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OSHO
TAO
sua história e seus ensinamentos
“A atitude taoísta é seguir com a vida — seguir ao longo de todo o
caminho, sem impor condições. Seja aonde for que a vida o leve, siga
com ela. Você é fruto da vida, você faz parte dela, então como ela
poderia feri-lo? Não é preciso ter medo.”
UNIVERSALISMO
Sumário
Introdução
Tao: a grande rebelião
Parte I – Os princípios do Tao
A síntese suprema
Yin e Yang
Nenhum objetivo, nenhuma técnica
O caminho da água corrente
Parte II – Lao Tzu “o velho camarada”
O Tao absoluto
Os três tipos de pessoas
Parte III – Chuang Tzu: natural e simples
O fácil é o certo
O valor do que é inútil
Parte IV – Lieh Tzu: um mestre contador de histórias
Como expressar o inexprimível
A natureza do saber
Parte V – Ko Hsuan: nenhuma doutrina, nenhum ensinamento
O Clássico da Pureza
Tao: a grande
rebelião
Os mestres taoístas falam apenas do “Caminho”; Tao significa o Caminho, e eles
nada falam sobre o objetivo. Eles dizem: “O objetivo virá por si mesmo; você não
precisa se preocupar com ele”.
Se você conhece o Caminho, conhece o objetivo, pois o objetivo não está no
final do Caminho, mas ao longo de todo o Caminho; a cada momento e a cada
passo ele está presente. Não que você atinja o objetivo quando o Caminho
termina; se você estiver no Caminho, estará no objetivo a todo momento, onde
quer que você esteja. Estar no Caminho é estar no objetivo. Por isso os mestres
taoístas não falam sobre o objetivo, não falam sobre Deus, não falam sobre
moksha, nirvana, iluminação... não, absolutamente. A mensagem deles é muito
simples: você precisa encontrar o Caminho.
As coisas ficam um pouco mais complicadas porque eles dizem: O Caminho não
tem mapa, não está cartografado, não é tal que você possa seguir alguém e
encontrá-lo. O Caminho não é como uma auto-estrada; é mais como um pássaro
voando no céu, sem deixar rastro... O pássaro voou, mas nenhum rastro foi
deixado e ninguém pode segui-lo. Assim, o Caminho é um percurso inexplorado;
ele é um percurso, mas inexplorado; ele não está pronto, não está disponível,
você não pode simplesmente decidir caminhar por ele; você terá de encontrá-lo.
E você terá de encontrá-lo à sua própria maneira, pois nenhuma outra servirá
para você. Buda caminhou, Lao Tzu caminhou, Jesus caminhou, mas esses
caminhos não irão ajudá-lo, porque você não é Jesus, não é Lao Tzu, não é
Buda. Você é você, um indivíduo único. Somente ao caminhar, somente ao viver
a sua vida, você encontrará o Caminho. Isso é algo de grande valor.
É por isso que o Taoísmo não é uma religião organizada, e nem pode ser. Ele é
uma religiosidade orgânica, mas não uma religião organizada. Você pode ser um
taoísta se simplesmente viver sua vida autêntica e espontaneamente, se tiver
coragem de entrar no desconhecido por conta própria, sozinho, sem depender
de ninguém, sem seguir ninguém, mas simplesmente penetrando na noite
escura sem saber se chegará a algum lugar ou se ficará perdido. Se você tiver
coragem, esse risco existe; é arriscado, é uma aventura.
O Cristianismo, o Hinduísmo e o Islamismo são grandes rodovias: você não
precisa arriscar nada, simplesmente segue a multidão. Com o Tao, você precisa
seguir sozinho, precisa estar sozinho. O Tao respeita o indivíduo e não a
sociedade; respeita o único e não a multidão; respeita a liberdade e não a
conformidade. O Tao não tem tradição; ele é uma rebelião, e a maior rebelião
possível.
PARTE UM
Os princípios
do Tao
O Tao é um, mas no momento em que ele se torna manifesto,
precisa se tornar dois. A manifestação precisa ser dual: ela não
pode ser uma só, precisa se dividir em duas. Ela precisa tornar-se
matéria e consciência, precisa tornar-se homem e mulher, dia e
noite, vida e morte... Você encontrará esses dois princípios em
todos os lugares. O todo da vida consiste nesses dois princípios, e
por trás deles está oculto o Uno. Se você insistir em permanecer
às voltas com essas dualidades, nos pólos opostos, permanecerá
no mundo. Se você for inteligente, se for um pouco mais alerta e
começar a olhar mais fundo, a olhar para a profundidade das
coisas, ficará surpreso: os opostos não são realmente opostos,
mas complementares. E por trás de ambos há uma única energia:
o Tao.
A síntese suprema
Tao significa transcendência, transcendência de toda dualidade, de toda
polaridade, de todos os opostos. O Tao é a síntese suprema — a síntese do
homem e da mulher, do positivo e do negativo, da vida e da morte, do dia e da
noite, do verão e do inverno.
Como essa síntese é possível? Como a pessoa vem a desenvolver essa síntese
suprema? Alguns pontos precisam ser entendidos.
Primeiro, o princípio do yin, o princípio da feminilidade, é como uma escada entre
o inferno e o paraíso. Você pode ir ao inferno por ela e pode ir ao paraíso por
ela; a direção será diferente, mas a escada será a mesma. Nada acontece sem
o feminino; a energia feminina é uma escada que vai do mais baixo ao mais
elevado, do mais escuro dos vales ao mais luminoso dos picos. Esse é um dos
princípios fundamentais do Tao e precisa ser entendido em detalhes. Uma vez
que ele se enraíze no seu coração, as coisas ficam muito simples.
Será bom entrar no simbolismo de Adão e Eva. O mundo não começou com
Adão, mas com Eva; foi por meio dela que a serpente persuadiu Adão a
desobedecer. A serpente não pôde persuadir Adão diretamente; é como se não
houvesse um modo direto de persuadir o homem. Se você quiser atingir o
homem, precisará fazer isso por meio da mulher. Ela serviu como um veículo
para o demônio, e então, novamente, quando Cristo nasceu, nasceu da Virgem
Maria. O Cristo menino nasceu da feminilidade virgem, do yin virgem. O mais
elevado entra por meio da mulher. O mais inferior e o mais elevado são ambos
expressos por meio da mulher.
Adão significa “terra vermelha”. Deus fez Adão a partir da terra vermelha. Adão
é o princípio do pó sobre pó; o homem é o princípio exterior, da extroversão, é o
corpo físico. Tente entender esses símbolos. O homem é o corpo físico e Deus
criou Eva a partir do corpo físico do homem. Eva era algo mais elevado. Primeiro
o homem precisou ser criado, e depois a mulher. O feminino era algo mais sutil,
mais sofisticado, de uma síntese superior. Eva foi criada de uma costela e não
poderia ser criada diretamente da terra.
Para entender esses símbolos, considere que você não pode comer lama, mas
pode comer maçãs, que estão num plano mais elevado. As maçãs vêm da terra,
as árvores crescem da terra, então a maçã nada mais é do que terra
transformada. Você pode comer a maçã e pode digeri-la, mas morrerá se tentar
comer a terra. A maçã é da terra, mas é uma síntese superior, melhor, mais
digerível.
Deus criou Adão e, na maneira de ver do homem, ele é o primeiro porque Deus
o criou primeiro. Não, o homem foi criado primeiro porque está muito próximo da
terra. Depois a mulher foi criada — ela não está tão próxima da terra. Ela foi
criada a partir de Adão e é uma síntese superior.
O nome Eva também é significativo; ele significa “coração”. Adão significa terra,
Eva significa coração. Deus disse a Adão para dar nome às coisas; então ele
deu nome a tudo e, quando foi dar nome a Eva, simplesmente disse: “Ela é o
meu coração, Eva.” Esse se tornou o nome de Eva. Eva ou Eve significa coração;
e, traduzido para o jargão moderno, significa psique. O homem é o princípio
corporal, a mulher é a psique; o homem é corpo, a mulher é mente. E tudo
acontece por intermédio da mente.
Antes de você fazer algo errado, a sua mente precisa ser convencida disso;
antes de fazer algo bom, a sua mente precisa ser convencida disso. Tudo
acontece primeiro como uma idéia, e então ela pode ser posta em prática.
O seu corpo não pode ser persuadido a fazer algo a menos que a sua mente
esteja disposta a fazê-lo. Até mesmo se uma doença entrar no seu corpo, entrará
por intermédio da mente. Tudo o que acontece, acontece por intermédio da
mente.
A mulher é o princípio do interior; certamente não do interior mais profundo, mas
do interior. Ela está justamente no meio. O interior mais profundo é chamado de
alma, o mais exterior é chamado de corpo, e justamente entre esses dois está a
psique, a mente.
Esse é o significado de toda a parábola de Adão e Eva. A serpente persuadiu
Eva, e apenas a mente pode ser persuadida, convencida, seduzida; e então a
mente pode persuadir o corpo muito facilmente. Na verdade, o corpo segue a
mente como uma sombra. Uma vez que a sua mente tenha um pensamento, é
inevitável que ele se transforme em realidade.
Por meio de Eva, Adão caiu; por meio de Eva, ele foi expulso do Jardim de Deus;
por meio de Eva, desenrolou-se essa grande aventura que chamamos de
mundo; por meio de Eva, Adão desobedeceu. Adão seguiu Eva nesta aventura
pelo mundo.
A parábola sobre Jesus é a mesma, com uma ênfase diferente. Jesus nasceu da
Virgem Maria. Por que de uma virgem? Porque, se você entender corretamente,
virgem significa uma mente absolutamente pura, não contaminada por nenhum
pensamento. Os pensamentos são representados pela serpente, pois os
caminhos dos pensamentos são muito serpentiformes. Se você observar seus
pensamentos, entenderá por que foram representados pela serpente. Eles
deslizam como serpentes, insinuam-se sorrateiramente dentro de você e são
muito espertos, ladinos e enganadores, como as serpentes. Eles se escondem
em buracos escuros no seu inconsciente e, sempre que têm oportunidade,
saltam sobre você. Na noite, na noite escura, eles saem; durante o dia, eles se
escondem. Quando você está um pouco alerta, esses pensamentos
desaparecem; quando você não está muito alerta, eles saem e começam a
influenciá-lo.
A Virgem Maria significa uma mente em meditação; Eva significa uma mente
cheia de pensamentos, cheia de serpentes. Jesus entrou novamente no mundo
por intermédio da Virgem Maria, por meio da pureza, da inocência. Os
pensamentos são ladinos; a ausência de pensamentos é inocente.
Se você entender essas belas parábolas, ficará surpreso: não fizemos justiça a
elas. Elas não são fatos históricos, mas grandes metáforas do interior do ser
humano. Por meio de Eva, Adão caiu, e por meio da Virgem Maria, Jesus se
elevou e novamente entrou no mundo da divindade.
Mais uma coisa: conta-se que o pecado de Adão foi a desobediência. Deus disse
para ele não comer o fruto de uma certa árvore, a árvore do conhecimento, mas
a serpente persuadiu Eva, e essa persuadiu Adão. Houve uma desobediência.
Você ficará surpreso ao saber que o significado hebraico de “Maria” é rebelião.
A palavra hebraica é mariam, que significa rebelião. Pela desobediência, Adão
caiu; pela rebelião, Jesus se ergueu.
Desobediência significa uma reação, ir contra, contra Deus; rebelião significa
negar o negativo, ir contra o mundo, ir contra as serpentes. Eva ouviu as
serpentes e foi contra Deus; Jesus se rebelou contra as serpentes e ouviu Deus.
A desobediência é política, a rebelião é religiosa; a desobediência só traz a
desordem. A rebelião, a rebelião verdadeira, traz uma mudança radical no seu
ser, uma virada de cento e oitenta graus, uma conversão.
Mas ambos, Adão e Jesus, aconteceram por meio do princípio feminino.
Yin e Yang
Na linguagem taoísta, o princípio feminino é chamado de yin e o princípio
masculino é chamado de yang. Yang é ambição, é agressão, é desejo e
projeção. Yang é político, yin é religioso. Sempre que você for ambicioso, é
impossível ser religioso; sempre que você for religioso, é impossível ser político.
Eles não caminham juntos. Eles não se misturam. Não podem se misturar — a
própria natureza deles é como a água e o óleo. A ambição e a meditação nunca
se misturam.
O político age por meio do princípio masculino e o sábio age por meio do princípio
feminino. É por isso que os sábios se tornam tão suaves, tão femininos, tão
plenos, tão belos. Uma certa graça os circunda, e a beleza certamente não é
apenas do corpo — às vezes pode acontecer de o corpo não ser absolutamente
bonito.
No começo do Cristianismo, havia uma lenda de que Jesus era a pessoa mais
feia do mundo. Com o passar do tempo, os cristãos abandonaram essa idéia,
pois não gostavam dela, mas ela tem algo de belo em si. A lenda dizia que o
corpo de Jesus era feio, mas, ainda assim, quando alguém se deparava com ele,
ficava de repente surpreso, tomado, possuído, encantado com a sua beleza. Se
você olhasse um retrato dele, veria apenas a sua feiúra. Mas, se fosse até ele,
se entrasse na sua presença real, você se esqueceria de sua feiúra porque muita
beleza fluía. Assim, tanta beleza se despejava e vertia dele que você nem sequer
se lembrava de que ele era feio. Assim, os que não viram Jesus achavam que
ele era feio, e os que o viram costumavam dizer que ele era a pessoa mais bela
que jamais existiu.
O corpo não é o que importa. O sábio não vive no corpo ou como o corpo; ele
vive por meio do corpo. O político nada mais é do que o corpo, o extrovertido. O
corpo é extrovertido, a psique é introvertida, e, quando você transcende ambos,
surge o Tao. Quando você não é extrovertido nem introvertido, quando não está
indo para o exterior nem para o interior, quando não está indo a lugar nenhum,
há uma imensa serenidade. Não há nenhum movimento, porque não há
motivação; sua chama interior não está mais oscilante, porque não há propósito
a ser satisfeito, não há nenhum outro lugar para estar e ninguém mais para ser;
você está absolutamente satisfeito com o momento. Então você transcendeu o
homem, a mulher e a polaridade. O Tao está nessa transcendência.
Essa transcendência foi ensinada de diferentes maneiras por todo o mundo;
diferentes termos foram usados. A explicação de um termo ajudará você a
entender. O termo é “Israel”. Esse não é o nome de uma certa raça e não é o
nome de um certo indivíduo. Israel é exatamente o Tao. Israel é composto de
três símbolos: is-ra-el. Is significa o princípio feminino, e vem da palavra egípcia
isis. Ísis é a deusa lua egípcia e Ishtar é a deusa lua babilônica. Portanto, is é o
princípio yin, feminino.
Na ioga eles dizem que existem três passagens no ser humano: a lua, o sol e o
transcendental. Com uma narina você respira a energia da lua, com a outra
narina você respira a energia do sol, e bem no seu interior, quando ambos os
tipos de respiração cessam, você transcende.
Ra vem do deus egípcio do sol; ele representa o princípio masculino, yang. E el
vem de Elohim, a mesma raiz da qual os muçulmanos derivaram a palavra “Alá”.
A palavra hebraica para Deus é Elohim; el vem daí. Ela representa o encontro
do feminino e do masculino e sua transcendência: o Tao. Israel significa
exatamente Tao.
Se você for dominado pelo sol, será agressivo, extremamente agressivo,
ambicioso, político, caloroso, ardendo de desejo e paixão. Se você for dominado
pela lua, será sereno, nada ambicioso, nada agressivo, receptivo, tranquilo,
silencioso. Mas ambos precisam ser transcendidos, pois ambos são
desequilibrados. A pessoa precisa chegar em um momento em que possa dizer:
“Não sou nem homem nem mulher”. E é aí que ela se torna um Buda, um Cristo
ou um Krishna, quando não é nem mulher nem homem, nem lua nem sol, nem
is nem ra, nem yin nem yang, mas simplesmente é, puramente é. Todas as
formulações desapareceram.
Esse acontecimento se dá apenas com o tempo. Primeiro você precisa
abandonar o princípio do ra, o princípio do sol, a energia masculina, e precisa se
dirigir para o feminino, para a feminilidade, e daí você precisa avançar para o
além. Lembre-se de que tudo acontece por meio do princípio feminino. Assim,
não faz diferença se você está indo além ou para baixo, pois se trata de uma
escada.
Com o corpo, com a energia do sol, com o masculino, você se torna um
estuprador. Você estupra a vida, não é um amante. A ciência vem da energia do
sol, é orientada pelo masculino, e é por isso que o Oriente não pôde desenvolvê-
la, pois viveu por meio do princípio da lua, do passivo, do silencioso, do que flui,
do que não tenta conquistar, do que sente profundo amor pela natureza, do que
não tenta lutar. O Oriente nunca foi um estuprador; o Ocidente estuprou a
natureza, e por isso surgiram os problemas ecológicos, pois a natureza está
sendo destruída.
Com o princípio feminino, com o princípio da lua, existe amor. Você ama, mas
não estupra. Às vezes o ato físico pode parecer o mesmo, mas a qualidade
interior é diferente. Se você não amar a sua esposa, pode estuprar até mesmo
ela. O ato físico de fazer amor ou estuprar uma mulher pode ser o mesmo, mas
a qualidade interior difere.
A ciência nasceu com a energia do sol e é um estupro contra a natureza. Com a
energia da lua, nasceu a poesia, a arte, a pintura, a dança, a música; ela é amor
brincando com a natureza. O Oriente viveu por meio da arte, da música, da
dança, do teatro; o Ocidente tem tentado usar demasiadamente a energia
masculina e perdeu o equilíbrio, mas o mesmo desequilíbrio aconteceu no
Oriente. Até agora, nenhuma sociedade evoluiu a ponto de poder ser chamada
de Israel, a ponto de poder ser chamada de Tao, a ponto de transcender ambas
ou sintetizar ambas numa tal harmonia que o antagonismo desapareça.
O Tao é o objetivo, ou seja, criar um ser humano que seja inteiramente integrado,
totalmente integrado, e também criar uma sociedade humana que seja
totalmente integrada.
Nenhum objetivo,
nenhuma técnica
Toda técnica é contra a natureza, contra o Tao; todo esforço é contra o Tao. Se
você conseguir deixar tudo por conta da natureza, então nenhuma técnica é
necessária, porque essa é a técnica suprema. Se você conseguir deixar tudo por
conta do Tao, essa é a mais profunda entrega possível. Você está entregando a
si mesmo, o seu futuro, as suas possibilidades, está entregando o próprio tempo,
todos os esforços. Isso significa paciência e espera infinitas.
Depois que você entregar tudo à natureza, não há esforço, você apenas flui;
você está num profundo estado de deixar acontecer. Coisas lhe acontecem, mas
você não está fazendo nenhum esforço para que elas aconteçam, não está nem
mesmo procurando-as. Se elas acontecerem, tudo bem; se não acontecerem,
tudo bem; você não escolhe. Tudo o que acontece, acontece; você não tem
expectativas e, é claro, nenhuma frustração.
A vida flui e você flui com ela. Você não tem nenhum objetivo a alcançar, porque
com o objetivo entra o esforço. Você não tem nenhum lugar para ir, porque, se
tiver algum lugar para ir, o esforço virá; ele está implícito. Você não tem nenhum
lugar para ir, nenhum lugar para alcançar, nenhum objetivo, nenhum ideal; nada
precisa ser atingido, você entrega tudo, e, nesse momento de entrega, nesse
exato momento, tudo lhe acontece.
O esforço requer tempo, a entrega não leva tempo; técnica leva tempo, a entrega
não leva tempo. É por isso que chamo a entrega de técnica suprema; ela é uma
não-técnica. Você não pode praticá-la, não se pode praticar a entrega. Se você
praticar, ela não é entrega; então você está contando consigo mesmo e não está
totalmente impotente; então você está tentando fazer alguma coisa. Mesmo se
for entrega, você está tentando fazê-la, e a técnica entrará em cena e, com a ela,
entra o tempo, o futuro. A entrega não é temporal, ela está além do tempo. Se
você se entrega, nesse exato momento você está fora do tempo, e tudo o que
pode acontecer acontecerá. Mas então você não a está procurando, não a está
buscando, não está ávido por ela. Você absolutamente não está pensando nela;
para você, dá no mesmo se ela acontecer ou não acontecer.
Tao significa entrega, entrega à natureza, e então o ego não existe. O tantra e a
ioga são técnicas, e por meio delas você atinge um ponto de entrega, mas será
um longo processo. No final, depois de cada técnica, você terá de se entregar,
mas com as técnicas a entrega acontecerá no final. Com o Tao, no Tao, ela virá
no começo. Se você puder se entregar agora mesmo, nenhuma técnica é
necessária.
Você precisa ser descondicionado. Se você estiver no Tao, então nenhuma
técnica é necessária; se você for saudável, então nenhum remédio é necessário.
Todo remédio é contra a saúde; mas você está doente, e o remédio é necessário.
Esse remédio matará sua enfermidade; ele não pode lhe dar saúde, mas, se a
doença for removida, a saúde lhe acontecerá. Nenhum remédio pode lhe dar
saúde; basicamente, todo remédio é um veneno, mas você coletou algum
veneno e precisa de um antídoto que criará um equilíbrio, e a saúde será
possível.
A técnica não lhe dará a sua divindade, não lhe dará a sua natureza. Ela destruirá
tudo o que você juntou à volta da sua natureza; ela apenas tirará os seus
condicionamentos. Você está condicionado e, no momento, não pode saltar em
direção à entrega. Se você puder saltar, ótimo, mas você não pode... Seus
condicionamentos perguntarão: “Como?” Então as técnicas serão de ajuda.
Quando a pessoa vive no Tao, nenhuma ioga, nenhum tantra e nenhuma religião
são necessários. A pessoa está perfeitamente saudável, e nenhum remédio é
necessário. Toda religião é medicinal. Quando o mundo viver totalmente no Tao,
as religiões desaparecerão e nenhum mestre, nenhum Buda e nenhum Jesus
serão necessários, porque cada um será um Buda ou um Jesus. Mas, no
momento, como você é, você precisa de técnicas; essas técnicas são antídotos.
Você juntou à sua volta uma mente tão complexa que complicará tudo o que for
dito e for dado a você; você tornará tudo mais complexo, mais difícil. Se eu lhe
disser: “Entregue-se”, você perguntará: “Como?”; se eu disser: “Use técnicas”,
você perguntará: “Técnicas? As técnicas não são contra o Tao?”; se eu disser:
“Nenhuma técnica é necessária, simplesmente se entregue e a divindade lhe
acontecerá”, imediatamente você perguntará: “Como?” Essa é a sua mente.
Se eu disser: “O Tao está exatamente aqui e agora, você não precisa praticar
nada; simplesmente dê um salto e se entregue”, você perguntará: “Como? Como
posso me entregar?” Se eu lhe der uma técnica para responder ao seu “como”,
sua mente dirá: “Mas um método, uma técnica e uma abordagem não são contra
o Tao? Se a divindade for a minha natureza, então como pode ser alcançada por
meio de uma técnica? Se ela já está presente, então a técnica é inútil, é
desnecessária. Por que perder tempo com técnicas?” Observe essa mente!
Certa vez aconteceu de um homem, pai de uma jovem, pedir ao compositor
Leopold Godowsky para ir à sua casa e dar aula à sua filha. Ela estava
aprendendo piano e Godowsky foi à casa deles e, pacientemente, ouviu a jovem
tocar. Quando ela terminou, o pai riu exultante, deu um grito de felicidade e
perguntou a Godowsky: “Ela não é maravilhosa?”
Conta-se que Godowsky respondeu: “Ela tem uma técnica impressionante.
Nunca ouvi alguém tocar uma peça tão simples com uma dificuldade tão grande”.
É isso o que acontece na sua mente. Mesmo uma coisa simples, você a tornará
complicada, difícil para si mesmo. E essa é uma medida de defesa, porque,
quando você cria dificuldade, não precisa fazê-la; primeiro o problema precisa
ser resolvido, e só depois você pode fazê-la.
Lembre-se, você pode seguir em frente indefinidamente nesse círculo vicioso,
mas precisará quebrá-lo em algum ponto e sair dele. Seja determinado, porque
somente com decisão nasce a sua humanidade, somente com decisão você se
torna humano. Seja determinado; se você puder se entregar, entregue-se; se
não puder se entregar, então não crie problemas filosóficos e use alguma
técnica. De ambas as maneiras, a entrega lhe acontecerá.
O caminho da água
corrente
Existem poucos templos taoístas, então é muito raro encontrar uma estátua
taoísta. A maioria se encontra nas montanhas ao ar livre, esculpidas na rocha,
sem teto, sem templo, sem sacerdote, sem culto.
Havia uma estátua de Lao Tzu, o fundador do Tao, e durante anos um jovem
pensou em ir às montanhas para ver essa estátua. Ele adorava as palavras, a
maneira como Lao Tzu falava, o seu estilo de vida, mas nunca tinha visto
nenhuma de suas estátuas. Anos se passaram, e sempre havia muitas coisas
impedindo o jovem de satisfazer seu desejo de ver a estátua.
Certa noite, finalmente, ele decidiu que precisava ir; não era muito longe, apenas
a cem quilômetros dali, mas ele era pobre e teria de ir a pé. Ele decidiu partir no
meio da noite, pois sua esposa e seus filhos estariam dormindo e não poderiam
criar problemas. A noite estava escura, então ele pegou uma lamparina e se
dirigiu para as montanhas. Quando ele saiu da cidade, surgiu-lhe um
pensamento: “Meu Deus, cem quilômetros! E tenho apenas dois pés; isso irá me
matar, estou pedindo o impossível; nunca caminhei tanto, e não há estradas”.
Havia uma pequena trilha pelas montanhas, que também era perigosa, e então
ele pensou: “É melhor esperar o amanhecer. Pelo menos haverá luz e poderei
ver melhor; senão sairei dessa pequena trilha e sem sequer ver a estátua de Lao
Tzu; estarei simplesmente acabado! Por que me suicidar?” Assim, ele parou e
se sentou.
Quando o sol nasceu, passou por ali um velho que, ao ver o jovem sentado, lhe
perguntou: “O que você está fazendo aqui?” O jovem lhe explicou, e o velho riu
e disse: “Você não ouviu o velho ditado? ‘Ninguém pode dar dois passos ao
mesmo tempo, apenas um passo por vez; e não importa se a pessoa é poderosa,
fraca, jovem, velha’. E o ditado continua: ‘Passo a passo, um passo por vez, uma
pessoa pode caminhar dez mil quilômetros’. E são apenas cem quilômetros!
Parece que você não é inteligente... E quem lhe disse que você precisa caminhar
sem parar? Você pode levar o tempo que quiser; depois de dez quilômetros,
você pode descansar por um ou dois dias e curtir. Este é um dos vales mais
bonitos que existem, tem as montanhas mais belas e as árvores estão
carregadas de frutas, frutas que talvez você nunca tenha provado. De qualquer
maneira, eu estou indo e você pode vir comigo; fiz esta trilha milhares de vezes,
e tenho pelo menos quatro vezes mais a sua idade. Levante-se!”
O homem era tão autoritário... Quando ele disse: “Levante-se!”, o jovem
simplesmente se levantou. E o velho disse: “Dê-me as suas coisas. Você é
jovem, inexperiente; eu carregarei as suas coisas. Simplesmente me siga e
faremos tantas paradas quanto você quiser”.
O que o velho disse era verdade. Quando eles entraram mais fundo na floresta
e nas montanhas, a paisagem foi ficando cada vez mais bonita. Havia tantas
frutas silvestres suculentas e, sempre que o jovem queria descansar, o velho
estava disposto a parar. O jovem ficou surpreso pelo fato de o velho nunca dizer
qual era a hora de descansar, mas sempre que ele dizia que era bom
descansarem, o velho estava disposto a descansar com ele. Um dia, dois dias
de descanso, e então eles recomeçavam a jornada.
Os cem quilômetros passaram logo, e eles chegaram a uma das mais belas
estátuas de um dos homens mais notáveis que caminharam sobre a terra. Até
mesmo a estátua dele tinha algo especial, pois não era apenas uma obra de arte;
ela fora criada por artistas taoístas para representar o espírito do Tao.
O Tao acredita na filosofia da entrega; acredita que você não precisa nadar, mas
apenas fluir com o rio, deixar que o rio o leve para onde ele estiver indo, pois
todo rio no final chega ao oceano. Então não se preocupe: você chegará ao
oceano, e não há necessidade de ficar tenso.
A estátua estava naquele lugar solitário, e havia uma cachoeira ao lado, porque
o Tao é chamado de o caminho da água corrente. Assim como a água segue
fluindo sem nenhum guia, sem nenhum mapa, sem nenhuma regra, sem
nenhuma disciplina... mas de uma maneira muito humilde, porque em todos os
lugares ela está sempre procurando a posição menos elevada. Ela nunca vai
para cima, sempre vai para baixo; e chega ao oceano, à sua própria fonte. Toda
a atmosfera ali era uma representação da idéia taoísta do deixar fluir.
O velho afirmou: “Agora começa a jornada”.
O jovem disse: “O quê? Eu estava pensando que, depois de cem quilômetros, a
jornada estaria terminada”.
O velho disse: “Essa é apenas a maneira como os mestres falam às pessoas.
Mas a realidade é que, a partir deste ponto, a partir desta atmosfera, começa
uma jornada de mil e um quilômetros. E não o enganarei, porque depois de mil
e um quilômetros você encontrará um outro velho, talvez eu mesmo, que lhe dirá:
‘Esta é apenas uma parada. Siga em frente’. Seguir em frente é a mensagem”.
A jornada é infindável, mas o êxtase continua se aprofundando. A cada passo,
você é mais; sua vida fica mais viva, sua inteligência fica chamejante. E ninguém
pára; uma vez que o buscador tenha chegado ao seu ser, ele próprio torna-se
capaz de perceber o que está à frente: tesouros e mais tesouros. A persuasão é
necessária apenas até o ponto do ser; esses primeiros cem quilômetros são os
mais difíceis, depois deles podem vir mil e um quilômetros ou uma infinidade;
não faz diferença.
Agora você sabe que na realidade não há objetivo; a própria conversa sobre
objetivos era para os principiantes, para crianças. A jornada é o objetivo.
A própria jornada é o objetivo.
Ela é infinita, eterna.
Você encontrará estrelas, espaços desconhecidos, experiências incognoscíveis,
mas nunca chegará a um ponto em que possa dizer: “Agora cheguei”. Qualquer
um que diga “Cheguei” não está no Caminho. Ele não viajou, sua jornada não
começou e ele está apenas sentado no primeiro marco.
Cada partida é um pouco dolorosa, mas a dor será imediatamente esquecida,
pois mais e mais bem-aventurança se despejará sobre você. Logo você
aprenderá isto: não é preciso sentir dor quando você parte depois de um
pernoite. Você se acostuma, sabe que a jornada é infindável; e os tesouros ficam
cada vez maiores, e você não é um perdedor. Parar em qualquer lugar será uma
perda; então, não há fim, não há ponto final, nem mesmo um ponto e vírgula...
O CAMINHO
Tao significa caminho sem nenhum objetivo; simplesmente o Caminho. Há 25 séculos,
Lao Tzu foi corajoso ao dizer às pessoas que não há objetivo e que não estamos indo a
lugar nenhum. Estamos apenas indo para estarmos aqui, então torne o tempo tão belo,
tão amoroso e tão alegre quanto possível. Ele chamou sua filosofia de Tao, e Tao
significa o Caminho.
Muitas pessoas lhe perguntaram: “Por que você escolheu o nome Tao? Pois você não
tem nenhum objetivo na sua filosofia”.
Ele respondia: “Especificamente por essa razão escolhi chamá-lo de ‘o Caminho’, para
que ninguém se esqueça de que não há objetivo, mas apenas o Caminho”.
O Caminho é belo, está repleto de flores e fica cada vez mais belo à medida que a sua
consciência fica cada vez mais elevada. No momento em que você atinge o ponto
culminante, tudo se torna tão doce, tão extasiante, que de repente você se dá conta de
que este aqui é o lugar, este é o lar. Desnecessariamente você estava correndo para lá
e para cá.
Assim, cancele todas as passagens que você reservou! Não há nenhum lugar para ir.
PARTE DOIS
Lao Tzu:
“o velho camarada”
Lao Tzu é apenas um porta-voz da vida. Se a vida é absurda, Lao
Tzu é absurdo; se a vida tem uma lógica absurda, Lao Tzu tem a
mesma lógica. Lao Tzu simplesmente reflete a vida e não
acrescenta nada a ela, não escolhe nada; ele simplesmente aceita
tudo o que ela é. É simples perceber a espiritualidade de Buda; é
impossível deixar de vê-la, ele é tão extraordinário! Mas é difícil
perceber a espiritualidade de Lao Tzu; ele é muito comum, assim
como você. Você terá de crescer em entendimento. Buda passa
por você e imediatamente você reconhecerá que um ser humano
superior passou; ele carrega a aura de um ser humano superior. É
difícil não notá-lo, praticamente impossível. Mas Lao Tzu... ele
pode ser o seu vizinho. Você pode ter deixado de notá-lo porque
ele é muito comum, extraordinariamente comum, e essa é a sua
beleza.
O Tao absoluto
Deixe-me contar-lhe a história de como foram escritos os versos do Tao Te
Ching, de Lao Tzu, porque isso o ajudará a entendê-los. Lao Tzu viveu noventa
anos; na verdade, ele nada fez a não ser viver; ele viveu totalmente. Muitas
vezes seus discípulos pediram que ele escrevesse alguma coisa, mas ele
sempre dizia: “O Tao que pode ser dito não é o Tao verdadeiro, a verdade que
pode ser dita se torna imediatamente uma mentira”.
Lao Tzu diz: O Tao que pode ser dito não é o Tao absoluto.
Assim, ele não dizia nada, não escrevia nada. Então o que os discípulos ficavam
fazendo com ele? Eles apenas ficavam com ele, viviam com ele, caminhavam
com ele, simplesmente se embebiam do seu ser. Quando estavam perto dele,
tentavam ficar abertos a ele; quando estavam perto dele, tentavam não pensar
em nada; quando estavam perto dele, ficavam cada vez mais calados. Nesse
silêncio, ele os alcançava, ia até eles e batia às suas portas.
Por noventa anos ele se recusou a escrever ou a dizer qualquer coisa. Esta era
a sua atitude básica: a verdade não pode ser ensinada. No momento em que
você diz algo sobre a verdade, ela deixa de ser verdadeira; o próprio dizer a
falsifica. Você não pode ensiná-la; no máximo você pode indicá-la, e essa
indicação deveria ser seu próprio ser, toda a sua vida; ela não pode ser indicada
com palavras. Ele era contrário às palavras, à linguagem.
Conta-se que ele costumava caminhar todos os dias pela manhã, e um vizinho
costumava segui-lo. Sabendo perfeitamente bem que ele não queria falar, que
ele era um homem de um silêncio absoluto, o vizinho sempre ficava quieto. Até
um “alô” não era permitido, até falar sobre o tempo não era permitido. Dizer: “Que
bela manhã!” seria um tagarelar demasiado. Lao Tzu dava uma boa caminhada,
de quilômetros, e o vizinho o seguia.
Isso continuou durante anos, mas uma vez aconteceu de o vizinho receber um
hóspede que também quis acompanhá-los, então o vizinho o levou junto. Ele não
conhecia Lao Tzu, nem as suas maneiras, então começou a se sentir sufocado,
porque seu anfitrião não estava falando, e ele não podia entender por que eles
estavam tão calados; e o silêncio ficou pesado para ele.
Se você não sabe como ficar em silêncio, o silêncio fica pesado. Não é que por
dizer coisas você se comunica, não; por dizer coisas você se descarrega.
Na verdade, a comunicação não é possível por meio de palavras, e apenas o
oposto é possível; você pode evitar a comunicação. Você pode falar, pode criar
uma cortina de palavras à sua volta, de tal modo que a sua situação real não
possa ser conhecida pelos outros; você se fecha por meio de palavras.
Aquele homem começou a se sentir despido, sufocado e desconfortável; ele
estava constrangido. Então, quando o sol estava nascendo, ele simplesmente
disse: “Que belo alvorecer, olhem...! Que sol maravilhoso está nascendo! Que
bela manhã!”
Ele só disse isso, mas ninguém respondeu, porque o vizinho, seu anfitrião, sabia
que Lao Tzu não gostaria de ouvir nada. E, é claro, Lao Tzu não disse nada, não
respondeu.
Quando eles voltaram, Lao Tzu disse ao vizinho: “A partir de amanhã, não traga
mais esse homem. Ele é um tagarela”. E ele só havia dito isto: “Que belo
alvorecer... que bela manhã”. Apenas isso numa caminhada de duas ou três
horas, mas Lao Tzu disse: “Não traga mais esse tagarela. Ele fala demais e sem
necessidade, pois também tenho olhos e posso ver que o sol está nascendo e
que ele é lindo. Qual é a necessidade de se dizer isso?”
Lao Tzu viveu em silêncio, sempre evitou falar sobre a verdade que ele atingiu e
sempre rejeitou a idéia de que deveria escrever para as gerações futuras.
E, na idade de noventa anos, despediu-se de seus discípulos e disse: “Agora
vou para as montanhas, para o Himalaia; vou lá para me preparar para morrer.
É bom viver com pessoas, é bom estar no mundo enquanto se está vivo, mas,
quando a morte se aproxima, é bom penetrar na solidão total, de tal modo que a
pessoa siga na direção da fonte original na sua pureza e solidão absolutas, não
contaminadas pelo mundo”.
Seus discípulos ficaram muito tristes, mas o que poderiam fazer? Eles o
seguiram por alguns quilômetros, mas aos poucos Lao Tzu os convenceu a
voltar. Então, sozinho, ao atravessar a fronteira do país, o guarda que vigiava a
fronteira o prendeu. O guarda também era seu discípulo e disse: “A menos que
o senhor escreva um livro, não permitirei que atravesse a fronteira. O senhor
precisa escrever um livro para a humanidade, essa é a dívida que o senhor
precisa pagar; do contrário, não permitirei que cruze a fronteira”. Assim, durante
três dias, Lao Tzu foi mantido preso pelo seu próprio discípulo.
Isso é belo, é muito amoroso. Ele foi forçado, e foi assim que nasceu esse
pequeno livro, o livro de Lao Tzu, o Tao Te Ching. Ele teve de escrevê-lo porque,
se não o fizesse, o discípulo não permitiria que ele cruzasse a fronteira do país,
e ele era o guarda, tinha autoridade e podia criar problemas; então Lao Tzu
precisou escrever o livro. E em três dias ele terminou de escrevê-lo.
Esta é a primeira sentença do livro:
O Tao que pode ser dito não é o Tao absoluto.
Este é o primeiro ponto que ele precisa salientar: tudo o que pode ser dito não
pode ser verdadeiro. Essa é a introdução do livro e simplesmente o alerta:
algumas palavras seguirão, mas não seja vítima delas. Lembre-se da ausência
de palavras, do que não pode ser comunicado pela linguagem, do que não pode
ser comunicado por meio de palavras. O Tao pode ser comunicado, mas
somente de ser para ser; ele pode ser comunicado quando você está com o
mestre e está sem fazer nada, nem mesmo praticando alguma coisa. O Tao só
pode ser comunicado quando você está na presença do mestre.
Por que a verdade não pode ser dita? Qual é a dificuldade? A verdade não pode
ser dita muitas razões, e a primeira e a mais básica é que a verdade sempre é
percebida em silêncio. Quando a sua conversa interior cessa, então ela é
percebida; e como você pode dizer por meio de som aquilo que é percebido no
silêncio? Trata-se de uma experiência, e não de um pensamento. Se ele fosse
um pensamento, poderia ser expresso, não haveria problema. Não importa quão
complicado ou complexo possa ser um pensamento; uma maneira de expressá-
lo pode ser encontrada. A teoria mais complexa de Albert Einstein, a teoria da
relatividade, também pode ser expressa por um símbolo; não há problema nisso.
A pessoa que ouve poderá não ser capaz de entendê-la, mas essa não é a
questão, pois ela pode ser expressa.
Quando Einstein estava vivo, conta-se apenas uma dúzia de pessoas no mundo
o entendia. Mas até isso é suficiente; se uma única pessoa puder entender, a
mensagem foi expressa. E até se nenhuma pessoa puder entender agora, talvez
depois de muitos séculos haja uma pessoa que possa entender, e então também
a mensagem foi expressa. Ela é expressa na própria probabilidade de que
alguém possa entendê-la.
Mas a verdade não pode ser expressa porque o próprio alcançar a verdade se
dá por meio do silêncio, da ausência de som, da ausência de pensamento. Você
a alcança por meio da não-mente; a mente pára. Como você pode usar algo que,
como condição necessária, precisa ser abandonado antes que a verdade possa
ser alcançada? A mente não pode entender a verdade, não pode perceber a
verdade; então, como ela pode expressá-la? Lembre-se disto como uma regra:
se a mente puder atingir algo, ela pode expressá-lo; se a mente não puder atingi-
lo, ela não pode expressá-lo.
Todas as linguagens são inúteis, pois a verdade não pode ser expressa.
Então o que todas as escrituras têm feito, o que Lao Tzu está fazendo, o que os
Upanishades estão fazendo? Eles tentam dizer algo que não pode ser dito na
esperança de que possa surgir em você um desejo de conhecer a respeito. A
verdade não pode ser dita, mas, no próprio esforço de dizê-la pode surgir um
desejo naquele que ouve de conhecer o que não pode ser expresso.
A sede pode ser provocada; a sede já existe e precisa de uma pequena
provocação. Você já está sedento, e como pode ser diferente? Você não se
encontra no estado de plenitude, não está extasiado... você está sedento, o seu
coração está ardendo, você está procurando algo que possa saciar a sua sede,
mas, ao não encontrar a água, ao não encontrar a fonte, aos poucos você tenta
suprimir a sua sede. Essa é a única maneira, senão ela seria insuportável e não
permitiria que você vivesse. Dessa maneira, você suprime a sede.
Um mestre como Lao Tzu sabe muito bem que a verdade não pode ser dita, mas
o próprio esforço de dizê-la provocará alguma coisa, trará à superfície a sua sede
suprimida. E uma vez que a sede aflore, começa uma busca, uma investigação,
e ele fez com que você se movesse...
O Tao que pode ser dito não é o Tao absoluto.
No máximo ele pode ser relativo.
Por exemplo, podemos dizer alguma coisa sobre a luz a um cego, sabendo
perfeitamente bem que é impossível comunicar algo sobre a luz, pois ele não
tem a experiência da luz. Mas algo pode ser dito sobre a luz, teorias sobre a luz
podem ser criadas. Mesmo um cego pode se tornar um especialista nas teorias
da luz, sobre toda a ciência da luz, não há problema nisso, mas ele não
entenderá o que é a luz. Ele saberá em que consiste a luz, entenderá a sua
física, a poesia da luz, mas não a sua realidade, o que é a luz; a experiência da
luz não será entendida. Assim, tudo o que é dito a um cego sobre a luz é apenas
relativo; é algo sobre a luz e não a própria luz. A luz não pode ser comunicada.
Algo pode ser dito sobre Deus, mas Deus não pode ser explicado; algo pode ser
dito sobre o amor, mas o amor não pode ser explicado. Esse “algo” permanece
relativo para quem ouve, para a sua compreensão, para o seu domínio
intelectual, para o seu treinamento, para o seu desejo de entender. Depende do
mestre e é relativo ao mestre a maneira de ele se expressar, as estratégias que
ele usa para se comunicar. Isso permanece relativo, relativo a muitas coisas,
mas essa nunca pode se tornar a experiência absoluta. Essa é a primeira razão
de a verdade não poder ser expressa.
A segunda razão é que ela é uma experiência. Nenhuma experiência pode ser
comunicada... a verdade é deixada de lado. Se você nunca conheceu o amor,
quando alguém diz algo sobre ele, você ouvirá a palavra mas deixará escapar o
seu significado. A palavra está no dicionário; mesmo se você não entender,
poderá procurar no dicionário e saberá o que ela significa, mas o significado está
em você, pois o significado vem por meio da experiência. Se você amou alguém,
então conhece o significado da palavra “amor”. O significado literal está no
dicionário, na linguagem, na gramática, mas o significado experimental e
existencial está em você. Se você conheceu a experiência, imediatamente a
palavra “amor” deixa de ser vazia e passa a conter algo.
Se você disser alguma coisa, isso é vazio, a menos que você traga a sua
experiência junto com o que você diz. Quando a sua experiência entra em cena,
o que você diz se torna significativo; do contrário, o que você diz permanece
vazio, palavras e mais palavras.
Como a verdade pode ser expressa se você não a experimentou? Até na vida
comum algo não experimentado não pode ser dito; apenas palavras serão
transmitidas. O recipiente chegará a você, mas o conteúdo será perdido; uma
palavra vazia irá na sua direção, você a ouvirá e achará que a entende porque
conhece o seu significado literal, mas não a compreenderá na realidade. O
significado real e autêntico vem por meio da experiência existencial. Você terá
de conhecê-la, não existe outra maneira, não existem atalhos. A verdade não
pode ser transferida, você não pode roubá-la, não pode emprestá-la, não pode
comprá-la, não pode furtá-la, não pode mendigá-la; não há como fazer isso. A
menos que você a tenha, não pode tê-la.
O Tao que pode ser dito não é o Tao absoluto.
Lembre-se dessa condição.
Os três tipos de
pessoas
Lao Tzu diz: Quando o tipo mais elevado de pessoa ouve o Tao, tenta
arduamente viver de acordo com ele. Quando o tipo medíocre ouve o Tao,
parece estar consciente e, ainda assim, está inconsciente dele. Quando o tipo
mais inferior ouve o Tao, irrompe numa sonora gargalhada; se ele não fosse
digno de riso, não seria o Tao.
O maior mito é o da “humanidade”. Ela não existe, pois existem tantas
humanidades quantas são as pessoas, não existe um tipo só. Cada pessoa é
tão diferente das outras que não existe uma “humanidade”. Ela é apenas uma
palavra, uma abstração. Você parece ser semelhante aos outros, mas não é, e
esse mito precisa ser desfeito; só então você poderá penetrar mais fundo na
realidade dos seres humanos.
Nenhuma psicologia antiga jamais acreditou que a “humanidade” existisse. Na
verdade, se formos classificar, todas as psicologias antigas classificaram o ser
humano em três divisões. Na Índia, a humanidade foi dividida em três partes:
Satwa, Rajas e Tamas. Lao Tzu não deu esses nomes, mas também divide a
humanidade em três tipos, exatamente os mesmos.
Essas três divisões são arbitrárias, mas precisamos classificar para entender; na
verdade, existem tantas humanidades quanto existem homens e mulheres; cada
homem e cada mulher é um mundo em si mesmo, mas essa classificação ajuda
a entender muitas coisas que seriam impossíveis de serem entendidas sem ela.
Tente compreender a classificação tão claramente quanto possível.
Quando o tipo mais elevado de pessoa ouve o Tao, tenta arduamente viver de
acordo com ele. Quando o tipo medíocre ouve o Tao, parece estar consciente e,
ainda assim, está inconsciente dele. Quando o tipo mais inferior ouve o Tao,
irrompe numa sonora gargalhada; se ele não fosse digno de riso, não seria o
Tao.
O primeiro é Satwa, o segundo é Rajas e o terceiro é Tamas.
Quando o tipo mais elevado de pessoa ouve falar do Tao, de repente se sente
sintonizado com ele. Para ele, não se trata de um entendimento intelectual; todo
o seu ser vibra com uma nova canção, uma nova música é ouvida. Quando ele
escuta a verdade, de repente algo se encaixa, e ele deixa de ser o mesmo;
apenas ao ouvir, ele se torna um tipo de pessoa totalmente diferente. Não que
ele precise usar o intelecto para entendê-lo; esse seria um entendimento
retardado. O tipo mais elevado de pessoa entende imediatamente, sem nenhum
intervalo de tempo. Se ele ouve uma verdade, no próprio ouvir ele entende, e
não que tenha trazido seu intelecto para entendê-la, não, pois isso seria
adiamento; todo o seu ser a entende, e não apenas a parte intelectual, não
apenas a sua alma, não apenas a sua mente, mas até o seu corpo vibra de uma
nova maneira desconhecida. Uma nova dança entrou no seu ser, e agora ele
nunca poderá ser o mesmo.
Uma vez que tenha escutado a verdade, ele nunca poderá ser novamente o
velho; uma nova jornada começou. Agora nada pode ser feito, ele precisa seguir
adiante. Ele ouviu falar sobre a luz e tem vivido na escuridão; agora, a não ser
que atinja a luz, não haverá descanso para ele. Ele ficará profundamente
descontente, pois ouviu que um tipo diferente de existência é possível. Agora, a
menos que a alcance, que a atinja, ele não poderá ficar à vontade, não poderá
se sentir em casa em lugar nenhum. Onde ele estiver, a constante chamada do
desconhecido estará batendo à porta, esteja ele acordado, dormindo ou
sonhando... e a batida estará presente, ele a ouvirá. Ele a ouvirá ao comer, ao
caminhar, na loja, no mercado... Ela o perseguirá o tempo todo.
É por isso que J. Krishnamurti sempre dizia que não havia necessidade de fazer
coisa alguma. Na verdade, para o primeiro tipo de pessoa, não há necessidade
de fazer coisa alguma; a pessoa atinge apenas ao ouvir, ao ouvir corretamente.
Mas onde encontrar o primeiro tipo de pessoa? Ele é muito raro, e a menos que
Krishnamurti venha a ouvir Krishnamurti, nada acontecerá. Mas por que um
Krishnamurti iria ouvir um Krishnamurti? Isso é absurdo, não tem sentido. Uma
pessoa que tem esse tipo de perceptividade pode ficar desperta apenas ao ouvir
o canto de um pássaro, apenas ao ouvir a brisa passando por entre as árvores,
apenas ao ouvir o som da água fluindo; isso é suficiente, porque a verdade fala
a partir de todos os lugares. Se você for perceptivo, ouvirá a verdade, o Tao, a
partir de tudo o que você ouve. Nada mais existe, todos os sons são divinos,
todas as mensagens são divinas, em todos os lugares há a assinatura divina.
Para a primeira categoria de mente, o Caminho não é absolutamente um
caminho; a pessoa simplesmente entra no templo sem nenhum caminho, não há
necessidade de nenhuma ponte.
Lao Tzu diz que, quando o tipo mais elevado de pessoa ouve o Tao, há uma
percepção imediata, um entendimento imediato. Ela entende apenas ao olhar
para o mestre que atingiu, apenas ao ouvir a sua palavra, apenas ao ouvir a sua
respiração, o seu silêncio, a sua serenidade, ao sentar-se a seu lado.
Uma vez que as pessoas desse tipo entendam, então não tentam atingir a
verdade, mas simplesmente tentam aperfeiçoar seu mecanismo. Elas
entenderam a verdade; ela existe, elas a ouviram. Os hindus chamam suas
escrituras de Shrutis, e a palavra Shruti significa “aquilo que foi ouvido”. Todas
as escrituras são “aquilo que foi ouvido”.
Uma vez que uma pessoa da primeira categoria de inteligência ouça a verdade,
ela a entende.
Certa vez, aconteceu de um mestre sufi subitamente chamar um de seus
discípulos. Muitos discípulos estavam sentados no anfiteatro, mas ele chamou
apenas um: “Aproxime-se”.
O mestre estava perto da janela, e era uma noite de lua cheia. Todos os
discípulos olharam admirados. Por que o mestre chamou apenas esse discípulo?
Então o velho indicou ao jovem algo fora da janela e disse: “Olhe!” E a partir
desse dia o jovem se transformou completamente.
Os outros perguntaram: “O que aconteceu? Não havia nada, sabemos disso,
apenas a noite de lua cheia. Havia a lua cheia, é claro; a noite estava linda, é
claro; mas o que aconteceu com você parece ser completamente
desproporcional, pois você está completamente transformado. O que
aconteceu?”
O jovem respondeu: “Eu ouvi o mestre e, por ele ter me chamado, fiquei tão
silencioso, tão sem pensamentos e tão sereno que, quando ele indicou a lua,
algo se abriu dentro de mim, uma janela; tive uma percepção que jamais tive.
Olhei para a lua com novos olhos, olhei para o luar com um novo ser. É claro,
percebi a cena a partir de um estado mental vago e terei de trabalhar arduamente
para alcançá-lo definitivamente, mas agora ele existe, agora ele é uma certeza,
agora não há dúvida. Mas ainda terei de alcançar esse estado... porque vi por
meio dos olhos do mestre. Aqueles olhos não eram meus; por um momento, ele
me deu seus olhos; eu os tomei emprestado, olhei por meio do seu ser. Não era
o meu ser, a janela não era a minha, mas a dele, e ele permitiu que eu olhasse
por ela. Mas agora eu sei que um tipo diferente de existência é possível, e não
apenas é possível, mas é absolutamente certa. Agora pode levar muitas vidas
para eu alcançar esse objetivo, mas o objetivo é certo. Agora não há nenhuma
dúvida em mim, nenhuma dúvida pode me perturbar; agora a minha jornada está
clara”.
Quando o tipo mais elevado de pessoa ouve o Tao, tenta arduamente viver de
acordo com ele.
Ele ouve, entende e tenta arduamente viver de acordo com o Tao. A pessoa
olhou através da janela do mestre e ficou certa de que então se tratava de um
fato absoluto; não é uma filosofia, não é uma metafísica, e sim algo existencial.
Ela o sentiu e o conheceu, mas terá de percorrer uma longa jornada antes que
a mesma percepção se torne própria.
A pessoa ouviu a verdade e a entendeu, mas terá de percorrer uma longa
jornada antes que a verdade se torne o seu ser.
O tipo mais elevado tenta arduamente viver de acordo com o Tao, isso não quer
dizer que a pessoa o atinja ao tentar arduamente viver de acordo com ele, não.
Ninguém o atinge apenas por tentar arduamente; mas, por tentar arduamente, a
pessoa aos poucos passa a que, nos estágios finais de transformação, o próprio
esforço é uma barreira. Ao tentar arduamente, a pessoa passa a saber que,
mesmo tentar arduamente, é uma barreira, e então ela deixa de lado o esforço.
Porque, quando você tenta arduamente viver de acordo com o Tao, essa vida
não pode ser uma vida espontânea, apenas um fenômeno forçado, uma
disciplina, e não uma liberdade; isso se tornará uma escravidão. Ao tentar
arduamente, ninguém pode atingir aquilo que já está presente; mas, ao tentar
arduamente, a pessoa vem a entender que mesmo o esforço é uma barreira,
uma barreira muito sutil, porque todos os esforços são do ego. Até o desejo de
chegar à verdade vem do ego, e a pessoa também abandona isso.
Mas lembre-se, a pessoa só pode abandonar o esforço quando se esforçou ao
máximo. Você não pode dizer: “Se é assim, então seria melhor abandonar o
esforço desde o começo. Por que fazer esforço?” Assim você perderá o ponto,
e é isso o que aconteceu com os que ouviram Krishnamurti. Tudo o que ele diz
é perfeitamente verdadeiro, e ele diz que nenhum esforço é necessário. Isso está
certo, mas está certo apenas para aqueles que fizeram um grande esforço com
todo o seu ser. Isso só é verdadeiro para essas pessoas; elas podem abandonar
o esforço.
Para quem não passou por nenhuma disciplina, é impossível tornar-se
naturalmente habilidoso. No final, o artista precisa se esquecer completamente
da sua arte, tem de se esquecer de tudo o que aprendeu. Mas você pode se
esquecer apenas daquilo que aprendeu. Se a arte de um artista vem do esforço,
então não é uma arte perfeita.
No Zen, são usados muitos métodos para ensinar meditação às pessoas,
inclusive a arte: pintura, caligrafia e outras coisas. O estudante pode aprender
pintura durante dez ou doze anos, até que se torne tecnicamente perfeito sem
ter um único erro na sua metodologia. E quando ele se torna tecnicamente
perfeito, o mestre diz: “Agora abandone a arte. Durante dois ou três anos
esqueça-se completamente dela, jogue fora seus pincéis, esqueça-se de tudo o
que sabe de pintura e, quando você se esquecer completamente, volte a mim”.
Para se esquecer, são necessários dois, três, quatro, cinco anos, às vezes até
mais; o esquecimento é muito difícil. Primeiro é difícil aprender uma coisa, e é
mais difícil desaprendê-la uma vez que a aprendeu. A segunda parte é muito
essencial, é fundamental; se não for assim, você será um técnico e não um
artista.
Conta-se que um grande arqueiro treinou seu discípulo até a perfeição nessa
arte e então lhe disse: “Agora se esqueça de tudo o que sabe sobre isso.”
Durante vinte anos o discípulo ia ao mestre mas esse nada dizia; então o
discípulo precisou esperar pacientemente. Aos poucos ele se esqueceu de tudo
o que sabia sobre arcos e flechas... Vinte anos é muito tempo, e ele já estava
ficando velho.
Então, um dia, ele veio e, ao entrar na sala do mestre, viu um arco, mas não
reconheceu o que era aquilo. O mestre foi até ele, abraçou-o e disse: “Agora
você se tornou um arqueiro perfeito; você se esqueceu até mesmo do arco.
Agora vá lá fora e olhe os pássaros voando e, apenas com a idéia de que eles
deveriam cair, eles cairão”.
O arqueiro foi para fora e não pôde acreditar; ele olhou uns doze pássaros
voando, e eles caíram imediatamente no chão. O mestre disse: “Agora não há
mais nada a ser feito. Eu estava apenas lhe mostrando que, quando a pessoa
se esquece da técnica, só então ela se torna perfeita. Agora o arco e a flecha
não são mais necessários; eles são necessários apenas para os amadores”.
O pintor perfeito não precisa de pincéis e de telas; o músico perfeito não precisa
de cítara, violino ou violão. Não, isso é para os amadores.
Encontrei um músico muito velho, de cento e dez anos, e agora ele já morreu.
Ravi Shankar é seu discípulo... Ele podia criar música a partir de qualquer coisa,
fosse o que fosse. Ele poderia passar entre duas rochas e poderia criar música
com elas; ele poderia encontrar um pedaço de ferro e começar a tocar com ele,
e belas músicas jamais ouvidas seriam produzidas. Esse era um músico; até seu
toque era musical. Se ele o tocasse, você perceberia que ele tocou o instrumento
mais íntimo da sua harmonia e música interiores, e de repente você começaria
a vibrar.
Quando alguma coisa se torna perfeita, o esforço que você fez para aprendê-la
precisa ser abandonado; do contrário, o próprio esforço continua pesando sobre
a sua cabeça. Assim, não é que tentar arduamente viver de acordo com o Tao
leve o tipo mais elevado a alcançá-lo, não. Ele tenta arduamente viver de acordo
com ele e, aos poucos, começa a entender que nenhum esforço é necessário
para viver de acordo com a natureza. É como flutuar na água; ninguém pode
simplesmente flutuar, pois antes a pessoa precisa aprender a nadar. Não vá ao
rio, senão você afundará. A pessoa precisa aprender a nadar e, quando o nadar
se torna perfeito, ela não precisa nadar e pode simplesmente estar no rio,
flutuando; ela pode se deitar no rio como se estivesse deitada numa cama. Agora
ela aprendeu a estar em harmonia com o rio, agora ele não pode afundá-la,
agora ela não tem mais inimizade com ele. Na verdade, ela deixa de existir de
uma maneira separada do rio. O nadador perfeito se torna parte do rio, é uma
onda no rio. Como o rio pode destruir a onda? Agora ele flutua em harmonia com
o rio; ele não está ali brigando, resistindo, fazendo alguma coisa, mas está em
sintonia com o rio e pode simplesmente flutuar. Mas não tente isso, a menos que
saiba nadar, senão você afundará.
O mesmo acontece com o Tao. Você faz um grande esforço para viver de acordo
com a verdade; então, aos poucos, entende que seu grande esforço ajuda um
pouco, mas dificulta bastante. Viver em harmonia é ficar em um estado de deixar
acontecer, e não de lutar contra a natureza. Viver em harmonia com a natureza
é estar integrado a ela; não há necessidade de lutar. O esforço é uma luta e
significa que você está tentando fazer alguma coisa de acordo consigo mesmo.
A ciência é esforço, o Tao é ausência de esforço. A ciência é violência para com
a natureza, e é por isso que os cientistas falam continuamente em termos de
conflito, de conquista. É uma briga, como se a natureza fosse sua inimiga e você
precisasse dominá-la. A ciência é uma política contra a natureza, uma profunda
guerra, uma inimizade. O Tao não é uma luta; na verdade, ele faz entender que
você é parte da natureza. Como a parte pode lutar contra o todo? E, se a parte
tentar lutar contra o todo e for dominada pela ansiedade, o que você pode
esperar? Se a parte tentar lutar contra o todo, se a minha mão tentar lutar contra
todo o meu corpo, é natural que a mão fique doente. Como a mão pode lutar
contra o corpo? O corpo supre a mão com sangue, com nutrientes, e como ela
pode lutar contra o corpo? A mão lutando contra o corpo? Isso é tolice.
É tolice o ser humano lutar contra a natureza; você só pode viver em harmonia
com a natureza. O Tao é entrega, a ciência é guerra. A ciência fortalece o ego,
e todo o problema é como abandonar o ego; por meio do esforço ele não pode
ser abandonado.
Assim, lembre-se disto:
Quando o tipo mais elevado de pessoa ouve o Tao, tenta arduamente viver de
acordo com ele.
Esse é o primeiro ponto de vista. Uma vez que essas pessoas entendam, ouçam,
sintam, saboreiem, tenham afinidade com ele, elas começam o árduo esforço
para viver de acordo. Mas, aos poucos, à medida que crescem nisso, começam
a entender que o esforço não é necessário, e sim o estado de ausência de
esforço. No final, elas abandonam o esforço e se tornam uma coisa só com a
natureza.
Alguém perguntou a Lao Tzu: “Como você chegou lá?”
Ele respondeu: “Eu estava sentado sob uma árvore e tinha feito tudo o que
poderia ser feito, tudo o que era humanamente possível, e estava
completamente frustrado. Muita coisa aconteceu por meio disso, mas não tudo;
algo estava faltando, algo estava ausente, e o elo que faltava era o mais difícil
de encontrar. Então, enquanto eu estava sentado sob a árvore, uma folha seca
caiu lentamente da árvore e foi levada pelo vento. O vento estava indo para o
norte e a folha foi levada para o norte; então o vento mudou de curso e começou
a soprar para o sul, e a folha começou a ser levada para o sul; então o vento
parou, e a folha caiu no chão sem nenhuma queixa, sem nenhuma luta de sua
parte, sem nenhuma direção própria. Se o vento fosse para o sul, ela ia para o
sul; se o vento fosse para o norte, ela ia para o norte; se o vento parasse, ela se
deixava cair na terra e descansava serenamente.
“Então, novamente, o vento soprou e de novo a folha se deixou levar para o céu;
não havia nenhum problema. De repente eu entendi, a mensagem foi
transmitida. A partir desse dia, tornei-me uma folha seca, e o elo que faltava, que
era tão esquivo, deixou de ser esquivo. O elo que faltava era apenas este: você
pode atingir muitas coisas por meio do esforço, mas não pode atingir o Tao por
meio do esforço. No final, você precisa abandonar o esforço, e de repente tudo
se ajusta e você fica em harmonia. Então você não direciona, deixa de ser um
diretor e não diz aos ventos: vá para o sul, pois estou numa jornada em direção
ao sul. Então você não tem nenhum destino, e o destino do todo é o seu destino;
então você não está separado e não pensa em termos de individualidade; você
se tornou parte do todo e, aonde o todo estiver indo, você estará indo. Se o todo
mudar de idéia, você mudará de idéia; se o todo interromper a jornada, isso é
belo; se o todo correr, você correrá com ele. Viver ‘de acordo’ significa isso.”
Sem nenhuma idéia própria, quando você se torna uma não-mente, o todo vive
por meio de você, vive você, move-se por meio de você, move você. Agora você
não respira, o todo respira você, e tudo é uma bênção, é uma graça. Como então
você pode ficar tenso? Você pode ficar preocupado com o quê? Todas as
preocupações existem porque você imaginou um destino individual na sua mente
que se contrapõe ao destino do todo; você está seguindo contra a corrente.
Este é todo o segredo do seu fracasso: você está seguindo contra a corrente.
Então você fica preocupado, tenso, angustiado, ansioso, praticamente
enlouquecido; qualquer um enlouquecerá se for contra a corrente, pois a luta é
multo árdua e sem sentido. E um dia você se sentirá cansado, e isso parecerá
uma frustração, um fracasso. O sábio abandona essa tolice de seguir contra a
corrente e simplesmente deixa que o rio o leve para onde ele estiver indo. Se ele
estiver indo a algum lugar, bom; se não estiver indo a lugar nenhum, bom.
De repente, você fica sereno e silencioso. Então, e nunca antes, a meditação
verdadeira acontece e todo o esforço é abandonado. Mas primeiro você precisa
fazer o esforço; do contrário, nunca entenderá que ele precisa ser abandonado.
Quando o tipo medíocre ouve o Tao, parece estar consciente e, ainda assim,
está inconsciente dele.
A mente medíocre é isto: um pouco consciente. Um pouco de entendimento e
um pouco de não entendimento; uma pequena parte com luz e uma pequena
parte no escuro, dividida. Estar dividido é ser medíocre; estar dividido contra si
mesmo é ser medíocre, pois isso dissipa a sua energia e nunca pode permitir
que você tenha uma existência transbordante e cheia de celebração. Se você
estiver tentando criar uma luta entre a sua mão direita e a sua mão esquerda,
como poderá ser feliz? A própria luta o matará e nada resultará disso, pois como
a esquerda ganhará ou como a direita ganhará? Ambas as mãos são suas.
Qualquer tipo de conflito interior o torna medíocre, e aqueles que ensinam você
a ser dividido são seus inimigos. Eles dizem: “Isto é ruim e aquilo é bom”, e
imediatamente entra a divisão. Eles dizem: “Isto é inferior e aquilo é superior”.
Imediatamente entra a divisão. Eles dizem: “Isto é pecado e aquilo é virtude” e
imediatamente entra a divisão; você fica fendido. Toda a humanidade é
esquizofrênica e todos se tornaram medíocres.
Ser um só é ser bem-aventurado, estar dividido é ser infeliz; ser um só é estar
no paraíso, estar dividido é estar no inferno. Quanto mais dividido, maior será o
inferno; e você é uma multidão, e não somente dois, mas muitos. Os psicólogos
dizem que o ser humano se tornou polipsíquico: agora ele não tem uma mente
apenas, mas muitas mentes. Você também tem muitas mentes em pequenos
assuntos... comer isso ou aquilo. Num restaurante, ao olhar o cardápio, você é
polipsíquico: pedir isto ou aquilo? É como se você tivesse perdido toda a
possibilidade de ser decidido, porque você só pode ser decidido se for um só,
uma unidade.
Como você pode ser decidido? Quando uma voz diz isto, uma outra
imediatamente contradiz e diz aquilo; uma voz diz para ir em direção ao oeste,
uma outra diz para ir em direção ao leste. Se você for puxado contra si mesmo
em muitas direções, toda a sua vida será apenas um triste fracasso, uma longa
história de frustração e nada mais; “uma história contada por um idiota, cheia de
violência e de barulho, sem nada significar”.
O significado só é possível quando há um uníssono dentro de você. O tipo mais
elevado de pessoa pode atingir a unidade, o tipo mais inferior também pode
atingir um certo tipo de unidade, mas o tipo medíocre, o “do meio”, está no maior
perigo.
Você pode perceber pessoas sábias como Buda ou Lao Tzu em unidade; um
estado de plenitude as envolve, elas se movem circundadas por um êxtase sutil.
Se você olhar para elas, poderá perceber que elas estão inebriadas com o divino,
que elas caminham sobre a terra mas não são daqui. Às vezes você também
pode sentir o mesmo tipo de vibração em torno de um idiota; uma certa inocência
o envolve... Ele ri, e você pode ter um vislumbre do sábio no idiota, pois ele
também é um só. Ele não é um sábio, não atingiu nada, mas pelo menos não
está dividido.
O sábio foi além da mente, o idiota está abaixo da mente. Eles são iguais numa
coisa: nenhum dos dois está na mente. Existem grandes diferenças, mas há
também essa semelhança. Assim, se você não entender, um sábio pode às
vezes parecer um idiota, e, às vezes, na sua ignorância, você pode venerar um
idiota como um sábio. Encontrei muitos idiotas sendo venerados; eles têm uma
certa qualidade, pelo menos são um só. Eles não têm muita mente; na verdade,
absolutamente não têm mente, não têm pensamentos.
Vivi numa cidade durante muitos anos e, próximo a essa cidade, havia um santo
muito famoso, e pessoas costumavam chegar de toda a Índia para vê-lo. Ele era
um perfeito idiota, mas tinha uma certa beleza à sua volta — nenhuma
ansiedade, nenhum problema. Alguns problemas teriam existido para ele; mas
porque as pessoas começaram a venerá-lo, mesmo esses problemas deixaram
de existir. As pessoas levavam comida e outras coisas para ele, e assim até os
problemas de sobrevivência não existiam — chegaram até a fazer uma bela casa
para ele.
E, se você o observasse, poderia perceber que ele não entendia nada. Fui ver
esse homem muitas vezes e o observei de perto. Ele tinha problemas mentais e
não podia pronunciar uma única palavra, mas as pessoas achavam que ele tinha
feito um voto de silêncio por toda a vida.
Não havia nenhum brilho de lucidez em seus olhos, mas mesmo assim havia
semelhanças. As pessoas foram enganadas muitas vezes; é claro, esses pobres
idiotas não podem enganá-lo, mas é a sua própria credulidade: você é enganado
por si mesmo. E muitas vezes aconteceu de almas muito raras serem
consideradas idiotas, porque outra vez as pessoas percebiam que estava
acontecendo algo parecido com o que se dá com os idiotas.
O idiota é uma parte, o ser sobre-humano é uma parte; e existe ainda a parte
intermediária, a medíocre, que é a maior parte do mundo.
“A parte medíocre”, diz Lao Tzu, “parece estar consciente e, ainda assim, está
inconsciente dele”. Se você fala sobre a verdade, a mente medíocre a entende
intelectualmente, mas não totalmente. Ela diz: “Sim, posso entender o que você
está dizendo, mas ainda assim não compreendo alguma coisa. O que você quer
dizer?” A palavra é ouvida, mas o significado lhe escapa; ela percebe que pode
entender intelectualmente; ela é uma pessoa instruída, pode ser formada em
alguma faculdade, até com doutorado. Ela entende o que você está dizendo
porque entende a linguagem, mas sente que deixou escapar algo. Ela entende
a palavra, mas a palavra não é a mensagem. A mensagem é algo sutil; ela pode
vir com a palavra, mas não é a palavra.
A palavra é como uma flor; o significado é como uma fragrância que a circunda.
Se o seu olfato não estiver funcionando muito bem, eu posso lhe dar uma flor,
mas não posso lhe dar a fragrância. Se a sua mente não estiver funcionando
totalmente, eu posso lhe dar a palavra, mas não o significado, porque o
significado precisa ser detectado por você, decodificado por você. Eu posso lhe
dar a flor porque isso não é problema; mas, como posso lhe dar a fragrância?
Se o seu olfato não estiver funcionando, se ele estiver insensível, então nada
poderá ser feito; posso lhe dar mil e uma flores, mas você não sentirá a
fragrância.
Muitas pessoas me procuram e dizem: “Entendemos tudo o que você diz, mas
nada acontece. Entendemos tudo o que você disse, lemos muitos dos seus
livros, muitas vezes, sublinhamos quase todas as linhas, mas nada está
acontecendo”.
Eu posso lhe dar a flor, mas como posso lhe dar a fragrância? Você precisa
limpar o nariz, precisa ficar mais sensível, e é então que a meditação pode ser
proveitosa, pois o deixa mais sensível e mais alerta. Ela o empurra em direção
primeiro tipo, e, aos poucos, você começa a sentir, e não apenas a entender. A
sensibilidade é necessária, e eu não quero dizer com isso que você deva se
tornar sentimental, não. Sentimentalismo não é sensibilidade, mas uma moeda
falsa. Há pessoas que podem chorar e se lamentar por qualquer coisa e acham
que são do tipo que sente, mas não são. Elas são sentimentais, e
sentimentalismo não é sensibilidade.
A sensibilidade é uma qualidade muito madura; o sentimentalismo é uma
qualidade imatura. Uma pessoa de sensibilidade fará alguma coisa; uma pessoa
sentimental criará até mais problemas. Por exemplo, se alguém estiver enfermo
ou estiver morrendo, a pessoa de sensibilidade irá ao hospital e tentará ajudar
aquele que está morrendo; mas a pessoa sentimental começará a chorar e a se
lamentar, criando mais problemas para a pessoa que está morrendo, sem
mesmo permitir que ela morra em silêncio. O sentimentalismo é um caos, a
sensibilidade é um crescimento substancial. Quando eu falo sobre o amor, se
você tiver sensibilidade, então não apenas a sua cabeça entende, mas o seu
coração começa a pulsar de um modo diferente, e então a fragrância chega até
você.
A meditação pode ajudá-lo porque jogará fora toda a poeira e a sujeira que você
acumulou dentro de você, tudo o que está bloqueando a sua sensibilidade. As
portas da sua percepção estão cobertas de sujeira. Você gostaria de ver
corretamente, mas há tantas lágrimas reprimidas que elas não permitirão que
você tenha uma visão límpida. Você gostaria de sentir o aroma de uma flor, mas
não pode, porque toda a civilização reprimiu o olfato. Você pode não estar ciente
de que o nariz é a parte mais reprimida do seu corpo. O ser humano perdeu o
olfato quase por completo.
Até cavalos e cães são mais sensíveis do que o ser humano. O que está
acontecendo com o olfato do ser humano? Por que ele está praticamente morto?
Há um mecanismo sutil funcionando por trás disso, pois o olfato está
profundamente relacionado e conectado com o sexo. Você já viu animais se
cheirando antes de cruzar? Eles nunca cruzam a menos que se cheirem, pois
por meio do olfato sentem se a energia de seus corpos se fundirá ou não, se eles
terão afinidade ou não. Esse cheirar é um tipo de antena. O cachorro cheira a
cadela e, se ela se ajusta à sua sensibilidade e ao seu senso olfativo, só então
ele se empenha; senão, eles se separam. Ele não fica nem um pouco
preocupado, o contato acaba ali. Aquela fêmea não é para ele e ele não é para
ela.
O olfato é o sentido mais sexual do corpo e, quando a civilização decidiu reprimir
o sexo, automaticamente também decidiu reprimir o olfato. Sempre que uma
mulher quer fazer amor, subitamente começa a emitir aromas sutis à sua volta,
e isso seria perigoso em um mundo civilizado em que o sexo não é aceito. Se
você caminhasse na rua com a sua esposa e, se ela olhasse para um outro
homem e começasse a emitir o aroma, você saberia imediatamente! Então a sua
esposa não poderia enganá-lo, não poderia dizer que nem sequer olhou para o
homem. Mas como as coisas são agora, a própria esposa não pode saber que o
corpo dela está liberando um certo odor, nem o homem por quem ela ficou
atraída pode saber. Seu olfato está completamente insensível; você não cheira,
e dessa maneira as coisas continuam em ordem e não surge nenhum problema.
Assim, se você realmente quiser cheirar uma flor, se quiser não apenas carregar
a flor mas também desfrutar sua fragrância, então precisará chegar a um estado
mais natural de sexualidade não reprimida; do contrário, não será possível. E,
se todos os seus cinco sentidos estiverem cobertos de poeira e sujeira e
estiverem reprimidos, eles farão uma mente medíocre, pois a mente nada mais
é do que um reservatório coletivo de todos os cinco sentidos. Então você é
medíocre; você pode ficar cada vez mais erudito, mas continuará sendo um tolo,
pois não estará vivo.
Você observou o fenômeno de que os eruditos são as pessoas mais sem vida
que existem? Os professores e os eruditos são pessoas mortas! Elas não vêem,
não cheiram, não saboreiam; estão praticamente mortas, todos os seus sentidos
estão mortos e apenas a cabeça funciona, e funciona sozinha, sem nenhum
apoio do corpo. Se você cortar fora o corpo delas, não ficarão preocupadas;
apenas não lhes perturbe a cabeça! Pelo contrário, elas ficarão muito felizes se
a cabeça puder funcionar sem o corpo, pois assim poderão continuar em suas
viagens intelectuais sem que o corpo lhes crie nenhum problema; nenhuma
doença as incomodará, nenhuma fome as incomodará.
O erudito nem entra em contato com a própria fome, pois vive na cabeça. Os
eruditos são sempre medíocres, perfeitos medíocres; o problema do medíocre é
que ele entende, e isso o engana, pois ele acha que entende e o assunto fica
encerrado. Mas ele não entende nada e continua inconsciente; seu
entendimento é apenas da cabeça, e não de todo o seu ser. E, a menos que o
entendimento seja de todo o ser, ele absolutamente não é entendimento. O
entendimento intelectual não é, de modo algum, entendimento, mas uma
denominação imprópria.
Quando o tipo mais inferior ouve o Tao, irrompe numa sonora gargalhada.
O tipo mais inferior acha que essa verdade, que esse Tao, é algum tipo de piada.
Ele é tão superficial que nada que diga respeito ao profundo tem atrativo para
ele, e a risada é uma proteção. Quando a pessoa superficial, o tipo inferior, ouve
dizer sobre a verdade, ela ri porque você está parecendo engraçado. Ela está
convencida de que não existe verdade nenhuma, de que nada como a verdade
existe, de que se trata apenas de uma invenção de pessoas ladinas para explorar
outras pessoas. Ela dá uma sonora risada, e essa risada é uma proteção, porque
ela também está com medo, com medo de que a coisa possa existir. Por meio
da risada, ela descarta, joga fora a idéia. Por meio da risada, ela mostra seu
escárnio, sua condenação e diz que tudo aquilo é tolice; no máximo, pode-se rir
da idéia, e nada mais do que isso. Pode-se encontrar o tipo inferior em todos os
lugares, e, se ele encontrar Lao Tzu, rirá e dirá que esse homem enlouqueceu,
que mais uma pessoa se perdeu.
Se uma pessoa do tipo inferior vir você meditando, ela rirá e achará que você
parece um tanto excêntrico. O que você está fazendo, por que está
desperdiçando o seu tempo? Se ela puder rir, poderá se sentir muito bem
consigo mesma por não ser tão maluca e tola como os praticantes de meditação.
Lao Tzu diz:
...se ele não fosse digno de riso, não seria o Tao.
Ele diz: Se o terceiro tipo não rir quando ouvir falar sobre a verdade, ela não será
a verdade. Dessa maneira, esta é uma indicação definitiva: sempre que a
verdade é declarada, o tipo inferior imediatamente rirá. Isso por certo mostra
duas coisas: que a verdade foi declarada e que o tipo inferior a ouviu. Entre a
verdade e o terceiro tipo de pessoa, o tipo inferior, acontece a risada; entre o
medíocre e a verdade, acontece um tipo intelectual de compreensão; entre o
primeiro tipo e a verdade, acontece uma profunda compreensão de seu ser como
um todo. Esse ser total pulsa com a aventura desconhecida, uma porta se abre
e ele entra em um novo mundo.
A FOLHA CAI E FICA PARADA ALI
Se a História fosse escrita corretamente, então deveria haver dois tipos de História: a
dos realizadores, como Genghis Khan, Tamerlane, Nadirshah, Alexandre, Napoleão
Bonaparte, Ivan o Terrível, Joseph Stalin, Adolf Hitler, Benito Mussolini... essas são as
pessoas que pertencem ao mundo do fazer. E deveria haver uma outra História, uma
História mais elevada, uma História real, a da consciência humana, da evolução humana:
a de Lao Tzu, Chuang Tzu, Lieh Tzu, Gautama Buda, Mahavira, Bodhidharma, que é de
um tipo totalmente diferente.
Lao Tzu se iluminou sentado sob uma árvore. Uma folha tinha começado a cair; era
outono e não havia pressa para cair; a folha estava caindo lentamente em ziguezague,
com o vento, e ele a observou. A folha caiu no chão e ficou parada ali, e à medida que
ele observava a folha cair e se acomodar no chão, algo se acomodou nele.
A partir desse momento, ele deixou de ser um “realizador”. Os ventos sopram por conta
própria e a existência toma conta.
Ele era contemporâneo de um grande pensador, moralista e legislador, Confúcio, que
pertence à outra História, a dos realizadores. Confúcio tinha grande influência sobre a
China e tem até hoje.
Chuang Tzu e Lieh Tzu eram discípulos de Lao Tzu. Essas três pessoas atingiram os
cumes mais elevados, mas ninguém parece se impressionar com elas. As pessoas ficam
impressionadas quando você faz algo grandioso, e quem fica impressionado por alguém
que atingiu um estado de não-fazer?
SER INÚTIL
Lao Tzu estava caminhando com seus discípulos e eles chegaram a uma floresta onde
centenas de pessoas estavam cortando árvores, pois um grande palácio estava sendo
construído. Assim, praticamente toda a floresta tinha sido cortada, mas apenas uma
árvore estava em pé, uma grande árvore com milhares de galhos, tão grande que dez
mil pessoas podiam se sentar à sua sombra. Lao Tzu pediu aos discípulos para perguntar
por que aquela árvore não havia sido cortada, enquanto toda a floresta viera abaixo.
Os discípulos foram e perguntaram: “Por que vocês não cortaram aquela árvore?”
Eles disseram: “Aquela árvore é absolutamente inútil. Não se pode fazer nada com ela
porque todos os galhos têm muitos nós e não tem nenhum galho reto nela. Não se pode
fazer colunas a partir dela, não se pode fazer móveis com ela, não se pode usá-la para
queimar porque sua fumaça é muito perigosa para os olhos, que ficam praticamente
cegos com ela. Aquela árvore é absolutamente inútil, e é por isso que não a cortamos”.
Os discípulos voltaram a Lao Tzu, que riu e disse: “Sejam como essa árvore. Se vocês
quiserem sobreviver neste mundo, sejam como essa árvore, absolutamente inúteis.
Então ninguém os prejudicará. Se vocês forem retos, serão cortados e se tornarão
móveis na casa de alguém. Se vocês forem belos, serão vendidos no mercado e se
tornarão uma mercadoria. Sejam como essa árvore, absolutamente inúteis. Então
ninguém poderá prejudicá-los e vocês crescerão grandes e vastos e milhares de pessoas
poderão encontrar sombra debaixo de vocês”.
LAO TZU E CONFÚCIO
Conta-se que Confúcio foi ver Lao Tzu. Lao Tzu era velho e praticamente desconhecido,
e Confúcio era mais jovem e conhecido praticamente no mundo todo. Reis e imperadores
costumavam chamar Confúcio para se apresentar na corte, sábios costumavam procurá-
lo para receber conselhos; naqueles dias, ele era a pessoa mais sábia da China. Aos
poucos ele deve ter sentido que, embora sua sabedoria pudesse ser de utilidade para os
outros, ele não era bem-aventurado e não atingira coisa alguma. Ele se tornou um
especialista, talvez em ajudar os outros, mas não em ajudar a si mesmo.
Assim, ele começou uma busca secreta para encontrar alguém que pudesse ajudá-lo.
Sábios comuns não serviriam, pois eles costumavam procurá-lo para pedir conselhos;
grandes eruditos não adiantariam, pois eles costumavam procurá-lo para falar de seus
problemas. Mas devia haver alguém em algum lugar, pois a vida é muito ampla. Ele
começou uma busca secreta e enviou seus discípulos para procurarem alguém que
poderia ser de ajuda para ele, e eles voltaram com a informação de que havia um homem
cujo nome ninguém sabia, mas que era conhecido como “O Velho Camarada”.
Lao Tzu significa “O Velho Camarada”. Esse não é o nome dele, ninguém sabe o nome
dele. Ele era uma pessoa tão desconhecida que ninguém sabia quando tinha nascido e
quem era o pai e a mãe dele. Ele viveu noventa anos, mas apenas raros seres humanos
o encontraram, muito raros, pessoas que tinham visões e perspectivas diferentes a ponto
de entendê-lo. Ele existia apenas para os mais raros; uma pessoa tão comum, mas
apenas para as mentes humanas mais raras.
Ao ouvir a notícia de que existia um homem conhecido como “O Velho Camarada”,
Confúcio foi vê-lo. Quando ele encontrou Lao Tzu, pôde sentir que havia ali um homem
de grande compreensão, de grande integridade intelectual, de grande sagacidade lógica,
um gênio; ele pôde perceber que havia alguma coisa ali, mas não conseguiu captar o
quê. Vaga e misteriosamente havia algo ali; esse homem não era uma pessoa comum,
embora parecesse absolutamente comum. Algo estava oculto; ele estava carregando um
tesouro.
Confúcio perguntou: “O que o senhor tem a dizer sobre a moralidade? O que o senhor
tem a dizer sobre como cultivar um bom caráter?” Pois Confúcio era moralista e achava
que a maior conquista era cultivar um bom caráter.
Lao Tzu riu alto e disse: “Se você for imoral, só então surgirá a questão da moralidade.
Se você não tiver nenhum caráter, só então pensará em caráter. Uma pessoa de caráter
está absolutamente alheia ao fato de que existe algo como o caráter. Uma pessoa que
tem moral não sabe o que a palavra ‘moral’ significa. Assim, não seja tolo! E não tente
cultivar nada; simplesmente seja natural”.
O homem tinha tamanha energia que Confúcio começou a tremer. Ele não conseguiu
tolerá-lo e fugiu. Confúcio ficou com medo como se estivesse à beira de um abismo.
Quando ele voltou a seus discípulos, que esperavam do lado de fora sob uma árvore,
eles não puderam acreditar... Aquele homem tinha ido a imperadores, ao maior dos
imperadores, e nunca viram nenhum nervosismo nele. E agora ele estava tremendo e
um suor frio cobria todo o seu corpo. Eles não puderam acreditar. O que acontecera; o
que esse homem, Lao Tzu, fizera com o mestre deles? Eles lhe perguntaram, e Confúcio
respondeu: “Esperem um pouco. Deixem que eu me recomponha. Esse homem é
perigoso”
Confúcio disse aos discípulos: “Ouvi falar de grandes animais como elefantes, e eu sei
como eles caminham; ouvi falar de animais ocultos no oceano, e eu sei como eles
nadam; ouvi falar de grandes pássaros que voam milhares de quilômetros pela terra, e
eu sei como eles voam. Mas esse homem é um dragão, e ninguém sabe como ele
caminha, como ele vive, como ele voa. Nunca se aproximem dele; ele é como um abismo,
como a morte”.
E esta é a definição de um Mestre: um mestre é como a morte. Se você se aproximar
dele, se chegar muito perto, ficará com medo, um tremor tomará conta de você, você
será possuído por um medo desconhecido, como se você fosse morrer. Conta-se que
Confúcio nunca mais foi ver aquele velho.
PARTE TRÊS
Chuang Tzu:
natural e simples
Chuang Tzu foi um dos homens mais naturais que o mundo já viu.
Ele não criou nenhuma disciplina ou doutrina, nem fez nenhuma
catequese; ele simplesmente explicou uma coisa: se puder ser
natural e simples, como os pássaros e as árvores, você florescerá
e terá suas asas abertas no vasto céu.
O fácil é o certo
Chuang Tzu diz:
O fácil é o certo.
Comece certo e você estará sendo natural; continue natural e você estará certo.
O caminho certo para seguir facilmente é se esquecer do caminho certo e se
esquecer de que o seguir é fácil.
O fácil é o certo. Ninguém jamais ousou dizer isso; pelo contrário, as pessoas
tornam o “certo” o mais difícil possível. Para todos os que foram condicionados
por diferentes tradições, o errado é fácil e o certo é árduo. É preciso treinamento,
disciplina, repressão, renúncia ao mundo, renúncia aos prazeres...
As mentiras são fáceis, a verdade é difícil — este é o condicionamento comum
da humanidade.
Mas Chuang Tzu certamente é um homem de imenso discernimento. Ele diz: O
fácil é o certo.
Então, por que as pessoas têm tornado o certo tão difícil? Todos os seus santos
tornaram o certo muito difícil, e há uma psicologia por trás disso: apenas o difícil
é atraente para o seu ego. Quanto mais difícil a tarefa, mais o ego se sentirá
desafiado.
Escalar o Everest era difícil; antes de Edmund Hillary ter chegado vivo ao topo,
centenas de pessoas morreram na tentativa. Por todo um século, grupos e mais
grupos de alpinistas se empenharam, e, quando Edmund Hillary chegou ao topo,
não havia nada a ser encontrado! No ponto culminante, nem mesmo há espaço
suficiente... apenas uma pessoa pode ficar em pé ali. Perguntaram a ele: “O que
o estimulou? Sabendo perfeitamente bem que dezenas de alpinistas perderam
a vida ao longo de todos esses anos, e os corpos deles nem foram encontrados...
por que você tentou realizar esse projeto perigoso?”
Ele respondeu: “Eu precisava tentar, pois isso estava ferindo o meu ego. Sou
alpinista, adoro escalar montanhas, e era humilhante o fato de o Everest existir
e ninguém ser capaz de chegar ao cume. Não é uma questão de encontrar
alguma coisa... Eu me sinto imensamente feliz”.
O que é essa felicidade? Você não encontrou nada! A felicidade é que o seu ego
ficou mais cristalizado. Você é a primeira pessoa em toda a História que chegou
ao ponto culminante do Everest; agora ninguém pode tirar o seu lugar; qualquer
um que chegar lá será o segundo, o terceiro... mas você deixou a sua marca na
História; você é o primeiro. Você não encontrou nada, mas um profundo alimento
para o seu ego.
Todas as religiões tornam o certo difícil porque o difícil é atraente, atraente para
o ego. Mas o ego não é a verdade, não é o certo. Você percebe o dilema? O ego
só é atraído pelo difícil. Se você quiser que as pessoas sejam santas, precisará
tornar muito difícil o seu certo, a sua verdade, a sua disciplina. Quanto mais
difícil, mais as pessoas egóicas serão atraídas, serão praticamente puxadas
como que por um ímã.
Mas o ego não está certo; ele é a pior coisa que pode acontecer a uma pessoa,
e não pode lhe entregar o certo, a verdade, mas apenas fortalecer-se mais. Em
uma simples afirmação, Chuang Tzu está fazendo a afirmação mais fecunda: O
fácil é o certo. Porque o ego não sente atração pelo fácil. Se você estiver se
movendo na direção do fácil, o ego começará a morrer; e, quando não sobrar
nenhum ego, você chegará à sua realidade, ao certo, à verdade.
E a verdade e o certo precisam ser naturais. Fácil significa natural; você pode
encontrar o real e o verdadeiro sem esforço. “O fácil é o certo” significa que o
natural é o certo, que a ausência de esforço é o certo, que a ausência de ego é
o certo.
Comece certo e você estará sendo natural; continue natural e você estará certo.
Esses são os dois lados da mesma moeda. Se, ao começar a viver uma vida
certa, você descobrir que ela está difícil, então lembre-se: ela não está certa. Se,
ao viver o certo, sua vida se tornar cada vez mais fácil, cada vez um deixar
acontecer, um fluir com a corrente...
É difícil ir contra a corrente, mas seguir com a corrente não é difícil. Assim,
escolha as coisas mais fáceis da vida, as coisas mais naturais da vida, e você
estará certo; ou, se você quiser começar da outra maneira, lembre-se do critério
de que o certo precisa produzir a facilidade em você, o estado de relaxamento
em você.
Continue natural e você estará certo. Nem por um momento se esqueça de que
o difícil é alimento para o ego e que o ego é a barreira que o torna cego, que o
torna surdo, que torna o seu coração difícil de abrir, que faz com que amar,
dançar e cantar sejam impossíveis para você.
Continue no fácil. Toda a sua vida deve ser um fenômeno fácil, e então você não
estará criando o ego. Você será um ser natural, apenas ordinário, comum. E o
ordinário é o mais extraordinário. As pessoas que estão tentando ser
extraordinárias não entenderam nada. Seja simplesmente uma pessoa comum,
seja simplesmente um joão-ninguém.
Mas todos os seus condicionamentos são tão corruptos; eles o corrompem. Eles
dizem: estar no fácil é ser preguiçoso, ser normal é humilhante. Se você não
tentar ter poder, prestígio ou respeitabilidade, sua vida não terá sentido; isso foi
forçado a entrar na sua mente.
Com essas simples afirmações, Chuang Tzu está tirando todos os seus
condicionamentos. Continue natural e você estará certo. Nunca, nem por um
momento, sinta-se atraído pelo difícil. O difícil fará de você “alguém”, um
primeiro-ministro, um presidente, mas não o tornará divino. O fácil é divino.
Ouvi falar sobre um americano muito rico. Durante toda a vida ele tentou estar
no topo, e ele chegou lá e tinha todas as coisas que o mundo pode oferecer.
Mas, por dentro, ele se sentia um idiota, pois não havia nada no topo.
Se Edmund Hillary era suficientemente inteligente, deve ter se sentido um idiota
ao chegar no topo do Everest. Por que ele lutou tanto? O homem que caminhou
na Lua deve ter se sentido um pouco constrangido, embora não houvesse
ninguém que pudesse ver o rosto dele. No que se refere a dinheiro, esse homem
chegara ao topo e, no que se refere ao que o dinheiro pode comprar, ele tinha
comprado tudo. Agora ele estava se sentindo um idiota.
“Qual é o sentido disso tudo?” Ele se sentia vazio por dentro, pois não tinha
tempo para seu crescimento interior nem para conhecer a si mesmo.
Ele abandonou todas as suas riquezas e foi para o Oriente descobrir a verdade,
porque três quartos de sua vida tinham praticamente ficado para trás. Mas, se
alguma coisa fosse possível, ele ainda tinha alguns dias de vida para tentar. Ele
correu de mestre em mestre, mas ninguém conseguiu satisfazê-lo, porque tudo
o que eles diziam correspondia a uma outra viagem do ego, e ele já conhecia
muito bem essa viagem.
Não importa se você está acumulando dinheiro ou virtudes, se está ficando
respeitável aqui ou respeitável no outro mundo; não importa, o jogo é o mesmo.
Não faz diferença se você está se tornando uma celebridade mundialmente
famosa ou um santo venerado mundialmente; ambos são viagens do ego.
E todos aqueles gurus estavam tentando lhe ensinar disciplinas difíceis e
caminhos árduos para encontrar a verdade; todos eles estavam dizendo: “Pode
não ser possível nesta vida, mas mesmo assim comece. Talvez na próxima
vida... A jornada é longa, o objetivo é uma estrela distante”.
Mas agora ninguém podia enganá-lo. Ele havia entendido que “tornar-se alguém
especial” é um exercício de burrice.
Finalmente, ele ouviu falar de um santo que vivia no Himalaia; as pessoas
diziam: “Se você não ficar satisfeito com ele, não ficará satisfeito com ninguém;
então se esqueça de tudo”.
Assim, cansado e maltrapilho, ele caminhou quilômetros e acabou encontrando
o ancião; ficou muito feliz por vê-lo, mas ficou chocado. Antes que pudesse dizer
alguma coisa, o ancião perguntou: “Você é americano?”
Ele respondeu: “Sim, sou”.
O ancião disse: “Muito bom! Você tem cigarros americanos com você?”
O homem exclamou: “Meu Deus, onde fui parar? Vim procurar a verdade,
encontrar o certo...” Ele ofereceu os cigarros, o ancião pegou um e começou a
fumar.
O americano comentou: “O senhor nem me perguntou por que vim aqui,
cansado, faminto...”
O ancião disse: “Isso não importa”.
O americano afirmou: “Vim para encontrar a verdade!”
O ancião disse: “Verdade? Faça uma coisa: volte para o lugar de onde você veio.
E na próxima vez que vier, traga muitos cigarros americanos, pois neste lugar é
muito difícil arranjá-los. Sou uma pessoa sem preocupações, não me esforço
para fazer nada; as pessoas vêm por conta própria, mas gosto dos melhores
cigarros”.
E o homem perguntou: “Mas e a minha busca?”
O ancião respondeu: “Sua busca? Esta é a disciplina para você: volte, compre
tantos cigarros quanto puder, retorne e fique aqui comigo”.
O homem perguntou: “E a disciplina?”
O ancião disse: “Sou uma pessoa simples; nenhuma disciplina, nenhuma
religião, nenhuma filosofia, apenas gosto de fumar. Venha aqui e, lentamente,
também se tornará tão simples quanto eu. E eu lhe digo: ser simples, sem
nenhuma pretensão, é o certo”.
E, quando o homem se voltou para ir embora, perplexo, o ancião disse: “Escute,
pelo menos deixe o seu relógio aqui, porque não tenho nenhum e nunca sei que
horas são. E você está voltando e pode comprar outro relógio”.
Chuang Tzu teria gostado desse velho.
O fácil é o certo. Comece certo e você estará sendo natural. Esse precisa ser o
critério. Se você se sente pouco à vontade e tenso, então o que você começou
não pode estar certo.
Continue natural e você estará certo.
E a última parte nunca deve ser esquecida. O caminho certo para seguir
facilmente é se esquecer do caminho certo — porque até se lembrar disso é um
incômodo. O caminho certo para seguir facilmente é se esquecer do caminho
certo e se esquecer de que o seguir é fácil. Qual é a necessidade de se lembrar
dessas coisas?
Relaxe a um tal ponto... seja tão natural quanto as árvores e os pássaros. Ao
olhar os pássaros, você não acha que um é santo e outro é pecador; ao olhar as
árvores, você não acha que uma é virtuosa e a outra está cheia de maus hábitos.
Tudo é natural, tão natural que você nem precisa se lembrar disso.
Chuang Tzu foi um dos homens mais naturais que o mundo já viu. Ele não criou
nenhuma disciplina ou doutrina, nem fez nenhuma catequese; ele simplesmente
explicou uma coisa: se puder ser natural e simples, como os pássaros e as
árvores, você florescerá e terá suas asas abertas no vasto céu.
Você não precisa ser santo. Os santos são muito tensos, mais tensos do que os
pecadores. Conheci os dois e, se tivesse de escolher, eu escolheria os
pecadores como companhia, e não os santos. Os santos são as piores
companhias que existem, pois seus olhos estão cheios de julgamentos sobre
tudo: “Você deveria fazer isso e não aquilo”. E eles começam a dominar você, a
condená-lo, a humilhá-lo, a insultá-lo, porque o que eles estão fazendo é certo e
o que você está fazendo não é certo. Eles envenenaram tão cruelmente a sua
natureza que, se procurássemos criminosos de verdade, eles seriam
encontrados entre os santos e não entre os pecadores. Os pecadores não
fizeram muito mal às pessoas.
Visitei prisões, encontrei criminosos e fiquei surpreso ao ver que, muitas vezes,
eles eram as pessoas mais inocentes. Talvez por serem as mais inocentes é que
foram pegas; os espertos estão fazendo crimes muito maiores, mas não são
pegos. Todas as leis têm brechas, e os espertos encontram primeiro as brechas;
os inocentes são pegos porque não têm essa esperteza.
Estamos vivendo em um mundo muito estranho. Os criminosos é que ditam as
regras; os criminosos são os políticos; tornam-se presidentes, vice-presidentes,
primeiros ministros, pois, a não ser o criminoso, quem deseja o poder? Um ser
humano autêntico quer paz, quer amor, quer que o deixem em paz, quer a
liberdade para ser ele mesmo. A própria idéia de dominar os outros é criminosa.
Chuang Tzu está certo: se você sente alguma tensão, lembre-se de que o que
você está fazendo não está certo. E ele foi a única pessoa que sugeriu um critério
tão belo:
O fácil é o certo.
Comece certo e você estará sendo natural; continue natural e você estará certo.
O caminho certo para seguir facilmente é se esquecer do caminho certo e se
esquecer de que o seguir é fácil.
Relaxe sendo um joão-ninguém, seja natural, torne-se parte deste universo
relaxado, tão relaxado que você se esquece de tudo sobre o fácil e de tudo sobre
o certo.
NÃO HÁ COMO
Conta-se que, na primeira vez em que Chuang Tzu entrou na cabana em que vivia seu
futuro mestre, Lao Tzu, este olhou para Chuang Tzu e disse: “Lembre-se de uma coisa,
nunca me pergunte como ficar iluminado”. O pobre sujeito tinha ido até ele justamente
com esse propósito. Mas Lao Tzu deixou bem claro: “Somente sob essa condição é que
eu o aceitarei como discípulo”.
Houve um momento de silêncio. Chuang Tzu pensou: “Estranho. Vim para me iluminar,
e esse é o verdadeiro propósito de ser um discípulo. E esse velho camarada, tão belo e
tão gracioso, está pedindo uma coisa muito absurda: se quiser ser meu discípulo,
prometa-me que nunca perguntará nada sobre como ficar iluminado”.
Mas era tarde demais, pois ele já estava sentindo amor pelo velho. Chuang Tzu tocou
os pés de Lao Tzu e disse: “Prometo que nunca perguntarei como me tornar iluminado,
mas aceite-me como seu discípulo”.
No mesmo instante ele sentiu uma forte bofetada. “Seu idiota! Se não for para você se
iluminar, para que você está se tornando um discípulo? Exigi de você essa resposta
porque pude reconhecer em você uma grande inteligência que poderia imediatamente
perceber o motivo do meu pedido. Você é iluminado; não há como se tornar iluminado,
não há necessidade. Na verdade, mesmo se você quiser ser não-iluminado, não há
como.”
A TARTARUGA FELIZ
Dois mensageiros foram enviados pelo imperador. Chuang Tzu estava pescando, e eles
se aproximaram e disseram: “O imperador quer que o senhor seja o primeiro-ministro do
país”
Chuang Tzu perguntou: “Vocês vêem aquela tartaruga ali, balançando o rabo na lama?”
Eles responderam: “Sim, vemos”.
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O Caminho do Tao: ensinamentos e história

  • 1. OSHO TAO sua história e seus ensinamentos “A atitude taoísta é seguir com a vida — seguir ao longo de todo o caminho, sem impor condições. Seja aonde for que a vida o leve, siga com ela. Você é fruto da vida, você faz parte dela, então como ela poderia feri-lo? Não é preciso ter medo.” UNIVERSALISMO
  • 2. Sumário Introdução Tao: a grande rebelião Parte I – Os princípios do Tao A síntese suprema Yin e Yang Nenhum objetivo, nenhuma técnica O caminho da água corrente Parte II – Lao Tzu “o velho camarada” O Tao absoluto Os três tipos de pessoas Parte III – Chuang Tzu: natural e simples O fácil é o certo O valor do que é inútil Parte IV – Lieh Tzu: um mestre contador de histórias Como expressar o inexprimível A natureza do saber Parte V – Ko Hsuan: nenhuma doutrina, nenhum ensinamento O Clássico da Pureza
  • 3. Tao: a grande rebelião Os mestres taoístas falam apenas do “Caminho”; Tao significa o Caminho, e eles nada falam sobre o objetivo. Eles dizem: “O objetivo virá por si mesmo; você não precisa se preocupar com ele”. Se você conhece o Caminho, conhece o objetivo, pois o objetivo não está no final do Caminho, mas ao longo de todo o Caminho; a cada momento e a cada passo ele está presente. Não que você atinja o objetivo quando o Caminho termina; se você estiver no Caminho, estará no objetivo a todo momento, onde quer que você esteja. Estar no Caminho é estar no objetivo. Por isso os mestres taoístas não falam sobre o objetivo, não falam sobre Deus, não falam sobre moksha, nirvana, iluminação... não, absolutamente. A mensagem deles é muito simples: você precisa encontrar o Caminho. As coisas ficam um pouco mais complicadas porque eles dizem: O Caminho não tem mapa, não está cartografado, não é tal que você possa seguir alguém e encontrá-lo. O Caminho não é como uma auto-estrada; é mais como um pássaro voando no céu, sem deixar rastro... O pássaro voou, mas nenhum rastro foi deixado e ninguém pode segui-lo. Assim, o Caminho é um percurso inexplorado; ele é um percurso, mas inexplorado; ele não está pronto, não está disponível, você não pode simplesmente decidir caminhar por ele; você terá de encontrá-lo. E você terá de encontrá-lo à sua própria maneira, pois nenhuma outra servirá para você. Buda caminhou, Lao Tzu caminhou, Jesus caminhou, mas esses caminhos não irão ajudá-lo, porque você não é Jesus, não é Lao Tzu, não é Buda. Você é você, um indivíduo único. Somente ao caminhar, somente ao viver a sua vida, você encontrará o Caminho. Isso é algo de grande valor. É por isso que o Taoísmo não é uma religião organizada, e nem pode ser. Ele é uma religiosidade orgânica, mas não uma religião organizada. Você pode ser um taoísta se simplesmente viver sua vida autêntica e espontaneamente, se tiver coragem de entrar no desconhecido por conta própria, sozinho, sem depender de ninguém, sem seguir ninguém, mas simplesmente penetrando na noite escura sem saber se chegará a algum lugar ou se ficará perdido. Se você tiver coragem, esse risco existe; é arriscado, é uma aventura.
  • 4. O Cristianismo, o Hinduísmo e o Islamismo são grandes rodovias: você não precisa arriscar nada, simplesmente segue a multidão. Com o Tao, você precisa seguir sozinho, precisa estar sozinho. O Tao respeita o indivíduo e não a sociedade; respeita o único e não a multidão; respeita a liberdade e não a conformidade. O Tao não tem tradição; ele é uma rebelião, e a maior rebelião possível.
  • 5. PARTE UM Os princípios do Tao O Tao é um, mas no momento em que ele se torna manifesto, precisa se tornar dois. A manifestação precisa ser dual: ela não pode ser uma só, precisa se dividir em duas. Ela precisa tornar-se matéria e consciência, precisa tornar-se homem e mulher, dia e noite, vida e morte... Você encontrará esses dois princípios em todos os lugares. O todo da vida consiste nesses dois princípios, e por trás deles está oculto o Uno. Se você insistir em permanecer às voltas com essas dualidades, nos pólos opostos, permanecerá no mundo. Se você for inteligente, se for um pouco mais alerta e começar a olhar mais fundo, a olhar para a profundidade das coisas, ficará surpreso: os opostos não são realmente opostos, mas complementares. E por trás de ambos há uma única energia: o Tao.
  • 6. A síntese suprema Tao significa transcendência, transcendência de toda dualidade, de toda polaridade, de todos os opostos. O Tao é a síntese suprema — a síntese do homem e da mulher, do positivo e do negativo, da vida e da morte, do dia e da noite, do verão e do inverno. Como essa síntese é possível? Como a pessoa vem a desenvolver essa síntese suprema? Alguns pontos precisam ser entendidos. Primeiro, o princípio do yin, o princípio da feminilidade, é como uma escada entre o inferno e o paraíso. Você pode ir ao inferno por ela e pode ir ao paraíso por ela; a direção será diferente, mas a escada será a mesma. Nada acontece sem o feminino; a energia feminina é uma escada que vai do mais baixo ao mais elevado, do mais escuro dos vales ao mais luminoso dos picos. Esse é um dos princípios fundamentais do Tao e precisa ser entendido em detalhes. Uma vez que ele se enraíze no seu coração, as coisas ficam muito simples. Será bom entrar no simbolismo de Adão e Eva. O mundo não começou com Adão, mas com Eva; foi por meio dela que a serpente persuadiu Adão a desobedecer. A serpente não pôde persuadir Adão diretamente; é como se não houvesse um modo direto de persuadir o homem. Se você quiser atingir o homem, precisará fazer isso por meio da mulher. Ela serviu como um veículo para o demônio, e então, novamente, quando Cristo nasceu, nasceu da Virgem Maria. O Cristo menino nasceu da feminilidade virgem, do yin virgem. O mais elevado entra por meio da mulher. O mais inferior e o mais elevado são ambos expressos por meio da mulher. Adão significa “terra vermelha”. Deus fez Adão a partir da terra vermelha. Adão é o princípio do pó sobre pó; o homem é o princípio exterior, da extroversão, é o corpo físico. Tente entender esses símbolos. O homem é o corpo físico e Deus criou Eva a partir do corpo físico do homem. Eva era algo mais elevado. Primeiro o homem precisou ser criado, e depois a mulher. O feminino era algo mais sutil, mais sofisticado, de uma síntese superior. Eva foi criada de uma costela e não poderia ser criada diretamente da terra. Para entender esses símbolos, considere que você não pode comer lama, mas pode comer maçãs, que estão num plano mais elevado. As maçãs vêm da terra,
  • 7. as árvores crescem da terra, então a maçã nada mais é do que terra transformada. Você pode comer a maçã e pode digeri-la, mas morrerá se tentar comer a terra. A maçã é da terra, mas é uma síntese superior, melhor, mais digerível. Deus criou Adão e, na maneira de ver do homem, ele é o primeiro porque Deus o criou primeiro. Não, o homem foi criado primeiro porque está muito próximo da terra. Depois a mulher foi criada — ela não está tão próxima da terra. Ela foi criada a partir de Adão e é uma síntese superior. O nome Eva também é significativo; ele significa “coração”. Adão significa terra, Eva significa coração. Deus disse a Adão para dar nome às coisas; então ele deu nome a tudo e, quando foi dar nome a Eva, simplesmente disse: “Ela é o meu coração, Eva.” Esse se tornou o nome de Eva. Eva ou Eve significa coração; e, traduzido para o jargão moderno, significa psique. O homem é o princípio corporal, a mulher é a psique; o homem é corpo, a mulher é mente. E tudo acontece por intermédio da mente. Antes de você fazer algo errado, a sua mente precisa ser convencida disso; antes de fazer algo bom, a sua mente precisa ser convencida disso. Tudo acontece primeiro como uma idéia, e então ela pode ser posta em prática. O seu corpo não pode ser persuadido a fazer algo a menos que a sua mente esteja disposta a fazê-lo. Até mesmo se uma doença entrar no seu corpo, entrará por intermédio da mente. Tudo o que acontece, acontece por intermédio da mente. A mulher é o princípio do interior; certamente não do interior mais profundo, mas do interior. Ela está justamente no meio. O interior mais profundo é chamado de alma, o mais exterior é chamado de corpo, e justamente entre esses dois está a psique, a mente. Esse é o significado de toda a parábola de Adão e Eva. A serpente persuadiu Eva, e apenas a mente pode ser persuadida, convencida, seduzida; e então a mente pode persuadir o corpo muito facilmente. Na verdade, o corpo segue a mente como uma sombra. Uma vez que a sua mente tenha um pensamento, é inevitável que ele se transforme em realidade. Por meio de Eva, Adão caiu; por meio de Eva, ele foi expulso do Jardim de Deus; por meio de Eva, desenrolou-se essa grande aventura que chamamos de mundo; por meio de Eva, Adão desobedeceu. Adão seguiu Eva nesta aventura pelo mundo. A parábola sobre Jesus é a mesma, com uma ênfase diferente. Jesus nasceu da Virgem Maria. Por que de uma virgem? Porque, se você entender corretamente, virgem significa uma mente absolutamente pura, não contaminada por nenhum pensamento. Os pensamentos são representados pela serpente, pois os
  • 8. caminhos dos pensamentos são muito serpentiformes. Se você observar seus pensamentos, entenderá por que foram representados pela serpente. Eles deslizam como serpentes, insinuam-se sorrateiramente dentro de você e são muito espertos, ladinos e enganadores, como as serpentes. Eles se escondem em buracos escuros no seu inconsciente e, sempre que têm oportunidade, saltam sobre você. Na noite, na noite escura, eles saem; durante o dia, eles se escondem. Quando você está um pouco alerta, esses pensamentos desaparecem; quando você não está muito alerta, eles saem e começam a influenciá-lo. A Virgem Maria significa uma mente em meditação; Eva significa uma mente cheia de pensamentos, cheia de serpentes. Jesus entrou novamente no mundo por intermédio da Virgem Maria, por meio da pureza, da inocência. Os pensamentos são ladinos; a ausência de pensamentos é inocente. Se você entender essas belas parábolas, ficará surpreso: não fizemos justiça a elas. Elas não são fatos históricos, mas grandes metáforas do interior do ser humano. Por meio de Eva, Adão caiu, e por meio da Virgem Maria, Jesus se elevou e novamente entrou no mundo da divindade. Mais uma coisa: conta-se que o pecado de Adão foi a desobediência. Deus disse para ele não comer o fruto de uma certa árvore, a árvore do conhecimento, mas a serpente persuadiu Eva, e essa persuadiu Adão. Houve uma desobediência. Você ficará surpreso ao saber que o significado hebraico de “Maria” é rebelião. A palavra hebraica é mariam, que significa rebelião. Pela desobediência, Adão caiu; pela rebelião, Jesus se ergueu. Desobediência significa uma reação, ir contra, contra Deus; rebelião significa negar o negativo, ir contra o mundo, ir contra as serpentes. Eva ouviu as serpentes e foi contra Deus; Jesus se rebelou contra as serpentes e ouviu Deus. A desobediência é política, a rebelião é religiosa; a desobediência só traz a desordem. A rebelião, a rebelião verdadeira, traz uma mudança radical no seu ser, uma virada de cento e oitenta graus, uma conversão. Mas ambos, Adão e Jesus, aconteceram por meio do princípio feminino.
  • 9. Yin e Yang Na linguagem taoísta, o princípio feminino é chamado de yin e o princípio masculino é chamado de yang. Yang é ambição, é agressão, é desejo e projeção. Yang é político, yin é religioso. Sempre que você for ambicioso, é impossível ser religioso; sempre que você for religioso, é impossível ser político. Eles não caminham juntos. Eles não se misturam. Não podem se misturar — a própria natureza deles é como a água e o óleo. A ambição e a meditação nunca se misturam. O político age por meio do princípio masculino e o sábio age por meio do princípio feminino. É por isso que os sábios se tornam tão suaves, tão femininos, tão plenos, tão belos. Uma certa graça os circunda, e a beleza certamente não é apenas do corpo — às vezes pode acontecer de o corpo não ser absolutamente bonito. No começo do Cristianismo, havia uma lenda de que Jesus era a pessoa mais feia do mundo. Com o passar do tempo, os cristãos abandonaram essa idéia, pois não gostavam dela, mas ela tem algo de belo em si. A lenda dizia que o corpo de Jesus era feio, mas, ainda assim, quando alguém se deparava com ele, ficava de repente surpreso, tomado, possuído, encantado com a sua beleza. Se você olhasse um retrato dele, veria apenas a sua feiúra. Mas, se fosse até ele, se entrasse na sua presença real, você se esqueceria de sua feiúra porque muita beleza fluía. Assim, tanta beleza se despejava e vertia dele que você nem sequer se lembrava de que ele era feio. Assim, os que não viram Jesus achavam que ele era feio, e os que o viram costumavam dizer que ele era a pessoa mais bela que jamais existiu. O corpo não é o que importa. O sábio não vive no corpo ou como o corpo; ele vive por meio do corpo. O político nada mais é do que o corpo, o extrovertido. O corpo é extrovertido, a psique é introvertida, e, quando você transcende ambos, surge o Tao. Quando você não é extrovertido nem introvertido, quando não está indo para o exterior nem para o interior, quando não está indo a lugar nenhum, há uma imensa serenidade. Não há nenhum movimento, porque não há motivação; sua chama interior não está mais oscilante, porque não há propósito a ser satisfeito, não há nenhum outro lugar para estar e ninguém mais para ser; você está absolutamente satisfeito com o momento. Então você transcendeu o homem, a mulher e a polaridade. O Tao está nessa transcendência.
  • 10. Essa transcendência foi ensinada de diferentes maneiras por todo o mundo; diferentes termos foram usados. A explicação de um termo ajudará você a entender. O termo é “Israel”. Esse não é o nome de uma certa raça e não é o nome de um certo indivíduo. Israel é exatamente o Tao. Israel é composto de três símbolos: is-ra-el. Is significa o princípio feminino, e vem da palavra egípcia isis. Ísis é a deusa lua egípcia e Ishtar é a deusa lua babilônica. Portanto, is é o princípio yin, feminino. Na ioga eles dizem que existem três passagens no ser humano: a lua, o sol e o transcendental. Com uma narina você respira a energia da lua, com a outra narina você respira a energia do sol, e bem no seu interior, quando ambos os tipos de respiração cessam, você transcende. Ra vem do deus egípcio do sol; ele representa o princípio masculino, yang. E el vem de Elohim, a mesma raiz da qual os muçulmanos derivaram a palavra “Alá”. A palavra hebraica para Deus é Elohim; el vem daí. Ela representa o encontro do feminino e do masculino e sua transcendência: o Tao. Israel significa exatamente Tao. Se você for dominado pelo sol, será agressivo, extremamente agressivo, ambicioso, político, caloroso, ardendo de desejo e paixão. Se você for dominado pela lua, será sereno, nada ambicioso, nada agressivo, receptivo, tranquilo, silencioso. Mas ambos precisam ser transcendidos, pois ambos são desequilibrados. A pessoa precisa chegar em um momento em que possa dizer: “Não sou nem homem nem mulher”. E é aí que ela se torna um Buda, um Cristo ou um Krishna, quando não é nem mulher nem homem, nem lua nem sol, nem is nem ra, nem yin nem yang, mas simplesmente é, puramente é. Todas as formulações desapareceram. Esse acontecimento se dá apenas com o tempo. Primeiro você precisa abandonar o princípio do ra, o princípio do sol, a energia masculina, e precisa se dirigir para o feminino, para a feminilidade, e daí você precisa avançar para o além. Lembre-se de que tudo acontece por meio do princípio feminino. Assim, não faz diferença se você está indo além ou para baixo, pois se trata de uma escada. Com o corpo, com a energia do sol, com o masculino, você se torna um estuprador. Você estupra a vida, não é um amante. A ciência vem da energia do sol, é orientada pelo masculino, e é por isso que o Oriente não pôde desenvolvê- la, pois viveu por meio do princípio da lua, do passivo, do silencioso, do que flui, do que não tenta conquistar, do que sente profundo amor pela natureza, do que não tenta lutar. O Oriente nunca foi um estuprador; o Ocidente estuprou a natureza, e por isso surgiram os problemas ecológicos, pois a natureza está sendo destruída.
  • 11. Com o princípio feminino, com o princípio da lua, existe amor. Você ama, mas não estupra. Às vezes o ato físico pode parecer o mesmo, mas a qualidade interior é diferente. Se você não amar a sua esposa, pode estuprar até mesmo ela. O ato físico de fazer amor ou estuprar uma mulher pode ser o mesmo, mas a qualidade interior difere. A ciência nasceu com a energia do sol e é um estupro contra a natureza. Com a energia da lua, nasceu a poesia, a arte, a pintura, a dança, a música; ela é amor brincando com a natureza. O Oriente viveu por meio da arte, da música, da dança, do teatro; o Ocidente tem tentado usar demasiadamente a energia masculina e perdeu o equilíbrio, mas o mesmo desequilíbrio aconteceu no Oriente. Até agora, nenhuma sociedade evoluiu a ponto de poder ser chamada de Israel, a ponto de poder ser chamada de Tao, a ponto de transcender ambas ou sintetizar ambas numa tal harmonia que o antagonismo desapareça. O Tao é o objetivo, ou seja, criar um ser humano que seja inteiramente integrado, totalmente integrado, e também criar uma sociedade humana que seja totalmente integrada.
  • 12. Nenhum objetivo, nenhuma técnica Toda técnica é contra a natureza, contra o Tao; todo esforço é contra o Tao. Se você conseguir deixar tudo por conta da natureza, então nenhuma técnica é necessária, porque essa é a técnica suprema. Se você conseguir deixar tudo por conta do Tao, essa é a mais profunda entrega possível. Você está entregando a si mesmo, o seu futuro, as suas possibilidades, está entregando o próprio tempo, todos os esforços. Isso significa paciência e espera infinitas. Depois que você entregar tudo à natureza, não há esforço, você apenas flui; você está num profundo estado de deixar acontecer. Coisas lhe acontecem, mas você não está fazendo nenhum esforço para que elas aconteçam, não está nem mesmo procurando-as. Se elas acontecerem, tudo bem; se não acontecerem, tudo bem; você não escolhe. Tudo o que acontece, acontece; você não tem expectativas e, é claro, nenhuma frustração. A vida flui e você flui com ela. Você não tem nenhum objetivo a alcançar, porque com o objetivo entra o esforço. Você não tem nenhum lugar para ir, porque, se tiver algum lugar para ir, o esforço virá; ele está implícito. Você não tem nenhum lugar para ir, nenhum lugar para alcançar, nenhum objetivo, nenhum ideal; nada precisa ser atingido, você entrega tudo, e, nesse momento de entrega, nesse exato momento, tudo lhe acontece. O esforço requer tempo, a entrega não leva tempo; técnica leva tempo, a entrega não leva tempo. É por isso que chamo a entrega de técnica suprema; ela é uma não-técnica. Você não pode praticá-la, não se pode praticar a entrega. Se você praticar, ela não é entrega; então você está contando consigo mesmo e não está totalmente impotente; então você está tentando fazer alguma coisa. Mesmo se for entrega, você está tentando fazê-la, e a técnica entrará em cena e, com a ela, entra o tempo, o futuro. A entrega não é temporal, ela está além do tempo. Se você se entrega, nesse exato momento você está fora do tempo, e tudo o que pode acontecer acontecerá. Mas então você não a está procurando, não a está buscando, não está ávido por ela. Você absolutamente não está pensando nela; para você, dá no mesmo se ela acontecer ou não acontecer.
  • 13. Tao significa entrega, entrega à natureza, e então o ego não existe. O tantra e a ioga são técnicas, e por meio delas você atinge um ponto de entrega, mas será um longo processo. No final, depois de cada técnica, você terá de se entregar, mas com as técnicas a entrega acontecerá no final. Com o Tao, no Tao, ela virá no começo. Se você puder se entregar agora mesmo, nenhuma técnica é necessária. Você precisa ser descondicionado. Se você estiver no Tao, então nenhuma técnica é necessária; se você for saudável, então nenhum remédio é necessário. Todo remédio é contra a saúde; mas você está doente, e o remédio é necessário. Esse remédio matará sua enfermidade; ele não pode lhe dar saúde, mas, se a doença for removida, a saúde lhe acontecerá. Nenhum remédio pode lhe dar saúde; basicamente, todo remédio é um veneno, mas você coletou algum veneno e precisa de um antídoto que criará um equilíbrio, e a saúde será possível. A técnica não lhe dará a sua divindade, não lhe dará a sua natureza. Ela destruirá tudo o que você juntou à volta da sua natureza; ela apenas tirará os seus condicionamentos. Você está condicionado e, no momento, não pode saltar em direção à entrega. Se você puder saltar, ótimo, mas você não pode... Seus condicionamentos perguntarão: “Como?” Então as técnicas serão de ajuda. Quando a pessoa vive no Tao, nenhuma ioga, nenhum tantra e nenhuma religião são necessários. A pessoa está perfeitamente saudável, e nenhum remédio é necessário. Toda religião é medicinal. Quando o mundo viver totalmente no Tao, as religiões desaparecerão e nenhum mestre, nenhum Buda e nenhum Jesus serão necessários, porque cada um será um Buda ou um Jesus. Mas, no momento, como você é, você precisa de técnicas; essas técnicas são antídotos. Você juntou à sua volta uma mente tão complexa que complicará tudo o que for dito e for dado a você; você tornará tudo mais complexo, mais difícil. Se eu lhe disser: “Entregue-se”, você perguntará: “Como?”; se eu disser: “Use técnicas”, você perguntará: “Técnicas? As técnicas não são contra o Tao?”; se eu disser: “Nenhuma técnica é necessária, simplesmente se entregue e a divindade lhe acontecerá”, imediatamente você perguntará: “Como?” Essa é a sua mente. Se eu disser: “O Tao está exatamente aqui e agora, você não precisa praticar nada; simplesmente dê um salto e se entregue”, você perguntará: “Como? Como posso me entregar?” Se eu lhe der uma técnica para responder ao seu “como”, sua mente dirá: “Mas um método, uma técnica e uma abordagem não são contra o Tao? Se a divindade for a minha natureza, então como pode ser alcançada por meio de uma técnica? Se ela já está presente, então a técnica é inútil, é desnecessária. Por que perder tempo com técnicas?” Observe essa mente! Certa vez aconteceu de um homem, pai de uma jovem, pedir ao compositor Leopold Godowsky para ir à sua casa e dar aula à sua filha. Ela estava
  • 14. aprendendo piano e Godowsky foi à casa deles e, pacientemente, ouviu a jovem tocar. Quando ela terminou, o pai riu exultante, deu um grito de felicidade e perguntou a Godowsky: “Ela não é maravilhosa?” Conta-se que Godowsky respondeu: “Ela tem uma técnica impressionante. Nunca ouvi alguém tocar uma peça tão simples com uma dificuldade tão grande”. É isso o que acontece na sua mente. Mesmo uma coisa simples, você a tornará complicada, difícil para si mesmo. E essa é uma medida de defesa, porque, quando você cria dificuldade, não precisa fazê-la; primeiro o problema precisa ser resolvido, e só depois você pode fazê-la. Lembre-se, você pode seguir em frente indefinidamente nesse círculo vicioso, mas precisará quebrá-lo em algum ponto e sair dele. Seja determinado, porque somente com decisão nasce a sua humanidade, somente com decisão você se torna humano. Seja determinado; se você puder se entregar, entregue-se; se não puder se entregar, então não crie problemas filosóficos e use alguma técnica. De ambas as maneiras, a entrega lhe acontecerá.
  • 15. O caminho da água corrente Existem poucos templos taoístas, então é muito raro encontrar uma estátua taoísta. A maioria se encontra nas montanhas ao ar livre, esculpidas na rocha, sem teto, sem templo, sem sacerdote, sem culto. Havia uma estátua de Lao Tzu, o fundador do Tao, e durante anos um jovem pensou em ir às montanhas para ver essa estátua. Ele adorava as palavras, a maneira como Lao Tzu falava, o seu estilo de vida, mas nunca tinha visto nenhuma de suas estátuas. Anos se passaram, e sempre havia muitas coisas impedindo o jovem de satisfazer seu desejo de ver a estátua. Certa noite, finalmente, ele decidiu que precisava ir; não era muito longe, apenas a cem quilômetros dali, mas ele era pobre e teria de ir a pé. Ele decidiu partir no meio da noite, pois sua esposa e seus filhos estariam dormindo e não poderiam criar problemas. A noite estava escura, então ele pegou uma lamparina e se dirigiu para as montanhas. Quando ele saiu da cidade, surgiu-lhe um pensamento: “Meu Deus, cem quilômetros! E tenho apenas dois pés; isso irá me matar, estou pedindo o impossível; nunca caminhei tanto, e não há estradas”. Havia uma pequena trilha pelas montanhas, que também era perigosa, e então ele pensou: “É melhor esperar o amanhecer. Pelo menos haverá luz e poderei ver melhor; senão sairei dessa pequena trilha e sem sequer ver a estátua de Lao Tzu; estarei simplesmente acabado! Por que me suicidar?” Assim, ele parou e se sentou. Quando o sol nasceu, passou por ali um velho que, ao ver o jovem sentado, lhe perguntou: “O que você está fazendo aqui?” O jovem lhe explicou, e o velho riu e disse: “Você não ouviu o velho ditado? ‘Ninguém pode dar dois passos ao mesmo tempo, apenas um passo por vez; e não importa se a pessoa é poderosa, fraca, jovem, velha’. E o ditado continua: ‘Passo a passo, um passo por vez, uma pessoa pode caminhar dez mil quilômetros’. E são apenas cem quilômetros! Parece que você não é inteligente... E quem lhe disse que você precisa caminhar sem parar? Você pode levar o tempo que quiser; depois de dez quilômetros, você pode descansar por um ou dois dias e curtir. Este é um dos vales mais bonitos que existem, tem as montanhas mais belas e as árvores estão
  • 16. carregadas de frutas, frutas que talvez você nunca tenha provado. De qualquer maneira, eu estou indo e você pode vir comigo; fiz esta trilha milhares de vezes, e tenho pelo menos quatro vezes mais a sua idade. Levante-se!” O homem era tão autoritário... Quando ele disse: “Levante-se!”, o jovem simplesmente se levantou. E o velho disse: “Dê-me as suas coisas. Você é jovem, inexperiente; eu carregarei as suas coisas. Simplesmente me siga e faremos tantas paradas quanto você quiser”. O que o velho disse era verdade. Quando eles entraram mais fundo na floresta e nas montanhas, a paisagem foi ficando cada vez mais bonita. Havia tantas frutas silvestres suculentas e, sempre que o jovem queria descansar, o velho estava disposto a parar. O jovem ficou surpreso pelo fato de o velho nunca dizer qual era a hora de descansar, mas sempre que ele dizia que era bom descansarem, o velho estava disposto a descansar com ele. Um dia, dois dias de descanso, e então eles recomeçavam a jornada. Os cem quilômetros passaram logo, e eles chegaram a uma das mais belas estátuas de um dos homens mais notáveis que caminharam sobre a terra. Até mesmo a estátua dele tinha algo especial, pois não era apenas uma obra de arte; ela fora criada por artistas taoístas para representar o espírito do Tao. O Tao acredita na filosofia da entrega; acredita que você não precisa nadar, mas apenas fluir com o rio, deixar que o rio o leve para onde ele estiver indo, pois todo rio no final chega ao oceano. Então não se preocupe: você chegará ao oceano, e não há necessidade de ficar tenso. A estátua estava naquele lugar solitário, e havia uma cachoeira ao lado, porque o Tao é chamado de o caminho da água corrente. Assim como a água segue fluindo sem nenhum guia, sem nenhum mapa, sem nenhuma regra, sem nenhuma disciplina... mas de uma maneira muito humilde, porque em todos os lugares ela está sempre procurando a posição menos elevada. Ela nunca vai para cima, sempre vai para baixo; e chega ao oceano, à sua própria fonte. Toda a atmosfera ali era uma representação da idéia taoísta do deixar fluir. O velho afirmou: “Agora começa a jornada”. O jovem disse: “O quê? Eu estava pensando que, depois de cem quilômetros, a jornada estaria terminada”. O velho disse: “Essa é apenas a maneira como os mestres falam às pessoas. Mas a realidade é que, a partir deste ponto, a partir desta atmosfera, começa uma jornada de mil e um quilômetros. E não o enganarei, porque depois de mil e um quilômetros você encontrará um outro velho, talvez eu mesmo, que lhe dirá: ‘Esta é apenas uma parada. Siga em frente’. Seguir em frente é a mensagem”.
  • 17. A jornada é infindável, mas o êxtase continua se aprofundando. A cada passo, você é mais; sua vida fica mais viva, sua inteligência fica chamejante. E ninguém pára; uma vez que o buscador tenha chegado ao seu ser, ele próprio torna-se capaz de perceber o que está à frente: tesouros e mais tesouros. A persuasão é necessária apenas até o ponto do ser; esses primeiros cem quilômetros são os mais difíceis, depois deles podem vir mil e um quilômetros ou uma infinidade; não faz diferença. Agora você sabe que na realidade não há objetivo; a própria conversa sobre objetivos era para os principiantes, para crianças. A jornada é o objetivo. A própria jornada é o objetivo. Ela é infinita, eterna. Você encontrará estrelas, espaços desconhecidos, experiências incognoscíveis, mas nunca chegará a um ponto em que possa dizer: “Agora cheguei”. Qualquer um que diga “Cheguei” não está no Caminho. Ele não viajou, sua jornada não começou e ele está apenas sentado no primeiro marco. Cada partida é um pouco dolorosa, mas a dor será imediatamente esquecida, pois mais e mais bem-aventurança se despejará sobre você. Logo você aprenderá isto: não é preciso sentir dor quando você parte depois de um pernoite. Você se acostuma, sabe que a jornada é infindável; e os tesouros ficam cada vez maiores, e você não é um perdedor. Parar em qualquer lugar será uma perda; então, não há fim, não há ponto final, nem mesmo um ponto e vírgula... O CAMINHO Tao significa caminho sem nenhum objetivo; simplesmente o Caminho. Há 25 séculos, Lao Tzu foi corajoso ao dizer às pessoas que não há objetivo e que não estamos indo a lugar nenhum. Estamos apenas indo para estarmos aqui, então torne o tempo tão belo, tão amoroso e tão alegre quanto possível. Ele chamou sua filosofia de Tao, e Tao significa o Caminho. Muitas pessoas lhe perguntaram: “Por que você escolheu o nome Tao? Pois você não tem nenhum objetivo na sua filosofia”. Ele respondia: “Especificamente por essa razão escolhi chamá-lo de ‘o Caminho’, para que ninguém se esqueça de que não há objetivo, mas apenas o Caminho”. O Caminho é belo, está repleto de flores e fica cada vez mais belo à medida que a sua consciência fica cada vez mais elevada. No momento em que você atinge o ponto culminante, tudo se torna tão doce, tão extasiante, que de repente você se dá conta de que este aqui é o lugar, este é o lar. Desnecessariamente você estava correndo para lá e para cá. Assim, cancele todas as passagens que você reservou! Não há nenhum lugar para ir.
  • 18. PARTE DOIS Lao Tzu: “o velho camarada” Lao Tzu é apenas um porta-voz da vida. Se a vida é absurda, Lao Tzu é absurdo; se a vida tem uma lógica absurda, Lao Tzu tem a mesma lógica. Lao Tzu simplesmente reflete a vida e não acrescenta nada a ela, não escolhe nada; ele simplesmente aceita tudo o que ela é. É simples perceber a espiritualidade de Buda; é impossível deixar de vê-la, ele é tão extraordinário! Mas é difícil perceber a espiritualidade de Lao Tzu; ele é muito comum, assim como você. Você terá de crescer em entendimento. Buda passa por você e imediatamente você reconhecerá que um ser humano superior passou; ele carrega a aura de um ser humano superior. É difícil não notá-lo, praticamente impossível. Mas Lao Tzu... ele pode ser o seu vizinho. Você pode ter deixado de notá-lo porque ele é muito comum, extraordinariamente comum, e essa é a sua beleza.
  • 19. O Tao absoluto Deixe-me contar-lhe a história de como foram escritos os versos do Tao Te Ching, de Lao Tzu, porque isso o ajudará a entendê-los. Lao Tzu viveu noventa anos; na verdade, ele nada fez a não ser viver; ele viveu totalmente. Muitas vezes seus discípulos pediram que ele escrevesse alguma coisa, mas ele sempre dizia: “O Tao que pode ser dito não é o Tao verdadeiro, a verdade que pode ser dita se torna imediatamente uma mentira”. Lao Tzu diz: O Tao que pode ser dito não é o Tao absoluto. Assim, ele não dizia nada, não escrevia nada. Então o que os discípulos ficavam fazendo com ele? Eles apenas ficavam com ele, viviam com ele, caminhavam com ele, simplesmente se embebiam do seu ser. Quando estavam perto dele, tentavam ficar abertos a ele; quando estavam perto dele, tentavam não pensar em nada; quando estavam perto dele, ficavam cada vez mais calados. Nesse silêncio, ele os alcançava, ia até eles e batia às suas portas. Por noventa anos ele se recusou a escrever ou a dizer qualquer coisa. Esta era a sua atitude básica: a verdade não pode ser ensinada. No momento em que você diz algo sobre a verdade, ela deixa de ser verdadeira; o próprio dizer a falsifica. Você não pode ensiná-la; no máximo você pode indicá-la, e essa indicação deveria ser seu próprio ser, toda a sua vida; ela não pode ser indicada com palavras. Ele era contrário às palavras, à linguagem. Conta-se que ele costumava caminhar todos os dias pela manhã, e um vizinho costumava segui-lo. Sabendo perfeitamente bem que ele não queria falar, que ele era um homem de um silêncio absoluto, o vizinho sempre ficava quieto. Até um “alô” não era permitido, até falar sobre o tempo não era permitido. Dizer: “Que bela manhã!” seria um tagarelar demasiado. Lao Tzu dava uma boa caminhada, de quilômetros, e o vizinho o seguia. Isso continuou durante anos, mas uma vez aconteceu de o vizinho receber um hóspede que também quis acompanhá-los, então o vizinho o levou junto. Ele não conhecia Lao Tzu, nem as suas maneiras, então começou a se sentir sufocado, porque seu anfitrião não estava falando, e ele não podia entender por que eles estavam tão calados; e o silêncio ficou pesado para ele.
  • 20. Se você não sabe como ficar em silêncio, o silêncio fica pesado. Não é que por dizer coisas você se comunica, não; por dizer coisas você se descarrega. Na verdade, a comunicação não é possível por meio de palavras, e apenas o oposto é possível; você pode evitar a comunicação. Você pode falar, pode criar uma cortina de palavras à sua volta, de tal modo que a sua situação real não possa ser conhecida pelos outros; você se fecha por meio de palavras. Aquele homem começou a se sentir despido, sufocado e desconfortável; ele estava constrangido. Então, quando o sol estava nascendo, ele simplesmente disse: “Que belo alvorecer, olhem...! Que sol maravilhoso está nascendo! Que bela manhã!” Ele só disse isso, mas ninguém respondeu, porque o vizinho, seu anfitrião, sabia que Lao Tzu não gostaria de ouvir nada. E, é claro, Lao Tzu não disse nada, não respondeu. Quando eles voltaram, Lao Tzu disse ao vizinho: “A partir de amanhã, não traga mais esse homem. Ele é um tagarela”. E ele só havia dito isto: “Que belo alvorecer... que bela manhã”. Apenas isso numa caminhada de duas ou três horas, mas Lao Tzu disse: “Não traga mais esse tagarela. Ele fala demais e sem necessidade, pois também tenho olhos e posso ver que o sol está nascendo e que ele é lindo. Qual é a necessidade de se dizer isso?” Lao Tzu viveu em silêncio, sempre evitou falar sobre a verdade que ele atingiu e sempre rejeitou a idéia de que deveria escrever para as gerações futuras. E, na idade de noventa anos, despediu-se de seus discípulos e disse: “Agora vou para as montanhas, para o Himalaia; vou lá para me preparar para morrer. É bom viver com pessoas, é bom estar no mundo enquanto se está vivo, mas, quando a morte se aproxima, é bom penetrar na solidão total, de tal modo que a pessoa siga na direção da fonte original na sua pureza e solidão absolutas, não contaminadas pelo mundo”. Seus discípulos ficaram muito tristes, mas o que poderiam fazer? Eles o seguiram por alguns quilômetros, mas aos poucos Lao Tzu os convenceu a voltar. Então, sozinho, ao atravessar a fronteira do país, o guarda que vigiava a fronteira o prendeu. O guarda também era seu discípulo e disse: “A menos que o senhor escreva um livro, não permitirei que atravesse a fronteira. O senhor precisa escrever um livro para a humanidade, essa é a dívida que o senhor precisa pagar; do contrário, não permitirei que cruze a fronteira”. Assim, durante três dias, Lao Tzu foi mantido preso pelo seu próprio discípulo. Isso é belo, é muito amoroso. Ele foi forçado, e foi assim que nasceu esse pequeno livro, o livro de Lao Tzu, o Tao Te Ching. Ele teve de escrevê-lo porque, se não o fizesse, o discípulo não permitiria que ele cruzasse a fronteira do país,
  • 21. e ele era o guarda, tinha autoridade e podia criar problemas; então Lao Tzu precisou escrever o livro. E em três dias ele terminou de escrevê-lo. Esta é a primeira sentença do livro: O Tao que pode ser dito não é o Tao absoluto. Este é o primeiro ponto que ele precisa salientar: tudo o que pode ser dito não pode ser verdadeiro. Essa é a introdução do livro e simplesmente o alerta: algumas palavras seguirão, mas não seja vítima delas. Lembre-se da ausência de palavras, do que não pode ser comunicado pela linguagem, do que não pode ser comunicado por meio de palavras. O Tao pode ser comunicado, mas somente de ser para ser; ele pode ser comunicado quando você está com o mestre e está sem fazer nada, nem mesmo praticando alguma coisa. O Tao só pode ser comunicado quando você está na presença do mestre. Por que a verdade não pode ser dita? Qual é a dificuldade? A verdade não pode ser dita muitas razões, e a primeira e a mais básica é que a verdade sempre é percebida em silêncio. Quando a sua conversa interior cessa, então ela é percebida; e como você pode dizer por meio de som aquilo que é percebido no silêncio? Trata-se de uma experiência, e não de um pensamento. Se ele fosse um pensamento, poderia ser expresso, não haveria problema. Não importa quão complicado ou complexo possa ser um pensamento; uma maneira de expressá- lo pode ser encontrada. A teoria mais complexa de Albert Einstein, a teoria da relatividade, também pode ser expressa por um símbolo; não há problema nisso. A pessoa que ouve poderá não ser capaz de entendê-la, mas essa não é a questão, pois ela pode ser expressa. Quando Einstein estava vivo, conta-se apenas uma dúzia de pessoas no mundo o entendia. Mas até isso é suficiente; se uma única pessoa puder entender, a mensagem foi expressa. E até se nenhuma pessoa puder entender agora, talvez depois de muitos séculos haja uma pessoa que possa entender, e então também a mensagem foi expressa. Ela é expressa na própria probabilidade de que alguém possa entendê-la. Mas a verdade não pode ser expressa porque o próprio alcançar a verdade se dá por meio do silêncio, da ausência de som, da ausência de pensamento. Você a alcança por meio da não-mente; a mente pára. Como você pode usar algo que, como condição necessária, precisa ser abandonado antes que a verdade possa ser alcançada? A mente não pode entender a verdade, não pode perceber a verdade; então, como ela pode expressá-la? Lembre-se disto como uma regra: se a mente puder atingir algo, ela pode expressá-lo; se a mente não puder atingi- lo, ela não pode expressá-lo. Todas as linguagens são inúteis, pois a verdade não pode ser expressa.
  • 22. Então o que todas as escrituras têm feito, o que Lao Tzu está fazendo, o que os Upanishades estão fazendo? Eles tentam dizer algo que não pode ser dito na esperança de que possa surgir em você um desejo de conhecer a respeito. A verdade não pode ser dita, mas, no próprio esforço de dizê-la pode surgir um desejo naquele que ouve de conhecer o que não pode ser expresso. A sede pode ser provocada; a sede já existe e precisa de uma pequena provocação. Você já está sedento, e como pode ser diferente? Você não se encontra no estado de plenitude, não está extasiado... você está sedento, o seu coração está ardendo, você está procurando algo que possa saciar a sua sede, mas, ao não encontrar a água, ao não encontrar a fonte, aos poucos você tenta suprimir a sua sede. Essa é a única maneira, senão ela seria insuportável e não permitiria que você vivesse. Dessa maneira, você suprime a sede. Um mestre como Lao Tzu sabe muito bem que a verdade não pode ser dita, mas o próprio esforço de dizê-la provocará alguma coisa, trará à superfície a sua sede suprimida. E uma vez que a sede aflore, começa uma busca, uma investigação, e ele fez com que você se movesse... O Tao que pode ser dito não é o Tao absoluto. No máximo ele pode ser relativo. Por exemplo, podemos dizer alguma coisa sobre a luz a um cego, sabendo perfeitamente bem que é impossível comunicar algo sobre a luz, pois ele não tem a experiência da luz. Mas algo pode ser dito sobre a luz, teorias sobre a luz podem ser criadas. Mesmo um cego pode se tornar um especialista nas teorias da luz, sobre toda a ciência da luz, não há problema nisso, mas ele não entenderá o que é a luz. Ele saberá em que consiste a luz, entenderá a sua física, a poesia da luz, mas não a sua realidade, o que é a luz; a experiência da luz não será entendida. Assim, tudo o que é dito a um cego sobre a luz é apenas relativo; é algo sobre a luz e não a própria luz. A luz não pode ser comunicada. Algo pode ser dito sobre Deus, mas Deus não pode ser explicado; algo pode ser dito sobre o amor, mas o amor não pode ser explicado. Esse “algo” permanece relativo para quem ouve, para a sua compreensão, para o seu domínio intelectual, para o seu treinamento, para o seu desejo de entender. Depende do mestre e é relativo ao mestre a maneira de ele se expressar, as estratégias que ele usa para se comunicar. Isso permanece relativo, relativo a muitas coisas, mas essa nunca pode se tornar a experiência absoluta. Essa é a primeira razão de a verdade não poder ser expressa. A segunda razão é que ela é uma experiência. Nenhuma experiência pode ser comunicada... a verdade é deixada de lado. Se você nunca conheceu o amor, quando alguém diz algo sobre ele, você ouvirá a palavra mas deixará escapar o seu significado. A palavra está no dicionário; mesmo se você não entender,
  • 23. poderá procurar no dicionário e saberá o que ela significa, mas o significado está em você, pois o significado vem por meio da experiência. Se você amou alguém, então conhece o significado da palavra “amor”. O significado literal está no dicionário, na linguagem, na gramática, mas o significado experimental e existencial está em você. Se você conheceu a experiência, imediatamente a palavra “amor” deixa de ser vazia e passa a conter algo. Se você disser alguma coisa, isso é vazio, a menos que você traga a sua experiência junto com o que você diz. Quando a sua experiência entra em cena, o que você diz se torna significativo; do contrário, o que você diz permanece vazio, palavras e mais palavras. Como a verdade pode ser expressa se você não a experimentou? Até na vida comum algo não experimentado não pode ser dito; apenas palavras serão transmitidas. O recipiente chegará a você, mas o conteúdo será perdido; uma palavra vazia irá na sua direção, você a ouvirá e achará que a entende porque conhece o seu significado literal, mas não a compreenderá na realidade. O significado real e autêntico vem por meio da experiência existencial. Você terá de conhecê-la, não existe outra maneira, não existem atalhos. A verdade não pode ser transferida, você não pode roubá-la, não pode emprestá-la, não pode comprá-la, não pode furtá-la, não pode mendigá-la; não há como fazer isso. A menos que você a tenha, não pode tê-la. O Tao que pode ser dito não é o Tao absoluto. Lembre-se dessa condição.
  • 24. Os três tipos de pessoas Lao Tzu diz: Quando o tipo mais elevado de pessoa ouve o Tao, tenta arduamente viver de acordo com ele. Quando o tipo medíocre ouve o Tao, parece estar consciente e, ainda assim, está inconsciente dele. Quando o tipo mais inferior ouve o Tao, irrompe numa sonora gargalhada; se ele não fosse digno de riso, não seria o Tao. O maior mito é o da “humanidade”. Ela não existe, pois existem tantas humanidades quantas são as pessoas, não existe um tipo só. Cada pessoa é tão diferente das outras que não existe uma “humanidade”. Ela é apenas uma palavra, uma abstração. Você parece ser semelhante aos outros, mas não é, e esse mito precisa ser desfeito; só então você poderá penetrar mais fundo na realidade dos seres humanos. Nenhuma psicologia antiga jamais acreditou que a “humanidade” existisse. Na verdade, se formos classificar, todas as psicologias antigas classificaram o ser humano em três divisões. Na Índia, a humanidade foi dividida em três partes: Satwa, Rajas e Tamas. Lao Tzu não deu esses nomes, mas também divide a humanidade em três tipos, exatamente os mesmos. Essas três divisões são arbitrárias, mas precisamos classificar para entender; na verdade, existem tantas humanidades quanto existem homens e mulheres; cada homem e cada mulher é um mundo em si mesmo, mas essa classificação ajuda a entender muitas coisas que seriam impossíveis de serem entendidas sem ela. Tente compreender a classificação tão claramente quanto possível. Quando o tipo mais elevado de pessoa ouve o Tao, tenta arduamente viver de acordo com ele. Quando o tipo medíocre ouve o Tao, parece estar consciente e, ainda assim, está inconsciente dele. Quando o tipo mais inferior ouve o Tao, irrompe numa sonora gargalhada; se ele não fosse digno de riso, não seria o Tao. O primeiro é Satwa, o segundo é Rajas e o terceiro é Tamas.
  • 25. Quando o tipo mais elevado de pessoa ouve falar do Tao, de repente se sente sintonizado com ele. Para ele, não se trata de um entendimento intelectual; todo o seu ser vibra com uma nova canção, uma nova música é ouvida. Quando ele escuta a verdade, de repente algo se encaixa, e ele deixa de ser o mesmo; apenas ao ouvir, ele se torna um tipo de pessoa totalmente diferente. Não que ele precise usar o intelecto para entendê-lo; esse seria um entendimento retardado. O tipo mais elevado de pessoa entende imediatamente, sem nenhum intervalo de tempo. Se ele ouve uma verdade, no próprio ouvir ele entende, e não que tenha trazido seu intelecto para entendê-la, não, pois isso seria adiamento; todo o seu ser a entende, e não apenas a parte intelectual, não apenas a sua alma, não apenas a sua mente, mas até o seu corpo vibra de uma nova maneira desconhecida. Uma nova dança entrou no seu ser, e agora ele nunca poderá ser o mesmo. Uma vez que tenha escutado a verdade, ele nunca poderá ser novamente o velho; uma nova jornada começou. Agora nada pode ser feito, ele precisa seguir adiante. Ele ouviu falar sobre a luz e tem vivido na escuridão; agora, a não ser que atinja a luz, não haverá descanso para ele. Ele ficará profundamente descontente, pois ouviu que um tipo diferente de existência é possível. Agora, a menos que a alcance, que a atinja, ele não poderá ficar à vontade, não poderá se sentir em casa em lugar nenhum. Onde ele estiver, a constante chamada do desconhecido estará batendo à porta, esteja ele acordado, dormindo ou sonhando... e a batida estará presente, ele a ouvirá. Ele a ouvirá ao comer, ao caminhar, na loja, no mercado... Ela o perseguirá o tempo todo. É por isso que J. Krishnamurti sempre dizia que não havia necessidade de fazer coisa alguma. Na verdade, para o primeiro tipo de pessoa, não há necessidade de fazer coisa alguma; a pessoa atinge apenas ao ouvir, ao ouvir corretamente. Mas onde encontrar o primeiro tipo de pessoa? Ele é muito raro, e a menos que Krishnamurti venha a ouvir Krishnamurti, nada acontecerá. Mas por que um Krishnamurti iria ouvir um Krishnamurti? Isso é absurdo, não tem sentido. Uma pessoa que tem esse tipo de perceptividade pode ficar desperta apenas ao ouvir o canto de um pássaro, apenas ao ouvir a brisa passando por entre as árvores, apenas ao ouvir o som da água fluindo; isso é suficiente, porque a verdade fala a partir de todos os lugares. Se você for perceptivo, ouvirá a verdade, o Tao, a partir de tudo o que você ouve. Nada mais existe, todos os sons são divinos, todas as mensagens são divinas, em todos os lugares há a assinatura divina. Para a primeira categoria de mente, o Caminho não é absolutamente um caminho; a pessoa simplesmente entra no templo sem nenhum caminho, não há necessidade de nenhuma ponte. Lao Tzu diz que, quando o tipo mais elevado de pessoa ouve o Tao, há uma percepção imediata, um entendimento imediato. Ela entende apenas ao olhar para o mestre que atingiu, apenas ao ouvir a sua palavra, apenas ao ouvir a sua respiração, o seu silêncio, a sua serenidade, ao sentar-se a seu lado.
  • 26. Uma vez que as pessoas desse tipo entendam, então não tentam atingir a verdade, mas simplesmente tentam aperfeiçoar seu mecanismo. Elas entenderam a verdade; ela existe, elas a ouviram. Os hindus chamam suas escrituras de Shrutis, e a palavra Shruti significa “aquilo que foi ouvido”. Todas as escrituras são “aquilo que foi ouvido”. Uma vez que uma pessoa da primeira categoria de inteligência ouça a verdade, ela a entende. Certa vez, aconteceu de um mestre sufi subitamente chamar um de seus discípulos. Muitos discípulos estavam sentados no anfiteatro, mas ele chamou apenas um: “Aproxime-se”. O mestre estava perto da janela, e era uma noite de lua cheia. Todos os discípulos olharam admirados. Por que o mestre chamou apenas esse discípulo? Então o velho indicou ao jovem algo fora da janela e disse: “Olhe!” E a partir desse dia o jovem se transformou completamente. Os outros perguntaram: “O que aconteceu? Não havia nada, sabemos disso, apenas a noite de lua cheia. Havia a lua cheia, é claro; a noite estava linda, é claro; mas o que aconteceu com você parece ser completamente desproporcional, pois você está completamente transformado. O que aconteceu?” O jovem respondeu: “Eu ouvi o mestre e, por ele ter me chamado, fiquei tão silencioso, tão sem pensamentos e tão sereno que, quando ele indicou a lua, algo se abriu dentro de mim, uma janela; tive uma percepção que jamais tive. Olhei para a lua com novos olhos, olhei para o luar com um novo ser. É claro, percebi a cena a partir de um estado mental vago e terei de trabalhar arduamente para alcançá-lo definitivamente, mas agora ele existe, agora ele é uma certeza, agora não há dúvida. Mas ainda terei de alcançar esse estado... porque vi por meio dos olhos do mestre. Aqueles olhos não eram meus; por um momento, ele me deu seus olhos; eu os tomei emprestado, olhei por meio do seu ser. Não era o meu ser, a janela não era a minha, mas a dele, e ele permitiu que eu olhasse por ela. Mas agora eu sei que um tipo diferente de existência é possível, e não apenas é possível, mas é absolutamente certa. Agora pode levar muitas vidas para eu alcançar esse objetivo, mas o objetivo é certo. Agora não há nenhuma dúvida em mim, nenhuma dúvida pode me perturbar; agora a minha jornada está clara”. Quando o tipo mais elevado de pessoa ouve o Tao, tenta arduamente viver de acordo com ele. Ele ouve, entende e tenta arduamente viver de acordo com o Tao. A pessoa olhou através da janela do mestre e ficou certa de que então se tratava de um fato absoluto; não é uma filosofia, não é uma metafísica, e sim algo existencial.
  • 27. Ela o sentiu e o conheceu, mas terá de percorrer uma longa jornada antes que a mesma percepção se torne própria. A pessoa ouviu a verdade e a entendeu, mas terá de percorrer uma longa jornada antes que a verdade se torne o seu ser. O tipo mais elevado tenta arduamente viver de acordo com o Tao, isso não quer dizer que a pessoa o atinja ao tentar arduamente viver de acordo com ele, não. Ninguém o atinge apenas por tentar arduamente; mas, por tentar arduamente, a pessoa aos poucos passa a que, nos estágios finais de transformação, o próprio esforço é uma barreira. Ao tentar arduamente, a pessoa passa a saber que, mesmo tentar arduamente, é uma barreira, e então ela deixa de lado o esforço. Porque, quando você tenta arduamente viver de acordo com o Tao, essa vida não pode ser uma vida espontânea, apenas um fenômeno forçado, uma disciplina, e não uma liberdade; isso se tornará uma escravidão. Ao tentar arduamente, ninguém pode atingir aquilo que já está presente; mas, ao tentar arduamente, a pessoa vem a entender que mesmo o esforço é uma barreira, uma barreira muito sutil, porque todos os esforços são do ego. Até o desejo de chegar à verdade vem do ego, e a pessoa também abandona isso. Mas lembre-se, a pessoa só pode abandonar o esforço quando se esforçou ao máximo. Você não pode dizer: “Se é assim, então seria melhor abandonar o esforço desde o começo. Por que fazer esforço?” Assim você perderá o ponto, e é isso o que aconteceu com os que ouviram Krishnamurti. Tudo o que ele diz é perfeitamente verdadeiro, e ele diz que nenhum esforço é necessário. Isso está certo, mas está certo apenas para aqueles que fizeram um grande esforço com todo o seu ser. Isso só é verdadeiro para essas pessoas; elas podem abandonar o esforço. Para quem não passou por nenhuma disciplina, é impossível tornar-se naturalmente habilidoso. No final, o artista precisa se esquecer completamente da sua arte, tem de se esquecer de tudo o que aprendeu. Mas você pode se esquecer apenas daquilo que aprendeu. Se a arte de um artista vem do esforço, então não é uma arte perfeita. No Zen, são usados muitos métodos para ensinar meditação às pessoas, inclusive a arte: pintura, caligrafia e outras coisas. O estudante pode aprender pintura durante dez ou doze anos, até que se torne tecnicamente perfeito sem ter um único erro na sua metodologia. E quando ele se torna tecnicamente perfeito, o mestre diz: “Agora abandone a arte. Durante dois ou três anos esqueça-se completamente dela, jogue fora seus pincéis, esqueça-se de tudo o que sabe de pintura e, quando você se esquecer completamente, volte a mim”. Para se esquecer, são necessários dois, três, quatro, cinco anos, às vezes até mais; o esquecimento é muito difícil. Primeiro é difícil aprender uma coisa, e é mais difícil desaprendê-la uma vez que a aprendeu. A segunda parte é muito
  • 28. essencial, é fundamental; se não for assim, você será um técnico e não um artista. Conta-se que um grande arqueiro treinou seu discípulo até a perfeição nessa arte e então lhe disse: “Agora se esqueça de tudo o que sabe sobre isso.” Durante vinte anos o discípulo ia ao mestre mas esse nada dizia; então o discípulo precisou esperar pacientemente. Aos poucos ele se esqueceu de tudo o que sabia sobre arcos e flechas... Vinte anos é muito tempo, e ele já estava ficando velho. Então, um dia, ele veio e, ao entrar na sala do mestre, viu um arco, mas não reconheceu o que era aquilo. O mestre foi até ele, abraçou-o e disse: “Agora você se tornou um arqueiro perfeito; você se esqueceu até mesmo do arco. Agora vá lá fora e olhe os pássaros voando e, apenas com a idéia de que eles deveriam cair, eles cairão”. O arqueiro foi para fora e não pôde acreditar; ele olhou uns doze pássaros voando, e eles caíram imediatamente no chão. O mestre disse: “Agora não há mais nada a ser feito. Eu estava apenas lhe mostrando que, quando a pessoa se esquece da técnica, só então ela se torna perfeita. Agora o arco e a flecha não são mais necessários; eles são necessários apenas para os amadores”. O pintor perfeito não precisa de pincéis e de telas; o músico perfeito não precisa de cítara, violino ou violão. Não, isso é para os amadores. Encontrei um músico muito velho, de cento e dez anos, e agora ele já morreu. Ravi Shankar é seu discípulo... Ele podia criar música a partir de qualquer coisa, fosse o que fosse. Ele poderia passar entre duas rochas e poderia criar música com elas; ele poderia encontrar um pedaço de ferro e começar a tocar com ele, e belas músicas jamais ouvidas seriam produzidas. Esse era um músico; até seu toque era musical. Se ele o tocasse, você perceberia que ele tocou o instrumento mais íntimo da sua harmonia e música interiores, e de repente você começaria a vibrar. Quando alguma coisa se torna perfeita, o esforço que você fez para aprendê-la precisa ser abandonado; do contrário, o próprio esforço continua pesando sobre a sua cabeça. Assim, não é que tentar arduamente viver de acordo com o Tao leve o tipo mais elevado a alcançá-lo, não. Ele tenta arduamente viver de acordo com ele e, aos poucos, começa a entender que nenhum esforço é necessário para viver de acordo com a natureza. É como flutuar na água; ninguém pode simplesmente flutuar, pois antes a pessoa precisa aprender a nadar. Não vá ao rio, senão você afundará. A pessoa precisa aprender a nadar e, quando o nadar se torna perfeito, ela não precisa nadar e pode simplesmente estar no rio, flutuando; ela pode se deitar no rio como se estivesse deitada numa cama. Agora ela aprendeu a estar em harmonia com o rio, agora ele não pode afundá-la, agora ela não tem mais inimizade com ele. Na verdade, ela deixa de existir de
  • 29. uma maneira separada do rio. O nadador perfeito se torna parte do rio, é uma onda no rio. Como o rio pode destruir a onda? Agora ele flutua em harmonia com o rio; ele não está ali brigando, resistindo, fazendo alguma coisa, mas está em sintonia com o rio e pode simplesmente flutuar. Mas não tente isso, a menos que saiba nadar, senão você afundará. O mesmo acontece com o Tao. Você faz um grande esforço para viver de acordo com a verdade; então, aos poucos, entende que seu grande esforço ajuda um pouco, mas dificulta bastante. Viver em harmonia é ficar em um estado de deixar acontecer, e não de lutar contra a natureza. Viver em harmonia com a natureza é estar integrado a ela; não há necessidade de lutar. O esforço é uma luta e significa que você está tentando fazer alguma coisa de acordo consigo mesmo. A ciência é esforço, o Tao é ausência de esforço. A ciência é violência para com a natureza, e é por isso que os cientistas falam continuamente em termos de conflito, de conquista. É uma briga, como se a natureza fosse sua inimiga e você precisasse dominá-la. A ciência é uma política contra a natureza, uma profunda guerra, uma inimizade. O Tao não é uma luta; na verdade, ele faz entender que você é parte da natureza. Como a parte pode lutar contra o todo? E, se a parte tentar lutar contra o todo e for dominada pela ansiedade, o que você pode esperar? Se a parte tentar lutar contra o todo, se a minha mão tentar lutar contra todo o meu corpo, é natural que a mão fique doente. Como a mão pode lutar contra o corpo? O corpo supre a mão com sangue, com nutrientes, e como ela pode lutar contra o corpo? A mão lutando contra o corpo? Isso é tolice. É tolice o ser humano lutar contra a natureza; você só pode viver em harmonia com a natureza. O Tao é entrega, a ciência é guerra. A ciência fortalece o ego, e todo o problema é como abandonar o ego; por meio do esforço ele não pode ser abandonado. Assim, lembre-se disto: Quando o tipo mais elevado de pessoa ouve o Tao, tenta arduamente viver de acordo com ele. Esse é o primeiro ponto de vista. Uma vez que essas pessoas entendam, ouçam, sintam, saboreiem, tenham afinidade com ele, elas começam o árduo esforço para viver de acordo. Mas, aos poucos, à medida que crescem nisso, começam a entender que o esforço não é necessário, e sim o estado de ausência de esforço. No final, elas abandonam o esforço e se tornam uma coisa só com a natureza. Alguém perguntou a Lao Tzu: “Como você chegou lá?” Ele respondeu: “Eu estava sentado sob uma árvore e tinha feito tudo o que poderia ser feito, tudo o que era humanamente possível, e estava completamente frustrado. Muita coisa aconteceu por meio disso, mas não tudo;
  • 30. algo estava faltando, algo estava ausente, e o elo que faltava era o mais difícil de encontrar. Então, enquanto eu estava sentado sob a árvore, uma folha seca caiu lentamente da árvore e foi levada pelo vento. O vento estava indo para o norte e a folha foi levada para o norte; então o vento mudou de curso e começou a soprar para o sul, e a folha começou a ser levada para o sul; então o vento parou, e a folha caiu no chão sem nenhuma queixa, sem nenhuma luta de sua parte, sem nenhuma direção própria. Se o vento fosse para o sul, ela ia para o sul; se o vento fosse para o norte, ela ia para o norte; se o vento parasse, ela se deixava cair na terra e descansava serenamente. “Então, novamente, o vento soprou e de novo a folha se deixou levar para o céu; não havia nenhum problema. De repente eu entendi, a mensagem foi transmitida. A partir desse dia, tornei-me uma folha seca, e o elo que faltava, que era tão esquivo, deixou de ser esquivo. O elo que faltava era apenas este: você pode atingir muitas coisas por meio do esforço, mas não pode atingir o Tao por meio do esforço. No final, você precisa abandonar o esforço, e de repente tudo se ajusta e você fica em harmonia. Então você não direciona, deixa de ser um diretor e não diz aos ventos: vá para o sul, pois estou numa jornada em direção ao sul. Então você não tem nenhum destino, e o destino do todo é o seu destino; então você não está separado e não pensa em termos de individualidade; você se tornou parte do todo e, aonde o todo estiver indo, você estará indo. Se o todo mudar de idéia, você mudará de idéia; se o todo interromper a jornada, isso é belo; se o todo correr, você correrá com ele. Viver ‘de acordo’ significa isso.” Sem nenhuma idéia própria, quando você se torna uma não-mente, o todo vive por meio de você, vive você, move-se por meio de você, move você. Agora você não respira, o todo respira você, e tudo é uma bênção, é uma graça. Como então você pode ficar tenso? Você pode ficar preocupado com o quê? Todas as preocupações existem porque você imaginou um destino individual na sua mente que se contrapõe ao destino do todo; você está seguindo contra a corrente. Este é todo o segredo do seu fracasso: você está seguindo contra a corrente. Então você fica preocupado, tenso, angustiado, ansioso, praticamente enlouquecido; qualquer um enlouquecerá se for contra a corrente, pois a luta é multo árdua e sem sentido. E um dia você se sentirá cansado, e isso parecerá uma frustração, um fracasso. O sábio abandona essa tolice de seguir contra a corrente e simplesmente deixa que o rio o leve para onde ele estiver indo. Se ele estiver indo a algum lugar, bom; se não estiver indo a lugar nenhum, bom. De repente, você fica sereno e silencioso. Então, e nunca antes, a meditação verdadeira acontece e todo o esforço é abandonado. Mas primeiro você precisa fazer o esforço; do contrário, nunca entenderá que ele precisa ser abandonado. Quando o tipo medíocre ouve o Tao, parece estar consciente e, ainda assim, está inconsciente dele.
  • 31. A mente medíocre é isto: um pouco consciente. Um pouco de entendimento e um pouco de não entendimento; uma pequena parte com luz e uma pequena parte no escuro, dividida. Estar dividido é ser medíocre; estar dividido contra si mesmo é ser medíocre, pois isso dissipa a sua energia e nunca pode permitir que você tenha uma existência transbordante e cheia de celebração. Se você estiver tentando criar uma luta entre a sua mão direita e a sua mão esquerda, como poderá ser feliz? A própria luta o matará e nada resultará disso, pois como a esquerda ganhará ou como a direita ganhará? Ambas as mãos são suas. Qualquer tipo de conflito interior o torna medíocre, e aqueles que ensinam você a ser dividido são seus inimigos. Eles dizem: “Isto é ruim e aquilo é bom”, e imediatamente entra a divisão. Eles dizem: “Isto é inferior e aquilo é superior”. Imediatamente entra a divisão. Eles dizem: “Isto é pecado e aquilo é virtude” e imediatamente entra a divisão; você fica fendido. Toda a humanidade é esquizofrênica e todos se tornaram medíocres. Ser um só é ser bem-aventurado, estar dividido é ser infeliz; ser um só é estar no paraíso, estar dividido é estar no inferno. Quanto mais dividido, maior será o inferno; e você é uma multidão, e não somente dois, mas muitos. Os psicólogos dizem que o ser humano se tornou polipsíquico: agora ele não tem uma mente apenas, mas muitas mentes. Você também tem muitas mentes em pequenos assuntos... comer isso ou aquilo. Num restaurante, ao olhar o cardápio, você é polipsíquico: pedir isto ou aquilo? É como se você tivesse perdido toda a possibilidade de ser decidido, porque você só pode ser decidido se for um só, uma unidade. Como você pode ser decidido? Quando uma voz diz isto, uma outra imediatamente contradiz e diz aquilo; uma voz diz para ir em direção ao oeste, uma outra diz para ir em direção ao leste. Se você for puxado contra si mesmo em muitas direções, toda a sua vida será apenas um triste fracasso, uma longa história de frustração e nada mais; “uma história contada por um idiota, cheia de violência e de barulho, sem nada significar”. O significado só é possível quando há um uníssono dentro de você. O tipo mais elevado de pessoa pode atingir a unidade, o tipo mais inferior também pode atingir um certo tipo de unidade, mas o tipo medíocre, o “do meio”, está no maior perigo. Você pode perceber pessoas sábias como Buda ou Lao Tzu em unidade; um estado de plenitude as envolve, elas se movem circundadas por um êxtase sutil. Se você olhar para elas, poderá perceber que elas estão inebriadas com o divino, que elas caminham sobre a terra mas não são daqui. Às vezes você também pode sentir o mesmo tipo de vibração em torno de um idiota; uma certa inocência o envolve... Ele ri, e você pode ter um vislumbre do sábio no idiota, pois ele também é um só. Ele não é um sábio, não atingiu nada, mas pelo menos não está dividido.
  • 32. O sábio foi além da mente, o idiota está abaixo da mente. Eles são iguais numa coisa: nenhum dos dois está na mente. Existem grandes diferenças, mas há também essa semelhança. Assim, se você não entender, um sábio pode às vezes parecer um idiota, e, às vezes, na sua ignorância, você pode venerar um idiota como um sábio. Encontrei muitos idiotas sendo venerados; eles têm uma certa qualidade, pelo menos são um só. Eles não têm muita mente; na verdade, absolutamente não têm mente, não têm pensamentos. Vivi numa cidade durante muitos anos e, próximo a essa cidade, havia um santo muito famoso, e pessoas costumavam chegar de toda a Índia para vê-lo. Ele era um perfeito idiota, mas tinha uma certa beleza à sua volta — nenhuma ansiedade, nenhum problema. Alguns problemas teriam existido para ele; mas porque as pessoas começaram a venerá-lo, mesmo esses problemas deixaram de existir. As pessoas levavam comida e outras coisas para ele, e assim até os problemas de sobrevivência não existiam — chegaram até a fazer uma bela casa para ele. E, se você o observasse, poderia perceber que ele não entendia nada. Fui ver esse homem muitas vezes e o observei de perto. Ele tinha problemas mentais e não podia pronunciar uma única palavra, mas as pessoas achavam que ele tinha feito um voto de silêncio por toda a vida. Não havia nenhum brilho de lucidez em seus olhos, mas mesmo assim havia semelhanças. As pessoas foram enganadas muitas vezes; é claro, esses pobres idiotas não podem enganá-lo, mas é a sua própria credulidade: você é enganado por si mesmo. E muitas vezes aconteceu de almas muito raras serem consideradas idiotas, porque outra vez as pessoas percebiam que estava acontecendo algo parecido com o que se dá com os idiotas. O idiota é uma parte, o ser sobre-humano é uma parte; e existe ainda a parte intermediária, a medíocre, que é a maior parte do mundo. “A parte medíocre”, diz Lao Tzu, “parece estar consciente e, ainda assim, está inconsciente dele”. Se você fala sobre a verdade, a mente medíocre a entende intelectualmente, mas não totalmente. Ela diz: “Sim, posso entender o que você está dizendo, mas ainda assim não compreendo alguma coisa. O que você quer dizer?” A palavra é ouvida, mas o significado lhe escapa; ela percebe que pode entender intelectualmente; ela é uma pessoa instruída, pode ser formada em alguma faculdade, até com doutorado. Ela entende o que você está dizendo porque entende a linguagem, mas sente que deixou escapar algo. Ela entende a palavra, mas a palavra não é a mensagem. A mensagem é algo sutil; ela pode vir com a palavra, mas não é a palavra. A palavra é como uma flor; o significado é como uma fragrância que a circunda. Se o seu olfato não estiver funcionando muito bem, eu posso lhe dar uma flor, mas não posso lhe dar a fragrância. Se a sua mente não estiver funcionando
  • 33. totalmente, eu posso lhe dar a palavra, mas não o significado, porque o significado precisa ser detectado por você, decodificado por você. Eu posso lhe dar a flor porque isso não é problema; mas, como posso lhe dar a fragrância? Se o seu olfato não estiver funcionando, se ele estiver insensível, então nada poderá ser feito; posso lhe dar mil e uma flores, mas você não sentirá a fragrância. Muitas pessoas me procuram e dizem: “Entendemos tudo o que você diz, mas nada acontece. Entendemos tudo o que você disse, lemos muitos dos seus livros, muitas vezes, sublinhamos quase todas as linhas, mas nada está acontecendo”. Eu posso lhe dar a flor, mas como posso lhe dar a fragrância? Você precisa limpar o nariz, precisa ficar mais sensível, e é então que a meditação pode ser proveitosa, pois o deixa mais sensível e mais alerta. Ela o empurra em direção primeiro tipo, e, aos poucos, você começa a sentir, e não apenas a entender. A sensibilidade é necessária, e eu não quero dizer com isso que você deva se tornar sentimental, não. Sentimentalismo não é sensibilidade, mas uma moeda falsa. Há pessoas que podem chorar e se lamentar por qualquer coisa e acham que são do tipo que sente, mas não são. Elas são sentimentais, e sentimentalismo não é sensibilidade. A sensibilidade é uma qualidade muito madura; o sentimentalismo é uma qualidade imatura. Uma pessoa de sensibilidade fará alguma coisa; uma pessoa sentimental criará até mais problemas. Por exemplo, se alguém estiver enfermo ou estiver morrendo, a pessoa de sensibilidade irá ao hospital e tentará ajudar aquele que está morrendo; mas a pessoa sentimental começará a chorar e a se lamentar, criando mais problemas para a pessoa que está morrendo, sem mesmo permitir que ela morra em silêncio. O sentimentalismo é um caos, a sensibilidade é um crescimento substancial. Quando eu falo sobre o amor, se você tiver sensibilidade, então não apenas a sua cabeça entende, mas o seu coração começa a pulsar de um modo diferente, e então a fragrância chega até você. A meditação pode ajudá-lo porque jogará fora toda a poeira e a sujeira que você acumulou dentro de você, tudo o que está bloqueando a sua sensibilidade. As portas da sua percepção estão cobertas de sujeira. Você gostaria de ver corretamente, mas há tantas lágrimas reprimidas que elas não permitirão que você tenha uma visão límpida. Você gostaria de sentir o aroma de uma flor, mas não pode, porque toda a civilização reprimiu o olfato. Você pode não estar ciente de que o nariz é a parte mais reprimida do seu corpo. O ser humano perdeu o olfato quase por completo. Até cavalos e cães são mais sensíveis do que o ser humano. O que está acontecendo com o olfato do ser humano? Por que ele está praticamente morto? Há um mecanismo sutil funcionando por trás disso, pois o olfato está
  • 34. profundamente relacionado e conectado com o sexo. Você já viu animais se cheirando antes de cruzar? Eles nunca cruzam a menos que se cheirem, pois por meio do olfato sentem se a energia de seus corpos se fundirá ou não, se eles terão afinidade ou não. Esse cheirar é um tipo de antena. O cachorro cheira a cadela e, se ela se ajusta à sua sensibilidade e ao seu senso olfativo, só então ele se empenha; senão, eles se separam. Ele não fica nem um pouco preocupado, o contato acaba ali. Aquela fêmea não é para ele e ele não é para ela. O olfato é o sentido mais sexual do corpo e, quando a civilização decidiu reprimir o sexo, automaticamente também decidiu reprimir o olfato. Sempre que uma mulher quer fazer amor, subitamente começa a emitir aromas sutis à sua volta, e isso seria perigoso em um mundo civilizado em que o sexo não é aceito. Se você caminhasse na rua com a sua esposa e, se ela olhasse para um outro homem e começasse a emitir o aroma, você saberia imediatamente! Então a sua esposa não poderia enganá-lo, não poderia dizer que nem sequer olhou para o homem. Mas como as coisas são agora, a própria esposa não pode saber que o corpo dela está liberando um certo odor, nem o homem por quem ela ficou atraída pode saber. Seu olfato está completamente insensível; você não cheira, e dessa maneira as coisas continuam em ordem e não surge nenhum problema. Assim, se você realmente quiser cheirar uma flor, se quiser não apenas carregar a flor mas também desfrutar sua fragrância, então precisará chegar a um estado mais natural de sexualidade não reprimida; do contrário, não será possível. E, se todos os seus cinco sentidos estiverem cobertos de poeira e sujeira e estiverem reprimidos, eles farão uma mente medíocre, pois a mente nada mais é do que um reservatório coletivo de todos os cinco sentidos. Então você é medíocre; você pode ficar cada vez mais erudito, mas continuará sendo um tolo, pois não estará vivo. Você observou o fenômeno de que os eruditos são as pessoas mais sem vida que existem? Os professores e os eruditos são pessoas mortas! Elas não vêem, não cheiram, não saboreiam; estão praticamente mortas, todos os seus sentidos estão mortos e apenas a cabeça funciona, e funciona sozinha, sem nenhum apoio do corpo. Se você cortar fora o corpo delas, não ficarão preocupadas; apenas não lhes perturbe a cabeça! Pelo contrário, elas ficarão muito felizes se a cabeça puder funcionar sem o corpo, pois assim poderão continuar em suas viagens intelectuais sem que o corpo lhes crie nenhum problema; nenhuma doença as incomodará, nenhuma fome as incomodará. O erudito nem entra em contato com a própria fome, pois vive na cabeça. Os eruditos são sempre medíocres, perfeitos medíocres; o problema do medíocre é que ele entende, e isso o engana, pois ele acha que entende e o assunto fica encerrado. Mas ele não entende nada e continua inconsciente; seu entendimento é apenas da cabeça, e não de todo o seu ser. E, a menos que o
  • 35. entendimento seja de todo o ser, ele absolutamente não é entendimento. O entendimento intelectual não é, de modo algum, entendimento, mas uma denominação imprópria. Quando o tipo mais inferior ouve o Tao, irrompe numa sonora gargalhada. O tipo mais inferior acha que essa verdade, que esse Tao, é algum tipo de piada. Ele é tão superficial que nada que diga respeito ao profundo tem atrativo para ele, e a risada é uma proteção. Quando a pessoa superficial, o tipo inferior, ouve dizer sobre a verdade, ela ri porque você está parecendo engraçado. Ela está convencida de que não existe verdade nenhuma, de que nada como a verdade existe, de que se trata apenas de uma invenção de pessoas ladinas para explorar outras pessoas. Ela dá uma sonora risada, e essa risada é uma proteção, porque ela também está com medo, com medo de que a coisa possa existir. Por meio da risada, ela descarta, joga fora a idéia. Por meio da risada, ela mostra seu escárnio, sua condenação e diz que tudo aquilo é tolice; no máximo, pode-se rir da idéia, e nada mais do que isso. Pode-se encontrar o tipo inferior em todos os lugares, e, se ele encontrar Lao Tzu, rirá e dirá que esse homem enlouqueceu, que mais uma pessoa se perdeu. Se uma pessoa do tipo inferior vir você meditando, ela rirá e achará que você parece um tanto excêntrico. O que você está fazendo, por que está desperdiçando o seu tempo? Se ela puder rir, poderá se sentir muito bem consigo mesma por não ser tão maluca e tola como os praticantes de meditação. Lao Tzu diz: ...se ele não fosse digno de riso, não seria o Tao. Ele diz: Se o terceiro tipo não rir quando ouvir falar sobre a verdade, ela não será a verdade. Dessa maneira, esta é uma indicação definitiva: sempre que a verdade é declarada, o tipo inferior imediatamente rirá. Isso por certo mostra duas coisas: que a verdade foi declarada e que o tipo inferior a ouviu. Entre a verdade e o terceiro tipo de pessoa, o tipo inferior, acontece a risada; entre o medíocre e a verdade, acontece um tipo intelectual de compreensão; entre o primeiro tipo e a verdade, acontece uma profunda compreensão de seu ser como um todo. Esse ser total pulsa com a aventura desconhecida, uma porta se abre e ele entra em um novo mundo. A FOLHA CAI E FICA PARADA ALI Se a História fosse escrita corretamente, então deveria haver dois tipos de História: a dos realizadores, como Genghis Khan, Tamerlane, Nadirshah, Alexandre, Napoleão Bonaparte, Ivan o Terrível, Joseph Stalin, Adolf Hitler, Benito Mussolini... essas são as pessoas que pertencem ao mundo do fazer. E deveria haver uma outra História, uma História mais elevada, uma História real, a da consciência humana, da evolução humana:
  • 36. a de Lao Tzu, Chuang Tzu, Lieh Tzu, Gautama Buda, Mahavira, Bodhidharma, que é de um tipo totalmente diferente. Lao Tzu se iluminou sentado sob uma árvore. Uma folha tinha começado a cair; era outono e não havia pressa para cair; a folha estava caindo lentamente em ziguezague, com o vento, e ele a observou. A folha caiu no chão e ficou parada ali, e à medida que ele observava a folha cair e se acomodar no chão, algo se acomodou nele. A partir desse momento, ele deixou de ser um “realizador”. Os ventos sopram por conta própria e a existência toma conta. Ele era contemporâneo de um grande pensador, moralista e legislador, Confúcio, que pertence à outra História, a dos realizadores. Confúcio tinha grande influência sobre a China e tem até hoje. Chuang Tzu e Lieh Tzu eram discípulos de Lao Tzu. Essas três pessoas atingiram os cumes mais elevados, mas ninguém parece se impressionar com elas. As pessoas ficam impressionadas quando você faz algo grandioso, e quem fica impressionado por alguém que atingiu um estado de não-fazer? SER INÚTIL Lao Tzu estava caminhando com seus discípulos e eles chegaram a uma floresta onde centenas de pessoas estavam cortando árvores, pois um grande palácio estava sendo construído. Assim, praticamente toda a floresta tinha sido cortada, mas apenas uma árvore estava em pé, uma grande árvore com milhares de galhos, tão grande que dez mil pessoas podiam se sentar à sua sombra. Lao Tzu pediu aos discípulos para perguntar por que aquela árvore não havia sido cortada, enquanto toda a floresta viera abaixo. Os discípulos foram e perguntaram: “Por que vocês não cortaram aquela árvore?” Eles disseram: “Aquela árvore é absolutamente inútil. Não se pode fazer nada com ela porque todos os galhos têm muitos nós e não tem nenhum galho reto nela. Não se pode fazer colunas a partir dela, não se pode fazer móveis com ela, não se pode usá-la para queimar porque sua fumaça é muito perigosa para os olhos, que ficam praticamente cegos com ela. Aquela árvore é absolutamente inútil, e é por isso que não a cortamos”. Os discípulos voltaram a Lao Tzu, que riu e disse: “Sejam como essa árvore. Se vocês quiserem sobreviver neste mundo, sejam como essa árvore, absolutamente inúteis. Então ninguém os prejudicará. Se vocês forem retos, serão cortados e se tornarão móveis na casa de alguém. Se vocês forem belos, serão vendidos no mercado e se tornarão uma mercadoria. Sejam como essa árvore, absolutamente inúteis. Então ninguém poderá prejudicá-los e vocês crescerão grandes e vastos e milhares de pessoas poderão encontrar sombra debaixo de vocês”. LAO TZU E CONFÚCIO Conta-se que Confúcio foi ver Lao Tzu. Lao Tzu era velho e praticamente desconhecido, e Confúcio era mais jovem e conhecido praticamente no mundo todo. Reis e imperadores costumavam chamar Confúcio para se apresentar na corte, sábios costumavam procurá- lo para receber conselhos; naqueles dias, ele era a pessoa mais sábia da China. Aos
  • 37. poucos ele deve ter sentido que, embora sua sabedoria pudesse ser de utilidade para os outros, ele não era bem-aventurado e não atingira coisa alguma. Ele se tornou um especialista, talvez em ajudar os outros, mas não em ajudar a si mesmo. Assim, ele começou uma busca secreta para encontrar alguém que pudesse ajudá-lo. Sábios comuns não serviriam, pois eles costumavam procurá-lo para pedir conselhos; grandes eruditos não adiantariam, pois eles costumavam procurá-lo para falar de seus problemas. Mas devia haver alguém em algum lugar, pois a vida é muito ampla. Ele começou uma busca secreta e enviou seus discípulos para procurarem alguém que poderia ser de ajuda para ele, e eles voltaram com a informação de que havia um homem cujo nome ninguém sabia, mas que era conhecido como “O Velho Camarada”. Lao Tzu significa “O Velho Camarada”. Esse não é o nome dele, ninguém sabe o nome dele. Ele era uma pessoa tão desconhecida que ninguém sabia quando tinha nascido e quem era o pai e a mãe dele. Ele viveu noventa anos, mas apenas raros seres humanos o encontraram, muito raros, pessoas que tinham visões e perspectivas diferentes a ponto de entendê-lo. Ele existia apenas para os mais raros; uma pessoa tão comum, mas apenas para as mentes humanas mais raras. Ao ouvir a notícia de que existia um homem conhecido como “O Velho Camarada”, Confúcio foi vê-lo. Quando ele encontrou Lao Tzu, pôde sentir que havia ali um homem de grande compreensão, de grande integridade intelectual, de grande sagacidade lógica, um gênio; ele pôde perceber que havia alguma coisa ali, mas não conseguiu captar o quê. Vaga e misteriosamente havia algo ali; esse homem não era uma pessoa comum, embora parecesse absolutamente comum. Algo estava oculto; ele estava carregando um tesouro. Confúcio perguntou: “O que o senhor tem a dizer sobre a moralidade? O que o senhor tem a dizer sobre como cultivar um bom caráter?” Pois Confúcio era moralista e achava que a maior conquista era cultivar um bom caráter. Lao Tzu riu alto e disse: “Se você for imoral, só então surgirá a questão da moralidade. Se você não tiver nenhum caráter, só então pensará em caráter. Uma pessoa de caráter está absolutamente alheia ao fato de que existe algo como o caráter. Uma pessoa que tem moral não sabe o que a palavra ‘moral’ significa. Assim, não seja tolo! E não tente cultivar nada; simplesmente seja natural”. O homem tinha tamanha energia que Confúcio começou a tremer. Ele não conseguiu tolerá-lo e fugiu. Confúcio ficou com medo como se estivesse à beira de um abismo. Quando ele voltou a seus discípulos, que esperavam do lado de fora sob uma árvore, eles não puderam acreditar... Aquele homem tinha ido a imperadores, ao maior dos imperadores, e nunca viram nenhum nervosismo nele. E agora ele estava tremendo e um suor frio cobria todo o seu corpo. Eles não puderam acreditar. O que acontecera; o que esse homem, Lao Tzu, fizera com o mestre deles? Eles lhe perguntaram, e Confúcio respondeu: “Esperem um pouco. Deixem que eu me recomponha. Esse homem é perigoso” Confúcio disse aos discípulos: “Ouvi falar de grandes animais como elefantes, e eu sei como eles caminham; ouvi falar de animais ocultos no oceano, e eu sei como eles nadam; ouvi falar de grandes pássaros que voam milhares de quilômetros pela terra, e eu sei como eles voam. Mas esse homem é um dragão, e ninguém sabe como ele caminha, como ele vive, como ele voa. Nunca se aproximem dele; ele é como um abismo, como a morte”.
  • 38. E esta é a definição de um Mestre: um mestre é como a morte. Se você se aproximar dele, se chegar muito perto, ficará com medo, um tremor tomará conta de você, você será possuído por um medo desconhecido, como se você fosse morrer. Conta-se que Confúcio nunca mais foi ver aquele velho.
  • 39. PARTE TRÊS Chuang Tzu: natural e simples Chuang Tzu foi um dos homens mais naturais que o mundo já viu. Ele não criou nenhuma disciplina ou doutrina, nem fez nenhuma catequese; ele simplesmente explicou uma coisa: se puder ser natural e simples, como os pássaros e as árvores, você florescerá e terá suas asas abertas no vasto céu.
  • 40. O fácil é o certo Chuang Tzu diz: O fácil é o certo. Comece certo e você estará sendo natural; continue natural e você estará certo. O caminho certo para seguir facilmente é se esquecer do caminho certo e se esquecer de que o seguir é fácil. O fácil é o certo. Ninguém jamais ousou dizer isso; pelo contrário, as pessoas tornam o “certo” o mais difícil possível. Para todos os que foram condicionados por diferentes tradições, o errado é fácil e o certo é árduo. É preciso treinamento, disciplina, repressão, renúncia ao mundo, renúncia aos prazeres... As mentiras são fáceis, a verdade é difícil — este é o condicionamento comum da humanidade. Mas Chuang Tzu certamente é um homem de imenso discernimento. Ele diz: O fácil é o certo. Então, por que as pessoas têm tornado o certo tão difícil? Todos os seus santos tornaram o certo muito difícil, e há uma psicologia por trás disso: apenas o difícil é atraente para o seu ego. Quanto mais difícil a tarefa, mais o ego se sentirá desafiado. Escalar o Everest era difícil; antes de Edmund Hillary ter chegado vivo ao topo, centenas de pessoas morreram na tentativa. Por todo um século, grupos e mais grupos de alpinistas se empenharam, e, quando Edmund Hillary chegou ao topo, não havia nada a ser encontrado! No ponto culminante, nem mesmo há espaço suficiente... apenas uma pessoa pode ficar em pé ali. Perguntaram a ele: “O que o estimulou? Sabendo perfeitamente bem que dezenas de alpinistas perderam a vida ao longo de todos esses anos, e os corpos deles nem foram encontrados... por que você tentou realizar esse projeto perigoso?” Ele respondeu: “Eu precisava tentar, pois isso estava ferindo o meu ego. Sou alpinista, adoro escalar montanhas, e era humilhante o fato de o Everest existir e ninguém ser capaz de chegar ao cume. Não é uma questão de encontrar alguma coisa... Eu me sinto imensamente feliz”.
  • 41. O que é essa felicidade? Você não encontrou nada! A felicidade é que o seu ego ficou mais cristalizado. Você é a primeira pessoa em toda a História que chegou ao ponto culminante do Everest; agora ninguém pode tirar o seu lugar; qualquer um que chegar lá será o segundo, o terceiro... mas você deixou a sua marca na História; você é o primeiro. Você não encontrou nada, mas um profundo alimento para o seu ego. Todas as religiões tornam o certo difícil porque o difícil é atraente, atraente para o ego. Mas o ego não é a verdade, não é o certo. Você percebe o dilema? O ego só é atraído pelo difícil. Se você quiser que as pessoas sejam santas, precisará tornar muito difícil o seu certo, a sua verdade, a sua disciplina. Quanto mais difícil, mais as pessoas egóicas serão atraídas, serão praticamente puxadas como que por um ímã. Mas o ego não está certo; ele é a pior coisa que pode acontecer a uma pessoa, e não pode lhe entregar o certo, a verdade, mas apenas fortalecer-se mais. Em uma simples afirmação, Chuang Tzu está fazendo a afirmação mais fecunda: O fácil é o certo. Porque o ego não sente atração pelo fácil. Se você estiver se movendo na direção do fácil, o ego começará a morrer; e, quando não sobrar nenhum ego, você chegará à sua realidade, ao certo, à verdade. E a verdade e o certo precisam ser naturais. Fácil significa natural; você pode encontrar o real e o verdadeiro sem esforço. “O fácil é o certo” significa que o natural é o certo, que a ausência de esforço é o certo, que a ausência de ego é o certo. Comece certo e você estará sendo natural; continue natural e você estará certo. Esses são os dois lados da mesma moeda. Se, ao começar a viver uma vida certa, você descobrir que ela está difícil, então lembre-se: ela não está certa. Se, ao viver o certo, sua vida se tornar cada vez mais fácil, cada vez um deixar acontecer, um fluir com a corrente... É difícil ir contra a corrente, mas seguir com a corrente não é difícil. Assim, escolha as coisas mais fáceis da vida, as coisas mais naturais da vida, e você estará certo; ou, se você quiser começar da outra maneira, lembre-se do critério de que o certo precisa produzir a facilidade em você, o estado de relaxamento em você. Continue natural e você estará certo. Nem por um momento se esqueça de que o difícil é alimento para o ego e que o ego é a barreira que o torna cego, que o torna surdo, que torna o seu coração difícil de abrir, que faz com que amar, dançar e cantar sejam impossíveis para você. Continue no fácil. Toda a sua vida deve ser um fenômeno fácil, e então você não estará criando o ego. Você será um ser natural, apenas ordinário, comum. E o ordinário é o mais extraordinário. As pessoas que estão tentando ser
  • 42. extraordinárias não entenderam nada. Seja simplesmente uma pessoa comum, seja simplesmente um joão-ninguém. Mas todos os seus condicionamentos são tão corruptos; eles o corrompem. Eles dizem: estar no fácil é ser preguiçoso, ser normal é humilhante. Se você não tentar ter poder, prestígio ou respeitabilidade, sua vida não terá sentido; isso foi forçado a entrar na sua mente. Com essas simples afirmações, Chuang Tzu está tirando todos os seus condicionamentos. Continue natural e você estará certo. Nunca, nem por um momento, sinta-se atraído pelo difícil. O difícil fará de você “alguém”, um primeiro-ministro, um presidente, mas não o tornará divino. O fácil é divino. Ouvi falar sobre um americano muito rico. Durante toda a vida ele tentou estar no topo, e ele chegou lá e tinha todas as coisas que o mundo pode oferecer. Mas, por dentro, ele se sentia um idiota, pois não havia nada no topo. Se Edmund Hillary era suficientemente inteligente, deve ter se sentido um idiota ao chegar no topo do Everest. Por que ele lutou tanto? O homem que caminhou na Lua deve ter se sentido um pouco constrangido, embora não houvesse ninguém que pudesse ver o rosto dele. No que se refere a dinheiro, esse homem chegara ao topo e, no que se refere ao que o dinheiro pode comprar, ele tinha comprado tudo. Agora ele estava se sentindo um idiota. “Qual é o sentido disso tudo?” Ele se sentia vazio por dentro, pois não tinha tempo para seu crescimento interior nem para conhecer a si mesmo. Ele abandonou todas as suas riquezas e foi para o Oriente descobrir a verdade, porque três quartos de sua vida tinham praticamente ficado para trás. Mas, se alguma coisa fosse possível, ele ainda tinha alguns dias de vida para tentar. Ele correu de mestre em mestre, mas ninguém conseguiu satisfazê-lo, porque tudo o que eles diziam correspondia a uma outra viagem do ego, e ele já conhecia muito bem essa viagem. Não importa se você está acumulando dinheiro ou virtudes, se está ficando respeitável aqui ou respeitável no outro mundo; não importa, o jogo é o mesmo. Não faz diferença se você está se tornando uma celebridade mundialmente famosa ou um santo venerado mundialmente; ambos são viagens do ego. E todos aqueles gurus estavam tentando lhe ensinar disciplinas difíceis e caminhos árduos para encontrar a verdade; todos eles estavam dizendo: “Pode não ser possível nesta vida, mas mesmo assim comece. Talvez na próxima vida... A jornada é longa, o objetivo é uma estrela distante”. Mas agora ninguém podia enganá-lo. Ele havia entendido que “tornar-se alguém especial” é um exercício de burrice.
  • 43. Finalmente, ele ouviu falar de um santo que vivia no Himalaia; as pessoas diziam: “Se você não ficar satisfeito com ele, não ficará satisfeito com ninguém; então se esqueça de tudo”. Assim, cansado e maltrapilho, ele caminhou quilômetros e acabou encontrando o ancião; ficou muito feliz por vê-lo, mas ficou chocado. Antes que pudesse dizer alguma coisa, o ancião perguntou: “Você é americano?” Ele respondeu: “Sim, sou”. O ancião disse: “Muito bom! Você tem cigarros americanos com você?” O homem exclamou: “Meu Deus, onde fui parar? Vim procurar a verdade, encontrar o certo...” Ele ofereceu os cigarros, o ancião pegou um e começou a fumar. O americano comentou: “O senhor nem me perguntou por que vim aqui, cansado, faminto...” O ancião disse: “Isso não importa”. O americano afirmou: “Vim para encontrar a verdade!” O ancião disse: “Verdade? Faça uma coisa: volte para o lugar de onde você veio. E na próxima vez que vier, traga muitos cigarros americanos, pois neste lugar é muito difícil arranjá-los. Sou uma pessoa sem preocupações, não me esforço para fazer nada; as pessoas vêm por conta própria, mas gosto dos melhores cigarros”. E o homem perguntou: “Mas e a minha busca?” O ancião respondeu: “Sua busca? Esta é a disciplina para você: volte, compre tantos cigarros quanto puder, retorne e fique aqui comigo”. O homem perguntou: “E a disciplina?” O ancião disse: “Sou uma pessoa simples; nenhuma disciplina, nenhuma religião, nenhuma filosofia, apenas gosto de fumar. Venha aqui e, lentamente, também se tornará tão simples quanto eu. E eu lhe digo: ser simples, sem nenhuma pretensão, é o certo”. E, quando o homem se voltou para ir embora, perplexo, o ancião disse: “Escute, pelo menos deixe o seu relógio aqui, porque não tenho nenhum e nunca sei que horas são. E você está voltando e pode comprar outro relógio”. Chuang Tzu teria gostado desse velho.
  • 44. O fácil é o certo. Comece certo e você estará sendo natural. Esse precisa ser o critério. Se você se sente pouco à vontade e tenso, então o que você começou não pode estar certo. Continue natural e você estará certo. E a última parte nunca deve ser esquecida. O caminho certo para seguir facilmente é se esquecer do caminho certo — porque até se lembrar disso é um incômodo. O caminho certo para seguir facilmente é se esquecer do caminho certo e se esquecer de que o seguir é fácil. Qual é a necessidade de se lembrar dessas coisas? Relaxe a um tal ponto... seja tão natural quanto as árvores e os pássaros. Ao olhar os pássaros, você não acha que um é santo e outro é pecador; ao olhar as árvores, você não acha que uma é virtuosa e a outra está cheia de maus hábitos. Tudo é natural, tão natural que você nem precisa se lembrar disso. Chuang Tzu foi um dos homens mais naturais que o mundo já viu. Ele não criou nenhuma disciplina ou doutrina, nem fez nenhuma catequese; ele simplesmente explicou uma coisa: se puder ser natural e simples, como os pássaros e as árvores, você florescerá e terá suas asas abertas no vasto céu. Você não precisa ser santo. Os santos são muito tensos, mais tensos do que os pecadores. Conheci os dois e, se tivesse de escolher, eu escolheria os pecadores como companhia, e não os santos. Os santos são as piores companhias que existem, pois seus olhos estão cheios de julgamentos sobre tudo: “Você deveria fazer isso e não aquilo”. E eles começam a dominar você, a condená-lo, a humilhá-lo, a insultá-lo, porque o que eles estão fazendo é certo e o que você está fazendo não é certo. Eles envenenaram tão cruelmente a sua natureza que, se procurássemos criminosos de verdade, eles seriam encontrados entre os santos e não entre os pecadores. Os pecadores não fizeram muito mal às pessoas. Visitei prisões, encontrei criminosos e fiquei surpreso ao ver que, muitas vezes, eles eram as pessoas mais inocentes. Talvez por serem as mais inocentes é que foram pegas; os espertos estão fazendo crimes muito maiores, mas não são pegos. Todas as leis têm brechas, e os espertos encontram primeiro as brechas; os inocentes são pegos porque não têm essa esperteza. Estamos vivendo em um mundo muito estranho. Os criminosos é que ditam as regras; os criminosos são os políticos; tornam-se presidentes, vice-presidentes, primeiros ministros, pois, a não ser o criminoso, quem deseja o poder? Um ser humano autêntico quer paz, quer amor, quer que o deixem em paz, quer a liberdade para ser ele mesmo. A própria idéia de dominar os outros é criminosa.
  • 45. Chuang Tzu está certo: se você sente alguma tensão, lembre-se de que o que você está fazendo não está certo. E ele foi a única pessoa que sugeriu um critério tão belo: O fácil é o certo. Comece certo e você estará sendo natural; continue natural e você estará certo. O caminho certo para seguir facilmente é se esquecer do caminho certo e se esquecer de que o seguir é fácil. Relaxe sendo um joão-ninguém, seja natural, torne-se parte deste universo relaxado, tão relaxado que você se esquece de tudo sobre o fácil e de tudo sobre o certo. NÃO HÁ COMO Conta-se que, na primeira vez em que Chuang Tzu entrou na cabana em que vivia seu futuro mestre, Lao Tzu, este olhou para Chuang Tzu e disse: “Lembre-se de uma coisa, nunca me pergunte como ficar iluminado”. O pobre sujeito tinha ido até ele justamente com esse propósito. Mas Lao Tzu deixou bem claro: “Somente sob essa condição é que eu o aceitarei como discípulo”. Houve um momento de silêncio. Chuang Tzu pensou: “Estranho. Vim para me iluminar, e esse é o verdadeiro propósito de ser um discípulo. E esse velho camarada, tão belo e tão gracioso, está pedindo uma coisa muito absurda: se quiser ser meu discípulo, prometa-me que nunca perguntará nada sobre como ficar iluminado”. Mas era tarde demais, pois ele já estava sentindo amor pelo velho. Chuang Tzu tocou os pés de Lao Tzu e disse: “Prometo que nunca perguntarei como me tornar iluminado, mas aceite-me como seu discípulo”. No mesmo instante ele sentiu uma forte bofetada. “Seu idiota! Se não for para você se iluminar, para que você está se tornando um discípulo? Exigi de você essa resposta porque pude reconhecer em você uma grande inteligência que poderia imediatamente perceber o motivo do meu pedido. Você é iluminado; não há como se tornar iluminado, não há necessidade. Na verdade, mesmo se você quiser ser não-iluminado, não há como.” A TARTARUGA FELIZ Dois mensageiros foram enviados pelo imperador. Chuang Tzu estava pescando, e eles se aproximaram e disseram: “O imperador quer que o senhor seja o primeiro-ministro do país” Chuang Tzu perguntou: “Vocês vêem aquela tartaruga ali, balançando o rabo na lama?” Eles responderam: “Sim, vemos”.