sim, a vida individual tinha sido um problema, mas só o indivíduo estava preocupado com isso. O padre era capaz de explorar o indivíduo muito facilmente. Ele é tão fraco e tão pequeno, tão limitado, e sabe que vai morrer — ele tem de buscar a ajuda do padre para achar algo em que se agarrar que seja imortal, eterno, que o levará para além da morte. E o padre prometeu isso. Mas nunca foi um problema com o qual toda a sociedade se defrontasse. The Rajneesh Bible — 20 de janeiro de 1985, noite
  • 29. A vida não deve ser mitificada A menos que o Ocidente mude sua concepção de que há somente uma vida, esta hipocrisia, este apegar-se e este medo não podem ser mudados. Na verdade, uma vida não é tudo: você viveu muitas vezes e viverá muitas vezes mais. Então, viva cada momento tão totalmente quanto possível; não há pressa para saltar para um outro momento. O tempo não é dinheiro, o tempo é inexaurível; está disponível tanto para o pobre como para o rico. O rico não é mais rico no que diz respeito a tempo, e o pobre não é mais pobre. A vida é uma encarnação eterna. O que aparece na superfície está muito profundamente enraizado nas religiões do Ocidente. Elas são muito miseráveis em dar somente setenta anos. Se você calcular, irá perceber que quase um terço da sua vida estará perdido no sono, um terço da sua vida terá sido perdido arranjando alimentos, roupas, moradia. O pouco que sobra tem de se dispendido em educação, jogos de futebol, cinemas, disputas estúpidas, lutas. Se você puder salvar, no período de setenta anos, sete minuto para si mesmo, eu o classificarei como um sábio. Mas é difícil salvar até mesmo sete minutos em toda a sua vida; assim, como você pode encontrar a si mesmo? Como você pode conhecer o mistério do seu ser, da sua vida? Como você pode compreender que a morte não é um fim? Como você perdeu a experiência da própria vida, você vai perder a grande experiência da morte também; de outro modo, não há nada para se temer na morte. É um lindo sono, um sono sem sonho, um sono que é necessário para que você se mova para um outro corpo, silenciosa e pacificamente. É um fenômeno cirúrgico, é quase como anestesia. A morte é uma amiga, não uma inimiga. Uma vez que você encare a morte como uma amiga e comece a viver a vida sem qualquer medo de que ela seja apenas a mínima extensão de tempo de setenta anos — se a sua perspectiva se abre para a eternidade da sua vida —, então tudo se acalmará; então não haverá necessidade de ser veloz. Em todas as coisas, as pessoas estão simplesmente correndo. Tenho visto pessoas apanhando suas pastas, colocando coisas dentro delas, beijando suas mulheres — não vendo nem se elas são as suas mulheres ou as de outros — e
  • 30. dizendo “até logo” para seus filhos. Esta não é a maneira de viver! E aonde você vai chegar com essa pressa? O Ocidente não tem nenhuma tradição de misticismo, é extrovertido: olha para fora, há tanto o que ver. Mas os ocidentais não estão conscientes de que por dentro não há somente o esqueleto; há algo mais dentro do esqueleto — a sua consciência. Ao fechar os olhos, você não encontrará o seu esqueleto; você encontrará a própria fonte de sua vida. O Ocidente precisa de uma profunda familiarização com a sua própria fonte de vida — então não haverá pressa. A pessoa se alegrará quando a vida trouxer juventude, a pessoa se alegrará quando a vida trouxer a idade avançada, a pessoa se alegrará quando a vida trouxer a morte. Então você simplesmente saberá como desfrutar de todas as coisas pelas quais passa, como transformá- las em celebração. Eu chamo de religião autêntica a arte de transformar todas as coisas numa celebração, numa canção, numa dança. The Golden Future — 19 de maio de 1987, noite
  • 32. Por que apegar-se? Simplesmente cante! Todo adorador, em todo templo, em toda sinagoga, em toda igreja, está humilhando a si mesmo e humilhando deus dentro de si. O deus interior não precisa de nenhum outro deus para ser adorado. Tudo que é necessário é o despertar da consciência, a consciência do próprio ser. No momento em que se torna consciente de si mesmo, o ser não é mais um mortal, ele se torna um imortal. Ele sempre foi um imortal, mas devido a seus equívocos, ele degradou-se em ser mortal, em alguém que vai morrer. Embora a vida dentro de você e a consciência dentro de você sejam eternas e imortais, ainda assim você continua tendo medo da morte — porque você vê alguém morrer todo dia, e a morte de todo mundo lembra-o da sua própria morte. O poeta canta: “Nunca pergunte por quem os sinos tocam: os tocam por ti...” Ele tem alguma verdade para transmitir a você. Toda morte é simbólica. Ela mostra que você está postado na mesma fila, e a fila está ficando cada vez mais curta. Todo dia você está chegando cada vez mais perto da morte. Na verdade, o dia em que você nasceu não foi o dia do seu nascimento; foi o dia em que você começou a morrer. E desde então, você está morrendo a cada dia. Em todo aniversário, sua morte ficou um ano mais perto. É um fato absolutamente certo que as pessoas morrem, os animais morrem, as árvores morrem, os pássaros morrem. Como você pode fugir do fato de que você vai morrer também — talvez amanhã, talvez depois de amanhã? É somente uma questão de tempo... Contudo, aqueles que estão conscientes de seu ser sabem que ninguém morre. A morte é uma ilusão. Você viu pessoas morrerem; alguma vez você se viu morrendo? E quando você vê alguém morrendo, você está realmente vendo alguém morrer? Tudo o que você está vendo e tudo o que a ciência médica pode ver é que o homem parou de respirar, que sua pulsação cessou, que seu coração não bate mais; declara- se que ele está morto.
  • 33. Há alguns dias, um homem da região de Caxemira, ocupada pelo Paquistão, pela terceira vez enganou seus amigos, seus colegas, sua família. Aos cento e trinta e cinco anos de idade, ele morreu pela terceira vez. O pessoal desconfiado porque, por duas vezes, ele havia aplicado o truque. Diagnosticado pelos médicos como morto, atestado como morto, ele acordou, abriu os olhos e começou a rir. Assim, quando ele morreu pela terceira vez, as pessoas mantiveram-se muito cautelosas. Os médicos foram muito cautelosos, mas tudo concorria para se ter certeza de sua morte; não havia dúvida. Disseram: “Talvez, anteriormente, ele possa ter enganado, mas desta vez certamente está morto. No que diz respeito ao que a ciência médica possa saber, ele preenche todos os requisitos de um homem morto”. E no momento em que o atestado foi assinado por três médicos, o homem abriu os olhos, começou a rir e disse: “Ouçam, da próxima vez, eu vou realmente morrer. Eu simplesmente achei que uma vez mais...”. Nessa região de Caxemira, ocupada pelo Paquistão, encontram-se as pessoas mais idosas da Índia e do Paquistão. Cento e vinte anos é muito comum, normal. Cento e cinquenta você pode encontrar; não é tão normal, contudo há centenas de pessoas que passaram dos cento e cinquenta. E há alguns casos raros em que pessoas alcançaram cento e oitenta anos de idade e ainda são jovens; ainda estão trabalhando em seus campos. Esse homem foi interrogado por jornais, por jornalistas de todo o mundo, porque ele é um homem raro; por três vezes foi tido como morto e por três vezes desafiou todo o conhecimento médico, toda a ciência médica. Perguntaram-lhe: “O que você esteve fazendo? O que aconteceu?” Ele respondeu: “Nada, porque eu não sou o meu corpo, eu sei disso; e eu não sou a minha respiração, eu sei disso; e eu não sou o meu coração, eu sei disso. Estou além deles todos, eu simplesmente deslizo para dentro do além. O coração pára de bater, o pulso pára de bater, e vocês são todos enganados. Então, eu deslizo, novamente, de volta para o corpo, o sangue começa a correr novamente, o pulso começa a trabalhar novamente e o coração começa a bater novamente”. Trata-se de um homem simples, um fazendeiro. Ele não é um iogue; ele nunca praticou nada. Mas quando ele era apenas uma criança bem pequena, com sete ou oito anos de idade, entrou em contato com um místico sufi que lhe disse ser a morte uma ilusão. E ele era tão inocente que aceitou isso. O místico sufi lhe disse: “Há um modo muito simples de você deslizar para fora de seu corpo. Apenas observe-o pelo lado de dentro; observe o corpo e subitamente haverá mais e mais distância entre você e o seu corpo. Logo o corpo estará a quilômetros de distância. Observe amente, e o mesmo acontecerá com ela.
  • 34. Você simplesmente permanece um observador e se tornará capaz de deslizar para fora de seu corpo, para fora de sua mente, para fora de toda a sua personalidade. É está dentro do seu controle voltar. Porque você deslizou para fora... você sabe o caminho e então saberá voltar. E o caminho é este: observando, você deslizou para fora. Então pare de observar. Identifique-se com o corpo. Diga: Eu sou o corpo, eu sou a mente, eu sou a batida do coração. Imediatamente a distância desaparecerá. Você chegará mais perto e logo deslizará para dentro do corpo. Ao identificar-se com o corpo, você se torna o corpo. Então você é um mortal. Então há medo da morte. Ao deixar de identificar-se com seu corpo, você é apenas um observador, você é apenas uma pura consciência, uma não-mente. E não há morte, não há doença, não há velhice. No que diz respeito ao seu testemunhar, ele é eterno e está sempre fresco e jovem, permanece o mesmo. A religião autêntica não o ensina a adorar. A religião autêntica ensina-o a descobrir sua imortalidade, a descobrir o deus dentro de você. Todos vão passar através dos portões da morte algum dia. Se você puder lembrar-se de que você é apenas pura consciência — não o corpo, não a mente, não o coração, não o seu dinheiro, não o seu prestígio, não o seu poder, não a sua casa, mas apenas consciência — então você pode passar através da barreira da morte sem arranhar-se. Então a morte não pode fazer nem mesmo um arranhão em você. Um grande rei chamado Yayati chegou aos cem anos de idade... ele havia vivido estupendamente bem, desfrutado de tudo o que a vida pôde lhe oferecer. A Morte veio e disse a Yayati: “Esteja pronto. É sua hora, e eu vim buscá-lo”. Yayati olhou para a Morte, e embora fosse um grande guerreiro e tivesse vencido muitas guerras, começou a tremer. Ele disse: “Mas é cedo demais”. A Morte respondeu: “Cedo demais?! Você viveu cem anos. Até os seus filhos se tornaram velhos. Seu filho mais velho está com oitenta anos. O que mais você quer?” Yayati tinha cem filhos porque ele tinha cem esposas. Ele perguntou à Morte: “Você pode me fazer um favor? Eu sei que você tem de levar alguém. Se eu puder persuadir um dos meus filhos, você pode me deixar aqui por mais cem anos e levar um deles?” A Morte respondeu-lhe: “Está bem, desde que alguém esteja pronto para ir. Mas eu não acredito nisso. Se você não está pronto, e você é o pai, viveu mais e desfrutou de tudo, por que seu filho deveria estar pronto?”
  • 35. Yayati chamou os cem filhos. O mais velho permaneceu silencioso. Houve um silêncio, ninguém dizia nada. Somente o filho mais jovem, que tinha apenas dezesseis anos, levantou-se e disse: “Eu estou pronto”. Até a Morte sentiu pena dele e disse ao jovem: “Talvez você seja inocente demais. Você não está vendo os seus noventa e nove irmãos absolutamente silenciosos? Um tem oitenta, outro setenta e cinco, outro setenta e oito, outro setenta, outro sessenta — eles viveram, mas ainda querem viver. E você não viveu, absolutamente. Até eu sinto tristeza de levá-lo. Pense de novo”. O rapaz disse: “Não, é justamente esta situação que me dá certeza. Não sinta tristeza ou pena: estou indo com absoluta consciência. Se meu pai, com cem anos, não está satisfeito, qual é o objetivo de permanecer aqui? Como poderei ficar satisfeito? Nenhum dos meus noventa e nove irmãos está satisfeito. Então por que perder tempo? Pelo menos posso fazer este favor ao meu pai. Na sua velhice, deixe-o desfrutar mais cem anos. Mas eu quero parar. Como ninguém está satisfeito, posso entender uma coisa claramente — mesmo que eu viva cem anos, também não ficarei satisfeito. Então não importa se vou hoje ou depois de noventa anos. Leve-me”. A Morte levou o rapaz. E depois de cem anos ela voltou, e Yayati estava na mesma situação. Ele disse: “Estes cem anos passaram tão depressa. Todos os meus filhos velhos morreram, mas eu tenho outros tantos. Posso dar-lhe algum filho. Tenha misericórdia de mim”. E continuou assim, diz a história, por mil anos. Dez vezes a Morte veio, e nove vezes ela levou algum filho e Yayati vivia mais cem anos. Na décima vez, Yayati disse: “Embora eu ainda esteja tão insatisfeito como estava quando você veio pela primeira vez, agora, embora sem querer, e relutando, eu irei, porque eu não poderei continuar pedindo favores. É demais. E uma coisa tornou-se certa para mim, de que se mil anos não puderam me ajudar a estar contente, então nem mesmo dez mil anos o farão”. É o apego. Você pode ir vivendo, mas assim que a idéia da morte o atinge, começará a tremer. Se você não está apegado a nada, a morte pode vir neste exato momento e você estará em atitude de boas-vindas. Estará absolutamente pronto para ir. Diante de um tal homem, a morte é derrotada. A morte somente é derrotada por aqueles que estão prontos para morrer a qualquer momento, sem nenhuma relutância. Eles se tornam imortais, eles se tornam budas. Livrar- se do apego é livrar-se da morte. Livrar-se do apego é livrar-se da roda do nascimento e da morte. Livrar-se do apego o faz capaz de entrar na luz do universo e tornar-se um com ela. E esta é a bênção maior, o êxtase supremo, além do qual nada mais existe. Você chegou em casa. Commentaries on the Teachings of the Messenger of Zen from India to China: Bodhidharma — 7 de junho de 1987, noite
  • 36. A vida é carícia preliminar, a morte é orgástica Amado Bhagwan, O que acontecerá à consciência humana quando as pessoas do mundo subitamente perceberem que estão no meio de uma praga incontrolável e devastadora, que matará a maior parte das pessoas que elas conhecem? Depende de cada pessoa. Para aquele que é absolutamente consciente, nada acontecerá: ele aceitará, exatamente como aceita tudo o mais. Não haverá nenhuma luta, nenhuma ansiedade. Como ele consegue aceitar a própria morte, pode aceitar a morte do seu planeta também. E esta aceitação não é de modo nenhum uma espécie de desamparo. Ao contrário, é simplesmente a percepção da natureza das coisas — que tudo nasce, vive e tem de morrer. Este planeta não estava aqui há cinco bilhões de anos: então ele nasceu. Talvez ele já tenha vivido toda a sua vida. E, de qualquer modo, mesmo que a mente humana dê um jeito de acabar com as dificuldades criadas pelos políticos, o planeta não poderá viver muito tempo porque o sol está morrendo. Em alguns milhões de anos ele terá exaurido toda a sua energia, e quando o sol morrer, este planeta não poderá permanece vivo. Toda a nossa energia de vida vem do Sol. O homem de consciência perfeita simplesmente aceitará isto como um fenômeno natural. Agora mesmo, as folhas estão caindo das árvores; na outra noite, o vento estava soprando forte e as folhas estavam caindo como chuva. Mas o que você pode fazer? Esta é a lei da existência. Tudo vem numa forma e desaparece na ausência dessa forma. Assim, para o homem que está acordado, não haverá nenhuma mudança em sua consciência. Para o homem não- acordado, haverá reações diferentes.
  • 37. Contaram-me que um homem estava morrendo: ele era muito velho, já tinha vivido sua vida; não havia nenhuma necessidade de se preocupar com a morte. Estava escurecendo e o sol tinha se posto. O homem abriu os olhos e perguntou à mulher, que estava sentada ao seu lado direito: “Onde está meu filho mais velho?” A mulher lhe disse: “Ele está sentado à minha frente do outro lado da cama. Não se preocupe com ele; não se preocupe com essas coisas neste momento. Relaxe e ore”. Mas o homem replicou: “E onde está meu segundo filho?” A mulher respondeu: “Ele está sentado ao lado do seu filho mais velho”. E o velho homem, que estava quase às portas da morte, começou a se levantar. A mulher disse: “O que você está fazendo?” Ele respondeu: “Estou procurando meu terceiro filho”. E a mulher e os filhos todos sentiram o quanto ele os amava. O terceiro filho estava sentado a seus pés. Ele falou: “Estou aqui, papai. Relaxe, nós estamos todos aqui”. Ele disse: “Vocês estão todos aqui e querem que eu relaxe? Quem está tomando conta da loja?” Na hora da morte ele ainda estava preocupado com a loja. É muito difícil predizer como as diferentes mentes inconscientes das pessoas vão reagir. Toda a vida delas estará refletida em suas reações, isto é certo. Mas a vida de cada um se moveu através de caminhos diferentes, experiências diferentes, e o ponto culminante vai ser diferente. A morte traz à superfície a personalidade essencial. Um outro velho estava morrendo — era um homem muito rico. Toda a sua família estava reunida. O filho mais velho disse: “O que deveremos fazer quando ele morrer? Teremos de alugar um carro para levá-lo ao cemitério”. O filho mais novo acrescentou: “Ele sempre desejou um Rolls Royce. Em vida ele não pôde sentar-se em um, mas pelo menos, morto, ele pode desfrutar um passeio — um passeio de mão-única, naturalmente — para o cemitério”. Mas o filho mais velho replicou: “Você é jovem demais e não entende que os mortos não desfrutam nada. Não importa à pessoa morta se é um Rolls Royce, ou só um Ford. Um Ford bastará”.
  • 38. O segundo filho disse: “Por que vocês estão tão extravagantes? De qualquer modo, um corpo morto somente tem de ser carregado. Conheço uma pessoa que tem um caminhão — será mais confortável e mais barato também”. O terceiro filho disse: “Não posso tolerar todo esse absurdo. Qual é a necessidade de se preocuparem com Rolls Royce ou Ford ou caminhões? Ele vai se casar? Ele vai morrer. Vamos pô-lo fora da casa onde nós pomos todo o nosso lixo. O caminhão municipal o recolherá, sem absolutamente nenhuma despesa”. Neste momento o velho abriu os olhos e disse: “Onde estão meus sapatos?” Perguntaram-lhe: “O que o senhor vai fazer com os seus sapatos? Descanse”. Mas ele insistiu: “Quero meus sapatos”. O filho mais velho disse: “Ele é um teimoso. Talvez queira morrer com os sapatos nos pés. Deixe-o pegar os sapatos”. E o velho, enquanto calçava os sapatos, disse: “Não precisam se preocupar com as despesas. Eu ainda tenho um resto de vida. Vou caminhar até o cemitério. Vejo-os lá! Morrerei exatamente na sepultura. Aborrece-me que vocês sejam tão extravagantes. Em vida eu apenas sonhei com um Rolls Royce, ou com outro carro bonito. Sonhar não é dispendioso, a gente pode sonhar com qualquer coisa”. E, diz-se, o velho andou até o cemitério, os filhos e os parentes seguiram-no, e ele morreu exatamente junto à sepultura — para economizar dinheiro. O último pensamento de um moribundo é decorrente de toda a sua vida, de toda a sua filosofia, de toda sua religião. É uma tremenda exposição. Um dos seguidores de J. Krishnamurti — um ancião muito respeitado na Índia — costumava vir a mim porque o seu filho era Procurador Geral de Madhya Radesh, e o Fórum de M.P. fica em Jabalpur. Ele costumava vir visitar o filho, e sempre ia ver-me se eu estivesse na cidade. O velho tinha sido seguidor de Krishnamurti por quase cinquenta anos. Ele abandonara todos os rituais, todas as escrituras; ele estava absolutamente convencido, lógica e intelectualmente, de que Krishnamurti estava certo. Eu costumava dizer-lhe: “Você deve lembrar- se: convicção intelectual, convicção lógica ou racional é muito superficial. Na hora da crise ela desaparece, evapora”. Mas ele costumava dizer: “Cinquenta anos! Não pode ser superficial”. Um dia seu filho veio a mim e disse-me: “Meu pai está morrendo e eu não pude pensar em mais ninguém que ele gostaria de ter perto de si. Ele o ama tanto. Então venha comigo: trouxe o carro, não há muito tempo”.
  • 39. Assim, eu fui com ele. Quando atravessei a porta do quarto de seu pai, muito silenciosamente seus lábios estavam se movendo. Entrei, também muito silenciosamente, porque eu queria ouvir o que ele estava repetindo. Estava dizendo: “Ram, Ram, Ram”, o nome hindu de Deus. E durante cinquenta anos ele afirmara que não havia Deus. Eu o sacudi. Ele abriu os olhos e falou: “Não me perturbe. Esta não é hora de argumentação”. Disse-lhe: “Não vou arguir, mas só perguntar: o que aconteceu com aqueles cinquenta anos? De onde vem essa repetição do nome de Deus? Você insistia que não havia nenhum Deus”. Ele replicou: “Isso estava bem naquele tempo, mas agora que estou morrendo — e o médico disse que eu não sobrevivo mais do que meia hora — não me perturbe. Deixe-me repetir o nome de Deus. De qualquer modo, quem sabe? Ele pode existir. Se não há nenhum Deus, não há nenhum mal em repetir o seu nome. Mas se há um Deus, e você não morre repetindo o seu nome, aí você está na lista negra. E eu não quero ir para o inferno, sofri o bastante aqui nesta terra”. Falei: “Isto era o que eu estava lhe dizendo, que convicção intelectual não serve para nada”. Ele não morreu; sobreviveu. Depois de três ou quatro dias, fui vê-lo. Estava sentado no jardim, e eu lhe disse: “E sobre aquela noite?” Respondeu-me: “Esqueça-se de tudo aquilo. Foi apenas um momento de fraqueza; o medo da morte me fez começar a repetir o nome de Deus, embora não haja nenhum Deus”. Disse-lhe: “Isto significa que você precisa de outra experiência de morte? Este foi o seu primeiro ataque do coração; você sobreviveu — o segundo virá logo. No máximo você pode sobreviver ao segundo, mas ao terceiro você não será capaz de sobreviver. E lembre-se do que você está me dizendo”. Ele respondeu-me: “Esqueça-se disso tudo. Estou absolutamente certo de que não há nenhum Deus”. Disse-lhe: “Apenas deixe a morte começar a aproximar-se de você e, imediatamente, as suas convicções superficiais, intelectuais, desaparecerão. Essa idéia de que não há nenhum Deus não é propriamente sua, é emprestada. Não é de sua própria exploração; não é seu próprio insight; não faz parte da sua consciência, mas somente parte da sua mente”. As pessoas se comportarão diferentemente. Você está perguntando: “O que acontecerá à consciência humana quando as pessoas do mundo, subitamente, perceberem que estão no meio de uma praga
  • 40. incontrolável e devastadora que matará a maior parte das pessoas que elas conhecem?” Alguns pontos, certamente, podem ser afirmados. Quando todo o mundo está morrendo, todos os seus relacionamentos — sua mãe, seu pai, sua namorada, sua esposa, seu marido, seu namorado, seus filhos — não significam nada. Quando todo o mundo está a ponto de desaparecer na morte, num buraco negro, os relacionamentos que você criou na vida não podem permanecer intactos. Na verdade, por trás dos nossos relacionamentos, permanecemos estranhos. Isso nos faz sentir medo, então nunca o encaramos. Por outro lado, mesmo quando você está na multidão, você está sozinho; mesmo que o seu nome seja conhecido pelas pessoas, isso faz alguma diferença? Você ainda é um estranho. E isso pode ser constatado: marido e mulher podem viver trinta, quarenta, cinquenta anos juntos, mas quanto mais eles vivem juntos, mais eles se tornam conscientes de que são estranhos. Antes de se casarem eles tiveram a ilusão de que talvez tivessem sido feitos um para o outro, mas, assim que a lua-de-mel acaba, esta ilusão desaparece. E a cada dia eles se tornam mais e mais distantes — fingindo que tudo está muito bem, que está tudo certo. Mas lá no fundo eles sabem que a estranheza deles é intocável. O mundo todo está cheio de estranhos. E se ele for desaparecer no próximo momento, se for anunciado em todas as rádios e em todas as televisões, subitamente, você se veria em sua completa nudez — sozinho. Uma criança pequena foi ao zoológico com o pai e ficaram observando um leão muito feroz em sua jaula — ele andava de um lado para o outro. O garoto ficou com muito medo; não tinha mais do que nove anos. Pediu ao pai: “Pai, se este leão sair e acontecer alguma coisa a você, por favor, diga-me o número do ônibus que eu tenho de tomar para chegar em casa”. Em tal situação, ele está fazendo uma pergunta muito relevante. Ele não consegue conceber que se acontecer alguma coisa ao pai, pode ocorrer o mesmo com ele. Mas caso consiga sobreviver, ele precisará saber o número do ônibus. O pai ficou chocado com o fato de o filho não estar absolutamente preocupado com ele. A proximidade da morte derruba todas as máscaras, subitamente o torna consciente de que você é só e de que todos os seus relacionamentos foram um engano, meios de você se esquecer da sua solidão; meios de criar uma família na qual você sentisse que não estava sozinho. Mas a morte expõe a realidade, infalivelmente. E isto se refere a mortes pequenas: se todo mundo for morrer, todos os seus relacionamentos desaparecerão antes disso. Você morrerá sozinho, como um estranho que não
  • 41. tem nenhum nome, nenhuma fama, nenhuma respeitabilidade, nenhum poder — completamente desamparado. Mas, neste desamparo, as pessoas ainda se comportarão diferentemente. Um velho ia ter um encontro com uma mulher, jovem. Então ele foi ao médico, que lhe prescreveu um afrodisíaco para aumentar e prolongar a sua libido. Ele marcou o encontro num dos melhores restaurantes da cidade. Quando eles pediram a sopa, ele levou a parceira até o toalete, e então chamou o garçom à parte: “Coloque estas pílulas na minha sopa, exatamente antes de trazê-la da cozinha”. A jovem dama voltou, mas quando, depois de quinze minutos, a sopa não havia sido servida, o velho chamou o garçom: “Onde está a nossa sopa?”, reclamou. “Estará aqui em alguns minutos — replicou o garçom — tão logo o talharim abaixe novamente.” No momento da morte, o assunto mais importante, nas mentes das pessoas que não são conscientes, vai ser o sexo — porque o sexo e a morte são dois lados da mesma moeda. Quando todo mundo estiver morrendo, a maioria das pessoas inconscientes, que viveram reprimindo a própria sexualidade, pensará somente em sexo. Elas não podem pensar em nada mais; todos os seus interesses, distrações e religiões desaparecerão — o mundo está acabando, talvez elas possam fazer amor mais uma vez, antes de a morte destruir tudo. Viveram reprimindo a libido, a necessidade sexual, durante toda a vida — de acordo com o parecer dos padres, de acordo com a imposição da sociedade e da cultura — e agora percebem que nada disso tem importância. Tudo vai desaparecer; eles não precisam de nenhuma respeitabilidade, não se importam com religião. Mas tudo dependerá, diferentemente, dos indivíduos, de como eles viveram. Se viveram uma vida desinibida, natural, dando-se totalmente a cada momento, então talvez eles simplesmente observarão — vai ser a maior tragédia, o maior drama no mundo. Não farão nada, mas se sentarão silenciosamente e observarão. Mas nenhuma lei geral pode ser estabelecida do que as pessoas farão. Somente sobre as pessoas iluminadas pode ser dito com absoluta garantia de que não haverá, absolutamente, nenhuma diferença. Elas sabem que esta é a natureza das coisas. Esta é toda a abordagem de Gautama Buda — a filosofia da natureza das coisas — de que há um tempo em que o outono vem, e as folhas têm de deixar a árvore. Quando chega a primavera, aparecem as flores. O Ocidente não tem esse modo de pensar. Segundo o pensamento oriental, não é apenas uma criação, mas toda a criação vai para dentro de uma de-criação exatamente como todo homem, depois de um dia inteiro de trabalho, vai dormir à noite. Esta é uma visão muito potente. Cada criação, depois de um tempo — eles até falavam de um tempo exato, quanto tempo demora para uma criação terminar —, vai para uma de-criação. Ela também precisa de um repouso. Assim,
  • 42. para uma pessoa iluminada, isso não é nada incomum: é parte da própria existência. Como o dia termina, a noite terminará também — e novamente a criação acorda. Os físicos modernos estão chegando mais perto dessa concepção. Primeiro eles descobriram buracos negros: que no espaço há estranhos buracos negros, e se qualquer planeta ou qualquer sol chegar perto do buraco negro, ele é puxado para dentro e simplesmente desaparece. Mas a ciência compreende o equilíbrio da natureza: assim, agora, eles estão dizendo que deve haver os buracos brancos. Talvez o buraco negro seja um dos lados da porta, e o buraco branco seja o outro lado da porta. Talvez, de um lado, um planeta ou uma estrela vai para dentro do buraco negro e desaparece de nós, e do outro lado, do buraco branco, nasça uma estrela nova. Todo dia novas estrelas nascem e velhas estrelas morrem: a vida e a morte fazem um círculo contínuo. Se a vida é o dia, a morte é a noite — esta não se opõe àquele; é apenas um tempo para repouso, sono, um tempo para se rejuvenescer. O homem que atingiu a compreensão não será perturbado por isso. Mas as pessoas inconscientes simplesmente vão ter um choque e começarão a fazer coisas que nunca fizeram. Elas estiveram se controlando e agora não há nenhuma razão para se controlar, não há nenhuma necessidade. Se o fato for conhecido antecipadamente — o que não é muito provável porque, com as armas nucleares, vai levar somente dez minutos para a terra desaparecer: daí não haverá muita possibilidade de que você seja informado antecipadamente: “Esteja pronto!” Haverá apenas o choque de ouvir nas rádios ou nas televisões que dentro de dez minutos o mundo vai acabar; você vai ficar simplesmente gelado, paralisado, o choque será muito grande e fora do comum. Talvez a maioria das pessoas morra com o choque, não com as armas nucleares. O simples fato de ouvir que dentro de dez minutos todo mundo vai morrer será o bastante, o choque destruirá a frágil existência delas. Assim sendo, só é possível levantar uma hipótese de como as pessoas se comportarão. Somente para os iluminados — eu posso dizer com absoluta garantia, com a minha própria autoridade — não haverá nenhuma diferença. Se eles estiverem tomando chá, continuarão a tomar chá; suas mãos nem mesmo tremerão. Se estiverem tomando banho, continuarão a tomar banho. Não se chocarão; nem ficarão paralisados, nem ficarão histéricos. Nem se satisfarão nas coisas que estiveram reprimindo, porque um iluminado não tem nenhuma repressão em seu ser; ele conhece sempre uma única palavra para dizer à natureza — “Sim”. Dirão “sim” ao desaparecimento da terra, à suprema morte — eles não conhecem a palavra “não”. Não vai haver nenhuma resistência da parte deles; e
  • 43. eles serão os únicos que morrerão conscientemente. E aquele que morre conscientemente entra no fluxo eterno da vida; não morre. Aqueles que morrem inconscientemente nascerão em algum outro planeta, em algum outro útero — porque a vida não pode ser destruída, mesmo por armas nucleares. Elas podem destruir somente as casas nas quais a vida existe. The Hidden Splendor — 18 de março de 1987, manhã
  • 44. PARTE IV VIAJANDO PARA O CENTRO DO SEU SER
  • 45. Meditação: o caminho além Amado Bhagwan, Sinto uma forte conexão entre a morte e a meditação — uma fascinação e um medo. Quando me sento com Você, é de alguma forma seguro fechar meus olhos e meditar; quando estou sozinho, é assustador. Por favor, comente. Não há somente uma forte conexão entre a meditação e a morte, mas elas são quase a mesma coisa — simplesmente duas maneiras de olhar para a mesma experiência. A morte separa-o do seu corpo, da sua mente, de tudo aquilo que não é você. Mas separa-o contra a sua vontade. Você está resistindo, não quer ser separado; você não está desejando, não está em estado de let-go. A meditação também separa do seu ser e realidade tudo que não é você — mas não existe resistência; esta é a única diferença. Ao invés de resistência, há uma tremenda boa vontade, um desejo, um sentimento apaixonado de boas-vindas. Você a quer; você a deseja desde as profundezas de seu coração. A experiência é a mesma — a separação entre o falso e o real — mas, devido à sua resistência, na morte, você se torna inconsciente, entra em coma. Você se apega demais na morte; não a permite acontecer, fecha todas as portas, todas as janelas. Sua ânsia pela vida chega ao ápice. A própria idéia de morrer assusta-o desde as raízes. Mas a morte é um fenômeno natural, e absolutamente necessário também — tem de acontecer. Se as folhas não se tornarem amarelas e não caírem, as folhas novas, o fresco e o jovem, não virão. Se a pessoa continua vivendo no corpo velho, não poderá se mover para uma casa melhor, mais fresca, mais nova, com maiores possibilidades de um novo começo. Talvez não tome o mesmo curso que percorreu na vida passada, perdendo-se num deserto. Pode penetrar em um novo céu de consciência. Cada morte é um fim e um começo. Não preste muita atenção ao fim. É o fim para um velho, roto, miserável estilo de vida, e é uma grande oportunidade para se começar uma vida nova, sem cometer os velhos equívocos. É o começo de uma aventura. Mas, porque você
  • 46. se apega à vida e não quer deixa-la — e ela tem de acontecer pela própria natureza das coisas —, você cai na inconsciência. Quase todo mundo, exceto aqueles poucos que se tornaram iluminados, morrem inconscientemente; portanto, eles não sabem o que a morte é, não conhecem seu novo começo, a nova madrugada. A meditação é sua própria investigação. Você está procurando saber exatamente do que você se constitui: o que é falso em você e o que é real em você. É uma estupenda jornada do falso para o real, do mortal para o imortal, da escuridão para a luz. Mas quando você chega ao ponto de ver a separação da mente e do corpo, e a você mesmo simplesmente como uma testemunha, a experiência é a mesma da morte. Você não está morrendo... um homem que meditou morrerá alegremente porque ele sabe que não há morte; a morte estava no seu apego à vida. Você diz: “Sinto uma forte conexão entre a morte e a meditação...” E há. Nas escrituras ancestrais desta terra, até o mestre é definido como a morte, porque toda a sua função, todo o seu trabalho é ensinar a meditação. Em outras palavras, ele ensina a morrer sem morrer — a passar pela experiência da morte, surpreso de que ainda esteja vivo; a morte foi como uma nuvem que passou, sem sequer arranhá-lo. Daí, a fascinação e o medo. Fascinação por saber que a misteriosa experiência pela qual todos têm de passar já aconteceu muitas vezes, mas não se tem consciência dela. E medo de que talvez a morte seja somente um fim, não um outro começo. Aconteceu, no princípio deste século, que o rei de Varanasi estava para ser operado. A operação era grande, mas o rei era muito teimoso e não queria tomar qualquer espécie de anestesia. Ele disse: “Podem fazer a operação, mas eu quero vê-la acontecer; não quero estar inconsciente”. Os médicos estavam perplexos. É contra a prática médica — uma tão grande operação seria muito dolorosa; o homem poderia morrer de tanta dor. A cirurgia requer que se esteja inconsciente. Talvez a ciência cirúrgica tenha aprendido a arte da anestesia a partir da experiência da morte, porque a morte é a maior cirurgia. Ela o separa do seu corpo, da sua mente e do seu coração, com o que você esteve identificado por setenta, oitenta anos. Eles quase se tornaram o seu ser real. A separação vai ser muito dolorosa, e há um limite para a dor. Você já percebeu? — não há nenhuma dor insuportável. A expressão “dor insuportável” existe somente na linguagem — toda dor é suportável. No momento em que ela se torna insuportável, você fica inconsciente. Sua consciência é uma das maneiras de suportá-la.
  • 47. Se Varanasi tivesse sido um homem comum, os médicos não o teriam ouvido — mas ele era um rei e um rei muito bem conhecido, conhecido por todo o país como um grande sábio. Ele persuadiu os cirurgiões: “Não se preocupem, nada vai acontecer comigo. Dêem-me apenas cinco minutos antes de começarem a operação, a fim de que eu possa me colocar em estado meditativo. Quando atingir o estado de meditação, já estarei bem longe do corpo. Então vocês podem cortar o meu corpo em pedaços; eu serei apenas uma testemunha, e uma testemunha distante, como se a cirurgia estivesse acontecendo com outra pessoa”. O momento era muito crítico; a operação tinha de ser feita imediatamente. Caso contrário, poderia causar a morte. Havia somente duas alternativas: ou operar e permitir ao paciente permanecer consciente, ou não operar, mas seguir a velha rotina da ciência. Mas neste caso, a morte era certa. No primeiro caso, havia uma chance de que, talvez, aquele homem pudesse se arranjar, e ele era tão insistente. Não encontrando nenhum modo de persuadi-lo, tiveram de operar. Esta foi a primeira operação feita sem anestesia, em estado de meditação. O rei simplesmente fechou os olhos, ficou silencioso. Até os cirurgiões sentiram algo mudando à volta do rei — a vibração, a presença; a face dele tornou-se relaxada como a de um bebezinho recém-nascido, e depois de cinco minutos eles começaram a operação. A cirurgia levou duas horas, e eles estavam tremendo de medo; na verdade, eles não estavam certos de que o rei sobreviveria — o choque poderia ser demasiado. Mas quando a operação terminou, o rei perguntou-lhes: “Posso abrir meus olhos agora?” Isto foi discutido na esfera médica do mundo inteiro como um caso muito estranho. Os cirurgiões perguntaram-lhe o que ele fez. Ele respondeu: “Não fiz nada. Meditar é a minha própria vida. Momento a momento estou vivendo em silêncio. Pedi aqueles cinco minutos porque vocês iam fazer uma operação tão perigosa que eu tinha de estar absolutamente assentado em meu ser, sem nenhuma hesitação. Então vocês poderiam fazer qualquer coisa porque não o estariam fazendo em mim. Eu sou consciência — e vocês não podem operar a consciência, podem operar somente o corpo”. Você diz: “Quando me sento com você, é de alguma forma seguro”. Não há realmente nenhuma diferença se você se senta comigo ou se senta sozinho — é apenas uma segurança da mente: sabendo que o mestre está presente, pensa- se que não há nenhum mal em dar o salto. Se alguma coisa der errado, alguém está presente para cuidar disso. Em meditação, nada dá errado — nunca. Sem meditação, tudo dá errado.
  • 48. Nada dá certo sem meditação; toda a sua vida dá errado. Você vive somente de esperança, mas suas esperanças nunca são preenchidas. Sua vida é uma longa, longa tragédia. E a razão é sua inconsciência, seu estado não-meditativo. A meditação se parece com a morte, e a experiência é exatamente a mesma. Mas a atitude e o acesso a elas são diferentes, e a diferença é tão vasta que se pode dizer que a meditação é vida e a morte é apenas um sonho. Mas esta é a função de uma escola de mistérios, onde muitas pessoas estão meditando, onde um mestre está presente. Você se sente seguro, não está sozinho. Se alguma coisa der errado, a ajuda estará disponível imediatamente. Mas nada dá errado. Assim, medite enquanto você está sentado perto de mim, e medite quando estiver só. A meditação é a única coisa com garantia absoluta de que nada dá errado. Ela somente revela a sua existência a você mesmo — como pode alguma coisa dar errado? E você não está fazendo nada; você está realmente parando de fazer tudo. Está parando de pensar, de sentir, de fazer — está pondo um ponto final em todas as suas ações. Somente a consciência permanece, porque ela não é ação sua, é você. Uma vez que você conseguiu provar do seu ser, todos os medos desaparecem, e a vida se torna uma dimensão totalmente nova — não mais mundana, não mais comum. Pela primeira vez você vê a sacralidade e a divindade não apenas de si mesmo, mas de tudo o que existe. Tudo se torna misterioso, e viver neste mistério é a única maneira de viver em felicidade suprema; viver neste mistério é viver sob a bênção que se derrama sobre você como chuva. Cada momento traz, mais e mais, bênçãos mais penetrantes e mais profundas para você — não que você as mereça, mas porque a vida as dá a partir de sua abundância; ela está carregada, compartilha com quem é receptivo. Mas não procure identificar a idéia da meditação com a morte, porque a morte não tem boas associações em sua mente. Isto o impedirá de experienciar a consciência — “É como a morte”. De fato, é uma morte comum, não é uma morte verdadeira. A morte comum não é uma morte verdadeira, porque você será, novamente, ligado a uma outra estrutura, a um outro corpo, A pessoa que medita morre em grande estilo; nunca mais fica aprisionada em um corpo. Um italiano perdeu um dia de trabalho e o contramestre quis uma explicação. — Onde você esteve? — perguntou. — Foi a minha mulher. Ela deu à luz um “wheelbarrow” (carrinho de mão). — Se você não tem nada melhor para dizer — disse o contramestre — vou despedi-lo.
  • 49. — Acho que não falei direito — disse o italiano. — Minha mulher, ela está numa cama tendo um carrinho de empurrar. — É isto, cara esperto — gritou o contramestre — você está despedido. O italiano foi para casa e perguntou à mulher: — Ei, o que aconteceu de errado ontem? — Eu lhe disse, tive um “miscarriage” (carrinho de mão ou... aborto.) — Eu sabia, tinha alguma coisa com rodas nele. As incompreensões se acumulam sobre você. Algumas podem ser imensamente danosas. Manter meditação e morte identificadas em sua mente é um dos maiores malefícios que você pode fazer a si mesmo. Embora você não esteja errado, suas associações com o significado de morte são tais que elas o impedirão de entrar em meditação. Esta é uma das razões pelas quais quero tornar a morte mais e mais associada à celebração, em vez de associá-la ao luto, mais e mais associada com uma mudança, um novo começo, em vez de identifica-la com um ponto final, com um fim. Quero mudar a associação, o que limpará o caminho para o estado meditativo. E se você está se sentindo, aqui, comigo, silencioso e meditativo — ainda vivo, mais vivo do que nunca — então não há nenhuma necessidade de ter medo. Tente isto em situações diferentes, e você sempre encontrará uma fonte de grande cura, uma fonte de grande bem-estar, uma fonte de grande sabedoria, uma fonte de grande insight na vida e nos seus mistérios. The Golden Future — 18 de maio de 1987, manhã
  • 50. Conheça a morte sem morrer Amado Bhagwan, Por que o medo da morte tem sido uma companhia constante por toda a minha vida e qual é o significado disso para mim? A meditação e a morte são experiências muito similares. Na morte o seu ego desaparece; somente o seu ser puro permanece. O mesmo acontece na meditação: o desaparecimento do ego e a presença somente do puro estado de ser, de seu ser. A semelhança é tão profunda que da mesma maneira que as pessoas têm medo da morte, têm também medo da meditação. Por outro lado, se você não tem medo da meditação, não terá medo da morte tampouco. A meditação prepara você para a morte. Toda a nossa educação é orientada somente para a vida. É apenas uma educação pela metade, e a outra metade — que é muito mais importante, que vem como um clímax da vida — é completamente descurada por todos os sistemas de educação que existiram anteriormente ou que existem agora. A meditação prepara você para a outra metade; ela o ajuda a conhecer a morte sem morrer. E, uma vez que você compreenda a morte sem morrer, o medo da morte desaparecerá para sempre. Mesmo quando a morte vier, você ficará observando-a silenciosamente, sabendo perfeitamente que ela não pode causar nem mesmo um pequeno arranhão em seu ser. Ela vai levar o seu corpo, a sua mente, mas não você. Você pertence à vida imortal. The Hidden Splendor — 23 de marco de 1987, noite
  • 51. O centro do ciclone A meditação é toda a ciência de extrair mais e mais consciência das trevas. A única maneira de chegar a isso é ser tão consciente quanto possível, vinte e quatro horas por dia. Sentando-se, sente conscientemente, não como um robô; andando, ande conscientemente, alerta a cada movimento; ouvindo, ouça mais e mais conscientemente, de tal modo que cada palavra chegue a você em sua pureza cristalina, em sua exatidão. Enquanto ouvir, permaneça silencioso, de tal modo que a sua consciência não seja encoberta por pensamentos. Neste exato momento, se você está silencioso e consciente, você pode ouvir pequenos insetos cantando suas canções nas árvores. A escuridão não é vazia, a noite tem a sua própria canção, mas se você está cheio de pensamentos, então você não pode ouvir os insetos. Esse é apenas um exemplo. Se você se torna mais e mais silencioso, você pode começar a ouvir as próprias batidas do seu coração, pode começar a ouvir o fluxo do seu próprio sangue porque o sangue está continuamente fluindo através de todo o seu corpo. Se você está consciente e silencioso, mais e mais claridade, criatividade, inteligência serão descobertas. Um dos maiores filósofos do Ocidente, C.E.M. Joad, estava morrendo, e um amigo, que era discípulo de George Gurdjieff, veio vê-lo. Joad perguntou ao amigo: “O que você continua fazendo com esse cara esquisito. George Gurdjieff? Por que você está perdendo o seu tempo? E não somente você, eu ouvi dizer que muitas pessoas estão perdendo o tempo delas”. O amigo riu. Disse: “É estranho que aquelas poucas pessoas que estão com Gurdjieff pensem que todo o mundo está perdendo seu tempo, e você está pensando que nós estamos perdendo o nosso tempo”. Joad disse: “Não tenho muito tempo para viver: de outro modo eu poderia ir e comparar”. O amigo respondeu: “Mesmo que você tenha somente alguns segundos mais para viver, isso pode ser feito aqui, agora”. Joad concordou.
  • 52. O homem disse: “Feche seus olhos e apenas olhe para dentro, e então abra os seus olhos e diga-me o que encontrou”. Joad fechou os olhos, abriu-os em seguida e disse: “Há escuridão e nada mais”. O amigo riu e disse: “Não é hora de rir, porque você está quase morrendo, mas eu vim na hora certa. Você disse que viu somente escuridão por dentro?” Joad respondeu: “Naturalmente”. E o homem replicou: “Você é um filósofo tão notável, escreveu livros tão lindos. Não pode ver o que é importante, que há duas coisas — você e a escuridão? De outro modo, quem viu a escuridão? A escuridão não pode ver a si mesma — isso é certo — e a escuridão não pode relatar que há somente escuridão”. Joad considerou o fato e disse: “Meu Deus, talvez as pessoas que estão com Gurdjieff não estejam perdendo seu tempo. É verdade, eu vi a escuridão”. O amigo falou: “Todo o nosso esforço é fazer este eu, a testemunha, mais forte e mais cristalizado, e transformar a escuridão em luz. Ambas as coisas acontecem simultaneamente. À medida que a testemunha se torna mais e mais centrada, a escuridão se torna cada vez menor. Quando a testemunha chega ao apogeu de seu florescimento, que é o lótus da consciência, toda a escuridão desaparece”. Estar na escuridão é estar vivendo no mínimo. E estar repleto de luz é viver no máximo. The Razor’s Edge — 2 de março de 1987, noite
  • 53. Uma ancestral chave de ouro Existem centenas de métodos de meditação, mas talvez a vipassana tenha um status singular, exatamente do mesmo modo como houve milhares de místicos, mas Gautama Buda tem uma singularidade própria. Por muitas razões ele é incomparável, e fez mais pela humanidade do que qualquer outro. Em muitos sentidos sua busca pela verdade foi mais sincera, mais autêntica do que a de qualquer outro. Esta foi a meditação através da qual Gautama Buda tornou-se iluminado. A própria palavra “vipassana”, em páli, a língua na qual Gautama Buda falava... O significado — o significado literal — da palavra é olhar, e o significado metafórico é observar, testemunhar. Gautama Buda escolheu uma meditação que pode ser chamada de meditação essencial. Todas as outras meditações são formas diferentes de testemunhar, mas testemunhar está presente em toda espécie de meditação como uma parte essencial: não pode ser evitada. Buda anulou tudo o mais e ficou somente com a parte essencial — testemunhar. Há três etapas no testemunhar. Buda é um pensador muito cientifico. Começa com o corpo, porque este é o mais fácil para se testemunhar. É fácil testemunhar minhas mãos se movendo, minha mão sendo levantada. Posso testemunhar a mim mesmo andando na rua, posso testemunhar cada passo à medida que ando. Posso testemunhar quando estou comendo meu alimento. Assim, o primeiro passo na vipassana é testemunhar as ações do corpo, que é o passo mais simples. Qualquer método científico sempre começará pelo mais simples. Enquanto testemunhar o corpo, você ficará surpreso com as novas experiências. Quando você move as suas mãos testemunhando, observando, em estado de alerta, de consciência, você sentirá uma certa graça e um certo silêncio na mão. Você pode fazer o movimento sem testemunhar — ele será mais rápido, mas perderá a graciosidade. Buda costumava andar tão vagarosamente que, muitas vezes, perguntavam-lhe por que andava tão lentamente. Ele dizia: “Faz parte da minha meditação: andar sempre como se estivesse andando no inverno, num rio gelado... vagarosamente, alerta — porque o rio está muito gelado; consciente porque a
  • 54. corrente está muito forte; testemunhando cada um dos passos, porque se pode escorregar nas pedras do rio”. O método permanece o mesmo, somente o objeto muda com cada passo. O segundo passo é observar a mente. Agora você se move para dentro de um mundo mais sutil: observa seus pensamentos. Se você foi capaz e bem-sucedido ao testemunhar o seu corpo, não vai haver nenhuma dificuldade. Os pensamentos são ondas sutis, ondas eletrônicas, ondas de rádio, mas são tão materiais quanto seu corpo. Não são visíveis, como o ar não é visível, mas o ar é tão material quanto as pedras; os seus pensamentos são igualmente materiais, mas invisíveis. Este é o segundo passo, o passo do meio. Você está se movendo na direção da invisibilidade, mas ainda é material — observe seus pensamentos. A única condição é: não julgue. Não julgue porque, no momento em que começar a julgar, se esquecerá de observar. Não há nenhum antagonismo com o julgar. A razão pela qual ele é proibido é que o tempo que você passa julgando: “Este é um bom pensamento”, não consegue testemunhar. Quando começa a pensar, você se envolve. Você não pode permanecer alheio, ficar de pé ao lado da estrada e apenas olhar o tráfego. Não se torne um participante, nem para valorizar, avaliar, condenar; nenhuma atitude deve ser tomada sobre o que está passando pela sua mente. Você deve olhar seus pensamentos como se observasse nuvens passando no céu. Você não emite julgamentos sobre elas: “Esta nuvem negra é muito ruim, esta nuvem branca parece um sábio”. Nuvens são nuvens, nem são más nem são boas. Assim são os pensamentos — uma onda de curta duração passando através da sua mente. Observe sem qualquer julgamento e você terá uma surpresa maior. A medida que seu observar se torna firme, os pensamentos virão cada vez menos. A proporção é exatamente a mesma: se você estiver cinquenta por cento no seu testemunhar, então cinquenta por cento dos seus pensamentos desaparecerão. Se você estiver sessenta por cento no seu testemunhar, então somente quarenta por cento de pensamentos estarão presentes. Quando você for noventa e nove por cento uma pura testemunha, somente de vez em quando haverá um pensamento solitário, um por cento, passando pela estrada; desse modo o tráfego se foi. Aquele tráfego da hora do rush não existe mais. Quando você está cem por cento sem julgar, sendo simplesmente uma testemunha, significa que se tornou apenas um espelho, porque um espelho nunca faz julgamentos. Uma mulher feia se olha nele — o espelho não emite nenhum julgamento. Uma linda mulher se olha nele — para o espelho, não faz nenhuma diferença. Ninguém se olha nele — o espelho está tão puro quanto se