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OSHO
GUERRA E
PAZ INTERIOR
Ensinamentos do Bhagavad Gita
UNIVERSALISMO
Sumário
Prefácio
1 — A Psicologia da Guerra
2 — As Raízes da Violência
3 — A Yoga da Angústia
4 — Além de Justificativas
5 — Além do Ego
6 — A Mente Sem Pensamento
7 — Morte
8 — A Gota de Orvalho e o Oceano
Prefácio
Uma das mais famosas escrituras hindus, o Bhagavad Gita é apresentado em
forma de diálogo entre o iluminado Krishna e o grande arqueiro e experiente
guerreiro Arjuna. O diálogo acontece na noite do Mahabharata, a climática
“Grande Guerra” da Índia que ocorreu há 5000 anos.
A guerra originou-se de uma disputa sobre qual dos dois lados da família real,
os Pandavas ou os Kauravas, deveria herdar o reino, cujo centro ficava próximo
a Delhi. Arjuna estava ao lado dos Pandavas mas, na noite da batalha — quando
viu muitos familiares, amigos e parentes se reunindo aos Kauravas para lutar —
percebeu, claramente, que entrar na guerra significaria matar “sua própria
gente”.
Krishna, que tinha parentes nos dois lados da família real, fazia o papel de
cocheiro e “instrutor de vida” de Arjuna. E conforme conversa com Arjuna, o
ajuda a ver, passo a passo, que as raízes de sua angústia estão em sua
identificação com sua mente e com todos os padrões e condicionamentos
inconscientes de sua mente.
Na série de palestras transcritas e publicadas neste livro, Osho chama o
Bhagavad Gita de “a primeira escritura psicológica”, disponível no Ocidente
muito antes de Freud, Adler e Jung. E o modo com que Krishna aborda os
problemas de Arjuna — todos os nossos problemas — só pode ser
compreendido uma vez que entendamos como a mente humana realmente
funciona. É aí que os brilhantes comentários de Osho entram, quando ele explica
como os padrões e condicionamentos de nossa mente criam dor e tristeza,
dilema, conflito e guerra.
Ao comentar o significado dos versos do Gita e responder às perguntas de sua
platéia, Osho revela como carregamos um Arjuna dentro de nós. Logo fica claro
que a natureza do homem no começo do século XXI pode não ser tão diferente
daquela que lutou na Guerra do Mahabharata. Mas, nestas páginas, Osho está
se dirigindo a um mundo que sofre as dores de uma crise muito mais complexa,
e de magnitude potencialmente muito maior do que a época em que Krishna e
Arjuna viveram. Enquanto nos vemos à beira da autodestruição, não só nacional
mas também mundial, Osho explica a visão psicológica de Krishna e nos dá as
chaves para uma paz pessoal e global.
Os Editores
1
A Psicologia da Guerra
Dhritarashtra;
Oh Sanjay,
assentado no campo da justiça,
o chão do Kuru,
e desejoso de guerra,
o que meus filhos e os filhos de Pandu fizeram?
Sanjay:
E então o rei Duryodhana
depois de ver o exército dos Pandavas
estrategicamente se posicionou para a batalha,
aproximou-se de seu mestre, Dronacharya, e disse:
“Oh, mestre honrado
veja esse poderoso exército dos filhos de Pandu
que seu próprio aluno esperto,
o filho de Drupada, estrategicamente organizou
“Aqui estiveram guerreiros e grandes arqueiros,
Como Bheema e Arjuna;
homens como Yuyudhana, Virata
e Drupada o grande arqueiro.
“Também, Dhrishtaketu, Chekitana,
o valente rei de Kashi,
Purujit, Kuntibhoja
e Shaibya o melhor entre os homens.
“O Poderoso Yudhamanyu e o forte Uttamauja;
o filho de Subhadra
assim como os filhos de Draupadi —
todos eles grandes comandantes.
“Também saiba, Oh primeiro entre os brahmins,
e dos ótimos homens do nosso lado;
e para sua informação eu nomearei
os comandantes de meu exército.
Você mesmo, depois Bheeshma, e Karna,
e Kripa, sempre vitorioso em batalha;
da mesma maneira, Ashvatthama, Vikarna,
e o filho de Somadatta.
“E muitos outros heróis valentes,
prontos para abrir mão de suas vidas por mim,
armados com muitos tipos de armas,
e todos muito habilidosos na batalha.
“Nosso exército, protegido por Bheeshma,
é invencível de todas as maneiras,
enquanto o deles, com Bheema no comando
será fácil de derrotarmos.
“Assim, firmes em todas as frentes,
cada um em seu respectivo lugar,
protejam Bheeshma com suas vidas todos vocês.”
Escutando essas palavras de Duryodhana dirigidas a Dronacharya,
o velho mais valente Bheeshma
o mais velho entre os Kauravas,
rugiu como um leão e tocou sua concha
para alegrar o coração de Duryodhana.
Então, conchas e tímpanos,
tambores, bumbos e cornetas
foram tocados ao mesmo tempo
fazendo um som tumultuado.
Com isso,
sentado em sua charrete maravilhosa,
que era levada por cavalos brancos,
Krishna e Arjuna tocaram suas lindas conchas.
Krishna tocou sua concha chamada Panchajanya,
e Arjuna a sua, chamada Devadatta.
Bheema, um realizador de grandes feitos
e um homem de imenso apetite,
tocou sua concha poderosa, Paundra.
O rei Yudhishthira, o filho de Kunti,
tocou sua concha chamada Anantvijaya,
e Nakula e Sahadeva
tocaram as suas, chamadas Sughosha e Manipushpaka.
E então, Oh Senhor da Terra,
o ótimo arqueiro, o rei de Kashi,
o grande arqueiro comandante Shikhandi,
Dhrishtaddumna e o rei Virata,
e o invencível Satyaki, Rei Drupada
e todos os filhos de Draupadi,
e o forte filho de Subhadra,
cada um deles tocou sua concha especial.
E ressoando nos céus
e na terra,
o grande rugido
tomou os corações dos filhos de Dhritarashtra.
E então, Oh Rei,
Arjuna, cuja bandeira trazia a crista de Hanumana,
tendo olhado os filhos de Dhritarashtra,
armados com suas armas e prontos para atacar,
pegou seu arco
e dirigiu as seguintes palavras a Krishna:
“Oh Ser Infalível,
coloque minha charrete entre os dois exércitos,
para que eu possa ver esses homens com clareza
que estão aqui, ansiosos para lutar,
e saiba quem são eles
que estarão lutando comigo nessa guerra.
Dhritarashtra é cego. Mas a paixão não desaparece com a ausência da visão; o
desejo não desaparece com a ausência da visão. Se Surdas tivesse pensado
em Dhritarashtra, ele nunca teria destruído seus próprios olhos.
Surdas destruiu seus olhos acreditando que, assim que perdesse sua visão, o
desejo e a paixão nunca mais nasceriam dentro dele. Mas o desejo não surge
nos olhos, ele surge fora da mente. Nenhuma paixão pode ser acabada desta
maneira — mesmo que uma pessoa destrua seus olhos.
Essa maravilhosa história do Gita começa com a curiosidade de um homem
cego. Na verdade, nem mesmo uma história seria contada neste mundo se não
existissem homens cegos. Todas as histórias desta vida começam com a
curiosidade de um homem cego. Um homem cego quer ver o que ele não
consegue ver; uma pessoa surda quer ouvir o que ela não consegue ouvir.
Mesmo que todos os órgãos do sentido fossem perdidos, os desejos escondidos
dentro da mente não sumiriam.
Por isso, gostaria de lembrá-los desde o princípio que Dhritarashtra é cego, e
mesmo assim, a milhas de distância, sua mente é curiosa, ansiosa e preocupada
em saber o que está acontecendo no campo de batalha. Também mantenham
um segundo ponto em mente: que o cego Dhritarashtra tem cem filhos, mas que
os filhos nascidos de uma pessoa cega não têm uma visão verdadeira, mesmo
que tenham olhos físicos. As pessoas que nascem de pais cegos — e talvez, de
modo geral, as pessoas nasçam de pais cegos — podem ter olhos físicos, mas
é difícil para elas obterem a visão interior. Então, em segundo lugar, é importante
entender que os cem filhos de Dhritarashtra estavam agindo de modo cego sob
todos os aspectos. Eles tinham olhos físicos e exteriores, mas não tinham olhos
interiores. Uma pessoa que é cega só pode ter a cegueira. Mas esse pai está
curioso para saber o que está acontecendo.
Em terceiro lugar, devemos perceber o que Dhritarashtra está dizendo:
Oh Sanjay,
assentado no campo da justiça,
o chão do Kuru,
e desejoso de guerra...
O campo da justiça deixa de existir no dia em que as pessoas se reúnem ali para
lutar em uma guerra. No dia em que a briga se tornar imperativa, a possibilidade
de qualquer justiça sobreviver neste mundo termina. Assim, em algum momento
pode ter sido um campo de justiça, de religião, mas agora não é mais. Agora, as
pessoas que anseiam matar umas às outras têm se assentado no lugar
conhecido como dharmakshetra — o campo da justiça.
Esse começo é realmente extraordinário. Também é extraordinário no sentido
de que agora será muito difícil entender o que deve estar acontecendo nos
campos da injustiça, nos campos da irreligiosidade, se isso é o que está
acontecendo nos campos da justiça. O que pode estar acontecendo no campo
da justiça se Dhritarashtra já está perguntando a Sanjay: “Eu quero saber o que
meus filhos e meus oponentes, que estão dispostos a lutar, estão fazendo”?
Talvez um campo de justiça ainda não tenha sido criado neste mundo. Se já
tivesse sido criado, então a guerra não mais seria uma possibilidade. Mas
quando a possibilidade da guerra ainda existe, e quando um campo de justiça
transforma-se em um campo de batalha, como podemos culpar ou criticar os
injustos, os irreligiosos?
A verdade é que talvez tenha havido menos guerras nos campos da injustiça do
que nos campos da justiça, da religião. Se pensássemos em termos de guerra e
derramamento de sangue, então os campos de justiça pareceriam mais com os
campos de injustiça do que os campos de injustiça de hoje.
Devemos entender a ironia envolvida aqui — de que, até agora, as guerras
aconteceram em domínios religiosos. Não pense que isso só está acontecendo
agora; que os templos e mesquitas se tornaram locais de guerra só hoje. Há
milhares de anos — quando se acreditava que pessoas boas existiam na terra,
e uma pessoa maravilhosa como Krishna estava presente —, até mesmo
naquela época as pessoas tinham se reunido para lutar nos campos religiosos
do Kuru. Essa profunda sede por guerra, esse profundo desejo por destruição,
esse animal escondido dentro dos restos com o homem até mesmo nos campos
de justiça. Até mesmo lá, esse animal se prepara para a guerra.
É bom lembrar disso, e também lembrar que lutar se torna ainda mais perigoso
quando vem protegido pelo escudo da religião — porque então parece
justificado.
Por isso, essa escritura religiosa começa com a curiosidade cega de
Dhritarashtra. Todas as escrituras religiosas começam com a curiosidade cega
de algum homem. Na verdade, no dia em que não existirem pessoas cegas no
mundo, não haverá a necessidade de nenhuma escritura religiosa. Então aqui
está ele, esse homem cego que está curioso.
OSHO,
Qual o significado de Sanjay, que fala sobre a guerra a Dhritarashtra, no
Gita? Sanjay possuía poderes de ver e ouvir de longe? Qual o curso de
seus poderes mentais? Sua força é intrínseca?
Muitas forças surgiram sobre Sanjay, e isso é natural. De longe, de muito longe,
Sanjay está contando a Dhritarashtra o que está acontecendo em Kurukshetra.
A yoga sempre acreditou que os olhos com os quais enxergamos não são os
únicos que temos. O homem também tem outro olho, que consegue ver além
das barreiras do tempo e do espaço. Mas não é só porque a yoga diz isso,
necessariamente, que Sanjay está correto no que diz. Uma dúvida surge na
mente: como Sanjay consegue ver de tão longe?
Ele é onisciente? Não. E, antes de qualquer coisa, o poder de ver e ouvir a
distância não é um poder muito grande. Não tem nada a ver com ser onisciente.
É um poder muito simples e qualquer pessoa pode desenvolvê-lo com um
pouquinho de esforço. E às vezes acontece, como o resultado de algum truque
na natureza, que esse poder se desenvolva em alguém com quem tenha
afinidade.
Existem poderes escondidos dentro de nossos olhos, que podem ser vistos além
dos limites de tempo e espaço. Mas esses poderes não têm muito a ver com a
espiritualidade.
Então não é que Sanjay seja algum tipo de homem espiritual. Ele certamente é
especial: é capaz de ver o que está acontecendo bem longe do campo de
batalha. E não é que ele tenha alcançado alguma santidade ou verdade por
causa desse poder. Pelo contrário, é possível que Sanjay possa ter sabotado a
si mesmo completamente usando esse poder.
Isso sempre acontece. Poderes extraordinários podem tirar as pessoas de seus
caminhos. É por isso que a ioga defende que se eles são poderes físicos comuns
ou poderes psíquicos da mente, uma pessoa que se envolve com esses poderes
nunca alcança a verdade.
Entretanto, o que Sanjay poderia fazer é possível. Recentemente, nos últimos
cem anos no Ocidente, uma grande quantidade de trabalho tem sido realizada
na pesquisa psíquica. Por isso, agora, ninguém tem motivo algum para duvidar
de Sanjay — nem mesmo em campos científicos. Agora os psicólogos estão
admitindo que existem poderes infinitos no homem.
Como resultado das viagens do homem ao espaço, os psicólogos começaram a
trabalhar em uma nova área. Não é mais possível depender completamente de
máquinas: especialmente quando as pessoas são mandadas para o espaço, um
grande risco está envolvido. Qualquer defeito no equipamento e podemos perder
o contato com eles para sempre, e seria impossível encontrar esses viajantes
perdidos. Pode ser que nunca sejamos capazes de localizá-los na infinidade do
espaço, ou saber se estão vivos ou mortos. É por isso que os cientistas
trabalham com ansiedade em seus laboratórios para desenvolver um sistema
substituto que nos permitirá ver de uma grande distância, ouvir e enviar
mensagens sem a ajuda da tecnologia. Não demorará muito para que todos os
países tenham Sanjays.
Um Sanjay não é particularmente um homem espiritual. No entanto, ele tem um
poder especial que todos nós temos e que pode ser desenvolvido.
Sanjay:
E então o rei Duryodhana
depois de ver o exército dos Pandavas
estrategicamente se posicionou para a batalha,
aproximou-se de seu mestre, Dronacharya, e disse:
“Oh mestre honrado
veja esse poderoso exército dos filhos de Pandu
que seu próprio aluno esperto,
o filho de Drupada, estrategicamente organizou
“Aqui estiveram guerreiros e grandes arqueiros,
Como Bheema e Arjuna;
homens como Yuyudhana, Virata
e Drupada o grande arqueiro.
“Também, Dhrishtaketu, Chekitana,
o valente rei de Kashi,
Purujit, Kuntibhoja,
e Shaibya o melhor entre os homens.
“O Poderoso Yudhamanyu e o forte Uttamauja;
o filho de Subhadra
assim como os filhos de Draupadi —
todos eles grandes comandantes.
“Também saiba, Oh primeiro entre os brahmins,
e dos ótimos homens do nosso lado;
e para sua informação eu nomearei
os comandantes de meu exército.
Quando a mente humana está sofrendo de complexo de inferioridade, quando
internamente a mente humana se considera inferior, então uma pessoa sempre
começa a falar sobre sua própria grandeza. Mas quando a pessoa não está
tomada pela inferioridade, a conversa sempre começa com os comentários
sobre a grandeza de outra pessoa.
Aqui Duryodhana está dizendo a Dronacharya quais grandes comandantes e
guerreiros juntaram-se no exército de Pandava. O fato de Duryodhana começar
assim é altamente simbólico. Geralmente, a conversa não começa com o elogio
ao inimigo; geralmente começa com a crítica ao inimigo, elogiando a si mesmo
em comparação ao inimigo. Mas aqui, Duryodhana começa a falar identificando
os heróis do exército inimigo. Isso mostra que seja lá o que Duryodhana possa
ser, certamente não é um homem com complexo de inferioridade.
É interessante que mesmo um bom homem que esteja sofrendo de complexo de
inferioridade seja pior do que um homem que não tenha o mesmo problema. Só
uma pessoa que é confiante em si mesma pode começar elogiando os outros.
Essa é uma diferença fundamental que tem ocorrido nos últimos séculos. Antes,
também, havia tanto pessoas boas quanto pessoas más — e não é que hoje o
número de pessoas más aumentou e o de pessoas boas diminuiu. Hoje em dia,
a proporção de pessoas boas e más também é parecida. Então, que mudança
ocorreu?
As pessoas que sempre falam sobre religião espalham a crença de que
antigamente as pessoas eram boas e que agora ficaram más. No meu ponto de
vista, essa afirmação é completamente errada. Sempre existiram pessoas boas
e pessoas más. A diferença que ocorreu antes e agora não é tão periférica; é
muito mais profunda. No passado, nem mesmo uma pessoa má sofria de
complexo de inferioridade; hoje em dia, até uma pessoa boa sofre disso. E aqui
está a grande diferença.
Hoje em dia, até mesmo o melhor dos homens só é bom por fora. Por dentro,
não tem certeza a respeito de si mesmo. Pense nisso: quando uma pessoa não
tem certeza a respeito de si mesma, sua bondade não é do tipo que pode durar
muito tempo. É superficial: um arranhãozinho e até mesmo a superfície ficará
feia. E se uma pessoa má é autoconfiante, apesar de sua maldade ela pode ser
transformada a qualquer momento, porque uma qualidade muito cristalizada de
bondade esconde-se no fundo: a qualidade da autoconfiança. Eu acho que é
muito importante que uma pessoa má como Duryodhana comece seu discurso
de um modo agradável. Ele menciona as boas qualidades de seus oponentes
em primeiro lugar, e depois descreve os heróis de seu próprio exército.
“Você mesmo, depois Bheeshma, e Karna,
e Kripa, sempre vitorioso em batalha;
da mesma maneira, Ashvatthama, Vikarna,
e o filho de Somadatta.
“E muitos outros heróis valentes,
prontos para abrir mão de suas vidas por mim,
armados com muitos tipos de armas,
e todos muito habilidosos na batalha.
“Nosso exército, protegido por Bheeshma,
é invencível de todas as maneiras,
enquanto o deles, com Bheema no comando,
será fácil de derrotarmos.
“Assim, firmes em todas as frentes,
cada um em seu respectivo lugar,
protejam Bheeshma com suas vidas
todos vocês.”
OSHO,
Por um lado vemos que a ênfase no Shrimad Bhagvad-Gita está sobre
Arjuna, enquanto aqui Duryodhana está dizendo que o exército de
Pandavas é protegido por Bheema, e o exército de Kauravas por
Bheeshma. É possível que a idéia escondida em colocar Bheema contra
Bheeshma seja pelo fato de Duryodhana ver Bheema como seu único
rival?
Esse ponto vale a pena ser discutido. A guerra toda é centralizada em Arjuna
como seu principal pivô, mas isso é retrospecto — ou seja, depois da guerra, na
conclusão da guerra. Aqueles que conhecem a guerra e seu resultado diriam
que Arjuna foi decisivo durante a guerra. Mas aqueles que viram o início da
guerra nunca poderiam ter pensado assim.
Para Duryodhana, a possibilidade de uma guerra acontecer encontrava-se em
Bheema. Havia motivos para isso. Nem mesmo Duryodhana poderia esperar que
uma pessoa boa como Arjuna entraria em uma guerra como aquela. Arjuna
poderia ser sensibilizado — até mesmo Duryodhana tinha suas dúvidas a
respeito de sua firmeza de decisão. Duryodhana tinha uma sensação profunda
e inconsciente de que Arjuna poderia fugir da guerra. Se essa guerra fosse
terminada, teria de ser somente por causa de Bheema. Pessoas como Bheema,
que são menos inteligentes mas mais poderosas, podem ser dependentes de
lutar em uma guerra.
Arjuna é inteligente; e onde há inteligência há dúvida, e onde há dúvida, há
dilema. Arjuna é racional; e onde existe racionalidade, existe a capacidade de
pensar de uma perspectiva total. Quando uma pessoa tem essas qualidades é
difícil entrar em uma situação perigosa, como a guerra, com os olhos fechados.
Existe uma grande semelhança entre Duryodhana e Bheema. Os dois têm a
mesma natureza; no fundo eles têm a mesma maneira de pensar, os dois são o
mesmo tipo de pessoa. Assim, se Duryodhana visse Bheema como a figura mais
importante de seu lado oposto, ele tinha razão. Não há nada de errado nisso.
Mais adiante, o Gita também prova esse fato: Arjuna está prestes a escapar.
Arjuna surge como um escapista, e isso é sempre provável em relação a uma
pessoa como Arjuna: para ele, entrar na guerra tornou-se possível apenas
depois de passar por uma autotransformação. Apenas depois de conquistar um
novo nível de compreensão ele pôde concordar com a guerra.
Bheema estava pronto para lutar em qualquer nível que se encontrasse no
momento. A guerra não é natural para Bheema como é para Duryodhana. Assim,
não é coincidência que Duryodhana visse Bheema como a figura central. Mas
isso é no começo da guerra; Duryodhana não sabe como a guerra vai terminar,
qual será o fim. Mas nós sabemos.
Lembre-se, geralmente a vida não termina da mesma maneira que começou. O
final é sempre desconhecido; é sempre invisível. Na maioria das vezes, o que
pensamos que vai acontecer não acontece. A vida é uma jornada desconhecida.
Assim, tudo em que acreditamos nos primeiros momentos da vida, nos primeiros
momentos de qualquer acontecimento, não termina da mesma maneira no final.
Podemos nos comprometer em moldar nossos destinos, mas não podemos nos
tornar aqueles que os decidem. O resultado é sempre alguma coisa diferente.
A compreensão clara de Duryodhana era que Bheema seria a figura central. E
se Bheema tivesse sido a figura principal, talvez o que Duryodhana dizia a
respeito de ser vitorioso tivesse se tornado verdade.
Vale a pena pensar por que o ponto de vista de Duryodhana não se mostrou
verdadeiro, e por que um elemento inesperado entrou em cena.
Duryodhana se esqueceu de Krishna, esqueceu que Krishna seria capaz de levar
Arjuna de volta à guerra se ele decidisse escapar.
Nós também nunca nos lembramos que o invisível, intangível, pode acontecer
em nossas vidas. Nossos cálculos são feitos de acordo com o que podemos ver.
Nunca lembramos que em algum ponto o invisível também pode entrar, que o
invisível pode se meter entre tudo.
Aqui, no meio de todas as coisas, o invisível entrou sob a forma de Krishna, e
consequentemente a história toda tomou um outro rumo. O que poderia ter
acontecido não aconteceu; e aquilo que tinha pouca possibilidade de acontecer,
aconteceu.
A chegada do desconhecido não pode ser prevista. Quem lê essa história pela
primeira vez fica chocado quando descobre Krishna levando o fugidio Arjuna de
volta para a guerra — certamente o leitor fica chocado.
Quando Emerson leu essa história pela primeira vez, ele fechou o livro, ficou
horrorizado — porque o que Arjuna estava dizendo seria aceito pelas tão
famosas pessoas religiosas. O argumento dado por Arjuna era aquele de uma
pessoa religiosa. Quando Henry Thoreau leu que Krishna aconselhou Arjuna a
entrar na guerra, ele também ficou horrorizado. Henry Thoreau escreveu que ele
não imaginava, que não tinha a menor idéia de que a história teria essa
reviravolta — Krishna aconselhando Arjuna a ir para a guerra. Gandhi também
enfrentou a mesma dificuldade; ficou perturbado pelo mesmo motivo. Mas a vida
nunca acontece de acordo com princípios preestabelecidos. A vida é um
extraordinário fenômeno. Não segue em trilhos, flui como a correnteza do rio
Ganges — seu curso nunca é predeterminado. E quando o invisível
desconhecido aparece, perturba tudo. Tudo que tenha sido planejado, tudo que
o homem tenha tecido, tudo que a mente do homem arquitetou — tudo fica de
cabeça para baixo.
Duryodhana nunca imaginara que essa presença invisível entraria na guerra. Por
isso, o que ele está dizendo é apenas uma frase inicial do tipo que todos nós
dizemos nos primeiros estágios de qualquer situação em nossas vidas.
Enquanto isso, o invisível, o desconhecido, continua interferindo, e a história toda
é mudada.
Se olharmos para nossa vida no passado, veremos que tudo que pretendíamos
que acontecesse deu errado. Onde esperávamos ter sucesso, tivemos fracasso;
tudo que nos esforçamos para ter, não alcançamos. Esperamos que a felicidade
venha como o resultado de alguma coisa obtida, mas quando a conseguimos,
ela nos levou à tristeza. E aquilo que nunca sonhamos em ter, de repente abriu
caminhos de alegria e felicidade. Tudo fica de cabeça para baixo.
Mas as pessoas que são inteligentes o bastante para pensarem no resultado
desde o começo são muito poucas neste mundo. No começo, prestamos atenção
apenas ao começo. Se ao menos pudéssemos pensar no fim primeiro, a história
da vida poderia ser muito diferente.
No entanto, se Duryodhana pensasse no final em primeiro lugar, a guerra não
teria acontecido. Mas Duryodhana não pensa no final. Ele não valoriza o final —
que só pode dar no que deu. É por isso que ele repete que apesar de o exército
do outro lado ser ótimo, a vitória final será dele; que seus guerreiros estão
ansiosos para fazer dele o vencedor, mesmo que isso custe suas vidas.
Mesmo que coloquemos nosso poder atrás dele, a falsidade nunca pode ser
vitoriosa. Mas um Duryodhana não consegue perceber, compreender esse fato.
A verdade, que no começo parece estar perdendo, sempre vence no final. A
mentira parece estar ganhando no começo, mas no final sempre encontra a
derrota. A verdade parece estar perdendo no começo, mas, no final, sai vitoriosa.
Mas como podemos ver o final antes do começo? A pessoa que consegue se
torna religiosa. A pessoa que não consegue ver isso continua escorregando,
como Duryodhana, em uma guerra cega.
OSHO,
Existe a vontade da força invisível desconhecida e existe a força do
indivíduo. Uma vez que elas entrem em conflito, como um indivíduo pode
saber qual é a vontade do desconhecido?
A pergunta é, como um indivíduo pode saber qual é a vontade do desconhecido?
O indivíduo nunca consegue saber. Mas se o indivíduo puder abrir mão de si
mesmo, se puder apagar seu ego, ele conhecerá a vontade do desconhecido
imediatamente — porque se torna um com ela.
Uma gota não tem como saber o que é um oceano até que se dissolva no
oceano. Um indivíduo não pode saber qual é a vontade do todo enquanto
mantiver sua identidade separada. Mas se ele puder se dissolver e deixar de ser
um indivíduo separado do todo, então apenas o todo restará, a questão de saber
a vontade do todo não aparece. Então o indivíduo viverá da maneira que o
desconhecido, que o todo o fizer viver. Nessa situação, nenhuma vontade
individual, nenhum desejo individual por nenhum resultado em especial, nenhum
desejo pessoal por nada, nenhuma atitude de impor sua própria vontade sobre
a vontade do todo existe em nenhum lugar, porque não existirá mais o indivíduo
em si.
Enquanto o indivíduo existir, a vontade do todo não será conhecida. E quando o
indivíduo não existir mais, não existirá mais a necessidade de saber a vontade
do todo — porque o que acontecer estará acontecendo de acordo com a vontade
do todo, do desconhecido; o indivíduo se tornou apenas um instrumento, um
veículo.
Mais adiante, e ao longo do Gita, Krishna aconselha Arjuna: que ele deveria se
entregar às mãos do desconhecido, que ele deveria se entregar ao desconhecido
— porque então aqueles com quem Arjuna se preocupa que serão mortos na
guerra, já estarão mortos nas mãos do desconhecido, do todo; porque então
Arjuna não será o responsável pela morte daqueles pelos quais ele se sente
responsável. É claro que se ele se mantiver separado como um indivíduo, ele
certamente será responsável. Mas se ele abrir mão de sua individualidade e lutar
como um instrumento, como uma testemunha, então nenhuma responsabilidade
lhe será atribuída.
Se o indivíduo conseguir desaparecer no todo, se puder se entregar totalmente,
se puder abrir mão de seu ego, então será apenas a vontade do todo, a vontade
da existência que estará sendo satisfeita o tempo todo. Está sendo satisfeita
neste momento; não há maneira de alterarmos sua realização. Mas podemos
lutar, podemos nos arruinar, podemos destruir a nós mesmos na esperança de
alterarmos a vontade da existência, a vontade do todo.
Sempre conto a história de dois pedaços de palha que estão se afogando em
um rio caudaloso. Uma das palhas, que está disposta em diagonal na correnteza,
está tentando conter o rio, está gritando que não deixará o rio continuar. Apesar
de as águas do rio continuarem rolando e a palha ser incapaz de controlá-las,
ela continua gritando que o rio será contido: está se gabando de que, quer ela
viva ou morra, o rio será contido.
Mas essa palha continua se afogando. O rio não ouve sua voz e não sabe que a
palha está lutando contra ele. É uma palha muito pequena; o rio não sabe que
ela existe, e ela não faz a menor diferença para ele. Mas para a palha é uma
questão de grande importância. É a maior dificuldade de sua vida. Ela está se
afogando, mas continua lutando, ela chegará ao mesmo lugar que chegaria se
não estivesse lutando. No entanto, como está lutando, esse momento, esse
período será de dor, de pesar, de conflito e ansiedade.
A palha perto dela se soltou. Ela não está indo contra o fluxo; está deitada reta,
na direção em que o rio está correndo — e acredita que está ajudando o rio a
correr. O rio também não conhece a existência dessa palha. A palha pensa que,
como está levando o rio para o mar, o rio vai chegar lá. E o rio desconhece essa
ajuda.
Tudo isso não faz a menor diferença para o rio, mas para as duas palhas trata-
se de um assunto de grande importância. Aquela que está guiando o fluxo do rio
está sentindo uma imensa alegria; está dançando, repleta de prazer. A palha que
está lutando contra o rio está sofrendo muito. Sua dança não é uma dança: é um
pesadelo. Nada mais é do que uma torção de seu corpo, ela está com problemas,
está sendo derrotada; enquanto aquela que está indo com o rio está vencendo.
Um indivíduo é incapaz de fazer qualquer coisa exceto aquilo que seja a vontade
do todo. Mas ele tem a liberdade de lutar, e lutando ele tem a liberdade de ficar
ansioso. Sartre disse algo importante: “O homem está condenado a ser livre”. O
homem está fadado, está condenado, está amaldiçoado a ser livre. No entanto,
o homem pode usar sua liberdade de duas maneiras. Pode usar sua liberdade
contra a vontade da existência e criar um conflito. Nesse caso sua vida será de
pesar, dor e angústia, e por fim ele será derrotado.
Outro indivíduo pode fazer de sua liberdade um objeto de entrega à existência
— e sua vida será uma vida de alegria, uma vida de dança e canção. E qual será
o resultado final? O final não será nada além de uma vitória para ele. A palha
que acredita que está ajudando o rio tem a probabilidade de ser vitoriosa. Ela
não pode ser derrotada. A palha que tenta parar o rio certamente será derrotada.
Ela não pode vencer.
Então é impossível conhecer a vontade da existência, mas certamente é possível
transformar-se em um com a existência. E se esse for o caso, então a vontade
de uma pessoa desaparecerá e apenas a vontade da existência permanecerá.
OSHO,
Nas descobertas científicas existe algo do indivíduo que é contribuído. É
difícil entender como a vontade da existência, do todo, entra na
descoberta científica.
Normalmente, parece que é a vontade do indivíduo que está atuando na
descoberta científica — mas isso não passa de uma impressão superficial. Se
olharmos mais atentamente, isso desaparecerá. Você ficará surpreso ao saber
que as experiências dos grandes cientistas do mundo em relação à ciência são
bem diferentes das idéias criadas nas faculdades e universidades.
Por exemplo, Madame Curie escreveu que certa vez, durante muitos dias, ela
ficou intrigada com um problema. Ela tentou resolvê-lo, mas não conseguiu.
Cansada e chateada, ela acabou desistindo; uma noite, às duas horas da
madrugada ela decidiu esquecer o problema e foi para a cama deixando os
papéis incompletos sobre sua mesa.
Quando Curie acordou de manhã, ela descobriu que o problema incompleto
estava resolvido. As portas estavam trancadas e ninguém havia entrado no
quarto. Mesmo que alguém tivesse entrado na casa, era impossível que um
problema que a Madame Curie não tinha conseguido resolver tivesse sido
solucionado por alguém. Afinal de contas, ela era uma vencedora de Prêmio
Nobel. Só havia empregados na casa, e teria sido um milagre se algum deles
tivesse resolvido o problema.
Mas, sem dúvida o problema havia sido solucionado. Ele havia sido deixado
incompleto, e a outra parte agora estava completa. Ela conferiu todas as portas,
e ainda assim não conseguia acreditar. Ela não podia aceitar a idéia de que
talvez Deus tivesse vindo dos céus. Mas, nenhum Deus havia descido à terra:
quando olhou com mais atenção, descobriu que o resto da caligrafia era dela.
Então ela começou a lembrar que durante a noite tivera um sonho. Lembrou-se
que sonhando ela se levantou e resolveu o problema.
Depois desse dia, isso se tornou uma prática comum para ela — sempre que
encontrava um problema que não conseguia resolver — colocá-lo sob seu
travesseiro e ir dormir. Durante a noite ela se levantava e o resolvia. Durante o
dia, Madame Curie era um indivíduo. À noite, dormindo, o ego desaparece; a
gota encontra o oceano. O problema que sua mente consciente era incapaz de
resolver era resolvido por sua mente inconsciente, que no fundo é unida com o
ser universal.
Certa vez, Arquimedes não conseguia resolver um problema. Ele estava
enrascado, porque o imperador lhe havia pedido que o resolvesse. A reputação
toda de Arquimedes dependia da solução daquele problema; mas ele ficou
exausto e nenhuma solução apareceu. O imperador lhe mandava mensagens
diárias pedindo uma resposta.
Alguém havia presenteado o imperador com um enfeite muito precioso. Mas o
imperador suspeitava estar sendo enganado, e suspeitava que alguma outra
coisa estava misturada com o ouro. O problema era descobrir, sem destruir o
enfeite, se algum outro tipo de metal havia sido usado em sua fabricação.
Naquele tempo não havia maneiras desenvolvidas para se saber uma coisa
dessas. Era um enfeite grande e era possível que seu peso tivesse sido
aumentado com a mistura de alguma outra coisa além de ouro.
Arquimedes ficou cansado e preocupado. Mas, certa manhã, quando ele estava
nu em sua banheira, o problema foi resolvido. Ele se esqueceu de tudo e correu
nu para a rua. Se Arquimedes estivesse presente, ele nunca teria se esquecido
de que estava nu. Ele foi para a rua gritando: — Eureca! Eureca! Consegui!
Consegui! — e correu em direção ao palácio.
As pessoas o seguraram e perguntaram o que ele estava fazendo: — Você ia
aparecer sem roupas na frente do imperador?
Ele respondeu: — Não percebi o que estava fazendo!
O homem que saiu correndo pelado pelas ruas não era Arquimedes. Arquimedes
nunca teria ido nu para fora de sua casa. Pode ser que naquele momento ele
tenha deixado de ser um indivíduo. O problema não foi solucionado na
consciência de um indivíduo; foi resolvido em um estado de inconsciência
impessoal, universal.
Ele estava no banheiro, dentro de sua banheira, relaxando. Um momento de
meditação ocorreu e tomou conta de seu ser... e o problema foi resolvido. A
banheira resolveu o problema que ele não conseguiu resolver? A banheira
poderia mesmo tê-lo resolvido? Ao ficar dentro de uma banheira, é possível
solucionar um problema que não tinha como ser solucionado? A inteligência
aumenta dentro d’água? Como o fato de estar nu resolve algo que não pode ser
resolvido quando estamos vestidos?
Não, alguma outra coisa aconteceu. Por um rápido momento Arquimedes deixou
de ser um indivíduo. Por esse rápido momento ele se tornou um só com o todo.
Se lermos a respeito das experiências de todos os grandes cientistas do mundo,
como Einstein, Max Planck, Eddington, Ediso, descobriremos que eles têm algo
em comum: tudo que descobriram não foi o “eu” que descobriu. O que aconteceu
várias vezes é que o “eu” descobriu alguma coisa, no momento em que o “eu”
não estava presente — e o ato de descobrir aconteceu. Isso é exatamente o que
os sábios dos Upanishads dizem, e o mesmo é dito pelos sábios do Vedas, pelos
muçulmanos e por Jesus.
Quando dizemos que o Vedas não foi criado pelo homem, não quer dizer que
Deus apareceu e escreveu o livro. Não existem razões para dizer algo tão
ridículo. “Não criado pelo homem” simplesmente quer dizer que essa ocorrência
— de colocar os mantras e versos védicos em palavras — aconteceu em um
momento em que a pessoa não estava presente; em um momento em que seu
“eu” não estava lá. Quando tal fenômeno aconteceu, quando as frases dos
Upanishads ocorreram a alguém, quando o Alcorão ocorreu a Mohamed, quando
as frases na Bíblia ocorreram a Jesus, essas pessoas não estavam presentes.
As experiências de religião e ciência não são diferentes. Não podem ser, porque
quando uma verdade é percebida na ciência, a rota para sua percepção é a
mesma que na percepção de uma verdade religiosa. Só existe uma maneira de
a verdade ser revelada: quando o indivíduo não está lá, a verdade surge para o
todo. Um espaço vazio ocorre dentro de nós e a verdade entra nesse espaço
vazio.
Quem já recebeu qualquer raio de verdade neste mundo, independente de qual
forma — seja essa pessoa um músico, um pintor, um poeta, um cientista, um
religioso ou um místico —, só o receberam quando não estavam presentes.
A religião compreendeu isso há muito tempo. A experiência da religião é de dez
mil anos, e com o passar desses dez mil anos, o religioso que procura, o místico
religioso, o religioso que medita, relaxou na experiência de que não sou “eu”
quem percebe a verdade.
É um assunto difícil. Quando pela primeira vez alguma coisa lhe ocorre, vinda do
todo, é muito difícil distinguir se aquilo partiu de você ou do todo. Quando isso
acontece pela primeira vez, a mente sente-se tentada a se gabar; e o ego
também gosta da idéia de ser dele. No entanto, gradualmente, quando essas
afirmações se tornam mais transparentes e você passa a saber que parece não
haver ligação ou relação entre você e a verdade que foi revelada, a distinção
entre você e o todo, o universal, se torna aparente.
A ciência ainda é muito jovem — tem só duzentos ou trezentos anos —, mas
nesse tempo os cientistas ficaram modestos. Há cinquenta anos um cientista
diria: “Nós descobrimos”. Hoje, ele não diz mais isso. Agora, ele diz: “Tudo
parece estar fora de nosso alcance”. O cientista de hoje está falando a mesma
linguagem mística que os místicos do passado falavam.
Não é preciso se apressar — espere mais cem anos e o cientista estará usando
a mesma linguagem que encontramos nos Upanishad. Eles terão de falar a
língua que Buda falava; eles terão de falar o mesmo idioma que Santo Agostinho
e São Francisco falavam. Eles terão de falar esses idiomas porque, conforme
suas experiências com a verdade aumentam, a crença no indivíduo como uma
personalidade diminui. Quanto mais a verdade se revela, mais o ego desaparece
— e um dia o indivíduo percebe que tudo que se soube foi por causa da graça
do todo. “Isso me ocorreu; eu não tenho nada com isso. E eu sou responsável
por tudo que eu não soube, porque eu estava tão presente que não tive como
saber. Eu estava presente de maneira tão sólida que a verdade não conseguiu
aparecer aqui”.
A verdade ocorre a uma mente vazia, e a presença do “eu” só se faz necessária
se a mentira precisa ser percebida.
Não, a vontade do todo, da existência, nunca será um obstáculo às descobertas
científicas. Na verdade, as descobertas que têm sido feitas até agora
aconteceram por meio de uma ligação com o todo, por meio da entrega. A
verdade nunca entrou, e nunca entrará por outro lugar que não seja pela porta
da entrega.
OSHO,
Essa sua frase de que a mente inconsciente é unida ao todo, à existência,
cria algumas confusões. Jung já explicou isso anteriormente relacionando
a mitologia com o inconsciente coletivo. Mas quando Freud diz que o
inconsciente também está ligado ao Satã, só aumenta a confusão.
Freud acredita que nossa mente inconsciente não só está ligada ao divino, como
também com o diabo. Na verdade, Deus e Satã são nossas palavras. Quando
não gostamos de determinada coisa, dizemos que ela está ligada a Satã; e
quando gostamos de alguma coisa, dizemos que ela está ligada a Deus. O que
eu estou dizendo é simplesmente que a mente inconsciente está ligada com o
desconhecido, e para mim o desconhecido é a divindade, e até onde eu sei, Satã
está incluído nessa divindade, não está separado dela.
Na verdade, nossas mentes querem acreditar que o que não gostamos deve ter
sido criado pelo diabo, e o que não é errado ou inconsistente deve ter sido obra
do divino. Acreditamos que estamos no centro da vida, e então tudo que nos
atrai é feito pelo divino, e tudo de que não gostamos é feito pelo diabo: o diabo
é o inimigo. Foi o ego do homem que colocou tanto Satã quanto Deus a seu
serviço.
Nada existe além da divindade. O que chamamos de Satã, ou satânico, não é
nada além de nossa não-aceitação. O que chamamos de “mal” é somente nossa
não-aceitação. Se pudéssemos analisar o que chamamos de mal
descobriríamos imediatamente o bem escondido ali. Se pudéssemos analisar
profundamente o pesar nós encontraríamos a felicidade ali. Se pudéssemos
analisar uma maldição de perto, encontraríamos uma bênção escondida nela.
Na realidade, o bem e o mal são apenas dois lados da mesma moeda.
Não estou me referindo ao desconhecido como o divino no sentido de ele ser o
oposto do mal. A entidade que eu estou chamando de desconhecido é a fonte
de todas as nossas vidas, é a base da existência. É dessa fonte de existência
que tanto Ravana, o símbolo do mal, quanto Rama, o símbolo do bem, surgem.
É dessa fonte de existência que a escuridão e a luz surgem.
Sentimos medo na escuridão, por isso nossas mentes querem acreditar que o
diabo deve ser o criador da escuridão. Como gostamos da luz, nossas mentes
querem acreditar que o divino deve estar criando essa luz. Mas assim, não há
nada ruim na escuridão ou bom na luz.
Aquele que ama a existência encontrará o bem tanto na escuridão quanto na luz.
A realidade é que por causa desse medo que temos da escuridão, nunca somos
capazes de conhecer a beleza da escuridão. Não temos a chance de apreciar o
sabor, o mistério da escuridão. Nosso medo é feito pelo homem. Saímos de
cavernas, passamos pelas selvas... a escuridão era perigosa lá; animais ferozes
podiam nos atacar, a noite era assustadora. É por isso que quando o fogo
apareceu, nós o aceitamos como um deus — porque então a noite tinha se
tornado segura. Afastávamos o medo acendendo uma fogueira. Por isso, em
nossa experiência, a escuridão tem sido associada ao fogo. Em nossos corações
a luz tem sido associada com a falta de medo.
Mas a escuridão e a luz têm seus próprios mistérios. Tudo que acontece nesta
vida que tenha qualquer significado acontece com a cooperação tanto da
escuridão quanto da luz. Nós enterramos a semente na escuridão, mas a flor
surge na luz.
Plantamos a semente na escuridão embaixo da terra, as raízes se espalham
nessa escuridão, mas as flores crescem no céu, na luz. Deixe uma semente na
luz, e a flor nunca aparecerá; enterre uma flor na escuridão, e as sementes nunca
serão criadas. A criança é criada na escuridão profunda do ventre da mãe, onde
não entra sequer um raio de luz. Depois, quando já está formada, surge na luz.
Portanto, tanto a escuridão quanto a luz são a base para a mesma energia de
vida. E a divisão, a polaridade, a contradição da vida são criadas pelo homem.
Freud dizia que a mente inconsciente também está associada ao diabo... Freud
tinha pensamentos judeus. Nasceu em uma família judia; desde pequeno ouviu
muito a respeito do conflito entre Deus e Satã. Os judeus fizeram uma divisão:
um lado pertence a Deus e o outro, a Satã. Na verdade, é uma divisão feita pela
mente humana. Então Freud pensava que sempre que coisas ruins surgiam do
inconsciente, Satã deveria ser responsável por elas.
Não, não existe nada como Satã. Se vemos Satã em algum lugar, estamos
cometendo um grande engano. Uma pessoa religiosa não consegue ver Satã em
lugar algum. Apenas coisas de Deus existem. E o inconsciente — de onde os
cientistas encontram a verdade, ou de onde a pessoa religiosa encontra verdade
— é a porta para as coisas de Deus. Ao avançarmos mais no assunto,
certamente ele será mais compreendido.
Escutando essas palavras de Duryodhana dirigidas a Dronacharya,
o velho mais valente Bheeshma
o mais velho entre os Kauravas,
rugiu como um leão e tocou sua concha
para alegrar o coração de Duryodhana.
Então, conchas e tímpanos,
tambores, bumbos e cornetas
foram tocados ao mesmo tempo
fazendo um som tumultuado.
Com isso,
sentado em sua charrete maravilhosa,
que era levada por cavalos brancos,
Krishna e Arjuna tocaram suas lindas conchas.
Krishna tocou sua concha chamada Panchajanya,
e Arjuna a sua, chamada Devadatta.
Bheema, um realizador de grandes feitos
e um homem de imenso apetite,
tocou sua concha poderosa, Paundra.
O rei Yudhishthira, o filho de Kunti,
tocou sua concha chamada Anantvijaya,
e Nakula e Sahadeva
tocaram as suas, chamadas Sughosha e Manipushpaka.
OSHO,
Uma vez que Krishna toca sua concha em resposta ao som assustador
da concha de Bheeshma, será que o som da concha de Krishna não
poderia ser visto como uma reação e não como uma ação independente?
Essa menção da concha tocada por Krishna e Arjuna no primeiro verso do
Gita quer dizer alguma outra coisa do que uma declaração?
A pergunta é se o som da concha de Krishna é uma reação ao som da concha
de Bheeshma. Não, é apenas uma resposta. O som da concha de Krishna é
apenas uma réplica — não para a guerra ou para a luta, mas apenas como uma
aceitação ao desafio. Seja lá o que esse desafio pudesse trazer, em que esse
desafio pudesse se transformar, aonde esse desafio pudesse chegar, era aceito.
Seria importante entender a natureza dessa aceitação um pouco mais.
A vida é um desafio a cada momento, e aquele que não aceita esse fato está
morto — apesar de ainda estar vivendo! Bernard Shaw costumava dizer que na
verdade as pessoas morrem cedo, apesar de serem enterradas muito tempo
depois. Quase quarenta anos se passam entre suas mortes e seus enterros.
No momento em que uma pessoa deixa de aceitar o desafio da vida, ela morre
— a partir desse momento. Viver significa aceitar os desafios a todo momento.
Mas esse desafio também pode ser aceito de duas maneiras: pode ser com
raiva, e então ela se torna uma reação; ou a aceitação pode ser com felicidade,
prazer e alegria, e então se torna uma resposta.
Devemos perceber que quando Bheeshma entoou sua concha, a descrição diz
que ele o fez com prazer, causando respostas dos outros guerreiros. Uma
grande alegria e exultação se espalharam quando ele entoou sua concha.
Isso é aceitação. Seja lá o que a vida está trazendo... mesmo que seja a guerra,
ela também é aceita. Se a guerra está levando alguém à guerra, essa guerra
também é aceita. Certamente essa ação merece uma resposta.
Consequentemente, Krishna e Pandavas entoam suas respectivas conchas.
Também vale a pena pensar que o primeiro som vem do lado de Kauravas. O
ônus pelo começo da guerra é de Kauravas. Krishna está apenas respondendo;
do lado de Pandavas é apenas uma resposta. Se houver uma guerra, eles estão
prontos para responder a ela — apesar de não terem nenhuma inclinação à
guerra ou coisas do tipo. Os Pandavas também poderiam ter entoado a concha
primeiro. Mas, não, essa responsabilidade grande, a responsabilidade de levar
todos para a guerra, apenas os Kauravas poderiam ter.
O início dessa guerra é muito simbólico. Há outra coisa a ser notada aqui: que é
Krishna quem dá a resposta. Como Bheeshma começou um desafio do lado dos
Kauravas, não parece adequado que Krishna seja quem responda. O adequado
seria que os guerreiros assentados ali participassem da briga para responder.
Krishna estava ali apenas como um cocheiro. Não é um soldado, nem estava ali
para participar na batalha. Era o comandante do exército de Pandavas quem
deveria ter respondido entoando sua concha.
Mas não — e isso é muito significativo —, a resposta foi iniciada com o som da
concha de Krishna. Isso simboliza que os Pandavas consideram essa guerra
como nada mais do que uma responsabilidade imposta a eles pela existência.
Eles estão prontos para a chamada que veio do todo. Estão dispostos a lutar
apenas como instrumentos da existência. É por isso que a aceitação da guerra
foi iniciada por Krishna.
E está certo. Está certo até mesmo enfrentar a derrota enquanto se luta do lado
da existência, e não está certo ser vitorioso quando lutando contra a existência.
Mas para os Pandavas, até mesmo a derrota será uma alegria, até mesmo a
derrota pode ser uma alegria — porque a batalha agora não é mais deles; se for
de alguém, é da existência. Por isso não é uma reação; é uma resposta. Não há
raiva envolvida nisso.
Se Bheema tivesse tocado a concha, teria sido como reação. Se Bheema tivesse
dado a réplica, certamente teria sido por raiva. Como a réplica veio de Krishna,
vem na forma de uma aceitação feliz no sentido de: “Tudo bem, se a vida nos
levou a um ponto onde a guerra se tornou imperativa, então nós nos entregamos
às mãos da existência”.
E então, Oh Senhor da Terra,
o ótimo arqueiro, o rei de Kashi,
o grande arqueiro comandante Shikhandi,
Dhrishtaddumna e o rei Virata,
e o invencível Satyaki, Rei Drupada
e todos os filhos de Draupadi,
e o forte filho de Subhadra,
cada um deles tocou sua concha especial.
E ressoando nos céus
e na terra,
o grande rugido
tomou os corações dos filhos de Dhritarashtra.
E então, Oh Rei,
Arjuna, cuja bandeira trazia a crista de Hanumana,
tendo olhado aos filhos de Dhritarashtra,
armados com suas armas e prontos para atacar,
pegou seu arco
e dirigiu as seguintes palavras a Krishna:
“Oh Ser Infalível,
coloque minha charrete entre os dois exércitos,
para que eu possa ver esses homens com clareza
que estão aqui, ansiosos para lutar,
e saiba quem são eles
que estarão lutando comigo nessa guerra.”
Arjuna está pedindo a Krishna que o deixe ver os homens com quem ele vai lutar.
Há dois ou três pontos aqui que valem a pena ser compreendidos como a última
coisa esta manhã. Todo o resto discutiremos à noite.
Vamos primeiro examinar o pedido de Arjuna para que ele seja levado a um lugar
de onde possa ver aqueles com quem vai brigar. Isso mostra que, para Arjuna,
essa guerra é uma responsabilidade imposta a ele pelo exterior — não é um
chamado vindo de seu próprio interior. É uma obrigação que está sendo forçada
a ele; não é um desejo vindo de dentro. Para Arjuna, essa guerra é algo a que
ele está sendo empurrado; não tem outra opção a não ser lutar. É por isso que
ele está questionando, perguntando com quem ele vai lutar. Ele quer ver quem
eles são — esses homens que querem tanto lutar, que querem tanto uma guerra.
Uma pessoa que quer uma guerra não se importa se seu oponente quer lutar ou
não. Uma pessoa que quer uma guerra é cega. Ela nunca olha para seu inimigo,
apenas projeta seu inimigo. Ela não quer ver seu oponente; na verdade, todas
as pessoas que encontra são inimigos. Ela não precisa ver o inimigo; ela cria,
ela projeta o inimigo.
Quando uma batalha está se formando por dentro, os inimigos aparecem por
fora. Apenas quando não existe guerra uma pessoa sente a necessidade de
investigar quem quer uma guerra e está pronto para ela.
Então Arjuna pede a Krishna que coloque sua charrete em um ponto estratégico
de onde ele possa ver quem está lá, pronto para lutar.
Em segundo lugar, a principal regra da guerra é conhecer bem o inimigo com
quem se vai lutar. Em todas as guerras, em todas as guerras da vida — internas
ou externas — identificar o inimigo, entender o inimigo é a regra principal.
Apenas aqueles que conhecem e entendem bem o inimigo conseguem vencer
as guerras.
É por isso que o provocador não consegue vencer as guerras. Ele está tão
envolto na fumaça de seu próprio desejo por guerra que é difícil para ele
conhecer o inimigo. Sua vontade de entrar na guerra é tanta que ele tem
dificuldade de conhecer e entender o inimigo com quem ele está lutando. E se
você não conhece seu oponente, então está fadado a perder desde o começo.
Assim, a calma e a compostura necessárias em tempo de guerra para se ganhar
a guerra são mais necessárias do que em qualquer outro momento. A
capacidade de testemunhar, necessária no tempo de guerra para ganhar a
guerra, é maior do que em qualquer outra situação. Arjuna está dizendo: “Deixe-
me ver, deixe-me observar do estado de uma vítima aqueles que vieram lutar”.
Isso precisa ser compreendido.
A observação está em seu mínimo quando você está bravo. Quando está com
raiva, a capacidade de observar é quase totalmente perdida. E o fato é que a
capacidade de observar se faz mais necessária quando você está bravo. A ironia
é que se há observação, não há raiva, e vice-versa. As duas não conseguem
estar presentes simultaneamente. Se uma pessoa que está brava fica
interessada em observar, a raiva desaparecerá.
Arjuna não está bravo aqui; é por isso que ele consegue falar sobre observar. O
que ele está dizendo não é motivado pela raiva. É como se a guerra fosse um
assunto à parte para Arjuna. Ela não o afeta de maneira alguma; ele só quer
observar como uma testemunha que foi à luta, que está ansiosa para lutar.
A frase a respeito da observação é muito valiosa. Sempre que uma pessoa vai
a qualquer guerra — seja ela com inimigos internos ou externos — a observação
correta é a primeira coisa a ser seguida. Mesmo que você vá lutar com inimigos
internos, a observação correta é o primeiro passo.
Em primeiro lugar a pessoa deve ver bem com quem ela lutará. Se a briga será
contra a raiva, olhe para a raiva; se vai ser contra o sexo, olhe para o sexo; e se
vai ser contra a ganância, então olhe para a ganância. Mesmo que alguém tenha
de enfrentar uma luta externa, primeiro deve olhar para quem vai ser seu
oponente. Quem é essa pessoa? Uma observação detalhada desse tipo só é
possível quando a pessoa tem a capacidade de ser uma testemunha. Caso
contrário, isso não é possível.
Então, o Gita agora está prestes a começar. O palco está montado. Mas olhando
para esse sutra parece que mesmo a pessoa que ainda não conhece o resto da
história do Gita, mas compreende o que a observação significa, pode muito bem
dizer — simplesmente baseando-se nesse sutra — que será muito difícil para
Arjuna lutar, que ele não será capaz de lutar, que ele certamente terá
dificuldades na luta.
Aquele que está pronto para observar terá dificuldades na luta. Como está
observando, não conseguirá lutar. Para lutar, os olhos da pessoa têm de ficar
fechados, para lutar uma pessoa tem de estar enlouquecida — não pode haver
espaço para nenhuma observação.
Assim, mesmo sem mais conhecimento a respeito do Gita, qualquer um que
entenda o fenômeno da observação pode dizer, olhando para esse sutra, que
esse homem, Arjuna, não é confiável; esse homem não é confiável em relação
à guerra — porque quando olhar, achará tudo sem sentido. Qualquer pessoa
que observar achará tudo tão fútil que sentirá vontade de fugir de tudo.
O que Arjuna está dizendo mostra claramente como estava sua mente. Nessa
frase, ele está mostrando o que se passa em sua cabeça com bastante clareza.
Ele não está dizendo que está ansioso para lutar: “Ó, meu cocheiro, leve-me a
um lugar onde eu possa destruir meus inimigos da melhor maneira”. Arjuna não
está dizendo isso — apesar de esperarem que ele dissesse. Em vez disso, ele
está dizendo: “Leve-me ao lugar onde eu possa ver quem veio para a guerra e
onde eu possa ver quão ansiosos eles estão para essa guerra”. Essa análise de
suas palavras mostra que ele é um homem de reflexão — e um homem de
reflexão tem a possibilidade de cair na indecisão.
Apenas aqueles que não param para pensar como Bheema ou Duryodhana, ou
que estão em um estado de “não-pensamento” como Krishna, podem lutar em
uma guerra. A reflexão, o pensar, é um estágio entre os dois.
Esses são os três estados. A falta de pensamento é um estado anterior ao estado
do pensar. A guerra é uma coisa muito fácil nesse estado. Não é preciso fazer
nada para entrar em uma guerra: um homem com esse estado mental está na
guerra o tempo todo. Mesmo quando esse homem ama, ele se mostra não ser
nada além de uma guerra. Mesmo quando esse homem ama, seu amor não
passa de ódio. Mesmo quando um homem como esse tem uma amizade, ela
não passa de um passo em direção a uma inimizade. Afinal, para ter um inimigo,
uma pessoa tem primeiro de ter um amigo. É difícil ter um inimigo sem ter um
amigo. Por isso, mesmo quando uma mente que não se preocupa em pensar faz
uma amizade, apenas a inimizade pode sair dela. A guerra é uma ocorrência
natural nesse estado.
O segundo estado é aquele de pensar, de refletir. Pensar é sempre indeciso,
está sempre balançando. Arjuna está nesse segundo estágio. Aqui ele está
dizendo: “Deixe-me observar. Deixe-me ver e entender. Então eu posso entrar
na guerra”. Alguém neste mundo já entrou em alguma guerra depois de olhar e
entender? Olhar e entender podem abrir caminho para a fuga da guerra, e não
para o ingresso nela.
Krishna está no terceiro estágio. É o estado do não-pensamento. O pensamento
também está ausente aqui, mas não é um estado de falta de pensamento. A falta
de pensamento e o não-pensamento parecem ser similares, mas há uma
diferença fundamental entre os dois. O homem de não-pensamento é aquele
que, percebendo a futilidade de pensar, foi além dele.
Pensar revela a futilidade de tudo: até mesmo da vida, até mesmo do amor, até
mesmo da família, da riqueza, até mesmo do mundo, até mesmo da guerra. Mas
se uma pessoa continua pensando, então, no final, esse pensamento mostra a
futilidade de pensar. E é nesse ponto que a pessoa entra no estado de não-
pensamento. Então, nesse estado de não-pensamento tudo se torna possível
para essa pessoa — da mesma maneira que é para a pessoa com falta de
pensamento. Mas a qualidade dessa pessoa e de suas ações é diferente. Ela é
como uma criança pequena.
Quando alguém se prende à santidade na idade avançada, ela volta a ser como
uma criança. No entanto, a semelhança entre a santidade e a criança existe
apenas por fora. Os olhos de um sábio se tornam tão inocentes quanto os de
uma criança, mas em uma criança tudo ainda está parado, ainda está para se
manifestar. Assim, uma criança é um vulcão: ainda não explodiu, mas essa é a
única diferença. Sua inocência é superficial: por baixo, tudo está ficando pronto
para explodir. As sementes estão germinando por dentro: estão brotando. Sexo,
raiva e inimizade — tudo aparecerá com o tempo. Agora, tudo está sendo
preparado. Uma criança é uma bomba-relógio: vai demorar um pouco e depois
vai explodir.
Mas um sábio foi além de tudo isso. Todas aquelas sementes que deveriam
brotar dentro dele, brotaram, e ao se mostrarem fúteis, foram abandonadas.
Agora não resta nada por dentro: seus olhos voltaram a ficar inocentes; tudo se
tornou puro novamente.
Alguém perguntou a Jesus quem herdaria seu reino do céu. Ele respondeu:
“Aqueles que são como as crianças”. Jesus não disse aqueles que forem
crianças — porque as crianças não podem herdar. Ele disse aqueles que são
como as crianças, não aqueles que são crianças. Então uma coisa está clara:
aqueles que não são crianças, mas que são como as crianças poderão herdar.
Se as crianças pudessem entrar no céu, então não haveria problema: todos
entrariam. Não, as crianças não podem entrar; apenas aqueles que são como
as crianças, que têm transcendido, podem entrar.
Então existe uma grande semelhança entre um homem ignorante e um homem
de compreensão suprema. O homem de compreensão suprema torna-se tão
simples quanto um ignorante. No entanto, por dentro da simplicidade do
ignorante, uma complexidade ainda está escondida, que pode se manifestar a
qualquer momento. O homem de suprema compreensão é aquele que perdeu
toda a complexidade.
A pessoa com falta de pensamento ainda pode pensar. Um dia ela pensará: o
poder do pensamento ainda está dentro dela. Mas aquele que atingiu o ponto de
não-pensamento transcendeu aos pensamentos: entrou na meditação, entrou no
samadhi, na meditação suprema.
É esse o problema que vai se apresentar ao longo do Gita. É o conflito interno
que se manifestará por meio do Gita. Arjuna pode entrar na guerra apenas de
duas maneiras: pode ter a falta de pensamento e entrar, ficando onde
Duryodhana e Bheema estão, ou pode ir ao ponto onde Krishna está em pé e se
tornar um homem de não-pensamento. Então ele pode entrar na guerra.
Mas se Arjuna permanecer como está — indeciso, preso ao pensamento — ele
irá à floresta, não vai à guerra. Ele vai escapar, vai fugir.
Discutiremos o restante à noite.
2
As Raízes da Violência
“Eu gostaria de ver aqueles que estão aqui, prontos para lutar, e
esperando que o filho perverso de Dhritarashtra apareça.”
Sanjay:
Assim, guiado por Arjuna, Krishna posicionou
sua suprema charrete entre os dois exércitos
bem de frente a Bheeshma, Drona e os outros dominadores, e disse:
“Veja, Arjuna, esses Kurus posicionados aqui.”
Assim Arjuna viu os tios, os avôs e mestres,
tios por parte de mãe, irmãos, filhos, e netos,
assim como compadres, posicionados ali.
Também sogros e amigos nos dois exércitos.
Vendo todos aqueles conhecidos prontos, Arjuna
superou sua piedade, e disse as seguintes palavras com grande angústia:
“Ó Krishna, vendo meus próprios homens diante de mim, prontos para
lutar,
“Meus membros perdem a força, minha boca fica seca, meu corpo treme,
e com esse terrível sentimento de medo os pêlos de meu corpo se
arrepiam.
“Meu arco, Gandiva, escorrega de minha mão; minha pele arde.
Não consigo ficar em pé. Minha mente parece confusa.
“Oh Krishna, vejo que todos os presságios se opõem a isso,
e eu não vejo nenhuma virtude em matar minha própria gente em batalha.
“Não desejo vencer, Ó Krishna,
nem pelo reino, nem pelos seus prazeres.
De que, Ó Krishna, os prazeres desse reino nos servirão,
ou mesmo a vida?”
Arjuna não é obcecado pela guerra, mas também não é contra ela. E não tem
aversão à violência. Na verdade, toda a educação e todo o treinamento, todo o
seu condicionamento adquirido ao longo da vida são para a violência e para a
guerra.
Mas vale a pena entender que quanto mais violenta for a mente, mais cheia de
envolvimento ela será. A violência e o envolvimento vivem juntos, lado a lado.
Uma mente não violenta transcende as fixações. Na verdade, a pessoa que
deseja não ser violenta tem de abandonar a idéia do envolvimento. A simples
idéia de “meu” é violenta, porque assim que eu digo “meu”, eu começo a me
separar do que não é meu. Assim que me refiro a alguém como um amigo,
comecei a tornar alguém meu inimigo. Assim que passo uma linha ao redor
daqueles que são meus, também desenho uma linha ao redor daqueles que são
desconhecidos.
Toda violência é um resultado da limitação criada entre aqueles que são “meus”
e aqueles que são de fora, “não meus”.
É por isso que Arjuna de repente ficou fraco, incapaz. Todos os seus membros
falharam: não porque ele repentinamente se tornou avesso à guerra ou porque
descobriu alguma coisa errada com a violência que estava prestes a ocorrer, ou
porque um pensamento de não-violência repentinamente tomou conta de sua
mente. Arjuna ficou fraco porque por um momento sua mente foi agarrada pelo
outro lado, pelo lado oposto da violência; por seu componente muito mais
profundo, por sua base fundamental. Sua mente foi tomada pelo sentimento de
posse, de envolvimento.
A posse, o envolvimento, não passam de violência. Será difícil entender o papel
do Gita sem entender isso primeiro. Para aqueles que não conseguem entender
esse ponto, parece que Arjuna estava realmente se inclinando à não-violência e
que Krishna o forçou à violência. Se uma pessoa estivesse inclinada a não ser
violenta, Krishna nunca a forçaria a ser violenta. Na verdade, mesmo que Krishna
quisesse fazer isso, não conseguiria.
A situação aqui é que Arjuna não está nem um milímetro propenso à não-
violência. A mente dele se moveu e está presa no ponto fundamental da
violência. A posse nada mais é que a base da violência.
Arjuna viu sua gente — seus entes queridos, seus parentes. Se eles não fossem
seus entes queridos e parentes, Arjuna os teria assassinado como se fossem
animais — mas ele teve dificuldades para fazer isso porque aquela era sua
própria gente. Se eles lhe fossem estranhos, ele não teria o menor problema em
cortá-los em pedacinhos.
A não-violência só pode nascer na consciência de uma pessoa que tenha
ultrapassado o sentimento de “meu” e “seu”. A razão por trás da mente confusa
de Arjuna não é que ele tenha sido atraído pela não-violência, mas sim que ele
tocou a base da violência.
É natural que a base, a pedra fundamental da violência apareça em um momento
de crise. Se os inimigos lhe fossem estranhos, Arjuna sequer teria percebido que
era uma pessoa violenta e que estava fazendo algo errado ao matá-los. Ele
nunca teria sentido que a guerra era contra a religiosidade. Seus membros não
teriam enfraquecido; pelo contrário, ao ver aqueles inimigos, seus membros
teriam ficado ainda mais fortes. Sua flecha teria sido posicionada no arco, suas
mãos teriam agarrado a espada — ele teria ficado extasiado, feliz.
Mas, naquele momento, Arjuna ficou totalmente triste, e nesse estado de tristeza
ele encontrou a verdadeira base da violência que existia dentro dele. O que ele
viu no momento da crise foi a posse.
É surpreendente o fato de só conseguirmos enxergar as profundezas de nossas
mentes nos momentos de crise. Não vemos essas profundezas nos momentos
comuns. Nos momentos comuns vivemos de modo comum. É apenas nos
momentos extraordinários que o que está escondido na parte mais profunda de
nossos seres começa a se manifestar.
Arjuna viu “minha gente”. Naquela situação horrorosa de guerra, naquela
urgência da guerra — quando o combate estava prestes a começar — ele vê
“minha gente”. Se Arjuna tivesse dito: “A guerra é inútil, a violência é inútil”, o
livro Gita nunca teria surgido. Mas Arjuna diz o seguinte: “Nossa própria gente
está pronta para lutar e meus membros perdem a força quando penso em matá-
los”. Na verdade, é natural que uma pessoa que construiu sua vida na base da
possessividade perca a força ao pensar em matar as pessoas que conhece.
Uma morte ocorre em nosso bairro, mas não toca os corações das pessoas. As
pessoas simplesmente dizem: “O pobre homem morreu”. Somos incapazes de
esquecer com tanta facilidade quando o mesmo acontece em nossos lares,
quando um “dos nossos” morre, nós também morremos, uma parte de nós morre.
Nós tínhamos um investimento nessa pessoa que morreu, nós ganhávamos
alguma coisa com a vida dessa pessoa. Essa pessoa ocupava um certo espaço
em nossos corações.
Por isso, quando uma esposa morre, não é apenas a esposa que morre. Alguma
coisa no marido também falece. A verdade é que o marido passou a existir
quando a esposa passou a existir. Antes disso não havia um marido e uma
esposa. Quando um filho morre, algo na mãe também morre — porque a mulher
só se tornou mãe no nascimento de seu filho. Com o nascimento de um filho, a
mãe também nasce, e quando um filho morre, a mãe também morre. Nós
estamos ligados àquela pessoa que chamamos de nossa. Quando essa pessoa
morre, também morremos.
Não é de surpreender que quando Arjuna viu sua própria gente se preparando
para a guerra, ele tenha tido a sensação de estar cometendo suicídio. Não é a
idéia da morte dos outros o que choca Arjuna. É a idéia de sua própria morte, a
possibilidade de uma experiência suicida, que o deixou trêmulo. Ele sentiu:
“Onde ficarei se a minha gente morrer?”.
Vale a pena pensar um pouco nisso.
Nosso “eu” nada mais é do que um nome da soma total que chamamos de “nossa
gente”. O que chamamos de “eu” é o nome para todos os acúmulos de “meu”.
Se todos aqueles que são “meus” forem embora, então eu não existirei mais,
não vou conseguir permanecer. Esse meu “eu” está envolvido em parte com meu
pai, em parte com minha mãe, em parte com meu filho, em parte com meu
amigo... com todas essas pessoas.
Mais surpreendente ainda é que esse “eu” não está relacionado apenas com
aqueles que chamamos de nossos, mas também com aqueles a quem
consideramos desconhecidos e “não-meus”. Apesar de esse envolvimento não
ser de nosso círculo, mesmo assim existe. Por isso, quando meu inimigo morre,
eu também morro um pouco, porque não vou conseguir ser exatamente o mesmo
que eu era enquanto meu inimigo estava vivo. Até mesmo meu inimigo contribui
com algo em minha vida. Ele era meu inimigo. Podia ser um inimigo, mas era
meu inimigo. Meu “eu” estava relacionado com ele também: sem ele eu serei
incompleto.
Se Arjuna tivesse encontrado outras pessoas com quem teria de guerrear e a
quem teria de assassinar, o caso seria bem diferente. Mas o que ele viu, no
fundo, foi: “Na verdade, não vou matar ninguém além de mim mesmo. Seria
suicídio. Qual seria a razão em continuar vivendo se todos os ‘meus’
morressem? Mesmo que eu ganhasse tudo, nada teria o menor valor se nenhum
dos ‘meus’ estivesse vivo”.
Isso vale a pena ser analisado mais profundamente. Tudo que acumulamos é
menos para nós mesmos do que para aqueles que chamamos de “nossos”. A
casa que construímos é menos para nós mesmos do que para aqueles que
chamamos de “nossos” — para os “nossos” que viverão nela, pelos “nossos” que
vão admirá-la e elogiá-la — e para os “nossos” e os “outros” que ficarão cheios
de inveja e que queimarão de inveja. Mesmo que a mais bela mansão do mundo
seja minha, e nenhum dos “meus” esteja por perto para vê-la — seja como
amigos ou inimigos —, vou descobrir que essa mansão vale menos que uma
cabana. Isso porque a mansão é apenas uma fachada: na verdade ela é apenas
uma maneira de eu impressionar os “meus” e aqueles que não são os meus. Se
ninguém estiver por perto, quem eu vou impressionar?
As roupas que você usa são mais para impressionar os olhos dos outros do que
para cobrir seu corpo. Tudo perde o sentido quando estamos sozinhos.
Descemos de tronos com muito menos prazer do que sentimos quando subimos
neles — ninguém sentiu prazer por apenas ocupar o lugar em um trono —, do
que pelo bem de todo o carisma que você é capaz de gerar entre “os seus” e
pelos “outros” quando está no trono. Você permanece sentado no trono, mas se
todas as pessoas perto dele desaparecerem, você perceberá que ficar sentado
no trono perdeu a graça. Vai descer dele e talvez nunca mais volte a ocupá-lo.
Naquele momento, Arjuna sentiu: “Essa é minha gente que se encontra dos dois
lados. É a minha própria gente que vai morrer — então para que serve a vitória?”.
A vitória nunca é desejada simplesmente para vencer. O verdadeiro interesse da
vitória dá-se na realização pessoal que ela nos dá entre os “nossos”, assim como
entre os “outros”. “Posso ganhar o império todo, mas qual será a vantagem?”
Não vai ter o menor valor.
A angústia que tomou conta da mente de Arjuna deve ser compreendida
corretamente. Essa angústia é o produto de uma mente violenta. E foi por causa
dessa angústia que Krishna teve de dar a Arjuna tantos empurrões. Se uma
pessoa como Mahavira estivesse na situação de Arjuna, o assunto teria sido
encerrado ali mesmo: não seria prolongado nem um minuto mais. Se tivesse
acontecido com alguém como Mahavira, talvez tal situação nunca tivesse se
formado. Talvez Krishna não dissesse nada a uma pessoa como Mahavira —
não faria sentido. O assunto todo seria encerrado sem que nada precisasse ser
dito.
A verdade é que o Gita é menos sobre o que Krishna disse e mais sobre o que
Arjuna fez Krishna dizer. Seu verdadeiro autor é Arjuna, e não Krishna. O estado
da mente de Arjuna se tornou a base do Gita. E está muito claro a Krishna que
um homem violento alcançou o topo filosófico de sua violência, e na raiz de toda
a sua conversa sobre fugir da violência está a mente violenta.
O dilema de Arjuna não é o dilema de um homem não violento tentando fugir da
violência. O dilema de Arjuna não é o dilema de um homem violento tentando
fugir da violência. Essa verdade precisa ser compreendida.
A possessividade não passa de violência. É uma violência mais profunda. No
momento em que eu chamo alguém de “meu”, a possessividade tem início. A
possessividade é uma forma de violência. O marido chama a esposa de “minha”;
a possessividade começou. A esposa chama o marido de “meu”; a
possessividade começou. Mas quando nos tornamos donos de alguém,
estragamos ali mesmo a alma dessa pessoa. Acabamos de matá-la; destruímos
a pessoa assim que dizemos ser donos dela.
Na verdade, ao possuirmos uma pessoa, a estamos tratando como um objeto, e
não como um indivíduo. Então uma esposa se torna “minha” da mesma maneira
que uma casa é minha. Naturalmente, sempre que existe a relação de “meu”, o
amor não é o resultado. O que se manifesta é apenas o conflito.
É por isso que neste mundo, enquanto um marido e uma esposa ou um pai e um
filho continuarem acreditando que são donos um do outro, apenas o conflito pode
existir entre eles — e nunca a amizade. A afirmação de tal posse é a causa da
destruição da amizade. Tal afirmação de posse estraga tudo, torna tudo violento.
Quando existe a afirmação de posse, apenas o ódio é criado; e onde há ódio, a
violência está fadada a aparecer. É por isso que todos os nossos
relacionamentos se tornaram relações de violência. Nossas famílias se tornaram
relações de violência.
Então, aqui, ver onde ele próprio estaria se toda a sua gente fosse destruída, ver
a futilidade de ser vitorioso — de ter o reino e tudo que viesse com ele, mas com
sua própria gente aniquilada — não tornou Arjuna uma pessoa não violenta.
Se isso tivesse acontecido, Krishna o teria abençoado e pedido para que fosse
embora, e o assunto teria se encerrado. Mas, como ele está falando em termos
de “eu” e “meu”, Krishna sabe que Arjuna é um homem totalmente violento, e
que sua conversa a respeito da não-violência é pura falsidade.
Se alguém fala com termos de “eu” e em favor da não-violência, saiba que essa
não-violência é falsa — porque a flor da não-violência nunca nasce no solo do
“eu” e do “meu”. Uma vida sem violência nunca se desenvolve a partir da base
do “meu”.
OSHO,
Arjuna foi ao campo de batalha, viu seus parentes, professores e amigos
e ficou cheio de pesar. Ele sentiu uma angústia... sua mente era violenta.
Ao mesmo tempo, Duryodhana, Yudhishthira, Dronacharya e muitos
outros cujos parentes e amigos estavam lá e cujas mentes estavam
repletas de violência e posse estavam no campo de batalha, também. Por
que, então, apenas Arjuna sentiu essa angústia?
Isso é verdade. Duryodhana certamente estava lá, assim como os outros
guerreiros — então por que eles não sentiram angústia? Eles também estavam
tomados pelo sentimento de “meu”, também estavam repletos de violência, mas
não sentiram angústia.
Existe uma razão para isso. A violência pode ser cega e impensada. Mas a
violência também pode ter olhos e pode ser pensativa, assim como o sentimento
de posse.
Como eu disse essa manhã, o problema de Arjuna é que ele pensa. É um homem
racional. Pensar nos coloca em um dilema, e foi pensar o que colocou Arjuna em
um dilema. Duryodhana também pode ver, mas a violência dentro dele é tão
cegante que ele é incapaz de perceber que se entregando à violência ele
destruirá todos aqueles que, ausentes, farão com que o resultado de sua
violência perca o sentido. Em sua cegueira não consegue ver esse fato.
Arjuna não é tão cego. E é por isso que ele é especial, único, nesse campo de
batalha. Ele é especial, pois apesar de sua preparação e criação terem sido as
mesmas de Duryodhana, a preparação de sua mente é diferente. Ele tem uma
mente capaz de pensar e duvidar. Ele pode duvidar, pode questionar e levantar
questões. Ele tem as chaves fundamentais do questionamento.
E nossas maiores perguntas não são aquelas que fazemos a respeito do
universo. Nossas maiores questões são aquelas nas quais perguntamos quem
criou o universo. Nossas maiores perguntas não são aquelas que envolvem
saber se Deus existe ou não. Nossas maiores questões são aquelas que nascem
de nosso conflito interno, de nosso dilema mental. Mas é preciso pensar, refletir
e contemplar para vermos os conflitos e dilemas de nossa própria mente.
Arjuna é capaz de pensar, é capaz de ver a violência que vai cometer ao matar
aquelas pessoas, algo que não teria justificativa para a aplicação da violência.
Arjuna não é cego, e esse fato é sua aflição e bênção, ao mesmo tempo.
É bom que entendamos isso.
Arjuna não é cego: esse é seu problema. Duryodhana não tem problemas — a
guerra é uma paixão para ele. Para Arjuna, a guerra se tornou uma crise e uma
aflição, que de modo diferente também lhe é uma bênção. Se ele conseguir
superar essa crise, ele entrará em um estado de não-pensar. Se conseguir
superar essa crise, vai chegar ao ponto de se entregar ao todo. Se conseguir
superar essa crise, vai chegar ao ponto de renunciar a essa posse. Mas se não
conseguir superar essa crise, então essa guerra será uma terrível crise para ele
e o transformará em um esquizofrênico. Nesse caso, ou ele vai fugir ou vai lutar
sem querer, e ser derrotado.
Uma batalha que é enfrentada com relutância está fadada à derrota — porque
lutar relutantemente quer dizer que metade da mente está fugindo enquanto a
outra metade está envolvida na briga. Para aquele que está indo em duas
direções dentro de si mesmo, a derrota é certa. Então Duryodhana será o
vencedor, porque estará lutando com uma mente sem divisões. Apesar de estar
caindo em um buraco, o faz com a mente decidida; apesar de estar adentrando
a escuridão, ele o faz com a mente decidida.
Na verdade, apenas dois tipos de pessoa conseguem entrar na escuridão com
a mente decidida. Um é o cego — porque não há diferença para ele se existe luz
ou não — e o outro é quem tem a luz de consciência — porque então sua própria
existência afastará a escuridão.
Arjuna deveria se tornar como Duryodhana, indo do pensar à irracionalidade, e
ir para a guerra, ou se tornar como Krishna, e sair do pensar para o não-pensar
— tornando-se tão iluminado e tão repleto de força interior que ele possa dizer
frases como “ninguém morre, ninguém é morto”.
Só então ele poderá ver que todas essas coisas acontecendo ao seu redor são
mais que um sonho.
Então ou ele pode entrar na guerra vendo uma grande verdade de tamanha
imensidão como essa, ou ele pode entrar na guerra submetendo-se a uma
grande mentira, de que ele alcançará a felicidade matando as pessoas que estão
na guerra.
Arjuna pode se livrar da ansiedade submetendo-se à mentira de Duryodhana ou
assumindo a verdade de Krishna. Então Arjuna é uma tensão.
Nietzsche disse, em algum momento, que o homem é uma ponte, um elo ligando
duas costas diferentes. Ele é uma tensão. Ou ele se torna um animal e encontra
o prazer, ou pode se tornar divino e ter alegria. Mas, enquanto continuar sendo
um ser humano, não poderá ter nem prazer nem alegria — pode simplesmente
se dividir entre os dois; permanecerá repleto de ansiedade e tensão.
É por isso que fazemos as duas coisas na vida. Bebemos e nos transformamos
em animais. Isso nos dá um pouco de prazer. O sexo dá um pouco de prazer —
voltamos para o estado animal. Encontramos prazer na irracionalidade. A
principal razão pelas quais as pessoas gostam tanto de álcool é porque ele as
ajuda a se tornarem animais novamente. Nós nos colocamos no mesmo patamar
dos animais quando nos embriagamos. Nesse patamar nos transformamos em
animais livres, porque os animais não têm preocupações.
Nenhum animal fica maluco, exceto aqueles que trabalham em circos, porque os
animais de circo chegam muito próximos ao estado do homem. E o homem está
muito próximo ao estado de um animal de circo.
Nenhum animal é maluco; nenhum animal enfrenta problemas como psicose,
preocupação, ou uma doença como a insônia. Nenhum animal se suicida —
porque para se cometer suicídio é preciso que muita ansiedade se acumule.
É interessante o fato de nenhum animal sentir tédio. Um búfalo mastiga a mesma
grama o dia todo e não se sente entediado. Não há como ele ficar entediado,
pois um estado de racionalidade se faz preciso para que haja o tédio. É por isso
que, entre os seres humanos, quanto mais racional uma pessoa é, mais
entediada ela se sente. Quanto mais racional uma pessoa é, mais preocupada
ela se torna. As pessoas mais racionais facilmente podem se tornar loucas ou
malucas. Mas esse é apenas um lado.
O outro lado é que a pessoa que consegue transcender o estado de insanidade
potencial pode se tornar livre, e aquela que consegue transcender o estado de
ansiedade consegue se ligar a um estado alegre e consciente — estado livre. E
a pessoa que consegue ir além da tensão consegue obter uma experiência de
relaxamento que acontece apenas ao relaxar na divindade, no todo.
Arjuna é o símbolo do homem, Duryodhana é o símbolo do animal, e Krishna é
o símbolo da divindade. Assim existem três símbolos no campo de batalha.
Arjuna não está parado; está em um estado trêmulo que se encontra entre os
estados de Duryodhana e Krishna. Ele pode alcançar a liberdade; pode se sentir
confortável se se tornar um Duryodhana ou um Krishna. Isso não será possível
enquanto ele permanecer um Arjuna. Ao permanecer um Arjuna, existe a tensão,
existe a dificuldade. Sua dificuldade é exatamente esta: ele não pode se tornar
Duryodhana, e não consegue se tornar Krishna. E, ao mesmo tempo, não pode
continuar sendo quem é, pois é um estado efêmero: não é possível ser assim
por muito tempo.
Nenhuma ponte deve ser feita dentro de uma casa.
Quando Akbar construiu Fatehpur Sikri, ele escreveu em uma ponte: “Uma ponte
deve servir de passagem, não de moradia”. Isso é verdade. Qualquer pessoa
que faça de uma ponte a sua casa, terá dificuldades.
Uma pessoa pode voltar a um desses dois estados: pode se tornar um animal
ou pode se tornar divino. Mas uma coisa é certa: permanecer um ser humano
não é o destino do homem. Ser um ser humano é estar em crise. O homem não
é o fim. Que fique claro que o homem não é animal, nem divino. Ele não é capaz
de ser animal, pois já passou desse estágio, e não é divino porque ainda não
chegou tão longe. O homem é simplesmente uma existência entre o divino e o
animal.
Nós tocamos essas extremidades muitas vezes ao longo do dia. Na raiva, uma
pessoa toca o animal, na paz, ela toca a divindade.
Durante essas vinte e quatro horas nós passamos diversas vezes entre o céu e
o inferno, muitas vezes. Em um momento estamos no céu, e no seguinte, no
inferno. Quando estamos no inferno, tentamos subir ao céu. Assim que
chegamos ao céu, começamos a descer de volta para o inferno. A tensão, por
sua própria natureza, cria uma atração ao oposto.
Peguemos como exemplo o pêndulo de um relógio. Quando ele vai para a
esquerda, parece que ele só vai para a esquerda. Mas aqueles que entendem
de ciência sabem que enquanto o pêndulo vai para a esquerda, ele está juntando
o momentum para ir para a direita. Está juntando energia para ir tão longe à
direita quanto foi para a esquerda. Na verdade, só vai para a esquerda para
poder ir para a direita, e só está indo para a direita para poder ir para a esquerda.
O homem constantemente se move como um pêndulo entre o animal e o divino.
Arjuna é o símbolo do homem — principalmente do homem de hoje. A
consciência do homem moderno é exatamente como a consciência de Arjuna. É
por isso que as duas coisas são simultaneamente evidentes no mundo de hoje.
Por um lado o homem está disposto a elevar sua consciência a samadhi, à
superconsciência, e por outro, ele está disposto a levá-la ao nível animal com a
ajuda de LSD, mescalina, maconha, álcool e sexo. Geralmente, a mesma pessoa
parece estar fazendo as duas coisas. A pessoa que vai à Índia à procura de
espiritualidade continuará fazendo uso de LSD nos Estados Unidos. Ela faz as
duas coisas simultaneamente.
Em seu estado inconsciente o homem pode se tornar um animal. No entanto,
não é possível manter-se inconsciente por muito tempo — porque mesmo os
prazeres do inconsciente são experimentados apenas no estado consciente.
Nem mesmo os prazeres do inconsciente são experimentados no estado
inconsciente. O prazer da bebida não é sentido quando uma pessoa está
embriagada; ela só o sente quando fica sóbria. Quando está dormindo, não
percebe o prazer de dormir; só depois que acorda de manhã é que reconhece
como seu sono foi bonito e relaxante. Para sentir o prazer do inconsciente é
preciso voltar ao estado consciente.
Arjuna representa a consciência humana, e é por isso que ele é tão especial. E
o Gita é tão especial porque ilustra a base do estado mais profundo da mente do
homem: a constante luta de Krishna com esse estado, que é representada em
Arjuna; esse diálogo, esse debate que Krishna está tendo com Arjuna; os
enormes esforços de Krishna para direcionar Arjuna novamente ao divino — e
os membros de Arjuna constantemente falhando, enquanto ele volta ao estado
animal... Essa luta interna é um fardo para Arjuna, mas não para Duryodhana.
Duryodhana não se importa com nada no mundo. Se Arjuna fosse como
Duryodhana, ele também não se importaria com nada no mundo. Mas eles não
são iguais.
Existem aqueles contra nós que, como Duryodhana, não se importam com nada.
Eles estão construindo casas, estão assumindo os tronos de Delhi e outras
capitais, estão ocupados ganhando dinheiro. Mas aqueles que são como Arjuna
não têm descanso e são preocupados. Sem descanso, porque onde estão não
parece um bom lugar para se fazer uma casa. Eles evoluíram muito de onde
começaram, por isso não é possível regredir, mas eles nada sabem sobre o lugar
que ainda não alcançaram. Como eles chegam lá, onde o templo sagrado está?
Eles não têm a menor idéia em relação a isso.
Um homem de religiosidade inevitavelmente vai se encontrar em uma crise. Um
homem não religioso não se sente em crise. Em comparação com um homem
sentado em uma prisão, um homem sentado em um trono parece mais
preocupado. O homem sentado na prisão aparenta menos preocupação; ele não
tem nada com que se importe no mundo. Ele está de um lado, na costa. Não
está na ponte. De certa maneira, ele pode parecer sortudo, de causar inveja. Ele
é tão livre! Mas escondido nessa sorte dele existe um azar profundo. Ele
permanecerá em sua margem. Nem uma faísca de humanidade nasceu nele
ainda. O problema, a angústia começa com o ser humano — pois nesse estado
de ser humano as portas da possibilidade de alcançar a divindade se abrem.
Arjuna não quer se tornar um animal — e essa situação poderia torná-lo um
animal —, mas ele não faz a menor idéia sobre como se apegar à divindade. É
por isso que ele está perguntando e levantando questões; é por isso que sua
procura está surgindo.
A religiosidade pode nascer em qualquer pessoa que tenha perguntas em sua
vida, que tenha procuras, um descontentamento. A religiosidade não tem a
possibilidade de entrar na vida de alguém cuja vida não tenha ansiedade,
perguntas, dúvidas, questionamentos ou descontentamentos.
A semente que está se abrindo para poder germinar certamente sentirá
ansiedade. A semente é algo duro, o broto é muito delicado; a semente é muito
livre, o broto enfrenta grande ansiedade. Passando pelas pedras, rompendo o
solo, uma coisa tão delicada como o broto sai para um mundo desconhecido e
nada familiar, um mundo com o qual não está acostumado. Uma criança pode
arrancá-lo, um animal pode comê-lo, qualquer pessoa pode pisar nele. O que
acontecerá ou não a um broto... nada é certo a respeito disso. Por outro lado, se
a semente se mantiver fechada, ela estará completamente segura e protegida,
livre — sem perigos desconhecidos. Fechada em si mesma.
Duryodhana é como uma semente fechada, sem se importar com nada; Arjuna
é como um broto, preocupado, sem descanso. Ele é ansioso para saber o que
vai acontecer daqui a pouco: as flores virão ou não? Ele deixou de ser apenas
uma semente, mas será que as flores aparecerão agora? Ele está ansioso para
crescer, ansioso para florescer e é essa ânsia que faz com que ele pergunte
coisas a Krishna o tempo todo. Portanto, existe ansiedade e perguntas na mente
de Arjuna — mas não na mente de Duryodhana.
OSHO,
Como o homem está sempre enfrentando dilemas interiores, qual deveria
ser sua base para superá-los? Como podemos transformar esse estado
de dilema interior em crescimento? E qual deveria ser o fator principal e
fundamental quando procuramos a resolução de um dilema interior?
Arjuna está enfrentando a mesma questão, e ele também quer resolvê-la da
maneira com que todos os homens geralmente fazem. Estar em um dilema é a
natureza do homem — não da alma, não do corpo, mas do homem.
Se uma pessoa tenta resolver esse dilema de forma drástica, ela volta ao estado
animal. Leva a pessoa para trás. É um caminho familiar: é fácil de voltar. Passar
pelo estado de conflito interior é uma disciplina verdadeira para o
autocrescimento. Passar com paciência por um estágio de conflito interior é um
ascetismo verdadeiro, apenas superando esse dilema uma pessoa pode
transcendê-lo. Por isso, se alguém toma uma decisão drástica, uma decisão
drástica apenas para evitar o dilema interior, esse tipo de decisão não ajudará.
Ela vai falhar, vai regredir.
Os animais são muito definidos; não têm dúvidas. Vivem na certeza, são muito
confiantes. Parecem ser grandes crentes! Mas a crença deles não é um teísmo
real — pois, a menos que uma pessoa tenha conhecido o ateísmo primeiro, o
teísmo não faz sentido. Quem nunca sentiu a dor de dizer “não” não pode
alcançar a alegria de dizer “sim”. A confiança de alguém que nunca duvidou não
tem valor. Mas alguém que duvidou, que passou por sua dúvida e a transcendeu
— isso por si só tem um pouco de força, um pouco de autenticidade.
Uma maneira é tomar uma decisão drástica, dar uma resolução drástica — e o
homem usa muitos meios para chegar a tal decisão. Se ele pegar alguma
escritura, a decisão, a resposta, estará lá. A escritura lhe dirá, de forma bastante
clara, para fazer isso e aquilo, e para ter fé. Mas a pessoa que chega a uma
decisão lançando mão das escrituras, nega a si mesma o direito de ser humano.
Ela teve uma oportunidade de evoluir, mas a rejeitou. Ou a pessoa pode recorrer
a algum professor ou guru. Mas quem faz isso está perdendo a oportunidade de
crescer. Houve uma crise, a vida ofereceu a ela a oportunidade de atravessá-la
sozinho, sem ajuda — mas a pessoa se poupou do transtorno. Seguiu adiante
sem passar pela crise.
Se tivesse passado pelo incêndio, teria saído iluminado. Mas essa pessoa nunca
passou pelo fogo. Em vez disso, ela se protegeu atrás de um guru. Naturalmente,
o ouro não se purificou sozinho.
Não estou lhe pedindo para tomar uma decisão. Como pode chegar a uma
decisão? A resposta de alguém que esteja com um problema certamente será
repleta de conflito interno, também. Como você pode perceber se está com um
problema? Uma pessoa cheia de conflito interno não consegue encontrar uma
resolução — e nem deveria.
Viva o dilema, passe pelo calor e pelo sofrimento dele, morra e seja consumido
por ele, sinta-o. Não fuja do fogo, porque o que está se manifestando como fogo
queimará toda a sujeira, todo o lixo, e o ouro puro permanecerá.
Passe pelo dilema. Entenda-o como o destino humano. Você terá de atravessá-
lo, vivê-lo. Não corra. Não tome uma decisão precipitada. Sim, se você passar
por ele, a decisão virá. Passe por ele e a confiança surgirá sozinha — você não
terá de consegui-la em nenhum outro lugar.
Uma confiança trazida de fora não tem valor. O fato de a confiança ter de ser
trazida mostra que a mente não estava pronta para ela, que ela foi
prematuramente trazida. Uma confiança que precisa ser enfatizada apenas
mostra que por trás dela existe uma mente cheia de conflito. Esse conflito
permanecerá vivo sob a camada externa dessa confiança. E apesar de esse tipo
de confiança funcionar superficialmente, não será de nenhuma valia em um
momento crítico.
Quando um momento difícil lhe for apresentado, quando a morte o encarar...
apesar de você acreditar firmemente que a alma é imortal, apesar dessa crença
firme que ficou com você quando leu o Gita, apesar de estar certo da
imortalidade da alma ao ir ao templo todas as manhãs; agora, quando o médico
estiver ao seu lado com uma expressão solene, e quando houver uma grande
comoção por parte de seus parentes preocupados com você quando seu
coração começar a falhar... nesse momento você perceberá que não sabe se a
alma é realmente imortal ou não.
A alma não pode se tornar imortal porque seus Gitas dizem que ela é — apesar
de seus Gitas dizerem que ela é porque a alma é realmente imortal. Mas isso é
um assunto diferente. A alma não pode se tornar imortal porque estão dizendo
isso. Você acreditar nas palavras de outra pessoa não fará a menor diferença.
Sim, passe pelo conflito interno. Tolere sua dor. É uma oportunidade, não tente
evitá-la.
Arjuna também está tentando fugir dessa situação de dilema, mas Krishna não
o está ajudando a evitá-lo; em vez disso, está tentando prolongá-lo. Caso
contrário, Krishna teria dito: “Não se preocupe. Eu sei tudo sobre isso. Não diga
coisas sem importância. Apenas tenha fé em mim e pule”. Ele poderia ter dito
isso; então não haveria necessidade de ele criar um Gita tão longo.
O Gita, longo como é, é um grande tributo ao conflito interno de Arjuna. O
interessante é que Arjuna fica perguntando a mesma coisa o tempo todo, e
Krishna nunca diz a ele: “Você já perguntou isso. Por que está perguntando de
novo?”. Arjuna pergunta a mesma coisa diversas vezes. Nenhuma de suas
perguntas é diferente; apenas as palavras são diferentes. Seu conflito interno se
mostra o tempo todo. Mas Krishna não diz a ele: “Fique quieto! Como você ousa
não ter fé no que eu lhe digo? Como ousa duvidar de mim?”. Não. Arjuna
continua perguntando as mesmas coisas. Seus conflitos internos aparecem o
tempo todo sob novas formas.
Krishna não está interessado em criar nenhuma crença em Arjuna. Krishna
certamente está interessado em levá-lo ao ponto da confiança. E existe uma
grande diferença entre crença e confiança. Crença é aquilo que impomos a nós
mesmos sem resolver a dúvida, enquanto confiança é o resultado da dúvida indo
embora. A confiança é o destino a que chegamos quando atravessamos a
dúvida. As crenças são apoios cegos aos quais nos apoiamos com medo da
dúvida.
Por isso, eu diria: viva o dilema, viva-o intensamente. Se vivê-lo normalmente,
ele vai demorar muito. Se colocar o ouro em um fogo baixo, pode ser que demore
muito para que ele fique puro. Viva intensamente.
O dilema é a maneira essencial com a qual o homem é testado, e ao encarar
esse dilema seu valor para chegar à divindade nasce. Portanto, viva. Não
escape; não procure consolos. Perceba apenas que esse é o destino: o dilema
é seu destino. Lute com ele; entre no dilema com intensidade.
Qual será o resultado disso? O resultado será duplo. Assim que uma pessoa
concorda em entrar completamente em seu conflito interno, um terceiro ponto
surge de dentro dessa pessoa — um terceiro ponto além dos outros dois que
nascem nele. Assim que uma pessoa concorda em passar por seu conflito
interno, três coisas, em vez de apenas duas, começam a funcionar nela. Essa
terceira força — que envolve a decisão de superar o dilema — está fora dela,
não se envolve com ela.
Ouvi uma história:
A madre Teresa era uma freira cristã. Certo dia ela tinha três centavos, e disse
às pessoas da cidade que tinha dinheiro suficiente e queria construir uma grande
igreja. As pessoas ficaram surpresas, porque um dia antes tinham visto Teresa
mendigar. Todos se perguntavam como, de uma hora para outra, ela tinha
encontrado tanto dinheiro para poder construir uma igreja.
Ela mostrou às pessoas a latinha que usava para pedir esmola, com três
centavos dentro.
As pessoas disseram: — Teresa, você ficou louca? Sempre soubemos que havia
algo de errado com sua cabeça.
Na verdade, as pessoas que não se voltam ao divino sempre vêem alguma coisa
de errado com as pessoas que se voltam a ele.
Teresa respondeu: — Além de mim mesma, eu tenho três centavos e uma
existência: Teresa, mais três centavos, mais a existência.
Perguntaram a ela: — Onde está essa existência?
Teresa disse: — É a terceira força que vocês não vêem, porque ainda não foram
capazes de encontrar essa terceira força dentro de si mesmos.
A pessoa que descobre essa terceira força dentro de si mesma torna-se
imediatamente capaz de vê-la no universo todo. Você está apenas olhando para
o dilema, sem perceber que quem a vê, quem a conhece, não pode ser parte do
dilema, mas sempre estará fora dele.
Quando as duas brigam dentro de você e você percebe, é inevitavelmente
separada das duas — caso contrário, como poderia estar observando-as? Se
estivesse associado a uma das duas, teria se identificado com uma e se
separado da outra.
Mas você diz que existe um conflito: que sua mão direita e sua mão esquerda
estão brigando. Essa briga entre as duas mãos pode ser observada como um
conflito, pois atrás das duas mãos você está presente como uma terceira força,
um terceiro poder. Caso contrário, se você fosse apenas a mão esquerda, por
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  • 1. OSHO GUERRA E PAZ INTERIOR Ensinamentos do Bhagavad Gita UNIVERSALISMO
  • 2. Sumário Prefácio 1 — A Psicologia da Guerra 2 — As Raízes da Violência 3 — A Yoga da Angústia 4 — Além de Justificativas 5 — Além do Ego 6 — A Mente Sem Pensamento 7 — Morte 8 — A Gota de Orvalho e o Oceano
  • 3. Prefácio Uma das mais famosas escrituras hindus, o Bhagavad Gita é apresentado em forma de diálogo entre o iluminado Krishna e o grande arqueiro e experiente guerreiro Arjuna. O diálogo acontece na noite do Mahabharata, a climática “Grande Guerra” da Índia que ocorreu há 5000 anos. A guerra originou-se de uma disputa sobre qual dos dois lados da família real, os Pandavas ou os Kauravas, deveria herdar o reino, cujo centro ficava próximo a Delhi. Arjuna estava ao lado dos Pandavas mas, na noite da batalha — quando viu muitos familiares, amigos e parentes se reunindo aos Kauravas para lutar — percebeu, claramente, que entrar na guerra significaria matar “sua própria gente”. Krishna, que tinha parentes nos dois lados da família real, fazia o papel de cocheiro e “instrutor de vida” de Arjuna. E conforme conversa com Arjuna, o ajuda a ver, passo a passo, que as raízes de sua angústia estão em sua identificação com sua mente e com todos os padrões e condicionamentos inconscientes de sua mente. Na série de palestras transcritas e publicadas neste livro, Osho chama o Bhagavad Gita de “a primeira escritura psicológica”, disponível no Ocidente muito antes de Freud, Adler e Jung. E o modo com que Krishna aborda os problemas de Arjuna — todos os nossos problemas — só pode ser compreendido uma vez que entendamos como a mente humana realmente funciona. É aí que os brilhantes comentários de Osho entram, quando ele explica como os padrões e condicionamentos de nossa mente criam dor e tristeza, dilema, conflito e guerra. Ao comentar o significado dos versos do Gita e responder às perguntas de sua platéia, Osho revela como carregamos um Arjuna dentro de nós. Logo fica claro que a natureza do homem no começo do século XXI pode não ser tão diferente daquela que lutou na Guerra do Mahabharata. Mas, nestas páginas, Osho está se dirigindo a um mundo que sofre as dores de uma crise muito mais complexa, e de magnitude potencialmente muito maior do que a época em que Krishna e Arjuna viveram. Enquanto nos vemos à beira da autodestruição, não só nacional mas também mundial, Osho explica a visão psicológica de Krishna e nos dá as chaves para uma paz pessoal e global. Os Editores
  • 4. 1 A Psicologia da Guerra Dhritarashtra; Oh Sanjay, assentado no campo da justiça, o chão do Kuru, e desejoso de guerra, o que meus filhos e os filhos de Pandu fizeram? Sanjay: E então o rei Duryodhana depois de ver o exército dos Pandavas estrategicamente se posicionou para a batalha, aproximou-se de seu mestre, Dronacharya, e disse: “Oh, mestre honrado veja esse poderoso exército dos filhos de Pandu que seu próprio aluno esperto, o filho de Drupada, estrategicamente organizou “Aqui estiveram guerreiros e grandes arqueiros, Como Bheema e Arjuna; homens como Yuyudhana, Virata e Drupada o grande arqueiro. “Também, Dhrishtaketu, Chekitana, o valente rei de Kashi, Purujit, Kuntibhoja e Shaibya o melhor entre os homens. “O Poderoso Yudhamanyu e o forte Uttamauja; o filho de Subhadra assim como os filhos de Draupadi — todos eles grandes comandantes. “Também saiba, Oh primeiro entre os brahmins,
  • 5. e dos ótimos homens do nosso lado; e para sua informação eu nomearei os comandantes de meu exército. Você mesmo, depois Bheeshma, e Karna, e Kripa, sempre vitorioso em batalha; da mesma maneira, Ashvatthama, Vikarna, e o filho de Somadatta. “E muitos outros heróis valentes, prontos para abrir mão de suas vidas por mim, armados com muitos tipos de armas, e todos muito habilidosos na batalha. “Nosso exército, protegido por Bheeshma, é invencível de todas as maneiras, enquanto o deles, com Bheema no comando será fácil de derrotarmos. “Assim, firmes em todas as frentes, cada um em seu respectivo lugar, protejam Bheeshma com suas vidas todos vocês.” Escutando essas palavras de Duryodhana dirigidas a Dronacharya, o velho mais valente Bheeshma o mais velho entre os Kauravas, rugiu como um leão e tocou sua concha para alegrar o coração de Duryodhana. Então, conchas e tímpanos, tambores, bumbos e cornetas foram tocados ao mesmo tempo fazendo um som tumultuado. Com isso, sentado em sua charrete maravilhosa, que era levada por cavalos brancos, Krishna e Arjuna tocaram suas lindas conchas. Krishna tocou sua concha chamada Panchajanya, e Arjuna a sua, chamada Devadatta. Bheema, um realizador de grandes feitos e um homem de imenso apetite, tocou sua concha poderosa, Paundra.
  • 6. O rei Yudhishthira, o filho de Kunti, tocou sua concha chamada Anantvijaya, e Nakula e Sahadeva tocaram as suas, chamadas Sughosha e Manipushpaka. E então, Oh Senhor da Terra, o ótimo arqueiro, o rei de Kashi, o grande arqueiro comandante Shikhandi, Dhrishtaddumna e o rei Virata, e o invencível Satyaki, Rei Drupada e todos os filhos de Draupadi, e o forte filho de Subhadra, cada um deles tocou sua concha especial. E ressoando nos céus e na terra, o grande rugido tomou os corações dos filhos de Dhritarashtra. E então, Oh Rei, Arjuna, cuja bandeira trazia a crista de Hanumana, tendo olhado os filhos de Dhritarashtra, armados com suas armas e prontos para atacar, pegou seu arco e dirigiu as seguintes palavras a Krishna: “Oh Ser Infalível, coloque minha charrete entre os dois exércitos, para que eu possa ver esses homens com clareza que estão aqui, ansiosos para lutar, e saiba quem são eles que estarão lutando comigo nessa guerra. Dhritarashtra é cego. Mas a paixão não desaparece com a ausência da visão; o desejo não desaparece com a ausência da visão. Se Surdas tivesse pensado em Dhritarashtra, ele nunca teria destruído seus próprios olhos. Surdas destruiu seus olhos acreditando que, assim que perdesse sua visão, o desejo e a paixão nunca mais nasceriam dentro dele. Mas o desejo não surge nos olhos, ele surge fora da mente. Nenhuma paixão pode ser acabada desta maneira — mesmo que uma pessoa destrua seus olhos. Essa maravilhosa história do Gita começa com a curiosidade de um homem cego. Na verdade, nem mesmo uma história seria contada neste mundo se não
  • 7. existissem homens cegos. Todas as histórias desta vida começam com a curiosidade de um homem cego. Um homem cego quer ver o que ele não consegue ver; uma pessoa surda quer ouvir o que ela não consegue ouvir. Mesmo que todos os órgãos do sentido fossem perdidos, os desejos escondidos dentro da mente não sumiriam. Por isso, gostaria de lembrá-los desde o princípio que Dhritarashtra é cego, e mesmo assim, a milhas de distância, sua mente é curiosa, ansiosa e preocupada em saber o que está acontecendo no campo de batalha. Também mantenham um segundo ponto em mente: que o cego Dhritarashtra tem cem filhos, mas que os filhos nascidos de uma pessoa cega não têm uma visão verdadeira, mesmo que tenham olhos físicos. As pessoas que nascem de pais cegos — e talvez, de modo geral, as pessoas nasçam de pais cegos — podem ter olhos físicos, mas é difícil para elas obterem a visão interior. Então, em segundo lugar, é importante entender que os cem filhos de Dhritarashtra estavam agindo de modo cego sob todos os aspectos. Eles tinham olhos físicos e exteriores, mas não tinham olhos interiores. Uma pessoa que é cega só pode ter a cegueira. Mas esse pai está curioso para saber o que está acontecendo. Em terceiro lugar, devemos perceber o que Dhritarashtra está dizendo: Oh Sanjay, assentado no campo da justiça, o chão do Kuru, e desejoso de guerra... O campo da justiça deixa de existir no dia em que as pessoas se reúnem ali para lutar em uma guerra. No dia em que a briga se tornar imperativa, a possibilidade de qualquer justiça sobreviver neste mundo termina. Assim, em algum momento pode ter sido um campo de justiça, de religião, mas agora não é mais. Agora, as pessoas que anseiam matar umas às outras têm se assentado no lugar conhecido como dharmakshetra — o campo da justiça. Esse começo é realmente extraordinário. Também é extraordinário no sentido de que agora será muito difícil entender o que deve estar acontecendo nos campos da injustiça, nos campos da irreligiosidade, se isso é o que está acontecendo nos campos da justiça. O que pode estar acontecendo no campo da justiça se Dhritarashtra já está perguntando a Sanjay: “Eu quero saber o que meus filhos e meus oponentes, que estão dispostos a lutar, estão fazendo”? Talvez um campo de justiça ainda não tenha sido criado neste mundo. Se já tivesse sido criado, então a guerra não mais seria uma possibilidade. Mas quando a possibilidade da guerra ainda existe, e quando um campo de justiça transforma-se em um campo de batalha, como podemos culpar ou criticar os injustos, os irreligiosos?
  • 8. A verdade é que talvez tenha havido menos guerras nos campos da injustiça do que nos campos da justiça, da religião. Se pensássemos em termos de guerra e derramamento de sangue, então os campos de justiça pareceriam mais com os campos de injustiça do que os campos de injustiça de hoje. Devemos entender a ironia envolvida aqui — de que, até agora, as guerras aconteceram em domínios religiosos. Não pense que isso só está acontecendo agora; que os templos e mesquitas se tornaram locais de guerra só hoje. Há milhares de anos — quando se acreditava que pessoas boas existiam na terra, e uma pessoa maravilhosa como Krishna estava presente —, até mesmo naquela época as pessoas tinham se reunido para lutar nos campos religiosos do Kuru. Essa profunda sede por guerra, esse profundo desejo por destruição, esse animal escondido dentro dos restos com o homem até mesmo nos campos de justiça. Até mesmo lá, esse animal se prepara para a guerra. É bom lembrar disso, e também lembrar que lutar se torna ainda mais perigoso quando vem protegido pelo escudo da religião — porque então parece justificado. Por isso, essa escritura religiosa começa com a curiosidade cega de Dhritarashtra. Todas as escrituras religiosas começam com a curiosidade cega de algum homem. Na verdade, no dia em que não existirem pessoas cegas no mundo, não haverá a necessidade de nenhuma escritura religiosa. Então aqui está ele, esse homem cego que está curioso. OSHO, Qual o significado de Sanjay, que fala sobre a guerra a Dhritarashtra, no Gita? Sanjay possuía poderes de ver e ouvir de longe? Qual o curso de seus poderes mentais? Sua força é intrínseca? Muitas forças surgiram sobre Sanjay, e isso é natural. De longe, de muito longe, Sanjay está contando a Dhritarashtra o que está acontecendo em Kurukshetra. A yoga sempre acreditou que os olhos com os quais enxergamos não são os únicos que temos. O homem também tem outro olho, que consegue ver além das barreiras do tempo e do espaço. Mas não é só porque a yoga diz isso, necessariamente, que Sanjay está correto no que diz. Uma dúvida surge na mente: como Sanjay consegue ver de tão longe? Ele é onisciente? Não. E, antes de qualquer coisa, o poder de ver e ouvir a distância não é um poder muito grande. Não tem nada a ver com ser onisciente. É um poder muito simples e qualquer pessoa pode desenvolvê-lo com um pouquinho de esforço. E às vezes acontece, como o resultado de algum truque na natureza, que esse poder se desenvolva em alguém com quem tenha afinidade.
  • 9. Existem poderes escondidos dentro de nossos olhos, que podem ser vistos além dos limites de tempo e espaço. Mas esses poderes não têm muito a ver com a espiritualidade. Então não é que Sanjay seja algum tipo de homem espiritual. Ele certamente é especial: é capaz de ver o que está acontecendo bem longe do campo de batalha. E não é que ele tenha alcançado alguma santidade ou verdade por causa desse poder. Pelo contrário, é possível que Sanjay possa ter sabotado a si mesmo completamente usando esse poder. Isso sempre acontece. Poderes extraordinários podem tirar as pessoas de seus caminhos. É por isso que a ioga defende que se eles são poderes físicos comuns ou poderes psíquicos da mente, uma pessoa que se envolve com esses poderes nunca alcança a verdade. Entretanto, o que Sanjay poderia fazer é possível. Recentemente, nos últimos cem anos no Ocidente, uma grande quantidade de trabalho tem sido realizada na pesquisa psíquica. Por isso, agora, ninguém tem motivo algum para duvidar de Sanjay — nem mesmo em campos científicos. Agora os psicólogos estão admitindo que existem poderes infinitos no homem. Como resultado das viagens do homem ao espaço, os psicólogos começaram a trabalhar em uma nova área. Não é mais possível depender completamente de máquinas: especialmente quando as pessoas são mandadas para o espaço, um grande risco está envolvido. Qualquer defeito no equipamento e podemos perder o contato com eles para sempre, e seria impossível encontrar esses viajantes perdidos. Pode ser que nunca sejamos capazes de localizá-los na infinidade do espaço, ou saber se estão vivos ou mortos. É por isso que os cientistas trabalham com ansiedade em seus laboratórios para desenvolver um sistema substituto que nos permitirá ver de uma grande distância, ouvir e enviar mensagens sem a ajuda da tecnologia. Não demorará muito para que todos os países tenham Sanjays. Um Sanjay não é particularmente um homem espiritual. No entanto, ele tem um poder especial que todos nós temos e que pode ser desenvolvido. Sanjay: E então o rei Duryodhana depois de ver o exército dos Pandavas estrategicamente se posicionou para a batalha, aproximou-se de seu mestre, Dronacharya, e disse: “Oh mestre honrado veja esse poderoso exército dos filhos de Pandu que seu próprio aluno esperto, o filho de Drupada, estrategicamente organizou
  • 10. “Aqui estiveram guerreiros e grandes arqueiros, Como Bheema e Arjuna; homens como Yuyudhana, Virata e Drupada o grande arqueiro. “Também, Dhrishtaketu, Chekitana, o valente rei de Kashi, Purujit, Kuntibhoja, e Shaibya o melhor entre os homens. “O Poderoso Yudhamanyu e o forte Uttamauja; o filho de Subhadra assim como os filhos de Draupadi — todos eles grandes comandantes. “Também saiba, Oh primeiro entre os brahmins, e dos ótimos homens do nosso lado; e para sua informação eu nomearei os comandantes de meu exército. Quando a mente humana está sofrendo de complexo de inferioridade, quando internamente a mente humana se considera inferior, então uma pessoa sempre começa a falar sobre sua própria grandeza. Mas quando a pessoa não está tomada pela inferioridade, a conversa sempre começa com os comentários sobre a grandeza de outra pessoa. Aqui Duryodhana está dizendo a Dronacharya quais grandes comandantes e guerreiros juntaram-se no exército de Pandava. O fato de Duryodhana começar assim é altamente simbólico. Geralmente, a conversa não começa com o elogio ao inimigo; geralmente começa com a crítica ao inimigo, elogiando a si mesmo em comparação ao inimigo. Mas aqui, Duryodhana começa a falar identificando os heróis do exército inimigo. Isso mostra que seja lá o que Duryodhana possa ser, certamente não é um homem com complexo de inferioridade. É interessante que mesmo um bom homem que esteja sofrendo de complexo de inferioridade seja pior do que um homem que não tenha o mesmo problema. Só uma pessoa que é confiante em si mesma pode começar elogiando os outros. Essa é uma diferença fundamental que tem ocorrido nos últimos séculos. Antes, também, havia tanto pessoas boas quanto pessoas más — e não é que hoje o número de pessoas más aumentou e o de pessoas boas diminuiu. Hoje em dia, a proporção de pessoas boas e más também é parecida. Então, que mudança ocorreu? As pessoas que sempre falam sobre religião espalham a crença de que antigamente as pessoas eram boas e que agora ficaram más. No meu ponto de
  • 11. vista, essa afirmação é completamente errada. Sempre existiram pessoas boas e pessoas más. A diferença que ocorreu antes e agora não é tão periférica; é muito mais profunda. No passado, nem mesmo uma pessoa má sofria de complexo de inferioridade; hoje em dia, até uma pessoa boa sofre disso. E aqui está a grande diferença. Hoje em dia, até mesmo o melhor dos homens só é bom por fora. Por dentro, não tem certeza a respeito de si mesmo. Pense nisso: quando uma pessoa não tem certeza a respeito de si mesma, sua bondade não é do tipo que pode durar muito tempo. É superficial: um arranhãozinho e até mesmo a superfície ficará feia. E se uma pessoa má é autoconfiante, apesar de sua maldade ela pode ser transformada a qualquer momento, porque uma qualidade muito cristalizada de bondade esconde-se no fundo: a qualidade da autoconfiança. Eu acho que é muito importante que uma pessoa má como Duryodhana comece seu discurso de um modo agradável. Ele menciona as boas qualidades de seus oponentes em primeiro lugar, e depois descreve os heróis de seu próprio exército. “Você mesmo, depois Bheeshma, e Karna, e Kripa, sempre vitorioso em batalha; da mesma maneira, Ashvatthama, Vikarna, e o filho de Somadatta. “E muitos outros heróis valentes, prontos para abrir mão de suas vidas por mim, armados com muitos tipos de armas, e todos muito habilidosos na batalha. “Nosso exército, protegido por Bheeshma, é invencível de todas as maneiras, enquanto o deles, com Bheema no comando, será fácil de derrotarmos. “Assim, firmes em todas as frentes, cada um em seu respectivo lugar, protejam Bheeshma com suas vidas todos vocês.” OSHO, Por um lado vemos que a ênfase no Shrimad Bhagvad-Gita está sobre Arjuna, enquanto aqui Duryodhana está dizendo que o exército de Pandavas é protegido por Bheema, e o exército de Kauravas por Bheeshma. É possível que a idéia escondida em colocar Bheema contra Bheeshma seja pelo fato de Duryodhana ver Bheema como seu único rival?
  • 12. Esse ponto vale a pena ser discutido. A guerra toda é centralizada em Arjuna como seu principal pivô, mas isso é retrospecto — ou seja, depois da guerra, na conclusão da guerra. Aqueles que conhecem a guerra e seu resultado diriam que Arjuna foi decisivo durante a guerra. Mas aqueles que viram o início da guerra nunca poderiam ter pensado assim. Para Duryodhana, a possibilidade de uma guerra acontecer encontrava-se em Bheema. Havia motivos para isso. Nem mesmo Duryodhana poderia esperar que uma pessoa boa como Arjuna entraria em uma guerra como aquela. Arjuna poderia ser sensibilizado — até mesmo Duryodhana tinha suas dúvidas a respeito de sua firmeza de decisão. Duryodhana tinha uma sensação profunda e inconsciente de que Arjuna poderia fugir da guerra. Se essa guerra fosse terminada, teria de ser somente por causa de Bheema. Pessoas como Bheema, que são menos inteligentes mas mais poderosas, podem ser dependentes de lutar em uma guerra. Arjuna é inteligente; e onde há inteligência há dúvida, e onde há dúvida, há dilema. Arjuna é racional; e onde existe racionalidade, existe a capacidade de pensar de uma perspectiva total. Quando uma pessoa tem essas qualidades é difícil entrar em uma situação perigosa, como a guerra, com os olhos fechados. Existe uma grande semelhança entre Duryodhana e Bheema. Os dois têm a mesma natureza; no fundo eles têm a mesma maneira de pensar, os dois são o mesmo tipo de pessoa. Assim, se Duryodhana visse Bheema como a figura mais importante de seu lado oposto, ele tinha razão. Não há nada de errado nisso. Mais adiante, o Gita também prova esse fato: Arjuna está prestes a escapar. Arjuna surge como um escapista, e isso é sempre provável em relação a uma pessoa como Arjuna: para ele, entrar na guerra tornou-se possível apenas depois de passar por uma autotransformação. Apenas depois de conquistar um novo nível de compreensão ele pôde concordar com a guerra. Bheema estava pronto para lutar em qualquer nível que se encontrasse no momento. A guerra não é natural para Bheema como é para Duryodhana. Assim, não é coincidência que Duryodhana visse Bheema como a figura central. Mas isso é no começo da guerra; Duryodhana não sabe como a guerra vai terminar, qual será o fim. Mas nós sabemos. Lembre-se, geralmente a vida não termina da mesma maneira que começou. O final é sempre desconhecido; é sempre invisível. Na maioria das vezes, o que pensamos que vai acontecer não acontece. A vida é uma jornada desconhecida. Assim, tudo em que acreditamos nos primeiros momentos da vida, nos primeiros momentos de qualquer acontecimento, não termina da mesma maneira no final. Podemos nos comprometer em moldar nossos destinos, mas não podemos nos tornar aqueles que os decidem. O resultado é sempre alguma coisa diferente.
  • 13. A compreensão clara de Duryodhana era que Bheema seria a figura central. E se Bheema tivesse sido a figura principal, talvez o que Duryodhana dizia a respeito de ser vitorioso tivesse se tornado verdade. Vale a pena pensar por que o ponto de vista de Duryodhana não se mostrou verdadeiro, e por que um elemento inesperado entrou em cena. Duryodhana se esqueceu de Krishna, esqueceu que Krishna seria capaz de levar Arjuna de volta à guerra se ele decidisse escapar. Nós também nunca nos lembramos que o invisível, intangível, pode acontecer em nossas vidas. Nossos cálculos são feitos de acordo com o que podemos ver. Nunca lembramos que em algum ponto o invisível também pode entrar, que o invisível pode se meter entre tudo. Aqui, no meio de todas as coisas, o invisível entrou sob a forma de Krishna, e consequentemente a história toda tomou um outro rumo. O que poderia ter acontecido não aconteceu; e aquilo que tinha pouca possibilidade de acontecer, aconteceu. A chegada do desconhecido não pode ser prevista. Quem lê essa história pela primeira vez fica chocado quando descobre Krishna levando o fugidio Arjuna de volta para a guerra — certamente o leitor fica chocado. Quando Emerson leu essa história pela primeira vez, ele fechou o livro, ficou horrorizado — porque o que Arjuna estava dizendo seria aceito pelas tão famosas pessoas religiosas. O argumento dado por Arjuna era aquele de uma pessoa religiosa. Quando Henry Thoreau leu que Krishna aconselhou Arjuna a entrar na guerra, ele também ficou horrorizado. Henry Thoreau escreveu que ele não imaginava, que não tinha a menor idéia de que a história teria essa reviravolta — Krishna aconselhando Arjuna a ir para a guerra. Gandhi também enfrentou a mesma dificuldade; ficou perturbado pelo mesmo motivo. Mas a vida nunca acontece de acordo com princípios preestabelecidos. A vida é um extraordinário fenômeno. Não segue em trilhos, flui como a correnteza do rio Ganges — seu curso nunca é predeterminado. E quando o invisível desconhecido aparece, perturba tudo. Tudo que tenha sido planejado, tudo que o homem tenha tecido, tudo que a mente do homem arquitetou — tudo fica de cabeça para baixo. Duryodhana nunca imaginara que essa presença invisível entraria na guerra. Por isso, o que ele está dizendo é apenas uma frase inicial do tipo que todos nós dizemos nos primeiros estágios de qualquer situação em nossas vidas. Enquanto isso, o invisível, o desconhecido, continua interferindo, e a história toda é mudada. Se olharmos para nossa vida no passado, veremos que tudo que pretendíamos que acontecesse deu errado. Onde esperávamos ter sucesso, tivemos fracasso; tudo que nos esforçamos para ter, não alcançamos. Esperamos que a felicidade
  • 14. venha como o resultado de alguma coisa obtida, mas quando a conseguimos, ela nos levou à tristeza. E aquilo que nunca sonhamos em ter, de repente abriu caminhos de alegria e felicidade. Tudo fica de cabeça para baixo. Mas as pessoas que são inteligentes o bastante para pensarem no resultado desde o começo são muito poucas neste mundo. No começo, prestamos atenção apenas ao começo. Se ao menos pudéssemos pensar no fim primeiro, a história da vida poderia ser muito diferente. No entanto, se Duryodhana pensasse no final em primeiro lugar, a guerra não teria acontecido. Mas Duryodhana não pensa no final. Ele não valoriza o final — que só pode dar no que deu. É por isso que ele repete que apesar de o exército do outro lado ser ótimo, a vitória final será dele; que seus guerreiros estão ansiosos para fazer dele o vencedor, mesmo que isso custe suas vidas. Mesmo que coloquemos nosso poder atrás dele, a falsidade nunca pode ser vitoriosa. Mas um Duryodhana não consegue perceber, compreender esse fato. A verdade, que no começo parece estar perdendo, sempre vence no final. A mentira parece estar ganhando no começo, mas no final sempre encontra a derrota. A verdade parece estar perdendo no começo, mas, no final, sai vitoriosa. Mas como podemos ver o final antes do começo? A pessoa que consegue se torna religiosa. A pessoa que não consegue ver isso continua escorregando, como Duryodhana, em uma guerra cega. OSHO, Existe a vontade da força invisível desconhecida e existe a força do indivíduo. Uma vez que elas entrem em conflito, como um indivíduo pode saber qual é a vontade do desconhecido? A pergunta é, como um indivíduo pode saber qual é a vontade do desconhecido? O indivíduo nunca consegue saber. Mas se o indivíduo puder abrir mão de si mesmo, se puder apagar seu ego, ele conhecerá a vontade do desconhecido imediatamente — porque se torna um com ela. Uma gota não tem como saber o que é um oceano até que se dissolva no oceano. Um indivíduo não pode saber qual é a vontade do todo enquanto mantiver sua identidade separada. Mas se ele puder se dissolver e deixar de ser um indivíduo separado do todo, então apenas o todo restará, a questão de saber a vontade do todo não aparece. Então o indivíduo viverá da maneira que o desconhecido, que o todo o fizer viver. Nessa situação, nenhuma vontade individual, nenhum desejo individual por nenhum resultado em especial, nenhum desejo pessoal por nada, nenhuma atitude de impor sua própria vontade sobre a vontade do todo existe em nenhum lugar, porque não existirá mais o indivíduo em si. Enquanto o indivíduo existir, a vontade do todo não será conhecida. E quando o indivíduo não existir mais, não existirá mais a necessidade de saber a vontade
  • 15. do todo — porque o que acontecer estará acontecendo de acordo com a vontade do todo, do desconhecido; o indivíduo se tornou apenas um instrumento, um veículo. Mais adiante, e ao longo do Gita, Krishna aconselha Arjuna: que ele deveria se entregar às mãos do desconhecido, que ele deveria se entregar ao desconhecido — porque então aqueles com quem Arjuna se preocupa que serão mortos na guerra, já estarão mortos nas mãos do desconhecido, do todo; porque então Arjuna não será o responsável pela morte daqueles pelos quais ele se sente responsável. É claro que se ele se mantiver separado como um indivíduo, ele certamente será responsável. Mas se ele abrir mão de sua individualidade e lutar como um instrumento, como uma testemunha, então nenhuma responsabilidade lhe será atribuída. Se o indivíduo conseguir desaparecer no todo, se puder se entregar totalmente, se puder abrir mão de seu ego, então será apenas a vontade do todo, a vontade da existência que estará sendo satisfeita o tempo todo. Está sendo satisfeita neste momento; não há maneira de alterarmos sua realização. Mas podemos lutar, podemos nos arruinar, podemos destruir a nós mesmos na esperança de alterarmos a vontade da existência, a vontade do todo. Sempre conto a história de dois pedaços de palha que estão se afogando em um rio caudaloso. Uma das palhas, que está disposta em diagonal na correnteza, está tentando conter o rio, está gritando que não deixará o rio continuar. Apesar de as águas do rio continuarem rolando e a palha ser incapaz de controlá-las, ela continua gritando que o rio será contido: está se gabando de que, quer ela viva ou morra, o rio será contido. Mas essa palha continua se afogando. O rio não ouve sua voz e não sabe que a palha está lutando contra ele. É uma palha muito pequena; o rio não sabe que ela existe, e ela não faz a menor diferença para ele. Mas para a palha é uma questão de grande importância. É a maior dificuldade de sua vida. Ela está se afogando, mas continua lutando, ela chegará ao mesmo lugar que chegaria se não estivesse lutando. No entanto, como está lutando, esse momento, esse período será de dor, de pesar, de conflito e ansiedade. A palha perto dela se soltou. Ela não está indo contra o fluxo; está deitada reta, na direção em que o rio está correndo — e acredita que está ajudando o rio a correr. O rio também não conhece a existência dessa palha. A palha pensa que, como está levando o rio para o mar, o rio vai chegar lá. E o rio desconhece essa ajuda. Tudo isso não faz a menor diferença para o rio, mas para as duas palhas trata- se de um assunto de grande importância. Aquela que está guiando o fluxo do rio está sentindo uma imensa alegria; está dançando, repleta de prazer. A palha que está lutando contra o rio está sofrendo muito. Sua dança não é uma dança: é um
  • 16. pesadelo. Nada mais é do que uma torção de seu corpo, ela está com problemas, está sendo derrotada; enquanto aquela que está indo com o rio está vencendo. Um indivíduo é incapaz de fazer qualquer coisa exceto aquilo que seja a vontade do todo. Mas ele tem a liberdade de lutar, e lutando ele tem a liberdade de ficar ansioso. Sartre disse algo importante: “O homem está condenado a ser livre”. O homem está fadado, está condenado, está amaldiçoado a ser livre. No entanto, o homem pode usar sua liberdade de duas maneiras. Pode usar sua liberdade contra a vontade da existência e criar um conflito. Nesse caso sua vida será de pesar, dor e angústia, e por fim ele será derrotado. Outro indivíduo pode fazer de sua liberdade um objeto de entrega à existência — e sua vida será uma vida de alegria, uma vida de dança e canção. E qual será o resultado final? O final não será nada além de uma vitória para ele. A palha que acredita que está ajudando o rio tem a probabilidade de ser vitoriosa. Ela não pode ser derrotada. A palha que tenta parar o rio certamente será derrotada. Ela não pode vencer. Então é impossível conhecer a vontade da existência, mas certamente é possível transformar-se em um com a existência. E se esse for o caso, então a vontade de uma pessoa desaparecerá e apenas a vontade da existência permanecerá. OSHO, Nas descobertas científicas existe algo do indivíduo que é contribuído. É difícil entender como a vontade da existência, do todo, entra na descoberta científica. Normalmente, parece que é a vontade do indivíduo que está atuando na descoberta científica — mas isso não passa de uma impressão superficial. Se olharmos mais atentamente, isso desaparecerá. Você ficará surpreso ao saber que as experiências dos grandes cientistas do mundo em relação à ciência são bem diferentes das idéias criadas nas faculdades e universidades. Por exemplo, Madame Curie escreveu que certa vez, durante muitos dias, ela ficou intrigada com um problema. Ela tentou resolvê-lo, mas não conseguiu. Cansada e chateada, ela acabou desistindo; uma noite, às duas horas da madrugada ela decidiu esquecer o problema e foi para a cama deixando os papéis incompletos sobre sua mesa. Quando Curie acordou de manhã, ela descobriu que o problema incompleto estava resolvido. As portas estavam trancadas e ninguém havia entrado no quarto. Mesmo que alguém tivesse entrado na casa, era impossível que um problema que a Madame Curie não tinha conseguido resolver tivesse sido solucionado por alguém. Afinal de contas, ela era uma vencedora de Prêmio Nobel. Só havia empregados na casa, e teria sido um milagre se algum deles tivesse resolvido o problema.
  • 17. Mas, sem dúvida o problema havia sido solucionado. Ele havia sido deixado incompleto, e a outra parte agora estava completa. Ela conferiu todas as portas, e ainda assim não conseguia acreditar. Ela não podia aceitar a idéia de que talvez Deus tivesse vindo dos céus. Mas, nenhum Deus havia descido à terra: quando olhou com mais atenção, descobriu que o resto da caligrafia era dela. Então ela começou a lembrar que durante a noite tivera um sonho. Lembrou-se que sonhando ela se levantou e resolveu o problema. Depois desse dia, isso se tornou uma prática comum para ela — sempre que encontrava um problema que não conseguia resolver — colocá-lo sob seu travesseiro e ir dormir. Durante a noite ela se levantava e o resolvia. Durante o dia, Madame Curie era um indivíduo. À noite, dormindo, o ego desaparece; a gota encontra o oceano. O problema que sua mente consciente era incapaz de resolver era resolvido por sua mente inconsciente, que no fundo é unida com o ser universal. Certa vez, Arquimedes não conseguia resolver um problema. Ele estava enrascado, porque o imperador lhe havia pedido que o resolvesse. A reputação toda de Arquimedes dependia da solução daquele problema; mas ele ficou exausto e nenhuma solução apareceu. O imperador lhe mandava mensagens diárias pedindo uma resposta. Alguém havia presenteado o imperador com um enfeite muito precioso. Mas o imperador suspeitava estar sendo enganado, e suspeitava que alguma outra coisa estava misturada com o ouro. O problema era descobrir, sem destruir o enfeite, se algum outro tipo de metal havia sido usado em sua fabricação. Naquele tempo não havia maneiras desenvolvidas para se saber uma coisa dessas. Era um enfeite grande e era possível que seu peso tivesse sido aumentado com a mistura de alguma outra coisa além de ouro. Arquimedes ficou cansado e preocupado. Mas, certa manhã, quando ele estava nu em sua banheira, o problema foi resolvido. Ele se esqueceu de tudo e correu nu para a rua. Se Arquimedes estivesse presente, ele nunca teria se esquecido de que estava nu. Ele foi para a rua gritando: — Eureca! Eureca! Consegui! Consegui! — e correu em direção ao palácio. As pessoas o seguraram e perguntaram o que ele estava fazendo: — Você ia aparecer sem roupas na frente do imperador? Ele respondeu: — Não percebi o que estava fazendo! O homem que saiu correndo pelado pelas ruas não era Arquimedes. Arquimedes nunca teria ido nu para fora de sua casa. Pode ser que naquele momento ele tenha deixado de ser um indivíduo. O problema não foi solucionado na consciência de um indivíduo; foi resolvido em um estado de inconsciência impessoal, universal.
  • 18. Ele estava no banheiro, dentro de sua banheira, relaxando. Um momento de meditação ocorreu e tomou conta de seu ser... e o problema foi resolvido. A banheira resolveu o problema que ele não conseguiu resolver? A banheira poderia mesmo tê-lo resolvido? Ao ficar dentro de uma banheira, é possível solucionar um problema que não tinha como ser solucionado? A inteligência aumenta dentro d’água? Como o fato de estar nu resolve algo que não pode ser resolvido quando estamos vestidos? Não, alguma outra coisa aconteceu. Por um rápido momento Arquimedes deixou de ser um indivíduo. Por esse rápido momento ele se tornou um só com o todo. Se lermos a respeito das experiências de todos os grandes cientistas do mundo, como Einstein, Max Planck, Eddington, Ediso, descobriremos que eles têm algo em comum: tudo que descobriram não foi o “eu” que descobriu. O que aconteceu várias vezes é que o “eu” descobriu alguma coisa, no momento em que o “eu” não estava presente — e o ato de descobrir aconteceu. Isso é exatamente o que os sábios dos Upanishads dizem, e o mesmo é dito pelos sábios do Vedas, pelos muçulmanos e por Jesus. Quando dizemos que o Vedas não foi criado pelo homem, não quer dizer que Deus apareceu e escreveu o livro. Não existem razões para dizer algo tão ridículo. “Não criado pelo homem” simplesmente quer dizer que essa ocorrência — de colocar os mantras e versos védicos em palavras — aconteceu em um momento em que a pessoa não estava presente; em um momento em que seu “eu” não estava lá. Quando tal fenômeno aconteceu, quando as frases dos Upanishads ocorreram a alguém, quando o Alcorão ocorreu a Mohamed, quando as frases na Bíblia ocorreram a Jesus, essas pessoas não estavam presentes. As experiências de religião e ciência não são diferentes. Não podem ser, porque quando uma verdade é percebida na ciência, a rota para sua percepção é a mesma que na percepção de uma verdade religiosa. Só existe uma maneira de a verdade ser revelada: quando o indivíduo não está lá, a verdade surge para o todo. Um espaço vazio ocorre dentro de nós e a verdade entra nesse espaço vazio. Quem já recebeu qualquer raio de verdade neste mundo, independente de qual forma — seja essa pessoa um músico, um pintor, um poeta, um cientista, um religioso ou um místico —, só o receberam quando não estavam presentes. A religião compreendeu isso há muito tempo. A experiência da religião é de dez mil anos, e com o passar desses dez mil anos, o religioso que procura, o místico religioso, o religioso que medita, relaxou na experiência de que não sou “eu” quem percebe a verdade. É um assunto difícil. Quando pela primeira vez alguma coisa lhe ocorre, vinda do todo, é muito difícil distinguir se aquilo partiu de você ou do todo. Quando isso acontece pela primeira vez, a mente sente-se tentada a se gabar; e o ego
  • 19. também gosta da idéia de ser dele. No entanto, gradualmente, quando essas afirmações se tornam mais transparentes e você passa a saber que parece não haver ligação ou relação entre você e a verdade que foi revelada, a distinção entre você e o todo, o universal, se torna aparente. A ciência ainda é muito jovem — tem só duzentos ou trezentos anos —, mas nesse tempo os cientistas ficaram modestos. Há cinquenta anos um cientista diria: “Nós descobrimos”. Hoje, ele não diz mais isso. Agora, ele diz: “Tudo parece estar fora de nosso alcance”. O cientista de hoje está falando a mesma linguagem mística que os místicos do passado falavam. Não é preciso se apressar — espere mais cem anos e o cientista estará usando a mesma linguagem que encontramos nos Upanishad. Eles terão de falar a língua que Buda falava; eles terão de falar o mesmo idioma que Santo Agostinho e São Francisco falavam. Eles terão de falar esses idiomas porque, conforme suas experiências com a verdade aumentam, a crença no indivíduo como uma personalidade diminui. Quanto mais a verdade se revela, mais o ego desaparece — e um dia o indivíduo percebe que tudo que se soube foi por causa da graça do todo. “Isso me ocorreu; eu não tenho nada com isso. E eu sou responsável por tudo que eu não soube, porque eu estava tão presente que não tive como saber. Eu estava presente de maneira tão sólida que a verdade não conseguiu aparecer aqui”. A verdade ocorre a uma mente vazia, e a presença do “eu” só se faz necessária se a mentira precisa ser percebida. Não, a vontade do todo, da existência, nunca será um obstáculo às descobertas científicas. Na verdade, as descobertas que têm sido feitas até agora aconteceram por meio de uma ligação com o todo, por meio da entrega. A verdade nunca entrou, e nunca entrará por outro lugar que não seja pela porta da entrega. OSHO, Essa sua frase de que a mente inconsciente é unida ao todo, à existência, cria algumas confusões. Jung já explicou isso anteriormente relacionando a mitologia com o inconsciente coletivo. Mas quando Freud diz que o inconsciente também está ligado ao Satã, só aumenta a confusão. Freud acredita que nossa mente inconsciente não só está ligada ao divino, como também com o diabo. Na verdade, Deus e Satã são nossas palavras. Quando não gostamos de determinada coisa, dizemos que ela está ligada a Satã; e quando gostamos de alguma coisa, dizemos que ela está ligada a Deus. O que eu estou dizendo é simplesmente que a mente inconsciente está ligada com o desconhecido, e para mim o desconhecido é a divindade, e até onde eu sei, Satã está incluído nessa divindade, não está separado dela.
  • 20. Na verdade, nossas mentes querem acreditar que o que não gostamos deve ter sido criado pelo diabo, e o que não é errado ou inconsistente deve ter sido obra do divino. Acreditamos que estamos no centro da vida, e então tudo que nos atrai é feito pelo divino, e tudo de que não gostamos é feito pelo diabo: o diabo é o inimigo. Foi o ego do homem que colocou tanto Satã quanto Deus a seu serviço. Nada existe além da divindade. O que chamamos de Satã, ou satânico, não é nada além de nossa não-aceitação. O que chamamos de “mal” é somente nossa não-aceitação. Se pudéssemos analisar o que chamamos de mal descobriríamos imediatamente o bem escondido ali. Se pudéssemos analisar profundamente o pesar nós encontraríamos a felicidade ali. Se pudéssemos analisar uma maldição de perto, encontraríamos uma bênção escondida nela. Na realidade, o bem e o mal são apenas dois lados da mesma moeda. Não estou me referindo ao desconhecido como o divino no sentido de ele ser o oposto do mal. A entidade que eu estou chamando de desconhecido é a fonte de todas as nossas vidas, é a base da existência. É dessa fonte de existência que tanto Ravana, o símbolo do mal, quanto Rama, o símbolo do bem, surgem. É dessa fonte de existência que a escuridão e a luz surgem. Sentimos medo na escuridão, por isso nossas mentes querem acreditar que o diabo deve ser o criador da escuridão. Como gostamos da luz, nossas mentes querem acreditar que o divino deve estar criando essa luz. Mas assim, não há nada ruim na escuridão ou bom na luz. Aquele que ama a existência encontrará o bem tanto na escuridão quanto na luz. A realidade é que por causa desse medo que temos da escuridão, nunca somos capazes de conhecer a beleza da escuridão. Não temos a chance de apreciar o sabor, o mistério da escuridão. Nosso medo é feito pelo homem. Saímos de cavernas, passamos pelas selvas... a escuridão era perigosa lá; animais ferozes podiam nos atacar, a noite era assustadora. É por isso que quando o fogo apareceu, nós o aceitamos como um deus — porque então a noite tinha se tornado segura. Afastávamos o medo acendendo uma fogueira. Por isso, em nossa experiência, a escuridão tem sido associada ao fogo. Em nossos corações a luz tem sido associada com a falta de medo. Mas a escuridão e a luz têm seus próprios mistérios. Tudo que acontece nesta vida que tenha qualquer significado acontece com a cooperação tanto da escuridão quanto da luz. Nós enterramos a semente na escuridão, mas a flor surge na luz. Plantamos a semente na escuridão embaixo da terra, as raízes se espalham nessa escuridão, mas as flores crescem no céu, na luz. Deixe uma semente na luz, e a flor nunca aparecerá; enterre uma flor na escuridão, e as sementes nunca serão criadas. A criança é criada na escuridão profunda do ventre da mãe, onde não entra sequer um raio de luz. Depois, quando já está formada, surge na luz.
  • 21. Portanto, tanto a escuridão quanto a luz são a base para a mesma energia de vida. E a divisão, a polaridade, a contradição da vida são criadas pelo homem. Freud dizia que a mente inconsciente também está associada ao diabo... Freud tinha pensamentos judeus. Nasceu em uma família judia; desde pequeno ouviu muito a respeito do conflito entre Deus e Satã. Os judeus fizeram uma divisão: um lado pertence a Deus e o outro, a Satã. Na verdade, é uma divisão feita pela mente humana. Então Freud pensava que sempre que coisas ruins surgiam do inconsciente, Satã deveria ser responsável por elas. Não, não existe nada como Satã. Se vemos Satã em algum lugar, estamos cometendo um grande engano. Uma pessoa religiosa não consegue ver Satã em lugar algum. Apenas coisas de Deus existem. E o inconsciente — de onde os cientistas encontram a verdade, ou de onde a pessoa religiosa encontra verdade — é a porta para as coisas de Deus. Ao avançarmos mais no assunto, certamente ele será mais compreendido. Escutando essas palavras de Duryodhana dirigidas a Dronacharya, o velho mais valente Bheeshma o mais velho entre os Kauravas, rugiu como um leão e tocou sua concha para alegrar o coração de Duryodhana. Então, conchas e tímpanos, tambores, bumbos e cornetas foram tocados ao mesmo tempo fazendo um som tumultuado. Com isso, sentado em sua charrete maravilhosa, que era levada por cavalos brancos, Krishna e Arjuna tocaram suas lindas conchas. Krishna tocou sua concha chamada Panchajanya, e Arjuna a sua, chamada Devadatta. Bheema, um realizador de grandes feitos e um homem de imenso apetite, tocou sua concha poderosa, Paundra. O rei Yudhishthira, o filho de Kunti, tocou sua concha chamada Anantvijaya, e Nakula e Sahadeva tocaram as suas, chamadas Sughosha e Manipushpaka. OSHO,
  • 22. Uma vez que Krishna toca sua concha em resposta ao som assustador da concha de Bheeshma, será que o som da concha de Krishna não poderia ser visto como uma reação e não como uma ação independente? Essa menção da concha tocada por Krishna e Arjuna no primeiro verso do Gita quer dizer alguma outra coisa do que uma declaração? A pergunta é se o som da concha de Krishna é uma reação ao som da concha de Bheeshma. Não, é apenas uma resposta. O som da concha de Krishna é apenas uma réplica — não para a guerra ou para a luta, mas apenas como uma aceitação ao desafio. Seja lá o que esse desafio pudesse trazer, em que esse desafio pudesse se transformar, aonde esse desafio pudesse chegar, era aceito. Seria importante entender a natureza dessa aceitação um pouco mais. A vida é um desafio a cada momento, e aquele que não aceita esse fato está morto — apesar de ainda estar vivendo! Bernard Shaw costumava dizer que na verdade as pessoas morrem cedo, apesar de serem enterradas muito tempo depois. Quase quarenta anos se passam entre suas mortes e seus enterros. No momento em que uma pessoa deixa de aceitar o desafio da vida, ela morre — a partir desse momento. Viver significa aceitar os desafios a todo momento. Mas esse desafio também pode ser aceito de duas maneiras: pode ser com raiva, e então ela se torna uma reação; ou a aceitação pode ser com felicidade, prazer e alegria, e então se torna uma resposta. Devemos perceber que quando Bheeshma entoou sua concha, a descrição diz que ele o fez com prazer, causando respostas dos outros guerreiros. Uma grande alegria e exultação se espalharam quando ele entoou sua concha. Isso é aceitação. Seja lá o que a vida está trazendo... mesmo que seja a guerra, ela também é aceita. Se a guerra está levando alguém à guerra, essa guerra também é aceita. Certamente essa ação merece uma resposta. Consequentemente, Krishna e Pandavas entoam suas respectivas conchas. Também vale a pena pensar que o primeiro som vem do lado de Kauravas. O ônus pelo começo da guerra é de Kauravas. Krishna está apenas respondendo; do lado de Pandavas é apenas uma resposta. Se houver uma guerra, eles estão prontos para responder a ela — apesar de não terem nenhuma inclinação à guerra ou coisas do tipo. Os Pandavas também poderiam ter entoado a concha primeiro. Mas, não, essa responsabilidade grande, a responsabilidade de levar todos para a guerra, apenas os Kauravas poderiam ter. O início dessa guerra é muito simbólico. Há outra coisa a ser notada aqui: que é Krishna quem dá a resposta. Como Bheeshma começou um desafio do lado dos Kauravas, não parece adequado que Krishna seja quem responda. O adequado seria que os guerreiros assentados ali participassem da briga para responder. Krishna estava ali apenas como um cocheiro. Não é um soldado, nem estava ali
  • 23. para participar na batalha. Era o comandante do exército de Pandavas quem deveria ter respondido entoando sua concha. Mas não — e isso é muito significativo —, a resposta foi iniciada com o som da concha de Krishna. Isso simboliza que os Pandavas consideram essa guerra como nada mais do que uma responsabilidade imposta a eles pela existência. Eles estão prontos para a chamada que veio do todo. Estão dispostos a lutar apenas como instrumentos da existência. É por isso que a aceitação da guerra foi iniciada por Krishna. E está certo. Está certo até mesmo enfrentar a derrota enquanto se luta do lado da existência, e não está certo ser vitorioso quando lutando contra a existência. Mas para os Pandavas, até mesmo a derrota será uma alegria, até mesmo a derrota pode ser uma alegria — porque a batalha agora não é mais deles; se for de alguém, é da existência. Por isso não é uma reação; é uma resposta. Não há raiva envolvida nisso. Se Bheema tivesse tocado a concha, teria sido como reação. Se Bheema tivesse dado a réplica, certamente teria sido por raiva. Como a réplica veio de Krishna, vem na forma de uma aceitação feliz no sentido de: “Tudo bem, se a vida nos levou a um ponto onde a guerra se tornou imperativa, então nós nos entregamos às mãos da existência”. E então, Oh Senhor da Terra, o ótimo arqueiro, o rei de Kashi, o grande arqueiro comandante Shikhandi, Dhrishtaddumna e o rei Virata, e o invencível Satyaki, Rei Drupada e todos os filhos de Draupadi, e o forte filho de Subhadra, cada um deles tocou sua concha especial. E ressoando nos céus e na terra, o grande rugido tomou os corações dos filhos de Dhritarashtra. E então, Oh Rei, Arjuna, cuja bandeira trazia a crista de Hanumana, tendo olhado aos filhos de Dhritarashtra, armados com suas armas e prontos para atacar, pegou seu arco e dirigiu as seguintes palavras a Krishna: “Oh Ser Infalível,
  • 24. coloque minha charrete entre os dois exércitos, para que eu possa ver esses homens com clareza que estão aqui, ansiosos para lutar, e saiba quem são eles que estarão lutando comigo nessa guerra.” Arjuna está pedindo a Krishna que o deixe ver os homens com quem ele vai lutar. Há dois ou três pontos aqui que valem a pena ser compreendidos como a última coisa esta manhã. Todo o resto discutiremos à noite. Vamos primeiro examinar o pedido de Arjuna para que ele seja levado a um lugar de onde possa ver aqueles com quem vai brigar. Isso mostra que, para Arjuna, essa guerra é uma responsabilidade imposta a ele pelo exterior — não é um chamado vindo de seu próprio interior. É uma obrigação que está sendo forçada a ele; não é um desejo vindo de dentro. Para Arjuna, essa guerra é algo a que ele está sendo empurrado; não tem outra opção a não ser lutar. É por isso que ele está questionando, perguntando com quem ele vai lutar. Ele quer ver quem eles são — esses homens que querem tanto lutar, que querem tanto uma guerra. Uma pessoa que quer uma guerra não se importa se seu oponente quer lutar ou não. Uma pessoa que quer uma guerra é cega. Ela nunca olha para seu inimigo, apenas projeta seu inimigo. Ela não quer ver seu oponente; na verdade, todas as pessoas que encontra são inimigos. Ela não precisa ver o inimigo; ela cria, ela projeta o inimigo. Quando uma batalha está se formando por dentro, os inimigos aparecem por fora. Apenas quando não existe guerra uma pessoa sente a necessidade de investigar quem quer uma guerra e está pronto para ela. Então Arjuna pede a Krishna que coloque sua charrete em um ponto estratégico de onde ele possa ver quem está lá, pronto para lutar. Em segundo lugar, a principal regra da guerra é conhecer bem o inimigo com quem se vai lutar. Em todas as guerras, em todas as guerras da vida — internas ou externas — identificar o inimigo, entender o inimigo é a regra principal. Apenas aqueles que conhecem e entendem bem o inimigo conseguem vencer as guerras. É por isso que o provocador não consegue vencer as guerras. Ele está tão envolto na fumaça de seu próprio desejo por guerra que é difícil para ele conhecer o inimigo. Sua vontade de entrar na guerra é tanta que ele tem dificuldade de conhecer e entender o inimigo com quem ele está lutando. E se você não conhece seu oponente, então está fadado a perder desde o começo. Assim, a calma e a compostura necessárias em tempo de guerra para se ganhar a guerra são mais necessárias do que em qualquer outro momento. A capacidade de testemunhar, necessária no tempo de guerra para ganhar a
  • 25. guerra, é maior do que em qualquer outra situação. Arjuna está dizendo: “Deixe- me ver, deixe-me observar do estado de uma vítima aqueles que vieram lutar”. Isso precisa ser compreendido. A observação está em seu mínimo quando você está bravo. Quando está com raiva, a capacidade de observar é quase totalmente perdida. E o fato é que a capacidade de observar se faz mais necessária quando você está bravo. A ironia é que se há observação, não há raiva, e vice-versa. As duas não conseguem estar presentes simultaneamente. Se uma pessoa que está brava fica interessada em observar, a raiva desaparecerá. Arjuna não está bravo aqui; é por isso que ele consegue falar sobre observar. O que ele está dizendo não é motivado pela raiva. É como se a guerra fosse um assunto à parte para Arjuna. Ela não o afeta de maneira alguma; ele só quer observar como uma testemunha que foi à luta, que está ansiosa para lutar. A frase a respeito da observação é muito valiosa. Sempre que uma pessoa vai a qualquer guerra — seja ela com inimigos internos ou externos — a observação correta é a primeira coisa a ser seguida. Mesmo que você vá lutar com inimigos internos, a observação correta é o primeiro passo. Em primeiro lugar a pessoa deve ver bem com quem ela lutará. Se a briga será contra a raiva, olhe para a raiva; se vai ser contra o sexo, olhe para o sexo; e se vai ser contra a ganância, então olhe para a ganância. Mesmo que alguém tenha de enfrentar uma luta externa, primeiro deve olhar para quem vai ser seu oponente. Quem é essa pessoa? Uma observação detalhada desse tipo só é possível quando a pessoa tem a capacidade de ser uma testemunha. Caso contrário, isso não é possível. Então, o Gita agora está prestes a começar. O palco está montado. Mas olhando para esse sutra parece que mesmo a pessoa que ainda não conhece o resto da história do Gita, mas compreende o que a observação significa, pode muito bem dizer — simplesmente baseando-se nesse sutra — que será muito difícil para Arjuna lutar, que ele não será capaz de lutar, que ele certamente terá dificuldades na luta. Aquele que está pronto para observar terá dificuldades na luta. Como está observando, não conseguirá lutar. Para lutar, os olhos da pessoa têm de ficar fechados, para lutar uma pessoa tem de estar enlouquecida — não pode haver espaço para nenhuma observação. Assim, mesmo sem mais conhecimento a respeito do Gita, qualquer um que entenda o fenômeno da observação pode dizer, olhando para esse sutra, que esse homem, Arjuna, não é confiável; esse homem não é confiável em relação à guerra — porque quando olhar, achará tudo sem sentido. Qualquer pessoa que observar achará tudo tão fútil que sentirá vontade de fugir de tudo.
  • 26. O que Arjuna está dizendo mostra claramente como estava sua mente. Nessa frase, ele está mostrando o que se passa em sua cabeça com bastante clareza. Ele não está dizendo que está ansioso para lutar: “Ó, meu cocheiro, leve-me a um lugar onde eu possa destruir meus inimigos da melhor maneira”. Arjuna não está dizendo isso — apesar de esperarem que ele dissesse. Em vez disso, ele está dizendo: “Leve-me ao lugar onde eu possa ver quem veio para a guerra e onde eu possa ver quão ansiosos eles estão para essa guerra”. Essa análise de suas palavras mostra que ele é um homem de reflexão — e um homem de reflexão tem a possibilidade de cair na indecisão. Apenas aqueles que não param para pensar como Bheema ou Duryodhana, ou que estão em um estado de “não-pensamento” como Krishna, podem lutar em uma guerra. A reflexão, o pensar, é um estágio entre os dois. Esses são os três estados. A falta de pensamento é um estado anterior ao estado do pensar. A guerra é uma coisa muito fácil nesse estado. Não é preciso fazer nada para entrar em uma guerra: um homem com esse estado mental está na guerra o tempo todo. Mesmo quando esse homem ama, ele se mostra não ser nada além de uma guerra. Mesmo quando esse homem ama, seu amor não passa de ódio. Mesmo quando um homem como esse tem uma amizade, ela não passa de um passo em direção a uma inimizade. Afinal, para ter um inimigo, uma pessoa tem primeiro de ter um amigo. É difícil ter um inimigo sem ter um amigo. Por isso, mesmo quando uma mente que não se preocupa em pensar faz uma amizade, apenas a inimizade pode sair dela. A guerra é uma ocorrência natural nesse estado. O segundo estado é aquele de pensar, de refletir. Pensar é sempre indeciso, está sempre balançando. Arjuna está nesse segundo estágio. Aqui ele está dizendo: “Deixe-me observar. Deixe-me ver e entender. Então eu posso entrar na guerra”. Alguém neste mundo já entrou em alguma guerra depois de olhar e entender? Olhar e entender podem abrir caminho para a fuga da guerra, e não para o ingresso nela. Krishna está no terceiro estágio. É o estado do não-pensamento. O pensamento também está ausente aqui, mas não é um estado de falta de pensamento. A falta de pensamento e o não-pensamento parecem ser similares, mas há uma diferença fundamental entre os dois. O homem de não-pensamento é aquele que, percebendo a futilidade de pensar, foi além dele. Pensar revela a futilidade de tudo: até mesmo da vida, até mesmo do amor, até mesmo da família, da riqueza, até mesmo do mundo, até mesmo da guerra. Mas se uma pessoa continua pensando, então, no final, esse pensamento mostra a futilidade de pensar. E é nesse ponto que a pessoa entra no estado de não- pensamento. Então, nesse estado de não-pensamento tudo se torna possível para essa pessoa — da mesma maneira que é para a pessoa com falta de
  • 27. pensamento. Mas a qualidade dessa pessoa e de suas ações é diferente. Ela é como uma criança pequena. Quando alguém se prende à santidade na idade avançada, ela volta a ser como uma criança. No entanto, a semelhança entre a santidade e a criança existe apenas por fora. Os olhos de um sábio se tornam tão inocentes quanto os de uma criança, mas em uma criança tudo ainda está parado, ainda está para se manifestar. Assim, uma criança é um vulcão: ainda não explodiu, mas essa é a única diferença. Sua inocência é superficial: por baixo, tudo está ficando pronto para explodir. As sementes estão germinando por dentro: estão brotando. Sexo, raiva e inimizade — tudo aparecerá com o tempo. Agora, tudo está sendo preparado. Uma criança é uma bomba-relógio: vai demorar um pouco e depois vai explodir. Mas um sábio foi além de tudo isso. Todas aquelas sementes que deveriam brotar dentro dele, brotaram, e ao se mostrarem fúteis, foram abandonadas. Agora não resta nada por dentro: seus olhos voltaram a ficar inocentes; tudo se tornou puro novamente. Alguém perguntou a Jesus quem herdaria seu reino do céu. Ele respondeu: “Aqueles que são como as crianças”. Jesus não disse aqueles que forem crianças — porque as crianças não podem herdar. Ele disse aqueles que são como as crianças, não aqueles que são crianças. Então uma coisa está clara: aqueles que não são crianças, mas que são como as crianças poderão herdar. Se as crianças pudessem entrar no céu, então não haveria problema: todos entrariam. Não, as crianças não podem entrar; apenas aqueles que são como as crianças, que têm transcendido, podem entrar. Então existe uma grande semelhança entre um homem ignorante e um homem de compreensão suprema. O homem de compreensão suprema torna-se tão simples quanto um ignorante. No entanto, por dentro da simplicidade do ignorante, uma complexidade ainda está escondida, que pode se manifestar a qualquer momento. O homem de suprema compreensão é aquele que perdeu toda a complexidade. A pessoa com falta de pensamento ainda pode pensar. Um dia ela pensará: o poder do pensamento ainda está dentro dela. Mas aquele que atingiu o ponto de não-pensamento transcendeu aos pensamentos: entrou na meditação, entrou no samadhi, na meditação suprema. É esse o problema que vai se apresentar ao longo do Gita. É o conflito interno que se manifestará por meio do Gita. Arjuna pode entrar na guerra apenas de duas maneiras: pode ter a falta de pensamento e entrar, ficando onde Duryodhana e Bheema estão, ou pode ir ao ponto onde Krishna está em pé e se tornar um homem de não-pensamento. Então ele pode entrar na guerra.
  • 28. Mas se Arjuna permanecer como está — indeciso, preso ao pensamento — ele irá à floresta, não vai à guerra. Ele vai escapar, vai fugir. Discutiremos o restante à noite.
  • 29. 2 As Raízes da Violência “Eu gostaria de ver aqueles que estão aqui, prontos para lutar, e esperando que o filho perverso de Dhritarashtra apareça.” Sanjay: Assim, guiado por Arjuna, Krishna posicionou sua suprema charrete entre os dois exércitos bem de frente a Bheeshma, Drona e os outros dominadores, e disse: “Veja, Arjuna, esses Kurus posicionados aqui.” Assim Arjuna viu os tios, os avôs e mestres, tios por parte de mãe, irmãos, filhos, e netos, assim como compadres, posicionados ali. Também sogros e amigos nos dois exércitos. Vendo todos aqueles conhecidos prontos, Arjuna superou sua piedade, e disse as seguintes palavras com grande angústia: “Ó Krishna, vendo meus próprios homens diante de mim, prontos para lutar, “Meus membros perdem a força, minha boca fica seca, meu corpo treme, e com esse terrível sentimento de medo os pêlos de meu corpo se arrepiam. “Meu arco, Gandiva, escorrega de minha mão; minha pele arde. Não consigo ficar em pé. Minha mente parece confusa. “Oh Krishna, vejo que todos os presságios se opõem a isso, e eu não vejo nenhuma virtude em matar minha própria gente em batalha. “Não desejo vencer, Ó Krishna, nem pelo reino, nem pelos seus prazeres. De que, Ó Krishna, os prazeres desse reino nos servirão,
  • 30. ou mesmo a vida?” Arjuna não é obcecado pela guerra, mas também não é contra ela. E não tem aversão à violência. Na verdade, toda a educação e todo o treinamento, todo o seu condicionamento adquirido ao longo da vida são para a violência e para a guerra. Mas vale a pena entender que quanto mais violenta for a mente, mais cheia de envolvimento ela será. A violência e o envolvimento vivem juntos, lado a lado. Uma mente não violenta transcende as fixações. Na verdade, a pessoa que deseja não ser violenta tem de abandonar a idéia do envolvimento. A simples idéia de “meu” é violenta, porque assim que eu digo “meu”, eu começo a me separar do que não é meu. Assim que me refiro a alguém como um amigo, comecei a tornar alguém meu inimigo. Assim que passo uma linha ao redor daqueles que são meus, também desenho uma linha ao redor daqueles que são desconhecidos. Toda violência é um resultado da limitação criada entre aqueles que são “meus” e aqueles que são de fora, “não meus”. É por isso que Arjuna de repente ficou fraco, incapaz. Todos os seus membros falharam: não porque ele repentinamente se tornou avesso à guerra ou porque descobriu alguma coisa errada com a violência que estava prestes a ocorrer, ou porque um pensamento de não-violência repentinamente tomou conta de sua mente. Arjuna ficou fraco porque por um momento sua mente foi agarrada pelo outro lado, pelo lado oposto da violência; por seu componente muito mais profundo, por sua base fundamental. Sua mente foi tomada pelo sentimento de posse, de envolvimento. A posse, o envolvimento, não passam de violência. Será difícil entender o papel do Gita sem entender isso primeiro. Para aqueles que não conseguem entender esse ponto, parece que Arjuna estava realmente se inclinando à não-violência e que Krishna o forçou à violência. Se uma pessoa estivesse inclinada a não ser violenta, Krishna nunca a forçaria a ser violenta. Na verdade, mesmo que Krishna quisesse fazer isso, não conseguiria. A situação aqui é que Arjuna não está nem um milímetro propenso à não- violência. A mente dele se moveu e está presa no ponto fundamental da violência. A posse nada mais é que a base da violência. Arjuna viu sua gente — seus entes queridos, seus parentes. Se eles não fossem seus entes queridos e parentes, Arjuna os teria assassinado como se fossem animais — mas ele teve dificuldades para fazer isso porque aquela era sua própria gente. Se eles lhe fossem estranhos, ele não teria o menor problema em cortá-los em pedacinhos.
  • 31. A não-violência só pode nascer na consciência de uma pessoa que tenha ultrapassado o sentimento de “meu” e “seu”. A razão por trás da mente confusa de Arjuna não é que ele tenha sido atraído pela não-violência, mas sim que ele tocou a base da violência. É natural que a base, a pedra fundamental da violência apareça em um momento de crise. Se os inimigos lhe fossem estranhos, Arjuna sequer teria percebido que era uma pessoa violenta e que estava fazendo algo errado ao matá-los. Ele nunca teria sentido que a guerra era contra a religiosidade. Seus membros não teriam enfraquecido; pelo contrário, ao ver aqueles inimigos, seus membros teriam ficado ainda mais fortes. Sua flecha teria sido posicionada no arco, suas mãos teriam agarrado a espada — ele teria ficado extasiado, feliz. Mas, naquele momento, Arjuna ficou totalmente triste, e nesse estado de tristeza ele encontrou a verdadeira base da violência que existia dentro dele. O que ele viu no momento da crise foi a posse. É surpreendente o fato de só conseguirmos enxergar as profundezas de nossas mentes nos momentos de crise. Não vemos essas profundezas nos momentos comuns. Nos momentos comuns vivemos de modo comum. É apenas nos momentos extraordinários que o que está escondido na parte mais profunda de nossos seres começa a se manifestar. Arjuna viu “minha gente”. Naquela situação horrorosa de guerra, naquela urgência da guerra — quando o combate estava prestes a começar — ele vê “minha gente”. Se Arjuna tivesse dito: “A guerra é inútil, a violência é inútil”, o livro Gita nunca teria surgido. Mas Arjuna diz o seguinte: “Nossa própria gente está pronta para lutar e meus membros perdem a força quando penso em matá- los”. Na verdade, é natural que uma pessoa que construiu sua vida na base da possessividade perca a força ao pensar em matar as pessoas que conhece. Uma morte ocorre em nosso bairro, mas não toca os corações das pessoas. As pessoas simplesmente dizem: “O pobre homem morreu”. Somos incapazes de esquecer com tanta facilidade quando o mesmo acontece em nossos lares, quando um “dos nossos” morre, nós também morremos, uma parte de nós morre. Nós tínhamos um investimento nessa pessoa que morreu, nós ganhávamos alguma coisa com a vida dessa pessoa. Essa pessoa ocupava um certo espaço em nossos corações. Por isso, quando uma esposa morre, não é apenas a esposa que morre. Alguma coisa no marido também falece. A verdade é que o marido passou a existir quando a esposa passou a existir. Antes disso não havia um marido e uma esposa. Quando um filho morre, algo na mãe também morre — porque a mulher só se tornou mãe no nascimento de seu filho. Com o nascimento de um filho, a mãe também nasce, e quando um filho morre, a mãe também morre. Nós estamos ligados àquela pessoa que chamamos de nossa. Quando essa pessoa morre, também morremos.
  • 32. Não é de surpreender que quando Arjuna viu sua própria gente se preparando para a guerra, ele tenha tido a sensação de estar cometendo suicídio. Não é a idéia da morte dos outros o que choca Arjuna. É a idéia de sua própria morte, a possibilidade de uma experiência suicida, que o deixou trêmulo. Ele sentiu: “Onde ficarei se a minha gente morrer?”. Vale a pena pensar um pouco nisso. Nosso “eu” nada mais é do que um nome da soma total que chamamos de “nossa gente”. O que chamamos de “eu” é o nome para todos os acúmulos de “meu”. Se todos aqueles que são “meus” forem embora, então eu não existirei mais, não vou conseguir permanecer. Esse meu “eu” está envolvido em parte com meu pai, em parte com minha mãe, em parte com meu filho, em parte com meu amigo... com todas essas pessoas. Mais surpreendente ainda é que esse “eu” não está relacionado apenas com aqueles que chamamos de nossos, mas também com aqueles a quem consideramos desconhecidos e “não-meus”. Apesar de esse envolvimento não ser de nosso círculo, mesmo assim existe. Por isso, quando meu inimigo morre, eu também morro um pouco, porque não vou conseguir ser exatamente o mesmo que eu era enquanto meu inimigo estava vivo. Até mesmo meu inimigo contribui com algo em minha vida. Ele era meu inimigo. Podia ser um inimigo, mas era meu inimigo. Meu “eu” estava relacionado com ele também: sem ele eu serei incompleto. Se Arjuna tivesse encontrado outras pessoas com quem teria de guerrear e a quem teria de assassinar, o caso seria bem diferente. Mas o que ele viu, no fundo, foi: “Na verdade, não vou matar ninguém além de mim mesmo. Seria suicídio. Qual seria a razão em continuar vivendo se todos os ‘meus’ morressem? Mesmo que eu ganhasse tudo, nada teria o menor valor se nenhum dos ‘meus’ estivesse vivo”. Isso vale a pena ser analisado mais profundamente. Tudo que acumulamos é menos para nós mesmos do que para aqueles que chamamos de “nossos”. A casa que construímos é menos para nós mesmos do que para aqueles que chamamos de “nossos” — para os “nossos” que viverão nela, pelos “nossos” que vão admirá-la e elogiá-la — e para os “nossos” e os “outros” que ficarão cheios de inveja e que queimarão de inveja. Mesmo que a mais bela mansão do mundo seja minha, e nenhum dos “meus” esteja por perto para vê-la — seja como amigos ou inimigos —, vou descobrir que essa mansão vale menos que uma cabana. Isso porque a mansão é apenas uma fachada: na verdade ela é apenas uma maneira de eu impressionar os “meus” e aqueles que não são os meus. Se ninguém estiver por perto, quem eu vou impressionar? As roupas que você usa são mais para impressionar os olhos dos outros do que para cobrir seu corpo. Tudo perde o sentido quando estamos sozinhos. Descemos de tronos com muito menos prazer do que sentimos quando subimos
  • 33. neles — ninguém sentiu prazer por apenas ocupar o lugar em um trono —, do que pelo bem de todo o carisma que você é capaz de gerar entre “os seus” e pelos “outros” quando está no trono. Você permanece sentado no trono, mas se todas as pessoas perto dele desaparecerem, você perceberá que ficar sentado no trono perdeu a graça. Vai descer dele e talvez nunca mais volte a ocupá-lo. Naquele momento, Arjuna sentiu: “Essa é minha gente que se encontra dos dois lados. É a minha própria gente que vai morrer — então para que serve a vitória?”. A vitória nunca é desejada simplesmente para vencer. O verdadeiro interesse da vitória dá-se na realização pessoal que ela nos dá entre os “nossos”, assim como entre os “outros”. “Posso ganhar o império todo, mas qual será a vantagem?” Não vai ter o menor valor. A angústia que tomou conta da mente de Arjuna deve ser compreendida corretamente. Essa angústia é o produto de uma mente violenta. E foi por causa dessa angústia que Krishna teve de dar a Arjuna tantos empurrões. Se uma pessoa como Mahavira estivesse na situação de Arjuna, o assunto teria sido encerrado ali mesmo: não seria prolongado nem um minuto mais. Se tivesse acontecido com alguém como Mahavira, talvez tal situação nunca tivesse se formado. Talvez Krishna não dissesse nada a uma pessoa como Mahavira — não faria sentido. O assunto todo seria encerrado sem que nada precisasse ser dito. A verdade é que o Gita é menos sobre o que Krishna disse e mais sobre o que Arjuna fez Krishna dizer. Seu verdadeiro autor é Arjuna, e não Krishna. O estado da mente de Arjuna se tornou a base do Gita. E está muito claro a Krishna que um homem violento alcançou o topo filosófico de sua violência, e na raiz de toda a sua conversa sobre fugir da violência está a mente violenta. O dilema de Arjuna não é o dilema de um homem não violento tentando fugir da violência. O dilema de Arjuna não é o dilema de um homem violento tentando fugir da violência. Essa verdade precisa ser compreendida. A possessividade não passa de violência. É uma violência mais profunda. No momento em que eu chamo alguém de “meu”, a possessividade tem início. A possessividade é uma forma de violência. O marido chama a esposa de “minha”; a possessividade começou. A esposa chama o marido de “meu”; a possessividade começou. Mas quando nos tornamos donos de alguém, estragamos ali mesmo a alma dessa pessoa. Acabamos de matá-la; destruímos a pessoa assim que dizemos ser donos dela. Na verdade, ao possuirmos uma pessoa, a estamos tratando como um objeto, e não como um indivíduo. Então uma esposa se torna “minha” da mesma maneira que uma casa é minha. Naturalmente, sempre que existe a relação de “meu”, o amor não é o resultado. O que se manifesta é apenas o conflito.
  • 34. É por isso que neste mundo, enquanto um marido e uma esposa ou um pai e um filho continuarem acreditando que são donos um do outro, apenas o conflito pode existir entre eles — e nunca a amizade. A afirmação de tal posse é a causa da destruição da amizade. Tal afirmação de posse estraga tudo, torna tudo violento. Quando existe a afirmação de posse, apenas o ódio é criado; e onde há ódio, a violência está fadada a aparecer. É por isso que todos os nossos relacionamentos se tornaram relações de violência. Nossas famílias se tornaram relações de violência. Então, aqui, ver onde ele próprio estaria se toda a sua gente fosse destruída, ver a futilidade de ser vitorioso — de ter o reino e tudo que viesse com ele, mas com sua própria gente aniquilada — não tornou Arjuna uma pessoa não violenta. Se isso tivesse acontecido, Krishna o teria abençoado e pedido para que fosse embora, e o assunto teria se encerrado. Mas, como ele está falando em termos de “eu” e “meu”, Krishna sabe que Arjuna é um homem totalmente violento, e que sua conversa a respeito da não-violência é pura falsidade. Se alguém fala com termos de “eu” e em favor da não-violência, saiba que essa não-violência é falsa — porque a flor da não-violência nunca nasce no solo do “eu” e do “meu”. Uma vida sem violência nunca se desenvolve a partir da base do “meu”. OSHO, Arjuna foi ao campo de batalha, viu seus parentes, professores e amigos e ficou cheio de pesar. Ele sentiu uma angústia... sua mente era violenta. Ao mesmo tempo, Duryodhana, Yudhishthira, Dronacharya e muitos outros cujos parentes e amigos estavam lá e cujas mentes estavam repletas de violência e posse estavam no campo de batalha, também. Por que, então, apenas Arjuna sentiu essa angústia? Isso é verdade. Duryodhana certamente estava lá, assim como os outros guerreiros — então por que eles não sentiram angústia? Eles também estavam tomados pelo sentimento de “meu”, também estavam repletos de violência, mas não sentiram angústia. Existe uma razão para isso. A violência pode ser cega e impensada. Mas a violência também pode ter olhos e pode ser pensativa, assim como o sentimento de posse. Como eu disse essa manhã, o problema de Arjuna é que ele pensa. É um homem racional. Pensar nos coloca em um dilema, e foi pensar o que colocou Arjuna em um dilema. Duryodhana também pode ver, mas a violência dentro dele é tão cegante que ele é incapaz de perceber que se entregando à violência ele destruirá todos aqueles que, ausentes, farão com que o resultado de sua violência perca o sentido. Em sua cegueira não consegue ver esse fato.
  • 35. Arjuna não é tão cego. E é por isso que ele é especial, único, nesse campo de batalha. Ele é especial, pois apesar de sua preparação e criação terem sido as mesmas de Duryodhana, a preparação de sua mente é diferente. Ele tem uma mente capaz de pensar e duvidar. Ele pode duvidar, pode questionar e levantar questões. Ele tem as chaves fundamentais do questionamento. E nossas maiores perguntas não são aquelas que fazemos a respeito do universo. Nossas maiores questões são aquelas nas quais perguntamos quem criou o universo. Nossas maiores perguntas não são aquelas que envolvem saber se Deus existe ou não. Nossas maiores questões são aquelas que nascem de nosso conflito interno, de nosso dilema mental. Mas é preciso pensar, refletir e contemplar para vermos os conflitos e dilemas de nossa própria mente. Arjuna é capaz de pensar, é capaz de ver a violência que vai cometer ao matar aquelas pessoas, algo que não teria justificativa para a aplicação da violência. Arjuna não é cego, e esse fato é sua aflição e bênção, ao mesmo tempo. É bom que entendamos isso. Arjuna não é cego: esse é seu problema. Duryodhana não tem problemas — a guerra é uma paixão para ele. Para Arjuna, a guerra se tornou uma crise e uma aflição, que de modo diferente também lhe é uma bênção. Se ele conseguir superar essa crise, ele entrará em um estado de não-pensar. Se conseguir superar essa crise, vai chegar ao ponto de se entregar ao todo. Se conseguir superar essa crise, vai chegar ao ponto de renunciar a essa posse. Mas se não conseguir superar essa crise, então essa guerra será uma terrível crise para ele e o transformará em um esquizofrênico. Nesse caso, ou ele vai fugir ou vai lutar sem querer, e ser derrotado. Uma batalha que é enfrentada com relutância está fadada à derrota — porque lutar relutantemente quer dizer que metade da mente está fugindo enquanto a outra metade está envolvida na briga. Para aquele que está indo em duas direções dentro de si mesmo, a derrota é certa. Então Duryodhana será o vencedor, porque estará lutando com uma mente sem divisões. Apesar de estar caindo em um buraco, o faz com a mente decidida; apesar de estar adentrando a escuridão, ele o faz com a mente decidida. Na verdade, apenas dois tipos de pessoa conseguem entrar na escuridão com a mente decidida. Um é o cego — porque não há diferença para ele se existe luz ou não — e o outro é quem tem a luz de consciência — porque então sua própria existência afastará a escuridão. Arjuna deveria se tornar como Duryodhana, indo do pensar à irracionalidade, e ir para a guerra, ou se tornar como Krishna, e sair do pensar para o não-pensar — tornando-se tão iluminado e tão repleto de força interior que ele possa dizer frases como “ninguém morre, ninguém é morto”.
  • 36. Só então ele poderá ver que todas essas coisas acontecendo ao seu redor são mais que um sonho. Então ou ele pode entrar na guerra vendo uma grande verdade de tamanha imensidão como essa, ou ele pode entrar na guerra submetendo-se a uma grande mentira, de que ele alcançará a felicidade matando as pessoas que estão na guerra. Arjuna pode se livrar da ansiedade submetendo-se à mentira de Duryodhana ou assumindo a verdade de Krishna. Então Arjuna é uma tensão. Nietzsche disse, em algum momento, que o homem é uma ponte, um elo ligando duas costas diferentes. Ele é uma tensão. Ou ele se torna um animal e encontra o prazer, ou pode se tornar divino e ter alegria. Mas, enquanto continuar sendo um ser humano, não poderá ter nem prazer nem alegria — pode simplesmente se dividir entre os dois; permanecerá repleto de ansiedade e tensão. É por isso que fazemos as duas coisas na vida. Bebemos e nos transformamos em animais. Isso nos dá um pouco de prazer. O sexo dá um pouco de prazer — voltamos para o estado animal. Encontramos prazer na irracionalidade. A principal razão pelas quais as pessoas gostam tanto de álcool é porque ele as ajuda a se tornarem animais novamente. Nós nos colocamos no mesmo patamar dos animais quando nos embriagamos. Nesse patamar nos transformamos em animais livres, porque os animais não têm preocupações. Nenhum animal fica maluco, exceto aqueles que trabalham em circos, porque os animais de circo chegam muito próximos ao estado do homem. E o homem está muito próximo ao estado de um animal de circo. Nenhum animal é maluco; nenhum animal enfrenta problemas como psicose, preocupação, ou uma doença como a insônia. Nenhum animal se suicida — porque para se cometer suicídio é preciso que muita ansiedade se acumule. É interessante o fato de nenhum animal sentir tédio. Um búfalo mastiga a mesma grama o dia todo e não se sente entediado. Não há como ele ficar entediado, pois um estado de racionalidade se faz preciso para que haja o tédio. É por isso que, entre os seres humanos, quanto mais racional uma pessoa é, mais entediada ela se sente. Quanto mais racional uma pessoa é, mais preocupada ela se torna. As pessoas mais racionais facilmente podem se tornar loucas ou malucas. Mas esse é apenas um lado. O outro lado é que a pessoa que consegue transcender o estado de insanidade potencial pode se tornar livre, e aquela que consegue transcender o estado de ansiedade consegue se ligar a um estado alegre e consciente — estado livre. E a pessoa que consegue ir além da tensão consegue obter uma experiência de relaxamento que acontece apenas ao relaxar na divindade, no todo.
  • 37. Arjuna é o símbolo do homem, Duryodhana é o símbolo do animal, e Krishna é o símbolo da divindade. Assim existem três símbolos no campo de batalha. Arjuna não está parado; está em um estado trêmulo que se encontra entre os estados de Duryodhana e Krishna. Ele pode alcançar a liberdade; pode se sentir confortável se se tornar um Duryodhana ou um Krishna. Isso não será possível enquanto ele permanecer um Arjuna. Ao permanecer um Arjuna, existe a tensão, existe a dificuldade. Sua dificuldade é exatamente esta: ele não pode se tornar Duryodhana, e não consegue se tornar Krishna. E, ao mesmo tempo, não pode continuar sendo quem é, pois é um estado efêmero: não é possível ser assim por muito tempo. Nenhuma ponte deve ser feita dentro de uma casa. Quando Akbar construiu Fatehpur Sikri, ele escreveu em uma ponte: “Uma ponte deve servir de passagem, não de moradia”. Isso é verdade. Qualquer pessoa que faça de uma ponte a sua casa, terá dificuldades. Uma pessoa pode voltar a um desses dois estados: pode se tornar um animal ou pode se tornar divino. Mas uma coisa é certa: permanecer um ser humano não é o destino do homem. Ser um ser humano é estar em crise. O homem não é o fim. Que fique claro que o homem não é animal, nem divino. Ele não é capaz de ser animal, pois já passou desse estágio, e não é divino porque ainda não chegou tão longe. O homem é simplesmente uma existência entre o divino e o animal. Nós tocamos essas extremidades muitas vezes ao longo do dia. Na raiva, uma pessoa toca o animal, na paz, ela toca a divindade. Durante essas vinte e quatro horas nós passamos diversas vezes entre o céu e o inferno, muitas vezes. Em um momento estamos no céu, e no seguinte, no inferno. Quando estamos no inferno, tentamos subir ao céu. Assim que chegamos ao céu, começamos a descer de volta para o inferno. A tensão, por sua própria natureza, cria uma atração ao oposto. Peguemos como exemplo o pêndulo de um relógio. Quando ele vai para a esquerda, parece que ele só vai para a esquerda. Mas aqueles que entendem de ciência sabem que enquanto o pêndulo vai para a esquerda, ele está juntando o momentum para ir para a direita. Está juntando energia para ir tão longe à direita quanto foi para a esquerda. Na verdade, só vai para a esquerda para poder ir para a direita, e só está indo para a direita para poder ir para a esquerda. O homem constantemente se move como um pêndulo entre o animal e o divino. Arjuna é o símbolo do homem — principalmente do homem de hoje. A consciência do homem moderno é exatamente como a consciência de Arjuna. É por isso que as duas coisas são simultaneamente evidentes no mundo de hoje. Por um lado o homem está disposto a elevar sua consciência a samadhi, à superconsciência, e por outro, ele está disposto a levá-la ao nível animal com a
  • 38. ajuda de LSD, mescalina, maconha, álcool e sexo. Geralmente, a mesma pessoa parece estar fazendo as duas coisas. A pessoa que vai à Índia à procura de espiritualidade continuará fazendo uso de LSD nos Estados Unidos. Ela faz as duas coisas simultaneamente. Em seu estado inconsciente o homem pode se tornar um animal. No entanto, não é possível manter-se inconsciente por muito tempo — porque mesmo os prazeres do inconsciente são experimentados apenas no estado consciente. Nem mesmo os prazeres do inconsciente são experimentados no estado inconsciente. O prazer da bebida não é sentido quando uma pessoa está embriagada; ela só o sente quando fica sóbria. Quando está dormindo, não percebe o prazer de dormir; só depois que acorda de manhã é que reconhece como seu sono foi bonito e relaxante. Para sentir o prazer do inconsciente é preciso voltar ao estado consciente. Arjuna representa a consciência humana, e é por isso que ele é tão especial. E o Gita é tão especial porque ilustra a base do estado mais profundo da mente do homem: a constante luta de Krishna com esse estado, que é representada em Arjuna; esse diálogo, esse debate que Krishna está tendo com Arjuna; os enormes esforços de Krishna para direcionar Arjuna novamente ao divino — e os membros de Arjuna constantemente falhando, enquanto ele volta ao estado animal... Essa luta interna é um fardo para Arjuna, mas não para Duryodhana. Duryodhana não se importa com nada no mundo. Se Arjuna fosse como Duryodhana, ele também não se importaria com nada no mundo. Mas eles não são iguais. Existem aqueles contra nós que, como Duryodhana, não se importam com nada. Eles estão construindo casas, estão assumindo os tronos de Delhi e outras capitais, estão ocupados ganhando dinheiro. Mas aqueles que são como Arjuna não têm descanso e são preocupados. Sem descanso, porque onde estão não parece um bom lugar para se fazer uma casa. Eles evoluíram muito de onde começaram, por isso não é possível regredir, mas eles nada sabem sobre o lugar que ainda não alcançaram. Como eles chegam lá, onde o templo sagrado está? Eles não têm a menor idéia em relação a isso. Um homem de religiosidade inevitavelmente vai se encontrar em uma crise. Um homem não religioso não se sente em crise. Em comparação com um homem sentado em uma prisão, um homem sentado em um trono parece mais preocupado. O homem sentado na prisão aparenta menos preocupação; ele não tem nada com que se importe no mundo. Ele está de um lado, na costa. Não está na ponte. De certa maneira, ele pode parecer sortudo, de causar inveja. Ele é tão livre! Mas escondido nessa sorte dele existe um azar profundo. Ele permanecerá em sua margem. Nem uma faísca de humanidade nasceu nele ainda. O problema, a angústia começa com o ser humano — pois nesse estado de ser humano as portas da possibilidade de alcançar a divindade se abrem.
  • 39. Arjuna não quer se tornar um animal — e essa situação poderia torná-lo um animal —, mas ele não faz a menor idéia sobre como se apegar à divindade. É por isso que ele está perguntando e levantando questões; é por isso que sua procura está surgindo. A religiosidade pode nascer em qualquer pessoa que tenha perguntas em sua vida, que tenha procuras, um descontentamento. A religiosidade não tem a possibilidade de entrar na vida de alguém cuja vida não tenha ansiedade, perguntas, dúvidas, questionamentos ou descontentamentos. A semente que está se abrindo para poder germinar certamente sentirá ansiedade. A semente é algo duro, o broto é muito delicado; a semente é muito livre, o broto enfrenta grande ansiedade. Passando pelas pedras, rompendo o solo, uma coisa tão delicada como o broto sai para um mundo desconhecido e nada familiar, um mundo com o qual não está acostumado. Uma criança pode arrancá-lo, um animal pode comê-lo, qualquer pessoa pode pisar nele. O que acontecerá ou não a um broto... nada é certo a respeito disso. Por outro lado, se a semente se mantiver fechada, ela estará completamente segura e protegida, livre — sem perigos desconhecidos. Fechada em si mesma. Duryodhana é como uma semente fechada, sem se importar com nada; Arjuna é como um broto, preocupado, sem descanso. Ele é ansioso para saber o que vai acontecer daqui a pouco: as flores virão ou não? Ele deixou de ser apenas uma semente, mas será que as flores aparecerão agora? Ele está ansioso para crescer, ansioso para florescer e é essa ânsia que faz com que ele pergunte coisas a Krishna o tempo todo. Portanto, existe ansiedade e perguntas na mente de Arjuna — mas não na mente de Duryodhana. OSHO, Como o homem está sempre enfrentando dilemas interiores, qual deveria ser sua base para superá-los? Como podemos transformar esse estado de dilema interior em crescimento? E qual deveria ser o fator principal e fundamental quando procuramos a resolução de um dilema interior? Arjuna está enfrentando a mesma questão, e ele também quer resolvê-la da maneira com que todos os homens geralmente fazem. Estar em um dilema é a natureza do homem — não da alma, não do corpo, mas do homem. Se uma pessoa tenta resolver esse dilema de forma drástica, ela volta ao estado animal. Leva a pessoa para trás. É um caminho familiar: é fácil de voltar. Passar pelo estado de conflito interior é uma disciplina verdadeira para o autocrescimento. Passar com paciência por um estágio de conflito interior é um ascetismo verdadeiro, apenas superando esse dilema uma pessoa pode transcendê-lo. Por isso, se alguém toma uma decisão drástica, uma decisão drástica apenas para evitar o dilema interior, esse tipo de decisão não ajudará. Ela vai falhar, vai regredir.
  • 40. Os animais são muito definidos; não têm dúvidas. Vivem na certeza, são muito confiantes. Parecem ser grandes crentes! Mas a crença deles não é um teísmo real — pois, a menos que uma pessoa tenha conhecido o ateísmo primeiro, o teísmo não faz sentido. Quem nunca sentiu a dor de dizer “não” não pode alcançar a alegria de dizer “sim”. A confiança de alguém que nunca duvidou não tem valor. Mas alguém que duvidou, que passou por sua dúvida e a transcendeu — isso por si só tem um pouco de força, um pouco de autenticidade. Uma maneira é tomar uma decisão drástica, dar uma resolução drástica — e o homem usa muitos meios para chegar a tal decisão. Se ele pegar alguma escritura, a decisão, a resposta, estará lá. A escritura lhe dirá, de forma bastante clara, para fazer isso e aquilo, e para ter fé. Mas a pessoa que chega a uma decisão lançando mão das escrituras, nega a si mesma o direito de ser humano. Ela teve uma oportunidade de evoluir, mas a rejeitou. Ou a pessoa pode recorrer a algum professor ou guru. Mas quem faz isso está perdendo a oportunidade de crescer. Houve uma crise, a vida ofereceu a ela a oportunidade de atravessá-la sozinho, sem ajuda — mas a pessoa se poupou do transtorno. Seguiu adiante sem passar pela crise. Se tivesse passado pelo incêndio, teria saído iluminado. Mas essa pessoa nunca passou pelo fogo. Em vez disso, ela se protegeu atrás de um guru. Naturalmente, o ouro não se purificou sozinho. Não estou lhe pedindo para tomar uma decisão. Como pode chegar a uma decisão? A resposta de alguém que esteja com um problema certamente será repleta de conflito interno, também. Como você pode perceber se está com um problema? Uma pessoa cheia de conflito interno não consegue encontrar uma resolução — e nem deveria. Viva o dilema, passe pelo calor e pelo sofrimento dele, morra e seja consumido por ele, sinta-o. Não fuja do fogo, porque o que está se manifestando como fogo queimará toda a sujeira, todo o lixo, e o ouro puro permanecerá. Passe pelo dilema. Entenda-o como o destino humano. Você terá de atravessá- lo, vivê-lo. Não corra. Não tome uma decisão precipitada. Sim, se você passar por ele, a decisão virá. Passe por ele e a confiança surgirá sozinha — você não terá de consegui-la em nenhum outro lugar. Uma confiança trazida de fora não tem valor. O fato de a confiança ter de ser trazida mostra que a mente não estava pronta para ela, que ela foi prematuramente trazida. Uma confiança que precisa ser enfatizada apenas mostra que por trás dela existe uma mente cheia de conflito. Esse conflito permanecerá vivo sob a camada externa dessa confiança. E apesar de esse tipo de confiança funcionar superficialmente, não será de nenhuma valia em um momento crítico.
  • 41. Quando um momento difícil lhe for apresentado, quando a morte o encarar... apesar de você acreditar firmemente que a alma é imortal, apesar dessa crença firme que ficou com você quando leu o Gita, apesar de estar certo da imortalidade da alma ao ir ao templo todas as manhãs; agora, quando o médico estiver ao seu lado com uma expressão solene, e quando houver uma grande comoção por parte de seus parentes preocupados com você quando seu coração começar a falhar... nesse momento você perceberá que não sabe se a alma é realmente imortal ou não. A alma não pode se tornar imortal porque seus Gitas dizem que ela é — apesar de seus Gitas dizerem que ela é porque a alma é realmente imortal. Mas isso é um assunto diferente. A alma não pode se tornar imortal porque estão dizendo isso. Você acreditar nas palavras de outra pessoa não fará a menor diferença. Sim, passe pelo conflito interno. Tolere sua dor. É uma oportunidade, não tente evitá-la. Arjuna também está tentando fugir dessa situação de dilema, mas Krishna não o está ajudando a evitá-lo; em vez disso, está tentando prolongá-lo. Caso contrário, Krishna teria dito: “Não se preocupe. Eu sei tudo sobre isso. Não diga coisas sem importância. Apenas tenha fé em mim e pule”. Ele poderia ter dito isso; então não haveria necessidade de ele criar um Gita tão longo. O Gita, longo como é, é um grande tributo ao conflito interno de Arjuna. O interessante é que Arjuna fica perguntando a mesma coisa o tempo todo, e Krishna nunca diz a ele: “Você já perguntou isso. Por que está perguntando de novo?”. Arjuna pergunta a mesma coisa diversas vezes. Nenhuma de suas perguntas é diferente; apenas as palavras são diferentes. Seu conflito interno se mostra o tempo todo. Mas Krishna não diz a ele: “Fique quieto! Como você ousa não ter fé no que eu lhe digo? Como ousa duvidar de mim?”. Não. Arjuna continua perguntando as mesmas coisas. Seus conflitos internos aparecem o tempo todo sob novas formas. Krishna não está interessado em criar nenhuma crença em Arjuna. Krishna certamente está interessado em levá-lo ao ponto da confiança. E existe uma grande diferença entre crença e confiança. Crença é aquilo que impomos a nós mesmos sem resolver a dúvida, enquanto confiança é o resultado da dúvida indo embora. A confiança é o destino a que chegamos quando atravessamos a dúvida. As crenças são apoios cegos aos quais nos apoiamos com medo da dúvida. Por isso, eu diria: viva o dilema, viva-o intensamente. Se vivê-lo normalmente, ele vai demorar muito. Se colocar o ouro em um fogo baixo, pode ser que demore muito para que ele fique puro. Viva intensamente. O dilema é a maneira essencial com a qual o homem é testado, e ao encarar esse dilema seu valor para chegar à divindade nasce. Portanto, viva. Não
  • 42. escape; não procure consolos. Perceba apenas que esse é o destino: o dilema é seu destino. Lute com ele; entre no dilema com intensidade. Qual será o resultado disso? O resultado será duplo. Assim que uma pessoa concorda em entrar completamente em seu conflito interno, um terceiro ponto surge de dentro dessa pessoa — um terceiro ponto além dos outros dois que nascem nele. Assim que uma pessoa concorda em passar por seu conflito interno, três coisas, em vez de apenas duas, começam a funcionar nela. Essa terceira força — que envolve a decisão de superar o dilema — está fora dela, não se envolve com ela. Ouvi uma história: A madre Teresa era uma freira cristã. Certo dia ela tinha três centavos, e disse às pessoas da cidade que tinha dinheiro suficiente e queria construir uma grande igreja. As pessoas ficaram surpresas, porque um dia antes tinham visto Teresa mendigar. Todos se perguntavam como, de uma hora para outra, ela tinha encontrado tanto dinheiro para poder construir uma igreja. Ela mostrou às pessoas a latinha que usava para pedir esmola, com três centavos dentro. As pessoas disseram: — Teresa, você ficou louca? Sempre soubemos que havia algo de errado com sua cabeça. Na verdade, as pessoas que não se voltam ao divino sempre vêem alguma coisa de errado com as pessoas que se voltam a ele. Teresa respondeu: — Além de mim mesma, eu tenho três centavos e uma existência: Teresa, mais três centavos, mais a existência. Perguntaram a ela: — Onde está essa existência? Teresa disse: — É a terceira força que vocês não vêem, porque ainda não foram capazes de encontrar essa terceira força dentro de si mesmos. A pessoa que descobre essa terceira força dentro de si mesma torna-se imediatamente capaz de vê-la no universo todo. Você está apenas olhando para o dilema, sem perceber que quem a vê, quem a conhece, não pode ser parte do dilema, mas sempre estará fora dele. Quando as duas brigam dentro de você e você percebe, é inevitavelmente separada das duas — caso contrário, como poderia estar observando-as? Se estivesse associado a uma das duas, teria se identificado com uma e se separado da outra. Mas você diz que existe um conflito: que sua mão direita e sua mão esquerda estão brigando. Essa briga entre as duas mãos pode ser observada como um conflito, pois atrás das duas mãos você está presente como uma terceira força, um terceiro poder. Caso contrário, se você fosse apenas a mão esquerda, por